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S Definição A injúria renal aguda (IRA) é uma síndrome clínica caracterizada por declínio abrupto da taxa de filtração glomerular (TFG) suficiente para diminuir a eliminação de produtos nitrogenados (ureia e creatinina) e outras toxinas urêmicas. Isso tem sido tradicionalmente referido como insuficiência renal aguda (FRA); porém, nos últimos anos, um esforço tem sido feito para implementar o termo injúria renal aguda e desenvolver uma definição padronizada de IRA. (NORRIS, 2021) O indicador mais comum de LRA é azotemia, ou seja, acúmulo de escórias nitrogenadas (ureia, ácido úrico e creatinina) no sangue e redução da taxa de filtração glomerular (TFG). (NORRIS, 2021) O termo “lesão renal aguda” descreve um declínio rápido da função renal, que ocorre dentro de poucas horas ou 1 dia (NORRIS, 2021) Ao contrário da doença renal crônica (DRC) e da insuficiência renal crônica (IRC), a LRA é potencialmente reversível quando os fatores desencadeantes podem ser revertidos ou eliminados antes que tenha ocorrido lesão irreversível do rim. (NORRIS, 2021) LRA é causada por condições que provocam perda aguda da função renal (NORRIS, 2021) Uma definição proposta para IRA, por exemplo, é um declínio da função renal em 48 horas demonstrado por aumento na creatinina sérica de mais que 0,3 mg/dL, um aumento na creatinina sérica de mais de 50% ou desenvolvimento de oligúria (JOHNSON, 2016) Epidemiologia A lesão renal aguda (LRA) representa um problema de saúde pública mundial com altas taxas de morbimortalidade, além de apresentar altos custos para a saúde, com maior tempo de internação e possibilidade de evolução para doença renal crônica em longo prazo. (RIELLA, 2018) A mortalidade da IRA é altíssima, chegando a 90% em populações mais suscetíveis (exemplo: idosos, hipertensos, diabéticos). (SANARFLIX) A maioria dos episódios de LRA ocorre no hospital, havendo uma incidência de 20% em todos os pacientes hospitalizados e de até 50% entre os pacientes em UTI. Em contrapartida, a incidência de LRA adquirida na comunidade não é superior a 1%. (GOLDMAN, SCHAFER, 2022) Fatores de risco Insuficiência renal crônica Pessoas que já têm insuficiência renal crônica têm um risco maior de desenvolver LRA, pois seus rins já estão comprometidos e têm uma capacidade reduzida de funcionar adequadamente. Doenças cardiovascular Condições como doença cardíaca, insuficiência cardíaca congestiva, hipertensão arterial e doença arterial coronariana podem aumentar o risco de LRA. Isso ocorre porque o sistema cardiovascular está intimamente ligado à saúde renal, e problemas cardíacos podem afetar a função renal. Diabetes A diabetes é uma condição crônica que pode causar danos aos vasos sanguíneos dos rins, prejudicando sua função e aumentando o risco de LRA. Uso de medicamentos nefrotóxicos Alguns medicamentos, como certos antibióticos, anti- inflamatórios não esteroides (AINEs), alguns diuréticos e medicamentos usados para tratar o câncer, podem ter efeitos nefrotóxicos, ou seja, podem causar danos aos rins e aumentar o risco de LRA. Sepse A sepse é uma infecção grave que pode causar inflamação generalizada no corpo, incluindo nos rins. A inflamação pode afetar a função renal e levar à LRA. Desidratação A desidratação pode ocorrer por várias razões, como vômitos, diarreia, sudorese excessiva e ingestão inadequada de líquidos. A desidratação pode levar a uma redução do fluxo sanguíneo para os rins, prejudicando sua função e aumentando o risco de LRA. Cirurgia ou trauma Pessoas que passam por cirurgias de grande porte, especialmente aquelas que envolvem os rins ou o trato urinário, ou que sofrem traumas graves, têm um risco aumentado de LRA devido ao estresse físico e metabólico que essas condições podem causar aos rins. Idade avançada Idosos têm maior probabilidade de desenvolver LRA devido a mudanças naturais relacionadas à idade nos rins e a uma maior Lesão Renal Aguda prevalência de doenças crônicas, como diabetes e hipertensão arterial. Etiologia A IRA pode ser resultado de uma série de motivos que tendem a serem causados de acordo com a porção do trato urinário a qual é afetada. Por exemplo, a redução da função renal pode ter ocorrido: ou por um problema circulatório que preceda o néfron, envolvendo as arteríolas renais; ou por um problema na filtração feita por esse néfron; ou por algum distúrbio ou lesão na via coletora de urina. (RIELLA, 2018) Pronto, assim fica fácil dividirmos a IRA em três etiologias: ➢ Injúria pré-renal (60-70%) ➢ Injúria renal intrínseca (25-40%) ➢ Injúria pós-renal (5-10%) Lesão pré-renal Normalmente, os rins recebem entre 20 e 25% do débito cardíaco. Esse volume sanguíneo expressivo é necessário para que os glomérulos removam as escórias metabólicas e regulem os líquidos e os eletrólitos do corpo. (NORRIS, 2021) Felizmente, o rim normal pode tolerar reduções consideráveis do fluxo sanguíneo, antes que ocorra lesão renal. À medida que o fluxo sanguíneo renal diminui, há redução da TFG, as quantidades de sódio e de outras substâncias filtradas pelos glomérulos diminuem e a necessidade de mecanismos dependentes de energia para reabsorver estas substâncias é reduzida. (NORRIS, 2021) Quando há redução do fluxo sanguíneo renal, a arteríola aferente sofre dilatação por conta de mediadores químicos (ex.: prostaglandinas, NO, etc.) e do reflexo miogênico por conta do estímulo dos barroreceptores nesse vaso, aumentando esse fluxo. De forma sinérgica, as arteríolas eferentes sofrem contração por conta do sistema renina- angiotensina-aldosterona. Tudo isso ocorre a fim de manter a TFG. (SANARFLIX) No entanto, essa autorregulação possui certo limite: só é feita até uma pressão arterial sistólica igual a 80mmHg (SANARFLIX) Conforme a TFG e o débito urinário aproximam-se de zero, o consumo de oxigênio pelos rins aproxima-se do que é necessário