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PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM Naomi Vidal Ferreira 1ª Edição, 2022 EAD Reitor e Diretor Campus Engenheiro Coelho: Martin Kuhn Vice-reitor para a Educação Básica e Diretor Campus Hortolândia: Douglas Jefferson Menslin Vice-reitor para a Educação Superior e Diretor Campus São Paulo: Afonso Cardoso Ligório Vice-reitor administrativo: Telson Bombassaro Vargas Pró-reitor de graduação: Afonso Cardoso Ligório Pró-reitor de pesquisa e desenvolvimento institucional: Allan Macedo de Novaes Pró-reitor de educação à distância: Fabiano Leichsenring Silva Pró-reitor de desenvolvimento espiritual e comunitário: Henrique Melo Gonçalves Pró-reitor de Desenvolvimento Estudantil: Carlos Alberto Ferri Pró-reitor de Gestão Integrada: Claudio Knoener Educação Adventista a Distância Conselho editorial e artístico: Dr. Adolfo Suárez; Dr. Afonso Cardoso; Dr. Allan Novaes; Me. Diogo Cavalcanti; Dr. Douglas Menslin; Pr. Eber Liesse; Me. Edilson Valiante; Dr. Fabiano Leichsenring, Dr. Fabio Alfieri; Pr. Gilberto Damasceno; Dra. Gildene Silva; Pr. Henrique Gonçalves; Pr. José Prudêncio Júnior; Pr. Luis Strumiello; Dr. Martin Kuhn; Dr. Reinaldo Siqueira; Dr. Rodrigo Follis; Esp. Telson Vargas Editor-chefe: Rodrigo Follis Gerente administrativo: Bruno Sales Ferreira Editor associado: Werter Gouveia Responsável editorial pelo EaD: Luiza Simões Editora Universitária Adventista Presidente Divisão Sul-Americana: Stanley Arco Diretor do Departamento de Educação para a Divisão Sul-Americana: Antônio Marcos Presidente Mantenedora Unasp (IAE): Maurício Lima 1ª Edição, 2022 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM Editora Universitária Adventista Engenheiro Coelho, SP Naomi Vidal Ferreira Doutora em Neuropsicologia pela Faculdade de Medicina da USP Campagnoni, Mariana / dos Santos, Diego Henrique Moreira Formação da identidade profissional do contador [livro eletrônico] / Mariana Campagnoni. -- 1. ed. -- Engenheiro Coelho, SP : Unaspress, 2020. 1 Mb ; PDF ISBN 978-85-8463-172-8 1. Carreira profissional 2. Contabilidade 3. Contabilidade como profissão 4. Contabilidade como profissão - Leis e legislação 5. Formação profissional 6. Negócios I. Título. 20-33026 CDD-370.113 Dados Internacionais da Catalogação na Publicação (CIP) (Ficha catalográfica elaborada por Hermenérico Siqueira de Morais Netto – CRB 7370) Psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem 1ª edição – 2022 e-book (pdf) OP 00123_228 Coordenação editorial: Késia Santos Conteudista: Carolina Pessoa Wanderley Preparador: Naomi Vidal Ferreira Projeto gráfico: Ana Paula Pirani Capa e Diagramação: William Nunes Caixa Postal 88 – Reitoria Unasp Engenheiro Coelho, SP – CEP 13448-900 Tel.: (19) 3858-5171 / 3858-5172 www.unaspress.com.br Editora Universitária Adventista Validação editorial científica ad hoc: Simone Hedwig Hasse Doutora em Educação - Universidade Metodista de Piracicaba/SP Editora associada: Todos os direitos reservados à Unaspress - Editora Universitária Adventista. Proibida a reprodução por quaisquer meios, sem prévia autorização escrita da editora, salvo em breves citações, com indicação da fonte. SUMÁRIO TEORIAS DO DESENVOLVIMENTO ......................... 13 Introdução ........................................................................................14 O desenvolvimento humano e seu campo de estudos ...................16 Influências que atuam sobre o curso do desenvolvimento ...................................................19 Teoria psicossexual de Freud ...........................................................27 Biografia de Freud ...................................................................27 O conceito de inconsciente .....................................................29 Id, ego e superego ...................................................................30 Mecanismos de defesa ...........................................................32 Fases do desenvolvimento psicossexual .................................33 Contribuições de Freud à educação ........................................35 Críticas à teoria ........................................................................38 VO CÊ ES TÁ A QU I Teoria psicossocial de Erikson ..........................................................38 O conceito de ego ...................................................................41 Estágios do desenvolvimento psicossocial .............................42 Contribuições da teoria de Erikson .........................................48 Teoria do apego de Bowlby .............................................................50 Tipos de apego ........................................................................52 Teoria do apego e aprendizagem ...........................................55 Teoria bioecológica de Bronfenbrenner ...........................................56 considerações finais .........................................................................58 Referências .......................................................................................60 TEORIAS DA APRENDIZAGEM ................................ 63 Introdução ........................................................................................64 A aprendizagem humana e seu campo de estudos .......................66 Visões sobre o contato com o conhecimento .........................67 Abordagens sobre aprendizagem ..........................................68 Cosmovisão cristã ....................................................................74 Teoria comportamental de Skinner .................................................75 VO CÊ ES TÁ A QU I Biografia de Skinner ................................................................75 Conceitos centrais ............................................................................77 Contribuições para a educação e críticas à teoria ...................81 Teoria construtivista de Piaget e teoria histórico-cultural de Vygotsky ..............................................83 Breve biografia e contexto histórico .......................................83 Organização, adaptação e equilibração ..................................85 Estágios do desenvolvimento cognitivo .................................87 Desenvolvimento moral .........................................................92 História de Vygotsky ................................................................93 Vygotsky e a troika ..................................................................94 Vygotsky e a zona de desenvolvimento proximal e aprendizagem .......................................................99 Contribuições das teorias de Piaget e Vygotsky para a educação ...................................................100 Teoria sociocognitiva de Bandura ...................................................102 Breve biografia de Albert Bandura ........................................102 Mecanismos de modelagem e imitação ..............................103 Determinismo recíproco na teoria sociocognitiva .................104 Contribuições da teoria de Bandura ......................................106 Considerações finais........................................................................106 Referências ......................................................................................110 AS TEORIAS DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO ................... 