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W BA 02 22 _V 2. 0 PSICOMOTRICIDADE E DESENVOLVIMENTO MOTOR 2 Dirceu Costa Junior São Paulo Platos Soluções Educacionais S.A 2022 PSICOMOTRICIDADE E DESENVOLVIMENTO MOTOR 1ª edição 3 2022 Platos Soluções Educacionais S.A Alameda Santos, n° 960 – Cerqueira César CEP: 01418-002— São Paulo — SP Homepage: https://www.platosedu.com.br/ Head de Platos Soluções Educacionais S.A Silvia Rodrigues Cima Bizatto Conselho Acadêmico Alessandra Cristina Fahl Camila Turchetti Bacan Gabiatti Camila Braga de Oliveira Higa Giani Vendramel de Oliveira Gislaine Denisale Ferreira Henrique Salustiano Silva Mariana Gerardi Mello Nirse Ruscheinsky Breternitz Priscila Pereira Silva Tayra Carolina Nascimento Aleixo Coordenador Giani Vendramel de Oliveira Revisor Ana Roberta Almeida Comin Editorial Beatriz Meloni Montefusco Carolina Yaly Márcia Regina Silva Paola Andressa Machado Leal Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)_____________________________________________________________________________ Costa Junior, Dirceu Psicomotricidade e desenvolvimento motor / Dirceu Costa Junior. – São Paulo: Platos Soluções Educacionais S.A., 2022. 35 p. ISBN 978-65-5356-175-5 1. Psicomotricidade. 2. Movimento humano. 3. Habilidades psicomotoras. I. Título. CDD 612.7 _____________________________________________________________________________ Evelyn Moraes – CRB 010289/O C837p © 2022 por Platos Soluções Educacionais S.A. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Platos Soluções Educacionais S.A. 4 SUMÁRIO Apresentação da disciplina __________________________________ 05 Psicomotricidade, desenvolvimento cognitivo e aprendizagem _______________________________________________________________ 07 O movimento humano ______________________________________ 23 Habilidades psicomotoras – observação e diagnóstico _______ 36 Principais distúrbios e possibilidades na prevenção e educação _______________________________________________________________ 49 PSICOMOTRICIDADE E DESENVOLVIMENTO MOTOR 5 Apresentação da disciplina A separação entre o corpo e a mente (ou alma) vem desde os antigos filósofos gregos, alguns séculos antes de Cristo. Nessa época, essa dicotomia concedia à mente um papel privilegiado, enquanto ao corpo restava apenas a função menosprezada de subserviência. Contextualizando esse período, foi uma época em que houve um grande desenvolvimento da ciência, coincidindo com o declínio dos Jogos Olímpicos da Antiguidade (quando o corpo era cultuado homenageando os deuses). Com o passar dos séculos, e muitos estudiosos debruçados sobre essa temática, percebeu-se a indissociabilidade entre corpo e mente. O “novo” entendimento de que eles se conectam, influenciando um ao outro, sinaliza agora com mais veemência. Conforme o poeta romano Juvenal associou ambos no final do séc. I: “mens sana in corpore sano”, ou traduzindo, “mente sã num corpo sadio”. Nesse cenário, surgem diversas ciências que se baseiam nesse ser humano “unificado”, como é o caso da Educação Física e da Psicologia. Dentre essas possibilidades, uma ciência se destaca — a Psicomotricidade. Compreendendo essa ciência por meio de suas diversas manifestações como uma abordagem educacional, uma intervenção hospitalar ou, ainda, uma terapia holística, comprovadamente eficiente (principalmente, mas não só, com o público infantil), esta disciplina é apresentada com o objetivo de oportunizar aos alunos, de diversas áreas, um maior aprofundamento sobre esse tema. 6 Serão abordados alguns conceitos, as principais características, além de algumas das aplicações práticas da Psicomotricidade e suas relações com o desenvolvimento motor, não objetivando abranger completamente este assunto, mas, sim, despertar o interesse para seu aprofundamento e servir de ponto de partida para discussões e reflexões sobre este relevante tema. 7 Psicomotricidade, desenvolvimento cognitivo e aprendizagem Autoria: Dirceu Costa Junior Leitura crítica: Ana Roberta Almeida Comin Objetivos • Contextualizar a área da Psicomotricidade. • Relacionar as experiências motoras com o desenvolvimento cognitivo. • Apresentar alguns conceitos sobre a aprendizagem. 8 1. Psicomotricidade A palavra Psicomotricidade, em uma análise etimológica, une a palavra grega psyché (refere-se à alma, espírito ou mente) com a palavra motricidade, que é uma derivação da palavra latina motor (que desloca, que faz mover). Nesse sentido, a formação da palavra seria algo que misturasse o corpo em movimento com a atividade mental, permitindo uma tradução que relacione a movimentação corporal e sua intencionalidade. A Associação Brasileira de Psicomotricidade (ABP), entidade de maior representatividade no Brasil, define a Psicomotricidade como sendo um “movimento organizado e integrado, em função das experiências vividas pelo sujeito cuja ação é resultante de sua individualidade, sua linguagem e sua socialização”. Por apresentar um conteúdo transdisciplinar, com contribuições científicas oriundas de diversas áreas como a Filosofia, a Psicologia, a Neurologia, a Pedagogia, entre outras, existem diversos significados para Psicomotricidade, mas sempre se referindo aos aspectos motor, intelectual e socioemocional. Dentre essas diversas definições, podemos destacar uma clássica, de Ajuriaguerra (1970, p.19), que afirma que a Psicomotricidade “[...] é a ciência do pensamento através do corpo preciso, econômico e harmonioso”, ou uma mais atual, de Barreto (2000, p.19), que aborda a psicomotricidade como “[...] a integração do indivíduo, utilizando, para isso, o movimento e levando em consideração os aspectos relacionais ou afetivos, cognitivos e motrizes”. 9 1.1 Percurso da Psicomotricidade A trajetória da Psicomotricidade, desde o seu surgimento até a atualidade, pode ser acompanhada por meio de alguns momentos importantes na história. Esses marcos apresentam, também, diversos estudiosos que contribuíram de alguma forma para a caracterização do que hoje entende-se por psicomotricidade. Dos berços europeus (especificamente franceses), até sua introdução e primeiros passos no Brasil, é possível seguir esse desenvolvimento pela ordem cronológica dos eventos: • Final do século XIX: Phellipe Tissié, um neuropsiquiatra francês, usou pela primeira vez o termo para nomear a região específica do cérebro encarregada por unir as funções do pensamento com as funções motoras (região do córtex frontal do cérebro). • 1870: o vocábulo aparece no discurso neurológico pela necessidade de explicar algumas patologias que não seguiam a lógica anterior que sempre relacionava um sintoma com uma área específica lesionada. • 1909: o neuropsiquiatra e professor francês Ernest Dupré expôs que a debilidade motora não precisava, necessariamente, ter relação com algum problema neurológico. • 1925: Henry Wallon, filósofo, médico, psicólogo e político francês, evidencia a relação existente entre o movimento humano, o afeto, as emoções e seus hábitos. • 1935: o francês Edouard Guilmain, famoso neurologista, apresentou um exame diagnóstico psicomotor. • 1947: Julian de Ajuriaguerra, psiquiatra e professor francês, delimitou com clareza os transtornos psicomotores, balizando-os entre os neurológicos e os psiquiátricos. 10 • 1968: iniciam-se os primeiros cursos dentro das universidades brasileiras de Graduação e, principalmente, de Pós-Graduação. • 1970: diversos profissionais começam a trazer da Europa os principais conceitos e práticas sobre Psicomotricidade com foco no corpo de um sujeito e sua relação entre a afetividade e a emoção (nitidamente perceptível à divisão entre as abordagens reeducativae terapêutica). • 1976: a francesa Françoise Désobeau, fonoaudióloga e terapeuta corporal, trouxe para o Brasil uma diferente abordagem desenvolvida por ela, que substituía as técnicas instrumentais por jogos e brincadeiras. • 1980: é fundada, no estado do Rio de Janeiro, a Sociedade Brasileira de Terapia Psicomotora (SBTP); alguns anos depois, em 1986, o nome foi modificado para Sociedade Brasileira de Psicomotricidade (SBP), e, em 2005, tornou-se a Associação Brasileira de Psicomotricidade (ABP). • 2012: na Assembleia Geral da ABP, instituiu-se o dia 29 de abril como o Dia do Psicomotricista. • 2019: a Psicomotricidade foi regulamentada no Brasil por meio da Lei Federal nº 13.794. Diversos outros fatos e muitos outros personagens participaram – e ainda participam – dessa construção da jovem ciência psicomotora. Entretanto, nem todas as ações são apresentadas claramente, por exemplo, alguns cursos e intervenções psicomotoras realizadas especificamente para pessoas com deficiência, por vezes apresentados com outros nomes; ou o professor de Educação Física e psicólogo francês Jean Le Bouch, um dos maiores estudiosos da área, que utiliza em diversos trabalhos o termo psicocinética. 11 1.2 Desenvolvimento psicomotor O desenvolvimento psicomotor refere-se às contínuas transformações do movimento humano ao longo da vida, em harmonia com o aperfeiçoamento social e cognitivo. Essa maturação, que se inicia logo após a concepção, acontece desde a sua fase não consciente, por meio dos movimentos reflexos, até a fase consciente, em que os movimentos passam a ser influenciados por outros indivíduos e pelo ambiente. Nesta fase, a motricidade relaciona-se ao cognitivo e começa a contemplar sentido e significado, possibilitando a capacidade de expressar as emoções e demonstrar as descobertas. Em um primeiro momento, os conhecimentos adquiridos referem-se ao próprio corpo e, em seguida, a interação com outros indivíduos e as situações experimentadas no meio onde vivem levam a reconhecer seu corpo em relação aos outros (pessoas e objetos) e sua relação em um espaço (ambiente); permitindo descobrir a si mesmo e o mundo ao seu redor. Esse desenvolvimento compara-se ao desenvolvimento biológico, paralelamente às funções motoras, cognitivas, perceptivas, afetivas e sociais. O psicólogo Henry Wallon é conhecido como o responsável pela visão científica da Psicomotricidade ao contribuir com informações fundamentais sobre o desenvolvimento neurológico do recém-nascido e da evolução psicomotora da criança. Ele propõe alguns estágios para esse desenvolvimento psicomotor, não de forma linear e sequencial, mas com os estágios posteriores aumentando e reestruturando os anteriores. Ele afirma, ainda, que é possível caracterizar a mudança de estágio por meio de um tipo diferenciado de comportamento, conforme é apresentado no Quadro 1. 