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Unidade 2 – Deontologia e Legislação 5º período - Farmácia 1 Apresentação O responsável técnico é um profissional com formação de nível superior, que está legalmente habilitado para assumir a responsabilidade técnica do estabelecimento que estiver sob atuação. Devido à sua formação e aos conhecimentos específicos, sua posição em relação aos aspectos técnicos de um determinado empreendimento não deverá ser desautorizada, nem mesmo pelo proprietário do local que estiver sob sua tutela. A presença do responsável técnico em determinadas áreas é fundamental para garantir que prevaleça o interesse público acima do interesse privado. No caso específico do profissional farmacêutico, seu principal objetivo será preservar a saúde e o bem-estar da população. Para isso, é fundamental que sua atuação seja pautada por princípios éticos, e que o profissional atue no sentido de coibir qualquer tipo de abuso ou violação legal que possa ser eventualmente cometida por seus subordinados, ou até mesmo por seus superiores. Deste modo, a responsabilidade técnica não é meramente uma formalidade burocrática. É necessário que o farmacêutico responsável técnico esteja devidamente preparado, não apenas com conhecimentos técnicos específicos e diretamente relacionados à sua atuação, mas também com conhecimentos sobre direito e legislação farmacêutica. A resolução n 577 do Conselho Federal de Farmácia (CFF) define o farmacêutico responsável ou diretor técnico como: “Farmacêutico titular que assume a direção técnica ou responsabilidade técnica da empresa e/ou estabelecimento perante o respectivo Conselho Regional de Farmácia (CRF) e os órgãos de vigilância sanitária, nos termos da legislação vigente, ficando sob sua responsabilidade a realização, supervisão e coordenação de todos os serviços técnico-científicos da empresa e/ou estabelecimento, respeitando, ainda, o preconizado pela legislação laboral ou acordo trabalhista. Ainda assim, apenas conhecer as leis não é suficiente. É fundamental que o responsável técnico entenda a importância dos aspectos regulatórios como instrumentos de proteção da população, e que saiba transmitir a importância da conduta correta a todos os seus colaboradores. Sua presença, deverá garantir a regularidade do estabelecimento perante os órgãos de fiscalização, e também ajudar a estabelecer e manter uma cultura empresarial pautada pela atuação ética e responsável de todos os envolvidos. É importante ressaltar que o farmacêutico responsável técnico responderá por suas ações e omissões enquanto exercer a profissão, e deverá prestar contas ao Conselho Regional de Farmácia, e à Vigilância Sanitária, sempre que solicitado, confirme a legislação vigente. No Brasil, o exercício e fiscalização no âmbito da assistência farmacêutica é regulamentado pela Lei nº 13.021, de 8 de agosto de 2014. O artigo 5º desta Lei estabelece que: “as farmácias de qualquer natureza requerem, obrigatoriamente, para seu funcionamento, a responsabilidade e a assistência técnica de farmacêutico habilitado na forma da Lei”. Esta mesma Lei determina que é obrigatória a presença do farmacêutico durante todo o horário de funcionamento do estabelecimento. Ao estabelecer a obrigatoriedade da presença do farmacêutico nos estabelecimentos onde é realizada a assistência farmacêutica, a legislação brasileira fornece a base legal que permite proteger a saúde pública, pois o farmacêutico responsável técnico deverá garantir a promoção do uso racional de medicamentos (OMS, 1985). É justamente nestes estabelecimentos que ocorrerá o contato direto entre o paciente e o farmacêutico, que deverá garantir que seja fornecido o medicamento correto, com todas as orientações necessárias para que o tratamento seja efetivo. Entretanto, não é apenas nas farmácias que um farmacêutico responsável técnico é necessário. Dentre as diversas possibilidades de atuação, o profissional farmacêutico também poderá ser responsável técnico, por exemplo, em indústrias farmacêuticas, distribuidoras de medicamentos e laboratórios de análises clínicas. Na indústria farmacêutica, a responsabilidade técnica do farmacêutico é regulamentada pela Resolução do Conselho Federal de Farmácia nº 584 de 29/08/2013, que foi atualizada pela Resolução nº 621 de 31/03/2016. Estas resoluções estabelecem que: “Todo estabelecimento industrial farmacêutico deve contar com responsabilidade técnica, a fim de garantir a lisura e a qualidade necessária em todas as etapas, durante todo o prazo de validade do produto, devendo a empresa possuir farmacêutico responsável técnico e farmacêutico(s) substituto(s), devidamente regularizado no CRF e nos órgãos do SNVS, para casos de eventuais ausências e impedimentos do responsável técnico.” No caso da atuação na indústria farmacêutica, o farmacêutico responsável técnico deverá garantir que sejam seguidas as determinações da RDC nº 17, de 16 de abril de 2010 da ANVISA, que dispõe sobre as boas práticas de fabricação de medicamentos. O farmacêutico deverá garantir que sejam tomadas todas as providências necessárias para garantir a qualidade dos medicamentos, dentro Unidade 2 – Deontologia e Legislação 5º período - Farmácia 2 dos padrões exigidos pela legislação, no processo chamado de garantia da qualidade. Conforme determina a RDC 17, “Boas Práticas de Fabricação é a parte da Garantia da Qualidade que assegura que os produtos são consistentemente produzidos e controlados, com padrões de qualidade apropriados para o uso pretendido e requerido pelo registro”. Além disso, a RDC 17 determina que: ““todos os processos de fabricação devam ser claramente definidos e sistematicamente revisados em função da experiência adquirida. Além disso, devem ser capazes de fabricar medicamentos dentro dos padrões de qualidade exigidos, atendendo às respectivas especificações”. Considerando o rigor exigido pela legislação atual a respeito da produção de medicamentos, o farmacêutico que segue as determinações legais de forma cuidadosa e responsável poderá garantir que a população tenha acesso a medicamentos de qualidade garantida, contribuindo para a promoção e manutenção da saúde da população. Por outro lado, os que violam essas determinações, poderão sofrer sanções éticas e penais. Em relação aos farmacêuticos que atuam na área de distribuição de medicamentos, sua presença também é obrigatória durante todo o funcionamento do estabelecimento, conforme disposto na Medida Provisória nº 2.190-34, de 23 de agosto de 2001, que determinou a aplicação das disposições do artigo 15 da Lei 5.991/73 para as distribuidoras. Nessa área de atuação, a presença do farmacêutico também é de grande importância, visto que o farmacêutico deverá fiscalizar as condições de estoque e armazenamento dos produtos, realizar a qualificação de fornecedores e clientes, acompanhar a expedição dos produtos, realizar o controle de produtos avariados ou vencidos, dentre outras obrigações. Com esse controle, o farmacêutico deverá garantir que produtos de boa qualidade possam ser recebidos