115 Introdução .......................................................................................116 Teoria e prática na formação e atuação de professores..................118 Tipos de abordagem ..............................................................122 Tipos de natureza ...................................................................123 Tipos de procedimentos metodológicos ...............................123 Tipos de objetivos ..................................................................126 Consideraçõessobre pesquisa e teoria na educação .............129 O educador frente à diversidade teórica .........................................131 As teorias do desenvolvimento e da aprendizagem nas práticas pedagógicas ......................................134 Aplicação do behaviorismo na sala de aula ..........................134 Aplicação do cognitivismo na sala de aula ...........................138 Aplicação do construtivismo em sala de aula .......................142 As teorias do desenvolvimento e da aprendizagem nas relações educativas .........................................147 Considerações finais........................................................................155 Resumo ...........................................................................................156 Referências ......................................................................................158 AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM ................ 161 Introdução .......................................................................................162 Dificuldades e transtornos específicos da aprendizagem .............164 Dislexia, disgrafia, disortografia e discalculia ................................176 Transtorno do déficit de atenção e hiperatividade, transtorno do espectro autista e deficiência intelectual ................180 Transtorno do Espectro Autista ..............................................185 Deficiência intelectual ...........................................................189 A epistemologia convergente de Jorge Visca ................................195 Processo de diagnóstico da dificuldade de aprendizagem na teoria de Jorge Visca ............................199 Considerações finais........................................................................202 Referências ......................................................................................205 EMENTA Trata da complexidade do processo ensino-aprendizagem, a partir de uma perspectiva da psicologia da aprendizagem, incluindo o impacto do fator desenvolvimento, biológico, cognitivo, afetivo e sociocultural. Análise das práticas escolares recorrendo a elementos da psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem. UNIDADE 1 TEORIAS DO DESENVOLVIMENTO UNIDADE 1 14 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM INTRODUÇÃO Olá, querido leitor(a)! Bem-vindo ao estudo sobre as teorias do desenvolvimento humano. O ser humano precisa ser enxergado de forma multifacetada, pois as formas de interação que ele estabelece com o mundo, bem como as fontes de influência que atuam sobre ele, são diversas. E não é diferente com a aprendizagem: ela também depende de vários fatores, e compreender esses fatores será de grande importância para a atuação do professor em sala de aula. A seguir, você encontrará um conteúdo importante a respeito do campo de estudos do desenvolvimento humano, bem como de sua contribuição para a área da aprendizagem. Você também terá contato com algumas teorias que são centrais no campo de estudos do desenvolvimento humano, e com algumas discussões sobre como elas podem ser utilizadas para o sucesso no ensino. Ao final da leitura, você compreenderá conceitos sobre: • o que o campo do desenvolvimento humano estuda: como as pessoas mudam, em que aspectos elas mudam e quais são as principais influências que atuam sobre essas mudanças; 15 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO • a teoria de Sigmund Freud, também conhecida como psicanálise, e seus principais conceitos – inconsciente, instâncias da mente, fases do desenvolvimento psicossexual e mecanismos de defesa – e sua importância para a aprendizagem; • a teoria do desenvolvimento psicossocial de Erik Erikson: o conceito de crise de personalidade, o papel do desenvolvimento de virtudes e as fases do desenvolvimento psicossocial, bem como as tarefas que precisam ser realizadas em cada uma dessas fases. Esses conceitos também serão aplicados à aprendizagem; • a teoria do apego, os tipos de apego e suas características e manifestações, e a importância da compreensão dessa teoria para o campo do desenvolvimento infantil, bem como para o sucesso do ensino; • a teoria bioecológica de Urie Bronfenbrenner e os diferentes aspectos que influenciam o desenvolvimento humano – a pessoa, o processo, o contexto e o tempo – bem como o papel da escola nesse processo. Bom estudo! 16 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM O DESENVOLVIMENTO HUMANO E SEU CAMPO DE ESTUDOS O campo de estudos do desenvolvimento humano tem como foco compreender como as pessoas mudam ao longo de suas vidas, ou, como é chamado pelos teóricos da área, ao longo de seu ciclo vital. Essas mudanças podem incluir vários aspectos humanos, como o aspecto físico, cognitivo, emocional, social, cultural e até espiritual (PAPALIA et al., 2009). Mas qual será a natureza dessas mudanças que ocorrem com as pessoas? Elas representam um aperfeiçoamento, ou aumento da complexidade, de sua capacidade de se movimentar, raciocinar, sentir e se comportar, principalmente durante a infância, a adolescência e a juventude. Durante a vida adulta, algumas capacidades se aperfeiçoam, outras se mantêm estáveis e outras tendem a COGNITIVO Aspecto do comportamento humano que lida com o pro- cessamento e armazenamento das informações. Fonte: lEZAK, M. D. et al. Neuropsychological assessment. Oxford University Press, USA, 2012. 17 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO diminuir. Já na terceira idade, boa parte das funções tende a sofrer uma perda progressiva, com algumas poucas exceções (o aumento da sabedoria do idoso pode ser considerado uma exceção) (PAPALIA et al., 2009). Você já deve ter percebido algumas dessas mudanças em você – a passagem pela puberdade, o aparecimento de uma ruga ou um cabelo branco – ou em alguma criança próxima, um(a) filho(a), talvez – os primeiros passos ou as primeiras palavras. Mas pode ser que você também tenha percebido que cada pessoa é única quando se trata do momento e da forma como essas mudanças acontecem: nem todas as crianças passam pelo mesmo processo cognitivo para aprender a falar, nem começam a falar exatamente com a mesma idade. Aqui estamos falando da diferença entre mudanças individuais e mudanças universais. Existem marcos no desenvolvimento que serão experimentados por todos os indivíduos, como é o caso da puberdade. Essas mudanças são chamadas de universais. Por outro lado, a forma e o momento em que cada indivíduo passará pela puberdade varia. Essas variações que acontecem entre as pessoas são chamadas de mudanças individuais (PAPALIA et al., 2009). 