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1 Júlia Morbeck – @med.morbeck Objetivos • Rever a morfofisiologia do pênis (focar no mecanismo fisiológico da ereção). • Compreender a epidemiologia, etiologia, fatores de risco, fisiopatologia, diagnóstico e tratamento da disfunção erétil). • Discutir o preconceito envolvido na sexualidade do idoso. Pênis ↠ O pênis contém a uretra e é uma passagem para a ejaculação do sêmen e a excreção de urina. Ele tem uma forma cilíndrica e é composto por um corpo, uma glande e uma raiz (TORTORA, 14ª ed.). ANATOMIA ↠ O corpo do pênis é constituído por três massas cilíndricas de tecido, cada uma circundada por tecido fibroso chamado de túnica albugínea. As duas massas dorsolaterais são chamadas de corpos cavernosos do pênis. A massa médio-ventral menor, o corpo esponjoso do pênis, contém a parte esponjosa da uretra e a mantém aberta durante a ejaculação. A pele e uma tela subcutânea envolvem todas as três massas, que consistem em tecido erétil (TORTORA, 14ª ed.). ↠ A extremidade distal do corpo esponjoso do pênis é uma região um pouco aumentada, em forma de bolota, chamada de glande do pênis; a sua margem é a coroa. A uretra distal aumenta no interior da glande do pênis e forma uma abertura terminal em forma de fenda, o óstio externo da uretra (TORTORA, 14ª ed.). ↠ Recobrindo a glande em um pênis não circuncidado está o frouxamente ajustado prepúcio do pênis (TORTORA, 14ª ed.). ↠ A raiz do pênis é a porção de inserção (porção proximal). Consiste no bulbo do pênis, a continuação posterior expandida da base do corpo esponjoso do pênis, e o ramo do pênis, as duas porções separadas e cônicas do corpo cavernoso do pênis. O bulbo do pênis está ligado à face inferior dos músculos profundos do períneo e é fechado pelo músculo bulboesponjoso, um músculo que auxilia na ejaculação. Cada ramo do pênis se dobra lateralmente para longe do bulbo do pênis para se inserir no ísquio e ramo púbico inferior, e é circundado pelo músculo isquiocavernoso (TORTORA, 14ª ed.). ↠ O peso do pênis é suportado por dois ligamentos que são contínuos com a fáscia do pênis. O ligamento fundiforme do pênis surge a partir da parte inferior da linha alba. O ligamento suspensor do pênis surge a partir da sínfise púbica (TORTORA, 14ª ed.). HISTOLOGIA ↠ O tecido erétil é composto por diversos seios sanguíneos (espaços vasculares) revestidos por células endoteliais e circundados por músculo liso e tecido conjuntivo e elástico (TORTORA, 14ª ed.). ↠ A maior parte da uretra peniana é revestida por epitélio pseudoestratificado colunar, que na glande se transforma em estratificado pavimentoso. Glândulas secretoras de muco (glândulas de Littré) são encontradas ao longo da uretra peniana (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2017). ↠ O prepúcio é uma dobra retrátil de pele que contém tecido conjuntivo com músculo liso em seu interior. – 2 Júlia Morbeck – @med.morbeck Glândulas sebáceas são encontradas na dobra interna e na pele que cobre a glande (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2017). MECANISMO DE EREÇÃO DO PÊNIS ↠ Em sua forma mais simples, o reflexo da ereção inicia com estímulos táteis detectados por mecanorreceptores da glande do pênis ou de outras zonas erógenas (SILVERTHORN, 2017). ↠ Os neurônios sensoriais sinalizam para o centro integrador espinal, o qual inibe o estímulo vasoconstritor simpático sobre as arteríolas do pênis. Simultaneamente, o óxido nítrico produzido por estímulo parassimpático dilata ativamente as arteríolas do pênis. À medida que o sangue arterial flui para os espaços abertos do tecido erétil, este comprime passivamente as veias e aprisona o sangue. O tecido erétil torna-se túrgido, enrijecendo e aumentando o tamanho do pênis dentro de 5 a 10 segundos (SILVERTHORN, 2017). ↠ O clímax do ato sexual masculino coincide com a emissão e a ejaculação (SILVERTHORN, 2017). Após a estimulação sexual (visual, tátil, auditiva, olfatória ou imaginada), fibras parassimpáticas da porção sacral da medula espinal iniciam e mantêm uma ereção, o alargamento e o enrijecimento do pênis. As fibras parassimpáticas produzem e liberam óxido nítrico (NO). O NO faz com que o músculo liso das paredes das arteríolas que irrigam o tecido erétil relaxe, o que possibilita que estes vasos sanguíneos se dilatem (TORTORA, 14ª ed.). 