pelas farmácias, e em última instância pelo paciente. Na área de análises clínicas, a responsabilidade técnica do farmacêutico é regulamentada pela Resolução nº 296 de 25 de julho de 1996 do CFF. Cabe dar destaque ao seu primeiro artigo, que determina o seguinte: “O Farmacêutico- bioquímico, devidamente registrado no Conselho Regional de Farmácia respectivo, poderá exercer a responsabilidade técnica de laboratório de análises clínicas competindo-lhe realizar todos os exames reclamados pela clínica médica, nos moldes da Lei, inclusive, no campo de Toxicologia, Citopatologia, Hemoterapia e Biologia molecular”. Assim, a Lei determina que nessa área, o farmacêutico deverá datar e assinar os laudos realizados sob sua responsabilidade, sendo que deverá constar obrigatoriamenteseu registro profissional. Esta área de atuação não é privativa do farmacêutico, e pode ser exercida também por médicos e biomédicos. Diante do exposto, fica claro que independentemente da área de atuação, o farmacêutico responsável técnico deverá ter pleno conhecimento dos aspectos legais que regulamentam sua área de atuação. Cada uma das leis e resoluções apresentadas neste tópico, e resumidas no Quadro 1, é um convite a uma leitura completa, para que se conheça os aspectos legais de cada área de atuação de forma mais detalhada. Sendo assim, discutiremos questões mais específicas, com ênfase nas penalidades que podem ser impostas em casos de irregularidades, e sobre a importância do código de defesa do consumidor. Código penal e civil Em um mundo ideal, todos os seres humanos deveriam agir de forma ética e responsável, garantindo um ambiente pacífico e equilibrado para toda a população. Infelizmente, esta não é a realidade em nosso mundo atual. Delitos dos mais variados tipos são cometidos no mundo todo, independentemente de gênero, classe social, ou profissão. Portanto, por maior que seja a expectativa de que o farmacêutico atue sempre como um guardião do bem-estar e da saúde da população, sabemos que alguns indivíduos, mesmo que sejam uma minoria, acabam atuando de forma irresponsável, fato que pode ocorrer em qualquer outra área profissional. O grande problema de uma atuação irresponsável de algumas pessoas, são os danos que ela pode causar. Nesse sentido, o Código Civil, estabelecido pela Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, determina que: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” Unidade 2 – Deontologia e Legislação 5º período - Farmácia 3 O código civil é um documento legal que estabelece normas relacionadas às questões jurídicas de ordem privada. Deste modo, é necessário que a sociedade estabeleça mecanismos legais para coibir atos ilícitos, de modo a proteger a população e garantir a estabilidade e o bem-estar coletivo. No Brasil, os atos considerados como ilícitos têm suas penas determinadas pelo Código Penal, estabelecido no Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. O Código Penal protege o próprio exercício da profissão farmacêutica, garantindo que a profissão poderá ser exercida apenas por aqueles que possuem autorização legal para tal. Assim, o artigo nº 282 do código penal determina que “Exercer, ainda que a título gratuito, a profissão de médico, dentista ou farmacêutico, sem autorização legal ou excedendo- lhe os limites” é uma infração sujeita a pena de detenção de seis meses a dois anos, e se o crime for praticado com fins lucrativos, também haverá aplicação de multa. A falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais é tipificada como um crime contra a saúde pública. A redação do Código Penal a este respeito foi atualizada pela Lei nº 9.677, de 2 de julho de 1998, que estabelece pelo artigo nº 273 a pena de reclusão de 10 a 15 anos, e aplicação de multa. Esta pena se aplica também a quem “importa, vende, expõe à venda, tem em depósito para vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo o produto falsificado, corrompido, adulterado ou alterado." Nos casos de modalidade culposa, será aplicada pena de detenção de um a três anos e multa. Além disso, essa Lei também abrange a questão dos medicamentos sem registro, em desacordo com a fórmula que consta no registro, ou que não apresentem as características de identidade e quantidade aprovadas para a comercialização. Portanto, substâncias importadas, mesmo que sejam aprovadas por instituições de boa credibilidade como o FDA (Foods and Drugs Administration), não poderão ser comercializadas legalmente no Brasil, caso não sejam devidamente registradas pelos órgãos competentes. Para produtos legítimos e devidamente registrados, esta parte da legislação implica na necessidade de se manter um rigoroso controle de qualidade em todos os lotes que são produzidos e liberados para a cadeia de distribuição. Assim, o Código Penal responsabiliza toda a cadeia de produção e distribuição de medicamentos. Apesar das penas estabelecidas pela Lei, centenas de operações de apreensão de produtos falsificados são realizadas todos os anos pela ANVISA, em conjunto com a Polícia Federal. Portanto, o farmacêutico deve estar atento quanto à procedência dos produtos que adquire, e também verificar constantemente as resoluções emitidas pela ANVISA, pois algumas dessas resoluções determinam a apreensão e inutilização de lotes específicos de medicamentos falsificados que eventualmente são encontrados no mercado. No artigo nº 274 do Código Penal, fica estabelecida a pena de detenção de um a três anos e multa, se ocorrer “emprego de processo ou de substância não permitida”. Nesse sentido, é muito importante a atenção dos farmacêuticos responsáveis por farmácias de manipulação, visto que alguns médicos podem, por desconhecimento, solicitar a manipulação de algum produto contendo substância não permitida. Em relação aos produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes, a ANVISA publicou na RDC n º 03, de 20 de janeiro de 2012, uma lista que apresenta as substâncias que estes produtos não devem conter, com exceção de algumas situações específicas. O artigo nº 280 do Código Penal estabelece pena de detenção de um a três anos e multa para quem fornecer substância medicinal em desacordo com a receita médica, e se o crime pertencer à modalidade culposa, a pena será de dois meses a um ano de detenção. Fica evidente deste modo a importância da atenção e cuidado do farmacêutico no ato da dispensação, evitando a chamada “empurroterapia”, e respeitando as determinações legais sobre intercambialidade de medicamentos (RDCs nº 16 e 58 da ANVISA. Vamos analisar e comentar sobre alguns casos que exemplificam situações de infração do código penal: Caso 1 – Serão apresentados alguns trechos extraídos de matéria do portal G1 “As transações irregulares de medicamentos ocorrem em espaços de comércio informal com facilidade, em Fortaleza, embora sejam proibidas pela legislação brasileira. A reportagem do G1 percorreu 10 feiras da capital cearense, constatando a venda irregular em seis. Em nenhuma delas havia presença de agentes fiscalizatórios, embora a Agência de Fiscalização