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P A R A D IG M A S P A R A D IG M A S LU CIA N A D E LU CA D A LLA VA L LEFundação Biblioteca NacionalISBN 978-65-5821-006-1 9 7 8 6 5 5 8 2 1 0 0 6 1 Código Logístico 59804 Novos paradigmas educacionais Luciana de Luca Dalla Valle IESDE BRASIL 2021 © 2021 – IESDE BRASIL S/A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito do autor e do detentor dos direitos autorais. Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: Prostock-studio/Shutterstock Todos os direitos reservados. IESDE BRASIL S/A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ V272n Dalla Valle, Luciana de Luca Novos paradigmas educacionais / Luciana de Luca Dalla Valle. - 1. ed. - Curitiba [PR] : IESDE, 2021. 100 p. : il. Inclui bibliografia ISBN 978-65-5821-006-1 1. Professores - Formação. 2. Prática de ensino. I. Título. 21-69248 CDD: 370.71 CDU: 37.026 Luciana de Luca Dalla Valle Mestre em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Especialista em Educação Infantil e em Psicopedagogia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e graduada em Pedagogia pela mesma universidade. É autora de livros para formação de professores e sobre desenvolvimento infantil, tendo sido agraciada, em 2010, com o Prêmio Jabuti, na categoria material didático. Possui experiência como docente e pesquisadora na área de capacitação de professores na graduação e pós-graduação. Atuou, ainda, como professora de educação básica, professora universitária, coordenadora pedagógica e diretora de instituição de ensino superior. SUMÁRIO Agora é possível acessar os vídeos do livro por meio de QR codes (códigos de barras) presentes no início de cada seção de capítulo. Acesse os vídeos automaticamente, direcionando a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet para o QR code. Em alguns dispositivos é necessário ter instalado um leitor de QR code, que pode ser adquirido gratuitamente em lojas de aplicativos. Vídeos em QR code! SUMÁRIO Agora é possível acessar os vídeos do livro por meio de QR codes (códigos de barras) presentes no início de cada seção de capítulo. Acesse os vídeos automaticamente, direcionando a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet para o QR code. Em alguns dispositivos é necessário ter instalado um leitor de QR code, que pode ser adquirido gratuitamente em lojas de aplicativos. Vídeos em QR code! 1 Propósito educativo e desafios cotidianos 9 1.1 Paradigmas educacionais da contemporaneidade 10 1.2 Qual é o propósito educativo? 17 1.3 Flexibilidade e adaptação docente 22 1.4 Desafios cotidianos do trabalho docente 25 2 A vida presente na escola 31 2.1 Educação disruptiva 32 2.2 Repensando o mindset educacional 37 2.3 Dá para viver sem tecnologia na escola? 44 3 Planejamento e uso criativo de ferramentas digitais 53 3.1 Curadoria de conteúdo 54 3.2 Criatividade no uso das tecnologias na escola 60 3.3 Metodologias ativas 68 4 Professor como sujeito da práxis docente 76 4.1 Afetividade e qualidade 77 4.2 Protagonismo e autonomia 84 4.3 Criticidade e reflexão 91 5 Gabarito 98 Falar sobre educação contemporânea é refletir sobre mudanças e quebras de paradigmas. Esta é a proposta deste livro: contribuir para a percepção de que a escola, em seus processos pedagógicos, precisa estar antenada com seu tempo e disposta a refletir sobre temas que estão presentes no dia a dia da sociedade e que também influenciam o ambiente escolar. O primeiro capítulo propõe reflexões sobre os propósitos da educação na contemporaneidade e dos novos paradigmas vigentes, elencando pontos essenciais na atuação dos professores para a efetivação de uma educação de qualidade e, dessa forma, fortalecendo o profissional para os desafios de seu cotidiano. Oferecendo percepções para suscitar pensamentos sobre a importância do mindset dos educadores, com atualização de conceitos, o segundo capítulo interliga teoria com exemplos e vivências, ao mesmo tempo em que oferece aos educadores um repensar das suas próprias convicções sobre a escolha de recursos e metodologias para seus programas pedagógicos. O uso de ferramentas digitais e a importância de um planejamento com curadoria de conhecimentos consciente é o tema das reflexões do terceiro capítulo, que também propõe o uso de metodologias ativas e projetos colaborativos nas realidades educacionais. O quarto e último capítulo propõe um refletir sobre aspectos intrínsecos da atuação do professor: afetividade, autonomia e criticidade, principalmente com vistas à qualidade de seu desempenho profissional. Nesse capítulo a percepção do protagonismo na educação é estudado sob o ponto de vista do professor e do aluno. A educação precisa ser pensada sob óticas modernas e esperamos que este livro possa desencadear mudanças de paradigmas, bem como ações conscientes que ajudem a fazer a educação melhor no nosso país. Que você possa pensar, desafiar-se, mudar e agir. APRESENTAÇÃO Vídeo Propósito educativo e desafios cotidianos 9 1 Propósito educativo e desafios cotidianos O pensador aponta sua luneta para o céu e questiona uma verdade absoluta: a Terra não é o centro do Universo. É a Terra que gira em torno do Sol, e não o contrário. Estuda, calcula, refaz cálculos, anota, compara. Apropria-se das ideias de outro pensa- dor para fortalecer as suas. E comprova! A história estava prestes a mudar. Publica o livro, desafia as ideias e as instituições vigentes e é duramente criticado por isso. Será morto se não alterar suas ideias e dizer estar equivocado. Muda as ideias e permanece vivo, mas em prisão domiciliar. Impedido de pesquisar e aprofundar seus estudos, é renegado à situação de ser alguém que publica here- sias. Morre cego, preso e sem ver suas ideias serem reconhecidas, sem saber que seu estudo não apenas questionou o paradigma vigente, mas também serviu de base para diversos outros estudos e, com isso, para o avanço da ciência. Certamente você reconhece que estamos falando de Galileu Galilei, físico italiano cujos estudos revolucionaram o que se co- nhecia sobre astronomia e física. A história de Galileu ilustra nosso raciocínio sobre mudanças de pensamento necessárias e nos re- mete às dificuldades encontradas para fazê-lo. Assim também ocorre no campo educacional, em que desafios estão constantemente surgindo, fazendo com que professores e equipes pedagógicas constantemente repensem seus propósitos e sua conduta. A dificuldade e o desafio de repensar e a necessidade de flexibilidade na atuação docente serão os temas tratados ao longo deste capítulo. 10 Novos paradigmas educacionais 1.1 Paradigmas educacionais da contemporaneidade Vídeo Ao longo de sua história, a educação adotou vários formatos, de- pendendo da época e das ideias vigentes. Convidamos você a relem- brar a educação pelo debate de ideias, defendida pelo filósofo grego Sócrates (470-399 a.C.), em que o diálogo era pano de fundo para que as pessoas, de modo geral, pensassem por si mesmas e sobre si mesmas. Considere na sua lembrança que Sócrates tinha um método diferenciado de ensinar, que pregava a reflexão oral sobre os temas, especialmente sobre aqueles de natureza humana. Quando era ques- tionado por seus discípulos, respondia às dúvidas com outras pergun- tas, que, segundo ele, faziam seus alunos pensarem sobre o assunto discutido e encontrarem suas próprias respostas. Sócrates acreditava que a educação deveria despertar nas pessoas um repensar de suas próprias ideias, no intuito de que somente o conhecimento interior poderia levar à construção de conceitos (FRAZÃO, 2019). Como não deixou nenhum texto escrito, suas ideias foram difundidas pelos seus mais conhecidos discípulos, Platão e posteriormenteAristóteles, que mesmo nascendo 15 anos após o falecimento de Sócrates, foi um im- portante estudioso da obra deste. Num salto histórico, há o grande período em que os jesuítas im- primiram no mundo sua forma de educar, tendo como argumento e modelo principal a formação moral e religiosa atrelada à educacional. A Companhia de Jesus, ordem religiosa fundada em 1534, destacava que a religião deveria ser um dos pilares de toda a instrução jesuítica, como destacado no documento Ratio Studiorum, cuja primeira edição data de 1599. O Ratio Studiorum foi escrito como um conjunto de nor- mas para regulamentar o ensino dos colégios jesuítas no mundo. Nele, os preceitos da educação jesuíta foram defendidos e explicados em 467 regras (TOYSHIMA; MONTAGNOLI; COSTA, 2012). Observe que os jesuítas foram considerados arrojados em sua pro- posta educativa no Ratio Studiorum, pois defendiam a ideia de que era necessário elogiar e incentivar as produções dos alunos, em detrimen- to dos castigos físicos permitidos na época. Não que eles tivessem de fato eliminado todo castigo (a palmatória era utilizada), mas a inovação estava realmente na ideia do incentivo, da premiação dos melhores Propósito educativo e desafios cotidianos 11 alunos e de sua dedicação. Você pode estar pensando que hoje obvia- mente se entende como melhor a ideia de incentivar os alunos no lugar de castigá-los por não corresponderem ao que se espera, mas volte no tempo em que essas ideias foram propostas, 1599, e aí sim essas palavras terão outro peso. Para saber mais sobre o documento com os preceitos da educação jesuítica, acesse o artigo de Ana Maria da Silva Toyshima e Célio Juvenal Costa intitu- lado O Ratio Studiorum e seus preceitos pedagógicos, apresentado e