3 Júlia Morbeck – @med.morbeck Os impulsos neurais para o tônus da musculatura lisa são fundamentais para o início e a manutenção de uma ereção. Também há interação complexa entre as células da musculatura lisa dos corpos cavernosos e seu revestimento de células endoteliais sobrejacentes. O óxido nítrico, que induz relaxamento vascular, promove a ereção e é antagonizado pela endotelina 1 (ET-1) e pela Rho-cinase, que medeiam a contração vascular. O óxido nítrico é sintetizado a partir de L-arginina pelo óxido nítrico-sintase e liberado do estoque nervoso autônomo não adrenérgico não colinérgico (NANC), atuando sobre as células musculares lisas com estimulação pós-juncional. O óxido nítrico aumenta a produção de 3′,5′-monofosfato de guanosina cíclico (GMPc), que relaxa a musculatura lisa. O GMPc é degradado gradualmente pela fosfodiesterase tipo 5 (PDE-5). Os inibidores da PDE-5, como os medicamentos orais sildenafila, vardenafila e tadalafila, mantêm ereções por meio de redução da degradação do GMP cíclico. No entanto, se o óxido nítrico não for produzido em algum nível, os inibidores da PDE-5 deixam de ser eficazes, uma vez que tais fármacos facilitam, mas não desencadeiam, a cascata enzimática inicial. Além do óxido nítrico, prostaglandinas vasoativas (PGE1, PGF2α) são sintetizadas no interior do tecido cavernoso e elevam os níveis de monofosfato de adenosina (AMP) cíclico, levando também ao relaxamento das células musculares lisas cavernosas (JAMESON et al., 2019). Disfunção erétil A disfunção sexual pode ser dividida em quatro categorias principais: (1) perda do desejo (libido), (2) disfunção erétil, (3) insuficiência ejaculatória e (4) estados anorgásmicos (GOLDMAN; SCHAFER, 2022). ↠ A disfunção erétil pode ser definida como incapacidade de um homem de obter rigidez suficiente para possibilitar o coito de duração adequada para satisfazer a si próprio e à(ao) parceira(o) (GOLDMAN; SCHAFER, 2022). ↠ A DE não constitui uma doença, mas sim, uma manifestação sintomatológica de patologias isoladas ou associadas (SARRIS et al., 2016). EPIDEMIOLOGIA ↠ A disfunção sexual masculina afeta 10 a 25% dos homens de meia-idade (JAMESON et al., 2019). ↠ A DE tem alta prevalência em idosos, sendo considerada a principal causa de disfunção sexual e com aumento diretamente proporcional à idade (afeta 67% dos idosos com mais de 70 anos); entretanto, menos de 5% dos homens recebem tratamento, muitas vezes em razão da não abordagem do assunto pelo paciente e/ou pelo médico (DINIZ et al., 2019). ↠ A DE é a mais comum disfunção sexual que acomete homens após os 40 anos – estima-se que mais de 100 milhões de homens no mundo tenham algum grau de DE (DINIZ et al., 2019). ↠ Três grandes estudos epidemiológicos sobre a DE foram feitos no Brasil. O primeiro deles, realizado em 2000, foi o Estudo do Comportamento Sexual do Brasileiro (ECOS) que contou com uma amostra de 2835 indivíduos, maiores de 18 anos e residentes em 7 cidades brasileiras. Dentre 1332 homens, 46,2% queixaram-se de DE. O segundo, o Estudo da Vida Sexual do Brasileiro (EVSB), conduzido entre 2002 e 2003, analisou 2862 homens com mais de 40 anos de idade, dentre os quais a taxa de DE foi de 45,1%. O último estudo, realizado em 2006, denominado de Estudo Populacional do Envelhecimento (EPE), entrevistou 5751 homens com mais de 40 anos provenientes de 18 capitais e do Distrito Federal. Como resultado, 43,6% da amostra apresentava DE. (SARRIS et al., 2016).↠ De acordo com os estudos pode-se admitir, portanto, que o valor em torno de 50% represente a prevalência da DE em homens acima dos 40 anos. Isso significa, em 4 Júlia Morbeck – @med.morbeck termos da população brasileira, aproximadamente 16 milhões de homens (SARRIS et al., 2016). FATORES DE RISCO ↠ Uma série de fatores interferem negativamente nesse mecanismo e estão associados à DE, tais como hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus, tabagismo, dislipidemia, doenças neurológicas, distúrbios hormonais, uso crônico de alguns medicamentos e distúrbios psicológicos (SARRIS et al., 2016). ETIOLOGIA ↠ As causas de DE podem ser classificadas como de etiologia psicológica, orgânica ou ainda uma combinação de ambas. As causas psicogênicas mais comuns incluem ansiedade de desempenho, transtornos psiquiátricos (ansiedade e depressão) e conflitos no relacionamento. Entre