de Fortaleza (Agefis) tenha registrado quase mil autuações em um ano e meio”. “Nos corredores da feira do bairro Henrique Jorge, dezenas de comprimidos são expostos sobre bandejas ao lado de caixas de xaropes e outros tipos de medicamentos. Um deles é o Apevitin-BC, estimulante do apetite utilizado para crescimento e ganho de peso, que uma das vendedoras Unidade 2 – Deontologia e Legislação 5º período - Farmácia 4 recomendou para uma mulher de mãos dadas com uma criança”. “Tem de R$3 e tem de R$5, respondeu outra vendedora ao ser questionada sobre o estoque de omeprazol, remédio para quem sofre de gastrite e refluxo. Sobre o preço, ela se referia ao tamanho das cartelas disponíveis. Amontoados ao ar livre, havia ainda paracetamol, dipirona, prednisolona e outros medicamentos utilizados principalmente como antitérmicos, antigripais e analgésicos”. Neste caso, vemos as seguintes infrações: venda de medicamentos em local não autorizado pela Vigilância Sanitária (Lei Federal Nº 5.991/73), e por consequência, sem a presença de um farmacêutico responsável. Poderá ser aplicada a pena estabelecida pelo artigo 273 do Código Civil, pois visto que o artigo inclui medicamentos “de procedência ignorada”. Também cabe aplicação do artigo 282 do Código Penal devido ao exercício ilegal da profissão de farmacêutico. A venda de medicamentos nessascondições pode trazer sérios riscos à saúde dos consumidores, visto que as condições de armazenamento não garantem que estes medicamentos sejam eficazes. Além disso, não há como saber se foram vendidos medicamentos fora do prazo de validade, visto que a procedência dos produtos é desconhecidas e não há controles de fiscalização ou rastreabilidade. Além disso, os medicamentos são vendidos sem receita médica e sem a devida orientação do profissional farmacêutico, o que pode levar a sérios problemas de saúde. Caso 2 – Dispensação de medicamentos em desacordo com a receita médica Um senhor foi à farmácia para adquirir medicamento fumarato de cetotifeno, que foi prescrito para sua filha, de seis anos de idade. O médico prescreveu a administração de 5 mL do medicamento na dose de 1 mg/5 mL a cada noite. Por motivo de desatenção, o farmacêutico que atendeu a este paciente dispensou o medicamento na dose de 1 mg/mL, e não forneceu as orientações necessárias para a administração correta. Como a criança utilizou o medicamento conforme as orientações da receita, a dose administrada era cinco vezes maior que a dose recomendada pelo médico. Como consequência, a criança desenvolveu um quadro de intoxicação medicamentosa, que foi constatada em ambiente hospitalar. Neste caso, a situação poderia ser considerada como uma infração penal, de acordo com o artigo 280 do código penal, visto que foi fornecida substância medicinal em desacordo com a receita médica, além disso, esta conduta está em desacordo com o código de defesa do consumidor. No entanto, cabe ressaltar, neste caso, que não haveria esta infração se o farmacêutico tivesse orientado corretamente sobre o uso do medicamento, pois no caso do medicamento fornecido na concentração de 1 mg/mL, o paciente poderia tomar 1 mL a cada noite, ao invés de cinco, mantendo a concentração recomendada pelo médico na receita e evitando a superdosagem. Mesmo com esta possiblidade de adaptação da dose, ainda seria necessário que o farmacêutico realizasse contato com o médico, para confirmar se haveria algum problema em função da mudança da forma farmacêutica do medicamento, visto que a Lei nº 9.787, de 10 de fevereiro de 1999 é clara ao estabelecer que a bioequivalência é garantida apenas entre produtos apresentados sob a mesma forma farmacêutica. Também é importante notar que, de acordo com o artigo nº 46 da RDC nº 44/2009 da ANVISA, “No momento da dispensação de medicamentos deve ser feita a inspeção visual para verificar, no mínimo, a identificação do medicamento, o prazo de validade e a integridade da embalagem”. Caso 3 – Caso sobre apreensão de medicamento falsificado “A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) determinou a apreensão de um lote falsificado do medicamento Rivotril, que é um ansiolítico com finalidade tranquilizante. Segundo o órgão sanitário, a medida preventiva foi com base em ação de fiscalização. A informação foi divulgada por meio da Resolução (RE) 1.753, de 2 de junho, publicada no Diário Oficial da União (D.O.U.). O lote citado pela Agência reguladora é o RJ0598. Para justificar a determinação, a Anvisa informa: "Como medida de interesse sanitário, a proibição do armazenamento, comercialização, distribuição, transporte e uso, bem como, a apreensão e inutilização, em todo o território nacional, de unidade lote (RJ0598) do medicamento Rivotril, (clonazepam)". Nesse sentido, o órgão sanitário completa: “O lote RJ0598, solução oral 2,5mg/ml, validade 01/2021, que não possuam em sua embalagem secundária as seguintes informações ‘GTIN 07896226501239’ e ‘MS 1010000720034’, por se tratarem de unidades falsificadas, não reconhecidas pelo detentor do registro”. Este caso evidencia a capacidade que os medicamentos falsificados podem ter no sentido de se infiltrarem sem serem percebidos pela cadeia de distribuição de medicamentos. Caso os responsáveis pela produção destes medicamentos sejam descobertos, são sujeitos às penalidades impostas pelo artigo 273 do Código Civil. Neste caso específicos, os farmacêuticos que receberem estes Unidade 2 – Deontologia e Legislação 5º período - Farmácia 5 medicamentos, a princípio, podem ser considerados também como vítimas deste esquema de falsificação, visto que foram distribuídos produtos visualmente idênticos aos originais. No entanto, uma vez que houve identificação da falsificação pela Vigilância Sanitária e publicação de Resolução determinando a retirada do mercado, o farmacêutico responsável deverá tomar imediatamente as providências necessárias para que o medicamento seja retirado de circulação e encaminhado para o descarte adequado, de acordo com as determinações da ANVISA. Caso estas providências não sejam tomadas e haja comprovação de que houve venda do medicamento após a publicação da Resolução da ANVISA, o farmacêutico deixa de apresentar a condição de vítima, e também poderá ser enquadrado pelo artigo 273 do código penal. Para facilitar os estudos, o Quadro 2 apresenta um resumo das principais leis e resoluções apresentadas neste tópico. Código de defesa do consumidor Em uma relação de consumo, existe sempre um consumidor, um fornecedor e um produto ou serviço a ser oferecido. Nessa relação, é comum que o consumidor esteja, de certa forma, em uma situação de maior vulnerabilidade, em relação ao fornecedor. Esta vulnerabilidade do consumidor pode ser caracterizada principalmente por questões de ordem técnica, jurídica, econômica. A vulnerabilidade técnica se caracteriza pela ausência de conhecimentos específicos a respeito do produto a ser adquirido. A vulnerabilidade jurídica, se refere a situações que envolvem contratos, onde o consumidor não possui conhecimento jurídico suficiente para compreender