publicado no Seminário de Pesquisa do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Estadual de Maringá. Acesso em: 9 fev. 2021. http://www.ppe.uem.br/publicacoes/seminario_ppe_2012/trabalhos/co_05/104.pdf Artigo Ao trazer à tona dois modelos de educação ao longo da história – sendo o primeiro de Sócrates, que defendia o método oral da reflexão, e o segundo dos jesuítas, focado na instrução atrelada à religiosidade –, não se pretende apenas uma pequena retrospectiva histórica, mas sim destacar a você a importância da compreensão de que nos diferentes períodos históricos houve diferentes formatos de educação. A escolha de um formato de educação destinado a uma sociedade depende em grande parte dos valores que são comungados por ela, do acesso à informação e do que aquela sociedade “pensa”. Assim, ressaltamos que em tempos diferentes a educação apresentou dife- rentes formatos e, da mesma forma, soluções diferentes para seus problemas. Vamos, portanto, evidenciar que há diferentes formatos de educação, considerando aqui que a educação é diferente em cada tempo histórico e que esses modelos são influenciados – e em alguns casos criados – pela sociedade da época. Também deve ficar nítido que não é só a época que define o formato da educação: ele também é definido pelo acesso às informações, pela atualização profissional e pela percepção da necessidade de mudança. Essa relação entre época, valores praticados e acesso à informação precisa ser compreendida para que possamos avançar na definição do que estamos chamando aqui de paradigmas educacionais. Tome como exemplo a instrução formal das mulheres no Brasil. No período colonial, a educação feminina era totalmente realizada no lar e voltada às atividades domésticas, porque se acreditava que a função http://www.ppe.uem.br/publicacoes/seminario_ppe_2012/trabalhos/co_05/104.pdf 12 Novos paradigmas educacionais das mulheres era cuidar bem do seu lar e posteriormente de sua fa- mília. Somente a partir do século XIX as mulheres abastadas puderam frequentar colégios, para que pudessem aprender a se comportar na sociedade e respeitar o outro, em especial o seu companheiro, po- rém não estudavam nenhuma disciplina que envolvesse cálculo; essas eram destinadas somente aos homens. Perceba a ideia implícita da mulher como alguém com capacidade inferior ao homem. Somente em 1880 foram instauradas escolas para formar professoras (novamente apenas mulheres oriundas de classe social abastada), e outra vez a ideologia restringia à mulher somente tarefas de cuidados das crian- ças pequenas, seja em casa ou na escola (RIBEIRO, 2000). As mulheres também não tiveram acesso a cursos superiores ou a qualquer ativi- dade relacionada à política até fins do século XIX (STAMATTO, 2002), e, em pleno século XXI, você certamente continua escutando nas pro- pagandas eleitorais frases sobre a importância das mulheres na polí- tica, o que demonstra que ainda há muito a conquistar e consolidar sobre essa questão. Obviamente há uma história de emancipação das mulheres em nos- so país que merece ser destacada, mas é relevante relembrar o peso desse paradigma de inferioridade, que faz com que algumas pessoas considerem que apenas cabe às mulheres (não por escolha própria, porque nesse caso não seria um problema) a tarefa de cuidar da família e da casa ou, quando estudadas, de lecionar. Desafiamos você com algumas perguntas: quantas mulheres engenhei- ras você conhece? Quantas meninas que desejam ser engenheiras que você conhece relatam ter o apoio e incentivo dos pais ou familiares? Não se trata aqui de colocar em posição melhor os cursos de engenharia em relação aos de licenciatura, claro. Trata-se do desafio de quebrar as ideias ainda vigentes na sociedade de que profissões envolvendo cálculo não são adequadas para mulheres; ideias essas que impedem muitas pessoas de olhar para as mulheres como igualmente capazes em relação aos homens e, claro, eficientes nas atividades que envolvam cálculos matemáticos. Com o avançar dos séculos e estudos, muita coisa mudou na reali- dade feminina, mas a luta das mulheres para que suas escolhas profis- sionais possam ser equiparadas as dos homens ainda é grande. Nos tempos atuais há muitos modelos de educação, e eles também estão atrelados ao pensamento vigente, ao desenvolvimento científi- Sabia que existe uma data de co- memoração mundial específica para as mulheres na engenharia? É o dia 23 de junho. Segundo os organizadores, a data tem como objetivo fortalecer o espaço que as engenheiras vêm ganhando na profissão, antes majoritariamente ocupada por homens. Essa data foi proposta pela Women’s Engineering Society, que reúne engenheiras, cientistas e tecnólogas para trabalhos em parceria. Curiosidade Propósito educativo e desafios cotidianos 13 co e tecnológico e às premissas pedagógicas de determinado grupo. Assim, é correto afirmar que todo modelo educacional corresponde a alguma vertente de pensamento que aquela sociedade tem sobre os assuntos que a circundam. Convencionou-se chamar esses “modelos” de paradigmas. Segundo sua etimologia, um paradigma, do grego paradeigma (modelo ou pa- drão), corresponde a modelos que são vigentes em determinado tem- po e situação (ROMANO, 1998). Observe que quando utilizada no campo educacional, a palavra pode ser considerada como sinônimo de modelo mental, desde que considerada dentro de um período histórico. Então, paradigmas são os delimitadores, verdades geradas em determinados períodos históricos, que definirão as ações da sociedade daquela época. Tome como exemplo Galileu Galilei (1564-1642), cuja história ilustra o início deste capítulo. Com suas descobertas, revolucionou a história da astronomia ao comprovar que a teoria geocêntrica (que conside- rava a Terra como o centro do Universo) não era verdadeira. Galileu reafirmou a teoria de Nicolau Copérnico de que o Sol era o centro do Sistema Solar (teoria heliocêntrica). A questão que queremos desta- car aqui não é a simples substituição de uma teoria pela outra (o que poderia ser considerado sob o ponto de vista da evolução da ciência sobre a religião), mas sim a dificuldade das pessoas da época para mu- dar os modelos vigentesque existiam. As conclusões de Galileu foram duramente questionadas pela Igreja Católica, porque contrariavam as Escrituras Sagradas, e o estudioso foi condenado à prisão domiciliar, onde morreu cego e sem o reconhecimento por seus estudos. Aliás, só não foi morto na fogueira (pena para quem cometia heresia) porque refutou seus conhecimentos e fez uma confissão admitindo que estava errado, mesmo sabendo que estava certo. Mas os estudos científicos de Galileu estavam corretos, e assim o desenvolvimento aprofundado da teoria científica mudou os paradig- mas vigentes e possibilitou avanços da ciência tanto no campo da astro- nomia quanto na física e na matemática, para citar só algumas áreas. Compreenda que naquela época, e por muito tempo depois, ques- tionar os paradigmas da fé com a ciência era algo inimaginável. Não é o caso aqui trazer a discussão de fé versus ciência; o que se pretende é alcançar um raciocínio de que a quebra de paradigmas pode ser difícil 14 Novos paradigmas educacionais e morosa, a depender do assunto, das pessoas envolvidas e, conse- quentemente, do quanto esse paradigma afeta a vida dessas pessoas e mexe com suas verdades. No caso de Galileu Galilei, foram necessários 350 anos da morte do estudioso para que a Igreja reconhecesse que ele havia sido condena- do injustamente e que as ideias por ele defendidas eram verdadeiras. Thomas Kuhn, em seu livro A estrutura das revoluções científicas, tra- ta dos paradigmas reconhecendo-os como as “realizações científicas universalmente reconhecidas que, durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares para uma comunidade” (KUHN, 1997, p. 13). Vamos destacar nas ideias de Kunh as expressões universalmen- te reconhecidas, que indica que paradigmas precisam ser reconhecidos como eficientes por uma grande parcela da população, e durante algum tempo, que mostra que as verdades não são absolutas, e sim mutáveis. Paradigmas, portanto, são temporários. Em seu livro, o autor defende a ideia de que a ciência vai seguindo seu curso até que problemas surgem e levam a um repensar. Esse re- pensar desafia as verdades que até então eram sustentadas e obriga os pesquisadores a buscarem novas respostas para as novas dúvidas. Para isso, é preciso que formulem novas estratégias de resolução. Isso faz com que pensem de maneira diferente, muitas vezes ampliando o que pensavam anteriormente sob outras perspectivas. Esse repensar vai gerar outros modelos mentais que vão direcionar novas pesquisas e, consequentemente, a ampliação do que já se sabia ou a alteração do que se pensava como “verdade”. É esta relação que se deseja estabelecer aqui: o entendimento de que os paradigmas, sendo modelos estabelecidos, em certo tem- po serão alterados, pois esse é o curso natural. Porém, é importante lembrar que o entendimento do que se considera um paradigma não implica na facilidade de superação ou substituição dele. A história tem nos mostrado como é elaborada e por vezes morosa a aceitação da mudança de um paradigma, talvez porque aceitar a mudança significa sair da posição confortável de conhecimento da realidade e se lançar ao novo. Desafiamos você a pensar na sua mudança pessoal de paradigmas. Certamente há verdades estabelecidas