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História do Brasil Colonial: Consolidação e Tensões Sociais Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof. Andre Valva Revisão Textual: Profa. Ms. Selma Aparecida Cesarin Alguns Aspectos sobre os Clássicos – Sérgio Buarque de Holanda 5 • Sérgio Buarque de Holanda • Obras, Estilos E Métodos · Apresentaremos um dos principais historiadores brasileiros e suas pesquisas, que contribuíram, significativamente, para uma melhor compreensão do Brasil e de seu povo. · A Unidade trará o ponto de vista de Sérgio Buarque de Holanda sobre o Brasil; fazendo-nos refletir sobre nós mesmos e compreender como chegamos até aqui. Para um bom aproveitamento do curso, leia o material teórico atentamente antes de realizar as atividades. É importante também respeitar os prazos estabelecidos no cronograma. Alguns Aspectos sobre os Clássicos – Sérgio Buarque de Holanda 6 Unidade: Alguns Aspectos sobre os Clássicos – Sérgio Buarque de Holanda Contextualização Um pequeno trecho do livro Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda: “A tentativa de implantação da cultura europeia em extenso território, dotado de condições naturais, se não adversas, largamente estranhas à sua tradição milenar é, nas origens da sociedade brasileira, o fato dominante e mais rico em consequências. Trazendo de países distantes nossas formas de convívio, nossas instituições, nossas ideias, e timbrando em manter tudo isso em ambiente muitas vezes desfavorável e hostil, ‘somos ainda hoje uns desterrados em nossa terra’. Podemos construir obras excelentes, enriquecer nossa humanidade de aspectos novos e imprevistos, elevar à perfeição o tipo de civilização que representamos: o certo é que todo o fruto de nosso trabalho ou de nossa preguiça parece participar de um sistema de evolução próprio de outro clima e de outra paisagem” (HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. 26.ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995, p.31). O trecho nos faz pensar sobre o nosso passado para que possamos entender o nosso presente de forma mais lúcida e salutar. Assim, é importante conhecermos as pessoas que construíram estes estudos e pesquisas que nos norteiam para a erudição A Unidade apresentará um dos principais autores clássicos da História do Brasil: Sérgio Buarque de Holanda. Também serão apresentados seus legados e contribuições para a historiografia nacional. Vamos conhecê-lo? 7 Sérgio Buarque de Holanda Wikimedia Commons Figura 1. Sérgio Buarque de Holanda, historiador brasileiro. Sérgio Buarque de Holanda nasceu em São Paulo, em 11 de julho de 1902; teve uma vida urbana, na infância e na adolescência. Contudo, não sofreu as desvantagens do afastamento rural. Recebeu formação acadêmica formal e regular, sempre estudando em boas escolas e, desde pequeno, notabilizou-se por possuir dotes artísticos aflorados: escrevia prosa e verso, poesias, tocava piano, compunha valsas e também gostava de dançar (REIS, 2000, p.118). Formou-se em Direito, embora não tenha exercido a profissão. Iniciou sua vida profissional sendo crítico literário e jornalista. Nestes serviços, teve a oportunidade de viajar várias vezes, principalmente para a Europa. Nessas viagens, ficou um ano na Alemanha e outros anos na Itália. Aprendeu a falar vários idiomas (REIS, 2000, p.116). Sérgio também lecionou em importantes instituições de ensino no Brasil, como na Escola de Sociologia e Política e na Universidade de São Paulo, entre as décadas de 40 e 60. Também teve a oportunidade de lecionar e palestrar nas principais universidades dos Estados Unidos, Itália, Chile, entre outros (NOGUEIRA, 1988, p.21). Recebeu inúmeros prêmios e conheceu a notoriedade de seus trabalhos ainda em vida. Suas pesquisas e seu intelecto eram conhecidos em todo o mundo e, de acordo com relatos de amigos, jamais se deixou levar pela fama (NOGUEIRA, 1988, p.20). Foi um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores (PT), em 1980, juntamente com outros dois amigos, Mário Pedrosa e Antônio Cândido (NOGUEIRA, 1988, p.25). O