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gente criando o futuro METODOLOGIA DO ENSINO DE ARTE Organizador Éderson da Cruz METODOLOGIA DO ENSINO DE ARTE Organizador Éderson da Cruz M etodologia do Ensino de Arte GRUPO SER EDUCACIONAL C M Y CM MY CY CMY K Metodologia do Ensino de Arte © by Editora Telesapiens Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Editora Telesapiens. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Bibliotecária: Maria Isabel Schiavon Kinasz, CRB9 / 626 Cruz, Éderson da C957m Metodologia do ensino de arte [recurso eletrônico] / Éderson da Cruz - Recife: Telesapiens, 2020. 216p.: il.; 29cm ISBN 978-65-86073-72-0 1. Arte – Estudo e ensino. 2. Prática de ensino. I. Título. CDD 707 (22.ed) CDU 7.01 Metodologia do Ensino de Arte Fundador e Presidente do Conselho de Administração: Janguê Diniz Diretor-Presidente: Jânyo Diniz Diretor de Inovação e Serviços: Joaldo Diniz Diretoria Executiva de Ensino: Adriano Azevedo Diretoria de Ensino a Distância: Enzo Moreira Créditos Institucionais Todos os direitos reservados 2020 by Telesapiens Olá. Meu nome é Éderson da Cruz. Sou formado em Letras- Português (UNISINOS, 2010), Mestre e Doutor em Educação (UNISINOS, 2015; 2019), Especialista em Gestão Escolar – Orientação e Supervisão (Faculdade São Luís, 2017) e Pedagogo (UFRGS, 2020), com uma experiência técnico profissional nas áreas de Letras, Linguagens e Educação de mais de dez anos. Passei por instituições públicas (estaduais e municipais) e privadas, de Educação Infantil, Ensinos Fundamental e Médio, Ensino Técnico e Ensino Superior, no estado do Rio Grande do Sul, atuando como docente e também como supervisor escolar. Sou apaixonado pelo que faço e adoro transmitir minha experiência de vida àqueles que estão iniciando em suas profissões. Por isso, fui convidado pela Editora Telesapiens e integrar seu elenco de autores independentes. Estou muito feliz em poder ajudar você nesta fase de muito estudo e trabalho. Neste material, estudaremos os fundamentos do ensino da Arte. Você verá que a arte, além de uma forma de expressão, é um campo de saber muito rico e conectado com nossa realidade de diferentes formas, possibilitando o gosto estético e também o repensar e realidade e a forma como percebemos o mundo que nos cerca. Vamos nessa? Conte comigo para o que precisar. Bons estudos! O AUTOR ÉDERSON DA CRUZ ICONOGRÁFICOS Esses ícones que irão aparecer em sua trilha de aprendizagem significam: OBJETIVO Breve descrição do objetivo de aprendizagem; + OBSERVAÇÃO Uma nota explicativa sobre o que acaba de ser dito; CITAÇÃO Parte retirada de um texto; RESUMINDO Uma síntese das últimas abordagens; TESTANDO Sugestão de práticas ou exercícios para fixação do conteúdo; DEFINIÇÃO Definição de um conceito; IMPORTANTE O conteúdo em destaque precisa ser priorizado; ACESSE Links úteis para fixação do conteúdo; DICA Um atalho para resolver algo que foi introduzido no conteúdo; SAIBA MAIS Informações adicionais sobre o conteúdo e temas afins; +++ EXPLICANDO DIFERENTE Um jeito diferente e mais simples de explicar o que acaba de ser explicado; SOLUÇÃO Resolução passo a passo de um problema ou exercício; EXEMPLO Explicação do conteúdo ou conceito partindo de um caso prático; CURIOSIDADE Indicação de curiosidades e fatos para reflexão sobre o tema em estudo; PALAVRA DO AUTOR Uma opinião pessoal e particular do autor da obra; REFLITA O texto destacado deve ser alvo de reflexão. SUMÁRIO UNIDADE 01 Conceituando arte 16 O que é Arte? 16 A procura da Arte 20 A arte como produção humana e histórica 21 Entendendo natureza da arte 26 Filosofia da arte: estética e poética 27 Mímesis 28 Diegésis 28 Poiésis 29 Poesia não é poema: poesia é arte 29 Tékne 30 Tudo é arte? 30 Kitsch 31 Os lugares do emissor e do receptor na criação artística 32 Compreendendo a linguagem artística 37 A linguagem da arte 37 O arranjo pode mudar a realidade 38 O artista serve de antena 39 A supra-realidade criada pela obra de arte 41 A elaboração especial dos significados 42 Elementos da obra de arte 43 Denotação 43 Conotação 45 Obras artísticas e obras não-artísticas 46 Explorando as modalidades artísticas 48 Artes visuais 49 Elementos das artes visuais 49 Literatura 50 Elementos da Literatura 51 Música 51 Elementos da música 52 Teatro 52 Elementos do teatro 52 Dança 53 Elementos da dança 53 Cinema 53 Elementos do cinema 54 Como ler uma obra de arte 54 Leitura formal 54 Leitura interpretativa 55 Contextualização histórica 55 UNIDADE 02 Relacionando a arte com as demais linguagens 60 Linguagens que se misturam 60 A proposição das linguagens 61 A rua como espaço de arte 62 Panorama das 11 artes 62 Música 63 Dança 63 Pintura 64 Escultura 64 Teatro 65 Literatura 65 Cinema 66 Fotografia 66 História em quadrinhos 67 Jogos eletrônicos 68 Arte digital 68 Refletindo sobre o ensino de arte na escola 70 A escola é o espaço da arte! 71 A evolução conceitual da disciplina 72 Alguns mitos pedagógicos sobre o ensino de Arte 73 Reprodução e releitura 73 Só se produz trabalhos artísticos com material 73 A arte estimula a criatividade 73 As grandes linguagens artísticas são apenas quatro: dança, artes visuais, teatro e música 74 Linha do tempo sobre o ensino de Arte nas escolas brasileiras 74 Metodologias mais comuns no ensino de Arte 76 Metodologia tradicional 76 Livre expressão 76 Metodologia sociointeracionista 77 Relacionando linguagem artística e poesia 79 Intertextualidade e metalinguagem 80 Poesia e poema 80 Língua e arte literária 80 Elementos da obra literária 82 Estilo 83 Versificação 84 Ritmo 85 Simetria e assimetria 86 Encadeamento 86 Rima 86 Versos regulares 87 Versos brancos 87 Versos livres 87 Versos polimétricos 87 Estrofe 87 Compreendendo teoricamente as noções de poesia e teatro 89 O gênero lírico 90 O gênero dramático 95 UNIDADE 03 Trabalhando a Arte com inclusão 104 A arte, a inclusão e o papel do docente 105 Arte e Inclusão 105 Fases do desenvolvimento da criança – desenho 107 A Arte e a deficiência visual 110 A Arte e a deficiência física 111 A Arte e a deficiência auditiva 113 Refletindo sobre a metodologia do ensino da Arte 116 A organização dos conteúdos no ensino de Arte 117 A avaliação em Arte 118 Artes visuais 120 Música 121 Teatro 122 Dança 122 Formas de avaliação 123 Autoavaliação 123 Refletindo sobre a docência em Arte 126 Sociedade do futuro ou do presente? 127 O fazer arte como um exercício de experimentação 130 O professor e o ensino de Arte 131 Dificuldades enfrentadas pelo professor de Arte 133 Compreendendo a Arte como um produto da cultura e da diversidade 137 O que é diversidade? 138 A construção da diversidade sociocultural na sociedade 139 O que é cultura? 140 Regras culturais 143 A Arte como um produto da diversidade e da cultura 145 UNIDADE 04 Refletindo sobre a Arte na Educação Infantil 152 O papel da Arte na Educação Infantil 153 Concepções de Arte e práticas pedagógicas 156 Necessidade de mudanças na abordagem 159 O trabalho com as crianças 161 Explorando o panorama sobre o ensino da Arte no Brasil – Parte I 165 Breve introdução 165 A vinda da Missão Francesa 168 O ensino de Arte numa perspectiva liberal 176 Explorando o panorama sobre o ensino da Arte no Brasil – Parte II 182 O Modernismo 182 O pensamento de John Dewey 184 A Arte como atividade extracurricular para crianças e adolescentes 187 Arte como forma de liberação emocional 190 Refletindo sobre o ensino da Arte 196 1964 e a pressão por mudanças 196 1980 e depois: As tendências pós-modernistas 201 Algumas considerações sobre o ensinode arte pós-1964 205 Metodologia do Ensino de Arte 13 UNIDADE 01 Metodologia do Ensino de Arte14 Há um filme onde, numa determinada cena em que os personagens principais conversam sobre uma pintura, um deles não consegue entender, naquelas formas de abstração o que seria a arte. O outro, por sua vez, apreciador de obras clássicas, diz a ele que a arte é a forma de registrar nossa passagem pela Terra. Será? A arte está praticamente em todo lugar: nas paredes, nas construções, nos movimentos, na linguagem, no corpo humano... Mas o que será que diferencia a arte das demais atividades humana? De modo geral, arte é técnica. Porém, funções do dia a dia também exigem uma técnica. Também podemos dizer que arte é linguagem. Mas, por exemplo, uma notícia não é artística e também é linguagem. Podemos dizer que a arte também é aquilo que nos toca. Mas... tragédias da vida real também podem nos tocar! Percebe como definir arte pode ser fácil e complicado ao mesmo tempo? Se nós, pessoas com experiências de vida mais plurais, temos essa dificuldade, imagine, então, numa sala de aula! Por isso, nesta disciplina abordaremos não somente os conceitos importantes para se pensar a arte, mas também veremos possibilidades, por meio do ensino da arte em sala de aula, produzir conhecimentos e aprendizagens. Entendeu? Ao longo desta unidade letiva você vai mergulhar neste universo! INTRODUÇÃO Metodologia do Ensino de Arte 15 Olá. Seja muito bem-vindo a nossa Unidade 1. Nesta unidade, o nosso objetivo é auxiliá-lo no desenvolvimento das seguintes competências profissionais: OBJETIVOS 1 Atuar com ética e compromisso com vistas à construção de uma sociedade justa, equânime, igualitária; 2 Compreender, cuidar e educar crianças de zero a cinco anos de forma a contribuir para o seu desen-volvimento nas dimensões, entre outras, física, psicológica, intelectual, social; 3 Identificar problemas socioculturais e educacionais com postura investigativa, integrativa e propositiva em face de realidades complexas, com vistas a contribuir para a superação de exclusões sociais, étnico-raciais, econômicas, culturais, religiosas, políticas e outras; 4 Demonstrar consciência da diversidade, respeitando as diferenças de natureza ambiental-ecológica, étnico-racial, de gêneros, faixas geracionais, classes sociais, religiões, necessidades especiais, escolhas sexuais, entre outras. Então? Está preparado para uma viagem sem volta rumo ao conhecimento? Ao trabalho! Metodologia do Ensino de Arte16 Conceituando arte Figura 1: Conceito de Arte Fonte: Freepik O que é Arte? Existem várias formas de se conceituar a arte, nem todos de acordo entre si. Alguns deles, por vezes, podem até mesmo ser contraditórios. Mas, de modo geral, pode-se dizer que todos eles apontam para algumas funções da arte: OBJETIVO Ao término deste capítulo, você será capaz de entender que arte é um termo bastante polissêmico. Isso fará toda a diferença em sua atuação profissional, uma vez que a arte faz parte do dia a dia da escola. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Metodologia do Ensino de Arte 17 � Formar uma visão de mundo; �Transformar a natureza; �Transformar a cultura; � Interpretar a realidade; �Expressar uma visão do mundo. Segundo Robert Cumming (1996), A função e o objetivo de uma grande obra de arte, as expectativas nela depositadas e o papel do artista não são constantes, variam conforme a época e a sociedade. Contudo, algumas obras se destacam por terem a necessidade de falar de algo além de sua própria época e oferecem uma inspiração e um significado que atravessam os tempos. Antes da Renascença, o artista era considerado um artesão, e uma obra-prima era um trabalho submetido à sua corporação profissional como prova de que ele dominava as habilidades técnicas necessárias. Contudo, os grandes mestres da Renascença propuseram que o artista deveria ser julgado mais pelas suas qualidades do que por sua perícia manual. Hoje, o conceito de obra-prima está estreitamente ligado ao de um grande museu, onde tesouros artísticos são exibidos para que todos possam vê-los. (CUMMING, Robert. Para entender a arte. Trad. Isa Mara Lando. São Paulo: Ática, 1996, p. 8.). Perceba, caro aluno, que o conceito de arte é algo que, como a própria definição de obra-prima, atravessa os tempos e pode se modificar. O que não se modifica é o valor artístico de uma obra, sua capacidade polissêmica e inusitada de provocar diferentes reações de sentido em nós, e de ser lida e relida através dos tempos. Metodologia do Ensino de Arte18 Um mesmo tema, pelos olhos da arte, pode ser submetido a diferentes interpretações. As expressões, a técnica, as noções de movimento, os sons, as feições, a matéria-prima, tudo fala pela obra artística, podendo ser considerado como elemento interpretativo. A obra de arte pode ser carregada de significados, e desafiar nossa sensibilidade. A arte é uma atividade, um trabalho, uma criação que transforma e que interpreta nosso mundo. Por isso, o artista promove determinadas formas e arranjos. Arranjos de linguagens e de cores no caso da pintura e da escultura; arranjos sonoros, no caso da música; arranjos de movimento, no caso da dança; arranjos de sons, imagens, cores, formas, movimento, no caso do cinema, do teatro, da dança, da fotografia; arranjos de palavras, no caso da literatura. Por meio da arte, o artista pode recriar a realidade, conforme aquilo em que acredita, ou ainda, conforme aquilo que nos é dado perceber. Podemos perceber simplicidade, tristeza etc. Numa obra artística em que outras pessoas realizam leituras completamente distintas. No Dicionário Aurélio (2008), encontramos a seguinte definição para arte: 1. Capacidade humana de criação e sua utilização com vistas a certo resultado, obtido por diferentes meios: arte da caça; arte de dominar o fogo; arte de compor poemas etc. 2. Artes plásticas. 3. Os preceitos necessários à execução de qualquer arte. 4. Habilidade; engenho. 5. Ofício (em especial, nas artes manuais). 6. Maneira, todo. 7. Travessura. [...] Artes plásticas. Artes que se manifestam por meio de elementos visuais e táteis, tais como o desenho, a pintura, a escultura etc. belas artes, arte. (p, 143). Metodologia do Ensino de Arte 19 Perceba a quantidade de significados que o dicionário traz para um único termo. Na busca interessada por compreender as coisas, em saber seu sentido, quase sempre encontramos vários caminhos. Podemos buscar explicações lógicas, científicas, baseadas em nossa vivência ou em crenças. Em meio a toda essa diversidade, como explicar a noção de arte? Uma palavra, por pertencer a uma determinada linguagem, pode ser manipulada pelo autor de uma obra, como um escritor, por exemplo. Em um espetáculo teatral, encontramos atores, sonoplastas, figurinistas, iluminadores, e tantos outros artistas que são importantes para a construção de um produto cultural, que tornam possível que múltiplas linguagens estejam reunidas num mesmo espaço para transmitir uma mensagem. A arte é uma linguagem que constantemente se reinventa para construir, conhecer, expressar questões humanas. No entanto, realizada de diversos modos e formas, por vezes a arte faz e provoca perguntas ao invés de apresentar respostas. O artista cria baseado em suas ideias e intenções, mas quem aprecia a obra de arte também cria por meio de suas interpretações. Não há como estabelecer uma verdade absoluta sobre o que as obras de arte querem, aparentemente dizer, porque sempre haverá interpretações diferentes de quem as olha, prova, toca ou ouve, seja espectador leigo ou apreciador de arte. Para compreender a arte, é necessário que nos deixemos levar por seu teor poético, por aquilo que ela nos provoca, e entremos num universo de sentimentos, pensamentos e sensações que ela nos propõe, desprovidos de respostas prontas e verdades preestabelecidas. Conhecer arte é observar,sentir e permitir-se descobrir o inesperado. O papel da arte varia conforma a época, o lugar ou a cultura. A maneira como nos relacionamos com a arte também está sempre sendo modificada. Encontrar respostas para essa pergunta pode parecer difícil, mas pode-se estabelecer algumas pistas, observando-se a própria arte. Metodologia do Ensino de Arte20 Ao longo do tempo, criamos diferentes modos de fazer arte, por diferentes razões. Na atualidade, as formas são ainda mais variadas, o que mostra que a cultura se encontra em constante movimento em fluxos de pensamentos, valores e gostos. A procura da Arte Museus, casas de espetáculos, galerias, centros culturais, exposições, pontos de cultura etc. são lugares determinados para que encontremos a arte. No entanto, não é somente nesses lugares que a encontramos. Os lugares que mencionamos são extraordinários para que tenhamos contato com diferentes formas artísticas, e é muito importante frequentá-los, porém, a arte pode estar mais perto do que imaginamos. Andando pelas ruas de uma cidade, podemos encontrar obras arquitetônicas históricas ou contemporâneas, esculturas, mosaicos, pinturas em grafites e, mais raramente, artistas realizando performances ou intervenções urbanas. Na atualidade, as cidades oferecem espaços para espetáculos de rua nas linguagens da dança, do teatro, das artes visuais e da música, abertos a toda a população. Além disso, pode-se ter acesso a acervos virtuais de museus e galerias do mundo todo por meio da internet, no computador, em tablets e em celulares. Há muitos espaços de arte fora de instituições culturais. A arte é um elemento que gosta de estar perto do povo... Na arte contemporânea, muitas linguagens inovam na forma de criação artística, assim como na maneira de encontrar o público, como no caso das intervenções urbanas, por exemplo. Metodologia do Ensino de Arte 21 A arte como produção humana e histórica Também, é importante considerar que muito do que hoje chamamos de arte, na época em que foi criado, não tinha tal definição. Um exemplo são as pinturas rupestres (feitas em cavernas) na Pré-História, que até os dias de hoje gera discussão entre historiadores, sobre as intenções que levaram seus autores a fazê-las. Não há como se ter certeza... Talvez, o que é considerado arte na atualidade, naquela época podia ter uma função “mágica”, textual, de ensino etc. Assim como as pinturas rupestres, o que hoje chamamos de arte egípcia, também era utilizado com o intuito de eternizar a vida após a morte. Os escultores criavam rostos com os mais diferentes materiais, para que as pessoas continuassem a viver além-túmulo. Segundo estudiosos, a noção de escultor, no Egito Antigo, tinha a ver com aquele que mantinha algo vivo. Na Antiga Grécia, especialmente nos períodos denominados como clássico e helênico, a arte resulta da percepção sensível do mundo e sua representação se dá por meio da ideia de beleza da concepção cultural da época. Durante a Idade Média (séculos V a XV), ocorre o retorno das funções religiosas na arte e na cultura ocidental. A arte é colocada a serviço da Igreja Católica na criação de templos, imagens, músicas e esculturas. CURIOSIDADE A intervenção urbana é uma forma de arte que geralmente é realizada em áreas centrais de grandes cidades. Consiste numa interação com objeto(s) artístico(s) ou com espaços públicos, objetivando tornar perceptível o objeto de arte. Metodologia do Ensino de Arte22 No período renascentista (séculos XV até o XVI), o interesse se volta para as questões humanas e os ideais de beleza clássica, resgatando-se técnicas artísticas gregas do passado. A função da arte, então, assumiu diferentes caminhos: os artistas buscavam representar a realidade a partir de um olhar mais científico e relacionavam diferentes conhecimentos à linguagem artística. Nos séculos posteriores, outras correntes artísticas foram surgindo na cultura do ocidente, para criar tensões entre tradições e rupturas estéticas, o que provocou mais debates sobre o que seria arte. Durante o período do Neoclassicismo, os artistas buscavam escolher “grandes” temas para a criação artística, de modo a exaltar valores como o heroísmo e a moralidade. CURIOSIDADE O Neoclassicismo foi um movimento cultural do século XVIII e de parte do século XIX, que defendia uma retomada da arte antiga, em especial, a arte clássica. Essa era considerada modelo de equilíbrio, clareza e proporção. O movimento teve fortes influências do estilo renascentista, especialmente nas questões técnicas e nas composições de pinturas. Esse estilo se manifestou sob diversas linguagens, como pintura, arquitetura, escultura e literatura. No período do Romantismo, já eram perceptíveis os ares de mudança estética em relação às concepções de arte e de beleza que viriam depois. Nessa corrente de estilo, o sentimento é considerado mais importante do que as normas da criação. Metodologia do Ensino de Arte 23 Durante o Realismo, a pintura propôs representar a vida o mais próximo possível de sua exatidão. Os artistas retrataram pessoas em seu cotidiano, e também em situações sociais na época. CURIOSIDADE O Romantismo foi um estilo artístico que se desenvolveu entre os séculos XVIII e XIX, em diferentes linguagens artísticas, como a literatura, a música, a pintura, a escultura e o teatro. Trazia uma visão idealista e romântica sobre a vida, valorizando mais as emoções, subjetividades, e intuições dos seres humanos, em detrimento da razão. CURIOSIDADE O Realismo foi um movimento artístico e literário que surgiu na França, em meados do século XIX, como forma de reação à arte neoclássica, que representava narrativas idealizadas. Os realistas procuraram apresentar na arte a vida em pleno aspecto social e histórico, com foco na realidade. Desenvolveu-se nas artes visuais, com temas, como trabalhadores do campo, das cidades, pessoas simples do povo etc. No fim do século XIX e no início do século XX, as concepções de beleza foram questionadas, e o mundo se transformou de forma veloz diante dos acontecimentos e das conquistas industriais e também tecnológicas. A maioria dos artistas assistiu a essas mudanças participando delas ativamente, questionando a vida, a arte e a sociedade. Dentre os movimentos Metodologia do Ensino de Arte24 que marcaram esse momento, o Expressionismo rompeu com as concepções de beleza clássica, com cores, formas e temas que falavam da existência humana. O Expressionismo foi um movimento artístico do início do século XX. Em meio a conflitos e guerras, seus artistas refletiam sobre as condições sociais da existência. Refletindo sobre a arte na perspectiva do Dadaísmo, artistas buscaram outras formas de linguagens e de materialidades para expressar ideias e conceitos novos na arte. O Dadaísmo foi um movimento que surgiu durante a Primeira Guerra Mundial, no qual os artistas e os intelectuais se posicionaram de modo crítico sobre a cultura ocidental do início do século XX, em meio a contradições sociais entre avanços tecnológicos e a barbárie da guerra, como uma forma de tornar a arte um manifesto, buscando romper fronteiras entre linguagens, delimitações de materiais ou regras artísticas. RESUMINDO Neste capítulo, você aprendeu que: A arte é um conceito bastante polissêmico, histórico e vinculado às culturas e formas de ver o mundo. Está relacionada às formas como o homem percebe a realidade que o cerca; Nem tudo o que hoje é considerado arte sempre o foi. O que hoje é um objeto artístico, no contexto de sua construção, podia ter outras finalidades, como religiosa, moral, narrativa etc.; A arte foi sendo modificada ao longo dos tempos. Desde os antigos gregos, até os dadaístas do início do século XX, a arte manifestou diferentes valores e formas de ver o mundo, conectada às necessidades humanas daquele tempo, porém transmitindo valores e possibilidades interpretativas diferentes ao longo dos tempos. Metodologiado Ensino de Arte 25 SAIBA MAIS Continue seus estudos e fortaleça suas aprendizagens por meio dos seguintes vídeos: GCFAprendeLivre. 2019. O que é arte? Disponível em: https:// bit.ly/2yNrF2Q. Ciência Maluca do Himalaia. S/d. A História da Arte. Disponível em: https://bit.ly/2LsLY8b Metodologia do Ensino de Arte26 Entendendo natureza da arte Figura 2: Natureza da Arte Fonte: Freepik Ao término deste capítulo, você será capaz de entender que a arte, criação humana, é um elemento temporal e, portanto, que sua natureza é essencialmente subjetiva. Isso fará toda a diferença em sua atuação profissional, uma vez que a arte faz parte do dia a dia da escola. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! OBJETIVO Metodologia do Ensino de Arte 27 Filosofia da arte: estética e poética A estética é um ramo de discussão filosófica, que atua na reflexão sobre o papel da arte na vida, sua natureza, seus valores e suas concepções, discutindo compreensões de beleza ao longo dos tempos. A poética, por sua vez, é um ramo da filosofia da arte que estuda a qualidade das obras artísticas em função de seu contexto de produção, o que expressam e o que provocam na sociedade. Segundo os gregos antigos, havia normas para se dizer também que a poética é o modo único com que se faz as coisas, ou ainda, o jeito peculiar com que se faz arte. A poética representaria, desse modo, as ideias dos artistas. Nessa base, estão os estudos sobre mímesis, ideias que foram discutidas por filósofos gregos como Platão (427-347 a.C) e por Aristóteles (384-322 a.C). Em seus discursos, Platão afirmava que a arte é uma mímesis da vida, como a sombra de um reflexo. Essa palavra (mimese, em português), apresenta a noção de imitação, cópia, representação ou reprodução. Para Platão, a mímesis artística era a representação da natureza, mas como uma cópia, como um reflexo da vida. E a vida, era também um reflexo do mundo das ideias. Deste modo, a arte seria uma cópia da cópia. Aristóteles, por sua vez, dizia que a arte era a representação da vida como uma manifestação poética do ser humano, defendendo que o conhecimento surge da percepção dos sentidos. Os artistas criam a arte por meio da poética. A arte imita a vida, porém, de modo mais belo. Essas ideias ainda hoje são estudadas para se tentar compreender a natureza estética e poética da arte e as concepções de beleza de Aristóteles influenciaram muitos períodos da história da arte. Essa como função poética foi estudada pelos gregos antigos, sendo investida até hoje em razão da necessidade de compreensão do que é arte de por que a fazemos. Metodologia do Ensino de Arte28 Mímesis O termo mímesis é um termo filosófico e crítico que abrange vários significados, tais como imitação, representação, semelhança, mímica, expressão e representação do eu. Trata-se de uma figura retórica baseada no discurso direto da imitação do gesto, voz, ações, ou palavras do outro. Essa imitação, segundo o pensamento aristotélico, representaria o fundamento de toda arte. A noção de mímesis surgiu com o filósofo Platão, que tentou definir esse vocabulário em seus diálogos sobre a natureza da arte. Porém, não conseguiu estabelecer um sentido fixo para a palavra. Aristóteles, em sua obra “A arte poética”, irá atribuir à mímesis dois sentidos: imitação e emulação. Ambos os filósofos gregos viam na mímesis uma forma de representar o universo perceptível. No entanto, Platão via toda a natureza como uma imitação. A natureza verdadeira seria oriunda do plano das ideias. Assim, o mundo físico seria uma imitação secundária. Aristóteles, por sua vez, via o drama como a imitação de uma ação. Como ele questionava o mundo das ideias, valorizava a arte como uma forma de representação do mundo. Dessa discussão, originou-se a poética. Pelos gregos antigos, a natureza de uma obra de arte estaria na imitação, sendo que os elementos abstratos, por não se assemelharem ao mundo concreto, não seriam artísticos. Tais concepções são refutadas na atualidade, pois se acredita que, embora a pintura abstrata apresente uma outra forma de ver o mundo, ainda assim, ela pode representar elementos concretos e da natureza. Diegésis A diegésis ou diegése surgiu com os gregos, tendo em Platão o sentido de ser um relato de uma história pelas palavras do próprio relator, como forma de oposição à mimese dessa história Metodologia do Ensino de Arte 29 por meio da recorrência ao relato de personagens. Sócrates, por sua vez, estabeleceu uma relação de oposição entre mimese e diegése, diferenciando-se pela situação em que o poeta é um locutor que assume sua própria identidade e na situação em que o poeta cria a ilusão de ser o locutor. O conceito, atualmente, tem sido bastante usado, especialmente, na área da sétima arte, o cinema. Diegése é um conceito que funcionaria como uma espécie de antônimo para mimese. Enquanto essa última estaria vinculada à imitação da realidade, a primeira, estaria vinculada ao relato da realidade. Ambas aconteceriam por meio da arte e da literatura. Poiésis Poiésis é um termo de origem grega, usado, inicialmente, para designar um processo criativo e, depois, o processo de criação de um poema. Desde sua ideia até sua materialidade. Para Platão, a Poiésis representava a forma de se atingir a imortalidade. Poesia não é poema: poesia é arte A poesia é um conjunto de características e técnicas de elaboração artística; o poema é uma das manifestações concretas da poesia. A noção de poesia está ligada ao grego poiésis, que era sinônimo de processo criativo, e depois, passou a nomear o processo criativo da poesia. Também, segundo Platão, poiésis designava os processos para se alcançar a imortalidade. Na atualidade, os significados de poiésis não se modificaram muito, haja vista que por meio da poesia, os homens se tornam imortais, uma vez que suas criações artísticas falam por eles. O poema é uma manifestação concreta da poesia, assim como a dança, a música, o cinema, a literatura, o romance etc. Aquilo que atinge a perfeição artística possui poesia; o poema cuja perfeição ultrapassa os limites do cotidiano e do não- Metodologia do Ensino de Arte30 artístico é um poema (seja ele haicai, soneto, ode, balada etc.) carregado de poesia. Tékne A palavra tékne significa, em grego, técnica ou arte. A tékne é um elemento que emerge da experiência individual e passa da experiência à tékne quando se generaliza as experiências individuais num conhecimento de coisas, de experimentação. Tudo é arte? Ao nosso redor, nos objetos, também há pensamento estético e artístico. A palavra “arte” está ligada à noção de “tékne” e surge da concepção de que o ser humano sempre faz coisas, desde sua origem. No entanto, a arte não é unicamente uma técnica de se fazer coisas, mas necessita de um sentido ou de uma intenção. Não existe uma função do cotidiano na arte, mas uma função estética, poética e artística. No nosso dia a dia, há diversos objetos criados com a intenção de agradar aos olhos, assim como aos demais sentidos. Porém, tais objetos possuem uma dimensão cotidiana, e servem para se “conectar” ao nosso mundo real. Embora haja neles um pensamento estético, isso não significa que sejam arte. Hoje, vemos que cada vez mais os meios de comunicação dominam a nosso dia a dia e nossa cultura. Não há como se negar que eles facilitam a vida. Porém, os objetos, em seu uso cotidiano, não podem ser considerados arte. Há movimentos que ressignificam esses objetos, tais como a Pop Art, que marca, na história da arte, um movimento de protesto. Por meio dela, começou-se a dialogar sobre a relação entre arte e estilo de vida, sendo sua discussão bastante abrangente a partir da segunda metade do século XX. Ela também ofereceu a possibilidade de refletirmos sobre a fama que as mídias desencadeiam, no momento em que os meios de Metodologia do Ensino de Arte 31 comunicação ofereceram imagensem cores e movimento de formas nunca vistas até então. A Pop Art surge no início da década de 1960, quando muitos artistas passaram a questionar o crescimento dos meios de comunicação em massa, como a televisão, um aparelho que possibilitou novas formas de apresentar produtos de consumo. A publicidade começava a conduzir as escolhas pessoais e, nesse cenário, a Pop Art surge como um movimento artístico que se utiliza da cultura de massa de forma crítica. Kitsch O termo kitsch surgiu da língua alemã, possuindo um significado até hoje não muito claro, porém, relacionado com as artes. É usualmente empregado nos estudos de estética para nomear uma forma de arte considerada vulgar, barata, brega e sentimental, que copiaria os elementos de uma cultura e de uma arte mais eruditas sem nenhum critério e profundidade. Essa apropriação se destinaria exclusivamente para o consumo, sendo essa forma de arte considerada uma distorção dos objetos originais. Essa forma de cultura e de arte estaria associada não a um ideal artístico partido do artista, mas a uma preocupação em “imitar” elementos artísticos para serem consumidos, sendo a preocupação maior quem o consumirá, e não o conteúdo ou a estética do objeto. Trata-se de uma expressão figurativa, sendo difícil de ser detectada, por exemplo, nas artes abstratas, pois para exercer seu efeito, necessitaria de um conteúdo narrativo. Alguns pesquisadores definem o kitsch como uma atitude de complacência e supressiva do senso crítico, estendida não somente a arte, mas a outras áreas, como religião, política, erotismo etc. Metodologia do Ensino de Arte32 Também, o kitsch pode ser considerado como um produto da industrialização, refém da cultura de massas, sendo um fenômeno de largo alcance e que movimenta uma indústria milionária, legitimada pelo público que a consome. O termo surgiu entre os pintores alemães do final do século XIX, associada ao amontoado de detritos nas ruas e bairros. Os lugares do emissor e do receptor na criação artística Se não há obra de arte sem um artista, também podemos dizer que não há arte sem um receptor. A relação entre esses dois elementos, emissor (artista) e receptor, é fundamental para que um determinado objeto se constitua como obra de arte. A criação artística pode ser livre, individual e subjetiva, submetida à vontade do autor; porém, não é possível que o artista desconsidere um possível receptor para sua obra; por isso, há uma relação complexa entre aquele que cria e aquele que vê, uma vez que ambas as ações são subjetivas. Nesse exercício entre criação e recepção, a obra de arte pode atingir sentidos diferentes daqueles esperados por seu criador, e também surpreender o receptor em relação às diferentes formas de interpretação. Também, sendo arte uma linguagem, é, portanto, um sistema semântico, cuja conotação se vincula à questão das diferenças sociais. Deste modo, também se pode afirmar que só há produção artística onde há um povo, pois a arte, além dos elementos anteriormente mencionados, está vinculada também ao desenvolvimento das culturas. Sua matéria, portanto, é cultural, pois o artista retira de seu mundo elementos que buscam representar totalidades coesivas que possam alcançar os diferentes tipos de receptores. Metodologia do Ensino de Arte 33 Podemos dizer, também, que a arte se constitui de uma maneira bem singular, abrangendo um emaranhado de características que a definem como obra de arte. A criação artística, embora se utilize das bases culturais da linguagem, ressignifica-as, dando a elas outras formas e outros sentidos, diferenciando a linguagem artística da não- artística, ou a conotação da denotação. Isso é importante porque a arte não tem o compromisso de estabelecer padrões estéticos, como muitos podem afirmar, mas criar outras possibilidades linguísticas que diferenciem o real do ficcional, o artístico do não-artístico. Observe o texto a seguir: Numa manhã, ao despertar de sonhos inquietantes, Gregório Samsa deu por si na cama transformado num gigantesco inseto. Estava deitado sobre o dorso, tão duro que parecia revestido de metal, e, ao levantar um pouco a cabeça, divisou o arredondado ventre castanho dividido em duros segmentos arqueados, sobre o qual a colcha dificilmente mantinha a posição e estava a ponto de escorregar. Comparadas com o resto do corpo, as inúmeras pernas, que eram miseravelmente finas, agitavam-se desesperadamente diante dos seus olhos. Que me aconteceu? – pensou. Não era nenhum sonho. O quarto, um vulgar quarto humano, bastante acanhado, ali estava, como de costume, entre as quatro paredes que lhe eram familiares. Por cima da mesa, onde estava deitado, desembrulhada e em completa desordem, uma série de amostras de roupas: Samsa era caixeiro-viajante, estava pendurada a fotografia que recentemente recortara de uma revista ilustrada e colocara numa bonita moldura dourada. Mostrava uma senhora, de chapéu e estola de peles, rigidamente sentada, ao estender ao espectador um enorme regalo de peles, onde o antebraço sumia! Gregório desviou então a vista para a janela e deu com o céu nublado – ouviam-se os pingos de chuva a baterem na calha da janela e isso o fez sentir-se bastante melancólico. Não seria melhor dormir um pouco e esquecer aquele delírio? - Cogitou. Metodologia do Ensino de Arte34 Mas era impossível, estava habituado a dormir para o lado direito e, na presente situação, não podia virar-se. Por mais que se esforçasse por inclinar o corpo para a direita, tornava sempre a rebolar, ficando de costas. Tentou, pelo menos, cem vezes, fechando os olhos, para evitar ver as pernas a debaterem- se, e só desistiu quando começou a sentir no flanco uma ligeira dor entorpecida que nunca antes experimentara. Oh, meu Deus, pensou, que trabalho tão cansativo escolhi! Viajar, dia sim, dia não. É um trabalho muito mais irritante do que o trabalho do escritório propriamente dito, e ainda por cima há ainda o desconforto de andar sempre a viajar, preocupado com as ligações dos trens, com a cama e com as refeições irregulares, com conhecimentos casuais, que são sempre novos e nunca se tornam amigos íntimos. Diabos levem tudo isto! Sentiu uma leve comichão na barriga; arrastou-se lentamente sobre as costas, — mais para cima na cama, de modo a conseguir mexer mais facilmente a cabeça, identificou o local da comichão, que estava rodeado de uma série de pequenas manchas brancas cuja natureza não compreendeu no momento, e fez menção de tocar lá com uma perna, mas imediatamente a retirou, pois, ao seu contato, sentiu-se percorrido por um arrepio gela- do. Voltou a deixar-se escorregar para a posição inicial. Isto de levantar cedo, pensou, deixa a pessoa estúpida. Um homem necessita de sono. Há outros comerciantes que vivem como mulheres de harém. Por exemplo, quando volto para o hotel, de manhã, para tomar nota das encomendas que tenho, esses se limitam a sentar-se à mesa para o pequeno almoço. Eu que tentasse sequer fazer isso com o meu patrão: era logo despedido. De qualquer maneira, era, capaz de ser bom para mim — quem sabe? Se não tivesse de me aguentar, por causa dos meus pais, há muito tempo que me teria despedido; iria ter com o patrão e lhe falar exatamente o que penso dele. Havia de cair ao comprido em cima da secretária! Também é um hábito esquisito, esse de se sentar a uma secretária em plano elevado e falar para baixo para os empregados, tanto mais que eles têm de aproximar-se Metodologia do Ensino de Arte 35 bastante, porque o patrão é ruim de ouvido. Bem, ainda há uma esperança; depois de ter economizado o suficiente para pagar o que os meus pais lhe devem — o que deve levar outros cinco ou seis anos —, faço-o, com certeza. Nessa altura, vou me libertar completamente. Mas, para agora, o melhor é me levantar, porque o meu trem parte às cinco. [...]