para manter as células tubulares renais vivas. Quando o fluxo sanguíneo diminui abaixo desse nível (cerca de 20 a 25% do normal), começam a ocorrer alterações isquêmicas. (NORRIS, 2021) Em razão de sua taxa metabólica alta, as células do epitélio tubular são mais suscetíveis à lesão isquêmica. Quando não é tratada adequadamente, a hipoperfusão renal prolongada pode causar necrose tubular isquêmica com morbidade e mortalidade significativas. Contudo, a maioria dos pacientes que desenvolve hipoperfusão renal prolongada não tem necrose do epitélio tubular, razão pela qual o termo NTA é usado com menos frequência e o termo LRA se refere a essa patologia intrarrenal (NORRIS, 2021) Essa lesão é acompanhada por uma hipoperfusão renal com PAS < 80 mmHg, havendo integridade do parênquima renal. Ou seja, consiste num problema hemodinâmico e não no néfron (SANARFLIX) A LRA pré-renal resulta da redução da perfusão renal, isto é, de eventos que culminam em diminuição do volume circulante, como no caso de desidratação (p. ex., diarreia, vômitos, febre), sangramentos, uso de diuréticos e insuficiência cardíaca. (RIELLA, 2018) Caracteriza-se por redução da excreção urinária de sódio e de água, com elevação da osmolaridade urinária. (RIELLA, 2018) A LRA pré-renal é facilmente reversível, desde que os fatores precipitantes sejam rapidamente corrigidos. (RIELLA, 2018) Os idosos têm risco especialmente alto em razão de sua predisposição à hipovolemia e à prevalência alta de doenças vasculares renais nesta faixa etária. (NORRIS, 2021) Alguns mediadores vasoativos, fármacos e compostos utilizados com finalidade diagnóstica causam vasoconstrição intrarrenal grave e podem induzir hipoperfusão glomerular e LRA pré-renal. Exemplos são endotoxinas, contrastes radiológicos (p. ex., usados em cateterização cardíaca), ciclosporina (agente imunossupressor usado para evitar rejeição dostransplantes) e anti-inflamatórios não esteroides (AINE). (NORRIS, 2021) Os inibidores da enzima conversora da angiotensina (ECA) e os bloqueadores do receptor da angiotensina (BRA) atenuam os efeitos da renina no fluxo sanguíneo renal; quando são combinados com diuréticos, esses fármacos podem causar LRA pré-renal nos pacientes com fluxo sanguíneo reduzido em consequência de doença renal dos vasos de pequeno ou grande calibre. (NORRIS, 2021) As prostaglandinas têm efeito vasodilatador nos vasos sanguíneos renais. Os AINE podem reduzir a irrigação sanguínea dos rins por inibição da síntese das prostaglandinas. Em alguns indivíduos com perfusão renal reduzida, os AINE podem desencadear LRA pré-renal. (NORRIS, 2021) Dessa forma, as quatro grandes causas dessa lesão renal são (SANARFLIX) ➢ Depleção absoluta do fluido corporal: Conhecida também como uma redução do volume circulante efetivo, é a causa mais comum dessa injúria. Pode ser causada por hemorragia externa ou interna (choque hemorrágico em caso mais extremos), diarreia, vômitos, fístula digestiva, poliúria, sudorese intensa, perda para o terceiro espaço e uso de diurético (SANARFLIX) ➢ Vasoconstrição renal: Ocorre em situações como sepse (lesão do endotélio, liberação de mediadores inflamatórios e geração de espécies oxidativas causam tal fenômeno) e doenças hepatorrenais (patologias graves caracterizadas pela rápida deterioração da função renal por conta de cirrose ou insuficiência hepática fulminante); (SANARFLIX) ➢ Redução do débito cardíaco: Complicação de pacientes com insuficiência cardíaca congestiva, hipertensão pulmonar e infarto agudo do miocárdio; (SANARFLIX) ➢ Alterações na autorregulação: Medicamentos como AINES (anti-inflamatórios não esteroidais), IECA (inibidor da enzima conversora de angiotensina) e BRA (bloqueador do receptor de angiotensina) atuam interferindo na hemodinâmica do corpo. Esses medicamentos inibem a produção e/ou ação de mediadores como prostaglandinas (provoca vasodilatação na arteríola aferente) e angiotensina II (provoca vasoconstrição na arteríola eferente), que auxiliam o aumento de pressão por conta do aumento da TFG. (SANARFLIX) Consequência da LRA pré-renal A LRA pré-renal evidencia-se por redução aguda do débito urinário e por elevação desproporcional do nível de ureia sanguínea em comparação com a concentração sérica de creatinina. (NORRIS, 2021) Excreção percentual baixa de sódio (< 1%) sugere que a oligúria seja devida à redução da perfusão renal e que os néfrons estejam reagindo adequadamente à redução progressiva da excreção de sódio filtrado na tentativa de preservar o volume vascular. (NORRIS, 2021) Os níveis da ureia também dependem da TFG. A TFG baixa oferece mais tempo para que partículas pequenas (como a ureia) sejam reabsorvidas para o sangue. Por ser uma molécula não difusível maior, a creatinina permanece no líquido tubular e a quantidade total de creatinina filtrada, embora seja pequena, é excretada na urina. Consequentemente, também há elevação desproporcional da razão entre ureia e creatinina sérica (faixa normal de 10:1; valores anormais acima de 15:1 a 20:1). (NORRIS, 2021) Lesão renal intrínseca Em seguida, caso a IRA seja resultante de um dano estrutural no parênquima do rim por fatores intrínsecos, temos uma injúria renal intrínseca. Dentre os principais fatores que lesionam o próprio parênquima renal, temos alterações vasculares, intersticiais e glomerulares (SANARFLIX) A LRA intrarrenal frequentemente ocorre quando a hipoperfusão grave não tratada ou intratável leva a lesão celular e LRA isquêmica. (RIELLA, 2018) Lesões isquêmicas e sépticas são as principais causas. Toxinas renais, como agentes de radiocontraste e aminoglicosídeos, também podem causar danos aos túbulos direta e indiretamente (RIELLA, 2018) Sua etiologia mais comum é a lesão tubular, principalmente de origem isquêmica ou tóxica No entanto, a principal e mais frequente causa de necrose tubular aguda (NTA) é isquêmica e o seu