historiador morreu em 24 de abril de 1982, também em São Paulo. Sérgio Buarque, conforme mencionado, teve sempre uma boa educação. Na infância, estudou na Escola Modelo Caetano de Campos. Nesta época, também iniciou seus estudos de piano, compondo, aos nove anos, uma valsa: Vitória Régia, sendo publicada pela revista Tico Tico, em 1913 (NOGUEIRA, 1988, p.19). No Colégio São Bento, Sérgio cursou o ginasial, onde também comungava. Foi neste período que ele se matriculou no curso de dança de Yvonne Daumérie. Segundo Nogueira, Sérgio foi um frequentador assíduo dos clubes Paulistano e Trianon e participava ativamente de maratonas dançantes em dois clubes campineiros (NOGUEIRA, 1988, p. 19). Desde muito jovem, Sérgio Buarque demonstrou uma veia artística saliente, fazendo-se notar pelos professores dos colégios ou de cursos extracurriculares, como o de música. 8 Unidade: Alguns Aspectos sobre os Clássicos – Sérgio Buarque de Holanda Escrevia versos e poemas rotineiramente. Certa vez, Afonso de Taunay, professor de Sérgio Buarque no Colégio São Bento, recolheu algumas das anotações de Sérgio e as entregou para serem publicadas no Correio Paulistano. A matéria acabou recebendo o título de “originalidade literária” (NOGUEIRA, 1988, p. 20). Nogueira comenta: O ano de 1921 foi particularmente significativo, pois marcava não só a mudança da família para o Rio de Janeiro como o ingresso do Dr. Sérgio na Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro, mais tarde Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil, onde se formou em 1925. Era tido como aluno não assíduo e não interessado (NOGUEIRA, 1988, p.20). Após a formatura, por intermédio de amigos, passou a escrever para jornais e trabalhar na redação de revistas, como, por exemplo, a Revista do Brasil e Rio-Jornal. Segundo relatos da época, coletados pela professora Nogueira, Sérgio Buarque passava as manhãs em livrarias, lendo pencas de livros de diversos idiomas diferentes. Outras vezes participou de longas palestras no Bar Nacional e no Brahma ao lado de Manuel Bandeira, Di Cavalcante, Aparício Torelli, Gastão Crulls, Gilberto Amado, Graça Aranha e outros. As discussões giravam em torno de política, arte e literatura (NOGUEIRA, 1988, p. 20). De acordo com Nogueira, a vida intelectual de Sérgio Buarque de Holanda se inicia quando ele é convidado para ser o representante da revista Klaxon, no Rio de Janeiro. Ele seria o chefe de personalidades como Oswald de Andrade e Mário de Andrade. A revista não vingou, tendo funcionado durante nove meses, entre 1922 e 1923 (NOGUEIRA, 1988, p.20). Figura 2. Revista Estética de criação de Sérgio Buarque e Prudente de Moraes Neto. Revista "Estética", Livraria Odeon; 1ª Ed.; Rio de Janeiro: 1924 Sérgio Buarque esteve sempre rodeado de amigos, o que lhe ajudou a conseguir trabalhos em alguns momentos da vida. Prudente de Moraes Neto, ao lado de Sérgio, foi um dos fundadores da revista Estética, em 1924: Explicava que Estética foi, na verdade, uma tentativa de reunião dos modernistas em torno de um periódico visto que, desde o desaparecimento de Klaxon, não havia mais nenhuma revista especializada no setor. Para o Dr. Sérgio, aquele ano foi repleto de planos, entusiasmo, tenacidade, mas, também, de desistência (NOGUEIRA, 1988, p.20). A revista, assim como o periódico Klaxon, não teve vida útil muito longa, sendo brevemente encerrada. Assim, atendendo a um convite, foi escrever para o jornal Capixaba O Progresso. Lá ficou apenas alguns meses, mas seu estilo literário e suas brincadeiras renderam-lhe mais amigos e um apelido: Dr. Progresso (NOGUEIRA, 1988, p.21). 