os fatores orgânicos, encontram-se causas vasculares, endócrinas, neurológicas, relacionadas a drogas e a intervenções urológicas (SARRIS et al., 2016). ↠ A DE pode ter causas vasculares (DM, HAS, dislipidemia, doença coronariana e cerebrovascular, pós- radioterapia, tabagismo), neurogênicas (doença de Parkinson, esclerose múltipla, demências em geral, etilismo, pós-prostatectomia), anatômicas (fratura peniana e doença de Peyronie), endócrinas (hipertireoidismo, hipotireoidismo, hiperprolactinemia e deficiência de testosterona, havendo controvérsia quanto a esta última como causa isolada de DE), psicogênicas (transtornos ansiosos e depressivos), medicamentosas ou mistas (DINIZ et al., 2019). Os idosos, ao contrário dos jovens, costumam apresentar mais fatores orgânicos que psicogênicos, sendo comum a presença de DE por etiologia mista (DINIZ et al., 2019). FISIOPATOLOGIA ↠ A DE pode advir de três mecanismos básicos: (JAMESON et al., 2019). • dificuldade de iniciação (psicogênica, endócrina ou neurogênica); • dificuldade de enchimento (arteriogênica); • dificuldade de manutenção de um volume sanguíneo adequado dentro da rede lacunar (disfunção venoclusiva). Essas categorias não se excluem mutuamente, e múltiplos fatores contribuem para DE em muitos pacientes. Por exemplo, a redução na pressão de enchimento pode acarretar extravasamento venoso secundário. Frequentemente, os fatores psicogênicos coexistem com outros fatores etiológicos e devem ser considerados em todos os casos. Causas diabéticas, ateroscleróticas e relacionadas com drogas são responsáveis por mais de 80% dos casos de DE em homens idosos (JAMESON et al., 2019). VASCULOGÊNICA ↠ A doença traumática arterial, a aterosclerose e a hipertensão arterial sistêmica (HAS) estão entre as principais causas de DE vasculogênica (SARRIS et al., 2016). A HAS pode estar diretamente relacionada à diminuição da quantidade de óxido nítrico (NO), substância essencial para a ereção peniana. A associação entre DE e HAS é muito complexa e pode envolver outros aspectos, como a interferência hemodinâmica provocada pela utilização de medicamentos anti-hipertensivos (SARRIS et al., 2016). ↠ A causa orgânica mais comum de DE é um distúrbio do fluxo sanguíneo de entrada e de saída do pênis. A doença arterial, aterosclerótica ou traumática, pode diminuir o fluxo para os espaços lacunares, resultando em redução da rigidez do pênis e em aumento do tempo necessário para que a ereção esteja completa (JAMESON et al., 2019). ↠ Um fluxo de saída em excesso pelas veias, mesmo com influxo adequado, também pode contribuir para DE. Alterações estruturais dos componentes fibroelásticos dos corpos cavernosos podem causar perda da complacência e incapacidade de comprimir as veias da túnica. Essa situação pode decorrer de envelhecimento, entrecruzamento aumentado das fibras de colágeno induzido por glicosilação não enzimática, hipoxemia ou alteração da síntese de colágeno associada à hipercolesterolemia (JAMESON et al., 2019). 5 Júlia Morbeck – @med.morbeck NEUROGÊNICA Estima-se que as causas neurológicas correspondam entre 10 a 19% dos casos de DE. Entre essas causas, destacam-se: doença de Parkinson, demências, doenças desmielinizantes e lesões medulares em níveis que afetam a ereção e/ou a ejaculação (SARRIS et al., 2016). ↠ Distúrbios que afetem a medula espinal sacral ou as fibras autonômicas dirigidas ao pênis impedem o relaxamento do músculo liso peniano pelo sistema nervoso e, dessa forma, provocam DE (JAMESON et al., 2019). ↠ Nos pacientes que sofreram traumatismo raquimedular, o grau de DE depende da extensão e do nível da lesão. Os pacientes com lesões ou traumatismos incompletos da parte superior da medula espinal são mais propensos a manter a habilidade erétil do que aqueles que apresentam lesões ou traumatismos completos da parte inferior. Embora 75% dos pacientes que sofreram lesão medular apresentem alguma capacidade de ereção, apenas 25% conseguem ereções suficientes para a penetração (JAMESON et al., 2019). ↠ Outras doenças neurológicas que comumente estão associadas à DE são esclerose múltipla e neuropatia periférica. A neuropatia periférica frequentemente é causada por diabetes melito ou por alcoolismo. A cirurgia pélvica pode causar DE em razão de ruptura do suprimento nervoso autônomo (JAMESON et al., 2019). ENDOCRINOLÓGICA