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MICROBIOLOGIA DA CÁRIE Conceito da cárie dentária: Doença infecciosa mista ou polimicrobiana (mais de um microrganismo associado ao processo), endógena (as bactérias que estão nessa doença também estão presentes na cavidade oral do hospedeiro no estado de saúde), multifatorial, caracterizada pela desmineralização dos dentes através da ação de ácidos oriundos da fermentação de carboidratos por bactérias específicas. Ps: nem toda bactéria que está presente no biofilme está associada à doença cárie, existem bactérias com características específicas que fazem o processo acontecer (com capacidade de fermentar carboidratos). Etiologia multifatorial da cárie: ❖ Fatores primários: ➢ Hospedeiro (dente) ➢ Microbiota cariogênica ➢ Dieta rica em carboidratos fermentáveis ➢ Fator tempo ❖ Fatores secundários ou moduladores: ➢ Idade de irrupção do dente (quando o dente irrompe na boca, ele está mais suscetível à cárie do que dentes que já possuem a maturação completa) ➢ Nutrição - modulador do fator primário, o dente. Nutrição é diferente de dieta. Nutrição é o que é absorvido e serve para o desenvolvimento. Os dentes começam a ser formados na sexta semana da vida intrauterina, portanto, a desnutrição da mãe no período da gravidez pode fazer com que a criança seja mais suscetível à cárie. Além disso, a desnutrição de crianças também as podem tornar mais suscetíveis à cárie. As deficiências nutricionais no período de formação dos dentes são causas de defeitos na sua estrutura, podendo alterar a sua forma e atuar na quantidade e qualidade da saliva, influenciando no processo de formação da cárie dentária. ➢ Flúor: bacteriostático e bactericida por consequência. Interfere no fator dente, pois se o flúor estiver de maneira frequente na boca, ocorrerá a formação do fluoreto de cálcio, importante no processo DesRe. O flúor forma a fluorapatita, aumentando a resistência do dente e fazendo com que a desmineralização seja dificultada, tornando o pH 4,5 (sem flúor: 5,5) o pH crítico, ou seja, o pH crítico do dente é tão baixo que nem os microrganismos sobrevivem. O flúor é o elemento mais eletronegativo da natureza e ele pode se ligar ao magnésio no meio bucal formando fluoreto de magnésio (importante para o funcionamento da enzima enolase - importante durante a via glicolítica do metabolismo bacteriano onde ocorre a transformação do ácido 2-fosfoglicérico em ácido 2-fosfoenolpirúvico [PEP], que se transforma em ácido pirúvico e em seguida em ácido lático - levando a desmineralização do esmalte) - PEP utilizado no transporte rápido de açúcar, que as bactérias cariogênicas possuem, as que vivem em meio com carboidratos, diferente das bactérias que não possuem esse mecanismo. ➢ Consistência - modulador da dieta: alimentos com consistência pegajosa ficam retidos mais tempo no ambiente bucal, fazendo com que haja maior probabilidade de disponibilidade do carboidrato para a metabolização dos microrganismos e portanto maior formação de cárie, diferente de quando se tem alimentos mais duros e mais fibrosos. ❖ HOSPEDEIRO (DENTE-ESMALTE) A cárie de raiz é o mesmo processo da cárie que se inicia no esmalte, entretanto, para ocorrer a de esmalte o pH tem que ser mais crítico que para a cárie de raiz. Isso se deve ao fato do esmalte ser mais mineralizado que o cemento que está na raiz. O pH crítico da raiz é de 6,2. O esmalte quando maduro não é chamado mais de tecido, pois um tecido é constituído de células enquanto que o esmalte: Constituição do esmalte maduro: minerais (95%), água (3%), material orgânico (2%) Estrutura: cristais de hidroxiapatita -> bastões (prismas) - esses bastões apresentam espaços e a medida que o dente irrompe na boca os espaços vão reduzindo