. KAFKA, Franz. A Metamorfose. Disponível em: https://bit.ly/2y1x45K. O trecho de texto literáriotrazido exemplifica o que estamos abordando acerca do fenômeno literário: Samsa é um personagem que representa um homem comum do mundo real, que trabalha, dorme e pode ter pesadelos. No entanto, algo de extraordinário aconteceu com ele, pois ao acordar, percebeu que estava transformado num grande inseto! Esse item, além de transportar a obra para um realismo fantástico, também se constitui num divisor de águas entre a linguagem conotativa e denotativa, marcando a literariedade do texto. Além disso, pelo que se percebe, o personagem está inserido dentro de uma cultura possível, a cultura moderna, ou capitalista/industrial. Esse contato do texto literário com o mundo real, transportado para a ficção, cria diferentes expectativas no leitor, levando-o a perceber – inclusive – os sentimentos do personagem e transportar-se para dentro da história. Metodologia do Ensino de Arte36 RESUMINDO Neste capítulo, você aprendeu que: A natureza da obra de arte é algo complexo, que vem sendo discutido desde os gregos, com conceitos como mimese, poiésis, tékne etc.; A arte pode estar em todo lugar, mas nem tudo é arte; A arte não pode ser considerada como algo apenas erudito. A Pop Art, inspirada na cultura de massa, e a Kitsch, que “traduz” ou imita arte erudita de forma descriteriosa para o gosto popular são exemplos da flexibilidade dos processos artísticos. Metodologia do Ensino de Arte 37 Compreendendo a linguagem artística OBJETIVO Ao término deste capítulo você será capaz de entender a arte é uma linguagem com características próprias. Isso fará toda a diferença em sua atuação profissional, uma vez que a arte faz parte do dia a dia da escola. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Figura 3: Linguagem Artística Fonte: Freepik A linguagem da arte Não é muito difícil ouvirmos pessoas dizerem não ter gostado de determinado tipo de livro, quadro ou filme, afirmando coisas do tipo “Acho José de Alencar muito chato”. “Não entendo esses rabiscos de Pablo Picasso.” “Como posso gostar se não entendo?” “Não sei o que a crítica viu nisso, achei péssimo!” Metodologia do Ensino de Arte38 Por que o público em geral não tem, quase sempre, o mesmo gosto dos críticos ou dos intelectuais? Teriam esses últimos um gosto melhor do que o primeiro? Há determinadas obras de arte de que os alunos só passam a gostar depois que o professor explica. Outros, ainda, nem chegam a ser explorados. E como fica isso? Gosto se discute, se aprende? A resposta é “com certeza”: gosto se discute, pode ser mudado, pode-se aprender a gostar de algo. Tudo é uma questão de treino e de ambiente. O arranjo pode mudar a realidade O que chamamos de “belo artístico” nem sempre é somente aquilo que retrata a beleza. Qualquer tipo de assunto ou tema pode servir de inspiração para uma obra de arte, desde que seu autor transmita por meio dela uma emoção. As palavras estão em nosso mundo, à disposição de qualquer pessoa. O que as transforma em Arte é o arranjo – a relação nova estabelecida entre elas. Vejamos um exemplo disso extraído da literatura: Versos íntimos (Augusto dos Anjos) Vês! Ninguém assistiu ao formidável Enterro de tua última quimera. Somente a Ingratidão – esta pantera – Foi tua companheira inseparável! Acostuma-te à lama que te espera! O Homem, que nesta terra miserável, Metodologia do Ensino de Arte 39 Mora, entre feras, sente inevitável Necessidade de também ser fera. Toma um fósforo. Acende teu cigarro! O beijo, amigo, é a véspera do escarro, A mão que afaga é a mesma que apedreja. Se a alguém causa inda pena a tua chaga, Apedreja essa mão vil que te afaga, Escarra nessa boca que te beija! ANJOS, Augusto dos. Versos Íntimos. In: MORICONI, Ítalo. (Org.). Os cem melhores poemas brasileiros do século. 1 ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p. 61. Perceba que se mantivermos a noção do belo como um elemento apenas positivo, jamais perceberemos a beleza desses versos, que se tornam uma obra literária autêntica pelo choque que o arranjo de palavras nos causa, assim como a atmosfera de desprezo pela humanidade que ele nos passa. O artista serve de antena A arte possui como matéria-prima a própria vida. O artista percebe o mundo como se tivesse antenas. Transmite, comunica, ajuda o ser humano a conhecer o outro melhor, assim como o mundo que o cerca. Por meio da obra de arte, o sujeito pode conhecer outras faces do amor, do ódio, da fome, da guerra, da morte etc. Ao fantasiar a realidade, o artista imagina e elabora uma outra realidade. Ele a imita e a devolve, na obra, como se fosse nova. Vamos ver como isso acontece num poema? Metodologia do Ensino de Arte40 Soneto de fidelidade (Vinícius de Moraes) De tudo ao meu amor serei atento Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto Que mesmo em face do maior encanto Dele se encante mais meu pensamento. Quero vive-lo em cada vão momento E em seu louvor hei de espelhar meu canto E rir meu riso e derramar meu pranto Ao seu pesar ou seu contentamento. E assim, quando mais tarde me procure Quem sabe a morte, a angústia de quem vive, Quem sabe a solidão, fim de quem ama Eu possa me dizer do amor (que tive): Que não seja imortal, posto que é chama, Mas que seja infinito enquanto dure. MORAES, Vinicius. Soneto de fidelidade. In: MORICONI, Ítalo. (Ogr.). Os cem melhores poemas brasileiros do século. 1 ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p. 101. Observe, no poema, que o modo como vai se desenrolando o texto, cria um sentido para fidelidade ao mesmo tempo semelhante com seu significado denotativo, mas também ampliando seus horizontes. Trata-se da realidade captada pelo autor e devolvida ao leitor, conforme mencionado anteriormente. Metodologia do Ensino de Arte 41 A supra-realidade criada pela obra de arte Conforme o filósofo Aristóteles (384 a 322 a.C.), o ser humano tem como ação natural imitar, representar, criar imagens, a fim de experimentar o próprio universo. Assim, a arte é uma forma de imitação da vida por meio de palavras arranjadas de tal modo que formam uma espécie de supra-realidade, isto é, uma realidade paralela. Observe: Garoto de aluguel (Zé Ramalho) Baby! Dê-me seu dinheiro que eu quero viver Dê-me seu relógio que eu quero saber Quanto tempo falta para lhe esquecer Quanto vale um homem para amar você Minha profissão é suja e vulgar Quero um pagamento para me deitar E junto com você estrangular meu riso Dê-me seu amor que dele não preciso! [...] Baby! Nossa relação acaba-se assim Como um caramelo que chega-se ao fim Na boca vermelha de uma dama louca Pague meu dinheiro e vista sua roupa Metodologia do Ensino de Arte42 Deixe a porta aberta quando for saindo Você vai chorando e eu fico sorrindo Conte pras amigas que tudo foi mal (tudo foi mal!) Nada me preocupa de um marginal [...] RAMALHO, Zé. Garoto de Aluguel. s/d. Disponível em: https://bit.ly/2Z3p7rT. Perceba que a forma como as palavras estão arranjadas nessa letra de canção nos remetem a uma determinada realidade, possível, mas que, trazendo do contexto da canção para a vida real, nunca existiu. A elaboração especial dos significados A arte se utiliza de diferentes linguagens e forma, mas nem tudo o que se utiliza de linguagem e tem forma é uma obra de arte autêntica. A obra de arte, ao contrário das demais formas de linguagem não-artísticas, tem uma preocupação especial com cada significado que vai constituindo em sua construção, mesmo que esse significado seja modificado por aqueles que interpretam a obra. Por esse motivo, há uma diferença gigantesca entre um boneco de pano e uma escultura; entre uma serfie e uma fotografia artística; entre notícia de jornal e um romance; entre um poema e uma receita de bolo. Vejamos: Receita (Nicolas Behr) Ingredientes 2 conflitos de gerações 4 esperanças perdidas Metodologia do Ensino de Arte 43 3 litros de sangue fervido 5 sonhos eróticos 2 canções dos Beatles Modo de preparar Dissolva os sonhos eróticos nos dois litrosde sangue fervido e deixe gelar seu coração leve a mistura ao fogo adicionando dois conflitos de gerações às esperanças perdidas corte tudo em pedacinhos e repita com as canções dos Beatles o mesmo processo usado com os sonhos eróticos mas dessa vez deixe ferver um pouco mais e mexa até dissolver parte do sangue pode ser substituído por suco de groselha mas os resultados não serão os mesmos sirva o poema simples ou com ilusões. BEHR, Nicolas. In: Hollanda, Heloísa Buarque de; PEREIRA, Carlos Alberto Messeder. (Orgs). Poesia jovem anos 70. São Paulo, Abril Educação, 1982. Perceba que embora o texto tenha a estrutura do gênero textual receita, sua compreensão só é possível por meio da interpretação subjetiva, e da compreensão da linguagem literária. A forma como as palavras estão arranjadas no texto, à primeira vista, lembram uma receita tradicional. Mas, na medida em que vamos construindo os significados do texto, percebemos que o arranjo de palavras do poema constitui sua qualidade artística. Elementos da obra de arte Veremos, a seguir, dois conceitos importantes para a compreensão da linguagem artística: denotação e conotação. Denotação A denotação refere-se ao significado estabelecido socialmente da realidade, àqueles significados objetivos, considerados práticos e objetivos. Nesse caso, dizemos que as palavras estão em seu Metodologia do Ensino de Arte44 significado primitivo, que informa o que é objetivo, concreto. Vejamos: Bolo de aniversário Ingredientes ½ xícara (de chá) de manteiga ½ xícara (de chá) de açúcar 2 ovos 1 ½ xícara (de chá) de farinha de trigo 1 colher (de sopa) de fermento em pó 1 pitada de sal ¾ xícara (de chá) de leite 1 colher (de chá) de essência de baunilha Modo de preparar Bata a manteiga e o açúcar por 15 minutos. Junte os ovos, um a um, a farinha, o sal e o fermento peneirados juntos. Reserve. À parte, misture o leite com a baunilha e acrescente à massa reservada. Bata bem. Ponha a massa em uma forma untada. Leve ao forno brando durante 1 hora. Desinforme. Sirva com o recheio e enfeitado a gosto. MARIA, Sônia. Trivial variado. São Paulo: Clube do Livro, 1985. Metodologia do Ensino de Arte 45 A receita, por ser um texto objetivo, pode ser seguida e realizada, sem gerar várias possibilidades de interpretação, dado que os significados das palavras que ela contém são dicionarizados. Da mesma forma, uma fotografia tirada para um documento, um esboço de uma construção, entre outros elementos, não podem ser considerados obras de arte. A isso, chamamos de linguagem denotativa ou denotação da obra de arte. Conotação Dizemos que uma obra artística apresenta conotação/ sentido conotativo/ sentido figurado/ reinvenção da realidade quando ela apresenta vários elementos que possibilitam mais de uma interpretação, além de reações variadas de quem as admira ou analisa. O artista constrói em sua obra a sua imagem de modo particular, expressando seus sentimentos e emoções. Vejamos: 12.207 (Alex Polari) Desembarcamos Os ferros foram lançados No porto e nos pulsos Enquanto fomos expulsos Da vida e do continente Estando sujeitos ao pulsar De incríveis sentimentos E ao sabor Das ondas e das contingências Rondamos em redor Das continências dos guardas. Metodologia do Ensino de Arte46 Depois da viagem Da travessia e do enjoo Nos colocaram em uma sala Tiraram nossa roupa E nos vestiram Nos revestiram de oco E fizeram a chamada. Ganhei um número de registro E por um instante Perdi as esperanças. POLARI, Alex. 12.207. In: CAMPEDELLI, Samira Yousseff. Literatura: História e Texto. Vol. 1. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 39. Esse poema, embora descritivo e baseado em fatos reais (o poeta descreveu sua entrada no presídio de Ilha Grande, em 1971), conta com uma descrição subjetiva dos fatos, marcada pela expressão dos sentimentos do autor e pala continuidade dos sentidos do texto, que devem ser atribuídas pelo leitor. Obras artísticas e obras não-artísticas Por meio da definição de denotação e conotação, podemos, também, estabelecer os limites entre o artístico e o não artístico: �Obra de arte: possui arranjos especiais da estética e da linguagem, a serviço da intencionalidade comunicativa do artista. São carregados de sentimentos, sua linguagem é conotativa e a interpretação, para que se efetive, parte da visão de mundo que aquele que analisa ou que admira a obra. Desse modo, a obra de arte possui significados múltiplos e possibilita mais de uma interpretação. Metodologia do Ensino de Arte 47 �Obra não-artística: a estética e a linguagem estão a serviço da objetividade, reguladas pelos jogos sociais e pelos contratos de comunicação do mundo real. Sua linguagem tende a ser objetiva, e seu sentido, denotativo, a fim de transmitir informações precisas. Por meio dela, o autor comunica algo, conforme seus objetivos e sua mensagem, para outros sujeitos, esperando que as interpretações dadas à sua obra não sejam plurais como ocorre nas artes. RESUMINDO Neste capítulo, você aprendeu que: A linguagem artística possui suas próprias características e marcas, estando a serviço da subjetividade e possuindo significados múltiplos; A denotação remete ao sentido literal, dicionarizado das palavras e das situações; a conotação, remete ao sentido múltiplo, figurado das palavras e das situações; A obra de arte é marcada pela subjetividade, pela conotação e pelo arranjo especial da linguagem. A obra não-artística é objetiva, marcada pelas regras denotativas de comunicação. Metodologia do Ensino de Arte48 Figura 4: Artes Visuais Fonte: Freepik Você já viu, ao longo dessa unidade, que a arte é uma linguagem, e como tal, é a manifestação de expressões. Como ocorre com a língua portuguesa, que tem suas variações, também a linguagem artística possui suas nuances, de onde se originam as diferentes formas de arte. Explorando as modalidades artísticas OBJETIVO Ao término deste capítulo você será capaz de entender que a arte é uma criação, e por isso, tem suas formas de ser constituída. Isso fará toda a diferença em sua atuação profissional, uma vez que a arte faz parte do dia a dia da escola. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Metodologia do Ensino de Arte 49 Cada forma de arte desempenha um papel importante em nosso processo de humanização, pois utiliza determinadas formas de manifestação, além de corresponder a um determinado grupo de anseios humanos. Algumas das linguagens que compõem a área de artes são as artes visuais, música, teatro e dança. A seguir, veremos algumas de suas particularidades. Artes visuais As artes visuais compreendem as manifestações cuja recepção é feita, especialmente, pelo sentido da visão. Além de suas formas mais conhecidas, como pintura, escultura, desenho, gravura, arquitetura, ourivesaria, objetos em cerâmica, marcheteria etc., na atualidade, com o avanço das tecnologias, passou-se a considerar as artes gráficas, a televisão, a fotografia e a moda como artes visuais. Cada uma dessas modalidades de arte tem suas particularidades e pode ser utilizada como várias possibilidades de combinação. Na contemporaneidade, as linguagens visuais ampliaram- se mais, o que torna possíveis novas combinações e novas modalidades expressivas. É o que ocorre com a instalação, o videoclipe e o museu virtual, por exemplo. Elementos das artes visuais � Ponto: é o início da linguagem plástica. �Linha: é uma sequência de pontos, que podem ser curvas, retas, longas e curtas. � Superfície: ao se fecharem sobre si mesmas, as linhas tornam-se linhas de contorno e criam uma área conhecida como superfície. Metodologia do Ensino de Arte50 � Plano: trata-se da largura e da altura apresentadas numa superfície. �Cor: é uma sensação provocada pela intervenção da luz sobre a visão. Classifica-se da seguinte forma: 1. Monocromia: uma cor; 2. Policromia: conjunto de cores diferentes; 3. Cores primárias: são as cores fundamentais,que não são criadas por meio de mistura, e que podem ser combinadas para a criação de novas cores. São o azul, o amarelo e o vermelho; 4. Cores secundárias: são as cores resultantes da mistura de cores, como o laranja, que se origina da combinação de amarelo com vermelho; 5. Cores quentes: são as cores que tendem ao vermelho e ao amarelo, lembrando calor; 6. Cores frias: são as cores que tendem ao azul e ao verde, lembrando frio e frescor; 7. Tons de cores: claro e escuro; 8. Escalas de cor: do mais claro para o mais escuro e vice- versa. �Textura: são as aparências visuais resultantes da materialidade das superfícies ou dos tratamentos gráficos dados aos espaços vazios do plano. �Volume: planos relacionados em diagonal, superposições, profundidade, e cheio/vazio são qualidades espaciais que podem ser formuladas por meio do volume. Literatura A literatura, em linhas gerais, é uma forma de arte que utiliza a palavra como seu elemento fundamental. O pesquisador Massaud Moisés, em seu Dicionário de Termos Literários Metodologia do Ensino de Arte 51 (Editora Cultrix, São Paulo, 2004, p. 264), define a literatura como a arte da escrita, porém, ao longo das várias páginas seguintes, problematiza esse conceito, uma vez que a palavra literatura é polissêmica, e seu significado depende de seu contexto de uso. Apesar da multiplicidade de significados - já que as palavras têm história – vamos delimitar a literatura àquele trabalho técnico e artístico, que não possui compromisso direto com a realidade, e que se constitui como obra a partir do campo da ficção, sendo formada por arranjos estéticos que exploram diferentes dimensões das palavras. É essa forma de literatura que atravessa épocas, que se cria e se recria ao longo dos séculos, e que, por meio de diferentes linguagens (dentre as quais está o cinema), produz efeitos de sentido sobre nossos modos de ser e de viver, possibilitando-nos ver a realidade sob diferentes ângulos. Elementos da Literatura �Linguagem: a linguagem literária é composta por palavras, exploradas em seu sentido sonoro, visual, morfológico, gráfico e semântico; � Prosa: é a linguagem sem rimas, em tom narrativo, despreocupada com a forma; �Verso: é a linguagem que pode ter rimas, preocupada com elementos como forma, métrica etc. Música A música pode ser entendida como uma expressão de arte que reflete circunstâncias de vida e de época. Como uma arte que se utiliza da linguagem musical, sua matéria-prima é o som, definido como um fenômeno acústico que consiste na propagação de ondas sonoras produzidas por um corpo em vibração. Metodologia do Ensino de Arte52 Com raras exceções, já nascemos com a capacidade musical, por meio da voz e do ouvido. Além disso, os sons vêm da natureza; o que dela fazemos, em relação ao som, é que muda conforme a época e a cultura. Elementos da música �Altura: é a propriedade de uma onda ou de uma vibração sonora. Dependendo de sua altura, pode ser grave ou aguda; � Intensidade: e o maior ou menor grau de força com que um som é emitido; �Duração: é o espaço de tempo em que o som acontece; �Timbre: é a qualidade que permite distinguir sons da mesma altura e intensidade; �Densidade: é a qualidade de sons produzidos num mesmo momento, num mesmo lugar. Teatro O teatro consiste numa dramatização, que envolve diferentes linguagens, como pintura, escultura, literatura, dança e música. Elementos do teatro � Personagem: é o figurante, a pessoa que interpreta a história a ser apresentada; �Texto: responsável tanto pela construção dos personagens como pelo roteiro da peça; �Caracterização: responsável pela contextualização de um espaço cênico; � Sonoplastia: contextualização dos sons característicos de determinado ambiente; Metodologia do Ensino de Arte 53 � Iluminação: responsável pela construção do clima do contexto a ser representado, dando destaque as cenas. Dança É uma sequência de movimentos corporais em maneira ritmada, geralmente, ao som de uma música. Expressa movimentos e gestos, e é uma linguagem por meio da qual os sujeitos expressam sensações, emoções, sentimentos e pensamentos por meio do corpo. Elementos da dança � Força: produção de movimentos fortes/ pesados ou fracos/ leves; �Tempo: duração do movimento que determina o ritmo; �Espaço: lugar onde se farão os movimentos; � Fluência: liberada quando o movimento ocorre sem controle, ou controlada, quando os movimentos são intencionais. Cinema O cinema é um conceito mais amplo, que pode ser analisado de diferentes formas: �Uma complexa máquina internacional da indústria, comércio e controle cinematográficos; �A estória vista na tela, que nos impacta (ou não) de diferentes maneiras. Assim, o cinema pode ser compreendido como uma arte mais recente (comparada às outras), que se manifesta por meio de uma atuação em tela. Alguns compreendem o cinema como sendo os filmes produzidos, como sendo a sala de cinema e como sendo o ato de assistir ao filme. No entanto, podemos dizer que o cinema é uma arte produzida por meio de um emaranhado de Metodologia do Ensino de Arte54 linguagens semelhante ao teatro, porém, sua ação não se dá no tempo em que ocorre a dramatização. Elementos do cinema �Ator: é aquele que representa o personagem; � Personagem: é o figurante, a pessoa que interpreta a história a ser apresentada; �Roteiro: responsável tanto pela construção dos personagens como pelo roteiro da peça; �Caracterização: responsável pela contextualização de um espaço cênico; � Sonoplastia: contextualização dos sons característicos de determinado ambiente; � Iluminação: responsável pela construção do clima do contexto a ser representado, dando destaque as cenas. Como ler uma obra de arte Para compreender uma obra de arte, é necessário conhecer o contexto em que ela está enquadrada. Além disso, é importante observar cada elemento que compõe a obra de arte, desde os elementos visuais aos elementos não visuais. Saber do modo como o artista constrói suas obras também pode ajudar, pois isso tem muita relação com a visão de mundo que aquela obra passa. A seguir, apresentamos alguns elementos importantes para a leitura de obras artísticas. Leitura formal Consiste na observação dos elementos que compõem a obra de arte, ou seja, na observação dos elementos que a constituem, como formas, traços, linhas etc. Metodologia do Ensino de Arte 55 Leitura interpretativa Durante essa forma de leitura, capa espectador coloca o que pensa sobre a obra de acordo com sua história de vida e com o que conhece sobre arte. Contextualização histórica Consiste na localização da obra em seu tempo histórico e espacial, sendo observados o tema, o espaço, e os significados temporais pelos quais fora criada. Neste capítulo, você viu que: �A arte é uma linguagem plural, e como tal, se manifesta em diferentes vertentes, de onde surgem as modalidades artísticas; �As artes plásticas correspondem a todas as artes que se configuram por meio de experiências visuais, como o desenho, o grafite, a fotografia, etc.; �A literatura é uma forma de arte visual que utiliza, principalmente, as palavras como matéria-prima, explorando- as em seus aspectos visual, sonoro, semântico, morfológico, sintático, etc.; �A música é uma forma de arte sonora, que se constitui por meio das tramas de sons e ritmos; �O teatro é uma forma de arte que só se completa quando encenada. Mistura várias linguagens diferentes; �A dança inclui ritmos e movimento, sendo expressa por meio do movimento corporal; �O cinema, assim como o teatro, é uma arte de linguagem múltipla, cuja ação não ocorre “ao vivo” como no teatro. Metodologia do Ensino de Arte56 Caro estudante: Chegamos ao final desta unidade. É importante que você revise este material, tome nota de suas principais aprendizagens e principais dúvidas, busque nas indicações de pesquisa leituras e vídeos que podem contribuirmuito nessa etapa! Além disso, ao término desta unidade, você encontrará as principais referências bibliográficas utilizadas na elaboração dessa obra, que podem ser consultadas. Não desanime nas dificuldades de estudo, mas faça com que essas dificuldades de hoje venham ajudá-lo a se tornar um estudante e um profissional melhor amanhã! Metodologia do Ensino de Arte 57 UNIDADE 02 Metodologia do Ensino de Arte58 Há um filme onde, numa determinada cena em que os personagens principais conversam sobre uma pintura, um deles não consegue entender, naquelas formas de abstração o que seria a arte. O outro, por sua vez, apreciador de obras clássicas, diz a ele que a arte é a forma de registrar nossa passagem pela Terra. Será? A arte está praticamente em todo lugar: nas paredes, nas construções, nos movimentos, na linguagem, no corpo humano... Mas o que será que diferencia a arte das demais atividades humanas? De modo geral, arte é técnica. Porém, funções do dia a dia também exigem uma técnica. Também podemos dizer que arte é linguagem. Mas, por exemplo, uma notícia não é artística e também é linguagem. Podemos dizer que a arte também é aquilo que nos toca. Mas... tragédias da vida real também podem nos tocar! Percebe como definir arte pode ser fácil e complicado ao mesmo tempo? Se nós, pessoas com experiências de vida mais plurais, temos essa dificuldade, imagine, então, numa sala de aula! Por isso, nesta disciplina abordaremos não somente os conceitos importantes para se pensar a arte, mas também veremos possibilidades por meio do ensino da arte em sala de aula, produzir conhecimentos e aprendizagens. Entendeu? Ao longo desta unidade letiva você vai mergulhar neste universo! INTRODUÇÃO Metodologia do Ensino de Arte 59 Olá. Seja muito bem-vindo a nossa Unidade 2. Nesta unidade, o nosso objetivo é auxiliá-lo no desenvolvimento das seguintes competências profissionais: OBJETIVOS 1 Atuar com ética e compromisso com vistas à construção de uma sociedade justa, equânime, igualitária; 2 Compreender, cuidar e educar crianças de zero a cinco anos de forma a contribuir para o seu desen-volvimento nas dimensões, entre outras, física, psicológica, intelectual, social; 3 Identificar problemas socioculturais e educacionais com postura investigativa, integrativa e propositiva em face de realidades complexas, com vistas a contribuir para a superação de exclusões sociais, étnico-raciais, econômicas, culturais, religiosas, políticas e outras; 4 Demonstrar consciência da diversidade, respeitando as diferenças de natureza ambiental-ecológica, étnico-racial, de gêneros, faixas geracionais, classes sociais, religiões, necessidades especiais, escolhas sexuais, entre outras. Então? Está preparado para uma viagem sem volta rumo ao conhecimento? Ao trabalho! Metodologia do Ensino de Arte60 Relacionando a arte com as demais linguagens OBJETIVO Ao término deste capítulo você será capaz de entender que arte é um termo bastante polissêmico, por isso, relacionado a diferentes linguagens. Isso fará toda a diferença em sua atuação profissional, uma vez que a arte faz parte do dia a dia da escola. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Figura 1 Fonte: Pixabay Linguagens que se misturam Podemos dizer que as linguagens artísticas surgem da necessidade humana de se comunicar e de agir no mundo, de estabelecer diversas maneiras de dialogar sobre tudo o que é Metodologia do Ensino de Arte 61 percebido, vivido e sentido pelo homem. Linguagens que foram criadas por pessoas que precisavam contar suas experiências, manifestar expressões, opiniões e poéticas. Os artistas criaram e continuam criando linguagens artísticas. Várias vezes, observamos pinturas e desenhos, lemos livros, escutamos músicas, assistimos a peças teatrais, a espetáculos de dança, a filmes de modo tão naturalizado que não nos damos conta do modo como essas linguagens foram construídas. Em cada tempo e lugar, as linguagens tiveram um modo e um propósito ao serem criadas, e também receberam algum tipo de valor ou grau de importância. Estudar e conhecer essas linguagens nos permite ampliar conhecimentos e desenvolver habilidades para que possamos ler e criar em arte. As linguagens podem se misturar ou não. Ao mesmo tempo, você pode ser surpreendido pelas linguagens artísticas ao perceber imagens, sons, luzes que iluminam uma cidade, ao se deparar com uma escadaria colorida, ou ao sentar-se em um banco de praça. A arte é um bem público! Na arte contemporânea, as linguagens visuais podem se reunir em obras que também utilizam a linguagem verbal. Isso ocorre porque a arte pode ser considerada como um elemento humano e ao mesmo tempo vivo, que recria a realidade inspirada nos anseios e sentimentos individuais dos seres humanos. A proposição das linguagens A linguagem artística, em geral, estabelece relações com quem a cria e também com quem a aprecia. O artista não é o único criador da obra, mas um coautor do processo de criação, dado por um projeto descrito pelo artista, mas para o qual é feito um convite ao público para que participe. São projetos que propõem percursos poéticos, convidando as pessoas a penetrarem na obra de arte, para além da apreciação como mero espectador, e, portanto, a participarem ativamente da criação. Metodologia do Ensino de Arte62 Pedir ao público que participe da obra tem sido uma prática bem presente na arte contemporânea. Isso ocorre não apenas nas artes visuais, mas também em outras linguagens. Retirar a característica de passividade de quem assiste a uma encenação teatral, por exemplo, é primordial. A passividade não combina com a proposição de uma arte em movimento. A proposta da arte contemporânea é transformar, encontrar saídas para os problemas mostrados no teatro e na vida. Nada está dado como pronto e acabado, ao contrário: tudo está por se fazer. Convidando o público a participar das artes cênicas, e não somente ficar assistindo ao espetáculo de forma passiva, a linguagem teatral se torna disponível a todos, rompendo barreiras entre artista e plateia. Esse tipo de proposta teatral incentivou grupos de teatro contemporâneo a convidar o público para uma atitude ativa na experiência cênica. A rua como espaço de arte A arte pública pode estar por todos os lados, nas cidades ou em outros locais de visitação. São instalações, esculturas, intervenções urbanas, pinturas em fachadas de prédios e outras ocorrências intervenções urbanas, pinturas em fachadas de prédios e outras ocorrências também da linguagem das artes cênicas e audiovisuais, com projeções artísticas. O teatro popular de rua é um exemplo dessa arte que se realiza em espaço aberto, com uma plateia que muitos. Panorama das 11 artes A arte é uma forma de comunicação que acompanha a humanidade desde os primórdios. Já na época das cavernas, os seres humanos se comunicavam por meio dela, a chamada arte rupestre. Atualmente, estão denominados 11 tipos de arte: música, dança, pintura, escultura, teatro, literatura, cinema, fotografia, Metodologia do Ensino de Arte 63 história em quadrinhos (HQ), jogos eletrônicos e arte digital. A seguir, abordaremos brevemente cada uma delas. Música Esse tipo de arte pode despertar sentimentos variados, favorecendo o equilíbrio mental e o bem-estar. A música está presente em nosso dia a dia a partir do momento em que nascemos. Desde as canções de ninar que cantarolavam para nós, até os ritmos dançantes que ouvimos em uma festa, por exemplo. A linguagem musical é formada por diversos sons que se apresentam em espaços de tempo pré-determinados, formando assim - ritmo, harmonia e melodia. O ritmo é dado pela marcação de tempo entre um som e outro. A harmonia trata-se da combinação dos elementos musicais simultâneos. Já a melodia, se refere à sequência sonora que se apresenta na música, sendo percebida em nossa mente como uma unidade. É por isso que conseguimos assobiar umacanção, por exemplo, mesmo que não saibamos tocar um instrumento. Dança A dança é a arte do movimento corporal. Usa o corpo como instrumento, as pessoas podem exteriorizar seus sentimentos fazendo gestos cadenciados por um ritmo. É uma das formas mais antigas de manifestação artística, tendo origem ainda na pré-história. Muitas pessoas dançavam em rituais de celebração, agradecimento, cerimônias fúnebres e para pedir proteção. Ou seja, a dança tinha um caráter sagrado. Frequentemente, esse tipo de arte vem acompanhado da música, sendo quase sempre inseparáveis, entretanto é possível também expressar-se nessa linguagem sem que haja som. Metodologia do Ensino de Arte64 É uma maneira muito saudável de expressão, pois além de favorecer a criatividade, também auxilia na vitalidade corporal e psicológica, trazendo inúmeros benefícios. Pintura A pintura é a técnica de depositar pigmentos coloridos - que podem ser pastosos, líquidos ou em pó - sobre uma superfície, gerando imagens figurativas ou abstratas. Essa é uma atividade que permite às pessoas se comunicar e demonstrar sentimentos por meio de formas, cores e texturas. A história da pintura remonta o período pré-histórico, quando os seres humanos usavam as cavernas como suporte para seus desenhos. Esse tipo de arte era feito com pigmentos extraídos de óxidos minerais, ossos carbonizados, vegetais, carvão, sangue e gorduras de animais. A pintura e uma manifestação artística que permite aos homens conhecer melhor o seu passado, costumes e crenças, pois pode revelar muito sobre a cultura de determinada época e lugar. Além disso, é considerada uma das formas de arte mais tradicionais e boa parte das grandes obras da humanidade são pinturas com tinta a óleo. Escultura A escultura pode ser compreendida como a arte de modelar ou desgastar matérias brutas (como a argila, mármore, madeira e pedra) e convertê-las em objetos com significados, expressando ideias e sentimentos. Usando formas, espaços e volumes, o artista cria obras tridimensionais, ou seja, que têm altura, largura e profundidade. Assim como as outras formas de artes, a escultura também é muito antiga e começou a ser feita ainda nas sociedades primitivas. Metodologia do Ensino de Arte 65 Teatro O teatro é uma linguagem artística em que as pessoas, no caso os atores e atrizes, representam uma história para um público. A manifestação teatral mais parecida com a que conhecemos hoje no Ocidente surgiu na Grécia Antiga, no século VI a.C. Naquela época, o teatro mesclava temas sagrados e profanos e era feito em homenagem ao deus Dionísio, considerado o deus do vinho, das festas e da fertilidade. Nessas encenações, não era permitida a participação de mulheres, sendo apenas homens a desempenhar os papéis. Os gêneros teatrais que haviam na Grécia Antiga eram somente a comédia e a tragédia. Atualmente, o teatro foi se transformando e avançou também por outros territórios. Existem muitas maneiras e estilos de se fazer teatro, entre eles: musical, ópera, fantoches, teatro de sombras, drama, comédia, teatro de rua, teatro de palco, entre outros. Literatura Na literatura, a escrita é a ferramenta utilizada para se expressar. Por isso, a literatura é a arte da palavra. A invenção da escrita foi um dos acontecimentos mais importantes para a humanidade. Ela figurou um marco e delimita o fim da chamada “pré-história” e o início da “história”. Com o desenvolvimento da humanidade e sua evolução, ela passou a ser não só um meio de comunicação simples e direta, mas também uma ferramenta para transmissão de ideias, sentimentos, reflexões, pensamentos e para narrar histórias. O desenvolvimento da literatura aconteceu gradualmente e cada época e lugar possui características literárias distintas. Entretanto, podemos dizer que a literatura sempre representou uma importante fonte de conhecimento histórico acerca das sociedades. Metodologia do Ensino de Arte66 São muitas as maneiras de escrever e tipos de textos literários, por exemplo: prosa, ficção, romance, poesia e cordel. Cinema O cinema é uma forma de arte que surgiu após a invenção da fotografia, como desdobramento dela. Utilizando várias imagens - fotografias - que são projetadas muito rapidamente em uma tela, nosso olho enxerga essa sequência de fotos como um filme, ou seja, com movimento. Deste modo, é possível contar histórias, transmitindo assim sensações e aguçando sentimentos como alegria, medo, tristeza e amor. A origem dessa linguagem artística se deu no final do século XIX. Na época, muitas pessoas estavam buscando maneiras de criar algo semelhante ao cinema. Porém, foram os irmãos Auguste e Louis Lumière que fizeram a primeira projeção cinematográfica ao público, em 1895, na França. O filme exibido tinha 40 segundos de duração e intitulou- se “A chegada do trem à estação de La Ciotat” ou “A saída dos operários da fábrica”. O público ficou bastante surpreso e intrigado. Diz-se que algumas pessoas inclusive correram assustadas para o fundo da sala de projeção, com medo da movimentação do trem. A partir de então, essa técnica foi bastante aprimorada e hoje podemos apreciar e nos divertir com filmes em 3D, que dão a ilusão de estarmos de fato dentro da história contada. Fotografia A fotografia é uma palavra de origem grega e significa escrever com a luz, sendo que foto quer dizer luz e grafia exprime a noção de escrita. É uma arte que se utiliza de máquinas para captar imagens por meio de reações obtidas através da iluminação. Metodologia do Ensino de Arte 67 O ano de 1826 é considerado um marco na história da fotografia, quando o francês Joseph Niépce conseguiu fixar a primeira representação fotográfica em uma placa de estanho. Niépce posicionou seu invento – uma câmera escura – em frente a uma janela e deixou a luz solar entrar no interior da máquina por 8 horas. Isso resultou numa imagem um tanto quanto borrada do telhado da casa vizinha. A partir de então, a fotografia sofreu muitos avanços. Atualmente, com o progresso tecnológico e as redes sociais, essa linguagem vem ganhando cada vez mais espaço em nossas vidas e despertando o interesse das pessoas. No início de sua invenção, a fotografia não era considerada arte propriamente. Entretanto, com o passar do tempo foi possível compreender que essa linguagem também possui características e potencialidades criativas. Fotografar é como “recortar” o mundo, optar por exibir um ponto de vista, um determinado olhar. Contudo, também possibilita a criação de “novas realidades”, fazendo uso de cenários, figurinos e poses, explorando ao máximo toda a capacidade imaginativa do ser humano. História em quadrinhos A história em quadrinhos, ou simplesmente HQ, é uma sequência de desenhos feitos em quadros que juntos contam uma história. Normalmente, se utiliza de balões e textos escritos dentro deles a fim de contar o que as personagens estão conversando ou pensando. Essa maneira de narrar histórias surgiu entre 1894 e 1895. Seu inventor foi o americano Richard Outcault, que publicou em jornais o que foi considerada a primeira história em quadrinhos. Na atualidade, as HQs estão presentes em todo o mundo e representam um importante meio de comunicação de massa. Metodologia do Ensino de Arte68 Os suportes escolhidos pela maioria dos desenhistas de quadrinhos - também chamados cartunistas - são os livros, gibis ou tiras publicadas em jornais e revistas. Jogos eletrônicos Os jogos eletrônicos – os famosos games - são programas nos quais as pessoas interagem com objetos virtualmente, tendo que ultrapassar desafios, cumprindo metas e se divertindo. Foram apresentados ao público na década 1970, sendo fruto de experimentações de acadêmicos em torno de pesquisas na área da ciência da computação. Por conta da evolução tecnológica, os jogos eletrônicos estão sendo constantemente aprimorados, sendo uma das formas mais populares de diversão e entretenimento em todo o mundo.Arte digital Toda a forma realizada por meio de computadores pode ser chamada de arte digital. Trata-se de um tipo de arte que evoluiu junto com o desenvolvimento tecnológico. Ela teve seu crescimento na década de 1980 e foi impulsionada pela música do francês Pierre Henry, considerado o precursor da música eletrônica. Hoje em dia, essa forma de expressão - também conhecida como ciberarte - engloba muitas linguagens além da música, como o vídeo, fotografia, desenho, cinema e até mesmo a literatura. É uma arte relativamente nova que está se expandindo bastante. Os suportes escolhidos normalmente são as telas de computadores, smartphones, tablets, televisores, projeções e impressões gráficas. Metodologia do Ensino de Arte 69 RESUMINDO Neste capítulo, você aprendeu que: A arte é um conceito bastante polissêmico, histórico e vinculado às culturas e formas de ver o mundo. Está relacionada às formas como o homem percebe a realidade que o cerca; A arte está em todo lugar, podendo ser criada e reconhecida nas mais diversas situações. Ao mesmo tempo, na atualidade, a noção de arte passa pela busca por interação com o público; São 11 as formas de arte na atualidade, que se utilizam de diferentes recursos, matérias-primas e tecnologias. Metodologia do Ensino de Arte70 Refletindo sobre o ensino de arte na escola OBJETIVO Ao término deste capítulo você será capaz de entender alguns pressupostos importantes para o ensino de arte na escola. Isso fará toda a diferença em sua atuação profissional, uma vez que a arte faz parte do dia a dia da escola. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Figura 2 Fonte: Pixabay. Metodologia do Ensino de Arte 71 A escola é o espaço da arte! Por muito tempo, o ensino de Arte na escola se resumiu a tarefas pouco criativas e marcadamente repetitivas. Desvalorizadas na grade curricular, as aulas dificilmente tinham continuidade ao longo do ano letivo. Essas atividades iam desde trabalhos de ligar pontos até a cópia de formas geométricas. Dessa forma, a criança não era considerada uma produtora de arte e, por isso, cabia ao professor dirigir seu trabalho e demonstrar o que deveria ser feito. Nos últimos vinte anos, essa situação vem mudando nas escolas brasileiras. Hoje, a tendência que guia a área é a chamada sociointeracionista, que apregoa a mistura e a pluralidade de produção, reflexão e apreciação de obras artísticas. Como defendem as próprias políticas norteadoras da educação, é papel da escola o ensino da produção histórica e social da arte e, ao mesmo tempo, a garantia ao aluno da liberdade de imaginar e edificar propostas artísticas pessoais ou grupais com base em intenções próprias. Infelizmente, no entanto, ainda há professores trabalhando na chamada metodologia tradicional, que supervaloriza os exercícios mecânicos e as cópias por acreditar que a repetição é capaz de garantir que os alunos “fixem modelos”. Sob essa perspectiva, o válido é o produto final (e ele é mais bem avaliado quanto mais próximo for do original). É por isso que, além de desenhos pré-preparados, tantas crianças tenham sido obrigadas ao longo dos tempos a apenas memorizar textos teatrais e partituras de música para se apresentar em datas comemorativas - sem falar no treino exaustivo e mecânico de habilidades manuais em atividades de tecelagem e bordado. Só nos anos 1960, com o surgimento do movimento da Escola Nova, ideias mais inovadoras começaram a influenciar as aulas de Arte. Na época, a proposta era romper totalmente com o jeito anterior de trabalhar. Segundo esse modelo, batizado de Metodologia do Ensino de Arte72 escola espontaneísta (ou livre expressão), os professores forneciam materiais, espaço e estrutura para as turmas criarem e não interferiam durante a produção dos estudantes. Tudo para permitir que a arte surgisse naturalmente nos estudantes, de dentro para fora e sem orientações que pudessem atrapalhar esse processo. A evolução conceitual da disciplina Alguns anos depois do surgimento da Escola Nova, outras concepções foram sendo construídas, abrindo espaço para a consolidação da perspectiva sociointeracionista, a mais indicada pelos especialistas hoje por permitir que crianças e jovens não apenas conheçam as manifestações culturais da humanidade e da sociedade em que estão inseridas, mas também soltem a imaginação e desenvolvam a criatividade, utilizando todos os equipamentos e ferramentas à sua disposição. Nos anos 1990, duas importantes inovações contribuíram significativamente para direcionar o caminho para o modelo atual de ensino: na Espanha, Fernando Hernández defendeu o estudo da chamada cultura visual (muito além das artes visuais clássicas, era necessário, segundo ele, trabalhar com videoclipes, internet, histórias em quadrinhos, objetos populares e da cultura de massa, rótulos e outdoors nas salas de aula). No Brasil, Ana Mae Barbosa elaborou a metodologia da proposta triangular (inspirada em ideias norte-americanas e inglesas, recuperou conteúdos e objetivos que tinham sido abandonados pela escola espontaneísta). Ela defendia que o professor deveria usar o seguinte tripé em classe: o fazer artístico, a história da arte e a leitura de obras. Esse tripé original é considerado uma “matriz” dos eixos de aprendizagem que dominam o ensino atualmente: a produção, a apreciação artística e a reflexão. O “novo” tripé ajuda a desconstruir alguns dos mitos que rondam as salas de Arte nas escolas brasileiras, como a confusão entre a necessidade Metodologia do Ensino de Arte 73 de ter muito material e estrutura para obter uma resposta “de qualidade” dos alunos. Na perspectiva sociointeracionista, o fazer artístico (produção) permite que o aluno exercite e explore diversas formas de expressão. A análise das produções (apreciação) é o caminho para estabelecer ligações com o que já sabe e o pensar sobre a história daquele objeto de estudo (reflexão) é a forma de compreender os períodos e modelos produtivos. Alguns mitos pedagógicos sobre o ensino de Arte A seguir, apresentaremos alguns dos principais mitos que norteiam a prática pedagógica do ensino de Arte nas escolas. Reprodução e releitura Mostrar uma obra de arte, discutir suas características e pedir que cada aluno faça o mesmo desenho no caderno não é propor uma releitura. Isso é uma simples reprodução ou cópia de materiais. Na releitura, parte-se de uma obra para criar outro trabalho (ou seja, o estudante transforma e interpreta). Só se produz trabalhos artísticos com material Qualidade não é quantidade. Um trabalho que garanta uma aprendizagem significativa para os alunos não depende de riqueza de material, mas de conteúdo, de estratégias, de metodologias e também de propostas que ofereçam oportunidades de participação. A arte estimula a criatividade A Arte ajuda a desenvolver a criatividade - e outras habilidades - se os conteúdos são aprendidos. Mas o mesmo ocorre quando, por exemplo, o aluno levanta uma hipótese na Metodologia do Ensino de Arte74 aula de Ciências ou pensa numa estratégia para um problema em Matemática. A criatividade ocorre independentemente de uma ou outra disciplina. As grandes linguagens artísticas são apenas quatro: dança, artes visuais, teatro e música O ideal é que as aulas de Arte contemplem atividades de quatro linguagens: dança, artes visuais, teatro e música. As diferentes manifestações culturais (das mais clássicas às mais vanguardistas) também merecem análise como resultado de um conjunto de valores e uma maneira de os seres humanos interagirem com o mundo em que vivem (ou viveram). Cotidianamente, a prática tem de combinar simultaneamente os três eixos citados anteriormente para que todos os estudantes avancem Mesmo que o trabalho dê ênfase mais para uma linguagem artística agora e mais para outra daqui a pouco, é necessário que fique claro que todos são interligados, fazem parte de um processo. Tambémé interessante variar as maneiras de estudar os conteúdos e programar as atividades ao longo do ano, pois, assim como na prática artística há um pensar fazendo e um fazer pensando, quando ensinamos, a ação também mobiliza para a reflexão e a reflexão transforma a ação. Linha do tempo sobre o ensino de Arte nas escolas brasileiras A seguir, apresentaremos brevemente um panorama histórico sobre o desenvolvimento do ensino de Arte no Brasil: � 1816: Durante o governo de dom João VI, chega ao Rio de Janeiro a Missão Artística Francesa e é criada a Academia Imperial de Belas Artes. Seguindo modelos europeus, é instalado oficialmente o ensino de Arte nas escolas. Metodologia do Ensino de Arte 75 � 1900: Até o início do século 20, o ensino do desenho é visto como uma preparação para o trabalho em fábricas e serviços artesanais. São valorizados o traço, a repetição de modelos e o desenho geométrico. � 1922: Apesar da efervescência das manifestações da Semana de Arte Moderna, o ensino segue as tendências da escola tradicional, que defende a necessidade de copiar modelos para treinar habilidades manuais. � 1930: O compositor Heitor Villa-Lobos, no governo de Getúlio Vargas, institui o projeto de canto orfeônico nas escolas. São formados corais, que se desenvolvem pela memorização de letras de músicas de caráter folclórico e cívico. � 1935: O escritor Mario de Andrade, então diretor do Departamento de Cultura do município de São Paulo, promove um concurso de desenho para crianças com tema livre. O ganhador recebe uma quantia em dinheiro. � 1948: É criada no Rio de Janeiro a primeira “Escolinha de Arte”, com a intenção de propor atividades para o aluno desenvolver a autoexpressão e a prática. Em 1971, chega a 32 o número de instituições particulares desse tipo no país. � 1960: As experimentações que marcam a sociedade, como o movimento da bossa nova, influenciam o ensino de Arte nas escolas de todo o país. É a época da tendência da livre expressão se expandir pelas redes de ensino. � 1971: Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), a Educação Artística (que inclui artes plásticas, educação musical e artes cênicas) passa a fazer parte do currículo escolar do Ensino Fundamental e Médio. � 1973: Criação dos primeiros cursos de licenciatura em Arte, com dois anos de duração e voltados à formação de professores capazes de lecionar música, teatro, artes visuais, desenho, dança e desenho geométrico. � 1989: Desde 1982 desenvolvendo pesquisas sobre três ideias (fazer, ler imagens e estudar a história da arte), Ana Mae Metodologia do Ensino de Arte76 Barbosa cria a proposta triangular, que inova ao colocar obras como referência para os alunos. � 1996: A Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional passa a considerar a Arte como disciplina obrigatória da Educação Básica. Os Parâmetros Curriculares Nacionais definem que ela é composta de quatro linguagens: artes visuais, dança, música e teatro. Metodologias mais comuns no ensino de Arte O ensino de Arte passou por muitas transformações ao longo da história. A seguir, apresentaremos algumas das principais metodologias de ensino de Arte. Metodologia tradicional Unânime na maneira de ensinar desde o fim do século XIX até a década de 1950. Ainda está presente em muitas escolas. � Foco: Aprendizado de técnicas e desenvolvimento de habilidades manuais, coordenação motora e precisão de movimentos para o preparo de um produto final. �Estratégia de ensino: Repetição de atividades, cópia de modelos e memorização. O professor adota a postura de transmissor do conhecimento. Ao aluno, basta absorver o que é ensinado sem espaço para a contestação. A turma era bem avaliada quando conseguia reproduzir com rigor as obras de artistas consagrados. Livre expressão Nasceu por volta de 1960, por influência das ideias do movimento da Escola Nova. � Foco: O que importa não é o resultado, mas o processo e, principalmente, a experiência. Há a valorização do Metodologia do Ensino de Arte 77 desenvolvimento criador e da iniciativa do aluno durante as atividades em classe. �Estratégia de ensino: Desenho livre e uso variado de materiais. Não há certo ou errado na maneira de fazer de cada estudante. Ao professor, não cabe corrigir ou orientar os trabalhos nem mesmo utilizar outras produções artísticas para influenciar a turma. A ideia é que o estudante exponha suas inspirações internas. Metodologia sociointeracionista É a tendência mais atual para o ensino da disciplina. A ideia de considerar a relação da cultura com os conhecimentos do aluno e as produções artísticas surgiu na década de 1980. � Foco: Favorecer a formação do aluno por meio do ensino das quatro linguagens de Arte: dança, artes visuais, música e teatro. �Estratégia de ensino: A experiência do aluno e o saber trazido de fora da escola são considerados importantes e o professor deve fazer a intermediação entre eles. O ensino é baseado em três eixos interligados: produção (fazer e desenvolver um percurso de criação), apreciação (interpretar obras artísticas) e reflexão sobre a arte (contextualizar e pesquisar). Apesar dessa divisão, não deve haver uma ordem rígida ou uma priorização desses elementos ao longo do ano letivo. De modo geral, o ensino de Arte tem sido pensado como fundamental para contribuir ao desenvolvimento dos alunos, e por isso, vem sofrendo uma série de modificações e de reflexões, a fim de que se torne mais potente, no sentido de desenvolver a competência linguística dos estudantes. Da mesma forma, é necessário que se estimule a criação artística, o desenvolvimento da imaginação e da criatividade na escola, cujo espaço por ser “invadido” por obras de arte e intervenções artísticas das mais diversas. Metodologia do Ensino de Arte78 RESUMINDO Neste capítulo, você aprendeu que: O ensino de Arte na escola foi pensado, no Brasil, desde o século XIX, e de lá para cá, vem passando por uma série de reformulações; Atualmente, a metodologia sociointeracionista, que compreende a arte como uma forma de expressão e de interação, e não apenas de reprodução de grandes obras, tem sigo a metodologia de ensino mais discutida no campo da Educação; A arte pode estar em todo lugar, mas nem tudo é arte; A escola é o lugar da arte; por isso, é importante que esse espaço de criação seja utilizado e valorizado. Metodologia do Ensino de Arte 79 OBJETIVO Ao término deste capítulo você será capaz de entender como se organiza a linguagem poética, e sua importância para o ensino da Arte. Conhecer a natureza dos gêneros literários, e como eles constituem os gêneros textuais considerados como pertencentes à linguagem literária será fundamental para o exercício de sua profissão. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Relacionando linguagem artística e poesia Figura 3 Fonte: Pixabay Metodologia do Ensino de Arte80 Intertextualidade e metalinguagem Conforme já abordado nas outras unidades, a intertextualidade se manifesta pelo diálogo entre textos, intencional, que faz com que um texto mais recente amplie ou “responda” a outro texto, ampliando, desconstruindo e pluralizando suas ideias. A metalinguagem se manifesta quando, por meio da linguagem, se procura descrever a própria linguagem. O texto literário apresenta essa característica quando procura conceituar determinados temas, ainda que de forma conotativa. Poesia e poema A poesia é um conjunto de características e técnicas de elaboração artística; o poema é uma das manifestações concretas da poesia. A noção de poesia está ligada ao grego poiésis, que era sinônimo de processo criativo, e depois, passou a nomear o processo criativo da poesia. Também, segundo Platão, poiésis designava os processos para se alcançar a imortalidade. Na atualidade, os significados de poiésis não se modificaram muito, haja vista que por meio da poesia, os homens se tornam imortais,uma vez que suas criações artísticas falam por eles. O poema é uma manifestação concreta da poesia, assim como a dança, a música, o cinema, a literatura, o romance, etc. Aquilo que atinge a perfeição artística possui poesia; o poema cuja perfeição ultrapassa os limites do cotidiano e do não- artístico é um poema (seja ele haicai, soneto, ode, balada etc.) carregado de poesia. Língua e arte literária A língua de um povo dito civilizado é constituída por várias modalidades, que podem existir juntas, com suas peculiaridades sem, necessariamente, romperem com sua unidade linguística. Metodologia do Ensino de Arte 81 A língua denominada geral é aquela oficializada por um país, vivificada pelo uso comum e aceita socialmente. Está acima das regionalidades, sempre existentes. No contexto brasileiro, é a língua portuguesa, vista em seu conjunto. A língua geral tende a conviver com as tonalidades regionais, na fonética e no vocabulário, resultando dali os falares regionais, que atingem fortemente a expressão cultural e literária em algumas áreas geográficas do país. Quando essas características são muito acentuadas, temos o que se chama de dialeto. O linguajar regional, com seus modismos e peculiaridades, é comumente retratado por escritores regionalistas em suas obras literárias. A língua popular é a fala espontânea do dia a dia de um povo. Quase sempre, destoa da norma gramatical e é rica em plebeísmos (palavras vulgares e gírias). Nessa modalidade da língua está inserida a fala familiar ou coloquial, sem a preocupação com a correção gramatical, dependendo do nível de escolaridade de seus falantes. A língua culta é utilizada pelas pessoas instruídas das diferentes profissões e níveis sociais. É pautada pelos preceitos vigentes da gramática normativa e se caracteriza pelo cuidado com a forma e o léxico. Seu vocabulário é mais prestigiado, servindo de ferramenta para as ciências e para o ensino nas escolas. Em língua culta se elaboram as obras científicas, as obras didáticas, textos midiáticos, documentos oficiais, etc. A mais artificial dessas linguagens ocupa o âmbito artístico, sendo conhecida como linguagem literária. Uma língua pode ser tanto falada como escrita, conforme são utilizados os signos vocais e os sinais gráficos. A língua falada é viva e atual; a língua escrita é a representação ou a imagem da língua escrita. A fala é mais comunicativa e insinuante, pois as palavras pressupõem sonoridade e inflexões, ritmos e gesticulação, dentre outros fatores. Metodologia do Ensino de Arte82 A comunicação oral ou escrita acontece em diferentes níveis de expressão. Dependendo das circunstâncias do ato comunicativo, o indivíduo utiliza um tipo de linguagem adequado à situação. O grau de instrução do usuário de língua portuguesa, seu meio sociocultural, sua profissão, entre outros fatores, atua fortemente na variação do idioma. Elementos da obra literária Podemos dividir os elementos fundamentais da obra literária em conteúdo e forma. �Conteúdo ou fundo: São ideias, conceitos, apelos, sentimentos e imagens imateriais que as palavras transmitem da mente do escritor para os leitores. � Forma: É a expressão linguística, a linguagem falada ou escrita, veículo de ideias e de sentimentos. A forma como uma obra literária pode se apresentar se manifesta sob dois aspectos diferentes: a prosa e o verso. � Prosa é a linguagem objetiva, usual, direta, veículo comum de pensamento. Mesmo que seja vazada em prosa, uma obra literária pode estar quase que predominantemente permeada de pensamentos poéticos. �A poesia é a linguagem subjetiva, carregada de emoção e sentimento, com ritmo, melodia constante, beleza e tão indefinível quando o mundo interior do poeta, objetivando a um efeito estético. Distribuída em linhas descontínuas ou versos, que podem ser metrificados ou livres, a linguagem poética, sob o aspecto melódico ou mesmo auditivo, se caracteriza pelo ritmo bem mais acentuado do que na linguagem em prosa, e pela eventual utilização de rimas. Metodologia do Ensino de Arte 83 Considera-se, também, que a obra literária é somente o escrito que se diferencia dos demais pela beleza da forma e pela excelência de conteúdo. Será tanto mais apreciada quanto maior seu poder de sugerir, de tocar nossa sensibilidade, de empolgar o nosso espírito. As obras literárias de alcance universal têm, comumente, mais valor que as de caráter estritamente nacional ou regional. Estilo Denominamos por estilo a maneira como cada um exprime seus pensamentos, sentimentos e emoções por meio da linguagem. Cada escritor possui seu estilo próprio e pessoal, ou seja, sua expressão reveste uma forma característica, pela qual são manifestos seus impulsos emotivos, sua sensibilidade, a feição peculiar de seu espírito. Em outras palavras, o estilo é o espelho em que se reflete a alma do escritor, a tela em que é projetada a personalidade do artista. Além dessas características individuais que diferenciam os autores uns dos outros, o estilo mostra também os traços psicológicos e culturais da raça e as tendências dominantes das diversas escolas e correntes literárias que fizeram época através dos tempos. Por isso, dizemos que há um estilo clássico, um estilo barroco, um estilo romântico, etc. É pelo seu estilo primoroso e brilhante que os grandes artistas da palavra conseguem criar obras de grande beleza. No estilo cumpre diferenciar o aspecto material ou linguístico e o aspecto mental, psíquico, subjetivo, os traços que exprimem sua dimensão psicológica, suas tendências, seu modo de ver e de julgar a vida e o mundo em que vive. Da fusão de todos esses elementos, é que surge o estilo. Metodologia do Ensino de Arte84 Versificação A versificação é a técnica ou a arte de se fazer versos. Em linhas gerais, o verso é uma linha poética, com número determinado de sílabas e agradável movimento de ritmo. a. Metro: Metro é a medida ou extensão da linha poética. Em língua portuguesa, os poetas têm utilizado doze tipos de versos, que vão de uma a doze sílabas, sendo raros os versos que ultrapassam esse número silábico. Conforme o número de sílabas, os versos são classificados da seguinte forma: Quadro 1: Classificação dos versos quanto ao número de sílabas Número de versos Classificação 1 Monossílabo 2 Dissílabo 3 Trissílabo 4 Tetrassílabo 5 Pentassílabo ou redondilha menor 6 Hexassílabo 7 Heptassílabo ou redondilha maior 8 Octossílabo 9 Eneassílabo 10 Decassílabo ou heroico 11 Hendecassílabo 12 Dodecassílabo ou alexandrino Fonte: Elaborado pelo autor, a partir de Cegala (2005). As sílabas métricas, isto é, as sílabas dos versos coincidem com as sílabas gramaticais, porém sua contagem se faz auditivamente, e se subordina aos seguintes princípios: b. Sempre que duas ou mais vogais se encontram no fim de uma palavra e no começo de outra, e podem ser ditas numa só emissão de voz, unem-se numa mesma sílaba métrica. Metodologia do Ensino de Arte 85 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 A i Da de aus te ra e no bre a que che ga mos c. Ditongos crescentes valem, quase sempre, uma única sílaba métrica. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 O pe rá rio mo des to, a be lha po bre d. Não se conta(m) a(s) sílaba(s) que se segue(m) ao último acento tônico do verso. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Quan do no poen Te o sol des do Bra as clâ mides Essa última regra só se atinge versos graves (que terminam por palavras paroxítonas) e esdrúxulos (que terminam por palavras proparoxítonas). Nos versos agudos (que terminam por palavras oxítonas) contam-se todas as sílabas. Ritmo O ritmo é o resultado a singular sucessão de sílabas átonas ou fracas e de sílabas tônicas ou fortes. É o elemento melódico do verso, tão importante à poesia como é para a música. Junto com a rima e as imagens poéticas, transmite a versos um misterioso poder de emoção e de encantamento. Os acentos tônicos ou as sílabas tônicas devem se repetir com intervalos semelhantes, de modo que o verso setorne melodioso. Não se distribuem as sílabas tônicas arbitrariamente, mas devem, segundo o tipo de verso, recair em determinadas sílabas. Metodologia do Ensino de Arte86 Simetria e assimetria Podemos definir a simetria como uma espécie de regularidade métrica e rítmica dos versos, enquanto a assimetria é caracterizada por maior liberdade em relação às regularidades dos versos. Encadeamento Quando a pausa final do verso não coincide com a pausa respiratória, ou quando o verso não finaliza juntamente com um segmento sintático, temos aquilo que chamamos de encadeamento ou transbordamento, mais conhecido pela palavra francesa enjambement. Em geral, procura-se não realizar pausa no fim dos versos, porém, pode-se fazer uma breve pausa, mas conservando-se a voz suspensa. Rima A rima é considerada a identidade ou a semelhança de som do fim (ou do meio dos versos. Mesmo que seja um elemento secundário e até mesmo dispensável, a rima é aproveitada pelos poetas para comunicar aos versos maior harmonização. É um recurso musical que agrada aos ouvidos. Foneticamente, as rimas podem ser: � Perfeitas: sereno e moreno, nele e leve etc; � Imperfeitas: Deus e céus, estrela e vela etc; �Toantes: são rimas idênticas somente na vogal tônica, como casa e vale, lírio e livro etc. Segundo a posição do acento tônico das palavras, as rimas podem ser: �Agudas ou masculinas: feroz e atroz, amor e clamor etc; �Graves ou femininas: festa e manifesta, flores e cores etc; �Esdrúxulas: mágico e trágico, lírico e onírico etc. Conforme o valor, são as rimas classificadas em: Metodologia do Ensino de Arte 87 � Pobres: são as rimas consideradas vulgares e as formadas com palavras de mesma morfologia, como coração e oração, amor e temor etc; �Ricas: rimas formadas com palavras de classes grama- ticais diferentes, como prece e adormece, penas e apenas etc; �Raras: são as rimas que são obtidas com palavras de muito poucas rimas possíveis, como cisne e tisne, bosque e enrosque etc; � Preciosas: são rimas artificiais, como vê-la e estrela, trantuilo e ouvilo etc. Versos regulares São os versos que obedecem às regras clássicas, que determinam a posição das sílabas acentuadas em cada tipo de verso. Suas rimas aparecem de modo regular, sendo marcadas pela semelhança fônica no final de cada verso. Versos brancos São versos que obedecem a certa métrica, porém, sem a presença de rimas. Versos livres Não obedecem a regras nem quanto ao metro, nem quanto à posição silábica. Também não apresentam regularidade de rimas. Versos polimétricos São versos que apresentam certa regularidade, mas tamanhos diferentes, com sílabas fortes localizadas em posições indicadas pelas métricas tradicionais. Estrofe A estrofe, também chamada de estância, é um grupo de versos de um poema Elas podem ser formadas por versos de Metodologia do Ensino de Arte88 RESUMINDO Neste capítulo, você aprendeu: A intertextualidade é um elemento que faz parte dos textos, uma vez que cada texto literário pode ampliar, tensionar, reformular conceitos de textos anteriores; A metalinguagem de um texto literário se manifesta quando, por meio da linguagem literária, se busca conceituar determinados elementos; O texto poético, em especial aquele pertencente ao gênero lírico, apresenta uma constituição bastante rica, marcada por ornamentos e por jogos de linguagem possíveis, a fim de atingir determinadas perfeições artísticas. medida igual ou diferentes. Conforme o número de versos, são denominadas das seguintes maneiras: Quadro 2: Nomenclatura das estrofes Número de versos Nomenclatura da estrofe 2 Dístico 3 Terceto 4 Quadra ou quarteto 5 Quintilha 6 Sextilha 8 Oitava 10 Décima Fonte: Elaborado pelo autor, a partir de Cegala (2005). Chamamos de estribilho ou de refrão o verso que costuma se repetir no final das estrofes de determinados poemas, como por exemplo, a balada. Metodologia do Ensino de Arte 89 Compreendendo teoricamente as noções de poesia e teatro OBJETIVO Ao término deste capítulo você será capaz de compreender os elementos básicos que caracterizam e constituem os gêneros lírico e dramático. Como um estudante do curso de Pedagogia, é importante que você os conheça, para que sua análise e trabalho com obras de arte se torne mais abrangente, fundamentada e profissional. Conhecer a natureza da poesia e do teatro, e como eles constituem os gêneros textuais considerados como pertencentes à linguagem literária (e, consequentemente, artística) será fundamental para o exercício de sua profissão. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Figura 4 Fonte: Pixabay Metodologia do Ensino de Arte90 O gênero lírico Leia o poema a seguir, de autoria de Vinícius de Moraes: Um poema acentuadamente lírico Apavorado acordo, em treva. O luar É como o espectro do meu sonho em mim E sem destino, e louco, sou o mar Patético, sonâmbulo e sem fim. Desço da noite, envolto em sono; e os braços Como ímãs, atraio o firmamento Enquanto os bruxos, velhos e devassos Assoviam de mim na voz do vento. Sou o mar! Sou o mar! Meu corpo informe Sem dimensão e sem razão me leva Para o silêncio onde o Silêncio dorme Enorme. E como o mar dentro da treva Num constante arremesso largo e aflito Eu me despedaço em vão contra o infinito. Disponível em: MORAES, Vinicius de. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 1985, p. 1. Visualmente, o poema de Vinícius de Moraes é um soneto, pois é formado por quatro estrofes, sendo que a primeira e a segunda possuem quatro versos cada; a terceira e a quarta estrofes possuem três versos cada. Há, também, o esquema de rimas externas, caracterizado por: A-B-A-B; C-D-C-D; E-F-E; F-G-G. Metodologia do Ensino de Arte 91 As rimas externas são aquelas que aparecem no final dos versos, sendo que cada sílaba tônica da última palavra é indicada por uma letra do alfabeto, e ao repetir-se o som, repete-se a letra indicativa. No caso do poema, as letras “A”, por exemplo, correspondem a “luar” e “o mar”; as letras “B”, correspondem a “em mim” e “sem fim”, e assim, sucessivamente. No soneto de Vinícius de Moraes, a um eu, uma voz que fala no poema. Essa voz apresenta angústia, solidão, e um traço importante: fusão entre o sujeito e o objeto, o que se percebe em versos como “[...] sou o mar”. Percebemos a presença do sujeito lírico não apenas pela utilização do pronome “eu”, ou pela flexão dos verbos na 1ª pessoa do singular, mas também pela forma como ele se projeta nos arranjos linguísticos durante todo o poema. Além disso, a emoção lírica no texto é percebida pela repetição constante da conjunção coordenativa aditiva e, o que impede uma conexão lógica. O esquema de rimas externas, abordado anteriormente, confere ao poema um tom de musicalidade, caracterizando o caráter emocional do texto. Entre o quinto e o sexto versos, temos uma quebra da linearidade frasal, com o trecho “[...] e os braços”, o que torna as ideias incompletas, caracterizando o que se chama de enjambement, caracterizando, também, uma mímesis de um estado afetivo. Além disso, há a presença de uma disposição anímica eliminando os distanciamentos entre as coisas, por meio do estado afetivo, e os recursos sonoros criam uma unidade de significação difícil de ser alterada. Em poucas linhas fizemos a análise literária de um poema. Agora, passaremos a discutir alguns elementos fundamentais que constituem o gênero lírico. Antes de mais nada, um detalhe histórico: o gênero lírico surgiu na Grécia Antiga, como uma forma de manifestação em verso para expressar diferentes emoções da esfera humana. Seu nome está associado ao instrumento musical que acompanhava as declamações: a lira. Até boa parte da Idade Média, poesia e música não eram entendidos como elementos separados, sendo indissociável a utilização da melodia durante Metodologia do Ensino de Arte92 as declamações. Somente a partir do Renascimento Cultural, no períodoliterário conhecido como Humanismo, começa a haver uma separação maior entre essas duas artes. Ao gênero lírico, em grande medida, pertencem os poemas nas suas mais variadas formas, o que não impede – obviamente – a pertença de outros gêneros textuais, desde que apresentem a predominância das marcas do gênero. Da mesma forma, como vimos no capítulo anterior, há uma diferença entre poesia e poema. A poesia é um conjunto de características e técnicas de elaboração artística; o poema é uma das manifestações concretas da poesia. Um dos primeiros elementos a se observar na análise do poema é sua estrutura visual (número de estrofes e de versos, disposição visual, etc.). Essa observação é importante para que se estabeleça relações de sentido entre o texto e sua forma visual. Essa análise é também conhecida como a análise do nível gráfico do poema, ou seja, da forma como ele está escrito. Nessa análise, também é importante observar o título, pois ele serve como uma espécie de slogan do poema, interferindo em sua significação. Tanto a disposição das palavras quanto os espaços em branco são importantes para essa análise. Após a “leitura visual” do poema, passamos para a análise do nível fônico do poema, observando os elementos de versificação, as repetições, a acentuação, a entonação, etc. Podemos dividir essa análise nas seguintes verificações: a. Construção métrica: de que forma os versos estão constituídos? Há quantas sílabas ortográficas em cada verso? b. Acentuação: de que forma está disposta a organização das sílabas tônicas nos versos? Lembre-se que as sílabas tônicas conferem a musicalidade ao poema, e nem sempre essas sílabas estão de acordo com a linguagem denotativa. c. Figuras sonoras: de que modos estão organizadas as rimas do poema? Estão no final dos versos (externas) ou Metodologia do Ensino de Arte 93 aparecem em seu interior (internas)? São feitas por meio de consoantes (aliteração) ou de vogais (assonância)? d. Enjambements: há “quebras” de sentido na linearidade do texto? Como elas interferem na compreensão geral do poema? Outro nível relevante a ser considerado no poema é o nível lexical. De que forma o sentido denotativo das palavras constitui sua literariedade? Há a presença de metaplasmos (desvios morfológicos), metataxes (desvios sintáticos) ou metassememas (desvios semânticos) da linguagem poética em relação ao sentido denotativo das palavras? De que forma ocorre a escolha lexical no texto? Se dá mais pela sonoridade ou pela construção semântica? No nível sintático, aprofunda-se a análise dos desvios sintáticos na construção do texto. No nível semântico, procura-se observar a estrutura de significação das palavras no texto, por meio das semelhanças e diferenças entre o sentido do texto e o sentido literal das palavras. Procura-se observar, também, quais figuras de sentido estão sendo construídas ao longo do poema. Além dessas análises, há algumas formas fixas de poemas que merecem ser mencionadas: �Hino: Geralmente, trata-se de um poema para canto coral, carregado de valoração, caracterizado por sua ligação com a música; �Ode: A ode, assim como o hino, é um poema carregado de musicalidade, porém, interpretado apenas por um cantor, acompanhado de um instrumento musical. Apresenta tons mais graves em relação ao hino e aos demais poemas; �Elegia: Poema que se apresenta como um canto grave, com a finalidade de estimular a reflexão sobre os sentimentos mais profundos; Metodologia do Ensino de Arte94 �Canção: Poesia relacionada diretamente à música e ao canto. Seu sentido se completa com esses dois elementos; �Cantiga: Semelhante à canção, associa-se ao canto, à música e também à dança. Eram muito populares durante a Idade Média; � Soneto: poema composto por quatro estrofes, sendo a primeira e a segunda com quatro versos cada uma, e a terceira e a quarta estrofes com três versos cada uma, obedecendo a um padrão de rimas externas e encerrando com uma conclusão muitas vezes inesperada, denominada “chave de ouro”; �Balada: forma poética surgida durante a Idade Média, composta para ser musicada e cantada com acompanhamento coreográfico em festas culturais; �Haicai: poema de origem japonesa, com forma breve e sentenciosa, que busca correspondência entre o som e o sentido das palavras, por meio da construção de onomatopeias e paranomásias. É importante ressaltar que além dessas, há outras formas poéticas, fixas (rondó, rondel, vilancete, redondilha, madrigal, epigrama, bucólica, caligrama, epístola, lira, oitava, panegírico, parábola, quadra, rapsódia, sátira, sextina, terceto etc.) e livres (sem rimas e sem métrica versal fixa) que podem ser aprendidas e exploradas. Aqui, apresentamos algumas das mais importantes. SAIBA MAIS Para complementar seus estudos, sugerimos que você assista ao vídeo “Gênero Lírico – Brasil Escola”, disponível em: https:// bit.ly/2LwznRn Metodologia do Ensino de Arte 95 O gênero dramático Observe o trecho a seguir: JOÃO GRILO – Padre João! Padre João! PADRE (aparecendo na igreja) – Que há? Que gritaria é essa? Fala afetadamente com aquela pronúncia e aquele estilo que Leon Bloy chamava “sacertotais”. CHICÓ – Mandaram avisar para o senhor não sair, porque vem uma pessoa aqui trazer um cachorro que está se ultimando para o senhor benzer. PADRE – Para eu benzer? CHICÓ – Sim. PADRE – Com desprezo – Um cachorro? CHICÓ – Sim. PADRE – Que maluquice! Que besteira! JOÃO GRILO – Cansei de dizer a ele que o senhor não benzia. Benze porque benze, vim com ele. PADRE – Não benzo de jeito nenhum. CHICÓ – Mas padre, não vejo nada de mal em se benzer o bicho. JOÃO GRILO – No dia em que chegou o motor novo do Major Antônio Morais o senhor não benzeu? PADRE – Motor é diferente, é uma coisa que todo mundo benze. Cachorro é que eu nunca ouvi falar. CHICÓ – Eu acho cachorro uma coisa muito melhor do que motor. Metodologia do Ensino de Arte96 PADRE – É, mas quem vai ficar engraçado sou eu, benzendo o cachorro. Benzer motor é fácil, todo mundo faz isso, mas benzer cachorro? JOÃO GRILO – É, Chicó, o padre tem razão... Quem vai ficar engraçado é ele e uma coisa é benzer o motor do Major Antônio Morais e outra é benzer o cachorro do Major Antônio Morais. PADRE – Mão em concha no ouvido – Como? JOÃO GRILO – É. Eu não queria vir, com medo de que o senhor se zangasse, mas o Major é rico e poderoso e eu trabalho na mina dele. Com medo de perder meu emprego, fui forçado a obedecer, mas disse a Chicó: o padre vai se zangar. PARDRE – desfazendo-se em sorrisos – Zangar nada, João! Quem é um ministro de Deus para ter direito de se zangar? Falei por falar, mas também vocês não tinham dito de quem era o cachorro. SUASSUNA, Ariano. Auto da compadecida. 9 ed. Rio de Janeiro: Agir, 1972, p. 31-4. O trecho anteriormente apresentado, do Auto da compadecida, ilustra um texto do gênero dramático. Observa-se que o trecho se manifesta quase em sua totalidade por meio de diálogo, sem interferência direta de um narrador. Há, apenas, alguns comentários grifados, para darem uma ideia da entonação e da emoção transmitida no diálogo. Além disso, o texto tem uma progressão de ações, e ficamos curiosos para saber o que acontecerá depois. Originalmente, a palavra “drama” vem do grego dráo e significa “fazer”, “ação”. E essa é uma das mais notáveis características do gênero dramático: o texto só se “completa” durante a encenação. Por causa dessa característica tão peculiar, alguns estudiosos chegam, inclusive, a defender o gênero dramático como uma arte separada da literatura. Metodologia do Ensino de Arte 97 De modo geral, o teatro (ou o gênero dramático) envolve uma gama de elementos um pouco maior do que os gêneros narrativo e lírico, dentre os quais podemos citar: imagens visuais, sons, músicas, ritmos e arte pictórica, entre outros. O acerto da peça teatral está no equilíbrio entre o texto, a dramatização e os demais elementos que o constituem.No drama, reúnem-se a objetividade do gênero épico e a subjetividade do gênero lírico. A linguagem da peça teatral é peculiar em relação aos demais gêneros, sendo caracterizada por um conflito (choque entre os objetivos das personagens) que vai sendo desenvolvido por meio da linguagem dialógica. Ao mesmo tempo, o tempo do gênero dramático é o agora. A seguir, apresentaremos alguns elementos fundamentais para a constituição do gênero dramático: �Texto: também chamado de script, o texto teatral é o elemento literário que constitui o drama. Trata-se de um conjunto de falas e de apontamentos os quais serão representadas pelos atores ao público. É formado pelas ações, pelos personagens, pelas indicações para o cenário e pelas reflexões das personagens. Semelhante ao gênero narrativo, o texto dramático apresenta os seguintes elementos: exposição da situação inicial, o conflito, o desenvolvimento, o clímax e o desenlace (esses elementos serão explicados mais detalhadamente no próximo capítulo); � Personagens: os personagens são aqueles que, interpretados por atores, dão vida ao drama. São seres ficcionais, criados para exercerem determinadas funções dentro da peça; �Atores: os atores são os seres reais que, por meio do estudo dos roteiros e da interpretação, dão vida aos personagens; � Público: se há todo o investimento para que a peça seja encenada, essa encenação, por sua vez, é realizada para ser mostrada para, talvez, o elemento mais importante do teatro: o público, que é constituído por aqueles que assistem à peça. A relação palco-público é fundamental para o sucesso ou o fracasso do drama; Metodologia do Ensino de Arte98 �Cenografia: corresponde ao cenário e seu responsável (cenógrafo), que colaboram nos aspectos visuais da peça; � Sonoplastia: a sonoplastia e seu responsável (sonoplasta) estão ligados a todos os aspectos sonoros, musicais e as trilhas que constituem a peça; �Diretor: Se o dramaturgo é quem escreveu o texto teatral, o diretor é aquele que “escreve” o espetáculo. É ele que coordena todos os elementos que compõem a peça e também quem deve ter uma interpretação profunda do texto, para poder organizar a encenação do início ao fim. Além dos elementos que constituem o drama, temos as formas dramáticas, dentre as quais destacamos: �Tragédia: constitui uma imitação de ações consideradas de caráter elevado, extensa e com linguagem ornamentada, cujo conteúdo está ligado está ligado a deuses ou a situações da vida, que levam a consequências fatais; �Comédia: é uma peça teatral que se caracteriza pelo uso do humor nas artes cênicas, com o intuito de provocar o público a refletir sobre uma determinada situação cotidiana; �Tragicomédia: trata-se de uma mescla de outros gêneros teatrais, tais como tragédia, comédia, farsa, melodrama, etc; � Farsa: peça teatral que mistura comédia, centrada em quadros da vida real, com o objetivo de despertar o ridículo, provocando o riso como forma de escape; �Auto: peça teatral de caráter religioso. Além dessas formas dramáticas, há outras, tais como ópera, mimo, momo, vaudeville e marionetes. Procuramos, aqui, destacar as mais relevantes. Metodologia do Ensino de Arte 99 SAIBA MAIS Para complementar seus estudos, sugerimos que você assista ao vídeo “Gênero Dramático – Brasil Escola”, disponível em: https://bit.ly/3czy7sD Neste capítulo, você viu que: �O gênero lírico é caracterizado pela expressão dos sentimentos individuais, tendo como sua materialização mais comum o poema, em suas mais variadas formas. A poesia é um elemento que constitui e torna as obras artísticas, e o poema é uma forma de manifestação da poesia. Para análise do poema, há que se considerar seus aspectos visuais, seus aspectos linguísticos e seus aspectos semânticos. �O gênero dramático é caracterizado pela ação. Ele só se completa por meio da atuação das personagens. Como texto literário, temos o script, que é a indicação dos diálogos e falas dos personagens, de observações acerca da entonação e do cenário, dentre outros. Caro estudante: Chegamos ao final desta unidade. É importante que você revise este material, tome nota de suas principais aprendizagens e principais dúvidas, Busque nas indicações de pesquisa leituras e vídeos que podem contribuir muito nessa etapa! Além disso, ao término desta unidade, você encontrará as principais referências bibliográficas utilizadas na elaboração dessa obra, que podem ser consultadas. Não desanime nas dificuldades de estudo, mas faça com que essas dificuldades de hoje venham ajudá-lo a se tornar um estudante e um profissional melhor amanhã! Metodologia do Ensino de Arte 101 UNIDADE 03 Metodologia do Ensino de Arte102 Há um filme onde, numa determinada cena em que os personagens principais conversam sobre uma pintura, um deles não consegue entender, naquelas formas de abstração o que seria a arte. O outro, por sua vez, apreciador de obras clássicas, diz a ele que a arte é a forma de registrar nossa passagem pela Terra. Será? A arte está praticamente em todo lugar: nas paredes, nas construções, nos movimentos, na linguagem, no corpo humano... Mas o que será que diferencia a arte das demais atividades humana? De modo geral, arte é técnica. Porém, funções do dia a dia também exigem uma técnica. Também podemos dizer que arte é linguagem. Mas, por exemplo, uma notícia não é artística e também é linguagem. Podemos dizer que a arte também é aquilo que nos toca. Mas, tragédias da vida real também podem nos tocar! Percebem como definir arte pode ser fácil e complicado ao mesmo tempo? Se nós, pessoas com experiências de vida mais plurais, temos essa dificuldade, imagine, então, numa sala de aula! Por isso, nesta disciplina abordaremos não somente os conceitos importantes para se pensar a arte, mas também veremos possibilidades de, por meio do ensino da arte em sala de aula, produzir conhecimentos e aprendizagens. Entendeu? Ao longo desta unidade letiva você vai mergulhar neste universo! INTRODUÇÃO Metodologia do Ensino de Arte 103 Olá. Seja muito bem-vindo a nossa Unidade 3. Nesta unidade, o nosso objetivo é auxiliá-lo no desenvolvimento das seguintes competências profissionais: OBJETIVOS 1 Atuar com ética e compromisso com vistas à construção de uma sociedade justa, equânime, igualitária; 2 Compreender, cuidar e educar crianças de zero a cinco anos de forma a contribuir para o seu desen-volvimento nas dimensões, entre outras, física, psicológica, intelectual, social; 3 Identificar problemas socioculturais e educacionais com postura investigativa, integrativa e propositiva em face de realidades complexas, com vistas a contribuir para a superação de exclusões sociais, étnico-raciais, econômicas, culturais, religiosas, políticas e outras; 4 Demonstrar consciência da diversidade, respeitando as diferenças de natureza ambiental-ecológica, étnico-racial, de gêneros, faixas geracionais, classes sociais, religiões, necessidades especiais, escolhas sexuais, entre outras. Então? Está preparado para uma viagem sem volta rumo ao conhecimento? Ao trabalho! Metodologia do Ensino de Arte104 Trabalhando a Arte com inclusão OBJETIVO Ao término desse capítulo, você será capaz de compreender que o ensino de arte é um tema democrático e abrangente, que pode ser trabalhado conforme as especificidades de cada aluno e sujeito envolvido. Isso também está em consonância com as principais diretrizes da educação brasileira. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Figura 1 Fonte: Pixabay Metodologia do Ensino de Arte 105 A arte, a inclusão e o papel do docente Um aspecto muito importante ao profissional que pretende atuar nos anos iniciais do Ensino Fundamental é a questão inclusiva. Na atualidade, todo professor, independentemente do nível de ensino que atue, encontrará em maior ou menor escala, alunos “de inclusão” com alguma forma de dificuldade considerada especial e, parasisso, é importante que estejamos preparados. No ensino da Arte não é diferente, pois sempre estamos sujeitos a encontrar alunos diferentes, que necessitarão de uma atenção especial do docente. Por este motivo, destinamos um espaço desta unidade para refletir sobre o ensino de Arte para as crianças com necessidades especiais. De modo geral, não com o objetivo de rotular, preconceituar ou segregar, as crianças com necessidades especiais são caracterizadas por serem portadores de alguma forma de limitação que requer certas modificações ou adaptações em seu programa educacional, a fim de que possa atingir seu potencial ao máximo. SAIBA MAIS Você pode ampliar sua compreensão sobre o ensino de arte numa perspectiva inclusiva assistindo ao documentário: Inclusão-Arte, no link: https://bit.ly/2T74XJO Arte e Inclusão A legislação educacional brasileira, bem como as principais diretrizes que orientam a organização dos currículos de forma inclusiva, abrangendo o ensino de Arte. Porém, essa é abordada sob a perspectiva de quatro blocos, a saber: artes visuais, música, teatro e dança. Metodologia do Ensino de Arte106 Você, caro aluno, já se perguntou como trabalhar, por exemplo, artes visuais com um deficiente visual? Ou ainda, música, teatro e dança com deficientes físicos e auditivos? Será que isso é possível? Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LEI nº 9394/96), em seu capítulo dedicado para tratar somente da educação especial, A modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais. Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela de educação especial. O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas do aluno, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular. (BRASIL, 1996) Pode-se perceber que a Lei estipula como prioridade a inclusão do aluno em classes regulares, e por isso, se torna tão necessário que todos os professores, atualmente e futuramente em sala de aula, conheçam esse assunto. A atualidade se caracteriza, entre outros aspectos, pelo contato com imagens, luzes e cores em quantidade impensável séculos antes. A criação e a exposição a uma multiplicidade de manifestações visuais geram a necessidade de uma educação para saber ver, perceber e distinguir diversos fatores, como: sentimentos, sensações, ideias e qualidades contidas nas formas e nos ambientes. Uma das habilidades artísticas que podem ser trabalhadas com os alunos inclusivos é o desenho, que pode ser considerada a principal linguagem artística infantil, pois independe até mesmo da existência de um mediador adulto. Essa manifestação é espontânea e só depende de recursos materiais disponíveis, não necessariamente sofisticados, apenas papel e lápis. Metodologia do Ensino de Arte 107 Já nos primeiros anos de vida, antes mesmo da criança registrar a sua existência por meio de outras linguagens, ela se expressa, já no período sensório-motor, por meio das primeiras garatujas (rabiscos desordenados) que cria, que representam suas capacidades, habilidades e potencialidades. Há dois autores, Lowenfeld e Brittain (1971), que sintetizaram as etapas de desenvolvimento do desenho infantil, em sua obra “Desenvolvimento da capacidade criadora”. Traremos, a seguir, alguns elementos abordados pelos autores, que podem ser pensados numa perspectiva inclusiva. Fases do desenvolvimento da criança – desenho Num primeiro momento de vida, as crianças começam a rabiscar para representar o imediato, o próximo, o “aqui” e o “agora”. Essa fase é chamada de “Fase das Garatujas”, em que a criança começa a descobrir a relação entre o desenho, o pensamento e a realidade, que vai dos 2 (dois) aos 4 (quatro) anos de vida, aproximadamente. A criança, inicialmente, realiza um determinado movimento sem qualquer significado, apenas para fixar, através da repetição, os movimentos manuais. (LOWENFELD, 1971) Pouco a pouco, a criança passa a dar significados aos seus desenhos, nomeando-os. Por volta dos 5 (cinco) anos de idade, começam a surgir, no desenho das crianças, algumas formas fechadas (semelhantes a círculos), organizadas de acordo com determinados preceitos (dentro/fora, em cima/ embaixo). Essas formas fechadas são conquistadas pelas crianças em sua fase de desenvolvimento chamada de “pré-esquemática”. Entre os 7 (sete) e 12 (doze) anos, aproximadamente, a criança entra na fase “esquemática”, caracterizada pela utilização de linhas geométricas e de formas esquemáticas. A figura é representada com exagero em partes que a criança considera importantes e com omissão ou esquecimento de outras Metodologia do Ensino de Arte108 partes sentidas como irrelevantes. As cores utilizadas buscam corresponder às cores reais dos objetos e das coisas. Entre os 9 (nove) e 11 (onze) anos, começa a se delinear o realismo. A criança se afasta dos esquemas e das linhas geométricas, passando a se preocupar com detalhes, como a diferenciação entre masculino e feminino, com a caracterização dos vestuários, dentre outros aspectos. (LOWENFELD, 1971) Dependendo do grau de dificuldades de aprendizagem, as crianças com necessidades especiais podem (ou não) seguir as etapas anteriormente apresentadas e, se assim for, isso acontecerá de uma forma diferenciada, mais lenta, podendo não seguir “ao pé da letra” a descrição realizada nas páginas anteriores. Quando trabalhamos por crianças portadoras de necessidades especiais, precisamos levar em consideração a necessidade de um espaço físico que seja adequado, bem como oferecermos estímulos e liberdade para que manipulem instrumentos e objetos e para que movimentem seu próprio corpo, desenvolvendo-se e descobrindo o mundo ao seu redor. Dessa forma, a escola deve contribuir para que todos os alunos passem por um conjunto amplo de experiências voltadas à criação e à aprendizagem, para que articulem a percepção, a sensibilidade, o conhecimento e a produção artística, de forma individual e coletiva. Ao perceber e ao criar formas visuais, estamos trabalhando com elementos específicos da linguagem e suas relações em espaços bidimensionais (imagens planas) e tridimensionais (objetos com altura, largura e profundidade). Elementos como ponto, linha, cor, plano, luz, textura, movimento e ritmo relacionam-se, dando origem a códigos, representações e sistemas de significações. A Arte também pode ser utilizada para auxiliar no desenvolvimento das habilidades e das capacidades de um portador de necessidades especiais, pois, por meio dela, esse indivíduo construirá suas próprias representações ou ideias e Metodologia do Ensino de Arte 109 as transformará ao longo do desenvolvimento, à medida que avança no processo educativo. Um ensino diferenciado pode ajudar os alunos especiais de várias maneiras. Deste modo, a Arte, segundo Lowenfeld (1971): �Deve propiciar, por ser uma linguagem natural, atividades que proporcionem a observação, exploração, associação, comparação, imaginação, reprodução, simbolização e expressão por meio das formas, cores, planos, espaços e texturas; �Estimula, por meio de exercícios de pintura, a realização e também o controle de movimentos específicos. A prática da arte pode facilitar a organização pessoal e os pensamentos; já as atividades em grupo auxiliam a desenvolver a cooperação, a comunicação com os outros, além de ofertarem oportunidades interpessoais; �Não deve instigar a competição, ela é essencialmente individual, pois não há pontos que serão disputados, entre oponentes, não há jogos a serem ganhos ou perdidos. Por outro lado, a própria atividade artística pode ser compartilhada entre muitas pessoas. A Arte pode influenciar as seguintes situações: �Durante a realização de atividades artísticas,a criança especial pode vivenciar, de forma natural, situações que a encorajem a ampliar seus limites físicos e mentais; �Após certo tempo de práticas artísticas, a criança especial poderá começar a controlar e a dirigir suas emoções. O professor, através da escolha cuidadosa de atividades artísticas, pode encorajar a criança a utilizar certos movimentos e mostrá- la que diferentes movimentos resultam em diferentes sinais no desenho e no espaço. Metodologia do Ensino de Arte110 Veja, caro aluno, que as crianças podem vir a aprender por meio de atividades artísticas simples, como a manipulação de materiais variados, identificando semelhanças e diferenças de texturas, formas e tamanhos. Todos os sentidos do corpo humano são passíveis de nos transmitirem sensações diversas, sejam elas agradáveis ou desagradáveis, mas essas sensações dependem não só da relação com o objeto de concentração, mas também das aptidões receptivas de cada indivíduo. Por isso, independente de sua deficiência, o portador de necessidades especiais usará a Arte por algum dos seus sentidos. (LOWENFELD, 1971) A seguir, abordaremos o ensino da Arte relacionado às deficiências com maior número de indivíduos, a saber: deficiência visual, deficiência auditiva e deficiência física. A Arte e a deficiência visual De início, você pode achar impossível, uma vez que a característica da deficiência visual é a ausência de ou a baixa visão. Porém, os deficientes visuais são muito mais sensíveis às artes do que as pessoas podem pensar. Pelo fato de não enxergarem, eles desenvolvem mais apuradamente os outros sentidos, o que lhes permite uma melhor compreensão das sensações visuais, ainda que isso pareça um tanto paradoxal. É primordial para o deficiente visual, como também para a criança que não apresenta esse tipo de deficiência a ação sobre as coisas, para conhecê-las, formar as imagens e interioriza-las, evocando-as, desse modo, quando necessário e expressando-as por meio de diversas linguagens. Quanto mais experiências propiciadas, mais “imagens” de coisas, pessoas e situações vão sendo delineadas com clareza. O desempenho do deficiente visual é mais lento na seleção de elementos úteis para formar imagens. Metodologia do Ensino de Arte 111 O aluno que é deficiente visual, por meio da exploração dos canais expressivos relacionados às experiências sinestésicas e táteis, conseguirá realizar a decodificação, a interpretação e a reprodução de ideias, imagens e objetos. Grande parte dos projetos artístico educacionais, com vistas à inclusão, apresentam preocupação com os portadores de necessidades especiais. Atualmente, já encontramos, em museus, preparação para deficientes visuais os visitarem – as visitas monitoradas. SAIBA MAIS Você pode ampliar seus conhecimentos e fomentar ideias assistindo ao vídeo “Deficiência visual e arte”, disponível em: https://bit.ly/362IKSr A Arte e a deficiência física A arte, para o deficiente físico – por meio da expressão plástica – pode atuar de duas formas: na deficiência primária, constituída pela alteração muscular, e na deficiência subjetiva, caracterizada pela incapacidade de superação de comprometimentos emocionais. Mesmo que cada caso de deficiência física deve ser considerado em suas peculiaridades, é importante que o professor tenha sempre a atenção em aula, pois, em qualquer atividade de Arte, a coordenação motora e os efeitos emocionais constituem sempre a sua parte essencial. Em casos mais extremos de alterações musculares, será difícil estabelecer, de início, uma autoidentificação com as expressões criativas, pois a dificuldade de controlar os Metodologia do Ensino de Arte112 músculos, quando se trata de coordenação motora, constitui-se um obstáculo difícil de ser vencido. Em qualquer tentativa de desenvolver uma coordenação muscular, a expressão plástica torna-se importante. Nas primeiras atividades com o deficiente físico, pode ser utilizada uma técnica de pintura com os dedos. Esse tipo de trabalho traz satisfação à criança que vê o resultado do movimento com seus dedos. Ao pintar com pincel, a necessidade de ter que pressionar esse instrumento com os dedos pode causar dificuldades ao aluno. Uma alternativa para essa atividade é adaptar uma fita adesiva como recurso de fixação do pincel à mão, mesmo que se saiba que o uso exclusivo do pincel proporciona maior incentivo para o desenvolvimento do aluno. O planejamento das atividades de Arte de forma inclusiva requer do professor conhecimento de causas, tipo de deficiência física e que movimentos físicos evidenciam mais tal deficiência. Também é necessário que o deficiente físico aprenda a enfrentar suas limitações quando realiza as atividades. Muitas vezes, é possível observar que ele experimenta uma sensação de alívio ao representar, por meio da Arte, certas partes do corpo, pois consegue, dessa forma, realizar através da imaginação, o que de outro modo, será incapaz de fazer. Os objetivos da Arte com relação ao trabalho com deficientes físicos são basicamente os de promover uma consciência corporal; reforçar a identidade do próprio indivíduo e reforçar a percepção dos próprios limites e dos limites dos outros, e como objetivo principal, promover a integração social do indivíduo. Metodologia do Ensino de Arte 113 A Arte e a deficiência auditiva A comunicação é um elemento primordial para promover a inclusão dos deficientes auditivos na sociedade. E nada melhor do que a Arte para oportunizar o desenvolvimento da comunicação nesse deficiente. O deficiente auditivo, embora não ouça (ou ouça pouco), tem uma grande percepção para a música, pois ele sente suas vibrações. Vários profissionais já fizeram projetos nessa área, como por exemplo o projeto Surdodum, criado em 1995, em Brasília, pela professora Ana Lúcia da Silveira Soares. No Surdodum, jovens surdos são iniciados na música, aprendendo a cantar e a tocar percussão. As atividades têm como objetivo trabalhar, principalmente, a fala, a dramatização, a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) e a autoestima do surdo. Outro projeto interessante, também nessa área, criado em 2003, é o projeto Céu e Terra, que propõe balé para portadores de deficiência auditiva. O uso da música é uma excelente forma de desenvolver a fala natural, pois estimula e aguça a percepção das crianças surdas, possibilitando que potencializam sua sensibilidade. É importante destacar, no entanto, especialmente, em relação ao deficiente auditivo que as atividades – assim como em todos os demais casos de deficiência – não devem ter por SAIBA MAIS Amplie seus conhecimentos e horizontes, assistindo ao vídeo “Arte na educação especial, incentivando a aprendizagem”, disponível em: https://bit.ly/2WRUYco. Metodologia do Ensino de Arte114 objetivo “corrigir” ou “normalizar” esses indivíduos, mas desenvolver seu potencial. A comunidade surda, por exemplo, tem se mobilizado cada vez mais fortemente em relação ao seu reconhecimento não como um grupo de deficientes, mas como uma grande comunidade com características próprias de comunicação. Da mesma forma, os deficientes visuais hoje contam com uma rede de apoio bem mais ampla do que há alguns anos atrás, sendo importante que a escola desenvolva, de alguma forma, seu conhecimento sobre braille. Os deficientes físicos, por sua vez, devem ter suas limitações respeitadas e, ao mesmo tempo, é importante que se estimule sua interação com o próprio corpo e com o ambiente externo. Ainda assim, cabe ressaltar ser importante que nenhum caso de deficiência seja tratado com “coitadismo”, com pena ou com menosprezo, mas com respeito, para que o indivíduo sinta- se acolhido e também valorizado dentro do contexto. SAIBA MAIS Amplie seus conhecimentos e tire ideias para o trabalho artístico com os surdos assistindo aos vídeos a seguir, que abordam os projetos apresentados nesta seção: BRASIL, Fábio. Surdodum Documentário. 2017. Disponívelem: https://bit.ly/3bA6KgX TV HORIZONTE. Pra mudar o mundo – Projeto Céu e Terra. 2014. Disponível em: https://bit.ly/2yOPK9t Metodologia do Ensino de Arte 115 RESUMINDO Neste capítulo, você aprendeu que: A educação brasileira está baseada no princípio da educação para todos e, portanto, da inclusão; Incluir não significa tentar “tornar normais” ou mesmo ignorar os indivíduos portadores de deficiência, mas propor atividades curriculares que respeitem suas limitações e que potencializem suas qualidades. Metodologia do Ensino de Arte116 Refletindo sobre a metodologia do ensino da Arte Ao término deste capítulo você será capaz de entender alguns pressupostos importantes para o ensino de arte na escola. Isso fará toda a diferença em sua atuação profissional, uma vez que a arte faz parte do dia a dia da escola. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! OBJETIVO Neste capítulo, apresentaremos algumas questões relevantes à metodologia do trabalho pedagógico na área de Arte. Dentre aquilo que aqui discutiremos, estão a organização dos conteúdos, a avaliação e a autoavaliação; o papel docente e as dificuldades enfrentadas por ele; a metodologia de ensino por meio de projetos e sua relevância para o ensino de Arte, além dos temas transversais presentes no cotidiano de nossos alunos. Figura 2 Fonte: Pixabay Metodologia do Ensino de Arte 117 A organização dos conteúdos no ensino de Arte Os principais documentos norteadores da educação no país, assim como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs, 2006), não trazem uma definição rígida sobre as modalidades a serem trabalhadas em cada ciclo (o 1º ciclo corresponde aos 1º e 2º anos; o 2º ciclo, ao 3º e 4º anos). Eles orientam o professor a adequar suas atividades ao repertório cultural que a criança traz à escola. Desta forma, o professor necessita saber como selecionar os conteúdos, uma vez que a área de artes apresenta uma vastidão de assuntos que podem ser trabalhados no Ensino Fundamental. Segundo orientações do documento, o conjunto de conteúdos em Arte está articulado ao contexto de ensino e aprendizagem em três eixos norteadores: produção, fruição e reflexão, sendo que a produção se refere ao fazer artístico, a fruição, se refere à apreciação da arte, e a reflexão, à construção do conhecimento sobre o trabalho artístico pessoal dos colegas sobre a Arte como sendo um produto histórico. Os conteúdos de Arte podem ser trabalhados em qualquer ordem, segundo a decisão do professor, desde que em conformidade com o currículo escolar e, especialmente, de acordo com a formação e tendência do professor. Além disso, dentro dos conteúdos gerais das linguagens artísticas, tais como as artes visuais, a música, o teatro e a dança, são necessárias considerar, baseado nos PCN (2006), que: �Os conteúdos devem estar de acordo com as possibilidades de aprendizagem dos alunos; �É importante valorizar o ensino de conteúdos básicos de Arte, em especial, aqueles que são necessários à formação cidadã, considerando, ao longo dos ciclos de escolaridade, manifestações artísticas de povos e de culturas de diferentes momentos históricos, inclusive o momento atual; Metodologia do Ensino de Arte118 �Devem ser trabalhadas, também, especificidades do conhecimento e da ação artística. Percebe-se, também, que nas diretrizes oficiais, os conteúdos não estão separados por séries ou por anos, ficando essa divisão ao critério de cada escola. SAIBA MAIS Aprofunde a discussão sobre os conteúdos de arte assistindo ao vídeo “Conteúdos e Metodologias do Ensino da Arte”, disponível em: https://bit.ly/36cfbhv A avaliação em Arte Um dos gargalos de qualquer sistema educacional, desde a Educação Infantil até a Pós-Graduação é, sem dúvidas, a avaliação. Já verificamos em nossa vida profissional ou mesmo acadêmica o quanto é difícil avaliar. A avaliação sempre é motivo de muita preocupação para os professores, independente da área do conhecimento humano ou do nível de ensino em que atuem na educação. Os professores costumam realizar questionamentos sobre isso, especialmente, se estão avaliando de forma correta, coerente e ética, e se a avaliação está colaborando para um processo qualitativo e não somente quantitativo ou classificatório. Para avaliar o aproveitamento discente em Arte, o professor deve considerar o seu histórico e sua relação com as atividades desenvolvidas na escola, observando a qualidade dos trabalhos em seus diversos registros. Metodologia do Ensino de Arte 119 Por certo, a avaliação é parte integrante do processo de ensino e de aprendizagem, em que o aluno é sujeito do processo educativo. Deste modo, faz-se necessário que o docente se preocupe com a observação dos progressos dos alunos, os conceitos que têm de determinados assuntos e as articulações que fazem no decorrer das aulas, reelaborando seus conhecimentos e adquirindo outros. Avaliar em Arte, segundo os PCNs (2006), constitui uma situação de aprendizagem na qual o estudante pode perceber aquilo que aprendeu, retrabalhar conteúdos, e o professor pode verificar como ensinou e o que seus alunos vieram a aprender. Deste modo, a avaliação no processo de ensino e de aprendizagem pode ser considerada como um momento importantíssimo, tanto para o professor quanto para o aluno, uma vez que ambos fazem parte desse processo interagindo entre si, diariamente na escola. A Arte trabalha com sentimentos, emoções, sensações. Nesse sentido, não podemos avaliar um aluno julgando uma opinião sua, mas avaliá-lo por sua disponibilidade de participar e de contribuir com a aula de Arte e com o grupo a que ele pertence. Avaliar em Arte também é verificar que conhecimentos podem acrescentar valores ao aluno, trazendo mudanças, tanto afetivas, cognitivas, relacionais ou como as relacionadas à valorização da vida, do patrimônio, da cultura e da própria Arte. Ao avaliar o aluno, o professor deve estar atento à trajetória de vida de cada aluno, e a participação e ao interesse de cada um. É necessário também que o aluno tenha consciência do resultado que o professor espera dele no final do processo. A avaliação das atividades artísticas é complexa, principalmente, quando se refere ao estabelecimento de critérios para expressão de julgamentos sobre a produção estética e expressiva de outrem. Por isso, consideramos importante buscar Metodologia do Ensino de Arte120 subsídios para avaliação nos documentos oficiais que norteiam a disciplina e educação, pois, no decorrer dos quatro anos do Ensino Fundamental, espera-se que os alunos vão adquirindo, de forma progressiva, competências de sensibilidade e de cognição em Arte. Nas próximas