em sua vida, algumas já altera- das, outras em processo de dúvidas. Vamos a uma pergunta que ainda Para saber mais sobre o impor- tante pensador Galileu Galilei, recomendamos o acesso a este site: https://history.uol.com.br/ biografias/galileu-galilei. Acesso em: 9 fev. 2021. Site https://history.uol.com.br/biografias/galileu-galilei https://history.uol.com.br/biografias/galileu-galilei Propósito educativo e desafios cotidianos 15 gera controvérsias em nosso país: o que você pensa sobre professores homens na educação infantil? De acordo com o Censo Educacional da Educação Básica de 2017, dentre os 443.405 profissionais da educação infantil brasileira, ape- nas 13.516 (3%) são homens (PENZANI, 2017). Qual será a causa dessa pequena porcentagem? Será que no seu pensamento não apa- receram os seguintes questionamentos: isso é trabalho feminino? Estamos ainda em um paradigma no qual há diferenciação na qua- lidade do profissional por gênero? Será que para todas as pessoas essa quebra de paradigmas da docência na educação infantil é aceita facilmente? Não esqueça que repensar um paradigma significa estar disposto a refletir sobre o assunto, ponderar, renunciar a uma verda- de que se achava estabelecida. Esse movimento, mesmo que difícil, é necessário. Poderíamos listar aqui uma infinidade de modelos que inconscien- temente fazem parte das verdades de cada um de nós. Poderemos afir- mar que estamos dispostos a renunciar a algumas verdades e talvez ainda não estejamos preparados para mudar outras no campo pes- soal. No entanto, como profissionais da educação, não é correto que- rermos estar sempre atualizados? Romper com paradigmas estabelecidos é resultado de fatores dife- renciados, entre eles o tempo e as circunstâncias sociais. É também fru- to de avanços de estudos da ciência e, no caso da educação, de ciências que podem apoiar a ação educativa, como a psicologia, a sociologia, a biologia, entre outras, além dos estudos específicos sobre a didática envolvida no processo de ensino-aprendizagem. Mas quais são os paradigmas da contemporaneidade? Para Behrens (2013), há dois tipos de paradigmas educacionais re- conhecidos ao longo da história da educação brasileira: • Paradigmas conservadores: são aqueles que se embasam na re- produção do conhecimento, feita de modo linear, com acúmulo de informações repassadas pelo professor, em geral sem envol- ver afeto e sentimento dos alunos e, dessa forma, com pouca incidência de compreensão. Podem ser encontrados nas teorias tradicional e tecnicista e na escola nova. Esta, mesmo sendo uma teoria cuja base era romper com o ensino tradicional e dar mais voz aos alunos, não foi imediatamente aceita e difundida por Será que a porcentagem pe- quena de professores brasileiros lecionando na educação infantil é fruto de um modelo mental que remete ao século XIX, em que “cuidar” de crianças era um trabalho feminino? Para refletir Uma das autoras que estudou o processo da mudança de paradigmas no campo educacional é Marilda Behrens. Em seu livro O paradigma emergente e a prática pe- dagógica, ela nos convida a refletir sobre o papel de mediador e sua prática pedagógica com fortes raízes no tradicionalismo. Com reflexão e ciência, a autora oferece caminhos para mudar as práticas e possibilitar aos alunos uma aprendizagem significativa. BEHRENS, M. A. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2013. Livro 16 Novos paradigmas educacionais muitos professores, que não conseguiram romper com as práti- cas anteriores. • Paradigmas inovadores: apresentam-se sob outra perspectiva, rompendo com a visão descontextualizada do ensino e possibili- tando que conteúdos sejam trabalhados de maneira menos frag- mentada e reducionista. Esses paradigmas estão presentes nas novas teorias da educação lançadas no Brasil a partir da década de 1980, em que raciocínio e sentimentos devem ser levados em consideração, como a teoria histórico-crítica e o construtivismo. O artigo Paradigmas inovadores: novos desafios para a prática pedagógica do professor universitário, de Mari Regina Anastacio, faz uma importante reflexão de como é preciso refletir criticamente sobre os paradigmas da ciência e sua influência no processo educativo e, com isso, justificar a validade de se optar por paradigmas inovadores no contexto educacional, repensando o papel do professor e sua metodologia na atuação docente. Acesso em: 9 fev. 2021. https://educere.bruc.com.br/arquivo/pdf2011/5815_2745.pdf Artigo A autora ainda se posiciona no que considera ser o novo paradigma para o ensino e a aprendizagem: o paradigma emergente resultante de uma união entre diferentes abordagens de ensino, especialmen- te a sistêmica (que supera o ensino fragmentadoe recupera a hu- manização no processo de aprendizagem) e o ensino com pesquisa (BEHRENS, 2013). Como é do seu conhecimento, a história da educação não é linear; mesmo com as políticas públicas apontando para uma direção de modernidade, as práticas pedagógicas se diferenciam muito no país. Mesmo com todos os estudos apontando para a falência do ensino no modelo tradicional, ainda é possível encontrar escolas que insistem em defender essa prática. Então, é correto afirmar que há paradigmas dife- renciados dentro do Brasil. Mas é importante refletir sobre as crenças; principalmente sobre o que as embasa. Por isso, é muito importante a formação continuada do professor para a atualização de ideias, para o contato com informações e estudos recentes que são capazes de melhorar sua prática pedagógica e que, em primeira instância, podem realmente alterar seu pensamento. Refletir sobre paradigmas da contemporaneidade é levar em con- sideração os avanços dos estudos sobre ensino, aprendizagem, co- Organize uma lista de suas cren- ças sobre educação, começando com a seguinte expressão: “Na educação, acredito que...”. Ao fazer esse exercício, seja sincero consigo mesmo. Depois de um tempo, releia a lista; será que algumas dessas crenças já não podem ser substituídas? Suas práticas educativas podem ser classificadas como conservado- ras ou inovadoras? Será que o avanço das pesquisas e o resul- tado da educação de modo geral não podem suscitar alguma mudança no seu pensamento e apontar para o paradigma emergente? Desafio https://educere.bruc.com.br/arquivo/pdf2011/5815_2745.pdf Propósito educativo e desafios cotidianos 17 nhecimento e contextualização. Isso envolve áreas como a biologia, a cognição, a sociologia, a psicologia e tantas outras. Paradigmas não são quebrados ou alterados pela simples opinião de alguém. É preci- so fundamentá-los com teorias que a ciência produziu, respostas que foram provadas, confirmadas e que, por não resultarem mais no que seria considerado um sucesso, precisam ser alteradas. 1.2 Qual é o propósito educativo? Vídeo Ao pensar sobre os paradigmas educacionais vigentes e sobre aque- les que norteiam sua práxis pedagógica, certamente você concordaria com esta afirmação: precisamos de práticas inovadoras na educação. Hoje em dia, falar sobre inovação é sem dúvida falar sobre experiências educativas de sucesso e de qualidade. Então, precisamos de sucesso e qualidade na educação. Assim, o fato de que a educação precisa de práticas de vanguarda e de modernidade parece ser um consenso no desejo de professores. Mas como chegar até elas? Há muitas formas metodológicas, evidente- mente, mas o desafio, em primeiro lugar, é cada professor pensar se- riamente no assunto, não só com respostas metodológicas que podem alternar para essa ou aquela prática, mas com estudos que permitam entender a razão dessas práticas, o fundamento por trás das ações. Que o professor não só busque em alguma rede social uma experiência que possa ser copiada e reproduzida na sua escola, mas sim se ocupe de pensar quais teorias sustentam tal prática e possa compor ele mes- mo as suas metodologias. Quando o entendimento da teoria for real, a mudança da prática se dará com mais facilidade. Considere a reflexão: muitas vezes, o pro- fessor que afirma ter dificuldades com as mudanças não é o mesmo que tece comentários sobre o atraso da educação brasileira? E a quem cabe a alteração das práticas? E a alteração das práticas não está de certa forma ligada a mudanças conceituais? Voltamos ao ponto que se pretende destacar: é preciso que o professor compreenda seu papel de estudioso, de fazedor de ciência da educação, e não seja apenas um reprodutor de práticas diferenciadas. Para ultrapassar paradigmas, o professor precisa de vontade docente, ação e conhecimento teórico. 