Entre as causas endócrinas, estão o diabetes mellitus (DM), a síndrome metabólica e as alterações dos hormônios sexuais. Entre 35% e 75% dos diabéticos apresentam algum grau de DE. A fisiopatologia da DE em diabéticos pode ser resultante de suas complicações, como doenças vasculares, hipertensão arterial sistêmica, obesidade e neuropatia. Uma metanálise envolvendo 9123 pacientes com diabetes tipo 1 ou 2 mostrou que o baixo controle glicêmico contribuiu para as altas taxas de DE em diabéticos. Isso ocorre porque o alto nível glicêmico está relacionado com o surgimento de doenças vasculares periféricas, coronarianas e cerebrais. Como as artérias penianas são de pequeno calibre, a obstrução de seu lúmen pode ocorrer antes da angina pectoris tornando, assim, a DE um marcador precoce para problemas mais graves (SARRIS et al., 2016). No DM, a exposição prolongada à glicose leva à glicação não- enzimática de proteínas plasmáticas e das membranas celulares, que podem se depositar na camada subendotelial. Dessa forma, isso pode, de maneira direta, inativar o NO endotelial impedindo a vasodilatação endotélio-dependente. Além disso, ocorre uma grande liberação de radicais livres que reagem com o NO gerando um potente oxidante (peroxinitrito) (SARRIS et al., 2016). ↠ Os androgênios aumentam a libido, mas sua participação exata na função erétil permanece incerta. Os indivíduos com níveis de testosterona compatíveis com castração podem alcançar ereções provocadas por estímulos visuais ou sexuais. Não obstante, níveis normais de testosterona parecem ser importantes para a função erétil, especialmente em homens mais idosos (JAMESON et al., 2019). A terapia de reposição de androgênio pode melhorar a função erétil reduzida quando ela for secundária a hipogonadismo; entretanto, será inútil para a DE quando os níveis de testosterona endógena forem normais. A prolactina aumentada pode diminuir a libido por suprimir o hormônio liberador das gonadotrofinas (GnRH), além de reduzir também os níveis de testosterona. O tratamento da hiperprolactinemia com agonistas da dopamina pode restabelecer a libido e a testosterona (JAMESON et al., 2019). PSICOGÊNICA ↠ Dois mecanismos contribuem para a inibição da ereção na DE psicogênica. Em primeiro lugar, os estímulos psicogênicos na medula sacra podem inibir respostas reflexogênicas, bloqueando, assim, a ativação dos impulsos vasodilatadores para o pênis (JAMESON et al., 2019). ↠ Em segundo lugar, a estimulação simpática excessivano homem ansioso pode aumentar o tônus da musculatura lisa peniana (JAMESON et al., 2019). ↠ As causas mais comuns de DE psicogênica são ansiedade quanto ao desempenho, depressão, conflito na relação, perda de atração, inibição sexual, conflitos acerca de preferência sexual, abuso sexual na infância e temor de gestação ou de infecção sexualmente transmissível. Quase todos os pacientes com DE, mesmo quando a disfunção tem base claramente orgânica, desenvolvem um componente psicogênico reacional (JAMESON et al., 2019). Relacionada com medicamentos ↠ Estima-se que a DE induzida por medicamentos ocorra em 25% dos homens atendidos em clínicas ambulatoriais de medicina geral. Os efeitos adversos relacionados com terapias farmacológicas são aditivos, especialmente em homens idosos. Além do efeito do próprio medicamento, é provável que a doença sob tratamento contribua para a disfunção sexual (JAMESON et al., 2019). ↠ Entre os agentes anti-hipertensivos, os diuréticos tiazídicos e os betabloqueadores são os implicados com maior frequência. Os bloqueadores dos canais de cálcio e os inibidores da enzima conversora da angiotensina são citados com menor frequência. Tais fármacos podem 6 Júlia Morbeck – @med.morbeck atuar diretamente ao nível dos corpos cavernosos (p. ex., bloqueadores dos canais de cálcio) ou indiretamente, reduzindo a pressão arterial pélvica, que é importante para que aconteça a rigidez peniana. Os bloqueadores α- adrenérgicos são menos propensos a causar DE (JAMESON et al., 2019). ↠ Estrogênios, agonistas do GnRH, antagonistas de H2 e espironolactona causam DE por suprimirem a produção de gonadotrofinas ou por bloquearem a ação do androgênio (JAMESON et al., 2019). ↠ Antidepressivos e antipsicóticos – em particular neurolépticos, tricíclicos e ISRSs – estão associados a dificuldades de ereção, ejaculação, orgasmo