12 Quadro 1 – Características dos estágios conforme a idade Estágios Idade Características Impulsivo-emocional Recém-nascido Reflexos Tônico-emocional 6 aos 12 meses Emoções Sensório-motor 1 a 2 anos Postura Projetivo 2 a 3 anos Eu corporal Personalismo 3 a 6 anos Símbolos Categorial 6 a 11 anos Praxias Adolescência A partir de 11 anos Reflexão Fonte: adaptado de Wallon (1981). Estágio impulsivo-emocional: predomínio afetivo. Interação com o meio pela emoção. Adaptações ao meio via reflexos (sucção, preensão palmar). Reações puramente fisiológicas (espasmos, contrações). Estágio tônico-emocional: passagem da desordem gestual para as emoções diferenciadas (já expressa medo e alegria). Movimentos ainda são bem desorientados. Relações com o meio via “cumplicidade afetiva” (a criança solicita e precisa da troca afetiva para o seu equilíbrio psicofisiológico). Estágio sensório-motor: a inteligência predomina e é dividida em inteligência prática (obtida pela interação do corpo com os objetos) e inteligência discursiva (conquistada por meio de imitação e consequente apropriação da linguagem). A ação precede o pensamento. Exploração do meio (ampliada após a conquista do andar). Estágio projetivo: surgimento da inteligência simbólica. Conhece o objeto pela interação com ele (via mobilidade intencional). Exterioriza o ato mental por meio de gestos, projetando os pensamentos em movimentos. Estágio de personalismo: predominância afetiva (período crítico na formação da personalidade, dá-se por meio de interações 13 sociais). Período de intenso intercâmbio social (com muita imitação, representação de papéis e trocas de amizades). Consciência de si (imagem própria). Crise de oposição. Estágio categorial: predominância da inteligência (capacidades mnemônicas e atenção voluntária) sobre as emoções. Aumento do interesse para o conhecimento e pelo mundo exterior (transmitindo suas relações com o meio). Idade da razão (idade escolar) e do “desmame afetivo”. Estágio adolescência: predominância afetiva (caracterizada por diversos conflitos internos e externos, levando à crise da puberdade). Período marcado pela busca de autoafirmação e pelo desenvolvimento da sexualidade. O reconhecimento da consciência de si mesmo no tempo, levando ao desenvolvimento das responsabilidades. 2. Experiências motoras As experiências vividas por cada indivíduo têm papel importante no seu desenvolvimento de maneira geral. As experiências motoras trazem percepções corporais e sensoriais que permitem ao homem um conhecimento melhor de si e da forma como se relaciona com o mundo ao seu redor, conforme explana o filósofo francês Merleau-Ponty (1999, p. 195) ao afirmar que “[...] a experiência motora do nosso corpo não é um caso particular de conhecimento; ela nos fornece uma maneira de ter acesso ao mundo e ao objeto [...]”. Para o filósofo, o processo cognitivo só ocorre por meio da corporeidade, demonstrando, assim, a importância das experiências motoras, quer seja pelos movimentos corporais ou pela utilização dos órgãos sensoriais. Portanto, quanto maior for a diversificação 14 e a qualidade dessas vivências, maiores serão as oportunidades de aprendizado e desenvolvimento. Conforme os anos passam, as pessoas vivenciam diversas mudanças e transformações em si mesmas. Além desse crescimento, em uma perspectiva morfofisiológica, há também um aprimoramento motor, cognitivo, emocional e social, permitindo seu desenvolvimento e seguindo uma linha que parte do simples para o complexo. Durante esse processo, essas modificações definem a maturidade biológica do indivíduo. O processo de maturação biológica se dá de forma distinta entre as pessoas. Ainda que se observe um grupo de mesma faixa etária, diferentes estágios dessa evolução serão identificados. No decorrer do processo, o indivíduo torna-se apto a aprender coisas novas e a executar novas tarefas. A maturação biológica diz respeito aos progressos físico e cognitivo do indivíduo relacionando-os com a idade cronológica. Matsudo e Matsudo (1991, p. 18) definem a maturidade biológica como um “[...] processo que irá levar a um completo estado de desenvolvimento morfológico, fisiológico e psicológico, e que necessariamente, tem controle genético e ambiental”. Existem algumas formas de aferir o nível de maturidade em que a pessoa se encontra, por exemplo, analisando a maturação dos dentes, por meio da maturação somática (como o Pico de Velocidade de Crescimento em estatura – PVC) ou, ainda, pela invasiva avaliação da maturação sexual, quando são observadas as características sexuais secundárias do adolescente. a idade esquelética também é um parâmetro bem confiável, embora utilize equipamentos caros. 15 3. Desenvolvimento cognitivo Algumas capacidades mentais são responsáveis pela forma como percebemos, compreendemos e interagimos com o mundo. Esse processo mental que envolve principalmente as ações de pensar, compreender, raciocinar, imaginar, prestar atenção, memorizar e aprender é chamado de cognição. Matlin (2004, p. 2) define que a cognição “[...]descreve a aquisição, o armazenamento, a transformação e a aplicação do conhecimento”. Esse conjunto de capacidades cerebrais é importante para a aquisição de conhecimento durante toda a vida. O desenvolvimento dessas competências mentais segue desde a infância até os últimos dias de vida da pessoa. As etapas desse desenvolvimento ficam mais perceptíveis durante a infância, pois a jovem mente vazia começa a entrar em contato com as diversas informações desse “novo mundo”, como se fosse o disco rígido de um computador novo quando se inicia a gravação de arquivos nele. Durante o desenvolvimento cognitivo, existem dois processos fundamentais para que ocorra a construção do conhecimento, que são a assimilação e a acomodação. Na assimilação, a pessoa tenta organizar e adaptar as novas informações (motoras, sensoriais e conceituais) de novas experiências por meio da similaridade com as estruturas cognitivas já possuídas anteriormente. Ao receber novos estímulos externos, diferenciando as novas informações daquelas já existentes previamente, é necessária a criação de novas estruturas cognitivas, surgindo então a acomodação. Seguindo essa premissa, o psicólogo suíço Jean Piaget, ao observar o desenvolvimento de algumas crianças, começando por seus próprios filhos, sugere a possibilidade de dividir o desenvolvimento em quatro períodos, os quais chamou de estágios: sensório-motor; pré-operacional; 16 operacional-concreto; e operacional-formal; cada um deles diferenciado por características específicas e associado a determinadas faixas etárias. Essa faixa etária é apenas uma referência e não uma diretriz rija; todas as pessoas passam por essas quatro fases, mas, não necessariamente na mesma idade cronológica, principalmente pelas diferenças biológicas e pela qualidade dos estímulos recebidos. • Estágio sensório-motor (de 0 a 2 anos) – É a fase da percepção e do movimento, é o período que os recém-nascidos substituem seus reflexos inatos (como o de sucção, por exemplo) pelos movimentos coordenados rudimentares. Nesse período, a criança centraliza-se no próprio corpo, não é capaz de realizar imagens mentais e sua inteligência prática (por meio de seus atos) permitirá o surgimento do pensamento. • Estágio pré-operacional (de 2 a 7 anos) – Nessa fase, há predominância do pensamento egocêntrico (só conseguem ver as coisas pelo seu próprio ponto de vista), do raciocínio transdutivo (quando usam a mesma explicação em situações semelhantes), da irreversibilidade (não entendem o processo inverso do que veem) e do animismo (dá vida a seres inanimados). Ainda nesse período, acontece o desenvolvimento da linguagem, além da utilização de imagens mentais e dos jogos simbólicos. • Estágio operacional-concreto (de 7 a 11 anos) – Nesse terceiro momento, a criança é capaz de entender o processo inverso do que vê (reversibilidade), de fazer análises lógicas, de realizar classificações e seriações simples e de concentrar-se mais. Momento também em que há a diminuição do egocentrismo, levando a uma maior colaboração, empatia e mais respeito com os outros, além da participação em grupos. • Estágio operacional-formal (a partir de 11 anos) – O jovem que se encontra nesse período está apto a realizar as operações lógico-matemáticas, sem utilização de artigos concretos e criando 17 conceitos e ideias. Apresenta, portanto, o pensamento formal abstrato, que lhe permite realizar todos os processos de aporte mental. 