principal fator causal tem origem pré-renal, como consequência da redução do fluxo sanguíneo não revertida, especialmente se houver comprometimento suficiente para provocar a morte das células tubulares. (REILLA, 2018) ➢ Doença vascular renal: Ocorrem por conta de obstrução do lúmen, por trombo ou êmbolo, de vasos de médio-grande calibre e/ou microvasculatura renal, ou de uma vasculite. (SANARFLIX) 1. Infarto renal decorrente de dissecção da aorta 2. Tromboembolismo sistêmico 3. Trombose aguda em veia renal 4. Anormalidade em artéria renal como aneurisma ➢ Doenças tubulares e intersticiais: Ocorre quando há um dano na estrutura tecidual e/ou celular do túbulo do néfron ou do interstício do rim (SANARFLIX) 1. Necrose tubular aguda (NTA) A lesão ou necrose tubular aguda caracteriza-se pela destruição das células do epitélio tubular com supressão súbita da função renal (NORRIS, 2021) Essa lesão aguda pode ser causada por isquemia, sepse, efeitos nefrotóxicos dos fármacos, obstrução tubular e toxinas liberadas a partir de uma infecção maciça. As células epiteliais tubulares são especialmente sensíveis à isquemia e também são suscetíveis às toxinas. A lesão tubular subsequente geralmente é reversível. (NORRIS, 2021) O rim é especialmente suscetível à lesão nefrotóxica, em razão de sua irrigação sanguínea profusa e de sua capacidade de concentrar toxinas em níveis altos na região medular do rim. (NORRIS, 2021) Os efeitos tóxicos, que causam necrose mais branda, geralmente se limitam ao túbulo proximal. Além disso, o rim é uma estrutura importante para os processos metabólicos que transformam substâncias relativamente inofensivas em metabólitos tóxicos. Entre os compostos farmacêuticos diretamente tóxicos aos túbulos renais estão antimicrobianos como aminoglicosídios (p. ex., vancomicina, gentamicina), quimioterápicos antineoplásicos (p. ex., cisplatina) e contrastes radiológicos. (NORRIS, 2021) A nefrotoxicidade induzida pelos contrastes radiológicos parece ser causada por efeitos tóxicos diretos nos túbulos e por isquemia renal. O risco de lesão renal causada pelos contrastes radiológicos é maior nos adultos e nos pacientes com doença renal, depleção de volume e diabetes melito preexistentes ou exposição recente a outros agentes nefrotóxicos. (NORRIS, 2021) A lesão tubular aguda é uma complicação da hemólise intravascular associada a muitas enfermidades hemolíticas, como anemia falciforme e traumatismo mecânico de próteses valvares cardíacas (NORRIS, 2021) A sepse causa isquemia porque desencadeia uma combinação de vasodilatação sistêmica e hipoperfusão intrarrenal. Além disso, a sepse acarreta a formação de toxinas que sensibilizam as células tubulares renais aos efeitos deletérios da isquemia. (NORRIS, 2021) A NTA, que complica os casos de traumatismo e queimadura, comumente é multifatorial, resultando dos efeitos combinados de hipovolemia, mioglobinúria e outras toxinas liberadas dos tecidos lesados (NORRIS, 2021) Consequência da lesão renal A causa mais comum de NTA secundária à obstrução intratubular é mioglobina, hemoglobina, ácido úrico, cadeias leves do mieloma ou excesso de uratos na urina. (NORRIS, 2021) A hemoglobinúria é causada por reações às transfusões de sangue e outros distúrbios hemolíticos agudos. (NORRIS, 2021) Os músculos cardíaco e esquelético contêm mioglobina, que corresponde à hemoglobina em sua função de servir como reservatório de oxigênio das fibras musculares. Normalmente, não há mioglobina no soro nem na urina. Na maioria dos casos, a mioglobinúria é causada por traumatismo muscular, mas também pode ser devida a esforços extremos, hipertermia, sepse, convulsões prolongadas, déficit de fosfato ou potássio e alcoolismo ou uso abusivo de drogas ilícitas.(NORRIS, 2021) A mioglobina e a hemoglobina conferem tonalidade anormal à urina, a qual pode variar da cor de chá ao vermelho, marrom ou preto. Cilindros granulares de coloração marrom e células epiteliais na urina estão relacionados com lesão tubular aguda; cilindros hemáticos e proteínas na urina indicam glomerulonefrite; e cilindros leucocitários e piúria sugerem nefrite tubulointersticial aguda. (NORRIS, 2021) 2. Nefrite intersticial aguda (NIA): A LRA secundária à lesão do interstício renal é denominada nefrite intersticial aguda. Os medicamentos comumente envolvidos no desenvolvimento da nefrite intersticial incluem penicilinas, cefalosporinas, sulfonamidas e AINEs. Infecções bacterianas e virais também podem ser agentes causais. A nefrite intersticial também está associada a um processo autoimune sistêmico ou confinado aos rins, como lúpus eritematoso sistêmico, síndrome de Sjögren, crioglobulinemia (REILLA, 2018) 3. ,Nefropatia urinária aguda por conta de síndrome de lise tumoral ➢ Doenças glomerulares: Consiste na inflamação ou degeneração do glomérulo renal, que pode ser classificada como primária (caso seja idiopática e não esteja relacionado com outras patologias sistêmicas) e secundária (induzida por síndromes paraneoplásicas, drogas ou doenças reumatológicas sistêmicas). São observados dois padrões dessas doenças: a) Padrão nefrítico: O paciente apresenta uma urina com bastante sedimentos, como hemácias disfórmicas e leucócitos, podendo apresentar certo grau de proteinúria (geralmente microscópica). Ocorre em casos de glomerulonefrites proliferativas, como a GNRP (glomerulonefrite rapidamente progressiva); (SANARFLIX) b) Padrão nefrótica: Nesse caso, o paciente apresenta uma severa proteinúria, sendo um padrão de glomerulopatia não proliferativa, como a GNM (glomerulonefrite membranosa). (SANARFLIX) Lesão renal aguda pós-renal A LRA pós-renal é causada pela obstrução do fluxo luminal do filtrado glomerular. Essa obstrução resulta em uma fisiopatologia relativamente complexa que se inicia com a transmissão da contrapressão ao espaço de Bowman do glomérulo. Intuitivamente, seria