e através desses espaços que as bactérias vão permear e iniciar o processo de desmineralização. Então quando o dente irrompe na boca ele tem muitos minerais como magnésio e sódio, a medida que ele vai estando na boca vai ganhando cálcio e fosfato, formando a estrutura mais mineralizada e mais resistente à cárie porque ocorre o processo de fechamento dos espaços interprismáticos e interbastões, então, dois anos após o dente se irromper é menos provável que haja formação de cáries do que logo após a irrupção. Maturação pós-irruptiva -> diminuição dos espaços interprismáticos ❖ Troca iônica - DES/RE A medida que o pH fica abaixo de 5,5 o dente começa a liberar íons cálcio e fosfato para a cavidade, o que faz com que o pH se eleve, quando o pH se eleva os íons retornam para o dente. Esse processo é fisiológico e a perda mineral é microscópica. O que determina o acontecimento adequado do DES/RE, além do comportamento fisiológico, são os hábitos de higiene, a dieta, a frequência de ingestão de carboidratos, o período que o carboidrato está sendo ingerido. Após a ingestão de carboidratos naturalmente ocorre o processo de desmineralização (DES), mas após 10 minutos inicia-se o processo de remineralização (RE), através da represipitação. Entretanto, a ingestão de carboidratos com uma certa frequência faz com que o processo de desmineralização seja mais frequente que a remineralização causando a lesão de manchas brancas que precedem a cárie. O DES/RE é um processo fisiológico caracterizado pela perda e ganho de substâncias importantes para a composição do esmalte dentário, em especial os íons cálcio e potássio (Desmineralização e Remineralização). Com a desmineralização do esmalte a saliva (água) preenche os espaços que deveriam estar os íons, provocando alterações no índice de refração da luz do esmalte, aparecendo como áreas brancas e opacas. ❖ Fatores que influenciam no tempo para haver reversão do pH - 20’ ->horas ➢ Forma como o açúcar é ingerido ➢ Frequência de ingestão ➢ Ação da saliva - mecanismo protetor ➢ Período do dia A partir de 2 anos é importante que a criança inicie o processo de escovação. ❖ Características da microbiota cariogênica ➢ Produção de PEC (Polissacarídeo extracelular) - formação da matriz intermicrobiana e adesão seletiva de bactérias formando a comunidade clímax e protege contra a ação de produtos química e flúor -> retenção mecânica; ➢ Formação e utilização (PIC - polissacarídeo intracelular de reserva). Quando o microrganismo se encontra no ambiente escasso em carboidratos, ele lança mão do metabolismo de reserva para conseguir metabolizar e garantir a sobrevivência; ➢ Transporte rápido de açúcar quando em competição com outras bactéria; ➢ Metabolismo sacarolítico (obtenção de energia através do catabolismo de carboidratos) - acidogênica (produzem sádico - consegue abaixar o pH a menor ou igual a 5,5 - na presença de flúor na boca esse pH passa a ser); ➢ Potencial acidúrico (sobreviver em meio ácido) - homeostase intracelular de pH (mantém o pH intracelular neutro ainda que o meio externo possua pH baixo - isso porque consegue expulsar o H+ da sua célula) ❖ Sistema de transporte rápido de açúcar - fosfotransferase mediado por fosfoenolpiruvato (PEP-PTS) ➢ transporte ativo; ➢ exclusivo de bactérias; ➢ a energia utilizada para esse transporte não é o ATP, é o PEP; ➢ Importância do flúor: se o flúor interfere no funcionamento correto da enolase onde o ácido 2-fosfoglicérico se torna em ácido fosfoenolpirúvico e tem a interrupção do ácido fosfoenolpirúvico na presença do flúor, o mecanismo de transporte rápido de açúcar na bactéria também vai ficar prejudicado, então além de não seguir a via metabólica com produção de ácido lático, também teremos a interrupção