4. Aprendizagem O conhecimento passa por diversas modificações, com momentos em que existem algumas associações. Após outras informações, ocorrem as acomodações. O processo de aquisição ou transformação desse conhecimento é a aprendizagem. Aprendizagem é uma função mental que ocorre quando há alguma modificação permanente no conhecimento, nas habilidades e nas competências ou nos valores e nas atitudes, por meio de observações, estudos ou experiências. É importante para as pessoas que querem aprender e, principalmente, vão mediar esse aprendizado, conhecer as principais características da aprendizagem, pois existem diversos fatores que podem auxiliar ou atrapalhar todo esse processo. Para que aconteça o processo da aprendizagem, são necessários cinco importantes fatores: a sensação (estruturas sensoriais que conectam o ser humano ao mundo); a percepção (conscientizar-se da sensação em progresso e da formação das imagens); a memorização (armazenamento de informações posteriormente utilizadas); a atenção (foco no objetivo de aprendizagem, ignorando outros estímulos dispersivos) e a motivação (interesse e diferenciação dos aspectos que estimulam e determinam a busca pela aprendizagem). A aprendizagem pode ser analisada sob diferentes perspectivas, por exemplo, utilizando suas diferentes abordagens, como apresentaremos a seguir, a partir de suas tradicionais concepções. Além destas, muitas 18 outras perspectivas já foram estudadas e aplicadas e, cada vez mais, surgem novos olhares e, assim, enfoques são apresentados. 4.1 Concepções behaviorista, cognitivista e humanista A concepção behaviorista, também conhecida como comportamentalista, baseia-se nas alterações de comportamento, em que o objetivo são que as respostas aos respectivos estímulos se tornem automáticas. O professor busca alterar comportamentos por meio de reforços (padrão de consequências). Ele atua com metas predeterminadas, baseadas em apenas uma realidade, visando estabelecer, cada vez mais rápido, a sequência: sugestão, comportamento e consequência. A ideia principal é condicionar o comportamento do aluno por repetição de estímulos. Nessa abordagem, a avaliação deve ser fundamentada em critérios predeterminados. A concepção cognitivista baseia-se no processo de pensamento, relacionando-o com mudanças no comportamento – nesse caso, as alterações comportamentais aparecem apenas como indicador da aprendizagem do aluno. Os alunos aprendem a fazer alguma coisa, todos do mesmo jeito (podendo não ser o melhor modo de fazê-la), criando, assim, um comportamento consistente entre si. Eles são passivos com relação à interpretação da realidade, embora tenham participação ativa ao adotar novas formas de comportamento. A aprendizagem concentra-se na transmissão do processo de pensamento do estudante e usa simulações para abordar situações da vida real. O professor, nesse caso, apresenta o modelo mental que o 19 aluno deve seguir, o processo de pensamento do aluno e a sucessão de atividades de aprendizagem visando alcançar as metas almejadas. A concepção humanista tem o foco em preparar o aluno para a resolução de problemas em situações distintas, partindo do pressuposto de que todas as pessoas usam suas experiências para construir a própria perspectiva do mundo. Nela, o aluno interpreta a realidade externa usando, para isso, suas experiências individuais. O professor leva em consideração a opinião e o conhecimento prévio do aluno para oportunizar a ele atividades de aprendizagem apropriadas que o ajudarão na construção do seu próprio conhecimento. Ele avalia o aluno pelo seu desempenho (podendo incluir a autoavaliação). 4.2 Aprendizagem e desenvolvimento A aprendizagem está diretamente ligada ao desenvolvimento. Quando acontece a aprendizagem, por intermédio de outras pessoas ou do meio, há a construção do conhecimento. Ao ser construído esse conhecimento, a pessoa passa dessa etapa para a próxima, gerando, assim, o desenvolvimento. Durante todo o desenvolvimento, existem diversos fatores que influenciam a aprendizagem. Como já visto, as habilidades psicomotoras recebem influências de outras habilidades, principalmente cognitivas e motoras. Além disso, existem outros fatores que também podem influenciar, como as interferências socioculturais. 4.3 Influências sociais e culturais Baseado no princípio de que o ser humano é um ser social, pois é frágil demais para sobreviver sozinho (está inserido em diversos grupos sociais, como família,amigos, comunidades religiosas, colegas 20 de trabalho, vizinhos, dentre outros), percebe-se que recebe várias influências do meio onde está. Diversas dessas influências atuam sobre a aprendizagem e o desenvolvimento, dentre elas podem ser observadas algumas, como carência afetiva, condições sanitárias, privações lúdicas e culturais, ambientes repressivos, relações interfamiliares ou métodos inadequados de ensino-aprendizagem. Na prática, essas influências podem ser percebidas por meio de interferências em qualquer etapa no processo de aprendizagem (sensação, percepção, memorização, atenção e motivação). Pensando nas influências sociais a que todos são submetidos, o educador psicomotriz precisa atentar para, além de evitar ou minimizar as influências que podem atrapalhar a aprendizagem, aproveitar e utilizar as influências positivas para auxiliar e facilitar o aprendizado. Outro fator de influência importante na aprendizagem diz respeito às influências culturais. Toda a cultura existente no grupo em que se está inserido também interfere no desenvolvimento. É possível perceber, por exemplo, culturas nas quais as mulheres não têm direito à educação escolar, ou os países onde a dedicação escolar é evidenciada com maior ênfase; nos grupos que têm acompanhamento de adultos fora da escola, outros não; grupos que estudam diferentes horas por dia; grupos que acompanham ensalamentos conforme a faixa etária ou aqueles que escolhem qual atividade realizar naquele momento, dentre diversos outros. Mais um ponto relevante para destacar é em relação às tradições, com culturas em que apenas uma estratificação social tem direito ao estudo, ou onde o estudo é realizado dentro da escola, ou é feito por meio de histórias sob a responsabilidade dos mais velhos. Esses e outros fatores 21 também precisam de um olhar cuidadoso, principalmente em uma época cada vez mais globalizada. Dando o ponta pé inicial nos estudos sobre o desenvolvimento psicomotor, percebe-se a importância de conhecer os processos da aprendizagem, suas principais características e possíveis influências, que atuam diretamente no indivíduo, levando em consideração, principalmente, seu desenvolvimento cognitivo, suas experiências motoras e a relação existente entre eles. O psicomotricista é um profissional que utiliza os conhecimentos do desenvolvimento psicomotor para educar, reeducar e realizar tratamentos de pessoas. Seus principais locais de atuação na área da educação são: as escolas; creches e escolas especiais para pessoas com deficiência. Na área da saúde são: clínicas multidisciplinares; hospitais: postos de saúde; e consultórios. Além destas duas grandes áreas, existem ainda algumas empresas que atuam no ramo de consultorias, e uma boa quantidade de pesquisas sobre este tema também são realizadas. Destaca-se aqui o público infantil em fase de desenvolvimento, pessoas com alguma deficiência (sensorial, motora ou cognitiva), familiares de pacientes, pessoas que necessitam de reinserção social e/ou de reabilitação motora. Referências AJURIAGUERRA, Julian. Manual de psiquiatria da criança. Paris: Masson, 1970. ABP. Associação Brasileira de Psicomotricidade. Disponível em: http:// psicomotricidade.com.br/. Acesso em: 10 fev. 2022. BARRETO, Sidirley de J. Psicomotricidade, educação e reeducação. Blumenau: Acadêmica, 2000. http://psicomotricidade.com.br/ http://psicomotricidade.com.br/ 22 BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Departamento de Atenção Básica. Saúde da criança: acompanhamento do crescimento e desenvolvimento infantil. Brasília: Ministério da Saúde, 2002. Disponível em: http:// bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/crescimento_desenvolvimento.pdf. Acesso em: 8 fev. 2022. LE BOULCH, Jean. O desenvolvimento psicomotor: do nascimento até 6 anos: a psicocinética na idade pré-escolar. Porto Alegre: Artmed, 1992. MATLIN, Margaret W. Psicologia cognitiva. São Paulo: LTC, 2004. MATSUDO, S. M. M.; MATSUDO, V. K. R. Validade da auto-avaliação na determinação da maturação sexual. Revista Brasileira de Ciência e Movimento, Taguatinga, 5, p. 18-35, 1991. Disponível em: https://portalrevistas.ucb.br/index.php/rbcm/about/ contact. Acesso em: 8 jun. 2022. PONTY, Maurice M. Fenomenologia da percepção. São Paulo: Martins Fontes, 1999. SHUMWAY-COOK, Anne; WOOLLACOTT, Marjorie. Controle Motor: Teoria e Aplicações Clínicas. Barueri: Manole, 2010. WALLON, Henri. Psicologia e educação da infância. Lisboa: Estampa, 1981. 23 O movimento humano Autoria: Dirceu Costa Junior Leitura crítica: Ana Roberta Almeida Comin Objetivos • Introduzir conceitos básicos sobre o movimento humano. • Caracterizar o córtex motor e o cerebelo. • Apresentar a relação deles com os movimentos da fala, da escrita e da leitura. • Mostrar as possíveis influências que podem afetar os movimentos. • Compreender o processo que envolve as habilidades dos movimentos. 