esperado que essa contrapressão reduzisse a TFG. No entanto, pela dilatação da arteríola aferente glomerular, a TFG permanece amplamente preservada. Infelizmente, essa compensação é apenas transitória e a TFG começará a cair se a obstrução não for aliviada rapidamente. (GOLDMAN, SCHAFER, 2022) Quando a obstrução persiste por mais de 12 a 24 horas, o fluxo sanguíneo renal e a pressão intratubular diminuem e grandes áreas não perfundidas e subperfundidas do córtex renal resultam em redução na TFG. (GOLDMAN, SCHAFER, 2022) Como o volume maior de urina não pode ser excretado em consequência da obstrução, a pressão é transmitida em sentido inverso aos túbulos e aos néfrons, que por fim são lesados (NORRIS, 2021) A LRA pós-renal ocorre na vigência de obstrução das vias urinárias, que pode ser observada em qualquer nível do trato urinário, porém, no acometimento de ureteres, depende da presença de obstrução bilateral. (REILLA, 2018) A obstrução pode ocorrer no ureter (i. e., cálculos e estenoses), na bexiga (i. e., tumor ou bexiga neurogênica) ou na uretra (i. e., hiperplasia da próstata). (NORRIS, 2021) A obstrução pode ser causada por hiperplasia prostática benigna, neoplasia de próstata ou bexiga, distúrbios retroperitoneais, bexiga neurogênica, cálculos renais bilaterais, fibrose retroperitoneal, entre outros (REILLA, 2018) A elevação da pressão hidráulica da via urinária, de maneira ascendente, resulta na ação de vasoconstritores locais, de modo que a obstrução prolongada tem como consequência a lesão parenquimatosa. Dessa forma, a reversibilidade da LRA pós-renal depende do tempo de duração da obstrução. (REILLA, 2018) Consequência da lesão pós-renal Dessa forma, por conta da redução da TFG, há um menor influxo de sódio, água, ureia e creatinina para dentro do néfron, aumentando suas concentrações sanguíneas. Ademais a isso, o aumento da pressão dentro dos túbulos, por conta da obstrução, faz com que a reabsorção das substância, que já se encontram em níveis menores, diminua ainda mais. Portanto, o portador dessa injúria pós-renal, além de apresentar oligúria, possui uma urina concentrada (SANARFLIX) Fisiopatologia A evolução da LRA pode ser dividida em quatro fases (NORRIS, 2021) 1. Fase inicial 2. Fase oligárica (anúrica) 3. Fase diurética 4. Fase de recuperação. Fase inicial A fase inicial, que se estende por horas a dias, é o intervalo decorrido entre a instalação do evento desencadeante (p. ex., fase isquêmica da insuficiência pré-renal ou exposição à toxina) e o desenvolvimento da lesão tubular. (NORRIS, 2021) Fase oligárica A fase oligárica (anúrica) dura 8 a 14 dias ou mais, dependendo da natureza da LRA, causando retenção súbita de metabólitos endógenos como ureia, potássio, sulfato e creatinina, que normalmente são eliminados pelos rins. (NORRIS, 2021) Em geral, o débito urinário alcança níveis mais baixos nesse ponto. A retenção de líquidos causa edema, intoxicação hídrica e congestão pulmonar. (NORRIS, 2021) Quando o período de oligúria é longo, o paciente frequentemente desenvolve hipertensão e também sinais de uremia. Se não forem revertidas, as manifestações neurológicas da uremia progridem de irritabilidade neuromuscular até convulsões, sonolência, coma e morte. (NORRIS, 2021) Em geral, a hiperpotassemia é assintomática até que o nível sérico de potássio aumente acima de 6,0 a 6,5 mEq/ℓ, quando então surgem alterações eletrocardiográficas típicas e sintomas de fraqueza muscular. (NORRIS, 2021) Fase diurética A fase diurética acontece quando os rins tentam se curar e a produção de urina aumenta, mas ocorrem cicatrizes e danos nos túbulos. Em geral, há diurese antes que a função renal seja normalizada por completo. Por essa razão, os níveis de ureia sanguínea, as concentrações séricas de creatinina, potássio e fosfato podem continuar elevados ou até mesmo aumentar ainda mais, embora o débito urinário tenha aumentado. (NORRIS, 2021) Durante essa fase, a TFG se eleva, o débito urinário aumenta para 400 mℓ/dia, e, possivelmente, há depleção de eletrólitos em função do aumento da excreção de água e dos efeitos osmóticos dos níveis sanguíneos elevados de ureia. (NORRIS, 2021) Fase de recuperação A fase de recuperação é o período durante o qual o edema tubular desaparece e a função renal melhora. Durante essa fase, existe normalização do equilíbrio hidreletrolítico. Por fim, a função dos túbulos renais é recuperada e a capacidade de concentrar urina aumenta. (NORRIS, 2021) De modo quase simultâneo, os níveis séricos de creatinina e de ureia começam a normalizar e a TFG retorna a 70 a 80% do normal. Em alguns casos, há lesão renal branda a moderada persistente. (NORRIS, 2021) Manifestações clínicas e complicações A LRA, mesmo quando avançada, é frequentemente diagnosticada primeiro por anormalidades observadas em exames laboratoriais de um paciente e não por qualquer sintoma ou sinal específico. (GOLDMAN, SCHAFER, 2022) Em alguns casos, os pacientes podem se apresentar assintomáticos, corroborando para que o seu diagnóstico seja eminentemente laboratorial (SANARFLIX) As manifestações clínicas associadas à LRA frequentemente são multiformes, ocorrem nas fases avançadas do processo e, em geral, não são evidentes até que a disfunção renal se torne grave. Os achados clínicos da LRA também dependem da fase na qual é diagnosticada. (GOLDMAN, SCHAFER, 2022) Pacientes com LRA podem queixar-se de anorexia, fadiga, náuseas e vômitos e prurido, bem como diminuição do débito urinário ou urina de coloração escura. Além disso, se o paciente apresentar sobrecarga de volume, pode-se observar dispneia em repousoe aos esforços. (GOLDMAN, SHCAFER, 2022) Sendo assim, o paciente com IRA apresenta sintomas renais (ex.: oligúria – sendo a mais frequente; anúria; ou poliúria) e extra-renais (ex.: edema, hipertensão e uremia), sendo esses últimos associados a condições clínicas como