9 Logo que retornou ao Rio de Janeiro, passou a escrever para a United Press e para o Jornal do Brasil. Assis Chateaubriand convidou Sérgio Buarque de Holanda, em 1929, para uma viagem, visitando Alemanha, Rússia e Polônia, sendo aceito de imediato. Os jornais da época mencionavam a viagemde Sérgio Buarque com seu vasto conhecimento, não só sobre a política dos locais escolhidos, mas pela capacitação de compreensão que Sérgio possuía sobre os movimentos revolucionários acontecidos anos antes (NOGUEIRA, 1988, p. 21). germanhistorydocs.ghi-dc.org Figura 3. Friedrich Meinecke, historiador e professor universitário alemão. Desembarcou na Alemanha, estabelecendo residência em Berlim. Visitou a Polônia, onde teve a oportunidade de assistir às aulas de História e Ciências Sociais com professores famosos, como, por exemplo, Friedrich Meinecke (1862-1954). Não chegou a ir à Rússia, sendo o motivo ainda desconhecido. Na Europa, trabalhou como correspondente internacional para o Diário de São Paulo, O Jornal e a Agência Internacional de Notícias. Entre as várias habilidades que possuía, na Europa também trabalhou como tradutor de filmes para o português (1988, p. 21). De acordo com Nogueira, em 1931, publicou seu primeiro conto A viagem à Nápoles, publicado pela Revista Nova. Neste período, da década de trinta, Sérgio Buarque vai se aproximando, cada vez mais, da História, pois a considerava “o elo primordial das ciências humanas”1 . Sua estada na Alemanha propiciou-lhe testemunhar a eclosão do nazismo. A situação internacional aliada à diminuição das possibilidades de encontrar ocupação – já que houve uma sensível redução na tradução de filmes e a suspensão da revista Duco – levaram-no a optar pela volta ao Brasil, no final de 1930. Isto o impediu de conhecer a quem chamava de seu filho alemão (NOGUEIRA, 1988, p.21) Também na década de 30 elaborou Raízes do Brasil, sendo parcialmente escrito ainda durante sua estadia na Europa. O livro foi primeiramente publicado em 1936, também o ano de seu casamento com Maria Amélia Alvim. Com Maria Amélia, Sérgio Buarque teve sete filhos. O ano de 1936 trouxe algumas notícias muito boas para Sérgio, além da publicação de seu livro e de seu casamento: ele também foi contratado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro para o cargo de Professor Assistente da Cadeira de História Moderna e Contemporânea (NOGUEIRA, 1988, p. 22). A década de trinta foi dedicada, quase que exclusivamente, à docência, retornando somente em 1940 a trabalhar como crítico literário no Diário de Notícias, no Rio de Janeiro. 1 DIAS, Maria Odila Leite da Silva. Palestra proferida na noite de lançamento do livro: Tentativas de Mitologia. São Paulo, 6 dez. 1979. (mimeog.). In: NOGUEIRA, A. R.; PACHECO, F. M.; PILNIK, M.; HORCH E. (orgs). Sérgio Buarque de Holanda: vida e obra. São Paulo: Secretaria de Estado da Cultura: Arquivo do Estado: Universidade de São Paulo: Instituto de Estudos Brasileiros, 1988, p. 19. 10 Unidade: Alguns Aspectos sobre os Clássicos – Sérgio Buarque de Holanda Em 1941, esteve nos Estados Unidos a convite da Divisão de Relações Culturais do Departamento de Estado norte americano. Proferiu palestras, participou de congressos, mesas redondas e cursos em diferentes universidades. Esteve em New York, Washington, Chicago e Wyoming. (NOGUEIRA, 1988, p.22). Pode-se dizer que outro ano marcante na vida do historiador Sérgio Buarque foi 1945. Ele foi um dos fundadores da Esquerda Democrática, participando do Congresso de Escritores, realizado em São Paulo. Além disso, também foi um dos idealizadores da Declaração de Princípios, manifestação contra a ditadura, lida nas escadarias do Teatro Municipal de São Paulo (NOGUEIRA, 1988, p. 22). Outra grande homenagem que recebeu ainda vivo foi sua nomeação para Diretor do Museu Paulista, em 1946, substituindo Afonso de Taunay. Sérgio Buarque ficou no cargo até 1956. A Esquerda Democrática transformou-se no Partido Socialista e convidou Sérgio Buarque para sair como candidato a vereador. Em 1947, passou a lecionar na Escola de Sociologia e Política, onde permaneceu até 1955 (NOGUEIRA, 1988, p.23). Ao final da década de 1940, Sérgio Buarque voltou a trabalhar como crítico literário para o Diário de Notícias. Além de seu retorno às criticas, ele também retornou algumas vezes à Europa para proferir palestras e seminários sobre civilizações e culturas, entre outros temas. De acordo com Nogueira, em 1950, ele integrou a delegação brasileira ao I Colloquium de Estudos Luso-Brasileiros, reunidos em