24 1. Compreendendo o movimento humano Nosso corpo está constantemente se movimentando, desde a primeira espreguiçada pela manhã, passando por movimentos que executamos sem prestar muita atenção nos detalhes, como quando nos banhamos ou caminhamos, até os movimentos mais complexos, como aprendendo uma nova coreografia de dança. O corpo, inclusive, realiza diversos movimentos enquanto dormimos, por exemplo, nosso coração batendo ou o músculo do diafragma que continua atuando, mantendo nosso movimento respiratório ativo. O movimento pode ser dividido em três tipos diferentes de acordo com o nível de controle motor: movimento automático, movimento involuntário e movimento voluntário (GALLAHUE; OZMUN; GOODWAY, 2013). O movimento voluntário é aquele consciente e planejado, realizado com intenção e de forma controlada. Esse movimento se inicia na fase de planejamento (mental), passando pela fase tática até chegar na fase de execução (movimento propriamente dito). Do cérebro (especificamente na região denominada córtex motor), parte o comando em forma de impulso nervoso, que passa pela medula espinhal até chegar no músculo. Esse sinal, na configuração de um estímulo elétrico, é transmitido a partir de um motoneurônio, às fibras musculares, realizando, então, a contração muscular. Importante lembrar que essa via córtex-espinhal é um caminho de mão dupla, pois, ao mesmo tempo que a informação enviada para a efetivação da contração vai até o músculo, este também “devolve” outro tipo de informação referente à realização do movimento. Essa informação vinda do músculo, juntamente com outras informações de propriocepção, informações vestibulares e estímulos ambientais, baseiam o controle desse movimento, refinando-o. A partir dessa 25 comparação do movimento idealizado com o movimento realizado, é possível fazer os alinhamentos e ajustes necessários com o objetivo de tornar o gesto mais preciso. Após diversas execuções realizadas, alguns movimentos não utilizam mais a fase de planejamento na área pré-motora, são os movimentos automáticos. Tornando-se automatizado, este movimento forma um programa motor, que nada mais é que uma via neuromuscular que se repete quase automaticamente quando recebe o mesmo estímulo. Ao estabelecer esse programa motor, o tempo entre a idealização e a realização do movimento, torna-se mais curto e essa comunicação torna- se mais intensa. Um bom exemplo disso é o caminhar, tão complexo nos primeiros passos, mas, quando adulto, é realizado juntamente com outras atividades, sem pensar nele, e ainda possibilita outras formas de realização (de trás, de lado, com um pé só etc.). Já o movimento involuntário ocorre no nível medular, sem contato com o córtex, sem a necessidade de acioná-los conscientemente. São os movimentos reflexos, que por meio de órgãos sensoriais intramusculares ou subcutâneos, “geram” informações que vão para a medula e, voltam desta diretamente para o músculo, como nos casos de controle postural e retirada rápida de segmentos agredidos. Diversosdestes movimentos correspondem ao funcionamento normal do corpo, como os batimentos cardíacos, por exemplo, porém, existem outros que podem ser prejudiciais para a pessoa, como o caso da doença degenerativa conhecida como Mal de Parkinson. Na área educacional, o foco principal é o tipo de movimento intencional. O movimento pretendido é, portanto, planejado e coordenado no nível cortical, depois é transmitido via medula espinhal e, na sequência, é executado nos músculos desejados. O sistema neuromotor transforma sinais elétricos em físicos e químicos para gerar o movimento, enquanto o sistema nervoso sensorial capta as informações externas e as utiliza 26 para regular o movimento. Ele pode ser dividido em central e periférico, sendo que o primeiro ocorre dentro do crânio e da coluna vertebral. 2. Vias motoras Na realização dos movimentos voluntários, aqueles intencionais, o estímulo motor percorre o caminho desde a decisão de realizar o movimento (no cérebro) até a contração do músculo (na célula muscular). Este trajeto (a via motora) passa pela medula espinhal, utilizando as células nervosas que se unem à fibra muscular, em um encontro conhecido como junção neuromuscular. Todo este complexo processo acontece de forma muito rápida, e pode ser dividido nas fases de planejamento, programação, execução e controle (KANDEL; SCHWARTZ; JESSEL, 2014). No planejamento motor, mesmo se o movimento for iniciado pela decisão da pessoa (ativação da área suplementar) ou por uma decisão de estímulos externos (ativação da área pré-motora), primeiro, são definidos os grupos musculares que serão acionados, o grau da contração muscular e a velocidade adequada deste movimento. Esta diferença na decisão do movimento pode ser observada no exemplo de uma pessoa resolver olhar para trás (decisão da pessoa) ou olhar para trás por escutar determinado barulho (decisão por estímulos externos). Após a definição desta “imagem motora”, a fase de programação contribui com uma filtragem na seleção do movimento e informações do meio externo, permitindo que os sinais de comando sejam enviados. Na fase de execução do movimento, o estímulo enviado já contém todas as características necessárias para que a informação chegue no músculo e realize o movimento. A partir deste momento, na fase de controle do 27 movimento, são recebidas informações do ambiente e internas do corpo para que ajustes sejam feitos durante a realização do movimento. Vale lembrar que, para a tomada de decisão na realização do movimento, ele deve ser aprendido anteriormente para que haja a escolha, a realização e o ajuste de forma mais adequada. As experiências motoras prévias, juntamente com as informações transmitidas pelos órgãos do sentido, é que definirão a melhor forma de selecionar tal movimento. Para exemplificar, pense como você passaria por um obstáculo, como atravessar uma poça de água sem molhar os pés – dentre diversas opções, você pode optar por pisar na água, saltar, dar a volta, passar encostando apenas uma parte dos pés ou colocar algum objeto que sirva de apoio. Caso você não saiba saltar ou andar apoiando sobre uma parte dos pés, estas opções já seriam excluídas de suas alternativas. Todas as informações do ambiente também são utilizadas nessa decisão, como você observar que não há espaço para dar a volta, ou que o chão está com características visuais aparentando estar escorregadio, despriorizando arriscar um pulo. 3. Córtex motor e cerebelo Todos os órgãos do sistema nervoso são fundamentais para a nossa sobrevivência, embora, para o entendimento da Psicomotricidade, devemos ter mais atenção ao encéfalo, mais precisamente em uma região do cérebro conhecida como córtex motor e com o órgão cerebelo. O córtex motor é responsável principalmente pelos movimentos voluntários e o cerebelo, por sua vez, responde ao controle e regulação desses movimentos. Além de movimentos básicos como andar, correr e saltar, por exemplo, existem outros movimentos que também são planejados e afinados no 28 encéfalo e que são de extrema importância para a educação e para o desenvolvimento humano, como os movimentos de falar, ler e escrever. 3.1 O córtex motor O córtex motor (Figura 1) é uma região do cérebro responsável por diversos processos mentais, principalmente pela linguagem e pelo processamento de informações. Ele pode ser subdividido em três áreas, as quais contribuem com as funções motoras (KANDEL; SCHWARTZ; JESSEL, 2014), são elas: • O Córtex Motor Primário é a região responsável pela produção de movimentos voluntários de todo o corpo e é capaz de enviar um estímulo para contrair um grupo de músculos (para realização de um determinado movimento) através de apenas um só neurônio. • O Córtex Pré-Motor, também conhecido como Córtex de Associação Motora, é a área responsável pela coordenação dos movimentos mais complexos. Aqui são criados padrões de movimento com funções específicas (programas motores) que são enviados ao córtex motor primário, e deste para os músculos. Responsável pela organização dos movimentos e pelos movimentos mais exteriores. • Área motora suplementar que funciona junto com o córtex pré-motor para realizar os movimentos posturais e de fixação (posicionamento ereto da cabeça e estabilização dos olhos). Opostamente, diferente do córtex pré-motor, essa área é a responsável pelos movimentos mais internos e também pela promoção dos movimentos bilaterais. 29 Figura 1 – Área do córtex motor (em vermelho) Fonte: MedicalArtInc/iStock.com. 3.2 Movimento da fala Conforme Le Boulch (1992), para a realização do movimento da fala, o córtex motor primário envia impulsos com informações referentes à vocalização, que dizem respeito aos movimentos na face, priorizando lábios, língua e mandíbula. A área Broca é conhecida como o centro da fala, região do cérebro próxima ao córtex motor primário, sendo responsável pela ativação das cordas vocais a partir do controle respiratório. Esse controle da 30 passagem de ar, visando emitir sons de forma organizada, é realizado a partir da contração muscular da laringe. A participação dessas duas regiões do cérebro, ativando harmoniosamente a contração dos músculos ligados ao som e a fala, juntamente com outra região no cérebro responsável pela escolha das palavras, é que permite as pessoas se comunicarem através da fala. Para falar é necessário, além dessa iniciativa motora, a decisão comportamental (além disso ainda sofre a influência da emoção). Nessa ação, algumas habilidades psicomotoras atuam diretamente na construção e execução da fala, como a coordenação motora e a noção espaço temporal, pois, para falar é necessária uma sequência espacial (as palavras são apresentadas de forma ordenada e sucessiva) e temporal (utilização do ritmo para pronunciar palavras e frases). A parte do cérebro que usamos para falar (sistema pré-motor medial) é diferente da usada para cantar, ou emitir sons ritmados (sistema pré- motor lateral). Por isso, as pessoas com gagueira são capazes de cantar sem nenhum problema como na sua fala. 3.3 Movimento da escrita No movimento da escrita, a principal fonte de estímulos está ligada às áreas do córtex pré-motor e área motora suplementar, que respondem pelos movimentos de rotação da cabeça, movimento ocular (voluntário), pela área das habilidades manuais (movimentos das mãos e dos dedos), escolha de palavras e fixação ocular. Pode-se dizer que a escrita é a representação gráfica da linguagem, portanto, para representar a linguagem por meio de símbolos, antes, é necessário ter desenvolvido essa linguagem e sua pronúncia satisfatoriamente. Após este processo, entendendo que a escrita é um aprendizado motor, concentra-se esforços no aprendizado motor imerso 31 na dissociação da mão e dos dedos, no ritmo e constância do traçado, na orientação da esquerda para a direita e no controle tônico (segurar o lápis). Outros fatores que também influenciam nessemomento de comunicação gráfica dizem respeito à percepção e representação espacial. Nosso modo de leitura ocidental (da esquerda para a direita e de cima para baixo), variou entre as épocas e os locais, não sendo unanimidade. Por exemplo os árabes e os hebreus liam da direita para a esquerda; já os chineses e os japoneses liam de cima para baixo. A relação direta entre linguagem oral e linguagem escrita também não pode ser esquecida, pois dificilmente a pessoa terá propriedade para conseguir escrever algo que ela não sabe como se fala corretamente, não cabendo neste caso atrelar tal dificuldade à algum problema de movimento. 