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Arrastados: Os Bastidores do Rompimento da Barragem de Brumadinho, o Maior Desastre Humanitário do Brasil João Vitor Silva Gama RSEE – 2019027709 1 O livro "Arrastados: Os Bastidores do Rompimento da Barragem de Brumadinho, o Maior Desastre Humanitário do Brasil" é uma obra (de arte) que relata detalhadamente a vida de cada um dos envolvidos no rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, Minas Gerais, em janeiro de 2019. Escrita pela jornalista Daniela Arbex, e publicada pela Editora Intríseca no ano de 2022, contendo 340 páginas (incluindo capa, dedicatória e posfácio), o livro apresenta uma descrição minuciosa do cenário do derramamento de rejeito da B1, no córrego do feijão, a negligência e as falhas na gestão da Vale, empresa responsável pela barragem. A escritora caprichosamente passeia no tempo e espaço ao longo do texto, mudando também o personagem principal de cada arco, de forma que o alto nível de detalhamento dado a cada personagem reflete que as vítimas no acidente não são apenas números/estatística: cada pessoa possuía sua individualidade, sonhos, amores, etc. "Arrastados" é uma obra fundamental para o leitor empático entender as causas e as consequências do maior desastre humanitário da história do Brasil, e para refletir sobre a responsabilidade das grandes corporações e do poder público na proteção dos direitos humanos e ambientais. Com ilustrações, esquemáticos e fotos, o texto envolve o leitor em cada história, utilizando da empatia do mesmo com os personagens, para ativar sua sensibilidade com o acontecimento: o leitor vive, torce, comemora e sofre junto do personagem. Apesar de ter cerca de 340 páginas, é de uma leitura rápida, uma vez que o mesmo possui uma linguagem simples e limpa. No entanto, ao mesmo tempo que a linguagem é de fácil leitura e compreensão, ao abordar um tema tão impactante, o texto se torna indigesto, e por muitas vezes, o leitor é levado ao choro. Por ser também uma espécie de documentário sobre o rompimento da barragem de Brumadinho, o leitor pode-se utilizar da internet para complementar a leitura: como buscar na internet o vídeo do resgate histórico da major Karla Lessa que planou o helicóptero a cerca de meio metro da lama para que três pessoas fossem resgatadas com sucesso, assim como ver o antes e depois de toda a região. a) Pertinência O livro é extremamente essencial para a formação acadêmica de todo e qualquer profissional: desde o médico que tem muito a aprender com a situação de catástrofe e seus protocolos abordados no livro; engenheiros, cuja responsabilidade de servir a sociedade com base na ciência, não deve ser superposta de forma alguma pelo interesse das grandes empresas; psicólogos etc. O fato dos inúmeros pareceres de segurança feitos até um ano antes pelas empresas TUV SUD, Potamos, Alphageos indicando que o fator de segurança da barragem B1 estava aquém das normas nacionais e internacionais, mostram que a Vale não seguiu o protocolo, e pôs as vidas dos seus colaboradores em segundo plano, para manter o crescimento do lucro líquido da empresa. Isso só foi possível por uma negligência do conhecimento científico produzido. Para o nosso caso, alunos da matéria de Responsabilidade Social no Exercício da Engenharia, o texto é o retrato exato do que podemos nos deparar no futuro: um jogo de interesses no qual não podemos ceder. O vazamento dos rejeitos não foi um acidente, muito menos inevitável (os dados apresentados e a condenação da Vale comprovam). A responsabilidade de permitir que esse evento catastrófico esteve na mão de algumas poucas pessoas, que ao final da investigação, se tornaram réus dos processos (pelo fato do livro ser Arrastados: Os Bastidores do Rompimento da Barragem de Brumadinho, o Maior Desastre Humanitário do Brasil João Vitor Silva Gama RSEE – 2019027709 2 lançado em 2022, o inquérito continuou em aberto, de forma que o texto não informa resultado final dos pedidos de prisão dos envolvidos listados nos últimos capítulos). Dessa forma, a nossa responsabilidade no exercício de nossa profissão de engenheiros, deve ser pautada não somente pelo viés econômico, mas também social. A escritora utiliza dos recursos de aproximação psicológica entre o leitor e os personagens para que se desenvolva uma empatia pela situação que é benéfica nesse desenvolvimento de responsabilidade e solidificação desse sentimento necessário. b) Atualidade do tema O texto é bem dividido e começa com um contexto bem didático sobre o desastre. Em seguida, como já mencionado, relata individualmente o momento exato em que a lama interrompe a vida de cada vítima, listando-os de uma forma natural, mas enfatizando que ninguém é só um número. Por último, o desfecho encaminhado do rompimento, como indenizações socioambientais e reflexões para o futuro. “[...] Em 2015, quando o país foi palco do maior desastre ambiental de sua história, o lema adotado pelo então diretor presidente da Vale quando assumiu o cargo, dois anos depois, foi: “Mariana nunca mais.” Três anos e dois meses após o rompimento da barragem de Fundão, que matou dezenove pessoas, a cidade de Brumadinho foi manchada de minério e 272 