suas consequências. A vulnerabilidade econômica, se refere ao poder econômico do fornecedor, quando este é maior que o do consumidor. Para proteger o consumidor de possíveis abusos por parte do fornecedor, foi instituída a Lei Nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, que estabeleceu o código de defesa do consumidor (CDC). Essa Lei define o consumidor como “toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”. Deste modo, apenas a pessoa que adquire produto para uso próprio ou para uso de sua família ou entes queridos poderá se beneficiar das garantias contidas no CDC, visto que aquele que aquele que adquire um produto para uso em seu trabalho, como por exemplo, para revenda, não é considerado como destinatário final. O fornecedor é definido pelo CDC como “toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”. No caso do farmacêutico que atua diretamente com a venda de medicamentos, é importante conhecer o CDC, a fim de melhor compreender os direitos do consumidor e as suas responsabilidades dentro da relação de consumo. Neste tópico, vamos estudar alguns dos principais direitos do consumidor, com ênfase nas situações mais comuns que podem ocorrer em uma farmácia. O artigo 6º do CDC considera como direitos básicos do consumidor: 1. A proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos 2. A educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade de contratações 3. A informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de qualidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem. É interessante notar que esses direitosbásicos se relacionam diretamente com a atuação do farmacêutico que trabalha diretamente com a venda de medicamentos, visto que eles remetem à execução adequada do processo de assistência farmacêutica. Sendo assim, o farmacêutico, ao realizar a venda de um medicamento, deverá fornecer ao paciente todas as informações necessárias ao seu uso adequado, para garantir a efetividade do tratamento. Caso não o faça, além de cometer uma infração ética, estará também ferindo os direitos estabelecidos pelo artigo 6º do CDC. Outra questão importante se refere à necessidade e um rigoroso controle a respeito do prazo de validade dos medicamentos, visto que as farmácias, atualmente, possuem uma grande quantidade de produtos. Para grandes estabelecimentos farmacêuticos, esse controle às vezes pode ser desafiador, devido à enorme carga de trabalho e ao grande volume de entradas e saídas de produtos. Unidade 2 – Deontologia e Legislação 5º período - Farmácia 6 Se por acaso um produto vencido for esquecido nas prateleiras e acabar sendo entregue ao cliente, o farmacêutico estará em desacordo com o CDC, pois, conforme apresentado no artigo nº 10, “o fornecedor não poderá colocar no mercado de consumo produto ou serviço que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de nocividade ou periculosidade à saúde ou segurança”. Outra questão presente no CDC que faz parte da rotina diária de muitas farmácias é a questão da troca de produtos. O artigo nº 18 do CDC estabelece o seguinte: “Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas”. Com essa determinação do CDC, fica assegurado ao consumidor o direito de reparação em casos em que o consumidor constata que o produto apresenta algum desvio de qualidade como, por exemplo, alterações de aspecto, número de unidades na embalagem, odor, sabor, validade do produto ou presença de corpo estranho. Nesses casos, o direito de reparação é dado pela substituição do medicamento por outro idêntico, a devolução imediata da quantia paga ou ainda o abatimento proporcional do preço na ocasião da compra. Entretanto, em algumas situações, não é possível realizar a devolução do produto. Se o consumidor solicitar a devolução por não desejar mais o produto, ou por motivo de interrupção do tratamento, a farmácia não possui a obrigação de aceitar essa devolução. No caso de medicamentos controlados, que são regulamentados pela portaria SVS/MS 344/98 e pela portaria SVS/MS 06/99, a devolução é expressamente proibida. O artigo 90 da portaria SVS/MS 06/99 determina que: “Quando, por qualquer motivo, for interrompida a administração de medicamentos à base de substâncias constantes das listas da Portaria SVS/MS nº 344/98 e de suas atualizações, o prescritor e/ou a Autoridade Sanitária local devem recomendar ao paciente ou seu responsável que façam a entrega destes medicamentos no Órgão competente Vigilância Sanitária. A Autoridade Sanitária emitirá um documento comprobatório do recebimento e, posteriormente, dará o destino conveniente (inutilização ou doação)”. Além dessa portaria, a RDC 20/2021, em seu artigo 20, determina expressamente que “é vedada a devolução, por pessoa física, de medicamentos antimicrobianos industrializados ou manipulados para drogarias e farmácias”. § 1º Excetua-se do disposto no caput deste artigo a devolução por motivos de desvios de qualidade ou de quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo, ou decorrentes de disparidade com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, a qual deverá ser avaliada e documentada pelo farmacêutico.” “§ 2º Caso seja verificada a pertinência da devolução, o farmacêutico não poderá reintegrar o medicamento ao estoque comercializável em hipótese alguma, e deverá notificar imediatamente a autoridade sanitária competente, informando os dados de identificação do produto, de forma a permitir as ações sanitárias pertinentes. Desse modo, não há base legal para que um medicamento que saiu do controle da farmácia seja reincorporado ao estoque. Além do impedimento legal, essa impossibilidade se dá também pelo risco sanitário, visto que uma vez que o medicamento saiu da farmácia, não é possível ter controle sob quais condições de armazenamento ele foi submetido. Além disso, os medicamentos sujeitos a controle especial só poderão ter sua “entrada” registrada no Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados (SNGPC) por meio de nota fiscal e a saída do estabelecimento ocorre apenas mediante receita ou notificação de receita fornecida pelo consumidor. Outra situação importante para que o farmacêutico esteja atento se refere ao artigo 39, inciso IX do CDC, que determina o seguinte: “É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais”. Nesse caso, se o paciente possuir receita médica que atenda a todos os requisitos legais, o farmacêutico não poderá se negar a realizar a venda do medicamento, exceto se houver algum outro motivo que justifique legalmente essa atitude. Para facilitar os estudos, as leis principais, portarias e resoluções apresentadas neste tópico estão descritas, de forma sintetizada, no Quadro 3. Unidade 2 – Deontologia e Legislação 5º período - Farmácia 7 Apresentação O código de ética da profissão farmacêutica foi constituído, inicialmente, pelo CFF em 05/06/1962, por meio da Resolução nº 06. Esse código, passou por sucessivas atualizações, pelas resoluções nº103/1973, 130/1977, 152/1980, 227/1991, 290/1996 e 417/2004. O atual Código de Ética Farmacêutica entrou