3.4 Movimento da leitura Na leitura, os principais movimentos envolvidos são os mesmos da escrita, com exceção das habilidades manuais das mãos e dos dedos. Da mesma forma, como descreve Le Boulch (1992), a forma de leitura horizontalizada da esquerda para a direita, exige além da lateralidade e orientação espaço-temporal bem desenvolvida, a coordenação do movimento de cabeça e, principalmente dos olhos. Também importante na leitura, o ritmo tem destaque, pois a nossa leitura é baseada na sequência de sílabas e o entendimento é margeado pela pontuação. 32 Antes de ser um bom escritor, o indivíduo precisa ser antes um bom leitor, permitindo-se ter acesso ao desenvolvimento da linguagem, a partir de uma gama de vocabulários e diferentes formas de escrita. Existe uma lesão conhecida como ataxia cerebelar, em que a pessoa com esse comprometimento apresenta dificuldades na coordenação dos movimentos da fala e caminha cambaleando, exatamente igual uma pessoa alcoolizada. Como o excesso de álcool também afeta o cerebelo (e os neurotransmissores que enviam e recebem suas informações) as características são semelhantes, tanto que é muito comum, quando, em dúvida sobre a embriaguez da pessoa, solicitarem para que façam testes de equilíbrio, como andar sobre uma linha ou fazerem o “4”, apoiando- se sobre uma só perna. 3.5 Influências socioculturais Outro fator importante, que não pode ser deixado de lado, refere-se aos estímulos recebidos pela pessoa. Uma pessoa pode não conseguir falar determinado fonema, simplesmente pelo fato de não ser comum ao seu vocabulário. Cuidado para não confundir erroneamente com um distúrbio ou uma doença que afete o sistema neuromotor. Um bom exemplo pode ser visto em norte-americanos tentando pronunciar algumas palavras com as vogais nasalizadas como o “ã” da palavra mamãe. Da mesma forma que nas aulas de Educação Física as crianças são expostas a diversos movimentos diferentes, visando a aquisição de uma gama ampla de movimentos, quanto maior a quantidade (e qualidade) de estímulos, maior será a chance de um grande repertório motor, mesmo nos casos como leitura e fala, como por exemplo, o contato com diversos livros ou com outros idiomas. 33 Vale, ainda, salientar a importância das condições mínimas necessárias (afetivas, cognitivas e sociais) para o aprendizado destes complexos movimentos, que podem ter grandes influências na sua execução. 4. Cerebelo O cerebelo é um órgão que faz parte do encéfalo e coordena as informações para o controle motor, além de ser o responsável em manter o equilíbrio e a postura do corpo. É formado pelo vermis cerebelar, que atua na postura e na locomoção e por dois hemisférios, responsáveis pela coordenação da atividade muscular voluntária e controle do tônus (KANDEL; SCHWARTZ; JESSEL, 2014). O cerebelo não é capaz de estimular diretamente a contração muscular, mas consegue manter a sequência contínua do movimento e, sua função principal, acompanhar e ajustar o movimento, de acordo com as informações recebidas (principalmente visuais, auditivas, proprioceptivas e vestibulares). Como ele é responsável por coordenar as sequências complexas dos músculos esqueléticos, sua ausência (ou deficiência) impediria a realização de qualquer movimento que necessite o mínimo de habilidade, uma coordenação motora um pouco mais refinada. 4.1 Funções nas habilidades dos movimentos O cerebelo age diretamente nas habilidades dos movimentos. Essas habilidades possibilitam a melhora qualitativa dos movimentos e é essa regulação que torna o cerebelo essencial para o desenvolvimento e, consequentemente, para a aprendizagem (KANDEL; SCHWARTZ; JESSEL, 2014). 34 Esse monitoramento funciona da seguinte forma: do córtex motor primário parte uma informação para a realização de determinado movimento. Durante a realização desse movimento, o cerebelo recebe diversas informações a respeito dele: • Informações externas – visuais, auditivas e táteis, vindas dos órgãos dos sentidos. • Informações internas – vestibulares, vindas de alguns órgãos do ouvido interno e cinestésicas (propriocepção), enviadas pelos músculos e articulações que são referentes à tonicidade dos músculos e amplitude das articulações, permitindo reconhecer as posições e movimentos de seu próprio corpo, sem uso da visão. De posse de todas essas informações (mais as imagens mentais que a pessoa tem daquele movimento) e de seus objetivos, o cerebelo envia informações para possíveis correções e adequações. Podem ser enviadas informações para aumento ou diminuição da tonicidade muscular, que podem interferir na coordenação motora fina, na velocidade, na força, na amplitude, no ângulo, na direção e no sentido do movimento; buscando um movimento mais hábil. Referências FURTADO, V. Q. Relação entre desempenho psicomotor e aprendizagem da leitura e escrita. 1998. 95 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1998. GALLAHUE, D. L.; OZMUN, J. C.; GOODWAY, J. D. Compreendendo o Desenvolvimento Motor. Porto Alegre: Grupo A, 2013. KANDEL, E. R.; SCHWARTZ, J. H.; JESSEL, T. M. Princípios da Neurociência. 5. ed. Barueri: Manole, 2014. LE BOULCH, Jean. O desenvolvimento psicomotor: do nascimento até 6 anos: a psicocinética na idade pré-escolar. Porto Alegre: Artmed, 1992. MATLIN, Margaret W. Psicologia cognitiva. São Paulo: LTC, 2004. 35 SHUMWAY-COOK, Anne; WOOLLACOTT, Marjorie. Controle Motor: Teoria e Aplicações Clínicas. Barueri: Manole, 2010. STEINER, R. Andar, falar, pensar. São Paulo: Antroposófica,1994. 36 Habilidades psicomotoras – observação e diagnóstico Autoria: Dirceu Costa Junior Leitura crítica: Ana Roberta Almeida Comin Objetivos • Identificar as principais habilidades psicomotoras; • Apresentar as diferenças entre Esquema Corporal e Imagem Corporal; • Caracterizar as funções de cada habilidade psicomotora. • Entender a importância da observação do desenvolvimento psicomotor. • Conhecer o diagnóstico dos principais grupos de distúrbios de psicomotricidade. 37 1. Habilidades psicomotoras Ao atuar em qualquer área que envolve o desenvolvimento da pessoa, quer seja na educação, na saúde ou até mesmo no campo empresarial, é de extrema importância o conhecimento “do que” está sendo avaliado e posteriormente trabalhado. Nesse caso, os parâmetros são norteados pelas capacidades e pelas habilidades. No escopo da Psicomotricidade, ao entendermos como uma área multidisciplinar (principalmente envolvendo os aspectos motor, cognitivo e afetivo), percebemos que as habilidades psicomotoras se relacionam com habilidades e capacidades de outras áreas, portanto, podendo influenciar e ser influenciada por elas. As habilidades psicomotoras são aquelas que envolvem funções cognitivas e o corpo humano em movimento. São aquelas capazes de abordar não somente o “que fazer”, mas também o “como fazer”, sem nos esquecermos das socioafetivas do meio. As principais habilidades utilizadas para o desenvolvimento psicomotor são: tonicidade; lateralidade; equilíbrio; coordenação motora global; coordenação motora fina; e orientação espaço-temporal. 1.1 Tonicidade Habilidade alusiva ao tônus muscular, à tensão dos músculos; controla duas funções do músculo: encurtamento (contração) e alongamento (relaxamento).Em alguns casos, um problema pode fazer com que essa tensão seja menor que o normal (hipotonia) ou maior que o normal (hipertonia). Influencia diretamente no desenvolvimento da pessoa, pois a tonicidade de alguns músculos é responsável por manter o equilíbrio e a postura da pessoa. Em outros músculos, essa habilidade pode intervir no controle tônico dos movimentos, agindo diretamente na coordenação motora. 38 Essa tonicidade muscular é muitas vezes associada a um comportamento psicológico. Essa correlação é apresentada tanto na forma de expressar os sentimentos, assim como na maneira que os sentem, como nas pesadas expressões, fortes batidas ou imposição firme da voz, usadas para demonstrar braveza ou seriedade, comparando com a voz suave, leves carícias e movimentos faciais amenos, ao querer demonstrar a sensação de paz, calmaria e tranquilidade. 1.2 Lateralidade Essa habilidade constantemente é confundida com o conhecimento cognitivo de direita e esquerda, mas ela transcende essa ideia. É baseada na realização de movimentos com os dois lados do corpo (juntos ou separados), mesmo com o domínio de um lado sobre o outro. Essa dominância lateral (que define a pessoa, aproximadamente após os seis anos, como destro ou canhoto) é controlada pelo hemisfério cerebral (predominância do hemisfério direito, domínio motor do lado esquerdo e vice-versa). Estudos realizados com fetos e recém-nascidos trazem evidencias de comportamentos que mostram um desempenho melhor de um lado do corpo comparado ao outro, que sugerem que a dominância lateral pode começar no início do desenvolvimento humano (SOUZA; TEIXEIRA, 2011). Pessoas que não tenham um bom desenvolvimento nessa habilidade, alteram também sua noção espacial e podem ter prejuízo em qualquer atividade que utilize localização e direcionamento. Quando a pessoa usa indiscriminadamente os dois lados do corpo, não tendo predominância de um deles, é chamada de ambidestra. A ambidestria é considerada um transtorno, e esse desequilíbrio no corpo pode trazer grandes problemas no futuro, por exemplo, maior propensão para distúrbios de déficit de atenção e hiperatividade. 