18 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM As mudanças estão presentes durante todo o ciclo vital. Mas, de todas as épocas da vida, aquelas que ocorrem durante a infância e a adolescência (o que equivale aos primeiros vinte anos de uma pessoa) são, provavelmente, as mais marcantes e acentuadas (PAPALIA et al., 2009). É durante esse período que a criança, inicialmente um bebê que pesa entre 2 e 4 quilos, deverá crescer fisicamente até atingir o tamanho de um adulto. Também é nesse período que ela deverá aprender a falar e a andar, e desenvolver a coordenação motora e as habilidades necessárias para praticar esportes. Ainda na infância, a criança deverá desenvolver importantes capacidades mentais, como a leitura, a escrita e o cálculo matemático, que lhe serão fundamentais na vida adulta. Do ponto de vista psicológico, durante esse período a criança deverá aprender a confiar nos adultos, a gostar de si mesma, a lidar com suas próprias emoções e a se relacionar com os outros; e o adolescente deverá desenvolver sua identidade, decidir que carreira irá seguir e aprender a pensar a longo prazo e a tomar decisões de forma autônoma. Ufa! Quantas coisas, não é? Dá para entender porque essa época é tão importante na vida de alguém. Ainda assim, tão importante quanto compreender as mudanças emsi, é entender as influências que atuam sobre elas. 19 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO INFLUÊNCIAS QUE ATUAM SOBRE O CURSO DO DESENVOLVIMENTO As mudanças experimentadas pelas pessoas ao longo de seu ciclo vital são consideradas adaptativas, o que significa que elas buscam atender às necessidades que surgem ao longo da vida. Essas necessidades ou demandas têm duas principais origens: internas e externas (PAPALIA et al., 2009). As demandas internas dizem respeito às necessidades biológicas e inatas de crescimento, que são específicas do indivíduo e de seu estágio de desenvolvimento. Já as demandas externas dizem respeito às exigências do ambiente, bem como às influências do meio em que o indivíduo está inserido (MOTA, 2005). AGORA É COM VOCÊ Você já parou para pensar nas mudanças pelas quais já passou ao longo da vida? Pense em, pelo menos, duas mudanças que você vivenciou no passado e identifique se foram mudanças físicas, cognitivas ou psicológicas. Além da compreensão sobre as variáveis internas e externas, existem três principais visões, ou interpretações, sobre que tipo de influências estão presentes no desenvolvimento humano: o inatismo, o empirismo e o interacionismo (PAPALIA et al., 2009). 20 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM A primeira interpretação, chamada de inatismo, entende que as mudanças pelas quais o indivíduo vai passar ao longo de sua vida são inatas, ou seja, já estão pré-determinadas quando ele nasce. Nessa abordagem, é entendido que as vivências e experiências que ele terá depois de nascer não exercem influência significativa sobre o curso de seu desenvolvimento. A segunda visão é o empirismo, que entende que, ao nascer, o indivíduo é como um livro em branco, e o contexto em que ele está inserido tem um papel fundamental em seu desenvolvimento. Nessa visão, o único fator que influenciará o curso do desenvolvimento de alguém será o ambiente que o cerca. A terceira abordagem é o interacionismo. Nessa visão, o desenvolvimento humano é resultado de uma interação complexa e dinâmica entre pré- disposições inatas, influências do ambiente e particularidades individuais, e essa interação segue atuante sobre o indivíduo ao longo de seu ciclo vital. MATURAÇÃO, PERÍODO CRÍTICO E PERÍODO SENSÍVEL Como acabamos de ver, alguns teóricos acreditam que o desenvolvimento humano é resultado de fatores inatos, sobre os quais o ambiente tem pouco ou nenhum efeito. Os teóricos da maturação são exemplos disso. O teórico do desenvolvimento Arnold Gesell adotou o termo “maturação” para descrever algumas mudanças que 21 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO são universais, ou seja, acontecem com todas as crianças, e que seguem padrões. Além de serem universais, as mudanças previstas pelo processo de maturação sofrem pouca influência do ambiente e não precisam ser aprendidas, não exigindo prática nem treino. E, por fim, essas mudanças também representam um amadurecimento progressivo e sequencial de capacidades ou características de um indivíduo. Exemplos de mudanças maturacionais são o nascimento dos pelos no rosto dos meninos e dos seios nas meninas (BEE & BOYD, 2011). PERÍODO CRÍTICO, PERÍODO SENSÍVEL, VULNERABILIDADE E RESILIÊNCIA O ponto de vista interacionista, como foi mencionado anteriormente, entende que o desenvolvimento de um indivíduo é resultado de aspectos inatos, influências ambientais e de sua interação com a individualidade. Os conceitos de período crítico e período sensível, bem como a teoria de vulnerabilidade e resiliência, apresentam visões interacionistas do desenvolvimento, como veremos a seguir. Pesquisas mostram que algumas capacidades dos organismos só serão desenvolvidas como resultado de estímulos do ambiente, como é o caso de uma proteína do sistema visual: o gene responsável por produzi-la só entra em ação quando o estímulo visual acontece (BEE & BOYD, 2011). 22 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM Além disso, o momento em que algumas experiências ocorrem para os organismos pode fazer diferença no resultado que terão sobre eles. Nos animais, esse período é conhecido como período crítico, porque caso a interação com o ambiente não ocorra exatamente naquele período, aquela característica não se desenvolverá. Nos seres humanos, esse período é conhecido como período sensível, pois em geral existe um momento em que o indivíduo está mais propício para desenvolver uma habilidade ou característica, o que não significa que aquela habilidade/característica não possa ser desenvolvida em outro momento. Um exemplo disso é a alfabetização. A criança que entra na escola formal aos seis ou sete anos está, em geral, no momento ideal para desenvolver a capacidade de ler e escrever, ou seja, no período sensível. No entanto, caso ela não tenha essa oportunidade nesse momento, a alfabetização também pode ocorrer em um momento mais tardio da infância, ou até na adolescência ou idade adulta (BEE & BOYD, 2011). Outra teoria que trata da interação entre o indivíduo e seu ambiente é a teoria da vulnerabilidade e resiliência. Alguns teóricos da área compreendem que cada criança possui características individuais que podem torná-la vulnerável (vulnerabilidade) ou protegê-la (resiliência) dos aspectos negativos de seu ambiente, principalmente se esse for desfavorável ao seu desenvolvimento (BEE & BOYD, 2011). 