em vigor a partir da publicação da Resolução do CFF, nº 596/2014. O código estabelece os atos que são considerados como infrações, e as regras de aplicação de sansões disciplinares. Em seu preâmbulo, a Resolução estabelece que: “O farmacêutico é um profissional da saúde, cumprindo- lhe executar todas as atividades inerentes ao âmbito profissional farmacêutico, de modo a contribuir para a salvaguarda da saúde e, ainda, todas as ações de educação dirigidas à coletividade na promoção da saúde.” A estrutura do Código de Ética Farmacêutica é apresentada do seguinte modo: Título I – Do Exercício Profissional. Capítulo I – Dos Princípios Fundamentais; Capítulo II – Dos Direitos; Capítulo III – Dos Deveres; Capítulo IV – Das Proibições; Capítulo V – Da Publicidade e dos trabalhos Científicos. Título II – Das Relações Profissionais. Título III – Das Relações com os Conselhos Federal e regionais de Farmácia. Título IV – Das Infrações e Sanções Disciplinares. Título V – Das Disposições Gerais. Neste momento, serão apresentados alguns dos pontos importantes do Código de Ética Farmacêutica. Exercício profissional O título I do Código de Ética Farmacêutica apresenta no Capítulo I, os princípios fundamentais que deverão reger a conduta da profissão farmacêutica. O código define seu artigo 1º conforme apresentado: O exercício da profissão farmacêutica tem dimensões de valores éticos e morais que são reguladas por este Código, além de atos regulatórios e diplomas legais vigentes, cuja transgressão poderá resultar em sanções disciplinares por parte do Conselho Regional de Farmácia (CRF), após apuraçãode sua Comissão de Ética, observado o direito ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa, independentemente das demais penalidades estabelecidas pela legislação em vigor no país.” Dentre os princípios destacados neste artigo, cabe destacar os princípios do devido processo legal, princípio do contraditório e da ampla defesa. O princípio do devido processo legal está previsto no artigo nº 5 da Constituição Federal em seu inciso LIV, que determina que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. Os princípios da ampla defesa e do contraditório também estão estabelecidos na constituição federal em seu inciso LV, que determina o seguinte: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. Isso implica que, em um processo legal, quando há alegação de uma parte, a outra parte também deverá ser ouvida, tendo o direito de se manifestar em sua própria defesa. Destaca-se também o artigo 4º: “O farmacêutico responde individual ou solidariamente, ainda que por omissão, pelos atos que praticar, autorizar ou delegar no exercício da profissão”. Esse ponto trata do princípio da responsabilidade individual e solidária. Dessa forma, o farmacêutico, além de cuidar de sua própria capacitação e atualização, também deve ser capaz de atuar como um líder, garantindo que sua equipe também esteja devidamente capacitada e atualizada. Nos casos em que o farmacêutico atue de forma contrária à legislação sanitária ou profissional, poderá haver responsabilização nas esferas civil e criminal. Além disso, o artigo nº 9 do Código de Ética Farmacêutica, se refere ao princípio da autonomia profissional, pois delibera que: “o trabalho do farmacêutico deve ser exercido com autonomia técnica e sem a inadequada interferência de terceiros, tampouco com objetivo meramente de lucro, finalidade política, religiosa ou outra forma de exploração em desfavor da sociedade”. Essa autonomia do profissional farmacêutico é legalmente garantida, por meio da Lei nº 13.021/14, e também de algumas resoluções do CFF, como, por exemplo, as de nº 357/01, 585/13 e 621/16. Já o capítulo II, dispõe sobre os direitos do farmacêutico. Esse capítulo amplia as possibilidades de atuação e interação com o profissional prescritor, em relação à redação anterior, conferida pela Unidade 2 – Deontologia e Legislação 5º período - Farmácia 8 Resolução nº 417/2004 do CFF. Isso fica evidenciado no seguinte trecho: “Art. 11 – É direito do farmacêutico: II - Interagir com o profissional prescritor, quando necessário, para garantir a segurança e a eficácia da terapêutica, observado o uso racional de medicamentos”. Cabe também destaque ao inciso XI desse artigo, que determina o direito do farmacêutico de: “decidir, justificadamente, sobre o aviamento ou não de qualquer prescrição, bem como fornecer as informações solicitadas pelo usuário”. Nesse caso, é fundamental que o farmacêutico se atente à questão da necessidade de justificativa legal, caso decida negar a dispensação de um determinado medicamento, para não contrariar o artigo 39 do CFC, conforme já discutido no tópico anterior. Vale ressaltar que, em situações em que houver violações dos direitos do farmacêutico, o profissional poderá recorrer aos órgãos pertinentes, devendo realizar uma denúncia devidamente fundamentada, com provas documentais suficientes a respeito do fato ocorrido. Dando prosseguimento ao capítulo III do Código de Ética Farmacêutica, nele são apresentados os deveres do farmacêutico. Destaca-se a atualização trazida pela redação atual, que trata sobre a baixa de responsabilidade técnica, ao estabelecer que: O farmacêutico, durante o tempo em que permanecer inscrito em um Conselho Regional de Farmácia, independentemente de estar ou não no exercício efetivo da profissão, deve: XIII - comunicar ao CRF em 5 (cinco) dias o encerramento de seu vínculo profissional de qualquer natureza, independentemente de retenção de documentos pelo empregador. Além de ser um dever, a comunicação do encerramento de vínculo também serve como uma medida de proteção para o profissional, pois evita que seja feito o uso indevido de seu nome em ações que não estiveram efetivamente sob sua responsabilidade. Sobre o capítulo IV, que trata das proibições, apresentaremos as principais atualizações que foram adicionadas em relação à redação anterior do Código de Ética Farmacêutica. Elas são: XXX - fazer uso de documento, atestado, certidão ou declaração falsos ou alterados Esta atualização contempla principalmente as situações onde o farmacêutico se utiliza de atestado médico falso com o objetivo de justificar ausência em seu estabelecimento. XXXI - permitir que terceiros tenham acesso a senhas pessoais, sigilosas e intransferíveis, utilizadas em sistemas informatizados e inerentes à sua atividade profissional. Este inciso inclui os casos onde o farmacêutico fornece a terceiros a senha do Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados – SNGPC. XXXIII – assinar laudo ou qualquer outro documento farmacêutico em branco, de forma a possibilitar, ainda que por negligência, o uso indevido do seu nome ou atividade profissional. Neste caso, estão incluídas situações onde o farmacêutico assina documentos em branco, que podem estar relacionados ao tráfico de drogas. XLII – fazer declarações injuriosas, caluniosas, difamatórias ou que depreciem o farmacêutico, a profissão ou instituições e entidades farmacêuticas, sob qualquer forma. Esse inciso contempla as