39 Aqueles que possuem essa habilidade bem desenvolvida são capazes de realizar movimentos harmoniosos usando os dois lados do corpo, como carregar uma bandeja com as duas mãos, ou realizar um movimento eficiente de toque, no voleibol. 1.3 Equilíbrio Existem dois tipos de equilíbrio: o estático (parado) e o dinâmico (em movimento). Nessa habilidade, busca-se manter a sustentação do corpo sobre uma base reduzida, usando uma combinação adequada de ações musculares. Essas ações são controladas pela visão e pela propriocepção. É também a responsável pela posição bípede e, consequentemente, pelo desenvolvimento da locomoção. A nossa forma de caminhar, o andar bípede, é baseado em uma sequência de equilíbrio e desequilíbrio. O corpo está em equilíbrio quando é capaz de controlar as forças externas e as forças internas, buscando a manutenção de posturas e de posições. Essa busca pelo equilíbrio motor, também representa a mesma busca pelo equilíbrio do pensamento. Essa habilidade é utilizada juntamente com a tonicidade e a lateralidade no equilíbrio estático e acrescida da coordenação motora e a orientação espaço-temporal no equilíbrio dinâmico. O corpo também recebe informações vestibulares importantes recebidas pelo labirinto, no ouvido interno, sobre o posicionamento do corpo. Quando estas informações recebidas não conversam entre si, o corpo tende a reagir demonstrando seu desconforto. Aquele mal-estar e enjoo que não raramente acontecem em viagens de navios é causado pela confusão mental gerada por diferentes informações. De um lado os olhos e as informações proprioceptivas dizendo que tudo está parado; do outro lado o labirinto, que é muito mais sensível, sentindo as 40 ondulações do mar. Esse conflito das informações é que gera incômodo para alguns navegantes. A contribuição do equilíbrio no desenvolvimento cognitivo e no desenvolvimento das outras habilidades psicomotoras é fundamental, sobretudo por alterar a perspectiva quando a criança se senta, engatinha, depois ao ficar de pé e principalmente ao andar. O desenvolvimento da afetividade também se escora nessa fase com este importante marco que traduz a conquista da independência. 1.4 Coordenação motora (global e fina) Essa habilidade corresponde à coordenação dos movimentos corporais. Pode ser dividida em global (também chamada de grossa) e fina. Na coordenação motora global, são utilizados grandes músculos para fazerem grandes movimentos e, apesar de ser importante a harmonia no movimento, não necessita de muita precisão nos mesmos. Como exemplo, podemos citar o andar ou o pular. Diferentemente da coordenação motora fina, que utiliza pequenos músculos para realização de atividades específicas, usando a precisão para a realização do movimento de forma eficiente. O desenhar e o pintar são alguns exemplos de movimentos que utilizam a coordenação motora fina. Fonseca (2008, p. 457) caracteriza a coordenação motora como uma “[...] organização preparatória da periferia motora, de modo a garantir a otimização da sua condutibilidade seletiva” e diz ainda, sobre esse processo de coordenação que ele “[...] opera antes da própria resposta motora, organizando as vias de condução que ligam o centro à periferia, a intenção à ação propriamente dita”. 41 1.5 Orientação espaço-temporal Como é possível perceber pelo nome, a orientação espaço-temporal é a habilidade que permite a pessoa a se orientar adequadamente em relação ao espaço e ao tempo. À orientação espacial é atribuída a noção de direita/esquerda, frente/atrás, acima/abaixo e todas as informações que oriente a pessoa em relação ao ambiente em que ela se contra; também se refere à condição de um objeto ou uma pessoa em relação a outro em determinado local. Já a orientação temporal tem como base o entendimento do antes/ agora/depois, manhã/tarde/noite, além de intervalos de tempo, como segundos/minutos/horas/dias/semanas. Pode-se dizer que a pessoa que tem essa habilidade aprimorada consegue perceber seu corpo em relação ao espaço e ao tempo. A orientação espaço-temporal é também a habilidade responsável pelo ritmo, que se caracteriza por mudanças de contração e relaxamento, relacionando como tempo. Encontra-se dentro dessa habilidade, principalmente, pela noção de duração e sucessão. 2. Esquema corporal A habilidade psicomotora chamada de esquema corporal, compreende o conhecimento do corpo (em partes e inteiro) e suas possibilidades de movimento, as suas funções; além de conhecer os gestos motores das partes do seu corpo e suas diversas combinações, também abrange a finalidade de seus movimentos. Um dos pesquisadores que estudaram e se posicionaram em relação à essa habilidade foi Jean Piaget, que destaca que a construção desse esquema corporal passa por três fases distintas: 42 • Corpo vivido (até 3 anos) período em que a criança começa a se conhecer e a conhecer o mundo – nessa fase, a criança ainda se percebe como parte do meio, como sendo uma coisa só. Isto acontece a partir da sua interação, de suas vivências e a partir de atividades instintivas. • Corpo percebido (3 a 7 anos) a criança nessa faixa etária começa a perceber seu corpo e diferenciá-lo do ambiente. Nesse período, seu corpo começa a tonar-se um ponto de referência para que possa se organizar no espaço e no tempo. • Corpo representado (7 a 12 anos), quando afirma que o jovem já é capaz de projetar seu ponto de referência fora do seu corpo, no ambiente. Mantém um domínio corporal mais apurado. A imagem corporal passa a ter movimento (próximo aos 10 anos) e a ser antecipatória. 3. Imagem corporal Entende-se por imagem corporal o conceito que cada pessoa tem do seu corpo, mas, representado em formato de imagem, uma imagem mental. Essa imagem é criada mentalmente pela pessoa, mas sofre interferênciadas informações externas, vindas de toda a sociedade em que está inserido e da maneira de como a pessoa se vê, vê o mundo ao se redor e principalmente de como essa pessoa se vê nesse mundo que o rodeia. Quando a pessoa tem uma visão irreal de como é seu próprio corpo, acaba criando uma distorção da sua imagem corporal, o que pode levar a quadros de distúrbios alimentares (como a bulimia, a vigorexia e a anorexia nervosa) e distúrbios comportamentais (como a depressão e a baixa autoestima). A autoestima está ligada diretamente à imagem corporal, pois ela nada mais é que a valoração (negativa ou positiva) da satisfação que a pessoa tem de si mesma. 43 Diversos fatores trazem para essa imagem corporal uma dinâmica constante de modificações; eles podem ser fatores intrínsecos ou extrínsecos. Como exemplos de fatores intrínsecos, podemos usar algumas alterações no corpo como engravidar, emagrecer ou amputar algum membro. Já para exemplificar os fatores extrínsecos, temos alterações de padrões de beleza da sociedade ou uso de adornos como uso de joias, trajes e acessórios. A influência de todo o ambiente sociocultural em que a pessoa está inserida, com o acréscimo de alguns fatores afetivos (como humor, sentimentos, emoções) impactam essa representação mental que fazemos criando nossa imagem corporal. Esse ponto de referência criado permite que a pessoa “analise” seus movimentos antes de serem realizados, viabilizando o pensamento e a projeção em sua mente da execução do movimento. 4. Observação do desenvolvimento psicomotor Ao falarmos da aplicação da psicomotricidade nos âmbitos educacional e terapêutico, devemos atentar-nos para o fato de existirem diversas abordagens teóricas e práticas que podem ser utilizadas. Em sua grande maioria, são atividades direcionadas ao desenvolvimento das habilidades psicomotoras que se deseja abranger. No caso educacional, busca-se o desenvolvimento completo e correlacionado de todas as habilidades psicomotoras. Entretanto, nos casos de intervenção terapêutica ou de reeducação, é necessária a realização do diagnóstico para conhecer a real necessidade de intervenção, para, então, realizá-la. Antes do diagnóstico e da intervenção, vem a fase de observação. Veremos, portanto, as principais 44 características da observação e dos diagnósticos no desenvolvimento psicomotor. Para observar qualquer tipo de desenvolvimento, precisa-se saber quais as etapas (ou fases ou estágios) passa a progressão de determinado contexto. No contexto da Psicomotricidade, existe a peculiaridade que dificulta um pouco mais, a qual diz respeito à transdisciplinaridade, e o fato de as habilidades interferirem umas nas outras. A observação é o passo anterior ao diagnóstico. Importante também lembrar que existe uma grande discussão sobre a observação e a interpretação. É comum escutarmos que para relatar uma observação, deve-se fazê- la da maneira que foi visualizada, não havendo a interpretação do observador. No entanto, alguns autores, como o filósofo Norwood Russell Hanson em sua obra Observação e Interpretação, levantam o questionamento sobre a existência de uma interpretação antes da observação, baseados na premissa de que o observador já traz consigo diversas informações que podem “influenciar” sua observação. Existem diversos instrumentos para avaliar as habilidades psicomotoras e saber como está o desenvolvimento, mas não se deve analisar qualquer competência isoladamente. Dentre os principais instrumentos, podemos destacar: • O teste de imitação dos movimentos dos braços, das mãos e dos dedos. • O teste DAP (Draw a person), em tradução livre do inglês teste do “Desenho de uma Pessoa”, utilizado com o objetivo de avaliar o esquema corporal. • A Bateria Neuropsicológica Luria-Nebraska (que formatou escalas para as funções motoras, o ritmo, as funções táteis, as funções visuais, a linguagem receptiva e expressiva, a escrita e a leitura, a aritmética, a memória e os processos intelectuais). 