Washington para comemorar o centésimo quinquagésimo aniversário da Biblioteca do Congresso (NOGUEIRA, 1988, p.23). Em seu retorno, foi eleito presidente da secção paulista da Associação Brasileira de Escritores. Figura 4. Sérgio Buarque em sua estadia na Itália. blogue.sitiodolivro.pt No ano de seu quinquagésimo aniversário, seguiu para a Itália com a família. O intuito era lecionar Estudos Brasileiros na Universidade de Roma. Conforme Nogueira comenta, “sua atividade na Europa foi pontilhada por atividades diversas”. Talvez, a mais importante tenha sido representar a Embaixada Brasileira no Conselho de Administração da Fundação Amerigo Rotellini. 11 De volta a São Paulo, como dizíamos, após dois anos de Europa, retomou suas atividades junto à Escola de Sociologia e Política e ao Museu Paulista. Em 1955, foi eleito para a vice-presidência do Museu de Arte Moderna, posto no qual permaneceu durante seis anos. Nesse tempo, teve a oportunidade de participar da organização de várias bienais (NOGUEIRA, 1988, p.24). Sérgio publicou, em 1957, Caminhos e Fronteiras, ensaio que lhe rendeu o prêmio Edgard Cavalheiro, instituído pelo Instituto Nacional do Livro (NOGUEIRA, 1988, p.24). Em 1961, o historiador recebeu outra grande honra, ocupando a cadeira de número 36 da Academia Paulista de Letras. No ano seguinte, Sérgio Buarque foi nomeado primeiro Diretor do Instituto de Estudos Brasileiros da USP. Ele não ficou muito tempo no cargo, indo para o Chile em 1963, para lecionar na Universidad del Chile. A década de 1960 foi repleta de prêmios para o historiador; contudo, foi um ano de grandes viagens; vez que foi convidado para lecionar como professor-convidado, em diversos países das Américas e da Europa. Recebeu o prêmio Governador do Estado, em 1976, por seu legado literário. Em 1978, sob liderança de Oscar Niemeyer, Sérgio Buarque de Holanda participou da criação do Centro Brasil Democrático Um ano mais tarde, Sérgio Buarque publicou sua última obra, Tentativas de Mitologia, pela qual recebeu o prêmio Juca Pato da União Brasileira de Escritores e da Folha da Manhã (NOGUEIRA, 1988, p.25). Segundo Nogueira, “ainda em 1979, recebeu o prêmio Jaboti, conferido pela Câmara Brasileira do Livro, pelo destaque de sua produção no campo da literatura”. (NOGUEIRA, 1988, p.25). Em 1980, Sérgio Buarque foi um dos membros fundadores do Partido dos Trabalhadores. Maria Eugenia de Menezes Partido dos Trabalhadores Figura 5. Historiador Sérgio Buarque de Holanda, no final dos anos 60. Figura 6. Sérgio Buarque de Holanda à esquerda e o futuro presidente do Brasil, Lula, à direita Sérgio Buarque de Holanda morre em 24 de abril de 1982, na cidade de São Paulo. Ele não foi “apenas um historiador – e que HISTORIADOR – mas um amigo de todas as horas e uma figura humana, sem dúvida, ímpar, sobretudo nos dias de hoje” (NOGUEIRA, 1988, p.25). 12 Unidade: Alguns Aspectos sobre os Clássicos – Sérgio Buarque de Holanda Obras, Estilos e Métodos Sérgio Buarque de Holanda produziu muito ao longo de sua vida. Algumas de suas obras se tornaram ícones para a historiografia brasileira. Um exemplo desta importância é Raízes do Brasil, de 1936. Boa parte do livro foi escrito na Alemanha e finalizada em solo brasileiro. Figura 7. Raízes do Brasil, publicado primeiramente em 1936. "Raízes do Brasil", Companhia das Letras; 3ª Ed., 1997 Segundo Reis: Ainda na Alemanha, pensou em escrever um livro sobre o Brasil e escreveu mesmo um volumoso texto, ao qual deu o título de Teoria da América, mas não publicou tal como escreveu. Esse texto volumoso deu origem a um dos textos mais curtos, sintéticos, da historiografia brasileira: Raízes do Brasil; ensaio de psicologiasocial. Raízes do Brasil foi publicado em 1936, um bom tempo depois de seu retorno da Alemanha (REIS, 2000, p.116). Raízes do Brasil é um resumo interpretativo do caminho brasileiro e que se propõe a discutir o presente e o futuro do país, sem se esquecer do passado. Sérgio Buarque identifica permanências arcaicas em nosso presente; do mesmo modo, ele se propõe a identificar as barreiras que nos