18 Novos paradigmas educacionais Para tal entendimento, convidamos você a um passeio na con- figuração do que estamos chamando aqui de propósito educativo. Para nortear nosso raciocínio, começamos com a definição do termo propósito. Segundo o Dicio – Dicionário Online de Português (2021), o termo é entendido como “o que se quer alcançar; aquilo que se bus- ca atingir; objetivo”, e também está definido como “grande vontade de realizar ou de alcançar alguma coisa; desígnio”. Então, são lançadas as perguntas: o que se quer alcançar na edu- cação? O que se busca atingir com as práticas educativas? Qual é o objetivo de todo o trabalho que realizamos na escola? Em linhas gerais, as respostas apontariam para a aprendizagem dos alunos, correto? Ou você responderia com “que o conteúdo seja repassado”? Quais os pa- radigmas que norteiam nosso entendimento do propósito do que faze- mos? São paradigmas conservadores, como os relacionados às práticas de transmissão de conhecimento em detrimento da construção, ou são paradigmas inovadores, que relacionam o aprender a um processo pessoal, o qual depende em grande parte do envolvimento de quem deseja aprender com o objeto de estudo? Vamos analisar pelo ponto de vista dos paradigmas inovadores, em consonância com as ideias modernas de educação. É possível afir- mar que o desejo dos professores em relação às suas práticas (pelo menos da maioria dos professores que segue esses paradigmas) é a melhoria do conhecimento dos alunos acerca do que está sendo trabalhado. É o desejo de que a aprendizagem aconteça de fato, com significado. Mas existe realmente uma grande vontade, um empenho real por parte dos educadores, para realizar esse propósito? Conside- re que somente a intenção, o querer realizar, não vale como resposta. É preciso a ação. E para a ação, é preciso ter conhecimento de práticas e de teorias, é preciso sustentar o que se faz. Voltamos ao ponto: é preciso estudar. Assim, propósito é utilizado na educação como um objetivo a ser alcançado, aquilo que se quer realizar, mas que, para se efetivar, pre- cisa da ação. Mas qual a importância de se ter um propósito na vida e no trabalho? Para Cortella (2016), tão relevante quanto respirar é ser o autor da própria vida, decidir o que fazer e principalmente por que fazer. Para o autor, a ideia de propósito está também intrinsecamente ligada à ideia de valores, em que a escolha dos propósitos da vida, a Propósito educativo e desafios cotidianos 19 decisão dessa ou daquela opção, está relacionada aos valores que as pessoas possuem. Vamos ampliar um valor importante atualmente: ter uma profissão e ser bem-sucedido nela. Hoje em dia, diferentemente de tempos atrás, há uma grande movimentação das pessoas para a realização no seu trabalho, que não é visto apenas como um ganha-pão, mas sim como um espaço de realização pessoal, algo que dê sentido à existência hu- mana e, especificamente no caso da educação, algo que possa mudar a vida de outras pessoas. Professor é alguém que ganha a vida ajudando e oportunizando crescimento a outras pessoas (CORTELLA, 2016). Se esse raciocínio se aplica a trabalhos de modo geral, com certeza é mui- to adequado à relação de trabalhar com a docência ou dentro de um ambiente escolar, local por excelência destinado a oportunizar cresci- mento às pessoas. Ocorre que para a escola e, consequentemente, a educação pode- rem cumprir o seu propósito, ele precisa ser conhecido e vivenciado pelos educadores e por todas as pessoas que compõem a equipe peda- gógica. Se consideramos que tal propósito das ações pedagógicas seja a aprendizagem dos alunos, precisamos pensar sobre isso, refletir so- bre a melhor forma de ensinar, questionar nossas escolhas, ter ânimo para prosseguir mesmo quando as coisas não saem bem como esperá- vamos e alterar alguns paradigmas que já se encontram ultrapassados. Nem sempre isso é fácil, e algumas dificuldades podem aparecer nesse processo. Kofman (2018) lista quatro dificuldades que precisam ser enfrentadas quando há a intenção de mudança de paradigma para alcançar um propósito 1 : • Descomprometimento: é impossível fazeros outros se com- prometerem com um projeto educativo moderno e arrojado se você mesmo não estiver 100% comprometido. Um líder precisa estar ciente da sua posição dentro da sua equipe, assim como um professor dentro da sua sala de aula. Comprometer-se com um processo educativo de qualidade é uma premissa que precisa ficar clara para todas as pessoas envolvidas, especialmente para o professor. • Desorganização: para dar certo, um projeto pedagógico inovador precisa que a equipe esteja coesa, partilhe as decisões e, com isso, as vitórias e os fracassos. Se cada pessoa da escola resolve Muitos professores serão também gestores em suas instituições de ensino. Para eles, e para aqueles que acreditam que bons professores devem ser bons líderes, sugerimos a leitura do livro Liderança e propósito: o novo líder e o real sig- nificado do sucesso, que, com histórias e reflexões de líderes, oferece uma grande oportunidade para adquirir informa- ções sobre propósito, liderança e quebra de paradigmas. Kofman, F. Rio de Janeiro: Harper Collins, 2018. Livro No livro citado, Kofman escreve para gestores empresariais; assim, aqui foi feita uma relei- tura das ideias dele no âmbito educacional. 1 20 Novos paradigmas educacionais fazer o trabalho por conta própria, sem se importar com o todo, as consequências dessa desorganização aparecerão como insu- cesso, sensação de desânimo e, com o tempo, talvez abandono da ideia original e volta aos paradigmas antigos. A organização e a coesão de uma equipe escolar são fundamentais para o suces- so do propósito educativo. • Desinformação: é preciso que o gestor escolar garanta que sua equipe tenha toda a informação de que precisa para a análise dos paradigmas latentes na escola e a definição clara do propósito educativo. Não basta receber um material pronto das entidades superiores ou do sistema de ensino do qual a escola faz parte (como Secretarias de Educação ou o próprio Ministério da Educa- ção) e repassar aos professores. É preciso estudar esse material, discutir como tais ideias serão incorporadas no ambiente escolar, viabilizar e otimizar as propostas. Nesse aspecto, a formação con- tinuada é fundamental para os professores, e ela também deve ser feita dentro do ambiente escolar. Sim, professores vão estu- dar o tempo todo, pois a excelência do trabalho educativo passa pela amplitude do conhecimento dos mestres. • Desilusão: alguns professores (e alunos) estampam em seu semblante aparente desilusão com a educação. Há explicações múltiplas para isso, inclusive o trabalho realizado numa equipe que não partilha dos mesmos ideais. Espaços de educação que contêm líderes (ou professores) que minam o comprometimen- to das pessoas, que seguem sendo controladores e arrogantes, promovem verdadeiras ondas de desilusão e podem causar um grande estrago a longo prazo. Quando os alunos seguem a lide- rança de um professor, ou professores seguem a liderança de seus coordenadores e diretores, é porque acreditam nele, e ele deve estar ciente da responsabilidade que exerce nesse contex- to; a desilusão precisa ser identificada e combatida. A equipe escolar precisa vibrar no mesmo tom para alcançar o sucesso de seu propósito. Especificamente sobre a relação de desilusão que quase sempre é acompanhada de desânimo, Cortella (2016, p. 56) destaca: um gestor dentro de uma organização precisa estar muito atento a esses sinais na equipe, não só em si mesmo. Quando se nota que a pessoa está desanimada, é preciso separar aquilo que é resultante da circunstância externa àquele emprego – como uma Propósito educativo e desafios cotidianos 21 crise econômica, por exemplo – do que é um desencanto com o trabalho. A coisa mais gostosa da vida é o encanto, ter um tra- balho encantador. Quando alguém perde esse encanto, que não é o encanto da novidade, mas o da vitalidade, começa a desistir. Não ter desafios é um fator de risco para a motivação. Ampliando a abrangência do texto do filósofo, vamos destacar que um professor também precisa ficar muito atento ao desempenho dos seus alunos, não só na execução do que é pedido a eles, mas na ener- gia que colocam nas suas atividades. O encanto da descoberta, a valo- rização do empenho e a busca por conhecimento precisam fazer parte da realidade das salas de aula, independentemente da disciplina ou do assunto que está sendo trabalhando. Este é o propósito da educação: a busca pelo conhecimento. Vamos analisar os propósitos docentes com base na intencionalida- de da ação do professor. É muito importante que as ações educativas dos professores estejam alinhadas com práticas modernas, atualizadas e que igualmente levem em conta o desenvolvimento das crianças e dos jovens que pretendem educar. É necessário compreender o como se faz (metodologia e intenção das ações educativas), o que se faz (quais são os temas relevantes ao desenvolvimento do meu grupo) e, principal- mente, o por que fazer (quais são os motivos que me levam a realizar essa prática); isso, em linhas gerias, definiria o propósito educativo. O caminho da reflexão é a busca das respostas, sem escolher somente buscar práticas novas sem entender por que as realizar. A diferença está em entender o todo que envolve a aprendizagem: o aprendente, o mediador e a própria relação entre eles e o objeto de aprendizagem 2 . Ou seja, é preciso compreender não apenas a busca por um conhecimento já estabelecido, mas a produção de um conhe- cimento que dependerá das propostas educativas vivenciadas. Para Behrens (2013, p. 55): o desafio […] do todo contamina a educação e instiga os profes- sores a buscarem uma prática pedagógica que supere a frag- mentação e a reprodução do conhecimento. O ensino como produção de conhecimento propõe enfaticamente o envolvimen- to do aluno no processo educativo. A exigência de tornar o sujeito Um livro leve e bem hu- morado sobre propósitos de vida e trabalho é o Por que fazemos o que fazemos? Aflições vitais sobre trabalho, carreira e realização, do filósofo brasileiro Mario Sérgio Cortella. Essa leitura vai prender sua atenção em pontos importantes para reflexão sobre o tema. CORTELLA, M. S. São Paulo: Planeta, 2016. Livro Se propósito é aquilo que se deseja alcançar, o professor deve se perguntar: tenho realmente vontade de fazer um trabalho educativo que realize determinado propósito? Invisto minha energia, meu tempo e minha dedicação em buscas de conteúdos e ações que podem fazer a diferença na formação e aprendizagem dos meus alunos? Para refletir Por objeto de aprendizagem en- tende-se aquilo que se estuda, o que se busca aprender. 