23 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO IMPORTANTE Alguns teóricos da área compreendem que cada criança possui características individuais que podem torná-la vulnerável (vulnera- bilidade) ou protegê-la (resiliência) dos aspectos negativos de seu ambiente. [...] Sendo assim, o mesmo ambiente poderá ter efeitos completamente diferentes sobre duas crianças diferentes. Essa teoria pode explicar o fato de que algumas crianças se tornarão adultos bem adaptados e competentes mesmo sendo criadas em ambientes que ofereciam risco considerável ao seu crescimento. Características que tornariam uma criança vulnerável seriam, por exemplo: ter uma deficiência física ou intelectual, ter predisposição genética para desenvolver algum transtorno mental, ter intolerância a certos tipos de alimentos, ter temperamento “difícil” etc. Por outro lado, características que poderiam proteger uma criança seriam, por exemplo: ter um temperamento “dócil”, ser amigável/sociável, ter boa capacidade motora e ter boa saúde (não adoecer com facilidade) (BEE & BOYD, 2011). INFLUÊNCIAS DO CONTEXTO Existem fatores ambientais, ou contextuais, que parecem ter um papel importante sobre o desenvolvimento do indivíduo. Esses fatores podem influenciar a pessoa como um 24 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM todo, pois seus efeitos atingem o crescimento físico, cognitivo, emocional, social e espiritual. O primeiro fator que iremos destacar é a família. Na definição de família estão incluídos dois conceitos: família nuclear, que é composta por pai e/ou mãe e filhos, que podem ser filhos biológicos ou adotados, ou enteados; e família extensa, composta por avós, pais, tios e primos, podendo também incluir outros parentes não tão próximos. Hoje nos deparamos com mudanças relacionadas à urbanização, à saída da mulher para o mercado de trabalho, ao aumento dos divórcios (que traz a presença de padrastos, madrastas e meios-irmãos para a família) e de famílias monoparentais, ao crescimento do número de famílias de pais homoafetivos, ao aumento da expectativa de vida dos idosos e a questões culturais. Tudo isso tem influência direta sobre a configuração das famílias atuais, que podem ser as mais diversas, e, como consequência, sobre a maneira como a criança será criada e sobre como seu desenvolvimento se dará. Há dois tipos de família: família nuclear, que é composta por pai e/ou mãe e filhos, que podem ser filhos biológicos ou adotados, ou enteados; e família extensa, composta por avós, pais, tios e primos, podendo também incluir outros parentes não tão próximos. 25 TEORIASDO DESENVOlVIMENTO O segundo fator que merece destaque é o nível socioeconômico. O nível socioeconômico se reflete em questões como a condição de moradia, o acesso à escola e ao ensino de qualidade, a renda familiar, o acesso à nutrição adequada, a assistência à saúde, entre outros. Esses fatores estão diretamente relacionados ao desenvolvimento dos indivíduos. Geralmente, os membros de famílias que têm um nível socioeconômico baixo têm mais problemas de saúde física do que membros de famílias que têm um nível socioeconômico alto. Além disso, crianças criadas em famílias e regiões com nível socioeconômico baixo podem apresentar mais sofrimento psicológico, menos competência social, mais problemas de comportamento, maior frequência de bullying e pior desenvolvimento cognitivo e, como consequência, mais problemas de aprendizagem quando comparadas a crianças criadas em situações mais favoráveis do ponto de vista socioeconômico. Ainda assim, a resiliência de uma criança, manifestada através de fatores como bom desempenho acadêmico e boas habilidades motoras, podem reduzir os efeitos de uma situação socioeconômica desfavorável sobre sua saúde (POULAIN et al., 2020). O terceiro fator que vamos destacar é a raça. Muitos pesquisadores da área do desenvolvimento humano e também 26 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM de outras áreas entendem a raça como uma construção social. Isso quer dizer que, mais do que os determinantes genéticos e biológicos que determinam as diferenças físicas entre as pessoas, ou sua raça biológica, as diferentes raças muitas vezes são olhadas do ponto de vista de sua construção social. Visto por essa perspectiva, entende-se que existem raças que são socialmente privilegiadas e outras que são socialmente desfavorecidas. Crianças que pertencem às raças socialmente privilegiadas geralmente terão benefícios em sua autoestima, seu status social e seu desempenho cognitivo e acadêmico. O contrário também é verdadeiro para crianças pertencentes a raças socialmente desfavorecidas. Esse fenômeno se deve, pelo menos em parte, aos preconceitos associados às diferenças raciais (QUINTANA et al., 2006). O quarto fator que será analisado é o contexto histórico. A época em que uma criança nasce e cresce terá influência sobre seu desenvolvimento. Ao longo dos séculos, as relações familiares têm se transformado, e isso tem afetado a forma com que a infância é vista (HAREVEN, 1985). As mudanças na constituição familiar incluem, por exemplo: a visão sobre a infância e as necessidades da criança; a importância dada e a influência permitida à relação com a família estendida, como avós, tios e primos; qual o papel do pai e qual o papel 27 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO da mãe; o principal cuidador da criança; a idade em que a criança irá para a escola; a idade em que se espera que a criança ou o adolescente comecem a contribuir financeiramente com a família; o tipo de valores que serão transmitidos para a criança, quem fará isso e como será esperado que a criança ou o adolescente adotem esses valores etc. SAIBA MAIS Você sabia que alguns aspectos do contexto apresen- tados aqui – a família, o nível socioeconômico e a raça – também conhecidos como fatores sociodemográficos, são tão importantes para o desenvolvimento e para as condições de saúde das pessoas que, na literatura sobre o assunto, são agrupados em um termo único? Esse ter- mo é definido como os “determinantes sociais da saúde”. TEORIA PSICOSSEXUAL DE FREUD BIOGRAFIA DE FREUD Sigmund Freud nasceu no ano de 1856 e morreu no ano de 1939, na Moravia. Sua contribuição para a área do desenvolvimento humano é inquestionável, e sua teoria serviu de base para muitos estudiosos de seu tempo e muitos outros 28 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM que vieram depois dele, e que desenvolveram teorias tanto correlatas quanto antagônicas à sua. Freud era o preferido de sua mãe, que o favorecia de forma clara, e seu pai via nele um futuro intelectual, pois o achava extremamente inteligente. Com essa visão, e a fim de contribuir com sua genialidade, seu pai lhe ensinou as histórias da Bíblia, e esses ensinamentos foram aplicados por Freud em sua teoria posteriormente, bem como os conceitos aprendidos por ele em seu estudo da mitologia grega. Ele cursou Medicina na Universidade de Viena e especializou-se em neurologia, pois o tratamento