impedem de desenvolver elementos políticos, econômicos e sociais. Para Sérgio Buarque, essas barreiras estão associadas às permanências arcaicas já identificadas, devendo ser alteradas para podermos superar estes obstáculos para o progresso. Reis comenta que na obra de Sérgio Buarque ele afirma que “o Brasil é mais português do que gostaríamos que fosse. Somos, sobretudo, neoportugueses e devemos nos tornar pós- portugueses, isto é, brasileiros” (REIS, 2000, p.122). Sérgio Buarque de Holanda retoma este passado no livro para mostrar às pessoas do presente como não deverão construir a sua sociedade (REIS, 2000, p.127). Segundo Reis: Raízes do Brasil é otimista, renova a esperança no Brasil. A libertação da dominação tradicional, a reaproximação do Estado da sociedade, a criação de novas formas de convívio, com novos valores, que é possível, realizável e não uma utopia inalcançável, abrem o horizonte do Brasil à democracia (REIS, 2000, p.141). De acordo com a professora Maria Odila, o método utilizado por Sérgio Buarque era a construção de eixos de interpretação amplos sobre conglomerados de sentido do passado (NOGUEIRA, 1988, p.73). Sérgio Buarque utiliza esse método como estilo literário. Ele elabora um processo próprio de interpretação histórica, buscando o concreto como alicerce de suas interpretações. 13 Segundo Maria Odila, Sérgio Buarque “identificou-se com a tendência modernista do pensamento europeu de reinterpretação da cultura e da história humana de uma perspectiva relativista e libertária” (NOGUEIRA, 1988, p.74). Como enfoque de seus trabalhos, Sérgio Buarque buscava as palavras que melhor traduzissem os pensamentos humanos de acordo com a época em que eram elaborados: A perspectiva do historiador situado no tempo obriga-o a captar a alteridade do pensamento dos homens do passado e a procurar palavras adequadas a transmitir matizes da mudança do linguajar através do tempo. (NOGUEIRA, 1988, p.74) Figura 8. Monções, livro publicado em 1945. "Monções", Companhia das Letras; 2014 A imaginação do real era algo fundamental para o historiador, segundo o próprio Sérgio Buarque, pois “esta postura não o impedia de reconhecer como necessárias as qualidades literárias para o bom historiador” (1988, p.74). Outra perspectiva literária sobre a Escrita Histórica era a capacidade que o pesquisador deveria possuir de recriar o movimento observado, a capacidade de reconstruir a realidade tal como era. Por isso Sérgio Buarque de Holanda se esforçou, arduamente, na busca de um estilo que abrangesse estas necessidades. A professora Maria Odila comenta que “tudo no ofício do historiador dependia de certa capacidade de empatia ou da sensibilidade do historiador em discernir as forças atenuantes ou princípios de aglutinação de uma época passada (NOGUEIRA, 1988, p.75). Suas obras são construídas ao redor do conceito “de tempo, continuidade e mudança no processo de vir a ser” (NOGUEIRA, 1988, p. 75) A preocupação do historiador era exprimir o evento observado em todos os seus aspectos possíveis de interpretação e de forma mais justa. Em Monções, publicado em 1945, Sérgio Buarque de Holanda “indicava a interpenetração e interação ativa das forças da natureza e da cultura” (1988, p.75). O livro retrata as incursões portuguesas pelo território americano através dos rios. Sérgio Buarque procurava adaptar métodos das Ciências Sociais, Antropologia e até da Filosofia para construir suas ideias e suas interpretações históricas. Maria Odila argumenta que “o trabalho do historiador exigia métodos fluidos para temas movediços e, sobretudo a arte de jogar com penumbras de sentido e de equivalência entre as palavras apreendidas no tempo” (NOGUEIRA, 1988, p.75). Para não afundar em terreno movediço, Sérgio Buarque busca “paciente e descritivamente” os detalhes em seu método de significação no tempo (1988, p.75). 