2 22 Novos paradigmas educacionais cognoscente 3 valoriza a reflexão, a ação, a curiosidade, o espírito crítico, a incerteza, a provisoriedade, o questionamento e exige reconstruir a prática educativa proposta em sala de aula. A reflexão que se sugere complementa a frase que nomeia esta se- ção: a pergunta, após a leitura do texto, não deve ser mais qual é o pro- pósito docente, mas sim: qual é o seu propósito, docente? A inserção de uma palavra e uma vírgula muda o tom da pergunta e relembra ao professor a importância da compreensão de que ele é professor por algum motivo; ele pode dar uma contribuição única para seu espaço educativo, para a vida das pessoas envolvidas e para a educação como um todo, e esse propósito merece seu melhor esforço. 1.3 Flexibilidade e adaptação docente Vídeo Se fosse convidado a escolher um animal para representar você, qual seria? Um cachorro, pela lealdade ao dono? Um gato gentil e cari- nhoso? Um pássaro que voa livre? Um dinossauro poderoso? Ou talvez uma barata? Podemos apostar que pouquíssimos escolheriam a última opção. Mas leia com atenção: quando os dinossauros habitavam a Ter- ra, eram os maiores predadores. Mas foram eliminados. E as baratas, seres bem menores, sobreviveram. Aliás, elas estavam no mundo antes mesmo dos dinossauros. E estão até hoje 4 . Darwinexplicou em sua teoria que a sobrevivência não era dos mais fortes, e sim dos mais aptos. Olhando por esse ponto de vista até dá para considerar ser representado por uma barata, não é? Um ser que se adaptou com os tempos e sobreviveu. Mas qual a relevância da relação entre baratas e dinossauros para os estudos desta seção? Ora, estamos falando de sobrevivência, e aqui especificamente trataremos de sobrevivência no ambiente de trabalho. Não literalmente, claro, mas na metáfora de que para sobrevivermos no mercado de trabalho, é preciso que sejamos seres adaptáveis e fle- xíveis e, com isso, mesmo com o passar dos tempos, sempre tenhamos no campo educacional professores e gestores adaptados ao tempo em que vivem. A palavra flexibilidade, num sentido figurado e utilizado na proposta deste livro, está sendo entendida como a capacidade das pessoas em compreender opiniões diversas, aceitar pontos de vista diferentes e buscar novas opções em suas ações pedagógicas. A palavra cognoscente aqui é entendida como atributo do sujeito que conhece, que se permite conhecer. 3 Mario Sérgio Cortella cita essa relação de sobrevivência da barata sobre os dinossauros numa entrevista concedida a Brisa Teixeira, do Jornal Gazeta do Povo, em 2017. Disponível em: https://www. gazetadopovo.com.br/educacao/ flexibilidade-e-uma-virtude- -para-o-trabalho-pedagogico- -br5k78aa5zp5akld8oicab0we/. Acesso em: 9 fev. 2021. 4 https://www.gazetadopovo.com.br/educacao/flexibilidade-e-uma-virtude-para-o-trabalho-pedagogico-br5k78aa5zp5akld8oicab0we/ https://www.gazetadopovo.com.br/educacao/flexibilidade-e-uma-virtude-para-o-trabalho-pedagogico-br5k78aa5zp5akld8oicab0we/ https://www.gazetadopovo.com.br/educacao/flexibilidade-e-uma-virtude-para-o-trabalho-pedagogico-br5k78aa5zp5akld8oicab0we/ https://www.gazetadopovo.com.br/educacao/flexibilidade-e-uma-virtude-para-o-trabalho-pedagogico-br5k78aa5zp5akld8oicab0we/ https://www.gazetadopovo.com.br/educacao/flexibilidade-e-uma-virtude-para-o-trabalho-pedagogico-br5k78aa5zp5akld8oicab0we/ Propósito educativo e desafios cotidianos 23 A flexibilidade é, portanto, uma das competências necessárias para o professor da contemporaneidade, uma vez que há um novo cotidia- no sendo construído nas escolas face às transformações vivenciadas na sociedade. Há avanço de tecnologias da informação, há mudança de pensamento e interesse dos alunos, há globalização e acesso fácil à informação e há, com tudo isso, a necessidade da revisão da ação docente, de modo que ela possa acompanhar (ou chegar perto disso) o que acontece na sociedade. Vamos tomar como exemplo a situação vivida no mundo e especi- ficamente no Brasil a partir de março de 2020, em que uma doença, a Covid-19, causada pelo Sars-CoV-2 e chamada de coronavírus, obrigou as escolas a repensarem suas práticas de contato social. Quem poderia imaginar uma situação como essa? Escolas tiveram que flexibilizar suas práticas e suas exigências até que pudessem reestruturar seus traba- lhos pedagógicos. Pela força com que essa situação ficou impressa no mundo todo, certamente teremos ao longo dos anos muito o que falar; por décadas essa situação não será esquecida e será pano de fundo para muitas reflexões na educação. Mas quem vivenciou isso tudo na prática docente precisou repensar e flexibilizar suas ações num perío- do muito pequeno de tempo. Acompanhe a história da professora Shirlei Ventorin (2020), que leciona para o ensino médio. Ela estava participando de uma propos- ta chamada Projetos de Vida, iniciativa em que professores trabalham com os alunos dos três anos do ensino médio. Segundo ela, no primei- ro ano do ensino médio se trabalha principalmente autoconhecimento e identidade do aluno, destacando o que é importante para cada um. A partir do segundo ano o enfoque muda para a relação do aluno ado- lescente com o mundo que o circunda e há a elaboração de um plano de ação que cada aluno cria para si mesmo. No terceiro ano o enfoque é dado ao caminho universitário, acadêmico, com visitas a faculdades, entrevistas e contato com profissionais e a retomada do plano que foi criado no ano anterior para comparação de crescimento ou para manutenção das ideias, de modo que o aluno possa compreender aos poucos a relação do mundo de trabalho que ele vai adentrar quando sair da escola. Ventorin tinha acabado de começar o projeto quando todas as au- las da escola foram mudadas para modelo remoto, em decorrência da pandemia do coronavírus. O pensamento dela foi imediato: havia ne- 24 Novos paradigmas educacionais cessidade de cancelar o projeto, uma vez que entendeu que, como es- sas aulas envolviam assuntos muito pessoais, não seria possível fazê-lo pelos meios digitais (exigência obrigatória por causa da situação), sem, portanto, contato físico e proximidade. Mas não foi bem assim: os alu- nos começaram a mandar mensagem, cobrando da professora a reto- mada do projeto. Com tudo que estava acontecendo, eles precisavam mais do que nunca contar com o apoio da professora e do projeto. E as- sim foi feito. Com o projeto retomado, realizado graças à tecnologia das salas de aula via Classroom 5 , a professora conta que já realizaram um bate-papo com psicólogos e até uma gincana virtual. Nada muito de- morado e nem exaustivo, como pedem as novas configurações de tra- balho virtual – o projeto foi adaptado para uma hora por semana, em que os alunos podem ligar a câmera e há até familiares que participam. Ventorin conta que percebeu que o projeto fez os alunos cresce- rem e os ajudou a passar pelo período de isolamento. Mas a mudan- ça real aconteceu com ela: com a convivência com os adolescentes, passou a entendê-los melhor, compreender suas ações e lembrar que muitas atitudes deles eram semelhantes às que ela tomava quando tinha essa idade. Se você conversar com professores que tiveram que reconfigurar suas aulas por causa da pandemia, vai encontrar muitos exemplos como o da professora Shirlei. Eles retratam o que estamos trabalhando aqui como flexibilização do docente; não só flexibilização das aulas e da metodologia, mas flexibilização das pessoas em sua disponibilidade de pensar diferente. No início, a professora não percebeu que o pro- jeto precisava ser feito mesmo que virtualmente, porque pensou só no projeto. Quando começou a receber pedidos dos alunos, mudou o foco do pensamento para os alunos e aí sim pode compreender como esses encontros verdadeiramente faziam diferença na vida deles e na dela. Por isso, é bom lembrar: todas as escolhas dos professores terão seu custo e seu benefício. Cumpre olhar para essas escolhas com olhos e disposição flexível para ousar, para se adaptar e para sempre fazer uma revisão e uma reflexão sobre elas. Classroom é um recurso da pla- taforma Google que possibilita gerenciamento de conteúdo a distância. 