linhas, traremos um resumo das orientações estabelecidas pelos PCNs de Artes (1997). SAIBA MAIS Amplie seus conhecimentos sobre os PCNs de Arte, acessando o vídeo “Resumo PCN de Arte”, disponível em: https://bit. ly/2Z1xpk9 Artes visuais Vejamos abaixo de acordo com Cumming (1996): �Criação de formas artísticas demonstrando algum tipo de capacidade ou de habilidade. Com esse critério, pretende- se avaliar se o aluno produz formas bi ou tridimensionais, desenvolvendo um processo de criação individual ou coletiva; �Estabelecimento de relações do trabalho de Arte produzido por si com o de outras pessoas sem discriminações estéticas, artísticas, étnicas e de gênero. Com esse critério, pretende-se avaliar se o aluno identifica o valor e gosto e argumentar a respeito deles em relação às imagens produzidas por ele ou pelos colegas; � Identificação de alguns elementos da linguagem visual que se encontram em múltiplas realidades. Busca-se avaliar se o aluno reconhece os elementos da linguagem visual; Metodologia do Ensino de Arte 121 �Reconhecimento e apreciação de vários trabalhos e objetos de arte por meio das próprias emoções, reflexões e conhecimentos. Com esse critério, busca-se avaliar se o aluno tem condições de apreciar,com curiosidade e respeito, trabalhos e objetos de arte, bem como de relacionar com suas próprias produções ou de outrem; �Valorização das fontes de documentação, preservação e o acervo da produção artística. Pretende-se avaliar se o aluno valoriza, respeita e reconhece o direito à preservação da própria cultura e das demais. Música � Interpretação, improviso e composição demonstrando alguma capacidade ou habilidade. Pretende-se avaliar se o aluno cria e interpreta com musicalidade, desenvolvendo a percepção musical, a imaginação e a relação entre emoções e ideias musicais em produções com a voz, com o corpo, com os diversos materiais sonoros e instrumentos; �Reconhecimento e apreciação dos seus trabalhos musicais, de colegas e de músicos por meio das próprias reflexões, emoções e conhecimentos, sem preconceitos estéticos, artísticos, étnicos e de gênero. Assim, busca-se avaliar se o aluno identifica e discute com discernimento sobre valorização, valoração e gosto nas produções musicais e se percebe nelas relações com os elementos da linguagem musical; �Compreensão da música como produto cultural, histórico e evolutivo, bem como sua articulação com as histórias do mundo, analisando as funções, valores e finalidades que foram atribuídas a ela por diferentes povos e épocas. Desse modo, pretende-se avaliar se o aluno relaciona estilos, movimentos artísticos, períodos, músicos e respectivas produções com o contexto histórico, social e geográfico; Metodologia do Ensino de Arte122 �Reconhecimento e valorização do desenvolvimento pessoal em música nas atividades de produção e apreciação, assim como na elaboração de conhecimentos sobre a música entendida como um produto da cultura e da história. Com isso, buscar-se avaliar se o aluno valoriza o caminho de seu desenvolvimento. Teatro �Estar habilitado para se expressar na linguagem dramática. Avaliar se o aluno desenvolve capacidades de atenção, concentração, observação, se enfrenta as situações que surgem nos jogos dramatizados e se articula o discurso falado e o escrito – a expressão do corpo; �Compreender o teatro como uma ação realizada coletivamente. Assim, isso permite avaliar se o aluno sabe se organizar e interagir em grupo, ampliando as suas capacidades de socializar, de ver e de ouvir, em processo de interação com seus colegas, bem como quanto à capacidade que tem de se expressar. Dança �Compreensão da estrutura e do funcionamento do corpo e dos elementos que compõem seus movimentos. Com esse critério, pretende-se avaliar se o aluno reconhece o funcionamento de seu corpo no movimento, se demonstra segurança ao se movimentar e se desenvolve pesquisa para uso do corpo no espaço; � Interesse pela dança como uma atividade coletiva. Isso possibilita avaliar se o aluno desenvolve-se na criação em grupo de forma solidária, se é capaz de improvisar e criar sequências de movimentação em grupo, se realiza interações com os colegas respeitando as qualidades individuais de movimento, de modo a cooperar com aqueles que têm dificuldades; se aceita Metodologia do Ensino de Arte 123 as diferenças, valoriza o trabalho em grupo e se empenha na obtenção de resultados de movimentação harmônica; Compreensão e apreciação das diversas danças como manifestações culturais. Esse critério pretende avaliar se o aluno é capaz de observar e avaliar as diversas danças presentes tanto na sua região como em outras culturas, em diferentes épocas. Formas de avaliação Há várias formas de avaliar o aluno, porém na área de Arte existe uma forma se evidencia: avaliar por meio de um portfólio. Ele é um instrumento que compreende o conjunto de trabalhos realizados pelos alunos durante um determinado período, série ou disciplina. Seus benefícios para avaliação não são automáticos, como também não dependem dos portfólios em si, mas do que os alunos aprendem ao criá-lo e ao alimentá-lo. O portfólio é uma ferramenta avaliativa promissora que poderá, sem dúvida, inspirar outras possibilidades, além das abordadas ao longo desse texto, pois a avaliação é um processo que precisa ser constantemente refinado. Esse instrumento possibilita ao professor considerar os trabalhos dos alunos de forma processual, atribuindo, inclusive, uma certa autonomia ao aluno, que escolherá os melhores trabalhos para alimentar seu portfólio. Autoavaliação Em Arte, o docente deve avaliar mais os processos criativos dos alunos e nem tanto os resultados. Por isso, a avaliação feita pelo próprio aluno sobre si torna-se um importante instrumento. Com a autoavaliação realizada pelo aluno, os professores têm ideia de como o aluno percebeu-se durante as aulas, e esses dados podem ser de extrema validade para uma avaliação em que o professor vai expressar em conceitos ou notas. Metodologia do Ensino de Arte124 O exercício da autoavaliação é, antes de tudo, o primeiro passo para o processo de aprendizagem, pois o aluno, enquanto se avalia, também aprende. É de extrema importância que o aluno avalie também a turma em que se insere e que seja capaz de expressar essa visão da aprendizagem e analisar o comportamento de todos: esses trabalhos são dados valiosos para a avaliação final do professor. A autoavaliação do próprio professor, do mesmo modo, é muito importante, pois diagnosticar a si mesmo implica compreender os parâmetros a que se está sujeito, de modo a verificar o próprio desempenho e, com base nisso, propor metas para superar e sanar dificuldades, podendo, com isso, realizar um balanceamento dos acertos e equívocos que marcaram o ano letivo. É importante, também, que o professor tenha sensibilidade em organizar a autoavaliação de forma contextualizada em relação ao nível de aprendizagem dos alunos. Em níveis de ensino não alfabetizados ou pré-alfabetizados, essa autoavaliação deverá prever manifestações de forma oral. Pode-se realizar um trabalho, um desenho, uma pintura etc. que expresse como a criança se sente em relação àquilo que aprendeu em Arte. Porém, de alguma forma, isso deverá ser sistematizado. Em níveis de ensino que já passaram pelo processo de alfabetização, é interessante que o professor solicite alguma forma de escrita e que, antes, estabeleça com seus alunos quais critérios pretenderá avaliar. O momento de sistematização dessas avaliações também é de fundamental importância no processo, uma vez que a leitura e a fala podem causar diferentes impressões no leitor/ ouvinte quando consideradas separadamente. O professor deve estar ciente de que os pontos positivos e negativos apresentados pelos alunos não são somente sua responsabilidade, mas que o papel docente dentro da sala de aula é essencial para que cada aluno, consideradas suas particularidades, desenvolva seu potencial. Para isso, o docente deve “treinar” seu ouvido para as críticas também. Metodologia do Ensino de Arte 125 É muito importante, além disso, ter em mente de que a avaliação e a autoavaliação não são processos fechados em si, que darão conta do “todo”, nem da parte do aluno, nem da parte do professor, muito menos da parte da escola. Por isso, esses elementos devem estar permanentemente associados às aulas, nem sempre com trabalhos e tarefas todo dia, mas com observações, anotações, diagnósticos e feedbacks da parte do professor. Ter um caderno ou outro aparelho que possibilite anotar suas observações é importante para o professor no momento em que realizará sua avaliação. Da mesma forma, é importante – não só na disciplina de Arte, mas em todas – que o professor, sempre que sentir dificuldades em relação a alguma situação, busque auxílio pedagógico e especializado. A avaliação, quer em Arte ou em outra disciplina, é um exercício conjunto, dependente de uma série de fatores, que nem sempre produz as respostas prontas ou aquelas que esperamos. Lidar com isso de modo flexível é o primeiro passo para que se produza diagnósticos de aprendizagem mais abrangentes. Neste capítulo,você aprendeu que: �A organização dos conteúdos de Arte não é rígida, porém, é necessário que o aluno vá evoluindo em seu desenvolvimento, especialmente no 1º e nos 2º ciclos do Ensino Fundamental; �A avaliação em Arte deve olhar não apenas para o que o aluno produziu de forma pontual, mas para aquilo que ele está sendo capaz de produzir, ou ainda, para como ele tem se relacionado com o componente curricular de Arte. Diversas são as competências que podem ser observadas e avaliadas pelo professor; �O portfólio, como um conjunto de trabalhos que vai sendo organizado pelos alunos e pelo professor ao longo de um período letivo, é uma das ferramentas mais interessantes para se avaliar o componente curricular de Arte; �A autoavaliação é outro instrumento extremamente importante, pois considera as potencialidades e limites do aluno, do contexto de aprendizagem, do professor e também da escola. Metodologia do Ensino de Arte126 Refletindo sobre a docência em Arte OBJETIVO Ao término deste capítulo você será capaz de entender retomar alguns pressupostos básicos da docência, assim como alguns elementos importantes para se pensar à docência em Arte. Conhecer a natureza dos gêneros literários, e como eles constituem os gêneros textuais considerados como pertencentes à linguagem literária será fundamental para o exercício de sua profissão. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Figura 3 Fonte: Pixabay Metodologia do Ensino de Arte 127 Sociedade do futuro ou do presente? O tempo em que vivemos pode ser qualificado como esquisito. Talvez, não haja melhor definição para caracterizá-lo. Isso porque com tanta coisa mudando de forma tão rápida, temos dois caminhos a serem tomados. Ou lideramos as mudanças, aceitando-as como inevitáveis, ou seremos arrastados por elas, ficando completamente fora. Trata-se de um desafio e de uma questão de sobrevivência na contemporaneidade. Segundo Fedrizzi (2017), isso acontece, especialmente, porque vivemos durante bastante tempo precisando apenas de habilidades genéricas, para profissões que mudavam muito pouco. E esse fato ocorreu durante praticamente toda, ou boa parte da história da humanidade. Nos últimos séculos, porém, cada geração viu profissões desaparecerem e novas surgirem. As máquinas – oriundas das revoluções industriais e tecnológicas – foram automatizando a manufatura cada vez mais rapidamente. E todas as funções repetitivas foram passando para as mãos de robôs e de computadores. Com toda essa mudança, obviamente, o ensino não ficaria para trás e, embora as transformações nessa área pareçam – por vezes – ser mais demoradas, o fato é que elas, cedo ou tarde, vêm para ficar. O que ocorre com nossos alunos e com as pessoas é que todos nós nos tornamos produtores de informação e de conhecimento. O mundo passou a ser feito por usuários, por muita gente e não apenas por um seleto e escasso grupo, vinculados a instituições e a veículos tradicionais. Atualmente, todo mundo produz, quer conversar, dialogar, interagir, debater, trocar, compartilhar, informar e ser informado. Os discentes, nesse contexto, deixaram de ser alunos passivos e passaram a se tornar criativos, muito ativos e criadores quase natos. Hoje, a cada minuto, milhões de e-mails são enviados no mundo todo. O Google é a ferramenta de pesquisa mais Metodologia do Ensino de Arte128 potente no que diz respeito a consultas globais. O número de páginas da internet, independente do conteúdo que apresentam, é quase infinito. Além disso, há os milhares de blogues, vlogues, perfis de Faceboook, Twitter e Instagram, além das postagens no Youtube e no WhatsApp, para citar algumas ferramentas de comunicação. Com essa quantidade de informação circulando, sua atualização, obsolência e desatualização ocorre quase que simultaneamente. Agora, caro aluno, imagine toda essa riqueza de informação e de troca de conhecimentos na nossa vida e na vida de nossos alunos. É certo que, nesse caldeirão de informações, um novo tipo de gente surge em nossas salas de aula. E os professores que estão nesse espaço ou ocupando cargos de direção escolar se deparam com essa realidade todos os dias. Simultaneamente, a máquina pública está se tornando cada vez mais obsoleta e emperrada, cheia de burocracias desnecessárias e centrada em si mesma, quase impossibilitada de se recriar. Nossa legislação está desatualizada, e primeiro, as coisas acontecem para, muitas vezes depois, existir uma lei que as regulamente. A emergência de aplicativos como o Uber e o Ifood, por exemplo, nos mostram isso claramente. E, a cada dia, surgem novos modelos e ações que “facilitam nossa vida”, que mudam nosso jeito de viver, conviver e interagir com o mundo que nos cerca. O mundo está cada vez mais difícil de ser regrado. É muito mais disruptivo. Por conta disso, terminamos formando gente para ir embora, em busca de mais oportunidades. Percebe-se, no dia a dia, que as pessoas estão muito aceleradas, buscando informações no mundo inteiro, querendo inovar e, muitas vezes, a comunidade não está respondendo a isso. Como resultado, os mais empreendedores, inquietos e criativos vão embora. E nos tornamos exportadores de talentos, pois muita gente com boa formação, que estudou nas melhores escolas e universidades do país, já foi para outras terras. Metodologia do Ensino de Arte 129 A adaptação ao mundo, seja ele chamado de moderno, pós-moderno, líquido ou contemporâneo, está cada vez mais difícil, pois suas mudanças são muito velozes. E isso impacta diretamente na sala de aula, já que, mesmo que seu layout não tenha sido tão afetado, ainda assim a configuração da escola por meio dos sujeitos que a procuram está em constante mudança. Além disso tudo, do excesso de informações, temos a falta de oportunidades e a violência. E com isso, temos testemunhado um número grande de pessoas que buscam uma vida mais tranquila e menos violenta fora do país. Isso tudo se torna um grande desafio para a educação, que é onde tudo começa. Como formar pessoas para que tenham interesse em permanecer, em produzir para essa comunidade, fortalecendo a sociedade, a pesquisa e a política nacional? É bastante difícil desempenhar a posição e o papel de educador hoje, pela necessidade – principalmente – de ter que lidar com alunos que praticamente já nascem com o tablet ou com o celular na mão, e que chegam às salas de aula encharcados de informação. E, ainda por cima, com pais muitas vezes omissos e infantilizados, que não têm autoridade sobre seus filhos, não sabem dar-lhes limites nem os estimular no que sambem e gostam de fazer, delegando toda árdua tarefa de ensinar somente aos professores. Diante disso, podemos nos perguntar: como segurar essa “onda”? Como manter o interesse do aluno dentro da sala de aula? Quais carreiras existirão no futuro e quais tecnologias estarão disponíveis daqui a cinco ou dez anos? No mundo onde os ciclos estão se acelerando, quais habilidades temos que ensinar às próximas gerações? Pensamos que muitos dos currículos atuais não estão preparando seus alunos para inovações tecnológicas e comunicacionais, para a volatilidade dos mercados e para as incertezas do século XXI. Para tentar atender a isso, algumas Metodologia do Ensino de Arte130 escolas estão ensinando codificação e outras habilidades. Mas a tecnologia muda tão rapidamente que essas novas habilidades talvez não sejam mais relevantes para quando esses alunos estiverem na idade adulta e entrarem no mercado de trabalho. Nesse mundo hiper conectado de hoje, precisamos de “resolvedores de problemas”, pensadores que sejam criativos e que estejam adaptados às mudanças que vêm pela frente. E, se formos ver, o modelo educacional com o qual trabalhamos é um modelo criado muitos séculos atrás, para momentos de mercados estáveis, que cada vez mais deixam de existir. O fazer arte como um exercício de experimentação Diantede todo esse cenário de mudanças, é importante que não apenas os alunos/ filhos, mas que os professores/ pais se reeduquem. Quando dizem para seus filhos, por exemplo, que “acabou uma brincadeira”, que estarão sinalizando? Pior ainda: quando dizem “não faz arte, meu filho”, o que ensinam sobre criatividade a arte? Não fazer arte, num sentido mais amplo, é não experimentar, não brincar. As pessoas estão tendo seu desenvolvimento artístico muitas vezes podado desde a infância, perdendo a espontaneidade e a capacidade de experimentação e de criação. Depois, quando grandes, as empresas precisam fornecer-lhes cursos de criatividade, porque não possuem vidas criativas. A arte, nesse contexto de mudanças, ou melhor, o ensino da Arte, é um elemento indispensável para preparar e desenvolver competências e habilidades necessárias para o exercício criativo e também para o enfrentamento das mudanças que ocorrem no mundo de forma cada vez mais veloz. Não podemos, como professores, deixar que nossos alunos percam a “veia criativa”, que deixem de buscar soluções inusitadas para os desafios cotidianos. Metodologia do Ensino de Arte 131 Com isso, é também bom para todos que o perfil do professor também mude. Não basta ser apaixonado por ensinar; é preciso ter certo grau de inquietude, de modo a romper com a noção de que a docência seja um sacerdócio, mas algo em movimento, atendo às transformações sociais. Na mesma lógica de necessidade de mudança, estão os alunos que só querem saber o que vai cair nas avaliações. Esse tipo de aluno não está interessado em aprender, mas em passar na avaliação. Se estamos interessados em fazer escolas para ter uma grande procura e notas boas nos sistemas de avaliação em larga escala, algo está errado. Nosso papel como professores é desenvolver pessoas para se responsabilizarem por si mesmas, pelo seu próprio conhecimento e desenvolvimento, atuando de forma criativa e, mesmo que grandes conhecedoras das ditas ciências exatas, ainda assim capazes de criar, de humanizar e de serem humanizadas. O professor e o ensino de Arte Uma das tarefas principais do professor que ensina Arte é instrumentalizar o aluno no domínio de diferentes linguagens artísticas, por meio de informações, do estudo e da análise da construção do conhecimento. O docente necessita compreender que ele é o mediador das experiências existentes entre o educando e sua realidade e que pode contribuir no processo sutil de desenvolvimento da percepção. Portanto, é necessário que o educador que ensina Arte tenha conhecimento e vivência em Arte. Nesse sentido, talvez o melhor mestre não seja somente aquele que impõe, que se afirmar como uma espécie de dominador do espaço mental, porém, ao contrário disso, aquele que se torna aluno de seu próprio aluno, que se esforça para acordar uma consciência ainda ignorante de si mesmo e de Metodologia do Ensino de Arte132 guiar seu desenvolvimento no sentido que melhor lhe convir. É importante que os educadores acreditem na individualidade e no poder de cada ser humano; no poder criativo e na necessidade vital que temos de nos expressar. Para que o professor possa conduzir com eficiência e com segurança o processo de expressão dos alunos, é primordial que ele próprio passa também por esse mesmo processo, descobrindo e exercitando suas potencialidades expressivas. Isso significa que é fundamental o seu constante aperfeiçoamento artístico. Cabe ainda ao processor a escolha de métodos e recursos didáticos que considerar mais adequados para apresentar as informações, zelando sempre pela necessidade de introduzir formas artísticas, por que ensinar Arte com Arte é um dos melhores caminhos. A Arte propõe ao homem momentos de descoberta e de sensações fantásticas, pois trabalha com a sensibilidade humana. Um ensino de forma criadora, que favoreça a integração entre a aprendizagem técnica e estética dos alunos poderá contribuir para o exercício conjunto complementar de razão e de sonho, de modo a tornar o conhecer um exercício de maravilhar- se, brincar com o desconhecido, arriscar hipóteses ousadas, trabalhar, esforçar-se e alegrar-se com descobertas. Assim, esse é o momento em que o professor precisa ser um sujeito que envolve o aluno com esse fascínio que a Arte contém, mas essa não é uma tarefa fácil. O professor enquanto cidadão – sujeito que participa da sociedade – possui sua própria identidade. Porém, enquanto professor, o sujeito deve refletir sobre suas experiências, sua inserção em um determinado momento histórico e social e, indispensavelmente, deve manter uma atitude de revisão e de análise de sua própria história de vida de forma constante para, como profissional, apresentar uma prática pedagógica que seja interessante, atual e coerente com as necessidades e propostas da educação contemporânea. Metodologia do Ensino de Arte 133 Por sua vez, é importante que o aluno também seja um sujeito integrado à sociedade, a qual possui uma identidade cultural com conhecimentos não sistematizados, mas que precisam e devem ser respeitados e valorizados no ambiente escolar. Em sala de aula, professor e aluno podem apreender a interagir permanentemente com a realidade que os cercam, definindo alternativas para novas questões. Cabe ao professor, cada vez mais, reelaborar e redimensionar os conhecimentos, buscando soluções de trabalho que garantam melhores resultados no processo de ensino e de aprendizagem. Não há professor ideal, mas o professor mais coerente com seu tempo é aquele profissional que está em constante estudo, que é preocupado com as mudanças na sociedade, aquele que acredita em transformações, que é estimulador que respeita e que valoriza o processo criativo do aluno, ou seja, sua cultura. Dificuldades enfrentadas pelo professor de Arte Enquanto docentes, podemos nos deparar com desafios, tais como: a falta de recursos, como audiovisual, livros, imagens e outros; alunos sem materiais (próprios); falta de lugar adequado para desenvolver música, teatro e dança; a indisciplina; a autocrítica dos alunos e a carga horária da disciplina. Para o ensino de Arte, é importante um espaço diferenciado, com materiais, imagens e instrumentos adequados, o que requer qualidade para que a disciplina não se forme apenas mais uma atividade informativa e desconectada da vida do aluno. Devemos gerar signos e também significados destinados para crianças e adolescentes que não possuem acesso à arte e à cultura. É importante também pensar que nem sempre o aluno chegará na escola com o repertório cultural que o professor esperava que ele tivesse. No entanto, cabe lembrar que a escola, Metodologia do Ensino de Arte134 como espaço onde também se produz e se reproduz arte, deve incentivar que o aluno amplie seu repertório artístico e cultural, lançando mão de todos os recursos possíveis que a escola disponibiliza. A Arte está em todo lugar. Cabe ao professor “abrir os olhos” dos alunos para que esses se percebam como apreciadores e também como produtores de obras de arte. Caso a escola não tenha condições materiais para organizar saídas pedagógicas a espaços que contêm obras de arte para que os alunos as apreciem, isso não impede que o professor realize atividades nas quais essas obras, mesmo que virtualmente, sejam apresentadas. E também, dentro desse contexto, é necessário que os alunos não conheçam as obras somente para copiá-las ou mesmo, apenas por conhecê-las. Quando mais desenvolvida for a competência de interação com as obras, melhor será o desenvolvimento de sua criatividade e de sua humanidade artística, de forma que a produção artística desse aluno poderá aparecer em diferentes contextos e situações. Além disso, é importante lembrar que, se a escola não vai até a Arte, a Arte pode vir até a escola, por meio do trabalho do professor, da ampliação do repertório artístico dos alunos e da organização de trabalhos que tornem as produçõesdos alunos verdadeiras obras de arte. Exposições e mostras de trabalhos são bons exemplos disso. Por fim, ensinar Arte na escola não é uma tarefa fácil, pois requer o preparo do professor de forma constante e o enfrentamento de diversos desafios. No entanto, o professor de Arte, se estiver interessado em ensinar, e seu aluno em aprender, logo perceberão quão ricos artisticamente podem ser os espaços que nos cercam, pois a Arte, conforme já dissemos em outros momentos, está em todo lugar. Metodologia do Ensino de Arte 135 Outro elemento importante para o ensino de arte é a habilidade do professor em trabalhar de forma integrada e interdisciplinar com outras áreas de conhecimento. Praticamente, todos os campos de saber podem ser representados ou relacionados com a Arte, o que possibilita trabalhar de diferentes formas e com diferentes linguagens. A história, por exemplo, é um campo riquíssimo, no qual muitos elementos artísticos podem ser explorados, tais como: pintura rupestre, arte egípcia, arte grega, arte gótica, arte contemporânea, etc. A literatura, ou a língua portuguesa, podem servir subsídios para o trabalho artístico através das obras literárias, que podem contribuir significativamente para a construção e constituição de releituras, adaptações e outros elementos que dialoguem com as obras. O campo da educação física, por meio do movimento e do conhecimento corporal, pode ser útil para o desenvolvimento do teatro, da dança e da própria música, uma vez que o acompanhamento do ritmo com o corpo, a expressividade e o “falar” por meio do corpo podem ser explorados nas duas áreas. Da mesma forma, áreas exatas, como ciências e matemática podem auxiliar o desenvolvimento artístico, fornecendo noções de formas geométricas, por exemplo, de diversidade de cores e de seres, dentre outros elementos. Para a ampliação do repertório artístico dos alunos, toda interdisciplinaridade é sempre bem-vinda. Por isso, é importante que o professor de Arte abandone a ideia de trabalhar isoladamente, ou ainda, de que só nas aulas de Arte se aprende Arte. Seus movimentos e esforços devem ser com o objetivo de despertar nos alunos o gosto estético, ampliar seu repertório artístico e permitir que vejam o mundo também sob outra perspectiva: a artística. Metodologia do Ensino de Arte136 RESUMINDO Neste capítulo, você aprendeu que: A sociedade contemporânea passa por constantes mudanças. E diante disso, o desafio da escola é o que ensinar e como ensinar, haja vista que as tecnologias estão cada vez mais banais; A arte, nesse contexto de mudanças pelas quais a sociedade passa, por servir como estimuladora da criatividade e da agilidade, competências tão apreciadas em nosso tempo; O professor, no processo de ensino de Arte, deve ser um constante aprendiz; deve viver a Arte que ensina, e deve buscar respeitar o repertório artístico dos alunos, porém, oferecendo oportunidades de ampliação desse repertório. Metodologia do Ensino de Arte 137 Compreendendo a Arte como um produto da cultura e da diversidade OBJETIVO Ao término deste capítulo você será capaz de compreender os elementos básicos que caracterizam e constituem o conceito de cultura e de diversidade, em sua relação com o ensino de Arte. Como um estudante do curso de Pedagogia, é importante que você os conheça, para que sua análise e trabalho com obras de arte se torne mais abrangente, fundamentada e profissional. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Figura 4 Fonte: Pixabay Metodologia do Ensino de Arte138 O que é diversidade? O termo “diversidade” está relacionado à qualidade daquilo que é diverso, diferente e variado, ou da variedade. Se fizermos uma busca em dicionários, encontraremos essa palavra relacionada a um conjunto variado, ou ainda, à multiplicidade, ao desacordo, à contradição, à oposição. Quando relacionada à ecologia, diversidade relaciona-se ao índice que leva em conta a equitabilidade e a abundância de uma comunidade. O termo “equitabilidade” descreve a proporção dos indivíduos de cada uma das espécies presentes em uma comunidade em relação ao total de indivíduos dessa mesma comunidade. Designa também uniformidade. Para as ciências sociais diversidade encontra correspondência com as palavras “alteridade”, diferença” e dessemelhança”. Vejamos, a seguir, o que cada uma delas representa. A palavra “diversidade” é mais genérica que as três demais e pode estar relacionada a cada uma delas em separado, ou as três simultaneamente. Toda alteridade, diferença ou dessemelhança pode, outrossim, indicar a simples distinção numérica que se tem quando duas coisas não diferem em nada exceto por serem numericamente diferentes. Nesse sentido, a diversidade é a negação da identidade. A seguir, a partir de Michaliszyn (2008), tentaremos abordar os três conceitos do qual a noção de diversidade se aproxima. � Por “alteridade”, um conceito mais restrito que o de diversidade, entendemos o sentimento de um indivíduo em ser outro, ou melhor, de colocar-se ou de constituir-se como o outro. Através desse sentimento, conseguimos perceber o outro, o diferente, sem segregá-lo pelas características que nos diferenciam. Metodologia do Ensino de Arte 139 �A “diferença” é a determinação da alteridade. Uma vez que a alteridade não implica necessariamente uma determinação, a diferença traz consigo a determinação. Podemos dizer, por exemplo, que João e Pedro são indivíduos pertencentes à espécie humana e, uma vez que passaram pelos mesmos processos que os inseriram nos grupos sociais, são agora chamados de seres humanos. Como João e Pedro vivem no Brasil, são brasileiros e essa característica os assemelha, os identifica. Por outro lado, João possui descendência alemã, e Pedro, descendência africana. Assim, embora João e Pedro sejam indivíduos da espécie humana, seres humanos que adquiriram valores culturais próprios de seus grupos e são considerados cidadãos brasileiros, João e Pedro representam etnias diferentes, cujas características – diferenças – são expressas não somente no campo dos valores culturais, mas em características físicas pertinentes às suas descendências. �A dessemelhança, por sai vez, se caracteriza pelas marcas que visivelmente tornam os seres diferentes, sejam elas marcas físicas ou culturais. A construção da diversidade sociocultural na sociedade O que se torna evidente na contemporaneidade é que vivemos num modelo social que se prevalece pelas diferenças, admite a alteridade, mas acentua a dessemelhança e, consequentemente, evidencia a diversidade. Em consequência desse tipo de comportamento social, somos, em determinados momentos, vítimas da diversidade e, em outros, dela fazemos uso para reafirmar nossa própria identidade. Por esses motivos, é extremamente importante entendermos como a sociedade constrói a diversidade. Para isso, é necessário revisitarmos e compreendermos melhor o que se caracteriza como diversidade cultural. Metodologia do Ensino de Arte140 O que é cultura? Podemos entender a cultura de diferentes maneiras. Uma delas é a definição de que a cultura é um processo através do qual o homem dá sentido a si e a todas as coisas que o cercam: a natureza e o outro com o qual convive. A cultura não possui conteúdo em si mesma, sendo produto exclusivo da condição humana. O homem, portanto, é tanto produtor quanto produzido pela cultura. A cultura nos acompanha desde o surgimento dos primeiros agrupamentos humanos e é uma das principais responsáveis pela sobrevivência de nossa espécie. A sobrevivência da espécie humana, espécie que talvez não possua mais do que 150 mil anos, e descende de um grupo que viveu na África, se deve à capacidade por ele desenvolvida de criar símbolos, de simbolizar situações de seu cotidiano. Em seguida, esse grupo foi capaz de criar ferramentas, simplificando as formas destinadas à obtenção de alimentos. Criou seu própriosistema comunicativo, aprimorou a linguagem e, por necessidade de melhor determinar as estratégias para sua sobrevivência e convivência com os demais membros de seu grupo, estabeleceu regras sociais e de sociabilidade. Esses laços de solidariedade construídos contribuíram para o estabelecimento de vínculos entre os integrantes do grupo. A união e a consequente organização tornaram possível a elaboração de estratégias para sua defesa em relação a outros indivíduos, mais fortes, mais velozes, porém, sem os traços que determinam a cultura humana. Através da noção de cultura, podemos perceber que os seres humanos se diferenciam dos demais animais pela função simbólica, ou melhor, pelo conjunto de sistemas simbólicos que determinam nossas identidades como atores sociais e como integrantes de grupos sociais distintos. Tal conjunto de sistemas simbólicos é responsável tanto pelo estabelecimento Metodologia do Ensino de Arte 141 da comunicação no interior dos agrupamentos sociais quanto pela definição da forma como os indivíduos relacionam-se entre si e também com a natureza, explorando-a em nome de sua sobrevivência e do desenvolvimento de seu grupo. Fazem parte desse conjunto de sistemas simbólicos a linguagem, as relações de parentesco, a religião e a crença no sagrado, os mitos, a arte, a economia, dentre outros elementos responsáveis pelo estabelecimento da comunicação humana nos diferentes níveis. Nossa relação de humanidade, nos é dada a partir da capacidade que temos, desde o nosso nascimento, de nos comunicarmos com nossos iguais e com eles nos relacionarmos e estabelecermos relações, necessárias à convivência em sociedade. Essa capacidade comunicativa desenvolve-se a partir da articulação da língua, pois, através da fala, aprimoramos a capacidade de nos comunicarmos. O desenvolvimento e a evolução da linguagem oral podem ser considerados como os princípios responsáveis pelo aumento das atividades corporativas e pelo desenvolvimento dos núcleos familiares e de comunidades. No momento de nosso nascimento, imediatamente somos apresentados a uma sociedade, cujos valores, regras, sistemas de significados – ou seja, a cultura – foram previamente estabelecidos e construídos por outros. Desde os primeiros instantes de nossa existência, vamos assimilando um conjunto de informações simbólicas e de experiências que nos vão sendo transmitidas pelo grupo social ao qual nos somamos e que foram por eles construídas e vividas ao longo de muitas e muitas gerações. Ao mesmo tempo em que assimilamos as informações culturais de nosso grupo social, também as processamos, acrescentando novos dados e eliminando outros. Metodologia do Ensino de Arte142 Nossa vivência e a experimentação de novas situações nos permite descobrir, inventar, reconstruir o conjunto de informações que recebemos. Dito de outra forma, a cultura pode ser entendida como um conjunto de princípios explícitos e implícitos herdados por indivíduos que são membros de uma dada sociedade. Tais princípios mostram aos indivíduos como ver o mundo, como vivenciá-lo emocionalmente e como se comportar em relação às outras pessoas, às forças sobrenaturais ou aos deuses e também ao ambiente natural. Essa cultura também permite aos indivíduos constituírem um meio de transmissão de suas diretrizes para a geração seguinte mediante o uso dos símbolos, da linguagem, da arte e dos rituais. Em certa medida, podemos dizer que a cultura pode ser vista como uma espécie de “lente” herdada para que o indivíduo perceba e entenda o seu mundo e para que aprenda a viver nele. Por isso, crescer em determinada sociedade é uma forma de enculturação pela qual o indivíduo, aos poucos, adquire a sua “lente”. Sem essa percepção de mundo, tanto a coesão quanto a continuidade de qualquer grupo humano seriam impossíveis. Por isso, podemos dizer que somos produto e também produtores de cultura. Somos por ela construídos e contribuímos para sua construção e reformulação. Nossa capacidade de simbolização e criação cultural nos permite constituir uma característica bastante extraordinária: pensar no que não está diante dos nossos olhos. Essa capacidade de abstração e transcendência permitiu que superaremos as limitações impostas pela natureza. Com isso, conquistamos