ICC, sepse, síndrome nefrítica, etc. Esses sintomas extra--renais que ajudam, durante a anamnese e exame físico, a identificação da patologia de base dessa lesão renal. (SANARFLIX) Manifestações renais Alterações hidroelétricas Sódio Com a retenção de sódio na circulação, gerando uma hipernatremia e, consequentemente de água, há uma sobrecarga do volume intravascular que pode ser percebida de diversas facetas, como HAS leve, edema cerebral, edema agudo de pulmão, aumento da pressão venosa jugular, edema periférico. Com a diluição desse sódio, o paciente com IRA pode repercutir com hiponatremia e, quando agudizada, tal comorbidade pode resultar em edema cerebral, crise convulsivas, cefaleia, confusão e estupor, coma (distúrbios neurológicos) (SANARFLIX) Durante a fase oligúrica, o balanço positivo de sódio pode levar à expansão de volume, hipertensão e insuficiência cardíaca. Nessa fase, acredita-se que a oferta de solução salina isotônica (300 mℓ/dia) associada a um controle rigoroso de peso é suficiente para equilibrar o balanço de sódio. Por sua vez, uma oferta menor de sódio, principalmente na fase poliúrica, pode provocar depleção de volume e hipotensão arterial (REILLA, 2018) Potássio Já no que tange ao potássio, o mais comum é de encontrar, com sua retenção na corrente sanguínea, é a hipercalemia. Mesmo sendo menos incidente que a hipernatremia, é um distúrbio mais grave por conta do teor cardiotóxico dessa substância quando em excesso (é assintomático em doses baixas). (SANARFLIX) A hiperpotassemia é a principal causa metabólica que leva o paciente com LRA ao óbito. Pequenas alterações no conteúdo extracelular de potássio provocam profundos efeitos na excitabilidade neuromuscular. A elevação do potássio (K+) sérico pode se dar na LRA por aumento do catabolismo endógeno de proteínas, por dano tecidual, sangramento intestinal e movimentação de K+ do intra para o extracelular pelo mecanismo-tampão dos estados acidóticos. A complicação mais temível da hiperpotassemia é a toxicidade cardíaca, manifestando-se com arritmias que, se não corrigidas, podem levar rapidamente à morte. (RIELLA, 2018) Fosfato e cálcio A hiperfosfatemia e hipercalcemia podem estar presentes de forma concomitante. Isso ocorre por conta do excesso de fosfato que o sangue apresenta nesses pacientes, eletrólito que apresenta forte relação com o cálcio no sangue (SANARFLIX) Distúrbio ácido-base Por outro lado, pacientes com IRA grave tendem a apresentar uma acidose metabólica, que se instara no organismo quando há retenção de metabólitos proteicos ácidos por conta da falha na sua filtração (SANARFLIX) Essa acidose da IRA possui o intervalo aniônico (ânion gap) elevado, que se instaurou por conta da diminuição da excreção de ácidos proteicos e da reabsorção de bicarbonato (HCO3-), além do acúmulo de sulfatos, fosfatos, uratos e hipuratos. (SANARFLIX) O intervalo/hiato aniônico (ânion gap) consiste na diferença entre os cátions presentes no sangue (sódio) e os ânions (bicarbonato e cloro) (SANARFLIX) Manifestações extrarrenais Uremia (síndrome urêmica aguda) Esse termo não se refere a concentração de ureia no corpo, mas sim do quadro sindrômico que o paciente apresente quando suas concentrações de metabólitos nitrogenados dialisáveis – de caráter tóxico – estão em alta. E, por conta do caráter sistêmico dessa síndrome, o paciente vai repercutir com diversos distúrbios nos sistemas ao longo de seu organismo. (SANARFLIX) Manifestações neurológicas Paciente pode apresentar confusão mental, irritabilidade, delirium, convulsão, coma, hiperreflexia tendinosa, mioclonia, flapping e sinal de Babinski bilateral, formando um quadro de encefalopatia urêmica (SANARFLIX) Seguem-se as alterações motoras (asterixes, tremores/flapping, mioclonias) e, finalmente, convulsões e coma, que representam os eventos terminais graves e de maior risco clínico. (REILLA, 2018) Manifestações cardiovasculares Do ponto de vista cardiovascular, uma das complicações mais frequentes é a presença de pericardite fibrinosa (10%), geralmente associada a atrito pericárdico, podendo ser complicada por derrame pericárdico e eventual tamponamento. (REILLA, 2018) Insuficiência cardíaca congestiva (ICC) e hipertensão também podem estar presentes na LRA e correlacionam-se com a sobrecarga de volume. Ainda, acidose metabólica e distúrbios eletrolíticos podem contribuir para o surgimento de ICC, bem como de arritmias. (REILLA, 2018) Manifestações pulmonares A uremia aguda pode desencadear, por conta da retenção de líquidos (ureia e outras toxinas, como amônia, “puxam” muito a água por osmose), temos edema agudo de pulmão e congestões. Pode causar também pleurite, por conta da toxicidade dos metabólitos. (SANARFLIX) Infecções broncopulmonares também são frequentes complicações da LRA. (REILLA, 2018) Manifestações digestivas: Quanto às complicações do trato gastrintestinal, ulcerações gástricas ou duodenais referem-se aos achados mais comuns. Obviamente, sangue no trato gastrintestinal contribui substancialmente para a elevação da concentração plasmática de ureia e potássio, com necessidade de adequação do programa dialítico. (REILLA, 2018) As primeiras manifestadas são náuseas, vômitos, anorexia e inflamação da mucosa, podendo levar, a posteriori, a distúrbios na motilidade gastrointestinal. (SANARFLIX) Manifestações hematológicas Trombocitopenia leve, disfunção plaquetária e anormalidade nos fatores de coagulação, pois pacientes urêmicos possuem menor capacidade de adesão e agregação plaquetária. Além do dito, paciente também pode apresentar uma anemia normocrômica e normocítica leve (em relação a da uremia por conta de uma DRC), atribuída produção ineficiente de eritropoetina pelo rim. (SANARFLIX) Diagnóstico O diagnóstico de uma IRA começa a partir da identificação da patologia de base na anamnese e no exame físico. Mas isso não é o suficiente