e desejo sexual. Entre os ISRSs, a paroxetina e o escitalopram foram associados a um maior risco de disfunção sexual. A bupropiona, a nefazodona e a mirtazapina parecem ter menos tendência a causar disfunção sexual. Diversas vias moleculares foram implicadas nos eventos adversos sexuais induzidos por antidepressivos (JAMESON et al., 2019). ↠ Foi aventada a hipótese de que a serotonina inibe a resposta normal ao diminuir a libido, a excitação e a ereção intensificadas pela dopamina e ao aumentar a liberação de prolactina. Também foi constatado que os ISRSs são potentes inibidores da síntese de óxido nítrico (JAMESON et al., 2019). EXTRA.: Em relação ao álcool, doses pequenas inicialmente promovem um aumento da ereção e do desejo sexual devido ao seu efeito vasodilatador. No entanto, grandes quantidades dessa substância podem causar sedação, diminuir a libido e causar uma disfunção sexual transitória. O alcoolismo crônico pode resultar em disfunção hepática, um decréscimo dos níveis de testosterona e um aumento dos níveis de estrogênio, podendo apresentar também casos de polineuropatia alcoólica que afeta diretamente a inervação peniana (SARRIS et al., 2016). DIAGNÓSTICO ↠ O diagnóstico da disfunção erétil baseia-se principalmente na anamnese (sobretudo história patológica pregressa clínica e sexual detalhada do paciente e de sua[seu] parceira[o]), quando disponível. A história pode revelar a causa subjacente, como uso de medicação ou outros distúrbios comuns associados à disfunção erétil (GOLDMAN; SCHAFER, 2022). ↠ O exame físico deve concentrar-se nos sistemas geniturinário, circulatório, endócrino e neurológico. O exame da próstata é importante, visto que a disfunção erétil está comumente associada à hiperplasia prostática benigna (HPB) sintomática (GOLDMAN; SCHAFER, 2022). ↠ O Índice Internacional de Função Erétil (IIEF) é um escore já validado no Brasil para o diagnóstico de DE, a graduação e a avaliação da efetividade do tratamento, sendo composto de 15 questões distribuídas em cinco domínios: função erétil, orgasmo, desejo sexual, satisfação sexual e satisfação geral. O valor de cada questão varia de 1 a 5, e a soma das respostas estabelece um escore final para cada domínio, com valores baixos indicando má qualidade da vida sexual (DINIZ et al., 2019). Os questionários validados usados mais comumente são o International Index of Erectile Function (IIEF) de 15 itens, ou uma versão abreviada de 5 itens (IIEF-5), mais adequada para uso em consultório (MCANINCH.; LUE, 2014). ↠ O questionário, entretanto, foi desenvolvido apenas para avaliação da função sexual de homens heterossexuais. Os intervalos da pontuação permitem classificar a gravidade da DE em cinco grupos: Sem DE (26-30), DE leve (22 25), DE leve a moderada (17-21), DE moderada (11-16) e DE grave (6-10) (SARRIS et al., 2016). EXAMES LABORATORIAIS E DE IMAGEM ↠ Os exames laboratoriais devem incluir a determinação da testosterona sérica pela manhã e, quando indicado, o antígeno prostático específico (PSA), a glicose em jejum (ou hemoglobina A1c) e o colesterol (GOLDMAN; SCHAFER, 2022). ↠ Raramente, há necessidade de exames diagnósticos específicos (GOLDMAN; SCHAFER, 2022). Contudo, em alguns pacientes, testes especializados podem proporcionar uma visão mais clara sobre os mecanismos patológicos envolvidos e auxiliar na escolha do tratamento. Os testes especializados opcionais são: (JAMESON et al., 2019). 7 Júlia Morbeck – @med.morbeck • estudos sobre tumescência e rigidez peniana noturna; • exames vasculares (injeção no consultório de substâncias vasoativas, ultrassonografia do pênis com Doppler, angiografia do pênis, cavernosografia/cavernosometria com infusão dinâmica); • exames neurológicos (percepção vibratória graduada com biotesiometria; potenciais evocados somatossensitivos); • testes diagnósticos psicológicos. As informações que podem ser obtidas com esses procedimentos devem ser ponderadas em função de invasividade e custo (JAMESON et al., 2019). TRATAMENTO ↠ A orientação do paciente e da parceira é fundamental para o tratamento da DE. Na terapia guiada por objetivo, a orientação facilita a compreensão da doença, dos resultados dos testes e da escolha do tratamento. A discussão das opções terapêuticas ajuda a esclarecer como o tratamento pode ser mais eficiente e a estratificar as