dos transtornos nervosos lhe chamava a atenção. Sua família extensa tinha sido acometida por transtornos mentais, o que pode ter contribuído para a sua atração por esse tipo de problema (HALL et al., 2000; ROUDINESCO, 2016). Ele estudou em Paris com Jean Charcot, um psiquiatra francês que tratava pacientes com neuroses através da hipnose. No início de sua prática, também utilizou a hipnose no tratamento de seus pacientes, mas considerou-a ineficaz, e adotou então o método da cura pela fala e da catarse usados por Joseph Breuer. O trabalho realizado com seus pacientes estabeleceu os fundamentos de sua teoria, pois as descobertas que ele fazia 29 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO enquanto lhes tratava serviam como conteúdo para que seus conceitos sobre a psiquê humana fossem construídos. O primeiro publicado por ele que se tornou importante foi A interpretação dos sonhos, de 1900, e a partir daí publicou muitas outras obras apresentando sua teoria (HALL et al., 2000). A psicanálise, como é conhecida a teoria e o método de tratamento de Freud, causou impacto importante na sua época e continua causando, tanto para a Psicologia e a pedagogia quanto para outras áreas do conhecimento, até hoje. Alguns dos principais conceitos da psicanálise serão estudados a seguir. O CONCEITO DE INCONSCIENTE Freud acreditava que grande parte do conteúdo mental é inconsciente, ou seja, não é acessível de forma direta à nossa consciência. Para ele, os impulsos inatos, que agrupam-se em dois principais desejos - a sexualidade, ou busca pelo prazer, e a agressividade - ficam armazenados no inconsciente e inacessíveis devido à barreira da repressão, gerando tensão, e as pessoas buscam satisfazê-los para aliviar essa tensão. No entanto, a sociedade estabelece limites sobre quando e como esses impulsos podem ser satisfeitos, e a personalidade se forma na relação que o indivíduo desenvolve entre a satisfação 30 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM de seus impulsos e os limites impostos pelo seu meio. Esse funcionamento, para Freud, se estabelece durante a infância, mas se estende para a vida adulta (PAPALIA et al., 2009). ID, EGO E SUPEREGO A teoria de Freud descreveu a mente, ou o aparelho psíquico, como é apresentado na psicanálise, como contendo três instâncias: o id, o ego e o superego. Essas instâncias se desenvolvem durante a infância, e a personalidade do indivíduo é resultado da interação entre elas (BEE & BOYD, 2011). O id é a única instância que já está presente no nascimento, e contém os impulsos e instintos, ou, usando a terminologia da psicanálise, as pulsões. O id é inconsciente e inconsequente, e é governado pelo que é chamado na teoria de princípio do prazer, o que significa que ele é movido apenas no sentido de satisfazer seus desejos e aliviar sua tensão (BEE & BOYD, 2011; PAPALIA et al., 2009). Entre dois e quatro anos, o ego começa a se desenvolver, a partir das frustrações da criança, pois quando ela tem que esperar para ser alimentada ou ter sua fralda trocada, ela começa a se perceber como um ser separado do mundo 31 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO externo. O ego funciona sob o princípio da realidade, o que significa que ele faz o papel de contato com a realidade, passando a satisfazer os desejos do id levando em consideração as possibilidades apresentadas pelo ambiente, utilizando mecanismos de adiamento da gratificação imediata. Um dos importantes papéis do ego é realizar a intermediação entre o id e o superego, buscando equilibrar as exigênciasde ambos com o que é esperado por parte do meio externo (BEE & BOYD, 2011; PAPALIA et al., 2009). A terceira instância a se desenvolver é o superego. Ele é resultado da incorporação, por parte da criança, das regras e valores praticados no meio em que ela está inserida, e faz o papel da consciência. O superego se forma, em geral, entre os cinco e seis anos, como resultado da resolução do complexo de Édipo, logo antes da entrada da criança na escola formal. O superego é exigente e deverá “punir” a criança com sentimentos de vergonha e inadequação quando ela se comporta de forma contrária a seus valores, e fazê-la sentir-se bem quando atende a eles (BEE & BOYD, 2011; PAPALIA et al., 2009). É importante lembrar que o complexo de Édipo, segundo a teoria de Freud, é um fenômeno psíquico que ocorre na criança em relação aos seus progenitores: a criança se afeiçoa com o progenitor do mesmo sexo e se identifica com o 32 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM progenitor do sexo oposto. Esse mecanismo de identificação faz com que as crianças internalizem as regras, representadas pelo progenitor com quem se identificam, o que resulta na formação de seu superego. Nas meninas, esse processo é chamado de complexo de Electra. MECANISMOS DE DEFESA A psicanálise descreve que o id e o superego estão constantemente em conflito, pois o id busca a satisfação de seus desejos e o superego busca atender às regras, ou seja, a atuação de cada um deles seria antagônica a do outro. Isso gera muita tensão para o ego, que passa a utilizar mecanismos de defesa para se proteger. Esses mecanismos de defesa são inconscientes, mas atuam de forma direta sobre a personalidade e o comportamento do indivíduo. Dentre os mecanismos de defesa mais comuns estão a negação, a projeção, o deslocamento, a racionalização e a regressão. Na negação, a pessoa prefere acreditar que um problema, ou uma necessidade/desejo, não existem, e age segundo essa crença, por mais claro e aparente que ele seja. Na projeção, ela transfere seus sentimentos/desejos para outras pessoas, entendendo que elas os estão experimentando 33 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO (mesmo que isso não seja verdade), pois ela acha insuportável reconhecê-los como seus e lidar com eles. No deslocamento, o indivíduo “descarrega” seus sentimentos sobre alguém que não é a pessoa que de fato o chateou, ou que provocou os sentimentos ruins, pois direcioná- los para a pessoa “certa” pode ser muito ameaçador. Na racionalização, a pessoa apresenta argumentos racionais para justificar comportamentos ruins, dela ou de outros, porque ela acha insuportável admitir a ocorrência do comportamento, ou as razões reais que o provocaram. Na regressão, ela se comporta de forma infantilizada, ou retorna a um comportamento imaturo que já havia sido abandonado, devido a uma dificuldade de lidar com uma situação difícil que possa estar enfrentando (BEE & BOYD, 2011). FASES DO DESENVOLVIMENTO PSICOSSEXUAL Para Freud, a formação da personalidade acontece ao longo dos primeiros anos de vida. Nesse processo de desenvolvimento, a libido, ou seja, a energia sexual, se desloca dentre as zonas erógenas ao longo das diferentes fases psicossexuais. As zonas erógenas geralmente são regiões do corpo que são mais sensíveis naquela etapa do 34 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM desenvolvimento, e o desenvolvimento neurológico, bem como o psicológico, permite a passagem da libido de uma região para a outra (BEE & BOYD, 