situações em que o farmacêutico se utiliza de redes sociais para se manifestar de forma desrespeitosa em relação aos outros profissionais ou instituições farmacêuticas. O Código de Ética Farmacêutica também proíbe ao farmacêutico exercer, simultaneamente, as atividades de medicina e farmácia. Essa proibição está descrita no Decreto nº 20.931/32 que regula e fiscaliza o exercício da medicina, da odontologia, da medicina veterinária e das profissões de farmacêutico, parteira e enfermeira, no Brasil. Destaca-se, também, o inciso III (capítulo IV, artigo nº 14) do Código, que proíbe o farmacêutico de “exercer a atividade farmacêutica com fundamento em procedimento não reconhecido pelo CFF”. Esse tipo de atitude pode acarretar até mesmo em crime como, por exemplo, se o farmacêutico prescrever medicamentos de venda sob prescrição médica, desobedecendo a legislação vigente. Para facilitar os estudos, o Quadro 4 apresenta, de forma resumida, as principais resoluções, leis e decretos apresentadas neste tópico. Relações profissionais O título que trata sobre as relações profissionais é o título II, que traz as determinações: Art. 17 - O farmacêutico, perante seus pares e demais profissionais da equipe de saúde, deve comprometer-se a: I - manter relações cordiais com a sua equipe de trabalho, observados os preceitos éticos; II - adotar critério justo nas suas atividades e nos pronunciamentos sobre serviços e funções confiados anteriormente a outro farmacêutico; III - prestar colaboração aos colegas que dela necessitem, assegurando-lhes consideração, apoio e solidariedade que reflitam a harmonia e o Unidade 2 – Deontologia e Legislação 5º período - Farmácia 9 prestígio da categoria; IV - prestigiar iniciativas de interesse da categoria; V - empenhar-se em elevar e firmar seu próprio conceito, procurando manter a confiança dos membros da equipe de trabalho e dos destinatários do seu serviço; VI - manter relacionamento harmonioso com outros profissionais, limitando-se às suas atribuições, no sentido de garantir unidade de ação na realização das atividades a que se propõe em benefício individual e coletivo; VII - denunciar atos que contrariem os postulados éticos da profissão;VIII - respeitar as opiniões de farmacêuticos e outros profissionais, mantendo as discussões no plano técnico-científico; IX - tratar com respeito e urbanidade os farmacêuticos fiscais, permitindo que promovam todos os atos necessários à verificação do exercício profissional. Desse modo, observa-se que esse artigo enfatiza a importância do respeito e da cordialidade nas relações profissionais. Assim, contrariar estas determinações pode ser prejudicial à imagem do farmacêutico, e a depender do caso, poderá até mesmo incidir em crimes previstos no Código Penal, como os de calúnia, injúria e difamação. Relações com os conselhos federal e regionais de farmácia Em relação ao artigo nº 18 do Código de Ética Farmacêutica, fica estabelecido que o farmacêutico, na relação com os conselhos, fica obrigado a: “I - observar as normas (resoluções e deliberações) e as determinações (acórdãos e decisões) dos Conselhos Federal e Regionais de Farmácia”. Essas normas e determinações são publicadas e, periodicamente, atualizadas pelas páginas eletrônicas de cada entidade. O segundo inciso desse artigo determina que é obrigatório ao farmacêutico: “prestar com fidelidade as informações que lhe forem solicitadas a respeito do seu exercício profissional”. Infringir o dado inciso poderá caracterizar crime contra a Administração Pública, de acordo conforme previsto no Código Penal. Ainda analisando o presente artigo, fica determinado que o farmacêutico também estará obrigado a: III - comunicar ao Conselho Regional de Farmácia em que estiver inscrito toda e qualquer conduta ilegal ou antiética que observar na prática profissional; IV - atender convocação, intimação, notificação ou requisição administrativa no prazo determinado, feitas pelos Conselhos Federal e Regionais de Farmácia, a não ser por motivo de força maior, comprovadamente justificado; V - tratar com respeito e urbanidade os empregados, conselheiros, diretores e demais representantes dos Conselhos Federal e Regionais de Farmácia. Em relação ao inciso III, mesmo que o profissional não tenha praticado nenhum ato ilícito ou antiético, deixar de comunicar uma infração que ocorreu sob seu conhecimento faz com que o profissional também se torne responsável por omissão, e a depender do caso, também poderá sofrer sanções administrativas ou legais. Infrações e sanções disciplinares e disposições gerais De acordo com o artigo nº 20 do Código de Ética Farmacêutica: As sanções disciplinares, definidas nos termos do Anexo III desta Resolução, e conforme previstas na Lei Federal nº 3.820/60, consistem em: I - advertência ou advertência com emprego da palavra "censura; II - multa no valor de 1 (um) salário mínimo a 3 (três) salários mínimos regionais; III - suspensão de 3 (três) meses a 1 (um) ano; IV - eliminação. As infrações foram classificadas em leves, medianas e graves. Nesse perspectiva, apresentaremos uma classificação das infrações e suas respectivas penas, conforme o anexo III da Resolução n º 596/14 do CFF: No anexo III da Resolução n º 596/2014, foi determinado que a pena de eliminação será aplicada aos que tenham sido condenados três vezes em processos de suspensão, mesmo que isso tenha ocorrido em Conselhos Regionais de Farmácias diferentes. Esse mesmo anexo também prevê a possibilidade de aplicação de mais de uma pena para o mesmo processo ético. Sendo aplicadas em situações em que diversas condutas irregulares forem praticadas pelo profissional em virtude do mesmo fato, ou seja, as penalidades podem ser aplicadas de forma cumulativa e sequencial. Há três exemplos que ilustram a situação das penas cumulativas, conforme apresentado pelo CRF-SP (CRF, 2016): a) Instauração do primeiro Processo Ético- Disciplinar pelas infrações de “Não Prestação de Assistência” e “Irregularidade em Atestado Médico”: - Não Prestação de Assistência – infração mediana Unidade 2 – Deontologia e Legislação 5º período - Farmácia 10 - Infração ao Art. 14, inciso V do Anexo I - Pena: multa de um salário mínimo regional (Art. 8º, inciso X do Anexo III) - Irregularidade em Atestado Médico – infração grave - Infração ao Art. 14, inciso XXX do Anexo I - Pena: suspensão de três meses do exercício profissional (Art. 9º, inciso XII do Anexo III) Pena cumulativa: multa de um salário mínimo regional e suspensão de três meses do exercício b) Instauração do primeiro Processo Ético- Disciplinar pelas infrações de “Fracionamento Irregular” e “Intermediação de Fórmulas”: - Fracionamento Irregular – infração mediana - Infração ao Art. 14, inciso XV do Anexo I - Pena: multa de um salário mínimo regional (Art. 8º, inciso III do Anexo III) - Intermediação de Fórmulas – infração mediana - Infração ao Art. 14, inciso XXXII do Anexo I - Pena: multa de um salário mínimo regional (Art. 8º, inciso XXVI do Anexo III) Pena cumulativa: multa de dois salários mínimos regionais. c) Instauração