5 Para conhecer a história de Ventorin e seus alu- nos no Projetos de Vida, acesse: https://porvir.org/ com-projetos-de-vida-me- -transformei-como-profissio- nal-e-os-alunos-perceberam/. Acesso em: 9 fev. 2021. Dica https://porvir.org/com-projetos-de-vida-me-transformei-como-profissional-e-os-alunos-perceberam/ https://porvir.org/com-projetos-de-vida-me-transformei-como-profissional-e-os-alunos-perceberam/ https://porvir.org/com-projetos-de-vida-me-transformei-como-profissional-e-os-alunos-perceberam/ https://porvir.org/com-projetos-de-vida-me-transformei-como-profissional-e-os-alunos-perceberam/ Propósito educativo e desafios cotidianos 25 1.4 Desafios cotidianos do trabalho docente Vídeo Se fosse convidado a fazer uma listagem que inclua uma série de desafios que o professor enfrenta para desenvolver seu ofício, o que colocaria? Será que é possível listar quais são os desafios que um pro- fessor enfrenta atualmente para exercer seu trabalho? A lista seria fixa ou variável? Hoje em dia há muitos desafios, e sem dúvidas a lista pre- cisaria estar em constante atualização, mas, mesmo com esse entendimento, há dois temasque sempre estarão presentes na carreira 6 : a atualização profissional e a compreensão da realidade local. A atualização profissional é um ponto fundamental na car- reira de todo professor. E não se trata aqui de falar somente da formação superior básica exigida para exercer a função, e sim da importância de reciclar essa formação constantemente com cursos de capacitação continuada. É preciso destacar aqui as ideias de Antônio Nóvoa (2012), autor conhecido no campo da formação de pro- fessores: não é o acúmulo de cursos que fará o bom professor exercer com maestria sua ação docente, e sim a possibilidade de que esses estudos possibilitem ao professor um refletir sobre suas práticas. Óbvio que uma diversidade de cursos pode formar um professor multifacetado, mas para haver eco desses estudos na atualização de práticas, é preciso que o professor reconheça a importância do que estuda em comparação com a prática que exerce. Do contrário, pode- remos lidar com o profissional que frequenta os cursos sem conseguir aproveitar nada do que foi estudado, sem melhorar sua ação e, com isso, seu profissional. Outra atualização importantíssima diz respeito às políticas públicas, às legislações e aos documentos oficiais, por exemplo, a Base Nacio- nal Comum Curricular (BRASIL, 2018). Como pode um professor não conhecer tal documento? Simples: não pode. A atualização de docu- mentos precisa ser uma exigência do professor. Observe que não es- tamos dizendo que o professor precisa concordar com tudo, e sim que precisa conhecer. O conhecimento ajudará na análise da viabilidade da proposta, na adequação do que está escrito com sua realidade, na efe- tivação da melhoria na educação. 6 Não pretendemos aqui, pela especificidade do tema, esgotar a lista com os itens propostos. Ao contrário, entendemos que essa lista pode ser alterada pe- riodicamente. O que desejamos é refletir sobre esses temas. 26 Novos paradigmas educacionais Destacamos que o conhecimento – inclusive o docente – constrói- -se em hipóteses que se estruturam e se desestruturam. Há certezas que são quebradas e reconfiguradas, há convicções que são restabe- lecidas e que geram outras convicções, que vão ensinando, mudando as pessoas, desenvolvendo-as. É esse movimento que se espera do professor, um movimento de crescimento, amparado pelos estudos diversos que sempre deverão fazer parte da sua vida, não como obri- gação, não como fardo, mas como parte da essência de ser professor (MIZUKAMI, 2002). Com relação à compreensão da realidade local, não se esqueça de que a escola faz parte de uma realidade local e que ela precisa ser, além de respeitada, considerada como parte importante nos projetos pedagógicos. A cultura do local onde a escola está inserida é um grande ponto a ser considerado pelo professor. Em linhas gerais, não se trata de restringir as ações em função de a escola estar nessa ou naquela comunidade, mas de agregar conhecimento ao estilo de vida daquele local, e não criar entre escola e sociedade um muro de separação. A escola deve abrir suas portas e derrubar suas paredes não ape- nas para que possa entrar o que se passa além de seus muros, mas também para misturar-se com a comunidade da qual faz parte. Trata-se, “simplesmente”, de romper o monopólio do saber, a posição hegemônica da função socializadora, por parte dos professores, e constituir uma comunidade de aprendizagem no próprio contexto. (IMBERNÓN, 2000, p. 85) Considerar a cultura do local onde a escola está faz com que profes- sores redefinam o sentido social do seu trabalho, dando destaque nas suas competências a um necessário saber se relacionar – nesse caso, com os outros (NÓVOA, 2012). Analisando esse ponto de vista, numa escola em que as pessoas se relacionam bem com a comunidade, que tem projetos de parceria e em que uma parte acredita na outra, abrem- -se as portas para uma aprendizagem de verdade, real. Essa necessidade de relacionamentos com o externo, aqui aponta- do como a comunidade que circunda o ambiente escolar, faz com que a escola possa cumprir seu papel de educação verdadeira, que não se- para saberes da vida e saberes escolares e retira do ambiente escolar aquela aura de saber enclausurado, de não pertencimento. O fato é que entre comunidade (com destaque para as famílias dos alunos) e escola deve haver um elo de parceria, de respeito e de crescimento Propósito educativo e desafios cotidianos 27 mútuo. A parceria tem que servir para a escola poder apresentar seus objetivos, solicitar (e agradecer) apoio e explicar qual a relevância das ações pedagógicas realizadas. Claro que, ao abrir as portas para a co- munidade, a escola também fica mais vulnerável (e mais verdadeira), uma vez que aceita receber as críticas, os pedidos e a análise de quem vê a realização da tarefa educativa por outro ângulo. Não podemos esquecer que os pais também têm expectativas, e quanto mais a es- cola considerá-las, mais sucesso vai ter na sua empreitada. Por isso, podemos dizer que, ao ouvir sua comunidade, a escola se torna mais vulnerável a diferentes pontos de vista, mas essa vulnerabilidade não é ruim; é uma reconstrução de caminho, de função educativa e de função social do professor. A parceria com as comunidades não torna a escola menor (ou tira dela a autonomia), apenas a torna verdadeira, uma me- diadora cultural e organizadora de situações educativas que levam em conta que ela precisa do outro para realizar seu papel (NÓVOA, 2012). Vamos ao desafio: o que você conhece da escola dos seus filhos? Da escola em que você trabalha? Da escola do seu bairro? Conhecer aquele que se pretende educar e o local onde essa educação se dará parece ser uma alternativa segura e de qualidade para fundamentar as práticas educativas? As perguntas aqui listadas têm como função provocar você para a parceria, incluindo na reflexão um aspecto relevante: não basta só aproximar a comunidade da escola, é preciso conhecer essa comuni- dade. Acompanhe esta história: uma empresa cria uma linha nova de calçados e manda dois vendedores para locais diferentes na tentativa de vender seus produtos. Depois de um tempo, recebe duas comuni- cações diferentes dos vendedores. O primeiro afirma: “não vamos con- seguir vender nada, aqui ninguém usa sapatos”. O segundo, animado, diz: “nós vamos vender muito nesse local, ninguém ainda usa sapatos”. Ora, se eram dois vendedores com o mesmo potencial, vendendo o mesmo produto em comunidades parecidas, o que mudou? O olhar do vendedor e a percepção de que era possível vencer os obstáculos e transformá-los em possibilidades com o conhecimento da realidade em que o negócio seria feito. Agora vamos trazer isso para o campo educativo. Imagine que a es- cola é uma empresa e que você precisa vender um determinado produ- to a um cliente; qual seria uma das melhores formas de fazer isso? Se você usou a lógica do vendedor de sapatos e disse: “conhecendo meu Escola e comunidade podem formar uma grande parceria. Para isso, a escola precisa propor alternativas interessantes para que a comunidade se perceba bem-vinda no ambiente escolar e possa de fato ajudar a instituição no projeto educativo. Quer algumas dicas de ações que podem aumentar a parceria da sua escola? Acesse: https://gestaoescolar.org.br/ conteudo/2175/escola-e-comu- nidade-9-acoes-para-comecar- -uma-boa-parceria. Acesso em: 13 nov. 2020. Saiba mais Preciosa é um filme que discute a importância da relação entre uma aluna e uma professora. Parece simples, mas é recheado de surpresas e de realidade e ensina que um bom professor, que conhece a realidade dos seus alunos, e uma boa proposta educativa podem fazer diferença na vida das pessoas, especialmente daquelas que mais precisam. Direção: Lee Daniels. Estados Unidos: Playarte Pictures, 2009. Filme https://gestaoescolar.org.br/conteudo/2175/escola-e-comunidade-9-acoes-para-comecar-uma-boa-parceria https://gestaoescolar.org.br/conteudo/2175/escola-e-comunidade-9-acoes-para-comecar-uma-boa-parceriahttps://gestaoescolar.org.br/conteudo/2175/escola-e-comunidade-9-acoes-para-comecar-uma-boa-parceria https://gestaoescolar.org.br/conteudo/2175/escola-e-comunidade-9-acoes-para-comecar-uma-boa-parceria 28 Novos paradigmas educacionais público e suas necessidades”, acertou. Essa é uma forma incrível de fazer a educação dar certo. Por isso, outro ponto que merece destaque na ação profissional é a realização de pesquisas que indiquem quais os desafios que são en- frentados por determinada escola em determinado local. E isso varia de escola para escola, claro. Vamos buscar pesquisas que nos apontem por que os alunos fracassam e o que precisamos alterar para que tenham sucesso – em que pese que a condição social muitas vezes influencia o desenvolvimento da parte educacional. Conhecer a realidade específica do local onde a escola está dará mais chances de a educação ser ver- dadeira e, com isso, respeitada. As escolas têm episódios de violência e indisciplina e apresentam índices de desigualdade, mas todos esses fenômenos podem ser estudados e pesquisados pela escola para fun- cionarem como combustível de crescimento, não de acomodação. Muitos dos desafios que o professor encontrará em seu cotidiano