o planeta e colocamos as demais espécies sob nosso domínio. Somos capazes de elaborar uma vestimenta para nos proteger do frio e, assim, embora sem um organismo adaptado para tanto, sobrevivemos em regiões árticas. Somos capazes de criar aviões e submarinos e, sem asas Metodologia do Ensino de Arte 143 ou nadadeiras, avançarmos por ares e por mares. Podemos dizer, inclusive, que a cultura nos torna os mais poderosos do planeta. Regras culturais Como vimos anteriormente, o comportamento social é o resultado da maneira pela qual os seres humanos se organizam, através do estabelecimento de regras de conduta e de valores. São as relações culturais que estabelecemos entre nós que norteiam a construção da vida social, econômica e política. Os modos de pensar, agir, sentir de todo ser humano, assim como os meios que procuramos para garantir nossa sobrevivência através de nossa ação sobre a natureza (trabalho) são por nós apreendidos por meio das experiências e das relações que nos são impostas ao longo de nossa vivência em sociedade. Para que o viver e o conviver em sociedade sejam possíveis, os grupos sociais estabelecem para si um conjunto de regras, que são aceitas coletivamente. Essas regras delimitam nossos pensamentos, nossas ações e determinam nossos “modelos” de vida. Em um sentido mais amplo, as culturas podem ser vistas como linguagens, cuja característica é permitir que se produzam sentido e ordem à atuação dos seres humanos e à realidade que eles produzem para si, estando na base da ordenação da subjetividade humana, das relações entre os indivíduos e do mundo que constroem ou experimentam. Enquanto linguagens, as culturas têm uma gramaticalidade, uma estrutura responsável pelo sentido presente nas manifestações humanas e, portanto, se constituem como campos fundados por regras. Sendo assim, as regras têm uma função simbólica que vai além da coerção. Elas permitem a produção de sentido. Uma vez que não há sociedades sem regras sociais estabelecidas, podemos dizer que ela, a regra, é produto e princípio de uma cultura. Assim, se nos primeiros momentos Metodologia do Ensino de Arte144 de nossa vida agimos exclusivamente por instinto ao nos relacionarmos com nossos “iguais”, ou melhor, com outros seres humanos, com eles aprendemos cultura e, automaticamente, incorporamos regras e padrões de viver socialmente. Pensamentos, ações, emoções, não são – deste modo – formas inatas ou biologicamente herdadas, mas o resultado de experiências e relações impostas pelo outro no decorrer de nossa inserção social. Logo, essas emoções, valores construídos, juízos morais, éticos, religiosos, são determinados culturalmente por regras que seguimos e construímos. Nesse sentido, essa “ordem”, que é humana por definição, tem por princípio e fundamento as regras que produzimos e sobre as quais alicerçaram a possibilidade de sermos humanos. Sem as regras, seríamos incapazes de produzir ordem e sentido para nossos pensamentos e ações e, consequentemente, para a realidade que vivemos e produzimos. Observemos, por exemplo, o teatro de marionetes. Vemos as marionetes dançando no palco minúsculo, movendo-se de um para outro lado levados pelos cordões, seguindo as marcações de seus papéis. Aprendemos a compreender a lógica desse teatro e nos encontramos nele. Localizamo-nos na sociedade e assim reconhecemos a nossa própria posição, determinada por fios sutis. Por um momento, podemos realmente nos vermos como fantoches. Porém, de repente percebemos a diferença decisiva entre o teatro de bonecos e nosso próprio drama. Ao contrário dos bonecos, temos a responsabilidade de interromper nossosmovimentos, olhando para o alto e divisando o mecanismo que nos moveu. Tal ato constitui o primeiro passo para a liberdade. A cultura é o processo pelo qual o homem dá sentido a si e a todas as coisas que o cercam: a natureza e o outro. Não possui conteúdo em si mesma e é um produto exclusivo da condição humana, pois o homem é seu produtor e, por ela, é produzido. Metodologia do Ensino de Arte 145 O mundo cultural é um sistema de significados (linguagens, arte, parentesco, religião, mito, arte, economia) estabelecidos pelo grupo social do qual fazemos parte. Ao nascermos iniciamos um processo de assimilação, onde aprendemos, a partir da linguagem, um conjunto de informações simbólicas construídas ao longo de várias gerações. Cada grupo social estabelece para si um conjunto de regras responsáveis por delimitar os pensamentos, as ações e por determinar “modos” de vida. Nossas emoções, valores construídos, juízos morais, éticos e religiosos são determinados culturalmente por todas as regras que seguimos e construímos. Sem as regras, seríamos incapazes de produzir ordem e sentido para nossas ações e pensamentos e, consequentemente, para a realidade que vivemos e produzimos. Sem elas, não seríamos a espécie humana. Nesse contexto, podemos dizer que a cultura perpassa a humanidade e nos torna seres humanos, fazendo com que partilhemos de determinadas regras de uso comum, que além de constituírem nossas identidades, nos marcam como membros de umas determinada cultura e não de outra. A Arte como um produto da diversidade e da cultura Se a cultura é o que nos torna humanos, a Arte, por sua vez, nos faz “deixarmos nossa marca” no mundo, tornamo-nos imortais como espécie e diferentes dos animais. Como uma linguagem produzida por signos e carregada de sentidos, a Arte é uma forma de manifestar os anseios e sentimentos humanos, um modo de universalizar determinadas relações e pontos de vista. Metodologia do Ensino de Arte146 Assim, a Arte pode ser considerada como um produto da diversidade porque é plural, porque está em todo lugar e porque assume as mais determinadas formas. A diversidade se constitui na Arte, que busca representar diferentes traços humanos, diferentes formas de ver e de interagir com o mundo. A cultura, por sua vez, é o grande “guarda-chuva” que sustenta a Arte, pois sem ela, a produção humana não teria sentido. É a cultura que cria condições de possibilidade para que se produza a arte de diferentes maneiras, para que se ouse, para que se busque novas técnicas e mestres. Com isso, pensamos que tanto a diversidade como a cultura, dentro da sala de aula de Arte, devem ser consideradas. Primeiramente, desde o primeiro contato com os alunos, é importante que o professor vá traçando os perfis dos alunos, avaliando em que medida sua turma/ suas turmas/ sua escola assumem um caráter de precariedade e de exclusão social. A cultura e a diversidade, aliadas à Arte, nos ensinam que é necessário aguçar a percepção em relação às diferenças e às relações de poder que nos cercam. Por isso, ao ensinar Arte em sala de aula, o professor deve propor atividades que conversem com a cultura da comunidade, considerando que essa cultura é formada pela diversidade, sendo constituída como plural. Valorizar as potencialidades de cada cultura, considerando sua multiplicidade, pode ser um bom passo para resgatar o criar o interesse pela escola, pelas artes e pelos estudos. Da mesma forma, quando falamos sobre diversidade na Arte, estamos defendendo a pluralidade de técnicas, de representações e também de estilos. Somente assim será possível trabalhar a disciplina de modo democrático, inclusivo e preocupado com o presente e o futuro. Metodologia do Ensino de Arte 147 RESUMINDO Neste capítulo, você aprendeu que: �A arte é fruto da cultura e da diversidade; �A cultura é aquilo que nos torna humanos; é o que construímos e o que nos constrói; é a atribuição de valores e de regras estabelecidas por uma grande comunidade, passadas por muitas e muitas gerações; �A diversidade é um conceito ancorado na noção de diferença, na qual a marca principal não é o que se tem em comum, mas o que se acha que não se tem. Caro estudante: Chegamos ao final desta unidade. É importante que você revise este material, tome nota de suas principais aprendizagens e principais dúvidas, busque nas indicações de pesquisa leituras e vídeos que podem contribuir muito nessa etapa! Além disso, ao término desta unidade, você encontrará as principais referências bibliográficas utilizadas na elaboração dessa obra, que podem ser consultadas. Não desanime nas dificuldades de estudo, mas faça com que essas dificuldades de hoje venham ajudá-lo a se tornar um estudante e um profissional melhor amanhã! Metodologia do Ensino de Arte 149 UNIDADE 04 Metodologia do Ensino de Arte150 Há um filme onde, numa determinada cena em que os personagens principais conversam sobre uma pintura, um deles não consegue entender, naquelas formas de abstração o que seria a arte. O outro, por sua vez, apreciador de obras clássicas, diz a ele que a arte é a forma de registrar nossa passagem pela Terra. Será? A arte está praticamente em todo lugar: nas paredes, nas construções, nos movimentos, na linguagem, no corpo humano. Mas o que será que diferencia a arte das demais atividades humanas? De modo geral, arte é técnica. Porém, funções do dia a dia também exigem uma técnica. Também podemos dizer que arte é linguagem. Mas, por exemplo, uma notícia não é artística e também é linguagem. Podemos dizer que a arte também é aquilo que nos toca. Todavia, tragédias da vida real também podem nos tocar! Percebe como definir arte pode ser fácil e complicado ao mesmo tempo? Se nós, pessoas com experiências de vida mais plurais, temos essa dificuldade, imagine, então, numa sala de aula! Por isso, nesta disciplina abordaremos não somente os conceitos importantes para se pensar a arte, mas também veremos possibilidades de, por meio do ensino da arte em sala de aula, produzir conhecimentos e aprendizagens. Entendeu? Ao longo desta unidade letiva você vai mergulhar neste universo! INTRODUÇÃO Metodologia do Ensino de Arte 151 Olá. Seja muito bem-vindo a nossa Unidade 4. Nesta unidade, o nosso objetivo é auxiliá-lo no desenvolvimento das seguintes competências profissionais: OBJETIVOS 1 Atuar com ética e compromisso com vistas à construção de uma sociedade justa, equânime, igualitária; 2 Compreender, cuidar e educar crianças de zero a cinco anos de forma a contribuir para o seu desen-volvimento nas dimensões, entre outras, física, psicológica, intelectual, social; 3 Identificar problemas socioculturais e educacionais com postura investigativa, integrativa e propositiva em face de realidades complexas, com vistas a contribuir para a superação de exclusões sociais, étnico-raciais, econômicas, culturais, religiosas, políticas e outras; 4 Demonstrar consciência da diversidade, respeitando as diferenças de natureza ambiental-ecológica, étnico-racial, de gêneros, faixas geracionais, classes sociais, religiões, necessidades especiais, escolhas sexuais, entre outras. Então? Está preparado para uma viagem sem volta rumo ao conhecimento? Ao trabalho! Metodologia do Ensino de Arte152 Refletindo sobre a Arte na Educação Infantil Figura 1: A arte Fonte: Pixabay OBJETIVO Ao término desse capítulo, terá conhecimento sobre alguns pressu- postos importantes da Arte na Educação Infantil, para refletir sobre a prática docente nesse nível de ensino. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Metodologia do Ensino de Arte 153 O papel da Arte na Educação Infantil Iniciaremos nossa reflexão com uma citação de Cunha (2007) sobre a Arte na Educação Infantil: Desenhar, brincar, poetar. Manchar, riscar, construir, se encantar. Transformar um fragmento de vidro em uma joia rara, rabiscos em dragão alado, pensamentos em formas. Buscaro dizível no invisível, e o visível na criação. Modos particulares e únicos de ver, sentir, expressar, de inventar e de reinventar o mundo. Depois de desenhar uma série de formas e riscos (des)ordenados, a criança costuma dizer: Eu, mamãe, a barraca e o gato. Faz-de-conta! Picasso reúne um guidão e o selim de uma bicicleta: Cabeça de touro. Assemblage, ressignificações de objetos. Arte! A arte faz de conta. Crianças, artistas, fazem de conta que cada rabisco, cada objeto, cada fragmento, cada pensamento vire uma coisa única. Tanto as crianças, quanto os adultos que persistem em deslocar a ordem estabelecida do mundo por meio da criação artística compartilham de um pensamento similar, no sentido de que ambos propõem simulacros ou fingem que uma coisa é outra coisa (CUNHA, 2007, s/p). Tanto artistas como crianças percebem o mundo e dão sentido a ele através de formas singulares. Utilizam seus sentidos de forma mais aguçada do que a grande parte dos adultos, que deixaram ao longo do tempo esta capacidade humana de ver, imaginar e simbolizar para trás, no passado. Por muitos motivos, e em um determinado período da infância (mais ou menos por volta dos 6-7 anos), boa parte das pessoas abandona seus infindáveis processos de elaborar enunciados poéticos. Por outros motivos, alguns adultos insistem em suas procuras por alterar os sentidos das coisas, insistindo em transformar o ordinário em extraordinário, o vulgar em diferente. Metodologia do Ensino de Arte154 Aqueles que persistem em nos provocar com suas produções, sejam elas as mais tradicionais, como a pintura e o desenho, sejam as performances e as instalações, são conhecidos, em nossa sociedade, como artistas. Os artistas brincam com o cotidiano, com a história, com os mitos, com as crenças e com os nossos pensamentos. Reconstroem significados em torno do já visto e do supostamente sabido. De muitas formas, os artistas, através de suas produções anteciparam saberes das ciências (CUNHA, 2007), como o Futurismo (1909), por exemplo, que visualizou a lei da relatividade de Albert Einstein. Ou expressaram as dores e os massacres humanos como Guernica (1937) de Picasso e a instalação 111 (1992) de Nuno Ramos; ou ainda visualizaram os principais fundamentos de pensadores como fez Gustav Klimt (1862 – 1918) ao “traduzir” a sensualidade das mulheres da teoria de Sigmund Freud (1856-1939). Para Cunha (2007, s/p), Artistas e suas obras formulam conhecimentos sobre o mundo, conhecimentos e saberes que só podem ser ditos e propagados através das linguagens visuais, plásticas e não verbais. Se todos nós estruturamos, nos anos iniciais de nossas vidas, o pensamento simbólico-poético, similar aos dos artistas, por que a maioria das pessoas desiste de transformar a obviedade cotidiana? Talvez, sejam muitos fatores: sociais, culturais e econômicos que estancam as possibilidades de ressignificar o que está no mundo e singularizar ações, pensamentos e modos de ser. Num contexto cultural mais amplo, podemos pensar o quanto as produções culturais imagéticas, que circulam nos mais variados meios, atuam sobre nossos modos de ser e de pensar. São imagens que produzem pontos de vista sobre o mundo e ao mesmo tempo anestesiam nossos sentidos em relação ao “diferente”, ao estranho, ao inusitado. Metodologia do Ensino de Arte 155 Afirma ainda a autora que as imagens que são disponibilizadas no nosso dia a dia, por intermédio dos meios de comunicação e de entretenimento a que temos acesso, tornam- se, se não as principais, importantes referências para que as crianças construam seus imaginários e vão constituindo imagens, principalmente pelo fato de que as artes visuais e plásticas não fazem parte do cotidiano da formação e da vida da maioria das crianças brasileiras. (CUNHA, 2007). Reforça a autora que: Cada vez mais, a conduta infantil é marcada pelos clichês, pelas citações e imagens emprestadas. O imaginário da contemporaneidade é entregue a domicílio. Cada criança é submetida a um profundo condicionamento cultural, e é sobre estes conteúdos que a criança vai operar. A ilustração, o desenho animado, a história em quadrinhos, a propaganda, a embalagem são representações que se tornam quase realidades. O elefante do desenho animado, por exemplo, é mais verdadeiro e presente do que o verdadeiro elefante que mora no zoológico, onde a criança raramente vai. Vivemos hoje sob o signo da ficção e da paródia. Em um contexto mais específico da educação formal, seja da Educação Infantil ao ensino universitário, na maioria das vezes, o ensino da Arte e também outras áreas do conhecimento, ao invés de promover ações pedagógicas que levem crianças e adultos ao universo da criação e estruturação da linguagem visual, acaba tolhendo os modos singulares dos alunos entenderem e expressarem suas leituras e relações com o mundo. Desta forma, em diferentes contextos socioculturais e nas salas de aula, nossa sensibilidade e nossas formas expressivas estão se escoando, fugindo de nossas vidas, sem que tenhamos como exercitar nossos processos sensíveis e criativos. (CUNHA, 2007, s/p). Metodologia do Ensino de Arte156 Isso nos leva a pensar e questionar a própria forma como lidamos com a arte e com a cultura desde a infância. É importante que os docentes tenham em mente que a formação estética e cultural também permeia a formação integral dos sujeitos. No entanto, em termos práticos, muitas vezes, a escola é o único espaço que proporciona – ainda quando pode- essa formação. As mídias em geral, às quais boa parte das famílias brasileiras possuem acesso, pouco considera a dimensão da formação artística das crianças, inclusive, nos programas ditos educativos. Isso deixa uma lacuna de formação que, infelizmente, muitas vezes, a escola não consegue suprir, já que a arte se torna meramente um conteúdo escolar, não fazendo parte diretamente da vida dos sujeitos no dia a dia. Isso pode ser prejudicial para a formação humana, pois, um sujeito que não tem contato com a arte desde pequeno, tampouco buscará uma formação estética na vida adulta. Concepções de Arte e práticas pedagógicas As concepções de arte dos professores direcionam seus modos de ensino, sendo que estes modos de compreender e ensinar arte estão disseminados em várias outras instâncias, como nos museus, nas publicações especializadas (CUNHA, 2012). Afirma a autora que: De diversos modos, as pedagogias da arte vão absorvendo e validando as ideias sobre arte que se fazem e refazem historicamente. Os discursos sobre arte como símbolo de distinção social, e os artistas, como seres de exceção, por exemplo, são produzidos sistematicamente por nossa cultura e aceitos nos contextos escolares - da educação infantil ao ensino universitário - sem serem contestados ou mesmo com um esforço analítico-crítico que provoque uma mudança significativa em termos de desmistificar a Metodologia do Ensino de Arte 157 noção de genialidade artística. Esta visão é vista, por exemplo, nas salas de aula, quando as educadoras elogiam determinadas produções infantis como se fossem frutos de um “dom”. Deste modo, a concepção de criação espontânea, do gênio que cria do nada, vai sendo reforçada pela educadora, que na maioria das vezes não se dá conta de quanto ela incorpora os discursos social e culturalmente produzidos. (CUNHA, 2007, s/p). Deste modo, nas palavras da autora (CUNHA, 2007), é perceptível para quem analisa e pesquisa o cotidiano da sala de aula e do ensino de arte que noções funcionalistas e essencialistas sobre a arte ainda falam fortemente nas práticas de sala de aula, expressas, por exemplo, em atividades de colorir desenhos prontos, na exploração de formas geométricas, personagens de histórias infantis, letras e números, em atividades para copiar linhas de constituições diferentes (como zigue-zague, ondulada e pontilhada), atividades com papel amassado, colagens com papel e com sucata, e manipulaçãode diferentes massas, como argila e plastilina. Ainda, além dessas atividades desenvolvidas no cotidiano escolar, está presente, segundo Cunha (2007), a intencionalidade do ensino de técnicas artísticas diversas para as crianças, como por exemplo, o desenho sobre a lixa, ou sopro de tinta em um canudo sobre o papel. A questão não é afirmar que isso está errado, porém, se essas técnicas ocorrem de forma descontextualizada e desvinculadas de um contexto mais amplo sobre a noção da linguagem visual, parecem fragmentadas e desarticuladas entre si. A aula de arte não pode servir apenas para ensinar a fazer um desenho bonito, não pode ser apenas uma reprodução de modelos. Deve ir além disso! Deve-se evitar que, para as crianças – principalmente – e também para muitos docentes, o padrão de excelência do bem feito sejam as reproduções mais próximas ao real ou ao modelo, sendo que Metodologia do Ensino de Arte158 a interpretação ou qualidade expressiva não são valorizadas e muitas vezes são “corrigidas”, pois distorciam o modelo. A concepção prática tem por objetivos desenvolver habilidades motoras e destrezas para a escrita, bem como a utilização do desenho para fixar a grafia de letras e números, cuja meta é o desenvolvimento de habilidades e destrezas, assim como os critérios do gosto vinculado às Artes. Na maioria das vezes, as práticas pedagógicas no campo das artes visuais desenvolvidas no contexto da Educação Infantil ainda estão fundadas em concepções pedagógicas de reprodução e domínio de técnicas de criação. Aliada à formação precária nesta área do conhecimento, muitos docentes não tiveram em suas vidas a oportunidade de experienciar situações expressivas, de exploração de materiais, contato com diferentes repertórios imagéticos ou de leituras de imagens, no que se refere às Artes. Ou seja, a carência de experiências nas áreas expressivas acarreta equívocos nas práticas pedagógicas junto às crianças.(CUNHA, 2007, s/p). Ainda, segundo a autora, as equipes diretivas e também os gestores responsáveis pela educação não têm investido adequadamente em cursos de formação para os professores, relacionados especialmente ao ensino de arte. Isso faz com que as atividades desenvolvidas em sala de aula sejam vinculadas a noções amplas, desconectadas de um olhar profundo e sensível sobre a arte e sobre a formação em arte, “ [...]como a noção de que arte é dar liberdade, de que arte depende de habilidades, de que arte é um dom, entre outras concepções que formam o senso comum sobre o que é arte e como ela deve ser ensinada.” (CUNHA, 2007, s/p). Reforçamos que nossa reflexão aqui não é demonizar as aulas de arte que acontecem na escola, mas propor que sejam reflexivas, conectadas com um contexto ao mesmo tempo mais Metodologia do Ensino de Arte 159 amplo e também mais crítico sobre a arte e sobre a realidade, estabelecendo conexões com o cotidiano dos alunos, mas também promovendo um ensino de arte que possa contribuir de forma significativa para o desenvolvimento emocional e intelectual dos sujeitos. Ainda, cabe reforçar que a arte é, sim, o lugar do ensino da técnica artística, mas deve ir além, possibilitando que a criança não somente reproduza técnicas, mas que reflita sobre ela, que crie e que transgrida tais técnicas. Isso é fundamental para que ela possa se desenvolver, crescer, refletir e interagir consigo e com o mundo ao seu redor. Necessidade de mudanças na abordagem Como foi abordado anteriormente, a cultura atuai, com sua pluralidade de artefatos imagéticos contribui para a formulação dos modos de imaginar e de ver o mundo. A quantidade de imagens a que estamos expostos, além de ensinar comportamentos, modos de conduta, hábitos e valores, contribui para produzir uma apatia nos olhares. Segundo Cunha (2007), As imagens estão aí, fora e dentro dos ambientes escolares, suas configurações e ensinamentos são cada vez mais persuasivos e poderosos. Os modos de ver o mundo, a nós mesmos e aos outros estão sendo moldados pelas mídias e pelas produções artísticas. Então, a questão das imagens e da visualidade deveriam fazer parte das discussões educacionais. Porém, as práticas pedagógicas em arte na Educação Infantil ainda carecem de uma visão mais contemporânea de educação. Embora os pressupostos teóricos e conceituais no campo da educação tenham se modificado nas últimas décadas, ainda estão alicerçados na visão de que as crianças são detentoras inatas de criatividade e inventividade, ou que as atividades em artes Metodologia do Ensino de Arte160 deveriam servir para desenvolver habilidades visando o controle visual e manual para preparar para a escrita. As formas de abordagens atuais no ensino arte para a Educação Infantil não estão permitindo outros olhares sobre uma área do conhecimento que trabalha basicamente com a transformação, a incerteza de modelos, a investigação da matéria bem como das linguagens não verbais e a abertura ao inusitado. (CUNHA, 2007, s/p). Para a autora, a realidade em que se encontra o ensino de arte na Educação Infantil e nos demais níveis de ensino, não favorece para o desenvolvimento da linguagem artística e expressiva, “[...] compreendida aqui como uma forma de ler e representar suas relações singulares com o mundo.” (CUNHA, 2007, s/p). Deste modo, é necessário repensar o ensino de arte, especialmente na Educação Infantil, de modo a conectá-lo com as práticas e tendências pedagógicas da atualidade. Uma observação que Cunha (2007) faz, que cremos não permear somente o ensino de arte, mas também as outras áreas de conhecimento, é que há um gigantesco distanciamento entre o que está sendo realizado em sala de aula e os diversificados pensamentos pedagógicos sobre o ensino de arte. Embora as imagens façam parte do cotidiano das crianças, dentro e fora do espaço escolar, e que sua influência sobre a formação das crianças seja cada vez mais potente, isso não significa que a formação estética e artística esteja transparecendo nesse processo, pois Os modos de ver o mundo, a nós mesmos e os outros estão sendo modulados pelas várias mídias. Então, a questão da constituição da linguagem visual e da visualidade infantil deveria ser um dos objetivos do ensino de arte na Educação Infantil, pois uma das funções da Arte na educação é provocar tensionamentos e desencadear uma outra Metodologia do Ensino de Arte 161 educação do olhar, uma educação que rompa com o estabelecido, com as normas e convenções sobre o próprio mundo. Uma educação em arte deve possibilitar que as pessoas continuem buscando e dando sentido poético à vida. (CUNHA, 2007, s/p). Acreditamos que a infância seja o local não da reprodução, mas da criação e da aprendizagem. Somente isso já nos leva a refletirmos sobre o ensino de arte como algo que deve procurar estar alinhado às tendências pedagógicas da atualidade e que também se torne desafiador para a criança e também para o jovem, no sentido de propor técnicas e elementos que façam sentido dentro de seu contexto de vida e de mundo. Tanto as técnicas mais simples como as mais elaboradas e a livre criação devem estar, de uma maneira ou de outra, sintonizadas com o intuito de permitir que, por meio das práticas, o sujeito vá desenvolvendo o gosto pela arte, a competência estética e que também tenha a possibilidade de criar, caso queira. O trabalho com as crianças De modo geral, a Educação Infantil não tem o compromisso do ensino de conteúdos como acontece, por exemplo, nos ensinos fundamental e médio. Isso não significa, entretanto, que o contexto da Educação Infantil – no que se refere ao ensino de Arte – se resuma a fazer nada, ou ainda, a apenas brincar. Pior ainda, como abordado anteriormente, seria tratar o ensino de Arte na Educação Infantil ou em qualquer outro nível de ensino como disciplina da reprodução. Primeiramente, o espaço da Educação Infantil não apresenta uma visão educacional diferenciada,se comparado aos outros segmentos de ensino, por se tratar de um momento da experiência, do primeiro contato que os indivíduos têm com o mundo externo ao espaço de convívio familiar. Metodologia do Ensino de Arte162 É nesse contexto que a criança se dá por conta da existência de outros, iguais e diferentes dela, que partilham de elementos comuns: a infância. Ao mesmo tempo, é na Educação Infantil que a criança aprende a experienciar valores como a convivência, a partilha, a socialização. Neste sentido, o ensino de Arte deve propiciar essas experiências de conviver, de partilhar, de socializar. Quando uma criança, por exemplo, já em idade de fala, expõe sua opinião sobre um desenho, um filme ou uma atividade artística desenvolvida, ela está se expressando e aprendendo, ao mesmo tempo, a falar e a ouvir. As atividades de criação individuais e conjuntas também auxiliam nesse processo, permitindo que as crianças desenvolvam, ora senso de autonomia, ora senso de coletividade. Outro elemento importante a ser destacado é a crença – especialmente comum nos níveis de ensino posteriores – de que a criança na Educação Infantil não faz nada, ou só brinca, já que não há “conteúdos” visíveis como nos demais segmentos. Essa visão é completamente equivocada e, em se tratando do ensino de Arte, mais ainda, pois, o fato de não haver a menção de conteúdos e de conceitos técnicos, não significa que a criança não aprenda a ir se desenvolvendo, conhecendo seu próprio corpo e limites, e o mundo ao seu redor, por meio da criação artística. Quando, por exemplo, uma criança pinta com as mãos, ela está aprendendo sobre texturas, superfícies e limites, o que permitirá que, conforma for se desenvolvendo, consiga apreender outros conceitos mais complexos, também, importantes. Cabe lembrar, inclusive, que, na Educação Infantil, as palavras de ordem são: criar e explorar. O conhecimento se dá pelo desenvolvimento da criatividade, e a o ensino de Arte potencializa esse conhecimento, uma vez que a criança aprende sobre objetos, texturas, cores, traços, limites etc. Metodologia do Ensino de Arte 163 Não há um certo ou um errado no que se refere à criação na Educação Infantil, mas atividades orientadas, nas quais os professores assumem o papel de orientadores e mediadores. O que conta nesse processo é que a criança desenvolva a expressão, que consiga agir sobre si e sobre o outro, respeitando e reconhecendo as diferenças e convivendo. Ainda, cabe destacar que há um equívoco quando se afirmar que na Educação Infantil apenas se brinca. De fato, o ato de brincar pode potencializar muitas experiências e aprendizagem, mas não se brinca só por brincar. Assim como na Educação Infantil não se tem o propósito de apenas ensinar a criança a comer, falar e fazer suas necessidades fisiológicas, também, o tato de brincar não é algo dado como um elemento de “vale tudo”. Toda a atividade de criação, na Educação Infantil, envolve o lúdico, e consequentemente, o brincar. Mas o que a diferencia da brincadeira que ocorre em casa ou com os amiguinhos em uma festa de aniversário é a existência de uma intencionalidade pedagógica, intencionalidade essa que faz toda a diferença, uma vez que a criança “brinca” ao produzir arte, mas depois, reflete sobre ela, interage, atua na (res)significação dos elementos de que dispõe em seu universo. Por isso, é importante que o planejamento de Arte na Educação Infantil preveja o desenvolvimento da criatividade, o (re)aproveitamento dos materiais mais diversos possíveis e a participação coletiva na criação. Só assim, a atividade de criação poderá potencializar o desenvolvimento da criança não apenas como um sujeito produtor de Arte, mas como um sujeito humano. Por fim, também é importante desmistificar a noção de que o ensino de Arte na Educação Infantil envolve reprodução de técnicas. As técnicas, de fato, são importantes, mas a criação artística prevê não uma rigidez em relação a isso, mas a possibilidade de reinventar técnicas, de acrescentar ou de tirar elementos, como na realização de uma receita. Metodologia do Ensino de Arte164 Nada é fixo e imutável no ensino de Arte; a liberdade criativa impera e se faz necessária, a fim de que a criação de cada criança possa manifestar não apenas uma técnica, mas a expressão de sua personalidade e individualidade, contribuindo para que seu desenvolvimento seja saudável e pedagogicamente amparado. Ensinar Arte para crianças talvez seja uma das atividades mais interessantes da Educação Infantil, se levada a sério e, principalmente, se o docente estiver aberto a repensar suas práticas, a criar um ambiente favorável para o ensino e para a aprendizagem, e a permitir que o ensino de Arte contribua, acima de tudo, para formar seres mais humanizados. RESUMINDO Neste capítulo, você aprendeu que: O ensino de Arte na Educação Infantil ainda carece de um repensar, especialmente da parte dos professores, para não se tornar um espaço de reprodução de técnicas artísticas apenas; Ensinar Arte na Educação Infantil pressupõe a criação, a exploração do mundo e a ampliação de conhecimentos, por meio da expressão, do respeito às diferenças e da convivência; Por não apresentar disciplinas e conteúdos rígidos como os níveis posteriores de educação, a Educação Infantil, por vezes, é confundida como um espaço onde não se ensina nada, ou mesmo, onde apenas se brinca. No entanto, esse espaço é permeado de intencionalidades pedagógicas necessárias para o desenvolvimento integral e humano dos sujeitos, fornecendo subsídios importantíssimos para seu desenvolvimento posterior. Metodologia do Ensino de Arte 165 Explorando o panorama sobre o ensino da Arte no Brasil – Parte I OBJETIVO Ao término deste capítulo você será capaz de entender alguns pressupostos importantes sobre a história do ensino da Arte no Brasil, entre a Independência (1822) e a segunda metade do século XIX. Isso fará toda a diferença em sua atuação profissional, uma vez que a arte faz parte do dia a dia da escola. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! Figura 2: Brasil e Arte Fonte: Pixabay Breve introdução O objetivo deste capítulo é buscarmos entender como o ensino de arte foi sendo constituindo historicamente no Brasil. Barbosa e Coutinho (2011) sugerem que essa história está relacionada a um contexto mais amplo, de dependência Metodologia do Ensino de Arte166 cultural. Ainda segundo as autoras, Ao longo deste capítulo, procuraremos compreender como a história do ensino da arte no Brasil está vinculada a uma dependência cultural. Ao mesmo tempo, segundo as autoras, a primeira manifestação cultural e artística brasileira foi “importada”, mas aqui ganhou outras formas: o Barroco, que ocorreu durante os séculos XVI e XVII. Vindo da Península Ibérica, o Barroco, na criação popular, foi dotado de qualidades diferentes do contexto europeu, que podem ser traduzidas como elementos nacionais: Os artistas e artesãos brasileiros, à maneira antropofágica, desenvolveram um barroco com distinções formais em relação ao Barroco europeu. O ensino da arte barroca tinha lugar nas oficinas através da prática sob a orientação e supervisão de um mestre. Estas oficinas eram a única forma de educação artística popular na época. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p.4). A primeira forma de institucionalizar o ensino de arte foi por meio da Missão Francesa (1816), que veio com a proposta de implementação do modelo artístico neoclássico, sendo talvez uma das poucas vezes que o Brasil esteve alinhado temporalmente a modelos artísticos internacionais, pois quase sempre, os modelos estrangeiros que aqui chegavam o faziam tardiamente, quando já estavam caindo na obsolência e no desuso, ou mesmo quando já estavam bem consolidados em seus locais de origem. Porém, com todas as considerações importantes que se pode fazer à Missão Francesa, há que se considerar que: A Missão Francesafoi na realidade uma invasão cultural de forte cunho elitista. Em contraposição, no fim do século XIX, já no período republicano, os liberais introduziram o ensino de desenho na educação numa perspectiva antielitista como preparação de mão-de-obra para o trabalho industriário, com inspiração no modelo norte- americano. A apropriação deste modelo e seus Metodologia do Ensino de Arte 167 desdobramentos deixou resquícios em livros didáticos e no ideário educacional até o século XX. Entretanto, já no início do século passado, o Modernismo transpôs para o campo educacional a noção de arte como forma de expressão. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 4-5). Na segunda metade do século XX, segundo as mesmas autoras, entra em voga a concepção da arte como forma de expressão, tendo propiciado experiências bastante proveitosas com relação ao ensino de arte para crianças e também para adolescentes, numa organização curricular sob a forma de atividades extracurriculares. Nos anos 1970, sob a égide do regime militar no Brasil, o ensino de arte, nomeado como Educação Artística, tornou-se obrigatório em todas as escolas de ensino formal, porém trazendo uma perspectiva bastante calcada no tecnicismo e ideologicamente sujeita à preparação para o trabalho e à polivalência. Já no fim do século XX, segundo Barbosa e Coutinho (2011) , o movimento de arte/educação começa, aos poucos, a ganhar forma, sintonizando-se com as teorias e com o pensamento pós- moderno, mostrando o amadurecimento desse campo do saber, ampliando-se inclusive – o número de pesquisas acadêmicas que tinha como objeto as práticas artísticas. A partir daí, podemos dizer que chegamos à contemporaneidade, que se caracteriza por múltiplas deglutições e apropriações de modelos, por trânsitos, entrosamentos entre culturas e pela pluralidade de formas. [...] porém, precisamos compreender que esta nossa história não é apenas uma sucessão de fatos e acontecimentos isolados que se apresentam em formato linear e que pertencem ao passado, mas uma constelação de proposições, de ideias e de experiências sobre a arte e seu ensino que se sobrepõem e co-habitam um mesmo espaço e Metodologia do Ensino de Arte168 cultura, e que continuam ativas hoje no ideário do sistema educacional. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 5). Com isso, afirmamos que os próximos capítulos trarão um panorama sobre o ensino de arte não com o objetivo apenas de informar aos futuros docentes o que aconteceu, mas, acima de tudo, apontar possibilidades de repensar o passado, o presente e o futuro do ensino de arte, observando as lacunas deixadas por cada época e pensando numa perspectiva que esteja – de fato – mais alinhada com as tendências atuais. A vinda da Missão Francesa Segundo Barbosa e Coutinho (2011, p. 6), A primeira institucionalização sistemática do ensino de arte foi a Missão Francesa, e um dos poucos modelos com atualidade no país de origem no momento de sua importação para o Brasil. Quase sempre os modelos estrangeiros foram tomados de empréstimo numa forma já enfraquecida e desgastada, quando já caíam em desuso em seus países originários. A Missão francesa foi, na realidade, uma forma de invasão cultural. Seus integrantes, que aqui chegaram em 1816, eram membros do Instituto de França, que havia sido aberto em 1795 para substituir as velhas academias de arte abolidas pela Revolução Francesa. Sob a supervisão e a influência de Jacques Louis David (1748-1825), considerado o mestre do Neoclássico, o Instituto de França logo alcançou reputação superior à da École des Beaux-Arts e influenciou as escolas de arte de toda a Europa por ser a instituição cuja metodologia era considerada a mais moderna de seu tempo. Portanto, o Neoclássico, através do qual se expressavam os Metodologia do Ensino de Arte 169 artistas da Missão Francesa quando aqui vieram organizar a nossa primeira escola de arte, era o estilo de vanguarda naquele tempo na Europa. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 6). Com todas as críticas e tensionamentos que se possa fazer à Missão Francesa, pode-se dizer que ela foi a primeira tentativa de estabelecer o ensino da arte no Brasil. Antes disso, as tendências eram importadas ou por estrangeiros que aqui passavam, ou por brasileiros que tinham contato com elas em seus locais de origem. A Missão Francesa também pode significar um avanço em termos de constitucionalização artística no Brasil pelo fato de que, pela primeira vez em nossa história, estivemos temporalmente alinhados com uma tendência artística estrangeira. Entretanto – claro – as questões de submissão e de dependência cultural ainda estavam presentes em nossa história, fato que torna a Missão Francesa ao mesmo tempo importante e criticada teoricamente. Todavia, os planos apresentados por Joachim Le Breton (1760-1819), chefe da Missão Francesa, para a Escola de Ciências Artes e Ofícios, criada por decreto de D. João VI em 1816, eram de perfil bem mais popular do que a orientação seguida no Instituto de França onde ele ensinava. Seu projeto repetia os mais atuais modelos de ensino de atividades artísticas ligadas a ofícios mecânicos empregados na França por Bachelier em sua École Royale Gratuite de Dessin, que existe até hoje com o nome de École Nationale des Arts Décoratifs. Bachelier, que era um grande mestre de decoração em porcelana da fábrica de Sèvres, combinou e concilou em sua escola (1767) métodos e objetivos de ensino de arte comuns às corporações e às academias. Ele contornou a tradicional luta Metodologia do Ensino de Arte170 entre artistas e artesões, conseguindo apoio das academias para o seu trabalho pedagógico, exigindo, por exemplo, que os mestres de desenho de sua escola tivessem obtido prêmios acadêmicos. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 6). No Brasil, a Missão Francesa chegou com um projeto de implementação um pouco diferente daquele presente na Europa: destinou-se a abrir suas portas, também, para as camadas mais populares, embora não possa – com isso – ser nomeada como democrática. Aqui, o modelo neoclássico implementado pela missão estava mais vinculado às tendências emergentes no mundo – como a Revolução Industrial, que também ocorria – do que propriamente com apenas o fruir estético e artístico. Isso marcou boa parte do período histórico da arte brasileira para as camadas mais populares: a visão do desenvolvimento artístico como forma de desenvolver motricidades finas, com o pretexto de especializar-se para o trabalho fabril. A experiência de Bachelier, muito comentada e aplaudida na Europa, levou outros países, como a Alemanha e a Áustria, a introduzirem o desenho criativo no treinamento das escolas para trabalhadores manuais, e as escolas de belas artes a considerarem importante o ensino da geometria. Era esta a perfeita união entre as belas artes e as indústrias que Le Breton pretendia repetir no Brasil. Por seus planos, nossa escola de arte seria uma entidade que não perderia de vista o equilíbrio entre educação popular e educação burguesa. No entanto, quando aquela escola começou a funcionar em 1826 sob o nome de Escola Imperial das Belas-Artes, não só seu nome havia sido trocado, mas, principalmente sua perspectiva de atuação educacional, tornando-se o lugar de Metodologia do Ensino de Arte 171 convergência de uma elite cultural que se formava no país para movimentar a corte, dificultando, desse modo, o acesso das camadas populares à produção artística. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 6-7). A dicotomia entre as formas de ensino, no Brasil, é algo com o qual nós, professores da contemporaneidade, também precisamos lidar. Diariamente, constatamos a diferenciação entre a educação tida como popular e a educação destinada às elites. Esse é um elemento bastante complicado, especialmente, do ponto de vista da democratização do ensino, pois, como democratizar, se o acesso e as oportunidades são desiguais? Como permitir que todos tenham condiçõesde acesso, se as realidades econômicas do Brasil interferem diretamente no contexto educacional? São perguntas que, praticamente duzentos anos após a vinda da Missão Francesa paras o país, ainda não têm resposta. Além da Missão Francesa, outra importante instituição foi criada: a Escola Imperial de Belas Artes: A Escola Imperial das Belas-Artes inaugurou a dicotomia na qual até hoje se debate a educação brasileira, isto é, o dilema entre educação de elite e educação popular. Na área específica de educação artística, a Escola incorporou o dilema já instaurado na Europa entre arte como criação e como técnica. Em 1855, Manuel José de Araújo Porto Alegre (1806-1879), inspirado no ideário romântico, pretendeu revigorar a educação elitista que vinha tendo lugar na então denominada Academia Imperial das Belas-Artes através do contato com o povo. Sua reforma buscava conjugar no mesmo estabelecimento escolar duas classes de alunos, o artesão e o artista, frequentando juntos as mesmas disciplinas básicas. A formação Metodologia do Ensino de Arte172 artística era alargada com outras disciplinas de caráter teórico, especializando-se o artífice nas aplicações do desenho e na prática mecânica. No entanto, a permanência dos velhos métodos e de uma linguagem sofisticada fez com que a busca popular por esses cursos fosse quase nula, assim como foi quase nula também a matrícula nos cursos noturnos para a formação de artesão criados em 1860 na Academia. Nestes últimos, a simplificação do currículo era quase pejorativa. Em ambos os casos, a inclusão da formação do artífice naquela instituição era uma forma de concessão da elite à classe trabalhadora e por isso destinada ao fracasso. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 7). A desigualdade brasileira começa pela educação. E isso ocorre pela forma de compreender, até mesmo, as formas que cada camada social deve pensar, privilegiando-se o exercício intelectual de algumas e a atividade técnica de outras. A Escola Imperial de Belas Artes foi uma instituição que, embora buscasse atender a todas as camadas populares, ainda assim se diferenciava nas suas entrelinhas, ou melhor, no currículo e nos objetivos curriculares destinados a cada segmento social. Por isso, se transpormos esses fatos históricos para o contexto atual, é tão importante que a legislação educacional vigente, assim como as orientações para a educação, sejam constantemente revisitadas e respeitadas, pois elas se constituem numa tentativa – ainda que com grandes dificuldades de implementação – de tornar o acesso à educação e ao conhecimento mais igualitário para todos. Além das duas formas de institucionalização do ensino de arte anteriormente abordada, outra instituição que se destacou foi o Liceu de Artes e Ofícios: Metodologia do Ensino de Arte 173 Já o Liceu de Artes e Ofícios de Bethencourt da Silva (1831-1911), criado em 1856 no Rio de Janeiro, porém, mereceu desde o seu início um alto grau de confiança das classes menos favorecidas, como atestou o grande número de matrículas já no primeiro ano de funcionamento. Coube aos liceus de artes e ofícios, criados na maioria dos Estados, com pequenas variações do modelo do Liceu de Bethencourt da Silva, a tarefa de formar não só o artífice mas os artistas que provinham das classes operárias. Até o ano de 1870, muito pouco se contestou o modelo de ensino da arte da Academia Imperial das Belas Artes, que em parte foi utilizado pela escola secundária. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 7). Outro elemento a ser analisado em relação ao ensino de arte se refere a questões de gênero. A arte, em geral, era vista como um elemento feminino, pelo menos, na maioria dos países da América. Isso pode evidenciar que o ensino de arte talvez fosse compreendido como algo secundário, dedicado a “passar o tempo”, e não, necessariamente, com alguma função direta na formação dos sujeitos. Tivemos, lado a lado ao longo da história do ensino da arte no Brasil, concepções de arte submetidas a outras culturas e também a diferenciação do ensino não apenas por nível social, conforme abordado anteriormente, mas também por questões de gênero, como se pode observar no relato de Barbosa e Coutinho (2007): Nas escolas secundárias particulares para meninos e meninas, as práticas mais comuns eram a cópia de retratos de pessoas importantes, de santos e a cópia de estampas, em geral europeias, representando paisagens desconhecidas aos nossos olhos acostumados ao meio ambiente Metodologia do Ensino de Arte174 tropical. Estas paisagens levavam os alunos a valorar esteticamente a natureza da Europa e depreciar a nossa pela rudeza contrastante. É importante notar que no século XIX poucos países do chamado Novo Mundo instituíram o ensino da arte para meninos nas escolas de elite. O mais comum é que a arte tivesse lugar apenas nas escolas de meninas de alta classe. No Brasil, isto aconteceu porque a elite brasileira esteve no período colonial mais ligada aos modelos aristocráticos do que aos modelos burgueses como nos outros países da América. Conforme o modelo aristocrático, arte era indispensável na formação dos príncipes. D. João VI deu o exemplo quando contratou Arnaud Pallière (1823-1887) para ensinar desenho aos príncipes. Seguindo este padrão, a arte foi incluída no currículo do Colégio do Padre Felisberto Antônio Figueiredo de Moura, uma escola para rapazes localizada no Rio de Janeiro que determinou o modelo de educação de meninos de alta classe na época, em 1811. O conteúdo e a função da arte nestas escolas foram sugeridos por Raul Pompeia no seu livro O Ateneu. A apresentação da exposição anual era o objetivo das aulas de arte e era numa espécie de símbolo de distinção para a escola. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 8). Em relação às concepções de arte e de ensino vigentes, nem todos partilhavam de uma mesma opinião sobre a divisão da arte. Exemplo foram os liberais, preocupados com a educação das camadas populares paras o trabalho. Essa, talvez, seja a grande dicotomia existente no ensino até a atualidade: ensinar para a vida ou para o trabalho? Isso reflete a liquidez da contemporaneidade, assim como a insegurança em relação ao próprio futuro e à educação. Metodologia do Ensino de Arte 175 As disputas pelos modos de ensinar ricos e pobres, na escola, também trazem à tona um elemento importante a se discutir: a educação é o campo das políticas. Isso, em parte, justifica o porquê de tantas mudanças no cenário educacional, sendo que essas ocorrem com a mesma regularidade que a alteração de partidos políticos nos governos. E, pelo “andar da carruagem histórica”, perceberemos que essa disputa é antiga: Contrários ao uso da arte na escola como uma espécie de adorno cultural, alguns liberais a partir dos anos 1870, e principalmente na década de 1880, defenderam uma educação popular para o trabalho, que deveria ser o principal objetivo da arte na escola, iniciando uma campanha para tornar o desenho obrigatório nos ensinos primário e secundário. Devemos principalmente aos liberais o início do ensino do desenho industrial na escola, isto é, do que hoje conhecemos como design. Eles se propuseram a dar um conhecimento técnico de desenho a todos os indivíduos de maneira que, libertados da ignorância, fossem capazes de produzir suas invenções. Educar o ‘instituto da execução’ para evitar que ele se tornasse um impedimento à objetivação da invenção era seu princípio mais importante, isto é, primeiro aprender como trabalhar, depois aplicar as habilidades técnicas solucionando os problemas e dando forma concreta às criações individuais. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 11). A educação e a educação em arte, desde os tempos do Império, assumiu diferentes formas e concepções, sempre vinculada aos ideais de uma classe social específica. Em termos gerais, a educação brasileira é marcada pelas disputas de classe, assim como pela ação de pensar o que é melhorde ser ensinado aos mais pobres. Metodologia do Ensino de Arte176 O ensino de Arte numa perspectiva liberal No final do século XIX, mais precisamente na década de 1870, o surto de desenvolvimento econômico ocorrido no Brasil permitiu que a organização da sociedade tivesse mais liberdade, expandindo – inclusive – ideias de contestação. Nesse período, foi criado o Partido Republicano, originando uma série de críticas e de protestos contra o Império, inclusive contra a política educacional do período. Os discursos abolicionistas, cada vez mais intensificados, buscavam igualdade na educação do povo e dos escravos, apontando também a preocupação com o que aconteceria com os ex-escravos após o fim da escravidão. Segundo Barbosa e Coutinho (2011), Os principais temas discutidos naquele momento eram a alfabetização e a preparação para o trabalho. A necessidade de um ensino do desenho apropriado era tida como um dos principais aspectos da preparação para o trabalho industrial. Buscando um modelo que estabelecesse a união entre criação e técnica, isto é, entre arte e sua aplicação a indústria, intelectuais e políticos (especialmente os liberais) brasileiros se comprometeram profundamente com os modelos de Walter Smith para o ensino da arte nos Estados Unidos que passaram a divulgar também no Brasil. Os principais divulgadores de Walter Smith no Brasil foram o jornal O Novo Mundo; Rui Barbosa, em seus Pareceres sobre a reforma do ensino primário e secundário; e Abílio César Pereira Borges, por meio de seu livro Geometria popular. A popularização do ensino da arte, entendido como ensino do desenho, isto é, ensino preparatório para o design, era o objetivo da orientação que o inglês Walter Smith apresentava por meio dos seus escritos e suas atividades como organizador do ensino da Metodologia do Ensino de Arte 177 arte em Massachusetts (EUA). Influenciado pelos estudos de Redgrave e Dyce, de quem foi aluno na South Kensington School of Industrial Drawing and Crafts em Londres, da qual só resta hoje o Victoria and Albert Museum, Smith se demitiu do cargo de professor da Leeds School of Art quando a instituição (1868) começou a alterar os objetivos para os quais havia sido criada, ou seja, vincular a arte à educação popular, para enveredar pelo caminho do ensino da arte como verniz cultural obedecendo aos caprichosos desejos da classe média. O Novo Mundo apresentou, em várias notícias e artigos, o aspecto de democratização da arte que caracterizava a ação de Walter Smith em Massachusetts, para onde ele fora contratado com carta branca para organizar o ensino da arte como desenho industrial. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 11-12). É importante que não sejamos ingênuos em relação às críticas feitas à educação imperial, como se de um lado estivessem os vilões e de outra, os mocinhos. Em ambos os lados, havia interesses explícitos e implícitos, geralmente vinculados a questões econômicas e a manutenção de classes sociais. O Jornal Novo Mundo tinha grande circulação no país e extrema importância cultural naquele período histórico (BARBOSA; COUTINHO, 2011). E, nesse sentido a educação era a instituição americana que arrancava maiores elogios. Na época, dava-se bastante ênfase à educação feminina, bem como à arte/educação. A arte, permeada pela moralidade protestante, era ligada ao trabalho, sendo valorizada a educação para o exercício do trabalho e para as ditas artes industriais. Segundo as autoras, André Rebouças escreveu para O Novo Mundo longos artigos defendendo a necessidade de se tornar compulsório, como Smith havia conseguido em Massachusetts, o ensino do desenho geométrico Metodologia do Ensino de Arte178 com aplicações à indústria. Um número especial de O Novo Mundo foi publicado acerca da Centennial Exhibition de 1876 na Filadélfia, onde se destacavam os trabalhos apresentados pela Escola Normal de Artes, criada e dirigida por Smith, assim como os trabalhos de 24 cidades de Massachusetts, todas elas orientadas em seu ensino de arte por Smith. O Novo Mundo destacava a importância que Smith atribuía aos exercícios geométricos progressivos no ensino do desenho, à sua ideia de que todo mundo tinha capacidade para desenhar e de sua crença no ensino do desenho como veículo de popularização da arte por meio da adaptação a fins industriais, colaborando para a qualidade e prosperidade da produção industrial. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 12-13). As ideias de Smith tiveram grande repercussão no país, tanto que Rui Barbosa subscreveu essas ideias nos Pareceres sobre a reforma da educação primária e secundária. Também foi no pensamento de Walter Smith que Rui Barbosa conseguiu traçar algumas recomendações em relação à metodologia do ensino do desenho. Outro educador, dessa vez inspirado nas ideias de Rui Barbosa, foi Abíblio Cesar Pereira Borges, que publicou uma espécie de sumário comentado do Teacher’s manual for free hand drawing de Walter Smith em 1873 defendendo uma Geometria popular. Seu estudo tinha como norte o desenho a ser iniciado por linhas verticais, horizontais, oblíquas, paralelas, ou seja, por aquilo Smith, segundo Borges, denominava como alfabeto do desenho. Junto a esse estudo, seguia-se a aprendizagem por meio de ângulos, triângulos e retângulos de forma gradativa. Os exercícios de memória presentes em sua obra também eram idênticos aos propostos por Smith. Na descrição de Barbosa e Coutinho (2011), Depois de estudar quadrados e polígonos, ele introduzia ornamentos e análises de folhas em Metodologia do Ensino de Arte 179 superfície plana. Os exemplos botânicos eram organizados em forma de diagramas exatamente como o livro de Smith. Ele ainda propunha o traçado de gregas, rosáceas, repetições verticais, repetições horizontais, formas entrelaçadas. Alguns objetos simples (vasos de água, bacias etc.), desde que tivessem as formas geométricas como Smith prescrevia, eram propostos para desenhar. Por fim, eram apresentados ornamentos e elementos arquitetônicos em diagrama (portais, arcos, colunas) de diferentes períodos, principalmente barrocos e neoclássicos. Os ornamentos como motivos para o trabalho em ferro eram também utilizados por Smith. O livro de Abílio César Pereira Borges teve, no mínimo, 41 edições e foi usado nas instituições pelo menos até 1959. O objetivo do livro, explicitado por ele próprio, era propagar o ensino do desenho geométrico e educar a nação para o trabalho industrial. Já os positivistas, atrelados ao evolucionismo, defendiam que a capacidade imaginativa deveria ser desenvolvida na escola por meio do estudo e cópia dos ornatos, pois estes representavam a força imaginativa do homem em sua evolução a partir das idades primitivas. No ensino do desenho, portanto, era dominante o traçado de observação de modelos de ornatos em gesso. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 14). Segundo Barbosa e Coutinho (2011), a recomendação de Borges, em seu livro, era que se começasse pelos trabalhos com baixos relevos formados por linhas retas, pois esta forma de composição, de todas, era a mais básica e primitiva, encontrada nos povos primitivos da Oceania e da África para, progressivamente, passar aos modelos mais complexos, encontrados na decoração dos povos que o autor chamava de mais evoluídos, como os índios Metodologia do Ensino de Arte180 peruanos e mexicanos e, posteriormente, utilizar o alto-relevo para representar elementos da fauna e da flora, consideramos mais complexos, e presentes na cultura grega. Tendo os liberais ganhado a corrente positivista nas lutas pela Reforma Republicana na Escola Nacional de Belas-Artes (1890), foi possível que eles impusessem sua diretriz ao ensino do desenho, por meio de uma reforma educacional ocorrida em 1901, descrita no Código Epitácio Pessoa. Conforme Barbosa e Coutinho (2011), Esta Lei transcrevia sucintamente as propostas de Rui Barbosa para o ensino do desenho, usando muitas vezes asmesmas palavras dos Pareceres. É, portanto, o modelo de Walter Smith, cujos conteúdos já haviam entrado no circuito da educação brasileira através de Abílio César Pereira Borges, que a partir de então teríamos imperando nos ginásios brasileiros. São conteúdos que estariam quase imexíveis até 1958, atravessando várias reformas educacionais e ainda há resquícios deles nas aulas de arte. Os exercícios foram preservados através dos livros didáticos de educação artística. Em quase todos os livros de educação artística para o ensino fundamental, editados (décadas de 1970, 1980 e 1990), ainda vemos gregas, rosáceas, frisas decorativas etc., um remanescente das propostas de Walter Smith consagradas pelo Código Epitácio Pessoa. É curioso imaginar que a aprendizagem destes elementos decorativos tinha sentido no início do século, já que se pretendia através do desenho preparar para o trabalho, e a arquitetura era generosa na utilização de elementos sobrepostos para cuja criação e execução as rosáceas seriam exercício preparatório. Por outro lado, as paredes internas das casas ostentavam complicadas faixas decorativas em suas pinturas. Ainda mais, estes Metodologia do Ensino de Arte 181 motivos eram também fartamente usados nas artes gráficas. Atualmente, pouco se justifica sua permanência como exercício escolar. Alguns voltariam a ter sentido no contexto da pós- modernidade se os autores dos livros didáticos tivessem consciência da recuperação atual de alguns modelos visuais do início do século XX. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 14-15). Como se pode perceber, muitos foram os desafios e alterações na educação em arte, especialmente no que se refere à forma como essa era tratada. Cabe ainda que saibamos que foi por meio das reformas liberais que o ensino se democratizou, entretanto, essa democratização contribuiu para que o distanciamento entre as educações de elite e popular se ampliassem ainda mais. RESUMINDO Neste capítulo, você aprendeu que: O ensino de Arte, no Brasil, iniciou-se ainda no período do Império, com a vinda da Missão Francesa, trazendo para o país os ideais neoclássicos de Arte e a primeira escola artística no país; Nossa história da Arte perpassa muitos episódios de reprodução de ideais artísticos defasados de outras culturas. Talvez, somente no período Barroco (séculos XVI e XVII), nossas manifestações artísticas começaram a subverter essa ordem; Na metade final do século XIX, o ensino de Arte no Brasil seguiu a influência americana, fortemente ligada à divisão social e à preparação para o trabalho, tendo perdurado essa noção até meados da década de 1950. Metodologia do Ensino de Arte182 Explorando o panorama sobre o ensino da Arte no Brasil – Parte II OBJETIVO Ao término deste capítulo você será capaz de entender alguns pressupostos importantes sobre a história do ensino da Arte no Brasil, entre a Independência (1822) e o século XX. Isso fará toda a diferença em sua atuação profissional, uma vez que a arte faz parte do dia a dia da escola. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! O Modernismo O final do século XIX e início do século XX foi marcado por intensas transformações econômicas e sociais, dentro e fora do país: do outro lado do oceano, vimos a Belle Epòque francesa, a Revolução Russa, a Primeira Guerra Mundial; aqui, vimos as tensões originadas entre o povo e o governo republicano, o surgimento de São Paulo como centro financeiro do país e um agitamento cultural, provocado por um grupo de artistas que, em 1922, buscaram promover uma arte que rompia com os padrões oitocentistas, sobre os quais Barbosa e Coutinho (2011) descrevem da seguinte forma: A Semana de Arte Moderna de 22, que introduziu o Brasil estrondosamente no Modernismo, não repercutiu imediatamente no ensino da arte. Quando a partir de 1927, o ensino da arte volta a ser objeto de discussões isto se deveu principalmente à modernização educacional. Com a crise político-social contestatória da oligarquia Metodologia do Ensino de Arte 183 e com a tentativa de instauração de um regime mais democrático, uma reflexão sobre o papel social da educação aflora novamente. Desta vez, é a educação primária e a escola que se tornam centrais nas reformas educacionais através do movimento da Escola Nova. Defendia-se, então, o mesmo princípio liberal de arte integrada no currículo, ou melhor, de arte na escola para todos. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 15). Com toda essa agitação conturbadas, de um lado, havia os liberais, com a defesa da educação em arte como o ensino das técnicas de desenho, a fim de preparar os sujeitos para o trabalho; de outro, o movimento da Escola Nova, apregoando a concepção da arte como forma de mobilização da capacidade de criação, juntando imaginação e inteligência. (BARBOSA; COUTINHO, 2011). Além disso, nessa época estava em voga o pensamento teórico de John Dewey, defendido por importantes figuras da educação brasileira, como Anísio Teixeira, que incorporou o pensamento do teórico às Reformas Educacionais do Distrito Federal realizadas por Fernando Azevedo e também pelas Reformas de Atílio Vivacqua no Espírito Santo, assim como de de Carneiro Leão em Pernambuco e de Francisco Campos em Minas Gerais. Sobre a transposição das ideias de Dewey para a educação brasileira, Barbosa e Coutinho (2011, p. 15-16) afirmam o seguinte: As diferentes interpretações acerca das ideias de John Dewey conduziram a caminhos distintos o ensino da arte no Brasil: à observação naturalista; à arte como expressão de aula; como introjeção da apreciação dos elementos do desenho (deturpada na prática do desenho pedagógico). Algumas experiências pedagógicas como as de Mário de Andrade, criando ateliês para crianças nos Parques Infantis e na Biblioteca Infantil, quando exerceu a função equivalente à de Secretário de Cultura de Metodologia do Ensino de Arte184 São Paulo em 1936, ou as classes de arte de Anita Malfatti na Escola Americana, hoje Mackenzie ou ainda a criação de Escolas de Arte para crianças bem dotadas em arte pelo Jornal A Tarde em São Paulo foram mudanças bastante significativas, cuja disseminação foi interrompida pelo golpe de Estado que instituiu a ditadura do Estado Novo. Com a Ditadura, vários educadores foram perseguidos e uns poucos ex-reformadores se aliaram ao regime para defender outros interesses, não os da criança. A diferenciação nas interpretações e nos movimentos que trouxeram as ideias de John Dewey para o Brasil não devem ser consideradas problemáticas, mas importantes para revolucionar, naquele tempo, e educação do Brasil. Atualmente, muitos sistemas educacionais ainda se inspiram nas ideias do educador, e muitas de suas contribuições teóricas para o campo da educação ainda permanecem. O pensamento de John Dewey Segundo Babosa e Coutinho (2011), o pensamento de John Dewey em relação à educação, especialmente em sua primeira fase, tratam a arte sob a perspectiva do naturalismo, e foi esse pensamento que mais influenciou a educação no Brasil. Seu divulgador principal foi Nereo Sampaio, professor de desenho da Escola Normal do Rio de Janeiro. Segundo as autoras, Nereo Sampaio defendeu o chamado método espontâneo-reflexivo para o ensino da arte, apontando como pressuposto teórico o pensamento de Dewey, recomendando a estimulação dos impulsos naturais da criança para o desenho através dos processos mentais de reconhecimento e reflexão. Nereo Sampaio declarava que seu método consistia em deixar a criança se expressar Metodologia do Ensino de Arte 185 livremente, desenhando de memória e depois fazer com que ela analisasse visualmente o objeto desenhado para, em seguida, executar um segundo desenho integrando, neste último, elementos observados do objeto real. O autor tentou resumir as ideias de Dewey para embasar seu método. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 16-17). Figura 3: Pensamento Fonte: Pixabay Nessesentido, segundo as mesmas autoras, pode-se dizer que John Dewey foi o pensador que melhor compreendeu e defendeu o valor educacional do ensino de linguagem gráfica para crianças. Para Dewey, as crianças se sentiam muito à vontade para se expressarem por meio do desenho e da cor, atividades que não deveria ser limitada, para que a criança pudesse criar. Nereo Sampaio buscou validar essa metodologia com crianças de escolas primárias no Rio de Janeiro, produzindo resultados convincentes em relação a essa forma metodológica. Por isso, a Reforma Educacional proposta por Fernando de Azevedo, no Distrito Federal (1929), foi principalmente influenciada pelo trabalho e pensamento de Nereo Sampaio, defendendo a prática espontânea do desenho, seguido pela Metodologia do Ensino de Arte186 apreciação naturalista, o que tem sido muito utilizado nas escolas até hoje. Conforme Barbosa e Coutinho (2011), A Reforma Fernando de Azevedo teve larga influência em todo o Brasil através do trabalho divulgador da ABE (Associação Brasileira de Educação) e do livro escrito pelo próprio Fernando de Azevedo, intitulado “A cultura no Brasil”. Outra iniciativa que muito influenciou a arte-educação brasileira foi a Reforma Francisco Campos (1927- 1929), realizada no estado de Minas Gerais. Esta reforma divulgou outra linha de interpretação do pensamento de Dewey sobre ensino da arte, marcando especialmente a ideia de apreciação como processo de integração da experiência. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 17). Além disso, Dewey também contribuiu para a educação em arte com a formulação da concepção de arte como uma forma de experiência consumatória. Esse conceito foi relacionado à noção de experiência final, tanto no Brasil, como nas Progressive Schools dos Estados Unidos, escolas supostamente com inspiração deweyana. Esse pensamento, no Brasil, teve grande repercussão a partir da Reforma Carneiro Leão, ocorrida em Pernambuco, sendo, aos poucos, difundida no restante do Brasil. Afirmam Barbosa e Coutinho (2011) que A ideia mais importante era dar, por exemplo, uma aula sobre peixes explorando o assunto em vários aspectos e terminando pelo convite aos alunos para desenharem peixes e fazerem trabalhos manuais com escamas, ou ainda dar uma aula sobre horticultura e jardinagem e levar as crianças a desenharem um jardim ou uma horta. A prática de colocar arte (desenho, colagem, modelagem, dramatização etc.) no final de uma experiência, ligando-se a ela através do Metodologia do Ensino de Arte 187 conteúdo, tem sido usada ainda hoje na educação infantil e ensino fundamental no Brasil, e está baseada na concepção de que a arte pode ajudar a compreensão dos conceitos porque há elementos afetivos na cognição que são por ela mobilizados. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p.17). Sem dúvidas, John Dewey foi um dos mais influentes pensadores da educação do século XX, e seu pensamento muito contribuiu para o ensino de arte no Brasil. Ainda que utilizado de diferentes formas, seu pensamento educacional defendia uma educação mais autônoma, relacionada à integralidade formativa dos sujeitos. A Arte como atividade extracurricular para crianças e adolescentes A parte final da década de XX, na educação em arte, é marcada pelas incluências de Dewey e, ao mesmo tempo, pelo surgimento das atividades extracurriculares voltadas para o ensino de arte, conforme abordam Barbosa e Coutinho (2011): No final da década de 1920 e início da década de 1930 encontramos as primeiras tentativas de escolas especializadas em arte para crianças e adolescentes, inaugurando o fenômeno da arte como atividade extracurricular. Em São Paulo, foi criada a Escola Brasileira de Arte conhecida através de Theodoro Braga, seu mais proeminente professor. Mas a ideia partiu da professora da rede pública, Sebastiana Teixeira de Carvalho, sendo patrocinada por Isabel Von Ihering, presidente de uma sociedade beneficiente, intitulada “A Tarde da Criança.” (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 20). Metodologia do Ensino de Arte188 Essa escola funcionava de forma anexa ao grupo Escolar João Kopke e lá, crianças e adolescentes de escolas públicas da região estudavam gratuitamente música, desenho e também pintura.Todas as atividades eram vinculadas ao contexto brasileiro, outro elemento importante da Escola Brasileira de Arte. “Theodoro Braga desenvolvia o que se pode chamar de método art nouveau. Braga trouxe para o campo do ensino de artes de sua época preocupações com um ideário estético fundamentado na cultura brasileira.” (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 20). O trabalho de Theófilo Braga foi bastante apreciado por artistas conceituados, como Tarcila do Amaral e Anita Malffati, sendo que esta última também desenvolvia projetos para crianças com o objetivo de ensinar arte, em seu ateliê localizado na Escola Mackenzie. Entre 1936 e 1938, quando o Departamento de Cultura de São Paulo estava sob a direção de Mário de Andrade, foi criado, na Biblioteca Municipal Infantil, o curso de arte para crianças. A contribuição que Mário de Andrade prestou para o ensino de arte foi importantíssima, especialmente para que se começasse a encarar a produção pictórica infantil com critérios advindos da filosofia da arte. De acordo com Barbosa e Coutinho (2011), O estudo comparado do espontaneísmo e da normatividade do desenho infantil e da arte primitiva era o ponto de partida de seu curso de filosofia e de história da arte, na Universidade do Distrito Federal. Por outro lado, o escritor dirigiu uma pesquisa preliminar sobre a influência dos livros e do cinema na expressão gráfica livre de crianças de 4 a 16 anos de classe operária e de classe média, alunos dos Parques Infantis e da Biblioteca Infantil de São Paulo. Seus artigos de jornal muito contribuíram para a valorização da atividade artística da criança como linguagem Metodologia do Ensino de Arte 189 complementar, como arte desinteressada e como exemplo de espontaneísmo expressionista a ser cultivado pelo artista. As atividades das escolas ao ar livre do México parecem ter exercido grande influência em sua interpretação do desenho infantil e sua atuação cultural. Em sua biblioteca, hoje no Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo, podemos encontrar revistas mexicanas da época, como a “30:30” e até o catálogo da exposição das Escuelas al Aire Libre do México que viajou pela Europa. O Estado Novo interrompeu o desenvolvimento da Escola Nova, perseguiu educadores e criou o primeiro entrave ao desenvolvimento da arte/educação. Solidificou alguns procedimentos antilibertários já ensaiados na educação brasileira anteriormente. Foi o início da pedagogização da arte no espaço escolar. Não veremos, a partir daí, por alguns anos, uma reflexão acerca da arte/educação vinculada à especificidade da arte, como fizera Mário de Andrade, e que só o pós-modernismo voltaria a fazer, mas uma utilização de cunho mais instrumental da arte na escola para treinar o olho e a visão ou seu uso para liberação emocional e para o desenvolvimento da originalidade vanguardista e da criatividade, esta considerada como beleza ou novidade. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 21-22). O ensino de arte próximo da forma que hoje conhecemos somente começou a ser institucionalizado a partir da década de 1960 em todas as escolas. É importante que tenhamos esse panorama histórico de seu desenvolvimento, para que possamos compreender que o ensino de arte, assim como das demais disciplinas escolares, não surgiu ao acaso, mas foi o resultado de intensas discussões, lutas e disputas ideológicas em torno dos processos de formação da infância e da adolescência. Metodologia do Ensino de Arte190 Arte como forma de liberação emocional A valorização do ensino da arte para criança, no período do Estado Novo (especialmente, a partir de 1947), deu-se por meio da valorização da arte como forma de libertação emocional. A partir do ano de 1947,apareceram ateliês para crianças em várias cidades do Brasil, em geral orientados por artistas que tinham como objetivo liberar a expressão da criança, fazendo com que ela se manifestasse livremente sem interferência do adulto. Trata-se de uma espécie de neoexpressionismo que dominou o continente europeu e os EUA do pós-guerra, revelando-se com muita pujança no Brasil que acabava de sair do sufoco ditatorial. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 22). Os ateliês por Guido Viaro (Curitiba), por Lula Cardoso Ayres (Recife) e por Suzana Rodrigues (Museu de Arte de São Paulo) foram muito bem sucedidos e significativos durante essa proposta. A escola de Lula Cardoso Ayres, criada em 1947, teve curta existência e sua proposta básica era dar lápis, papel e tinta à criança e deixa-la se expressar livremente. Seguindo o mesmo princípio, Augusto Rodrigues, criou em 1948 a Escolinha de Arte do Brasil, que começou a funcionar no prédio de uma biblioteca infantil no Rio de Janeiro. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 22). Outra iniciativa, de Augusto Rodrigues, Alcides da Rocha Miranda e Clóvis Graciano, também recebeu bastante prestígio e incentivo daqueles que buscavam a redemocratização da educação, como Helena Antipoff e Anísio Teixeira que, naquele momento, estava se refugiando na Amazônia em virtude da perseguição política do Estado Novo. Metodologia do Ensino de Arte 191 Barbosa e Coutinho (2011) apresentam um panorama bastante importante desse período, o qual reproduziremos a seguir, a fim de não deixarmos “escapar” nenhum detalhe importante sobre esse período: Depois que iniciou seus cursos de formação de docentes, a Escolinha de Arte do Brasil teve uma enorme influência multiplicadora. Professores, ex-alunos da Escolinha, criaram Escolinhas de Arte por todo o Brasil, chegando a haver vinte e três Escolinhas somente no Rio Grande do Sul, constituindo-se no Movimento Escolinhas de Arte (MEA). Usando especialmente argumentos psicológicos, o MEA tentou convencer a escola comum da necessidade de deixar a criança se expressar livremente usando lápis, pincel, tinta, argila etc. Naquele momento, dava a impressão de ser um discurso de convencimento no vazio, uma vez que os programas editados pelas Secretarias de Educação e Ministério de Educação deveriam ser seguidos pelas escolas e acabavam tolhendo a autonomia do professor tanto quanto os Parâmetros Curriculares Nacionais em Ação de hoje. Ocorreu, na época, uma enorme preocupação com a renovação destes programas. Lúcio Costa (autor do plano urbanístico de Brasília) foi chamado para elaborar o programa de desenho da escola secundária (1948). Seu programa revelava certa influência da Bauhaus, principalmente na preocupação de articular o desenvolvimento da criação e da técnica e desarticular a identificação de arte e natureza, direcionando a experiência para o artefato. Este programa nunca foi oficializado pelo Ministério de Educação e só pôde exercer influência sobre o ensino da arte a partir de 1958. Naquele ano, uma lei federal permitiu e Metodologia do Ensino de Arte192 regulamentou a criação de classes experimentais. As experiências escolares surgidas nesta época objetivavam, sobretudo, investigar alternativas experimentando variáveis para os currículos e programas determinados como norma geral pelo Ministério de Educação. A presença da arte nos currículos experimentais foi a tônica geral. Houve escolas continuaram a aplicar alguns métodos renovadores de ensino introduzidos na década de 1930, como o método naturalista de observação e o método de arte como expressão de aula, agora sob a designação de arte integrada no currículo, isto é, relacionada com outros projetos que incluíam diversas disciplinas. Algumas experiências foram feitas, aproveitando ideias lançadas por Lúcio Costa em seu programa de desenho para a escola secundária de 1948. Porém, a prática que dominou o ensino da arte nas classes experimentais foi a exploração de uma variedade de técnicas, de pintura, desenho, impressão etc. O essencial é que no fim do ano letivo o aluno tivesse tido contato com uma larga série de materiais e empregado uma sequência de técnicas estabelecidas pelo professor. Para determinar esta sequencialidade, os professores se referiam à necessidade de se respeitar as etapas de evolução gráfica das crianças. Três mulheres fizeram das Escolinhas a grande escola modernista do ensino da arte no Brasil: Margaret Spencer, que criou a primeira Escolinha com o artista plástico Augusto Rodrigues, era uma escultora americana que conhecia as Progressive Schools e o movimento de arte/educação já bastante desenvolvido nos Estados Unidos. A segunda destas mulheres que fizeram a Escolinha foi Lúcia Valentim, que Metodologia do Ensino de Arte 193 assumiu a direção da Escolinha de Arte do Brasil durante uma prolongada viagem de Augusto Rodrigues ao exterior. Influenciada por Guignard de quem foi aluna, imprimiu uma orientação mais sistematizada à Escolinha e se desentendeu com Augusto quando este retornou ao comando. Entrou em cena, então, Noêmia Varela convidada por Augusto para assumir a direção da Escolinha, passou a ser a orientadora teórica e prática com total responsabilidade pela programação, na qual se incluía o já citado Curso Intensivo em Arte Educação que ajudou a formar toda uma geração de arte/educadores no Brasil e muitos na América Latina Hispânica. A visibilidade de Augusto Rodrigues foi muito maior que a destas três mulheres, assim como foi maior do que a de sua própria ex-mulher Suzana Rodrigues, que criou o Clube Infantil de Arte do Museu de Arte de São Paulo no mesmo ano (1948), mas meses antes de Augusto ter criado a Escolinha de Arte do Brasil. Quanto a Margaret Spencer, nada mais se soube dela; ela foi apagada da história da arte/ educação no Brasil. Até aqui, pode-se dizer que o desenvolvimento do ensino de arte nas escolas brasileiras, especialmente no século XX, seguiu tendências plurais, que procuraram valorizar tanto a técnica, quando formar intelectualmente e para o mercado de trabalho. A arte, ao longo do século XX, foi vista como um elemento importante para compor os currículos escolares e, independentemente da forma e do enfoque teórico com o qual era abordada, foi se constituindo de forma cada vez mais presente nos currículos das escolas, tanto para meninos quanto para meninas. As tendências escolares da primeira metade do Metodologia do Ensino de Arte194 século XX no Brasil, no que diz respeito ao ensino da Arte, também procuraram seguir enfoques estrangeiros, como os americanos e europeus. Pouco se criou de forma inovadora em nosso país. Contudo, muito se falou sobre o ensino da arte.Por fim, as últimas tendências do ensino de arte viam em sua prática uma forma de expressar sentimentos e emoções, de pensamento criativo e de formação, seja ela intelectual ou técnica. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 22-24). De modo geral, pode-se dizer que, apesar das críticas que se pode realizar à política de educação do Estado Novo, um movimento bastante significativo por ele realizado por a permissão de que se espalhasse o número de escolas de arte, contribuindo não somente para a constituição do ensino de arte no país, mas para sua implementação. Com o apoio do estado, muitos educadores passaram a pensar esse ensino que, mesmo adquirindo características técnicas, foi importante naquele momento histórico para que hoje chegássemos às reflexões que realizamos sobre o passado. Isso nos permite retomarmos o presente e refletirmos sobre o ensino de arte nas escolas atualmente, em especial, na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental. É necessário que as crianças e adolescentes conheçam técnicas artísticas, mas isso por si só não basta; há que se buscar, em cada planejamento, ampliar os horizontes artísticos dos alunos. Da mesma forma, não se pode repetir os mesmos erros do passado, utilizandoa arte como pretexto para o ensino de outras competências, como a preparação para o trabalho. É necessário, antes de tudo, que o professor, juntamente com seus alunos, estabeleça um ponto de partida para o conhecimento prévio das crianças, e outro ponto de chegada, que pode ser revisado constantemente, na medida em que as crianças vão ampliando seu repertório artístico e cultural. Metodologia do Ensino de Arte 195 A arte não deve ser usada para fins exclusivos e ideológicos, mas para possibilitar que se enxergue o mundo de diferentes maneiras, sob diferentes perspectivas e diferentes pontos de vista. Assim, algumas orientações que fazemos em relação à reflexão sobre o ensino de arte é que se leia os pensadores clássicos abordados nesse capítulo, mas que também se tenha sensibilidade para perceber como ensinar e o que ensinar em sala de aula, que esteja de acordo com as diretrizes educacionais, mas que também possa permitir que os alunos avancem em relação ao conhecimento sobre a arte, sobre si e sobre o mundo. Não podemos nos esquecer de que a arte deve ser encarada como uma livre expressão, como uma forma de mostrar a individualidade e de dialogar com anseios individuais e coletivos e que, por isso, deve ser valorizada como artefato cultural, não como pressuposto para outra coisa, seja ela qual for. RESUMINDO Neste capítulo, você aprendeu que: O Modernismo de 1922 inaugurou um novo tempo no ensino de arte no Brasil. Mesmo não interferindo diretamente e em breve tempo, foi por intermédio dele que se passou a olhar o ensino de arte com outros olhos; A metodologia do ensino de arte seguiu, durante um bom período do século XX, as tendências norte-americanas e europeias; Dentre algumas das concepções mais importantes do ensino de arte nas escolas, destacam-se: a influência modernista, o pensamento modernista, os movimentos do ensino de arte como componente extracurricular e a compreensão da arte como forma de libertação dos sentimentos. Metodologia do Ensino de Arte196 Refletindo sobre o ensino da Arte Ao término deste capítulo você será capaz de ter um panorama sobre o ensino de arte na segunda metade do século XX até os dias atuais, bem como compreender e refletir sobre algumas linhas contemporâneas para o ensino de arte. Como um estudante do curso de Pedagogia, é importante que você os conheça, para que sua análise e trabalho com obras de arte se torne mais abrangente, fundamentada e profissional. E então? Motivado para desenvolver esta competência? Então vamos lá. Avante! OBJETIVO 1964 e a pressão por mudanças Talvez, um dos períodos mais conturbados em termos de liberdade de expressão de nossa história tenha sido o período da Ditadura Militar, iniciada em 1964 e finalizada na década de 1980. Com o regime militar, muitas reformas educacionais foram realizadas, procurando alinhar a educação aos interesses do governo. Conforme Barbosa e Coutinho (2011), A ditadura de 1964 perseguiu professores e escolas experimentais foram aos poucos desmontadas sem muito esforço. Era só normatizar e estereotipar seus currículos tornando-as iguais as outras do sistema escolar. Até escolas de educação infantil foram fechadas. A partir daí, a prática de arte nas escolas públicas primárias foi dominada, em geral, pela sugestão de tema e por desenhos alusivos a comemorações cívicas, religiosas e outras festas. Metodologia do Ensino de Arte 197 No entanto, por volta de 1969, a arte fazia parte do currículo de todas as escolas particulares de prestígio, seguindo a linha metodológica de variação de técnicas. Eram, porém, raras as escolas públicas que desenvolviam um trabalho de arte. Na escola secundária pública comum, continuou imbatível o desenho geométrico com conteúdo quase idêntico proposto pelo Código Epitácio Pessoa em 1901. Nos fins da década de1960 e início de 1970 (especialmente entre 1968 e 1972), em escolas especializadas em ensino de arte, começaram a ganhar lugar algumas experiências no sentido de relacionar os projetos de arte de classes de crianças e adolescentes com o desenvolvimento dos processos mentais envolvidos na criatividade, ou com uma teoria fenomenológica da percepção, ou ainda com o desenvolvimento da capacidade crítica ou da abstração e talvez mesmo com a análise dos elementos do desenho. Um certo contextualismo social começou também a orientar o ensino da arte especializada, podendo-se detectar influências de Paulo Freire na experiência da Escolinha de Arte de São Paulo. Algumas escolas especializadas, como a Escola de Arte Brasil (São Paulo), Escolinha de Arte do Brasil (Rio de Janeiro), e Escolinha de Arte de São Paulo, Centro Educação e Arte (São Paulo), o NAC – Núcleo de Arte e Cultura (Rio de Janeiro) tiveram ação multiplicadora nos fins da década de 1960, influenciando professores que iriam atuar ativamente nas escolas a partir de 1971, quando a Educação Artística se tornou componente obrigatório nos currículos de 1º e 2º graus (atuais ensinos fundamental e médio) e na universidade nos cursos de Educação Artística e Metodologia do Ensino de Arte198 licenciatura em artes plásticas, criados em 1973. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 26-27). Pode até soar de forma estranha que foi justamente durante a ditatura que o ensino de arte, nas escolas públicas, tenha se consolidado. No entanto, essa consolidação se tratou de um processo a que Barbosa e Coutinho (2011) denominam como “mascaramento humanístico para uma lei extremamente tecnicista”, a lei 5692, que buscou promover a profissionalização dos jovens de classe média. Como, no entanto, as escolas públicas careciam de recursos materiais e de laboratórios que as colocassem num patamar semelhante aos das escolas elitistas, os resultados dessa implementação, com foco no acesso ao mercado de trabalho nas indústrias, foram praticamente nulo. Por outro lado, no entanto, as diferencias sociais no país, bem como a pobreza dos mais pobres aumentou consideravelmente, já que as escolas particulares eram as mais preparadas para que os jovens ingressassem no mercado de trabalho e também no ensino superior. Enquanto isso, o ensino médio da rede pública sequer preparava para o acesso à universidade, nem formava técnicos assimiláveis pelo mercado. No que diz respeito ao ensino da arte, cursos universitários de dois anos foram criados para preparar professores aligeirados, que ensinassem todas as artes ao mesmo tempo, tornando a arte na escola uma ineficiência a mais no currículo. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 28). A Reforma Educacional promulgada no ano de 1971 trouxe muitas novidades para o ensino de arte, em especial, a noção de polivalência. Tal reforma pretendia que a arte se dividisse no ensino das seguintes áreas: artes plásticas, música e artes cênicas (teatro e dança), devendo essas ser ensinadas deveriam ser ensinadas todas por um mesmo professor, ocorrendo da primeira à oitava séries do antigo primeiro grau. Metodologia do Ensino de Arte 199 Em 1973, surgiram os cursos de licenciatura em Educação Artística de curta duração (dois anos), para a preparação de professores para o ensino polivalente. Terminado esse curso, era possível que o docente continuasse seus estudos em direção às licenciaturas plenas, com habilitação específica no campo das artes plásticas, do desenho, das artes cênicas ou mesmo da música. Ao mesmo tempo, “Educação Artística” foi a nomenclatura que passou a designar o ensino polivalente de artes plásticas, música e teatro. O Ministério de Educação, no mesmo ano (1971), organizou em convênio com a Escolinha de Arte do Brasil, um curso para preparar o pessoal das Secretarias de Educação a fim de orientar a implantação da nova disciplina. Deste curso fez parte um representante de cada Secretaria Estadual de Educação, o qual ficou encarregado de elaborar o guia curricular de Educação Artística do seu Estado. Contudo, poucos Estados desenvolveram um trabalho de preparaçãode professores para aplicar e estender as normas gerais e as atividades sugeridas nos guias curriculares. Por outro lado, a maioria dos guias apresentava um defeito fundamental: a separação entre objetivos e métodos que dificultava o fluxo de entendimento introjetado na ação. As Secretarias de Estado (educação e/ou cultura) que desenvolveram um trabalho mais efetivo de reorientação e atendimento de professores de educação artística foram as do Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. Não é, portanto, por acaso que tenham sido possíveis, na década de 1970, experiências como a da Escola de Artes Visuais e do Centro Educacional de Niterói, no Rio de Janeiro, e em Minas Gerais a do CEAT (Centro de Metodologia do Ensino de Arte200 Arte da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte) e a Escola Guignard. Em 1977, o MEC, diante do estado de indigência do ensino da arte, criou o Programa de Desenvolvimento Integrado de Arte Educação - PRODIARTE. Dirigido por Lúcia Valen seu objetivo principal era a integração da cultura da comunidade com a escola, promovendo o encontro do artesão com o aluno e estabelecendo convênios com órgãos estaduais e universidades. Nos inícios de 1979, dezessete unidades da Federação tinham iniciado a execução de projetos ligados ao PRODIARTE. Os programas de maior consistência foram os levados a efeito em 1978 nos Estados da Paraíba (convênio com a Universidade Federal da Paraíba e Secretaria de Educação), Rio Grande do Sul (convênio com DAC-SEC), Rio de Janeiro (convênio com Escolinha de Arte do Brasil e SEC-RJ) e Pernambuco (convênio com a Secretaria de Educação). Tais propostas tinham sido explicitadas no Primeiro Encontro de Especialistas de Arte e Educação em Brasília pelo MEC e UnB em 1973, organizado por Terezinha Rosa Cruz. Outros encontros de arte/educação se sucederam, girando sempre em torno dos mesmos assuntos já debatidos naquele ano de 1973, com a vantagem de alargar o número de debatedores. A construção da diversidade sociocultural na sociedade. (BARBOSA; COITUNHO, 2011, p. 28-29). A nomenclatura “Educação Artística” perdurou nas escolas desde a institucionalização da disciplina até o final do século passado, quando - por intermédio do pensamento pós-moderno e das novas técnicas exploradas – assumiu o nome de “Arte” ou “Artes”. Metodologia do Ensino de Arte 201 Contudo, ainda assim, resquícios da “Educação Artística” permanecem no cotidiano escolar, necessitando não apenas de uma nova roupagem, mas de serem repensados, contextualizados e olhados sob diferentes perspectivas. É necessário que se retome as práticas descontextualizadas, assim como o estudo dos cânones artísticos e a decoração de técnicas de forma isolada, para trabalhar-se numa perspectiva intercultural, interdisciplinar e contextualizada. Na atualidade, muitas escolas estão, aos poucos, aderindo a espaços (laboratórios) específicos para o ensino de arte, onde a liberdade criativa pode ser direcionada e trabalhada como uma produção individual e coletiva, num espaço apropriado. Sabemos, no entanto, que nem todas as escolas possuem esse espaço, mas que, independente disso, é importante que se incentive no trabalho com diferentes linguagens artísticas e também de forma contextualizada, para que, futuramente, se consiga despertar o gosto pela arte e a criatividade dos sujeitos, não com o intuito de prepará-los para o trabalho especificamente, mas para o exercício da cidadania. 1980 e depois: As tendências pós- modernistas No ano de 1980, um evento, denominado Semana de Arte e Ensino (1980), ajudou a fortificar politicamente os arte/educadores, “[...] e já em 1982/1983 foi criada na Pós- Graduação em Artes a linha de pesquisa em arte/educação na Universidade de São Paulo constando de doutorado, mestrado e especialização, com a orientação de Ana Mae Barbosa.”. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 30). Aos poucos, cursos de especialização e linhas de pesquisa mais específicas, nos cursos de pós-graduação destinados ao ensino de arte, foram surgindo. Em 1990, surgiu a Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Metodologia do Ensino de Arte202 Federal do Rio Grande do Sul, coordenada por Analice Dutra Pillar. De acordo com Barbosa e Coutinho (2011), Nos últimos anos, outras linhas de pesquisa em ensino de arte foram criadas em cursos de pós- graduação em artes. Entretanto, para atender aos egressos das quase cem licenciaturas em artes o número de vagas nas pós-graduações ainda é insuficiente, criando-se um funil na formação dos arte/educadores, o que é um contra senso, pois o desenvolvimento do ensino da arte no Brasil muito deve à pesquisa gerada nas pós-graduações. Outro fator que interferiu positivamente na qualidade do pensamento sobre o ensino de arte foi a ação política desencadeada por vários congressos e festivais, dentre eles os festivais de Ouro Preto; o Festival de Inverno de Campos de Jordão de 1983, onde primeiro se trabalhou na arte/educação com leitura ou análise de TV; o Congresso sobre história do Ensino da Arte, em que primeiro se introduziu oficinas de arte e novas tecnologias na arte/educação (1984); o Simpósio sobre Ensino da Arte e sua História (MAC/USP, 1989), assim como a atuação de associações regionais e estaduais reunidas na Federação de Arte Educadores do Brasil, a FAEB. Para exemplificar a intensidade da produção em arte/educação no Brasil, oitenta pesquisas foram produzidas para mestrados e doutorados entre 1981 e 1993 e nos últimos anos, este número foi quintuplicado (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 30-31). As pesquisas na área de ensino de arte têm apresentado os temais mais variados “[...] e vão desde a preocupação com o desenho da criança até experiências com as novas tecnologias. Muitas destas pesquisas investigam problemas inter-relacionados com a Proposta Triangular” (BARBOSA; CUNHA, 2011, p. Metodologia do Ensino de Arte 203 31), proposta essa sistematizada a partir das condições estéticas e culturais da pós-modernidade. Um elemento que caracteriza a pós-modernidade em arte/ educação é a entrada da imagem, sua decodificação e possíveis interpretações em sala de aula, junto da expressividade. Querendo ou não, essa mudança caracteriza um grande avanço no ensino de arte, especialmente por contribuir para o desenvolvimento intelectual abstrato e não apenas técnico, como estava ocorrendo com outras concepções de ensino de arte. No Brasil a ideia de antropofagia cultural nos fez analisar vários sistemas e ressistematizar o nosso que é baseado não em disciplinas, mas em ações: fazer – ler - contextualizar. Deste modo, a Proposta Triangular e o DBAE partem de pressupostos conceituais e metodológicos diversos, são no máximo paralelos, pois se constituíram no que se entende por pós-modernismo na arte/ educação. O “critical studies” é uma manifestação pós-moderna inglesa no ensino da arte, como o DBAE é a manifestação americana e a Proposta Triangular a manifestação pós-moderna brasileira, respondendo às nossas necessidades, especialmente a de ler o mundo criticamente. Há correspondências entre elas, sim. Mas, estas correspondências são reflexo dos conceitos pós-modernos de arte e de educação. A Proposta Triangular começou a ser sistematizada em 1983 no Festival de Inverno de Campos de Jordão, em São Paulo e foi intensamente pesquisada entre 1987 e 1993 no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo e na Secretaria Municipal de Educação sob comando de Paulo Freire e Mário Cortela. (BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 31). Metodologia do Ensino de Arte204 No ano de 1997, o Governo Federal cedeu a pressões externas, e estabeleceu os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) para o ensino de Arte e das demais disciplinas. Nesse documento, a Proposta Triangular foi esquecida, sendo deixada de lado, sendo também desconsiderado todo o trabalho curricular desenvolvido por Paulo Freire nos anos de 1989e 1990, quando era Secretário Municipal de Educação em São Paulo, contando com uma grande equipe de consultores e avaliação constante. Outra característica de nossos PCNs é o fato de serem descontextualizados e de desistoricizarem nossa experiência educacional para buscar apresentar novidades, já que foram dirigidos por um educador espanhol, não por brasileiros. Uma crítica que se faz a esses documentos é o fato de apresentarem “receitas” para salvar a educação nacional, o que, na prática, não é possível. Destacam Barbosa e Coutinho (2011) que: A nomenclatura dos componentes da aprendizagem triangular designados como fazer arte (ou produção), leitura da obra de arte e contextualização foi trocada para produção, apreciação e reflexão (da primeira a quarta séries) ou produção, apreciação e contextualização (na quinta a oitava séries). Infelizmente os PCNs ainda não estão surtindo efeito e a prova é que o próprio Ministério de Educação editou uma série designada Parâmetros em Ação, que é uma espécie de cartilha para o uso dos PCNs, determinando a imagem a ser “apreciada” e até o número de minutos para observação da imagem, além do diálogo a ser seguido. A educação bancária de que Paulo Freire falava ronda a arte/educação hoje no Brasil. Mas, apesar de equivocadas políticas educacionais, temos experiências de alta qualidade tanto na escola pública como na escola privada e principalmente nas organizações não- governamentais que se ocupam dos excluídos, Metodologia do Ensino de Arte 205 graças a iniciativas pessoais de diretores e de professores e mesmo de artistas.(BARBOSA; COUTINHO, 2011, p. 31-32). De modo geral, nosso objetivo não é criticar os PCNs, afirmando que os mesmos não se constituam uma documentação importante em nosso cenário educacional, mas refletir sobre o fato de que, da forma como foram construídos, esses documentos desconsideraram toda a realidade nacional. Exemplo disso é a pluralidade artística e cultural das regiões de nosso país, que muitas vezes internamente já apresentam uma riqueza artística que ficou de fora de documentos tão importantes. Os PCNs, juntamente com os atuais Referenciais Curriculares Nacionais, são documentos orientadores para uma prática mais igualitária nas escolas, porém que esbarram em diferentes fatores, como desigualdades regionais, sociais, culturais, econômicas e sociais, dentre outras. Como educadores, é importante estarmos atentos a esse cenário, não com o intuito de abolirmos tais documentos, mas de tensionarmos as proposições neles contidas, a fim de que possamos, futuramente, ter a riqueza cultural e artística representada das mais possíveis e adequadas formas em nossas políticas públicas. Algumas considerações sobre o ensino de arte pós-1964 De modo geral, desde a sua constituição o ensino de Arte passou por muitas mudanças enfáticas e, foi a partir da década de 1960, que se constituiu como obrigatório em todas as escolas, apesar das inúmeras críticas que possamos fazer a respeito de como foi sua implementação e do aumento das desigualdades sociais, mesmo com sua efetivação. Metodologia do Ensino de Arte206 Cabe lembrar que a Arte, assim como as ditas disciplinas humanísticas, tem uma função essencial para o desenvolvimento humano: promover o conhecimento sobre si, sobre o outro e sobre a realidade que nos cerca. Desse modo, não há uma forma ideal de se ensinar arte, nem uma única metodologia que seja o remédio para todos os males da educação; há diversas possibilidades. Desse modo, não há uma forma ideal de se ensinar arte, nem uma única metodologia que seja o remédio para todos os males da educação; há artes produzidas por meio de tecnologias. Um ensino de Arte abrangente busca ampliar o universo artístico do aluno, e isso pode ser feito desde a Educação Infantil até o ensino superior. Focando na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, é importante que se invista na ampliação do universo de conhecimento artístico e também de criação artística da criança e do aluno, uma vez que, nas camadas mais populares, o acesso a diferentes formas de arte nem sempre é comum. Outro ponto a se destacar é que é necessário que o professor, em seus planejamentos, considere a realidade das crianças e dos adolescentes, de modo que suas individualidades, suas culturas e seus modos de ver o mundo sejam respeitados. O docente é o detentor de uma forma de conhecimento; o a criança, de outra. Essas duas formas de conhecimento podem produzir algo novo, inusitado e potente para as atividades de ensino e de aprendizagem para ambos os sujeitos. Por isso, o ensino de Arte na Educação Infantil pressupõe a experiência de trabalhar com os materiais mais diversos possíveis, assim como o estímulo à criatividade a o conhecimento sobre a consistência de diferentes materiais. Já no Ensino Fundamental, a motricidade, a criatividade e a técnica podem ser estimuladas de outras formas, considerando, inicialmente, um movimento de sondagem sobre Metodologia do Ensino de Arte 207 os conhecimentos dos alunos para, posteriormente, investir no diálogo com diferentes formas artísticas. Como já abordamos em outras unidades de ensino, a disciplina e o ensino de arte fazem parte do cotidiano escolar como algo a somar, a ser concebido de forma multidisciplinar e a possibilitar a aprendizagem de temas variados. Além disso, conforme já abordamos em outras unidades, se a cultura é o que nos torna humanos, a arte, por sua vez, nos faz “deixarmos nossa marca” no mundo, tornarmo-nos imortais como espécie e diferentes dos animais. A arte, em linhas gerais, é uma forma de manifestar os anseios e sentimentos humanos, um modo de universalizar determinadas relações e pontos de vista. Por isso, em dado momento histórico, ela foi tratada como possibilidade de libertação de sentimentos. Também, a arte é uma técnica; é a busca da perfeição, da transposição e da transgressão. Isso justifica que no século XX ela tenha influenciado fortemente a criação de ateliês, com o intuito do ensino de técnicas, mas também da espontaneidade criativa. Ao mesmo tempo, a arte é um produto da diversidade porque é plural, porque está em todo lugar e porque assume as mais determinadas formas e se relaciona diretamente com a cultura. É a cultura, por sua vez, que cria condições de possibilidade para que se produza a arte de diferentes maneiras, para que se ouse, para que se busque novas técnicas e mestres. A cultura e a diversidade, em parceria com a arte, nos ensinam que é necessário aguçar a percepção em relação às diferenças e às relações de poder que nos cercam. Deste modo, ao ensinar arte em sala de aula, é importante que o docente proponha atividades que conversem com a cultura da comunidade, considerando que essa cultura é formada pela diversidade, sendo constituída como plural. Metodologia do Ensino de Arte208 Valorizar as potencialidades de cada cultura e de cada forma artística, considerando sua multiplicidade, pode ser um bom passo para resgatar a criatividade e o interesse pela arte. Da mesma forma, quando falamos sobre ensino de arte, estamos defendendo a pluralidade de técnicas, de representações e também de estilos, bem como a possibilidade ampla de criação, numa perspectiva criativa. Somente assim será possível trabalhar a disciplina de modo democrático, inclusivo e preocupado com o presente e o futuro, garantindo que a arte exerça seu principal papel: humanizar. RESUMINDO Neste capítulo, você aprendeu que: A história é sempre contada a partir de um ponto de vista, neste caso, a história do ensino da arte no Brasil foi se constituindo a partir de apropriações de modelos estrangeiros, deglutidos e antropofagicamente transformados por nossas necessidades. Desde a instauração da Academia Imperial de Belas Artes, primeira instituição pública e formal de formação para as Artes Plásticas no Brasil, até a formalização da Arte como área deconhecimento nos Parâmetros Curriculares Nacionais, passando pelas diferentes iniciativas do final do século XIX e por todo o século XX, os modelos de ensino da arte foram se tecendo e se sobrepondo, correspondendo as demandas políticas e culturais de cada época. Cada um desses modelos, para bem ou para o mal, se sustentam em concepções de arte e de educação, explícitas ou implícitas. Cabe a nós, educadores de hoje, analisarmos e avaliarmos a pertinência dessas concepções, procurando entender os contextos que as constituem. Metodologia do Ensino de Arte 209 REFERÊNCIAS UNIDADE 01 ANJOS, Augusto dos. Versos Íntimos. In: MORICONI, Ítalo. (Org.). Os cem melhores poemas brasileiros do século. 1 ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p. 61. BEHR, Nicolas. 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Kitsch Os lugares do emissor e do receptor na criação artística Compreendendo a linguagem artística A linguagem da arte O arranjo pode mudar a realidade O artista serve de antena A supra-realidade criada pela obra de arte A elaboração especial dos significados Elementos da obra de arte Denotação Conotação Obras artísticas e obras não-artísticas Explorando as modalidades artísticas Artes visuais Elementos das artes visuais Literatura Elementos da Literatura Música Elementos da música Teatro Elementos do teatro Dança Elementos da dança Cinema Elementos do cinema Como ler uma obra de arte Leitura formal Leitura interpretativa Contextualização histórica02 Relacionando a arte com as demais linguagens Linguagens que se misturam A proposição das linguagens A rua como espaço de arte Panorama das 11 artes Música Dança Pintura Escultura Teatro Literatura Cinema Fotografia História em quadrinhos Jogos eletrônicos Arte digital Refletindo sobre o ensino de arte na escola A escola é o espaço da arte! A evolução conceitual da disciplina Alguns mitos pedagógicos sobre o ensino de Arte Reprodução e releitura Só se produz trabalhos artísticos com material A arte estimula a criatividade As grandes linguagens artísticas são apenas quatro: dança, artes visuais, teatro e música Linha do tempo sobre o ensino de Arte nas escolas brasileiras Metodologias mais comuns no ensino de Arte Metodologia tradicional Livre expressão Metodologia sociointeracionista Relacionando linguagem artística e poesia Intertextualidade e metalinguagem Poesia e poema Língua e arte literária Elementos da obra literária Estilo Versificação Ritmo Simetria e assimetria Encadeamento Rima Versos regulares Versos brancos Versos livres Versos polimétricos Estrofe Compreendendo teoricamente as noções de poesia e teatro O gênero lírico O gênero dramático 03 Trabalhando a Arte com inclusão A arte, a inclusão e o papel do docente Arte e Inclusão Fases do desenvolvimento da criança – desenho A Arte e a deficiência visual A Arte e a deficiência física A Arte e a deficiência auditiva Refletindo sobre a metodologia do ensino da Arte A organização dos conteúdos no ensino de Arte A avaliação em Arte Artes visuais Música Teatro Dança Formas de avaliação Autoavaliação Refletindo sobre a docência em Arte Sociedade do futuro ou do presente? O fazer arte como um exercício de experimentação O professor e o ensino de Arte Dificuldades enfrentadas pelo professor de Arte Compreendendo a Arte como um produto da cultura e da diversidade O que é diversidade? A construção da diversidade sociocultural na sociedade O que é cultura? Regras culturais A Arte como um produto da diversidade e da cultura 04 Refletindo sobre a Arte na Educação Infantil O papel da Arte na Educação Infantil Concepções de Arte e práticas pedagógicas Necessidade de mudanças na abordagem O trabalho com as crianças Explorando o panorama sobre o ensino da Arte no Brasil – Parte I Breve introdução A vinda da Missão Francesa O ensino de Arte numa perspectiva liberal Explorando o panorama sobre o ensino da Arte no Brasil – Parte II O Modernismo O pensamento de John Dewey A Arte como atividade extracurricular para crianças e adolescentes Arte como forma de liberação emocional Refletindo sobre o ensino da Arte 1964 e a pressão por mudanças 1980 e depois: As tendências pós-modernistas Algumas considerações sobre o ensino de arte pós-1964