45 • A APM (Avaliação Pré-escolar de Miller). • A VMI (Teste do Desenvolvimento da Integração Viso-Motora), como o nome já diz, avalia a associação das habilidades visuais com as habilidades motoras, conhecida como coordenação visomotora, principalmente em crianças. Uma bateria de testes psicomotores muito utilizada é a Bateria Psicomotora (BPM), de Fonseca (1995). Ela classifica o perfil psicomotor em: • Apráxico, quando há realização imperfeita, incompleta e descoordenada; pode indicar dificuldade de aprendizagem. • Dispráxico, quando a realização é satisfatória (porém, com dificuldade de controle). • Eupráxico, com realização adequada e controlada; não apresenta dificuldades na realização. • Hiperpráxico, quando a realização é perfeita, harmoniosa e controlada; é característica da pessoa que tem facilidade na aprendizagem. 5. Diagnóstico dos distúrbios Identificar distúrbios psicomotores não é uma tarefa fácil, principalmente porque envolve diversos aspectos, como o motor, o cognitivo e o afetivo, relacionando-se entre si. Realizar diagnósticos em alterações nessas habilidades, como ritmo, lateralidade e atenção, requer cuidado, pois é preciso ter uma visão da pessoa como um todo, ampliando a perspectiva em todos os aspectos envolvidos. Grünspun (1980) classifica esses aspectos em alguns grupos: 46 Instabilidade psicomotora: apresenta-se quando a pessoa não consegue fixar-se em uma tarefa devido à falta de controles psíquicos e motores. Essa agitação apresentada é comumente confundida com a hiperatividade. A pessoa com esse distúrbio pode ser reconhecida pelo conjunto de características motoras que demonstra uma pessoa desajeitada e com falta de coordenação motora, com problemas no equilíbrio, com contração muscular contínua e aparência apática. Também apresenta características psíquicas como falta de atenção e de concentração, dificuldades na comunicação, na percepção, na formulação de conceitos e no pensamento abstrato. Essa instabilidade intelectual acompanhada de uma instabilidade emocional (como impulsividade, explosões e sensibilidade) e de problemas no sono (como terror noturno e movimentos durante o sono), levam a dificuldades escolares. Debilidade psicomotora: são perturbações motoras relacionadas à paratonia e à sincinesia. A paratonia é uma rigidez muscular que aparece em duas ou quatro extremidades do corpo, limitando movimentos de braços, pernas, mãos e pés. A pessoa não consegue relaxar um músculo por vontade própria, dando a impressão de que o movimento está bloqueado. Na sincinesia, alguns músculos participam em movimentos que não são necessários. São características desse distúrbio: descontinuidade e imprecisão dos movimentos; problemas na linguagem; tremores nos lábios, pálpebras e dedos; dificuldades com a coordenação motora e comprometimento na atenção; afetividade; e intelectualidade. Outras características marcantes são os hábitos manipuladores, como enrolar o cabelo ou chupar os dedos, sonolência acima do normal e enurese (noturna e até diurna). Esses problemas motores, cognitivos e de afetividade levam ao isolamento social e a dificuldades com a disciplina e a aprendizagem. Inibição psicomotora: pode ser percebida quando há falta de movimento ou ele é inibido. Apresenta as mesmas características da debilidade psicomotora acrescida de ansiedade constante. É possível ver 47 a pessoa com a cabeça baixa, sobrancelhas franzidas e com problemas de conduta. Diferente dos outros tipos, as pessoas com inibição psicomotora gostam de situações novas e de trabalhar em grupos. Lateralidade cruzada: aparece quando a dominância de olhos, ouvido, pés e mãos não se apresenta do mesmo lado do corpo, o que leva à deformação do esquema corporal. As pessoas com a lateralidade cruzada podem apresentar fadiga constante e acima do normal, distúrbios do sono e problemas na coordenação (pessoa desajeitada e com quedas frequentes) que podem levar a problemas de linguagem.A atenção instável e a intranquilidade comprometem a leitura e a escrita. Imperícias: possui inteligência normal, embora apresente frustação por não conseguir realizar algumas atividades que envolvam a coordenação motora fina. Caracteriza-se por movimentos rígidos, tornando a pessoa desajeitada com uma letra irregular e esbarrando e quebrando objetos. Essa rigidez muscular aumenta a fadiga. Referências AJURIAGUERRA, J.; MARCELLI, D. Manual de psicopatologia infantil. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991. CRENITTE, Patrícia A. P. et al. Estudo piloto de adaptação da bateria neuropsicológica luria-nebraska para crianças (LNNB-C). Psicopedagogia, v. 28, nº 86, São Paulo, 2011. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S0103-84862011000200002. Acesso em: 10 mar. 2022. FONSECA, V. Desenvolvimento psicomotor e aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 2008. GALLAHUE, D. L.; OZMUN, J. C.; GOODWAY, J. D. Compreendendo o Desenvolvimento Motor. Porto Alegre: Grupo A, 2013. GRÜNSPUN, H. Distúrbios psicossomáticos na criança. Rio de Janeiro: Atheneu, 1980. HANSON, N. R. “Observação e interpretação”. Filosofia da ciência. São Paulo: Cultrix/Edusp, 1975. 48 KANDEL, E. R.; SCHWARTZ, J. H.; JESSEL, T. M. Princípios da Neurociência. 5. ed. Barueri: Manole, 2014. LE BOULCH, J. O desenvolvimento psicomotor: do nascimento até 6 anos: a psicocinética na idade pré-escolar. Porto Alegre: Artmed, 1992. LUNDY-EKMAN, Laurie. Neurociência: fundamentos para a reabilitação. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2000. MATLIN, Margaret W. Psicologia cognitiva. São Paulo: LTC, 2004. PETROSKI, Edio Luiz; PELEGRINI, Andreia; GLANER, Maria Fátima. Motivos e prevalência de insatisfação com a imagem corporal em adolescentes. Ciência e Saúde Coletiva, 17 (4), p. 1071-1077, 2012. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ csc/v17n4/v17n4a28.pdf. Acesso em: 10 mar. 2022. PIAGET, J. Seis estudos de psicologia. 24. ed. São Paulo: Forense Universitária, 2002. SOUZA, R. M.; TEIXEIRA, L. A. Sobre a relação entre filogenia e ontogenia no desenvolvimento da lateralidade na infância. Psicologia: Reflexão e Crítica, v. 24 (1), p. 62-70, 2011. Disponível em: https://www.scielo.br/j/prc/a/ YtyCBFH9BVKwBvrSc9ZvNmd/?lang=pt. Acesso em: 8 jun. 2022. WALLON, H. As origens do caráter na criança. São Paulo: Nova Alexandria, 1995. 49 Principais distúrbios e possibilidades na prevenção e educação Autoria: Dirceu Costa Junior Leitura crítica: Ana Roberta Almeida Comin Objetivos • Entender a relação entre o ato motor e a representação mental. • Conhecer as praxias e as gnosias. • Identificar e caracterizar as agnosias e dispraxias. • Caracterizar a psicomotricidade enquanto ferramenta da educação. • Mostrar a importância da psicomotricidade na prevenção. • Conhecer algumas intervenções práticas na educação. • Compreender o papel do educador na intervenção psicomotora. 50 1. Ato motor e representação mental O ato motor é passado ao ato mental por meio do reconhecimento do próprio corpo e das sensações, percepções e movimentos resultantes das experiências vividas. A motricidade dá início à representação mental. Para que seja formada essa imagem mental, faz-se necessária a recepção de diversas informações intra e extra corporais. Após a aquisição dessas informações, a pessoa realiza simultaneamente o gesto e a representação mental. O gesto é uma projeção de suas ideias, em que a pessoa age ao mesmo tempo que projeta a imagem mental. No período seguinte, o ato mental projeta o ato motor. O ato é planejado mentalmente (no córtex motor) e o estímulo é enviado (através da medula) ao músculo, para que este realize a contração, objetivando o ato motor. Logo, o ato motor realiza-se por imagens mentais, e para que isso aconteça, é necessário receber dados corretos intracorporais (parietais) e extracorporais (occipitais e temporais). Só́ depois o córtex motor induzirá as unidades motoras a atuarem e produzirem o ato motor. Do exposto, pode-se, então, afirmar que o sistema psicomotor do ser humano pensa antes de agir. Ao realizarmos qualquer movimento, diversos neurônios no córtex motor são ativados e geram uma pequena corrente elétrica. Como ficam em uma região do cérebro superficial, é possível medir e até utilizar essas correntes elétricas. Essa tecnologia já está sendo utilizada para o desenvolvimento de produtos que utilizam a interface cérebro- computador, como braços robóticos e cadeiras de rodas, que podem ser movidos usando apenas o cérebro. 51 2. Praxias e gnosias Compreendendo agora o ato motor e a representação mental, acrescentando ainda a importância dos estímulos perceptivos sensoriais, é possível perceber suas diferenças e como estão conectados. Por meio da relação do corpo com o meio, organizam-se as funções cerebrais superiores ou funções cognitivas superiores, responsáveis principalmente pela consciência, pela tomada de decisões e pelos comportamentos. As principais funções são: a atenção; a orientação; a memória; a linguagem; o cálculo; a abstração; o raciocínio lógico; as praxias; e as gnosias. Observam-se, nesse momento, as duas últimas funções, que são adquiridas (não nascemos com ela) e requerentes de aprendizagem (não é um processo automático do nosso corpo): gnosias e praxias. Por exemplo, o movimento de agarrar uma bola, que não nascemos sabendo, mas aprendemos e reconhecemos o que fazer. Gnosia são as atividades organizadas da percepção sensorial. Quanto mais vezes se repete, mais se consolida e maior é sua capacidade de análise dos estímulos, caracterizando os estímulos mais fortes. Também é conhecida como o “saber reconhecer”. As gnosias podem ser dos tipos: • Gnosias simples – intervenção de apenas um estímulo perceptivo: como a gnosia auditiva (referente à análise de sons, ruídos e músicas); a gnosia visual (reconhecimento de cores e formas); a gnosia tátil (informações adquiridas através da pele, principalmente da ponta dos dedos) e a gnosia olfativa (tipos correspondentes – incluindo a percepção sensorial térmica e vibratória). • Gnosias complexas – intervenção de mais de um estímulo perceptível: gnosia viso-espacial (reconhecimento de formas geométricas e planas; unindo um estímulo visual e outro de atividade muscular); gnosia tátil complexa (combina estímulos táteis com os musculares e mais os cinestésicos). 