serão objetos de seu aprendizado e crescimento como profissional, desde que resultem em reflexão. Não basta passar pelas dificuldades; é preciso aprender com elas. Estudar, comparar, analisar os aconteci- mentos e conhecer a realidade em que se pretende educar são cami- nhos eficientes na busca de diminuição de problemas e efetivação de um excelente projeto educativo. Vamos encerrar este capítulo com uma frase, deixando aqui um es- paço para reflexão e relembrando o compromisso que o professor tem na construção do seu caminho profissional: “Ouça sempre. A experiên- cia tem valor, mas esteja atento a essa verdade pétrea […]: bons conse- lhos podem ser úteis, mas seu caminho será construído exclusivamente por você” (KARNAL, 2012, p. 16). Pense nisso! CONSIDERAÇÕES FINAIS Esperamos a esta altura do capítulo que você tenha se questionado, concordado e, também, discordado. Certamente essas páginas serviram para reflexão sobre o tema proposto. Esse é o caminho para a mudança de paradigmas, para a alteração dos modelos mentais que por muito tem- po fizeram a escola ser da mesma forma, sem considerar a necessidade da mudança, do fazer diferente. É preciso resgatar o real propósito da educação, da escola e dos pro- fissionais. Por que estamos fazendo esse trabalho? Qual é o caminho mais Antônio Nóvoa é um dos autores mais respeitados quando o assunto é formação de professores. Suas reflexões sobre o tema são sempre perti- nentes e desafiadoras. Recomendamos a leitura da obra do autor como um todo, mas aqui o destaque vai para o livro Formação de professores e trabalho pedagógico. NÓVOA. A. Lisboa: Educa, 2012. Livro Propósito educativo e desafios cotidianos 29 acertado? Será que existe um só caminho? As dúvidas não se encerram e nem podem acabar. São elas que em primeira instância inquietarão o pro- fessor e o farão avançar. Essa inquietude pode resultar num crescimento formidável. A flexibilização docente também é um ponto importante a se desta- car para que o profissional pense de maneira diferente, permita-se tes- tar novas possibilidades metodológicas e conheça diferentes alternativas teóricas. O professor precisa se adaptar às exigências de uma sociedade cada vez mais plural. Observe que é preciso antes de tudo considerar a necessidade dessa adaptação para a mudança que se deseja. Mas crescer e mudar requer esforço, dedicação, estudo e conheci- mento da realidade. A atividade docente, e seus desafios, é uma ativida- de profissional – por mais que haja grande relação de afetos, ela precisa ser desenvolvida por quem entende do assunto. O desafio maior é e sempre será de estudo, de capacitação e de profissionalização cada vez maior dos professores. ATIVIDADES 1. O que quer dizer propósito e como esse conceito é aplicado no campo da educação? 2. Há muitos paradigmas que circundam a prática profissional, e muitos deles acabam por impedir o avanço de atividades docentes mais modernas. O que o professor precisa fazer para superá-los? 3. Como a formação continuada pode ser considerada um desafio presente no cotidiano do professor? REFERÊNCIAS BEHRENS, M. A. O paradigma emergente e a prática pedagógica. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2013. BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, DF: Ministério da Educação, 2018. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_ versaofinal_site.pdf. Acesso em: 9 fev. 2021. CORTELLA, M. S. 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Estavam os dois rapazes formados, desempregados e sem dinheiro para pagar o aluguel daquele mês. Precisavam ganhar algum dinheiro rapidamente e tiveram a ideia de inflar três colchões de ar e alugar um quarto em seu apartamento, visto que havia uma demanda de hospedagem na cidade em que moravam por conta de os hotéis estarem lota- dos naquele fim de semana. Essa história é verídica e aconte- ceu em 2008, na cidade de São Francisco, nos Estados Unidos. O projeto iniciado ali foi chamado de Air Bed & Breakfast, numa tradução livre “cama de ar e café da manhã”. Deu certo e eles re- ceberam um bom dinheiro na continuidade da proposta, a qual só se iniciou porque entenderam que havia uma outra forma de conceber hospedagem, diferente daquela que era praticada. O novo formato de hospedagem oferecido pelos recém- -formados rompeu com os paradigmas propostos do que se entendia como hospedagem até então. Romper com o que já existe e inovar. Essa é a proposição discutida ao longo desse capítulo, sob o ponto de vista da educação. A disrupção pode ser um caminho interessante e real para mudanças e cresci- mento e, dentro dessa ótica, convidamos você a pensar so- bre uma escola diferente, propostas pedagógicas inovadoras, uso de tecnologias na escola e, principalmente, em mudar seu mindset, repensar as suas escolhas metodológicas e otimizar o processo de ensino-aprendizagem. 32 Novos paradigmas educacionais 2.1 Educação disruptiva Vídeo O termo disruptivo indica uma ruptura, uma interrupção. Contudo, neste capítulo, a disrupção não será considerada no sentido de que alguma coisa seja interrompida e tenha fim, mas sim de que a inter- rupção de determinado ciclo é seguida do começo de outro. A questão é que o novo início precisa ser diferente do que vinha sendo feito. Sob essa ótica, a disrupção, então, está associada à ideia de mudança, de al- teração e principalmente de inovação. Em outras palavras, ao abordar- mos o termo sob esse ponto de vista, não estamos pensando apenas em romper ou interromper algo que vinha sendo feito, mas que essa interrupção precisa ter a função de permitir uma inovação. Não dá para romper e continuar fazendo a mesma coisa, é preciso romper e ousar inovar. Chamamos, então, de inovação disruptiva. A ideia de inovação disruptiva foi proposta na década de 1990 por Clayton Christensen, professor de Administração na Harvard Business School, e é embasada na ideia de que é preciso fazer diferente para ino- var e romper com o estabelecido. Fazer diferente de tudo que vinha sen- do feito e usar a tecnologia como elemento propulsor do seu sucesso é a proposta de inovar com disrupção (CHRISTENSEN; HORN; JOHSON, 2012). Vamos considerar a seguinte situação: supondo que desejemos fa- zer uma viagem ao continente europeu, há que considerar um bom planejamento e uma reserva considerável de recursos. É preciso prever que investimento será necessário para a concretização da viagem e um dos gastos mais efetivos, sem dúvida, será com a hospedagem. Aqui, no nosso exemplo, focaremos apenas nesse gasto, para contextualizar uma inovação que nasceu após uma ruptura. Convidamos você a fazer uma pequena busca em sites de reserva de hotéis das cidades europeias que deseja visitar. A ideia é pesquisar para fazer um panorama de valores. Então, dê uma paradinha na lei- tura deste texto e realize essa pesquisa em um site de busca. Quanto custa, por exemplo, se hospedar em hotéis da cidade de Paris? Fez a pesquisa? Ficou impactado com os resultados? Já havia previs- to? E se você pudesse reduzir os gastos em hospedagem? Na maioria dos casos isso impactaria em uma economia de valores que poderiam ser destinados a outras diversões na viagem, não acha? E se a sua hospedagem pudesse ser realizada num daqueles colchões de ar do A vida presente na escola 33 exemplo dado no início do capítulo? Fique tranquilo que não estamos propondo isso. A ideia aqui é dar significado ao conceito de disrupção, que envolve rompimento e inovação. Voltemos ao exemplo que inicia este capítulo e apresenta dois jovens recém-formados com um problema financeiro. Ao alugar um quarto com colchões de ar em seu apartamento, eles, além de arranjar uma forma de ganhar dinheiro, romperam com o estabelecido e criaram um modo inovador de conceber o que se entendia por hospedagem du- rante uma viagem. Sim, porque até aquele momento só se pensava em hospedagem (que não fosse na casa de amigos ou parentes, ob- viamente) em hotéis. Acontece que essa ideia inicial de disponibilizar hospedagem no apartamento deles se transformou em uma empresa conhecida e respeitada (e utilizada) em quase todos os lugares do pla- neta. Uma empresa que vale aproximadamente 25 bilhões de dólares (SALOMÃO, 2017). Se você não a identificou pelo nome, provavelmente reconhecerá estas letras: AIRBNB – Air Bed & Breakfast; lembra? O modelo de hospedagem proposto pelo Airbnb conecta consumi- dores que desejam alugar um espaço, por curto período, aos donos dos locais para essa hospedagem. Tudo isso feito por meio de um site re- conhecidamente seguro, com presença em quase todos os lugares do mundo. Alguns números impressionam: em 2017, o relatório do Airbnb indicava que haviam disponibilizados mais de 3 milhões de anúncios (de casas, quartos, apartamentos e até castelos) em mais de 65.000 cidades distribuídas em mais de 191 países. A isso correspondem mais de 180 milhões de visitantes nas listagens da empresa em todo o mun- do. No Brasil, segundo dados de 2017, a comunidade do Airbnb con- tava com cerca de 123.000 anúncios, sendo que no ano anterior, em 2016, registrou a chegada de mais de um milhão de hóspedes no país (SALOMÃO, 2017). Assim, perceba como uma ideia inovadora de hospe- dagem também ajudou a desenvolver o turismo. Só para valer o desafio, que tal comparar a pequena pesquisa de hospedagem em hotel a qual foi desafiado a fazer com os valores prati- cados pelo Airbnb na mesma cidade? Há diferenças nos valores? Claro que