para diagnosticarmos um paciente com esse quadro, pois precisamos de exames laboratoriais e, se for necessário, de figura para termos certeza do diagnóstico e da sua respectiva etiologia. (SANARFLIX) Anamnese Por causa das taxas elevadas de morbidade e mortalidade associadas à LRA, deve-se dar atenção especial às medidas preventivas e ao diagnóstico precoce. Isso inclui procedimentos de avaliação para detectar pacientes com risco de desenvolver LRA, inclusive os que têm disfunção renal e diabetes melito preexistentes. Esses grupos são especialmente suscetíveis a desenvolver LRA causada por fármacos nefrotóxicos (p. ex., aminoglicosídios e contrastes radiológicos) ou fármacos que alteram a hemodinâmica intrarrenal (p. ex., AINE). (NORRIS, 2021) Os idosos são suscetíveis a todos os tipos de insuficiência renal aguda, em consequência dos efeitos do envelhecimento nas reservas renais (NORRIS, 2021) Exame físico Um exame físico completo com ênfase especial na determinação da volemia e do volume arterial efetivo é essencial. Se houver sobrecarga de volume, podem ocorrer distensão da veia jugular, estertores pulmonares e edema periférico. (GOLDMAN, SCHAFER, 2022) Asterixe, mioclonia ou atrito pericárdico podem ocorrer na LRA grave. (GOLDMAN, SCHAFER, 2022) Exames complementares Exame de função renal O ideal para avaliar tal critério seria medir a TFG em cada néfron presente em ambos rins, estimando aproximadamente a verdadeira eficácia do funcionamento renal. Embora isso não seja possível na prática, podemos utilizar a depuração ou clearence da creatinapara avaliação renal, substância produzida pelo metabolismo do tecido muscular esquelético. (SANARFLIX) Foi escolhida essa substância pois ela é livremente filtrada do sangue no filtrado, não sendo reabsorvida como as outras (SANARFLIX) Sua depuração pode superestimar o TFG. Isso ocorre, pois uma pequena parte da creatina excretada é secretada no túbulo contorcido proximal. Por conta disso, tanto faz usar sua depuração como sua concentração sérica para estimar a função renal, pois o restante que não foi filtrado do sangue, será secretado nessa porção do túbulo (SANARFLIX) Essa creatina ela é totalmente excretada na urina no rim saudável, porém, em um rim lesionado, ela tende a aumentar sua concentração sérica e diminuir na urina, a partir de uma TFG menor que 70%. (SANARFLIX) Podemos usar a fração entre a concentração de ureia plasmática e de creatina plasmática para avaliarmos se há algum indício de IRA, além de classificar sua etiologia. Faremos isso a partir do pressuposto que o valor de referência (VR) normal dessa fração é de 20:1, ou seja, para 2º ureias, tem-se 1 creatinina. Esse valor varia a depender da etiologia da IRA (SANARFLIX) • Numa injúria pré-renal: Por conta do hipoperfusão renal, menor fluxo de sangue passa pelas arteríolas renais, havendo maior filtração de ureia e creatina. Mas até aí, as proporções se mantêm. No entanto, cerca de 90% da ureia é reabsorvida, por conta da integridade funcional do rim. Assim, a relação ureia/creatina aumenta, alcançando um VR > 40:1 • Numa injúria renal intrínseca: Nesse caso, não há aumento da reabsorção de ureia por conta de uma disfunção das células tubulares proximais. Assim, a relação diminui, chegando a um VR < 15:1; • Numa injúria pós-renal: Geralmente, o VR se encontra igual (20:1) ao normais, podendo haver um leve aumento por conta do aumento efetivo de reabsorção da ureia resultante da grande pressão inferida pela obstrução. Exame de urina Os exames de urina que medem a osmolalidade urinária, a concentração de sódio na urina e a excreção percentual de sódio ajudam a diferenciar entre azotemia pré-renal (na qual a capacidade de reabsorção das células tubulares está mantida) e necrose tubular (na qual esta função é perdida). Uma das primeiras manifestações de lesão tubular é incapacidade de concentrar a urina. (NORRIS, 2021) Outros dados diagnósticos que podem ser fornecidos pelo exame simples de urina (EAS) incluem proteinúria, hemoglobinúria e cilindros ou cristais na urina. (NORRIS, 2021) Permite a análise química, física e de sedimentos da urina, além de não ser dispendiosa. (SANARFLIX) ➢ Análise química: avaliaremos pH, concentração de glicose, proteína e outras substâncias que não deviam aparecer na urina, como sangue e secreção purulenta ➢ Análise física: vemos seu aspecto, cloração e densidade. ➢ Análise de sedimentos: presença de elementos celulares, como células epiteliais e leucócitos, além de cilindros (deposições moléculas ou íons, juntos com células mortas que formam um “tampão” no formato cilíndrico) As análises são de acordo com a localização baseia-se em: (SANARFLIX) ➢ Numa injúria pré-renal: Nenhum aspecto químico diferente da urina normal; maior densidade (concentrada) por conta da menor concentração de solvente (água) nela; sedimentos ausentes ou em formato de cilindros hialinos; ➢ Numa injúria renal intrínseca: Por conta de lesões no parênquima, pode haver hematúria, piúria, proteinúria e glicosúria; urina se encontra com menor densidade (diluída) por conta do menor poder de reabsorção do rim; podemos encontrar células epiteliais, leucócitos e cilindros; ➢ Numa injúria pós-renal: Por conta da lesão por conta da obstrução, pode existir hematúria e piúria; a priori, normal, mas pode se tornar mais concentrada caso a obstrução torne a pressão dentro túbulo tamanha; ausentes (pode aparecer pedaços do coágulo ou do cálculo). Exame de fração de excreção do sódio É um exame que ajuda a diferenciar as etiologias da IRA entre pré-renal e renal intrínseca: (SANARFLIX) • Na injúria pré-renal: Aqui, o rim absorve muita água e sódio, por conta do hipofluxo (dá “mais tempo” para as células tubulares os reabsorverem). Sendo assim, a excreção de sódio será < 1%;) • Na injúria renal intrínseca: Excreção > 2% Diagnóstico por imagem A ultrassonografia de rins e