de Processo Ético-Disciplinar por “Irregularidade em Atestado Médico”, protocolado como justificativas de quatro ausências constatadas pela fiscalização do CRF-SP: - Irregularidade em Atestado Médico – infração grave - Infração ao Art. 14, inciso XXX do Anexo I, por 4 (quatro) vezes - Pena: eliminação (Art. 12 do Anexo III) Justificativa: A pena de eliminação é imposta aos que tenham sido três vezes condenados definitivamente à pena de suspensão por falta grave decorrentes de um mesmo processo ou em processos distintos, ainda que em Conselhos Regionais de Farmácia diversos. Para facilitar os estudos, o Quadro 6 apresenta um resumo das principais resoluções e leis apresentadas neste tópico: Apresentação No Brasil, o exercício da profissão farmacêutica passou a ter uma regulamentação legal mais específica a partir da publicação do Decreto nº 19.606 de 1931. As atividades consideradas como privativas, ou seja, que somente poderão ser exercidas legalmente pelos farmacêuticos foram definidas inicialmente pelo Decreto nº 85.878, de 7 de abril de 1981. O exercício de cada uma dessas atividades pode ser regulamentado por dispositivos próprios, seja por leis federais, decretos ou por resoluções dos Conselhos Federais e Regionais de Farmácia. O âmbito de atuação do farmacêutico começou a ser ampliado a partir da publicação da Resolução CNE/CES 2, de 19 de fevereiro de 2002 que estabeleceu novas diretrizes curriculares nacionais para o curso de graduação em farmácia. A partir dessa Resolução, foi estabelecido o que é conhecido como o “perfil generalista” do farmacêutico, que é obtido atualmente pelos cursos de graduação. Para exemplificar essa questão do perfil generalista, aqueles que se formavam antes da CNE/CES n°. 2, de 19/02/2002 tinham sua formação reconhecida pela Resolução nº 04, de 11 de abril de 1969, do Conselho Federal de Educação. Nesse caso, para atuar na área de análises clínicas, o estudante de farmácia deveria realizar um segundo ciclo de formação profissional, que lhe concederia o título de Farmacêutico-Bioquímico. Por outro lado, os que se formaram de acordo com a CNE/CES n°. 2, de 19/02/2002, não precisarão realizar este ciclo de formação adicional, e não receberão o título de Farmacêutico-Bioquímico, mas estarão habilitados a atuar em laboratórios de análises clínicas devido ao perfil generalista obtido pela nova grade curricular. O mesmo ocorre no tocante à atuação na área industrial, ou em outras. As principais atividades privativas e não privativas do farmacêutico serão discutidas, bem como alguns dos principais aspectos regulatórios que deverão ser seguidos nas respectivas áreas. Atividades privativas do farmacêutico São consideradas como atividades privativas do farmacêutico, de acordo com o Decreto de nº 85.878, de 7 de abril de 1981, as seguintes atribuições: “I – desempenho de funções de dispensação ou manipulação de fórmulas magistrais efarmacopeias quando a serviço do público em geral ou mesmo de natureza privada”. Dessa forma, o profissional que atuar na área de manipulação de fórmulas magistrais e farmacopeicas deverá estar atento às determinações da RDC nº 67/2007 da ANVISA, que regulamentou normas de boas práticas de manipulação de preparações magistrais e oficinais (farmacopeicas) para uso humano em farmácias. Esse marco regulatório constitui-se de extrema importância para a área de manipulação, pois estabelece normas que objetivaram a segurança e a qualidade das formulações magistrais. Unidade 2 – Deontologia e Legislação 5º período - Farmácia 11 Nessa RDC, foram estabelecidos critérios para a garantia da qualidade das instalações físicas e equipamentos, além de normas específicas referentes aos procedimentos e recursos humanos. As atribuições e competências do farmacêutico nessa área foram definidas e regulamentadas com mais detalhes pela Resolução nº 467, de 28 de novembro de 2007, do CFF. Em seu segundo inciso, o Decreto nº 85.878/81 também considera como atividade privativa: II - Assessoramento e responsabilidade técnica em: a) estabelecimentos industriais farmacêuticos em que se fabriquem produtos que tenham indicações e/ou ações terapêuticas, anestésicos ou auxiliares de diagnóstico, ou capazes de criar dependência física ou psíquica; b) órgãos, laboratórios, setores ou estabelecimentos farmacêuticos em que se executem controle e/ou inspeção de qualidade, análise prévia, análise de controle e análise fiscal de produtos que tenham destinação terapêutica, anestésica ou auxiliar de diagnósticos ou capazes de determinar dependência física ou psíquica; c) órgãos, laboratórios, setores ou estabelecimentos farmacêuticos em que se pratiquem extração, purificação, controle de qualidade, inspeção de qualidade, análise prévia, análise de controle e análise fiscal de insumos farmacêuticos de origem vegetal, animal e mineral. Cada um desses estabelecimentos deverá seguir regulamentações específicas, mas cabe ressaltar, em especial, para a indústria farmacêutica, a RDC nº 301, de 21 de agosto de 2019 da ANVISA, que dispõe sobre as boas práticas de fabricação de medicamentos. Para os laboratórios que produzem insumos e/ou realizam controle de qualidade em insumos farmacêuticos, é fundamental observar as disposições da RDC nº 69, de 8 de dezembro de 2014, e também a RDC nº 45, de 9 de agosto de 2012 que regulamenta os estudos de estabilidade de insumos farmacêuticos ativos. Ainda no inciso II, do Decreto nº 85.878/81, a alínea d) determina que é atribuição privativa do farmacêutico a atuação em depósitos de produtos farmacêuticos de qualquer natureza. Nessa área, é importante que o farmacêutico conheça a Resolução nº 304, de 17 de setembro de 2019 da ANVISA, que dispõe sobre as boas práticas de distribuição, armazenagem e transporte de medicamentos. Já o inciso III do mesmo Decreto considera como atividade privativa do farmacêutico “a fiscalização profissional sanitária e técnica de empresas, estabelecimentos, setores, fórmulas, produtos, processos e métodos farmacêuticos ou de natureza farmacêutica”. Assim, estabelece também em seu artigo nº 11 e inciso VII, que é um direito do farmacêutico ser fiscalizado no âmbito profissional e sanitário obrigatoriamente por outro profissional farmacêutico. O farmacêutico pode, desse modo, exigir dos órgãos públicos o cumprimento dessa regulamentação. Porém, é importante ressaltar que não poderá se negar a ser fiscalizado por outros órgãos competentes, pois existe previsão legal atribuída aos órgãos da administração pública, tais como as autoridades policiais o Ministério Público. Além dessas atividades, o Decreto nº 85.878/81 também considerou como privativas do farmacêutico, as atividades de elaboração de laudos técnicos, pericias técnico-legais relacionadas com atividades, produtos, fórmulas, processos e métodos farmacêuticos ou de natureza farmacêutica, o magistério superior das matérias privativas do curso de formação farmacêutica, e também o desempenho de outros serviços e funções não especificados, desde que se situem no domínio da capacitação