é preciso compreender que há diferenças também na oferta uma vez que são hospedagens diferentes. Não é o caso aqui de comparar as facilidades ou vantagens de uma ou outra hospedagem. Estamos somente destacando que são propostas diferentes para um mesmo fim. A ideia de que durante uma viagem de lazer a hospedagem só 34 Novos paradigmas educacionais podia ser realizada em hotéis foi rompida e inovada com a proposta de hospedagem em casas de famílias. Como toda proposta diferente, algumas vão agradar um público, outras vão agradar outro. É normal que seja assim. Não se pretende, neste capítulo, direcionar você, leitor, a entender o quão vantajoso é este ou aquele formato de hospedagem; isso é muito particular. A ideia é só fazê-lo pensar que há sempre um outro jeito de fazer as coisas, aqui representado pelo exemplo da hospedagem em outro continente. Ao romper com o que era normal, com o que era estabelecido, os rapa- zes conseguiram criar um negócio muito lucrativo que é reconhecido e utilizado em todo o mundo, além de revolucionarem a forma de fazer alguma coisa, no caso, de hospedar pessoas. Amplie o pensamento em direção à disrupção: há sempre outra maneira de romper com o que está sendo feito e fazer diferente e, ao fazê-lo, podem surgir grandes inovações, como foi o caso do exemplo apresentado. Mas o que isso tem a ver com a educação? Na essência, tem tudo a ver. Estamos falando de romper com práticas estabelecidas e tidas como normaispara recriar uma outra forma de fazer. Essa é a proposta da disrupção que vai ao encontro da demanda de atualização, de ino- vação, de práticas modernas de que carece a educação. O conceito de inovação disruptiva, dessa forma, invade o campo educacional e apre- senta uma nova ótica: a educação disruptiva. Um dos maiores exemplos que temos de educação disruptiva é a Escola da Ponte, em Portugal, que rompeu com as bases de uma educação tradicional ao eliminar classes, séries e disciplinas, integrando os alunos em salas únicas e baseando a aprendizagem partindo do interesse deles. Essa escola revolucionou o formato da aprendizagem ao reformular sua proposta pedagógica e até hoje é exemplo para muitas outras escolas. É importante frisar aqui que romper com o já estabelecido não sig- nifica dizer que tudo na educação precisa ser esquecido ou descartado. Isso depende do local onde você está, do objetivo do rompimento. O que pretendemos com a educação disruptiva é romper com práticas tradicionais estabelecidas, as quais ainda imperam na escola e levam sempre a resultados iguais (muitas vezes que não são mais satisfató- Sobre a Escola da Ponte, há muito material produzido, mas uma boa referência é uma entrevista do criador dessa ideia, José Pacheco, que foi diretor da escola e responsável pela dis- rupção. Disponível em: https://novaescola. org.br/conteudo/335/jose- pacheco-e-a-escola-da-ponte. Acesso em: 9 fev. 2021. E também o livro A escola com que sempre sonhei sem imaginar que pudesse existir, escrito por Rubem Alves, que trata da visita do autor à escola. ALVES, R. 11. ed. São Paulo: Papirus, 2008. Leitura https://novaescola.org.br/conteudo/335/jose-pacheco-e-a-escola-da-ponte https://novaescola.org.br/conteudo/335/jose-pacheco-e-a-escola-da-ponte https://novaescola.org.br/conteudo/335/jose-pacheco-e-a-escola-da-ponte A vida presente na escola 35 rios para as necessidades do mundo contemporâneo) e ousar em no- vas possibilidades. Não se trata também de considerar a educação disruptiva apenas como um conjunto de práticas novas; seria muito mais coerente dizer que ela é uma possibilidade de repensar (e refazer) tudo que envolve o processo de ensinar e aprender: as práticas metodológicas, os concei- tos, os conteúdos, o uso das tecnologias no ambiente escolar, enfim, a educação como um todo. Mas só repensar não adianta, é preciso rom- per, ousar e fazer! Essa é a ideia presente quando utilizamos o conceito em questão: é preciso olhar para os elementos que compõem um processo educativo sob a ótica da análise e assim verificar o que não está funcionando, o que pode ser mudado, interrompido e redirecionado, o que precisa ser modernizado e de que modo a inovação pode fazer parte da realidade existente. Disrupção, então, está intrinsecamente ligada à inovação. O rompimento acontece para dar lugar à inovação. Sobre inovação é preciso destacar: inovar não é necessariamente fazer algo que nunca foi feito em lugar nenhum. É fazer algo diferen- te na sua realidade. Mas o diferente para uma escola pode já ser o cotidiano de outra, percebe? Há muitas escolas que se inspiraram na Escola da Ponte, por exemplo, e igualmente obtiveram sucesso. Outras escolheram modelos diferentes que também deram certo. O importante é considerar que temos muita disparidade (de educação, de recursos, de qualidade educativa) entre as escolas brasileiras e, por isso, algumas são mais avançadas em práticas mais modernas de educação, assim podemos aprender com quem faz melhor do que já fazemos. Desse modo, não é preciso que a escola esteja sempre criando, em- bora, obviamente, é muito interessante a escola criar um modelo seu para educar. No entanto, às vezes as escolas precisam de ajuda para inovar, para criar, ou pelo menos para começar a inovar e a criar. Então, lembre-se: o que é inovação em uma escola, pode ser prática em outra. Em outras palavras, dá para aprender com os exemplos de sucesso que temos por aí. Só precisamos encontrá-los, estudá-los e colocá-los em prática. Perceba a importância da formação continuada do professor, da leitura, da pesquisa, as quais vão possibilitar que o docente encontre essas diferentes práticas e partilhe com colegas experiências diversas. Mudar por quê? Pense que se fizermos tudo do mesmo jeito, teremos sempre o mesmo resultado; essa é a lógica natural. Agora, foque nos resultados. Eles estão bons? Se os resultados não estão bons, será necessário alterar o modo de fazermos as coisas para chegar aos novos resultados tão desejados. Isso faz sentido para você? Para refletir A proposta do livro Inova- ção na sala de aula: como a inovação disruptiva muda a forma de aprender é ampliar os horizontes do professor para que ele possa compreender como acontece uma edu- cação disruptiva, conside- rando a tecnologia como primordial para promover um ensino mais persona- lizado e moderno e com isso refletir sobre formas de superar alguns dos desafios da educação. CHRISTENSEN, C. M.; HORN, M. B.; JOHNSON, C. W. Porto Alegre: Bookman, 2012. Livro 36 Novos paradigmas educacionais Um dos pontos de maior destaque de inovação na esfera educa- cional e, por consequência, na educação disruptiva diz respeito ao uso de tecnologias. Todos concordamos que há vários anos as tecnologias revolucionam nossa forma de viver, estando presentes na nossa vida cotidiana. Se há tecnologias na vida, não há como imaginar que elas não estejam presentes na escola em projetos pertinentes. A questão não é a presença, é o bom uso. Acompanhe este exemplo: até aproximadamente duas décadas atrás, as aulas eram sempre ministradas pelo trio professor, quadro e giz; com a evolução, passaram a ser apresentadas aos alunos em trans- parências de retroprojetor e posteriormente em slides. Sem dúvida, foi uma evolução para a apresentação do conteúdo e essa evolução é bem-vinda. Aliás, não poderia ser diferente; se os recursos evoluem, é fundamental que o ambiente escolar faça uso deles. Então, atente-se para esta afirmação: evolução não é necessariamente disrupção. É preciso especial atenção para que o conceito de educação disruptiva não se confunda com o de evolução. Evolução é o processo de melhoria natural das coisas, o curso normal das práticas; disrupção é o rompi- mento de práticas ineficazes. Acontece que, numa grande parte dos casos, mesmo evoluindo no recurso, a apresentação dos conteúdos continua sendo feita da mesma maneira, como no exemplo do parágrafo anterior. Não houve ruptura com o modelo de aula expositiva (professor explicando e apre- sentando o conteúdo), somente uma evolução do meio de fazer isso. A essência do trabalho pedagógico continuou a mesma, mas agora com o professor explicando o que aparece nas telas do computador. Então, teoricamente continua o mesmo modus operandi 1 : o professor repassa ou apresenta as informações. E nos tempos atuais é isso que precisa ser questionado. De modo geral, é facilmente perceptível na prática que os resul- tados de aprendizagem da educação brasileira não melhoraram só porque os professores passaram a dar aulas usando telas de com- putador. Mas os testes são reveladores desse deficit: no ranking da avaliação do PISA (programa internacional de avaliação de estudan- tes, sigla em inglês), que avalia as habilidades dos alunos de leitura, matemática e ciências, o Brasil está em 57º lugar entre 79 países avaliados (O QUE…, 2019). Professores devem partilhar sua prática pedagógica em cursos e congressos, porque assim, além de refletirem sobre o que fazem, podem aprender com o fazer de outros profissionais e conhecer novas teorias. Qual é a importância dessa participação na sua opinião? Agora reflita: quantas vezes você já participou destes eventos? E profissionais da sua escola já apresentaram alguma experiência pedagógica nessas ocasiões? O que falta para mais professores participarem de eventos pedagógicos? Para refletir Muitos professores desejam realizar
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