2011; PAPALIA et al., 2009). Na primeira fase, a fase oral, que ocorre entre os zero e 12- 18 meses do bebê, a libido está localizada na boca, fazendo dela a principal região de gratificação, que é experimentada através do ato de mamar, sugar objetos e comer. Na segunda fase, a fase anal, que ocorre entre os 12-18 meses e os três anos, os esfíncteres passam a ser a zona erógena. Nessa fase, a criança sente satisfação e prazer na capacidade de controlar o que ela retém e o que ela expele para o ambiente. Na terceira fase, a fase fálica, que ocorre entre os três e seis anos, a zona erógena é a genital. Durante a fase fálica, a principal fonte de gratificação passa a ser a região genital; também é nessa fase que a criança descobre as diferenças sexuais e que ocorre o fenômeno do complexo de Édipo, em que a criança vive um crescente apego pelo genitor do sexo oposto e desenvolve uma identificação com o genitor do mesmo sexo. A quarta fase é a latência, que ocorre entre os seis anos e a puberdade. Durante a latência, as zonas erógenas passam por um período de adormecimento, ou sublimação, permitindo à criança direcionar sua energia mental para o aprendizado, o que é muito positivo, pois coincide com a época em que, em geral, a criança ingressa na escola formal e passa pelo processo de alfabetização (PAPALIA et al., 2009). 35 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO A última fase é a fase genital, e ocorre da puberdade até a idade adulta. Nessa fase, a principal fonte de prazer e gratificação volta a ser a região genital; é a partir daqui que o indivíduo passa a viver a sexualidade adulta, sendo capaz de experimentar a satisfação sexual madura. Durante as fases do desenvolvimento psicossexual, se a criança recebe gratificação em excesso ou se falta gratificação direcionada à zona erógena específica, ela pode se fixar naquela fase, o que prejudica seu desenvolvimento saudável (PAPALIA et al., 2009). Na teoria de Freud, se a pessoa fosse deixada a se desenvolver sem que a socialização ocorresse, o id e seus impulsos sexuais e agressivos predominariam nela. Por outro lado, o processo de socialização tem, entre outros papéis, a função de fazer com que o indivíduo dê vazão a seus impulsos de forma aceitável socialmente, para que a vida em grupo, ou dentro de uma comunidade, seja possível. CONTRIBUIÇÕES DE FREUD À EDUCAÇÃO Uma das importantes contribuições que a teoria de Freud trouxe para a educação foi o conceito de “inconsciente”. Muitas vezes, fazemos coisas que não compreendemos, e, por mais que aquele comportamento nos traga sofrimento, temos 36 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM grande dificuldade de abandoná-lo. Isso pode se aplicar a comportamentos contraproducentes por parte do professor, que tem dificuldade de mudar, mas também a comportamentos por parte do aluno, que o professor tem dificuldade de compreender. Outras vezes, temos muita relutância em aceitar a realidade a respeito de nós, de nossa prática, e de nossos alunos e de seu processo de aprendizado; fugimos da realidade com todas as nossas forças, acreditando em mentiras que não podem se sustentar. Em outras situações, nossos relacionamentos com alguns alunos, ou com vários alunos, são extremamente difíceis e conturbados, e não conseguimos entender os motivos dessas dificuldades relacionais. Na teoria apresentada, muitas dessas vivências podem ser explicadas por conflitos e impulsos inconscientes, e pelos mecanismos de defesa que o ego adota para se proteger da tensão gerada por esses conflitos. Outra contribuição significativa deixada pela teoria de Freud é a importância dos primeiros anos de vida. De acordo com a psicanálise, essa é a principal época da vida no que diz respeito ao desenvolvimento da personalidade do indivíduo, em especial os cinco ou seis primeiros anos, pois o tipo de relacionamento que a criança desenvolve aqui com os outros, consigo mesma e com o mundo, se prolongará ao longo de sua vida. Atualmente, a importância dessa fase da vida é reconhecida pelos teóricos do 37 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO desenvolvimento, e também por grande parte dos profissionais da educação, e por isso seu estudo recebe grande ênfase da parte desses estudiosos. O conceito dos mecanismos de defesa também pode ser considerado como sendo uma contribuição fundamental da teoria de Freud, pois eles ajudam a explicar comportamentos humanos que aparentemente não têm sentidonenhum e que, de outra forma, permaneceriam incompreendidos, tanto por quem tem esses comportamentos como por quem os presencia. No contexto escolar, mecanismos de defesa como a identificação, a projeção e o deslocamento são comuns, e fazem com que os relacionamentos entre professor e aluno sejam carregados de significado emocional, tanto bom como ruim. Além disso, mecanismos como a negação e a projeção estão amplamente presentes nas bases teóricas de outros campos do conhecimento. A teoria de Freud recebeu e recebe muitas críticas, mas trouxe importantes contribuições para a educação. 38 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM CRÍTICAS À TEORIA Uma das críticas à teoria de Freud é a dificuldade de realizar pesquisas científicas que verifiquem sua aplicabilidade e confiabilidade. Isso se dá porque os mecanismos inconscientes são muito difíceis de medir, assim como os processos mentais vividos pelos bebês e crianças pequenas. Além disso, o contexto cultural e histórico em que Freud desenvolveu sua teoria é diferente do contexto em que vivemos hoje, o que faz com que alguns estudiosos atuais questionem a aplicabilidade de alguns conceitos da psicanálise. Outra crítica que é comumente feita à teoria de Freud é a ênfase que ele colocou sobre os impulsos sexuais. Muitos teóricos releitores de sua teoria, tanto em sua época como hoje em dia, defendem abordagens que enfatizam a busca por gratificação de formal geral, ao invés de se focar apenas na gratificação sexual, como foi proposto originalmente por ele. TEORIA PSICOSSOCIAL DE ERIKSON Erik Erikson nasceu em 1902, na Alemanha, e morreu em 1994. Ele foi criado por sua mãe judia e seu padrasto – Erikson não sabia que seu padrasto não era seu pai 39 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO biológico. Durante seu desenvolvimento, viveu um conflito de identidade entre sua origem judia e dinamarquesa, esta última devido à origem de seu pai biológico. Posteriormente, Erikson afirmou que essa bagagem confusa teve influência sobre a teoria que ele desenvolveu, uma vez que um dos temas centrais de seus escritos é a busca pela identidade e o processo de desenvolvimento desta (CLONINGER, 2002). Ele estudou arte durante a juventude e chegou a ser professor de arte, dando aula para crianças que pertenciam ao círculo de convívio de Freud. Sua futura esposa o introduziu à psicanálise, e ele chegou a ser analisado por Anna Freud, filha do psicanalista. Com o crescimento do antissemitismo na Alemanha, em 1933, Erikson e sua esposa deixaram o país, passaram um período na Dinamarca e depois se mudaram para os Estados