vias urinárias é um procedimento simples e de grande importância na avaliação das alterações da função renal. O tamanho renal reduzido e a ecogenicidade aumentada com perda da diferenciação corticomedular podem indicar doença renal preexistente, tornando possível diferenciar entre a doença renal crônica e a LRA. (REILLA, 2018) Ainda, a ultrassonografia é capaz de fornecer informação sobre a existência de obstrução das vias urinárias e de cálculos (se visíveis). (REILLA, 2018) A cintilografia renal também pode ser alternativa, auxiliando na avaliação da perfusão renal. (REILLA, 2018) No caso de evidência de obstrução sem fator causador visível, a tomografia computadorizada pode fornecer mais informações, sendo, na maioria das vezes, desnecessária a utilização de contraste, o que poderia agravar a LRA em curso. (REILLA, 2018) Biópsia renal No contexto da LRA, indica-se a biopsia renal precoce (nos primeiros 5 dias) quando há suspeita de glomerulonefrite rapidamente progressiva (que pode decorrer de doenças sistêmicas, como as vasculites e o lúpus eritematoso), de nefrite intersticial aguda, de necrose cortical bilateral ou na ausência de diagnóstico clínico provável. (REILLA, 2018) A biopsia fornecerá bases para justificar uma terapêutica mais agressiva (p. ex., corticosteroides, agentes citotóxicos e plasmaférese), bem como uma indicação prognóstica, pela avaliação histológica de componentes inflamatórios e fibróticos. (REILLA, 2018) Exame de sangue Elevação de escórias nitrogenadas (uréia, creatinina, ácido úrico), acidose metabólica, hipo ou hipernatremia, hiperpotassemia, hipo ou hipercalcemia e hiperfosfatemia e anemia normocítica e normocrômica (NORRIS, 2021) Novos biomarcadores Hoje em dia, existem pesquisas em andamento sobre o uso de biomarcadores novos para avaliar a LRA em uma fase mais precoce que os parâmetros convencionais. (NORRIS, 2021) A interleucina 18 (IL-18) é produzida pelo túbulo proximal depois da LRA e é uma citocina inflamatória. Esse marcador aumenta nos casos de LRA isquêmica e pode ser dosado facilmente na urina. (NORRIS, 2021) A lipocalina associada à gelatinase do neutrófilo (LAGN) é, normalmente, encontrada em vários órgãos, inclusive nos rins. A LAGN pode ser dosada no sangue e na urina, e níveis altos foram considerados preditivos de disfunção dos transplantes renais. (NORRIS, 2021) Critério diagnóstico Precisamos efetivamente diagnosticar o nosso paciente. Para isso, foram criados critérios de diagnóstico, como: (SANARFLIX) ➢ RIFLE (Risk, Injury, Failure, Loss of kidney function, End-Stage kidney disease) – o mais antigo; ➢ AKIN (Acute Kidney Injury Network) – uma versão mais reduzida da RIFLE que aborda temporaridade; ➢ KDIGO (Kidney Disease Improving Global Outcome) – o mais recente e mais usado, mesclando os dois outros; 0 KDIGO é o mais usado no dia a dia médico e propõe que, para ser diagnosticado com injúria renal aguda, o paciente precisa apresentar UM dos seguintes TRÊS critérios: (SANARFLIX) 1. Aumento da creatinina sérica > 0,3 mg/dL dentro de 48 horas; 2. Aumento da creatinina sérica > 1,5x o valor de base, conhecido ou presumido nos últimos 7 dias; 3. Débito urinário < 0,5ml/kg/h por 6 horas. Critério de estadiamento Além disso, o KDIGO também possui critérios para o estadiamento da IRA, ajudando a determinar o quão grave é seu estado. Dessa forma, o KDIGO estabelece a existência de três estágios, em que o paciente precisa APENASapresentar 1 dos critérios de estadiamento para ser diagnosticado nesse estágio. (SANARFLIX) Acidentes ofídicos Envenenamento causado pela inoculação de toxinas, através das presas de serpentes (aparelho inoculador), podendo determinar alterações locais (na região da picada) e sistêmicas (WEISS, PAIVA, 2018) As serpentes ou ofídicos são popularmente conhecidas no Brasil como “Cobras”, pertencem à classe Reptilla, ordem Squamata e subordem Serpentes. (WEISS, PAIVA, 2018) Epidemiologia No Brasil, quatro grupos de serpentes venenosas têm importância médica. Entre eles, o acidente mais comum é o botrópico (jararaca), que compõe 86% dos casos e em um distante segundo lugar o acidente crotálico (cascavel) com 10% dos casos. Os acidentes laquético (surucucu) e elapídico (coral) são ainda mais raros, perfazendo 2% e 0,8% dos casos, respectivamente. (SANARFLIX) Quanto à letalidade, o pior é o acidente crotálico (0,87%), seguido dos acidentes laquético (0,77%), botrópico (0,43%) e elapídico (0,4%). (SANARFLIX) Etiologia No Brasil, existem aproximadamente 442 espécies descritas, 75 gêneros e 10 famílias. Destas, apenas duas famílias são consideradas de importância médica, sendo elas: (WEISS, PAIVA, 2018) • Família Viperidae que engloba o gênero Bothrops (Jararaca), Crotalus (Cascavel), Lachesis (surucucu-pico- dejaca) • Família Elapidae com dois gêneros Micrurus e Leptomicrus, conhecidas como corais-verdadeiras No Brasil, quatro tipos de acidente são considerados de interesse em saúde: botrópico, crotálico, laquético e elapídico (KRAMER et al., 2016) • Acidente botrópico: É causado por serpentes da família Viperidae, dos gêneros Bothrops e Bothrocophias (jararacuçu, jararaca, urutu, caiçaca, comboia). • Acidente crotálico: É causado pelas cascavéis (Família Viperidae, espécie Crotalus durissus). • Acidente laquético: Também é causado por serpentes da família Viperidae, no caso a espécie Lachesis muta (surucucu-pico-de-jaca). • Acidente elapídico: É causado pelas corais-verdadeiras (família Elapidae, gêneros Micrurus e Leptomicrurus). Os acidentes envolvendo esses animais em geral acontecem na mata, no roçado, em quitais de chácaras e sítios, terreno baldios e na periferias. Na maioria dos ambientes, é característica a ocorrência sazonal, associada a períodos de calor e umidade. (WEISS, PAIVA, 2018) Ficar atento que nem sempre picada por um animal peçonhento é sinônimo de soroterapia. Existem muitas serpentes