terapias como de primeira e segunda linha (JAMESON et al., 2019). MODIFICAÇÃO NO ESTILO DE VIDA ↠ Os pacientes que apresentem problemas relacionados com estilo de vida de alto risco, como obesidade, tabagismo, abuso de álcool ou uso de drogas ilícitas, devem ser informados sobre a participação desses fatores no desenvolvimento de DE (JAMESON et al., 2019). ↠ A prática de atividade física aeróbica pelo menos 150 minutos por semana promove melhora do desempenho sexual na maioria dos idosos (DINIZ et al., 2019). ↠ Ademais, também deve ser avaliada a possibilidade de substituição das medicações de uso crônico envolvidas na etiologia da DE (DINIZ et al., 2019). TERAPÊUTICA DE PRIMEIRA LINHA ↠ Inibidores da fosfodiesterase 5 (iFDE5) Essas medicações constituem a primeira linha de tratamento da DE por sua eficácia, facilidade de uso e perfil com poucos efeitos colaterais (DINIZ et al., 2019). ↠ O uso dos iFDE5 se baseia no papel do óxido nítrico na vasodilatação peniana, mediada por guanosina monofosfa-to cíclico (GMPc), responsável por iniciar e manter a ereção. A perda da ereção é relacionada ao catabolismo do GMPc pela enzima fosfodiesterase 5 (DINIZ et al., 2019). ↠ Os iFDE5 garantem maior atuação do GMPc, resultando em ereções mais efetivas e duradouras. Os iFDE5 não serão eficazes se o idoso não realizar os estímulos físicos e emocionais necessários para uma ereção adequada e são contraindicados nos pacientes em uso de nitratos, devendo ser prescritos com bastante cautela para aqueles que tomam bloqueadoresalfa- adrenérgicos em virtude do risco de hipotensão (DINIZ et al., 2019). Sildenafila, tadalafila, vardenafila e avanafila são os únicos agentes orais aprovados e efetivos para o tratamento de DE. Esses quatro medicamentos melhoraram sobremaneira o tratamento da DE porque são efetivos para uma ampla gama de causas, incluindo a psicogênica, a diabética, a vasculogênica, a pós-prostatectomia radical (procedimentos que preservam nervos) e o traumatismo raquimedular (JAMESON et al., 2019). Inicialmente, houve preocupação acerca da segurança cardiovascular desses fármacos. Sabe-se que eles podem atuar como vasodilatadores leves, e há advertências sobre a possibilidade de hipotensão ortostática com o uso concomitante de alfa-bloqueadores. Não há contraindicação para o uso de PDE5i nos homens que estejam sendo tratados com α-bloqueadores, mas esses pacientes devem estar estabilizados com esses anti-hipertensivos antes de iniciar o tratamento. A preocupação inicial de que o uso de PDE5i iria aumentar os eventos cardiovasculares foi atenuada com os resultados de vários ensaios clínicos controlados, mostrando não haver nenhum aumento dos eventos isquêmicos miocárdicos ou da mortalidade global, em comparação com a população geral (JAMESON et al., 2019). A reposição de testosterona é usada para tratar o hipogonadismo tanto primário quanto secundário. A suplementação de androgênios em paciente com níveis normais de testosterona raramente é eficaz no tratamento da DE e não é recomendada. Os métodos de reposição de androgênios incluem adesivos e géis transdérmicos, incluindo géis nasais e axilares cutâneos. Dispõe-se também de administração parenteral de ésteres de testosterona de ação longa (enantato e cipionato), implantes subcutâneos de ação 8 Júlia Morbeck – @med.morbeck longa e preparações orais (derivados 17α-alquilados). As formulações orais de androgênios apresentam potencial de hepatotoxicidade e devem ser evitadas (JAMESON et al., 2019). TERAPÊUTICAS DE SEGUNDA LINHA Dispositivos de ereção a vácuo ↠ Os dispositivos de ereção a vácuo têm três componentes básicos: (DINIZ et al., 2019). • um cilindro transparente, normalmente de plástico, colocado no pênis e preso firmemente ao púbis; • um mecanismo para retirar o ar e produzir um vácuo que irá permitir o retorno de sangue; • um anel de constrição colocado ao redor do cilindro enquanto se cria o vácuo e que desliza até a base do pênis. ↠ Os dispositivos não são invasivos, apresentam taxas baixas de complicações e não têm restrições quanto à frequência de uso. Contudo, exigem boa destreza manual, levam à perda do ângulo agudo da ereção e induzem a descoloração do pênis. Recomenda-se que o anel seja removido após um período máximo de 30 minutos. Os dispositivos podem causar contusão em razão da constrição e interferem