Unidos. Lá ele foi professor em Harvard, em Yale e na Universidade da Califórnia em Berkeley, e teve a oportunidade de estudar a cultura e os costumes de algumas tribos indígenas (CLONINGER, 2002). A experiência com os índios fez com que Erikson aprendesse a valorizar os aspectos sociais e culturais do desenvolvimento, e isso teve impactos importantes sobre sua teoria, que, apesar 40 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM de ter sido grandemente influenciada pela psicanálise, deu uma ênfase bem maior ao papel da sociedade no desenvolvimento da personalidade. Assim, sua teoria hoje é conhecida como teoria do desenvolvimento psicossocial (LEITE & SILVA, 2019). Um conceito importante de sua teoria é o princípio epigenético: a compreensão de que o processo de desenvolvimento envolve as dimensões biológica, social e individual. Na compreensão dele, a dimensão biológica está na base do desenvolvimento humano; a dimensão social se constrói na interação entre o bebê e as pessoas presentes em seu entorno; e a dimensão individual diz respeito ao ego, ou seja, ao eu, e representa a individualidade. Para ele, a cultura, o contexto e as relações sociais interagem com a individualidade para formar a personalidade, mas é a dimensão individual que articula as outras duas (LEITE & SILVA, 2019). Do ponto de vista da dimensão social, Erikson entendia que as sociedades procuram desenvolver métodos de educação condizentes com seus valores culturais. O papel da educação seria, como consequência, não apenas o de ensinar os conteúdos acadêmicos, mas também os valores da cultura. Além disso, ele entendia que a educação não se restringe ao ambiente escolar, mas permeia todas as interações do indivíduo, desde seu nascimento. 41 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO O CONCEITO DE EGO Diferentemente da teoria de Freud, a teoria de Erikson descreve que o ego se mantém em desenvolvimento durante todo o ciclo de vida do indivíduo. Além disso, para Erikson, o ambiente em que a criança está inserida tem um papel fundamental sobre seu desenvolvimento, e os fatores inatos e maturacionais, biologicamente determinados, saem do foco (não porque Erikson acreditava na inexistência desses fatores, mas porque o tema central de seu estudo foi o efeito das demandas sociais e culturais sobre o desenvolvimento humano). Ele entendia que o desenvolvimento humano é um processo que segue uma sequência fixa de estágios, e em cada um desses estágios o indivíduo enfrentará uma crise de personalidade, terá uma tarefa psicossocial a realizar e desenvolverá uma virtude – caso tenha sucesso em realizar a tarefa. Nesse processo, em cada estágio ela desenvolve um aspecto de sua identidade ou personalidade (BEE & BOYD, 2011). A forma como cada indivíduo vai lidar com cada tarefa, para Erikson, está grandemente relacionada com o ambiente em que ele está inserido. Por exemplo: no primeiro estágio, a tarefa do bebê é desenvolver a confiança básica, mas o sucesso na realização dessa tarefa é resultado, em grande parte, das condições de afeto e responsividade que o ambiente 42 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM – representado por seus progenitores ou cuidadores – lhe proporciona (BEE & BOYD, 2011). Uma vez que aquela crise é superada de forma saudável, os efeitos que o indivíduo terá serão duradouros, pois ele vai adquirir virtudes que passarão a fazer parte dele. Por outro lado, a resolução não saudável de uma crise também terá efeitos duradouros, pois seus efeitos negativos terão impactos significativos sobre a pessoa e sobre as relações que ela vai estabelecer com as outras pessoas, consigo mesma e com o mundo (PAPALIA et al., 2009). AGORA É COM VOCÊ Você já parou para pensar nos fatores ambientais que influenciaram seu desenvolvimento? A sugestão é que você reflita sobre isso, identificando três das principais influências que atuaram sobre você durante sua infância e adolescência (podem ser pessoas, circunstâncias, eventos etc.), e buscando entender os efeitos que elas trouxeram sobre quem você é hoje. ESTÁGIOS DO DESENVOLVIMENTO PSICOSSOCIAL Erikson descreveu oito estágios do desenvolvimento psicossocial, que abrangem todo o ciclo de vida, desde o 43 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO nascimento até a velhice. Em cada um deles, é importante que o indivíduo aprenda a equilibrar os aspectos positivos e os negativos de forma saudável, ou seja, com predominância do aspecto positivo. Os estágios serão descritos a seguir: • Confiança básica versus desconfiança básica: esse estágio tem lugar entre o nascimento e os 12 a 18 meses, e a principal tarefa do bebê aqui é aprender a ver o mundo como um lugar que representa segurança, no qual ele poderá ter suas necessidades supridas. Ao mesmo tempo, ele também precisa aprender a ter um pouco de desconfiança, para conseguir perceber e lidar com situações em que esteja em perigo. Como resultado da resolução dessa crise, caso a confiança se sobressaia, a criança desenvolve a virtude da esperança. Mas caso a desconfiança se sobressaia, a criança passa a enxergar o ambiente externo como sendo ameaçador, desenvolvendo dificuldades para estabelecer relacionamentos íntimos e de confiança (PAPALIA et al., 2009); • Autonomia versus vergonha e dúvida: esse estágio acontece entre os 12 a 18 meses e os três anosde idade. A tarefa principal da criança nessa idade é 44 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM desenvolver a independência – ela começa a fazer as coisas sozinha: caminhar, alimentar-se, vestir- se, e seu comportamento passa do controle externo para o autocontrole – ao mesmo tempo em que aprende o papel da vergonha e da dúvida, pois a liberdade completa não é algo seguro. O resultado dessa crise, caso a independência predomine, é o desenvolvimento da virtude da vontade. Caso a vergonha ou a dúvida predominem, a criança pode desenvolver um senso de incapacidade e inadequação, e enfrentar dificuldades para tomar decisões (PAPALIA et al., 2009); • Iniciativa versus culpa: esse próximo estágio ocorre entre os três e os seis anos, e a tarefa principal que a criança tem que realizar aqui é desenvolver a iniciativa para experimentar coisas novas – ela já é capaz de fazer planos e implementá-los – ao mesmo tempo em que aprende sobre o lugar do sentimento de culpa, ao entender que algumas coisas não podem ser feitas. Como resultado da resolução dessa crise, caso a coragem e a iniciativa predominem, a criança desenvolve a virtude do propósito. Por outro lado, caso a culpa predomine, ela pode sentir-se subjugada pelo sentimento de fracasso, ou desenvolver a 45 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO necessidade de estar sempre se exibindo e falando de seus próprios feitos (PAPALIA et al., 2009); • Produtividade versus inferioridade: esse estágio tem lugar entre os seis anos e a puberdade. A principal tarefa que precisa ser realizada aqui é o desenvolvimento do senso de produtividade – através do aprendizado das habilidades que sua cultura reconhece e valoriza – ao mesmo tempo em que a criança