14 Unidade: Alguns Aspectos sobre os Clássicos – Sérgio Buarque de Holanda Imagem 9. Visão do Paraíso, publicado em 1959. “Visão do Paraíso”, Editora Brasiliense; 2002 Em Visão do Paraíso (1959), de acordo com a descrição da Companhia das Letras, Sérgio Buarque de Holanda “inaugura o ensaísmo sobre o imaginário do colonizador. O livro “(...) antecipou a historiografia das mentalidades ao estudar os mitos edêmicos que acompanharam as narrativas dos descobrimentos e da colonização da América.”2 Sérgio Buarque tem a preocupação de construir uma “linguagem adaptada à reconstrução de mentalidades. Procurava acertar cada palavra, adequá-la à época, à consciência de testemunhos do passado” (NOGUEIRA, 1988, p.76). Outro destaque da professora Maria Odila é a relação que Sérgio Buarque faz aos ritmos de tempo estabelecidos por Fernand Braudel: a relação do homem com seu meio físico (longa duração); o tempo das estruturas sociais (duração intermediária); e a história dos eventos, dos políticos e dos indivíduos (curta duração). Sérgio Buarque ainda escreveu outros livros de importância para a historiografia brasileira, Caminhos e Fronteiras, publicado em 1957, e Do império à República, de 1972. 2 Texto retirado de http://www.companhiadasletras.com.br/detalhe.php?codigo=12895,no qual consta uma breve descrição dos tópicos abordados no livro. Site visitado em 15 de fevereiro de 2015, às 2h54m. http://www.companhiadasletras.com.br/detalhe.php?codigo=12895 15 Material Complementar Vídeos: • Raízes do Brasil – Sérgio Buarque de Holanda – parte I. https://www.youtube.com/ watch?v=2LjYRwJJqAg; • Raízes do Brasil – Sérgio Buarque de Holanda – parte II. https://www.youtube.com/ watch?v=5E8qD9mAxOE. Produzido pela Regina Filmes / Vídeo Filmes / Riofilme, o vídeo conta a vida e as obras do historiador brasileiro; • Brasil das Letras – Raízes do Brasil – Sérgio Buarque de Holanda. https://www. youtube.com/watch?v=IDI8ngIdyAM. O Vídeo conta como Sérgio Buarque de Holanda construiu os argumentos para o livro, abordando a questão do Homem Cordial e a ligação intrínseca, segundo o autor, com Portugal. Livros: • BLOCH, Marc. Apologia da história: ou o ofício de historiador. Rio de Janeiro: Zahar, 2001. O livro foi publicado em 1949, por Lucien Febvre, uma vez que seu autor, Marc Block, havia sido fuzilado pelos nazistas. No livro, Bloch procura orientar os interessados nos estudos históricos, definindo práticas, objetivos e transformando estes estudos em um ofício; • CALDEIRA, Jorge (org). Brasil: a história contada por quem viu. São Paulo: Mameluco, 2008. O autor reúne diversos textos (oficiais, oficiosos e populares) que narram eventos e fatos importantes da história brasileira. O curioso do livro, e talvez seu principal diferencial, é que estes textos são escritos por pessoas que vivenciaram o fato ou o evento narrado. O autor contextualiza os eventos, os textos intermediando as narrações para o leitor. Filme: • A missão. Produzido em 1986 e distribuído por Warner Bros. Direção de Roland Joffé, estrelado por Robert De Niro, Jeremy Irons e Liam Neeson. O filme retrata a vida de um mercador de escravos e sua relação com as missões e os Jesuítas na fronteira da América Espanhola com a América Portuguesa. Podemos perceber no filme, as permanências citadas por Sérgio Buarque, que ainda vivem em nossas mentalidades. https://www.youtube.com/watch?v=2LjYRwJJqAg https://www.youtube.com/watch?v=2LjYRwJJqAg https://www.youtube.com/watch?v=5E8qD9mAxOE https://www.youtube.com/watch?v=5E8qD9mAxOE https://www.youtube.com/watch?v=IDI8ngIdyAM https://www.youtube.com/watch?v=IDI8ngIdyAM 16 Unidade: Alguns Aspectos sobre os Clássicos– Sérgio Buarque de Holanda Referências FREYRE, Gilberto. Casa Grande & Senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. 50.ed. São Paulo: Global, 2005. IGLÉSIAS, Francisco (org.). Caio Prado Júnior: História. São Paulo: Ática, 1982. NOGUEIRA, A. R.; PACHECO, F. M.; PILNIK, M.; HORCH E. (orgs.). Sérgio Buarque de Holanda: vida e obra. São Paulo: Secretaria de Estado da Cultura: Arquivo do Estado: Universidade de São Paulo: Instituto de Estudos Brasileiros, 1988. REIS, José Carlos. As identidades do Brasil: de Varnhagen à FHC. 3.ed. Rio de Janeiro: FGV, 2000. 17 Anotações
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