na ejaculação, sendo comuns queixas de dor ou de falta de ejaculação anterógrada (40% dos casos). Os pacientes em anticoagulação ou com discrasias sanguíneas devem ter cautela ao usá-los (DINIZ et al., 2019). Dispositivo intrauretral com alprostadil ↠ O supositório de alprostadil (prostaglandina E1) produz relaxamento e dilatação arteriolar com consequente ereção. Após a administração e massagem local, a ereção ocorre em 15 minutos e tem a duração de 30 a 60 minutos. A resposta terapêutica efetiva ocorre em torno de 60% dos pacientes. O inconveniente é a necessidade de habilidade na técnica de aplicação, o que restringe seu uso (DINIZ et al., 2019). ↠ O efeito adverso mais frequente é a dor peniana durante a aplicação. Também podem ocorrer taquicardia, tontura e síncope em virtude do escape de alprostadil para a circulação. Na parceira, podem ocorrer prurido, desconforto vaginal e indução de trabalho de parto, sendo contraindicado em caso de gravidez (DINIZ et al., 2019). Injeção peniana (intracavernosa) ↠ A combinação de prostaglandina E1 (alprostadil), papaverina e fentolamina apresentou eficácia superior ao uso isolado de qualquer uma dessas substâncias e menos efeitos colaterais. Após a aplicação da medicação, o corpo do pênis deve ser massageado por 30 segundos, e a ereção ocorrerá em 5 a 10 minutos (DINIZ et al., 2019). ↠ O uso dessa técnica deve ser restrito a até três vezes por semana, diminuindo a probabilidade de eventos adversos (dor, hematoma ou fibrose peniana). A taxa de sucesso chega a 80%. Em geral, os pacientes que não respondem ao tratamento são aqueles com DE arterial grave ou com anormalidades venosas (DINIZ et al., 2019). Terapêutica medicamentosa oral para disfunção erétil psicogênica ↠ Para a DE psicogênica com transtorno de humor associado, as opções terapêuticas que menos interferem na sexualidade são a trazodona, a mirtazapina, a bupropiona e a vortioxetina. Há risco de priapismo (ereção prolongada – > 4 horas de duração) e de sonolência excessiva com o uso da trazodona, aumento do apetite e do peso com a mirtazapina e pouca eficácia antidepres-siva da bupropiona quando usada como monoterapia. A vortioxetina ainda é medicação cara e pouco disponível (DINIZ et al., 2019). 9 Júlia Morbeck – @med.morbeck Tratamento psicológico ↠ Acredita-se que quase todos os idosos afetados por DE apresentem tanto fatores orgânicos como psíquicos. Mesmo com as inúmeras terapias disponíveis para DE orgânica, os fatores psicogênicos não podem ser negligenciados. Os dados da história clínica que sugerem etiologia psicogênica incluem: início súbito relacionado com algum evento da vida (separação conjugal, viuvez, aposentadoria, entre outros), manutenção de ereções noturnas ou matinais, DE intermitente e história de conflitos de relacionamento familiar e conjugal (DINIZ et al., 2019). ↠ Dentre as técnicas de terapia psicossexual se destacam: terapia comportamental, cognitiva, psicoanalítica e psicoeducacional. A participação do paciente e da(o) parceira(o) é fundamental para a melhora dos resultados (DINIZ et al., 2019). CIRURGIA ↠ Uma forma menos utilizada de terapia para DE é a implantação cirúrgica de prótese peniana semirrígida ou inflável. A escolha do tipo de prótese depende da preferência do paciente e devem ser levadas em consideração a compleição física e a destreza manual dos pacientes, que podem afetar a capacidade de manipular o dispositivo (JAMESON et al., 2019). ↠ Em razão da permanência da prótese, os pacientes devem ser orientados a considerar primeiro as opções menos invasivas. Esses tratamentos cirúrgicos estão associados a uma baixa taxa de complicações potenciais, porém são geralmente reservados para o tratamento da DE refratária ou para homens que não conseguem tolerar tratamentos menos invasivos. Apesar de seu custo e da necessidade de cirurgia, as próteses penianas estão associadas a taxas muito altas de satisfação do paciente e da parceira (JAMESON et al., 2019). Sexualidade do idoso ↠ A sexualidade não se restringe apenas à relação sexual, na visão reprodutiva, mas também se manifesta na corporeidade, ou seja, envolve todos os sentidos, abrange um conjunto de experiências, emoções e sentimentos (FRUGOLI; MAGALHÃES-JUNIOR, 2011). ↠ Os principais fatores que influenciam negativamente a sexualidade do idoso é o desconhecimento acerca da