sem importância médica capazes de agredir um indivíduo. De outra forma, uma serpente peçonhenta de importância médica pode não injetar veneno suficiente para causar alterações fisiopatológicas e determinar uma “picada seca” (WEISS, PAIVA, 2018) É simples diferenciar as víboras com fosseta e as cobras inofensivas As víboras com fosseta, como o nome indica, têm uma fossa na região situada entre o olho e a narina, em ambos os lados da cabeça. Esta fossa é um órgão sensível ao calor que permite à cobra localizar presas de sangue quente. (SANARFLIX) Mecanismo de ação dos venenos Os venenos provocam alterações na região da picada (efeito local) e à distância (efeitos sistêmico), cujos mecanismos de ação estão classificados em: (WEISS, PAIVA, 2018) • Atividade inflamatória aguda: Tem patogênese complexa, com a participação de proteases, hialuronidases, fosfolipases e mediadores da resposta inflamatória. De ação imediata à inoculação do veneno no organismo, leva a lesões locais, como edema e dor, podendo evoluir com bolhas e necrose. • Atividade hemorrágica: Hemorragias são causadas devido às lesões na membrana basal dos capilares, levando a manifestações hemorrágicas locais e sistêmicas. • Atividade coagulante: Ativa a cascata de coagulação sobre fator X, protrombina e/ou trombina, com consumo de fibrinogênio, que pode ocasionar incoagulabilidade sanguínea, semelhante ao da coagulação intravascular disseminada. • Atividade neurotóxica: Neurotoxinas de ação pré-sináptica atuam nas terminações nervosas, inibindo a liberação de acetilcolina na placa motora, enquanto neurotoxinas de ação pós-sináptica impedem a ligação da acetilcolina no sítio receptor da placa mioneural. O resultado é o bloqueio neuromuscular e consequente paralisia motora. • Atividade miotóxica: Produz rabdomiólise, levando à liberação de enzimas musculares e pigmento de mioglobina que apresenta ação nefrotóxica Manifestações clínicas Acidente botrópico 1. Manifestações locais (primeiras horas após a picada) • Dor • Edema • Equimoses • Bolhas com conteúdo seroso ou serohemorrágico podem surgir na evolução e dar origem à necrose cutânea. • As principais complicações locais são decorrentes da necrose e da infecção secundária que podem levar à amputação e/ou déficit funcional do membro. 2. Manifestações sistêmicas • Sangramentos em pele e mucosas são comuns (gengivorragia, equimoses à distância do local da picada); • Hematúria, hematêmese e hemorragia em outras cavidades podem determinar risco ao paciente. • Hipotensão pode ser decorrente de sequestro de líquido no membro picado ou hipovolemia consequente a sangramentos, que podem contribuir para a instalação de insuficiência renal aguda. Acidente laquético As manifestações, tanto locais como sistêmicas, são indistinguíveis do quadro desencadeado pelo veneno botrópico. A diferenciação clínica se faz quando, nos acidentes laquéticos, estão presentes alterações vagais, como náuseas, vômitos, cólicas abdominais, diarreia, hipotensão e choque. (KRAMER et al., 2016) Acidente crotálico 1. Manifestações locais: não se evidenciam alterações significativas. A dor e o edema são usualmente discretos e restritos ao redor da picada; eritema e parestesia são comuns. 2. Manifestações sistêmicas: • Ptose palpebral • Turvação visual • Oftalmoplegia • Distúrbios de olfato e paladar, além de ptose mandibular e sialorreia podem ocorrer com o passar das horas. • Raramente a musculatura da caixa torácica é acometida, o que ocasiona insuficiência respiratória aguda. Essas manifestações neurotóxicas regridem lentamente, porém são totalmente reversíveis. • Gengivorragia e outros sangramentos discretos. • Mialgia generalizada • Escurecimento da cor da urina (cor de “coca cola” ou “chá preto”). • Insuficiência renal aguda é a principal complicação e causa de óbito. Acidente elapídico 1. Manifestações locais: dor e parestesia na região da picada são discretos, não havendo lesões evidentes. 2. Manifestações sistêmicas • Fácies miastênica ou neurotóxica (comum ao acidente crotálico) constitui a expressão clínica mais comum do envenenamento por coral verdadeira; • Complicações são decorrentes da progressão da paralisia da face para músculos respiratórios. Diagnóstico O diagnóstico presumível é feito pela história, pelo exame físico e pela avaliação dos efeitos do veneno no paciente e na maioria dos casos deve ser suficiente para determinação do soro antiofídico correto (SANARFLIX) Não existe exame laboratorial para determinar o tipo de envenenamento ofídico, sendo o diagnóstico eminentemente clínico-epidemiológico. (KRAMER et al., 2016) As serpentes da família Viperidae (Bothrops e Crotalus) costumam deixar as marcas de suas duas presas no local da mordida. (KRAMER et al., 2016) Nos acidentes botrópicos, laquéticos e crotálicos, exames de coagulação devem ser realizados para confirmação diagnóstica e avaliação da eficácia da soroterapia. O tempo de coagulação, simples e de fácil execução, pode ser feito nos locais que não dispõem de laboratório (KRAMER et al., 2016) Alterações de coagulograma, particularmente de fibrinogênio, são importantes para o diagnóstico e acompanhamento dos casos de acidentes botrópicos e crotálicos e não são considerados critérios de gravidade. (KRAMER etal., 2016) Abordagem Referências: NORRIS, Tommie L. Porth - Fisiopatologia : Grupo GEN, 2021. RIELLA, Miguel C. Princípios de Nefrologia e Distúrbios Hidroeletrolíticos, 6ª edição : Grupo GEN, 2018. JOHNSON, Richard J. Nefrologia Clínica.: Grupo GEN, 2016. GOLDMAN, Lee; SCHAFER, Andrew I. Goldman-Cecil Medicina: Grupo GEN, 2022. WEISS, Marcelo Barros; PAIVA, Jorge Wilson Souza. Acidentes com animais peçonhentos. Thieme Revinter Publicações LTDA, 2018. KRAMER, Aline Melo et al. Acidentes com animais peçonhentos mais comuns. Acta médica, Porto Alegre, p. 6-6, 2016.
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