do transporte que seria uma vantagem para a bactéria quando o meio está escasso de carboidratos. ➢ Funcionamento do sistema de transporte rápido de açúcar: Os mutans, sublimus e lactobacilos possuem esse sistema Quando a bactéria está num ambiente escasso em carboidratos, ela ativa o sistema PEP-PTS, aumentando a atividade do sistema, porque ela precisa ganhar a competição, para o funcionamento do sistema é preciso um pH neutro e crescimento lento (devido à escassez de nutrientes). Quando a bactéria está em um ambiente com grande concentração de carboidratos,o crescimento é intenso e portanto o metabolismo é intenso gerando muito ácido fazendo com que o pH caia, nesse caso a bactéria desativa o sistema PEP-PTS e ativa o sistema Glicose permease -> PIC (Polissacarídeo intracelular - molécula de reserva) ❖ Mecanismo ácido tolerância (acidúricos) ➢ Extrusão [expulsão] de prótons via ATP-Sintase translocadora de prótons (H+/ATPase) ➢ Efluxo do produto ácido final [da fermentação lática]; ➢ aumento da atividade da glicose permease [formação do PIC para reserva]; ➢ diminuição da atividade do PEP-pts de açúcares, o processo de absorção de carboidratos se torna um pouco mais lento e a bactéria não morre intoxicada com tanto carboidrato para dar conta. ❖ Destino metabólico de carboidratos da dieta:. Precisamos lembrar dos mecanismos de cariogenicidade e traçar um paralelo com os microrganismos presentes na boca: ❖ Microrganismos que preenchem os requisitos de cariogenicidade: ➢ Estreptococos do grupo mutans (S. mutans, S.sobrinus, S.cricetus, S. rattus [mais presentes na microbiota humana], S.macace, S.ferus e S.downie) - acidúricos e acidogênicos ➢ Lactobacillus casei; L.acidophilus (acidúricos e acidogênicos) ➢ Actinomyces viscosus; A. naeslundii (cárie de raiz - não são tão acidúricos e nem tão acidogênicos) ➢ Ps.: em estado de saúde esses microrganismos também estão presentes mas em situação de equilíbrio. ❖ Streptococcus mutans ➢ cárie de coroa (superfície lisa - vestibular e lingual; fóssulas e fissuras) e cárie de raiz ➢ fermentam: sacarose, manitol e sorbitol - importante para identificação em laboratório - formação de placa em vidro (Quando colocado um tubo de vidro, dentro do tubo de ensaio contendo S. mutans, em meio do tipo BHI [rico em sacarose], ele consegue se aderir na estrutura de vidro - formação de placa em vidro) ➢ acidúricos e acidogênicos ➢ produzem PIC e PEC ➢ O mutans está presente na boca de bebês que ainda não possuem dentes, mas de maneira transitória, quando ocorre a irrupção dos dentes, o contato com a mãe e adultos, a criança começa a adquirir a microbiota e tendo estruturas duras na boca, como os dentes, ele começa a fazer parte da microbiota residente. ➢ Transmissibilidade de S. mutans: contato com alimentos, contato com a mãe etc. Ps.: a cárie não é transmissível, apenas os microrganismos são, mas a cárie é multifatorial. ❖ Streptococcus sobrinus ➢ Cárie de coroa (maior superfície lisa, fóssulas e fissuras) e cárie de raiz ➢ Fermentam sacarose, manitol e sorbitol ➢ acidúricos e acidogênicos ➢ produzem PIC e PEC ➢ normalmente associado com S. mutans - muito parecido do ponto de vista de patogenicidade da doença cárie; ❖ Lactobacillus casei ➢ Bactéria acidúrica e acidogênica - não conseguem usar do PEC para aderir a estrutura do dente, para formar um biofilme mais coeso, então normalmente os lactobacillus estão mais associados à cárie de fóssulas e fissuras, cáries profundas (lesão de cárie aberta)- pois precisam de nichos de retenção. ➢ Faz parte da microbiota suplementar ❖ Actinomyces viscosus -> A. naeslundii tipo II ➢ Cárie de raiz; ➢ fermentam glicose ➢ menos acidúricos e acidogênicos quando comparada ao grupo mutans e aos lactobacillus, não sobrevivem