sexualidade na velhice, assim como os aspectos culturalmente proibitivos cultivados a respeito de relações sexuais entre eles. Para muitos, a velhice é vista como um período de assexualidade. Isso faz com que eles se comportem segundo as expectativas sociais e, aqueles que têm desejo sexual experimentam um sentimento de culpa e vergonha (FRUGOLI; MAGALHÃES-JUNIOR, 2011). ↠ As mulheres são as que mais sofrem preconceitos, pois são avaliadas pela sua aparência externa e pela capacidade reprodutiva. O corpo da idosa, além de não mais fecundoe produtivo, perante a sociedade é feio e assexuado. Isso faz com ela se feche e não expresse sua sexualidade. Na sociedade, prevalece o culto a beleza; o envelhecimento é visto como uma ameaça para as mulheres, pois está fortemente associado a perda de libido e, consequentemente, elas se sentem assexuadas (FRUGOLI; MAGALHÃES-JUNIOR, 2011). ↠ Imagina-se que o envelhecimento repercute negativamente sobre a sexualidade da mulher, mas a sexualidade é uma necessidade humana básica, independente da faixa etária, embora ainda sejam incipientes os estudos relacionados a este assunto (FRUGOLI; MAGALHÃES-JUNIOR, 2011). “esse preconceito tende a reprimir as expressões da sexualidade na velhice, como se o interesse sexual ou amoroso causasse certo horror, fosse algo aberrante, que não pode ser revelado, demonstrado, explicado e muito menos aceito” (FRUGOLI; MAGALHÃES-JUNIOR, 2011). ↠ É normal que, com avançar da idade, ocorra um declínio da atividade sexual, verificando que as relações de sedução podem ser mais facilmente reconhecidas e reivindicadas do que o próprio ato sexual. Com isso é possível mostrar que sexualidade não é só o ato sexual, mas envolve amor, partilha, calor, toque, enfim, todas as formas que expressam a busca pelo prazer (FRUGOLI; MAGALHÃES-JUNIOR, 2011). ↠ Sobre a sexualidade na velhice, observa-se, ainda, preconceitos e mitos. A crença de que esteja ligada somente aos jovens contribui para a convicção de que a sexualidade para o idoso seja uma prática incomum e imoral (EVANGELISTA et al., 2019). ↠ O Ministério da Saúde (MS) reforça a importância de lidar com a questão sexual da população idosa, devido não apenas ao envelhecimento populacional e crescimento das infecções sexualmente transmissíveis (IST) entre indivíduos com mais de 60 anos, mas também por tratar-se de um aspecto fundamental para a qualidade de vida dessas pessoas (EVANGELISTA et al., 2019). 10 Júlia Morbeck – @med.morbeck ↠ A enfermagem deve estar atenta e preparada para dar o suporte necessário aos idosos acerca das intensas modificações envolvidas na plasticidade do corpo e dos fatores biológicos que interferem na sexualidade. Os profissionais de saúde devem ser isentos de preconceitos, e é essencial que não tratem essa população como um ser em degeneração. “Assim, devem criar situações de valorização da autoestima, falar diretamente sobre o assunto, responder a todas as questões, sem rodeios ou constrangimentos, ajudando no seu bem-estar biopsicossocial” (EVANGELISTA et al., 2019). Referências TORTORA, Gerard J. Princípios de anatomia e fisiologia / Gerard J. Tortora, Bryan Derrickson; tradução Ana Cavalcanti C. Botelho... [et al.]. – 14. ed. – Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. JUNQUEIRA, Luiz Carlos U.; CARNEIRO, José. Histologia Básica - Texto e Atlas. Grupo GEN, 2017. SILVERTHORN, Dee U. Fisiologia humana. Grupo A, Artmed, 2017. JAMESON, J L.; FAUCI, Anthony S.; KASPER, Dennis L.; et al. Medicina interna de Harrison - 2 volumes. Grupo A, 2019. GOLDMAN, Lee; SCHAFER, Andrew I. Goldman-Cecil Medicina. Grupo GEN, 2022. DINIZ, Lucas R.; GOMES, Daniel Christiano de A.; KITNER, Daniel. Geriatria. MedBook Editora, 2019. MCANINCH, Jack W.; LUE, Tom F. Urologia geral de Smith e Tanagho. Grupo A, 2014. SARRIS et al. Fisiopatologia, avaliação e tratamento da disfunção erétil: artigo de revisão. Revista Médica, 2016. FRUGOLI, A.; MAGALHÃES-JUNIOR, C. A. O. A sexualidade na terceira idade na percepção de um grupo de idosas e indicações para a educação sexual. Arq. Ciênc. Saúde UNIPAR, Umuarama, v. 15, n. 1, p. 85-93, jan./abr. 2011. EVANGELISTA et al. Sexualidade de idosos: conhecimento/atitude de enfermeiros da Estratégia Saúde da Família. Revista da Escola de Enfermagem d USP, 2019.
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