técnico- científica profissional. Para facilitar os estudos, o Quadro 7 apresenta um resumo dos principais decretos e resoluções apresentados neste tópico. Atividades não privativas do farmacêutico De acordo com artigo 2º, do Decreto nº 85.878, de 7 de abril de 1981, as seguintes atividades são reconhecidas como atribuições dos farmacêuticos, mesmo que não sejam privativas ou exclusivas: I - A direção, o assessoramento, a responsabilidade técnica e o desempenho de funções especializadas exercidas em: a) Órgãos, empresas, estabelecimentos, laboratórios ou setores em que se preparem ou fabriquem produtos biológicos, imunoterápicos, soros, vacinas, alérgenos, opoterápicos para uso humano e veterinário, bem como de derivados do sangue; b) Órgãos ou laboratórios de análises clínicas ou de saúde pública ou seus departamentos especializados; c) Estabelecimentos industriais em que se fabriquem produtos farmacêuticos para uso veterinário; d) Estabelecimentos industriais em que se fabriquem insumos farmacêuticos para uso Unidade 2 – Deontologia e Legislação 5º período - Farmácia 12 humano ou veterinário e insumos para produtos dietéticos e cosméticos com indicação terapêutica; e) Estabelecimentos industriais em que se fabriquem produtos saneantes, inseticidas, raticidas, anticépticos e desinfetantes; f) Estabelecimentos industriais ou instituições governamentais onde sejam produzidos radioisótopos ou radiofármacos para uso em diagnóstico e terapêutica; g) Estabelecimentos industriais, instituições governamentais ou laboratórios especializados em que se fabriquem conjuntos de reativos ou de reagentes destinados às diferentes análises auxiliares do diagnóstico médico; h) Estabelecimentos industriais em que se fabriquem produtos cosméticos sem indicação terapêutica e produtos dietéticos e alimentares; i) Órgãos, laboratórios ou estabelecimentos em que se pratiquem exames de caráter químico- toxicológico, químico-bromatológico, químico- farmacêutico, biológicos, microbiológicos, fitoquímicos e sanitários; j) Controle, pesquisa e perícia da poluição atmosférica e tratamentos dos despejos industriais; II - Tratamento e controle de qualidade das águas de consumo humano, de indústria farmacêutica, de piscinas, praias e balneários, salvo se necessário o emprego de reações químicas controladas ou operações unitárias; III - Vistoria, perícia, avaliação, arbitramento e serviços técnicos, elaboração de pareceres, laudos e atestados do âmbito das atribuições respectivas. Mesmo que o âmbito de atuação não seja privativo, o farmacêutico ainda assim poderá estar sujeito a fiscalizações pelas autoridades competentes, e deverá observar todos os aspectos legais que regulamentam a área em que estiver atuando. Apresentação Por motivo de desinformação, alguns profissionais acabam por confundir as atribuições exercidas pelos conselhos profissionais, sindicatos e associações. Alguns acreditam que seria o papel de uma associação de classe a luta pelo direito ao piso salarial. Todavia, outros acham que ao se cadastrar em um conselho de classe, estariam ao mesmo tempo filiados às associações. Para evitar essas confusões, serão apresentados os papéis exercidos por cada uma dessas instituições. Os conselhos de classe profissionais, sejam eles definidos como conselhos federais ou conselhos regionais, são autarquias criadas por Lei federal, que lhes confere autonomia administrativa e financeira. Essas entidades têm como objetivo principal, definir os princípios de ética que deverão ser seguidos por seus profissionais, e garantir que a atuação destes profissionais respeite os princípios éticos, bem como os aspectos legais queregulamentam o exercício da profissão. Os sindicatos representam os trabalhadores no tocante aos direitos e deveres trabalhistas, buscando garantir que seus associados tenham boas condições de trabalho e remuneração. As atribuições dos sindicatos estão descritas no artigo nº 8 da Constituição Federal, e também no artigo nº 513 das Consolidações das Leis do Trabalho (CLT). As associações de classe são definidas pelo Código Civil (Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002) como entidades caracterizadas pela união de pessoas que se organizam para fins não econômicos. Sua atuação é direcionada para promoções de eventos sobre temas técnico-científicos, com o intuito de contribuir com ações de aprimoramento, formação e atualização profissional. Atribuições do conselho federal de farmácia O CFF criado pela Lei nº 3.820, de 11 de novembro de 1960, que o definiu como o “órgão supremo dos Conselhos Regionais, com jurisdição em todo o território nacional e sede no Distrito Federal”. Cabe destacar, de forma resumida, algumas das atribuições do CFF definidas pelo artigo 6º dessa lei: 1. Tomar conhecimento e esclarecer duvidas levantadas pelo Conselhos Regionais; 2. Julgar em última instancia recursos dos Conselhos Regionais; 3. Propor modificações que se tornem necessárias para regulamentar o exercício da profissão farmacêutica; 4. Promover reuniões com os Conselhos Regionais para estudo de questões profissionais de interesse nacional; 5. Ampliar o limite de competência do exercício profissional do farmacêutico; 6. Expedir resoluções para definir ou modificar atribuições ou competência dos profissionais de farmácias conforme as necessidades futuras; O plenário do CFF é formado por um conselheiro federal que é eleito para cada estado, e de seu respectivo suplente. Os conselheiros do CFF, representando os farmacêuticos de todos os estados brasileiros, se reúnem mensalmente em Brasília/DF para promover discussões e votações de resoluções abertas ao plenário. Unidade 2 – Deontologia e Legislação 5º período - Farmácia 13 Atribuições do conselho regionais de farmácia Os Conselhos Regionais de Farmácia, assim como os Conselhos Federais, são autarquias federais, que também foram criados com base na Lei nº 3.820, de 11 de novembro de 1960. As competências e atribuições administrativas dos Conselhos Regionais são definidas em seu regimento interno, que é aprovado pelo CFF. De forma resumida, algumas das atribuições dos Conselhos Regionais: 1. Registrar os profissionais de acordo com as normatizações do CFF; 2. Fiscalizar o exercício das atividades farmacêuticas, impedindo e punindo as infrações, enviando relatórios documentados às autoridades competentes quando necessário; 3. Sugerir ao CFF medidas necessárias para regularidade de serviços e fiscalização das atividades farmacêuticas e do exercício profissional. 4. Dirimir dúvidas relativas à competência e ao ambiento das atividades profissionais farmacêuticas. 5. Analisar e julgar em primeira instancia os processos de interesse da profissão farmacêutica, dentro de sua competência administrativa; 6. Promover atividades que busquem contribuir com a melhora da saúde pública, assistência farmacêutica, e que estimulem a unidade da profissão e a atualização do farmacêutico. 7. Criar seccionais e subsedes quando julgado necessário por deliberação de seu plenário.
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