em pH igual ou menor que 5,0, então não conseguem contribuir no processo de formação de cárie em esmalte. ➢ produzem levanos extracelulares e heteropolissacarídeo ➢ necessita de retração gengival para exposição de raiz, muito comum em idosos. ❖ Substrato - carboidrato fermentável - fator primário ➢ Consistência do alimento (forma física) ➢ Frequência de ingestão de carboidratos - maior a frequência/maior o desafio cariogênico - quanto maior a ingestão de carboidratos, maior a dificuldade de remineralização. ➢ Obs: açúcares mais consumidos - sacarose 90%, frutose, glicose O ceod geralmente é mais usado para crianças, menos de 12 anos, porque tem a unidade dentária que vai ser perdida já que vai ter a reabsorção da raiz na troca do dente decíduo para o dente permanente. Se chama CEOD porque não se sabe se a criança perdeu a dentição por causas naturais ou por cárie. No gráfico mostra que quanto maior o consumo de carboidratos, maior a quantidade de dentes cariados. ❖ CEOD: índice de dentes cariados, extração indicados e obturados em crianças menores de 12 anos ❖ CPOS: índice de dentes cariados, extração indicados e obturados em pessoas maiores de 12 anos ❖ Tanto o sobrinus e o mutans fermetam sorbitol, ❖ O tipo de carboidrato influencia no pH do meio ❖ O xilitol é não cariogênico e anticariogênico ❖ O que é ser anticariogênico e não cariogênico? Não cariogênico a bactéria não consegue metabolizar e anticariogênica o microrganismos consegue colocar o xilitol para dentro, mas não consegue metabolizar de modo que as concentrações do xilitol se tornam tóxicas para o microrganismo e ele morre. ❖ Teste microbiológico de atividade de cárie (o grau de susceptibilidade individual é dependente de fatores próprios do hospedeiro) - nenhum teste por si só não determina a predisposição e presença de cárie na cavidade oral, é necessário uma análise clínica da placa dentária, os testes bioquímico, entre outros ➢ Saliva estimulada: degradação dos microrganismos dos sítios anatômicos da cavidade bucal, que passam para a saliva total; -> contagem de lactobacilos na saliva (coleta e diluição da saliva - 30 a 300 colônias). Meio de cultura: ágar rogosa pH5,4 mais ou menos 2 (possui ácido acético - meio seletivo para lactobacillus) ■ coleta de saliva ■ colocar na placa de Petri ■ Coleta da colônia ■ diluição da solução salina ■ agitamos a saliva no córtex ■ semeadura por pour-plate/profundidade - primeiro coloca a saliva e depois joga o meio ■ incubação 37ºC / 72 horas/ microaerofilia ■ contagem de lactobacilos ❖ Semeadura por disseminação - contagem de colônias de Streptococcus mutans ➢ Meio MSBS (Ágar Mitis salivares com bacitracina [antibiótico que torna o meio seletivo para o grupo mutans] e sacarose) - 15% sacarose pH 7+- 2 ■ Coleta da saliva ■ Diluição da saliva ■ Semeadura por disseminação - o meio já está na placa e colocar 1mL de saliva diluído no centro da placa e com a ajuda de uma alça de Drigalsky e fazer a semeadura ■ Microaerofilia ou estufa de CO2 - incubação 37ºC/ 48h ■ colônias altas, convexas, com aspecto de vidro fosco esmerilhado ■ contagem de colônias no microscópio: Porque um valor alto para lactobacillus é acima de 10 mil e para o mutans é acima de 1 milhão? Porque o lactobacillus é microbiota suplementar e sua concentração deve estar menor que 1%, enquanto que mutans é residente. ❖ Teste de Snyder - medir a atividade de cárie ➢ Semear saliva (shake-tube) em ágar glicose contendo verde de bromocresol [indicador de pH] ■ Coleta de saliva ■ semeadura de shake -tube [ mistura em tubo] - meio fluido ■ incubação ■ medida indireta de quantificar a quantidade de bactérias cariogênicas, baseado na velocidade de produção de ácido.
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