vidas foram perdidas. De lá para cá, alterações nas leis impuseram exigências novas aos empreendedores de barragens, sobretudo no setor de mineração. Mas se o desfecho da história se repetiu é porque o enredo continuou o mesmo. Perguntei aos especialistas que entrevistei se o ciclo de tragédias se encerraria em Brumadinho. Ainda não há respostas para isso. Enquanto o modelo de negócio não mudar e a política da mineração priorizar o produto, em vez da vida humana, não haverá lugar seguro para ninguém.” (Trecho final do livro “Arrastados: os bastidores do rompimento da barragem de Brumadinho” de Daniela Arbex.) Esse trecho retrata bem a atualidade do assunto no contexto brasileiro: um responsável pela empresa já havia declarado que “Mariana nunca mais”, e pouco tempo depois, houve Brumadinho. O que garante que esse acontecimento não venha efetivamente a se repetir? A implementação da lei “Mar de Lama Nunca Mais” nº 23.291/19 também foi considerada como “lei para inglês ver”, uma vez que a lei que regulamentava a revisão do protocolo de 54 barragens pelo Brasil no prazo de três anos, só foi cumprida por três barragens. Dessa forma, o problema de segurança na lavra ainda é latente no Brasil, e extremamente recente. Enquanto a punição não for irredutível para empresa, o “projeto de desmonte” ainda será viável economicamente, assim como a Vale mostrou que o prejuízo econômico gerado foi, na verdade, um investimento, obtendo nos anos seguintes, os maiores lucros da história da empresa. c) Passagens Por ser uma leitura tão necessária e chocante, torna-se difícil definir as três passagens que mais chamaram minha atenção, uma vez que ao longo do texto acabei grifando 208 trechos pessoalmente impactantes. Elencando três dentre as várias: “[...] Elias, que barulho é esse? — indagou Sebastião olhando para todos os lados. — Acho que o pneu de um off-road estourou. Tá ouvindo? Tem gente gritando. Arrastados: Os Bastidores do Rompimento da Barragem de Brumadinho, o Maior Desastre Humanitário do Brasil João Vitor Silva Gama RSEE – 2019027709 3 Ainda não tinham entendido o que acontecia, quando, repentinamente, diante deles, vagões de carga foram levantados [...]” Esse excerto não é individualmente uma passagem que me chamou atenção. No entanto, a coletânea infindável de casos de pessoas que tiveram suas vidas ceifadas de maneira quase instantânea pela velocidade e força dos rejeitos (no alto da lavra a 108 km/h e já distante a cerca de 60 km/h), retratadas no livro, foi algo chocante. Dessa forma, esse trecho representa todos os outros trechos no qual vítimas morreram sem saber o porquê. “[...] O minério que cobria os corpos era tão denso que impediu radiografias. O filme de raio X ficou velado. Só depois delavados os cadáveres, os legistas descobriram que, ao serem arrastadas, as vítimas tinham perdido a pele que lhes dava cor. Assim, o preto, o pardo e o branco desapareceram. Todos os corpos, do operário ao diretor, tinham a mesma coloração [...]” Novamente, esse trecho me chamou atenção pela surpresa: eu não tinha noção de que isso aconteceu e isso foi chocante para mim. Ao mesmo tempo que é uma boa reflexão sobre o racismo estrutural, a informação é de uma brutalidade tremenda. Não só esse trecho relativo as condições das vítimas, mas também do fato de cerca de 920 fragmentos corpóreos correspondem a cerca de 270 pessoas (28% x 920), indicando uma mutilação múltipla de várias vítimas. Soma-se a isso o fato do IML inicialmente ligar para os familiares para informar o encontro de cada membro do desaparecido. “[...] O chefe da Tanatologia Forense estava comovido. Dauro bancaria a compra de um equipamento que custava mais de R$ 50 mil [...]” Mais uma vez, utilizarei um trecho para simbolizar a ideia por trás: a comoção nacional (e internacional) em prol do acontecimento. Médicos e dentistas de folga, de férias retornando exclusivamente para prestar apoio técnico-científico aos sobreviventes e ás famílias; funcionários recém saídos do “inferno” retornando para ajudar os colegas, doações de refeições por restaurantes, roupas íntimas, equipamentos médicos por civis e equipamentos diversos por empresas, assim como a mobilização voluntária da população atingida da região para fazer comida para os bombeiros e lavar suas roupas. Essa união em momentos de crise apesar de ser muito bonita, me entristece porque, em geral, é necessário uma crise para que ela seja expressa. Essa empatia com o próximo, mesmo das pessoas menos abastadas e ao mesmo tempo mais afetadas, me chamou atenção por sua beleza. d) Considerações finais São inúmeros os trechos impactantes nessa obra. Retrata uma história muito triste, mas ao mesmo tempo, necessária: reconhecer o problema é o primeiro passo para solucioná-lo e não o repetir. Dessa forma, reafirmo aqui a importância dessa leitura para a formação crítica profissional dos estudantes de uma forma geral. Como mencionado, durante a leitura, algumas pesquisas pontuais foram feitas para complementar visualmente o conteúdo, e por fim, pesquisas sobre a reparação da Vale, e resultado dos inquéritos criminais para verificar o “saldo” da tragédia brasileira.
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