52 Praxia é a capacidade de realizar qualquer movimento intencional coordenado (anteriormente aprendido) de forma satisfatória, objetivando um fim ou determinado resultado. Pode ser entendida como o “saber o que fazer” e o “como fazer”. A praxia compreende dois aspectos: o aspecto motor, que é a ação, o movimento que pode ser observado e o aspecto cognitivo (e perceptivo) que é aquele que não pode ser observado, por se tratar de um processo mental que já está internalizado. Ela envolve três processos básicos: a ideação, o planejamento e a execução. 3. Dispraxias e agnosias Por conta de uma disfunção cerebral, uma lesão, uma deficiência física, ou até por causa de dificuldades emocionais, a pessoa pode apresentar algum transtorno. Quando atingem as praxias e as gnosias, são chamadas respectivamente de dispraxias e agnosias, como veremos em seguida. 3.1 Dispraxias – Transtornos psicomotores A dispraxia é uma disfunção motora neurológica (sem lesão) que impossibilita o cérebro de desempenhar os movimentos corretamente. Também é conhecida como “síndrome do desastrado”, pois, dentre seus sintomas mais aparentes estão a falta de coordenação motora, a falta de percepção tridimensional e problemas no equilíbrio, o que leva à dificuldade na execução de movimentos coordenados e na organização espacial. As pessoas dispráxicas não conseguem realizar e nem imitar ações simples de maneira satisfatória. Existem diversos tipos de transtornos psicomotores, dentre os quais destacam-se: 53 • A dispraxia motora: apresentada pelas dificuldades com o esquema corporal e atraso na organizaçãomotora (como vestir ou comer). Também pode estar associada à lentidão, imprecisão e dificuldade no planejamento de movimentos simples. • A dispraxia espacial: quando há uma desorganização do gesto, do esquema corporal e das relações com o espaço. Apresenta dificuldades de seriação (colocar em determinada ordem) e classificação, além de problemas na utilização de conceitos (como alto e baixo ou dentro e fora). • A dispraxia postural: problema na postura, gerando movimentos sem ritmo e sem muito controle. • A dispraxia verbal: afeta o desenvolvimento da linguagem, gerando um déficit na fala, podendo ser fonológico e/ou fonético, ou no programa motor da fala. 3.2 Agnosias – Transtornos da percepção Agnosia é a incapacidade de reconhecer as impressões sensoriais, quando a pessoa pode ver ou sentir um objeto, mas não pode nomeá- lo (em casos que a pessoa não possui demência grave ou algum tipo de retardo). A pessoa com agnosia ainda tem a função sensorial intacta. Podem ser realizados diversos testes no diagnóstico dos transtornos de percepção, por exemplo, entregar um objeto (comum) para uma pessoa com os olhos fechados e pedir para que ela nomeie o objeto (em caso de falha, caracteriza agnosia somatossensorial). Ou tocar alguma parte do corpo da pessoa que, com os olhos fechados, deve dizer qual parte está sendo tocada (em caso de insucesso, esta pessoa possui “extinção tátil”). Existem outros tipos de agnosias e todos eles vão se referir à dificuldade no reconhecimento de algo: 54 • A agnosia visual: incapacidade de reconhecer objetos por meio da visão. • A agnosia auditiva: incapacidade de reconhecer sons. • A agnosia tátil: incapacidade de reconhecimento por meio do tato. • A agnosia aperceptiva: incapacidade de lembrar informações sobre os objetos. • A simultagnosia: incapacidade de reconhecer vários objetos ao mesmo tempo. • A agnosia associativa: incapacidade de nomear e saber o uso de objetos. • A prosopagnosia: incapacidade de reconhecer rostos. Conhecendo alguns processos psicomotores e entendendo algumas possibilidades que podem afetar diretamente este desenvolvimento, torna-se possível visualizar a importância da intervenção psicomotriz, facilitando o entendimento de “onde”, “como” e “porquê” é necessária sua utilização. 4. A Psicomotricidade enquanto prevenção Ao trabalharmos a psicomotricidade na fase adequada, estamos ao mesmo tempo educando a pessoa em relação às habilidades psicomotoras propriamente ditas e também subsidiando essa pessoa para que seja capaz de realizar seu desenvolvimento em todas as esferas educacionais. Importante ressalta aqui que, além das possibilidades de problemas psicomotores, também devem ser levados em consideração os diversos problemas associados. 55 É possível realizar a intervenção em Psicomotricidade de diversas maneiras e utilizando diversos métodos. A prática pode ser realizada de diferentes formas possíveis, combinando diferentes estratégias e metodologias. A importância da educação psicomotriz é facilmente notada ao se reconhecer que as habilidades psicomotoras são básicas e fundamentais para os aprendizados pré-escolares. A criança precisa conhecer seu próprio corpo e seus movimentos, reconhecer as outras pessoas e o ambiente que está inserida, para depois poder começar a fazer as associações e conexões dos outros aprendizados. A estimulação psicomotora nessa fase pré-escolar e nos anos iniciais, realizada de forma adequada e encarada como uma formação integral, auxilia a evitar maiores problemas nas habilidades psicomotoras (que podem levar a diversos outros problemas de caráter cognitivo, motor, afetivo e social). É muito importante que esses aprendizados e essas adaptações, feitos no começo da vida, sejam estruturados de maneira correta, pois é mais fácil do que tentar corrigi-los mais adiante, quando já estão estruturados de forma não conveniente. Atuando desse modo, é possível prevenir diversas inadequações já conhecidas, como a empunhadura do lápis, que ao ser aprendida de forma inadequada, depois é de difícil correção. Apenas reforçando que nosso objetivo principal é a prática educativa. A prática terapêutica da psicomotricidade é utilizada principalmente nos casos de instabilidade postural, descoordenação motora, disgrafia, dispraxia, perturbações do esquema corporal e da lateralidade, perturbações da estruturação espacial e temporal. 56 5. Práticas e intervenções educativas em Psicomotricidade Diversas estratégias são utilizadas para atingir objetivos educativos específicos, sendo conhecidas como práticas educativas. Elas acontecem nos mais diferentes contextos, podendo ser encontradas dentro ou fora da escola e aplicadas por profissionais da Pedagogia ou não (como treinadores e maestros). Ao optar por intervenções com explanações ou debates, disciplina indutiva ou coerciva, estilo indulgente ou negligente, aula teórica ou prática, estilo punitivo ou de recompensa, assume-se determinada prática educativa. Por essas (e outras) escolhas não serem todas dialéticas e poderem ser montadas em diversas combinações, criam- se diversas possibilidades de intervenção. Em uma mesma aula, um educador pode agir de formas diferentes de acordo com o aluno, o grupo ou a situação. A intervenção em Psicomotricidade pode-se dividir em dois componentes: instrumental (com maior fundamentação cognitiva e neuropsicológica, centrado nas situações-problema, com descoberta guiada, pensamento divergente e exploração da verbalização) e relacional (focado no componente psicoafetivo e relacional, em um diálogo tónico-emocional, explorando o corpo, em uma comunicação não verbal). Em psicomotricidade, a maioria das intervenções é baseada no lúdico, especificamente nos jogos, favorecendo os objetivos afetivo-sociais seja durante as aulas ou fora delas (nas chamadas “sessões psicomotoras”). Além disso, existem características específicas de acordo com a faixa etária ou o objetivo pretendido, observe: 57 • Na educação no nível infantil, a busca pelo conhecimento e a organização do esquema corporal permanecem; a criança continua usando seu corpo para buscar novas experiências e, aos poucos, vai formatando sua imagem corporal, conhecendo as possibilidades e os limites de seu corpo e criando sua noção do mundo. Nesta fase, o educador deve criar condições para que o aluno possa vivenciar todas as habilidades psicomotoras e desenvolvê-las, assumindo a função de um facilitador. • Na atividade em grupo, realizada principalmente na dinâmica escolar, pode haver duas situações: a atividade individualizada, mas realizada em grupo, na qual o grupo influencia os movimentos dos alunos (principalmente afetivamente), embora a realização do exercício não dependa de outra pessoa (por exemplo, todos alunos jogando bolas para cima e agarrando-as, cada um com a sua). Ou a atividade pode ser coletiva, obrigatoriamente havendo interação entre os participantes (assim como todos os alunos participando de um jogo de voleibol). Le Boulch (1987) apresenta que, nesse contexto, é possível perceber algumas atitudes socioafetivas como organização, comunicação, cooperação, liderança, rivalidade e agressividade. • Referente à atenção (na verdade, na falta dela), sabe-se que pode ser causada por vários motivos. No caso específico da Psicomotricidade, o foco é no que Wallon (1925) chamou de “instabilidade psicomotora”, que é a falta de controle das reações impulsivas. As atividades espontâneas (mesmo com mínimo estímulo) geram uma resposta motora ou verbal que deveria ser ajustada por uma função de controle; a dificuldade nesse equilíbrio é que apresenta essa instabilidade. • Na leitura e na escrita, como aprofundado no tema 5, estão envolvidas as habilidades psicomotoras de coordenação dos movimentos da cabeça, dos olhos, das mãos e dos dedos, além 58 da lateralidade, da orientação espaço-temporal, do ritmo e do controle tônico. • Na matemática, a abstração lógico-matemática
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