reconhece suas limitações e imperfeições. O resultado da resolução dessa crise, caso a produtividade se sobressaia, é o desenvolvimento da virtude da competência, também chamada na Psicologia de “senso de autoeficácia”. Por outro lado, caso a inferioridade se sobressaia, a criança pode se tornar dependente da família, ou então se tornar um workaholic, ou seja, alguém que trabalha demais para compensar seus sentimentos de incapacidade. Esse estágio, em geral, coincide com a entrada da criança na escola formal e com sua alfabetização, o que pode ajudá-la a desenvolver o senso de competência e produtividade, ou contribuir para que ela se sinta incapaz e inferior, dependendo de como transcorrer esse processo (PAPALIA et al., 2009); 46 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM IMPORTANTE O estágio da produtividade versus inferioridade geralmente coincide com a entrada da criança na escola formal e com sua alfabetização, o que pode ajudá-la a desenvolver o senso de competência e de produti- vidade, ou contribuir para que ela se sinta incapaz e inferior, dependen- do de como transcorrer esse processo. • Identidade versus confusão de identidade: esse estágio acontece entre a puberdade e o início da fase adulta. A principal tarefa dessa fase é estabelecer o senso pessoal de identidade – ou seja, o senso de continuidade pessoal – ao mesmo tempo que o adolescente mantém sua capacidade de se adaptar às diferentes situações e demandas do ambiente. Caso o senso de identidade predomine, como resultado o adolescente irá desenvolver a virtude da fidelidade. Isso ocorre porque o senso saudável de identidade traz consigo o estabelecimento de um sistema de valores pessoais, juntamente com a capacidade de se manter estável e agir de forma previsível, o que permite ao indivíduo ser fiel a seus valores. Por outro lado, caso a confusão de identidade predomine, o adolescente pode experimentar confusão de papéis (PAPALIA et al., 2009); 47 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO • Intimidade versus isolamento: esse próximo estágio acontece com o jovem adulto. A principal tarefa dessa época da vida é desenvolver a intimidade, através do estabelecimento de compromisso – em geral, isso ocorre no processo de construção de um relacionamento amoroso duradouro -, sem que a pessoa perca sua individualidade. Como resultado da resolução dessa crise, caso a intimidade se sobressaia, a pessoa desenvolverá a virtude do amor. Por outro lado, caso o isolamento e a dificuldade de estabelecer relações íntimas se sobressaiam, a pessoa poderá sofrer consequências como o egocentrismo e o próprio isolamento social (PAPALIA et al., 2009); • Generatividade versus estagnação: o próximo estágio de desenvolvimento acontece ao longo da meia idade, e a principal tarefa a ser realizada aqui é desenvolver a capacidade de constituir e educar a próxima geração. Como resultado da resolução saudável dessa crise, caso a generatividade predomine, o indivíduo vai desenvolver a virtude do cuidado. Por outro lado, caso ele permaneça estagnado e não aprenda a cuidar de outros, ele poderá experimentar 48 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM sentimentos de empobrecimento pessoal e perda de sentido (PAPALIA et al., 2009); • Integridade versus desespero: esse é o último estágio descrito por Erikson, e ocorre durante a terceira idade. A principal tarefa a ser realizada aqui pelo idoso é aceitar a vida que viveu, da forma que viveu, bem como a realidade da proximidade da morte, ao mesmo tempo que reconhece que cometeu erros durante sua existência. Caso o senso de integridade se sobressaia, o idoso desenvolverá a virtude da sabedoria. Por outro lado, caso o sentimento de desespero predomine, o idoso poderá olhar para trás e experimentar sentimentos angustiosos ao relembrar sua trajetória, uma vez que é impossível retornar do começo e viver a vida novamente. CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA DE ERIKSON A teoria de Erikson trouxe grandes contribuições para as áreas de estudos do desenvolvimento humano e da educação. Conhecer os estágios do desenvolvimento descritos por ele, bem como as tarefas que seria importante que as crianças – e 49 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO os adultos – realizassem em cada etapa do desenvolvimento, pode servir de ferramenta para que o professor participe na promoção do desenvolvimento saudável de seus alunos. Além disso, é importante que o professor reconheça seu papel como transmissor dos pressupostos culturais, uma vez que, como figura de autoridade, ele é um representante dos valores de sua cultura. Essa prerrogativa, no entanto, precisa ser usada com responsabilidade, pois existe o risco do professor se aproveitar da autoridade de seu papel para fazer com que seus alunos sejam reprodutores de seus pressupostos pessoais, o que não deve acontecer. Por fim, compreender a importância e o papel da individualidade no desenvolvimento das pessoas também é fundamental. O professor tem responsabilidades quanto a transmitir os conteúdos previstos para a sala de aula, APEGO “Relacionamento ativo, afetuo- so, recíproco e duradouro entre pessoas cuja interação fortalece ainda mais sua ligação”. 50 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM mas é fundamental que, no processo de ensinar, ele também leve em consideração a individualidade de seus alunos e, na medida do possível, respeite sua forma e ritmo de aprendizado. TEORIA DO APEGO DE BOWLBY O conceito de apego é descrito por Papalia (2009) como sendo um “relacionamento ativo, afetuoso, recíproco e duradouro entre pessoas cuja interação fortalece ainda mais sua ligação”. O estudo dessa classe específica de relacionamentos é o foco da teoria do apego, teoria essa que oferece uma base importante para a área de estudos do desenvolvimento humano. John Bowlby, principal estudioso da teoria do apego, buscou entender o desenvolvimento da personalidade em situações adversas – mais especificamente ocasiões em que as crianças são separadas de suas mães ou responsáveis principais, deixando de receber o cuidado materno e o apoio emocional durante os primeiros meses de vida. Nessa teoria, entende-se que, desde suas primeiras experiências de vida, a criançabusca por proximidade afetiva e apoio psicológico de seus cuidadores, como forma de sobrevivência, assim como ela busca pelo suprimento de suas necessidades fisiológicas (ABREU, 2005). 51 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO Para que o apego se estabeleça de forma saudável, existem alguns aspectos fundamentais que deveriam estar presentes no comportamento dos cuidadores da criança. São eles: cuidado responsivo, sensibilidade e constância ou regularidade na atenção às necessidades da criança. De acordo com a teoria, a situação ideal para que o apego se desenvolva é o ambiente de alimentação do bebê (PAPALIA et al., 2009). O apego que a criança constrói com seus cuidadores durante a infância terá influências importantes sobre o restante de sua vida, pois ela terá a tendência de construir, com outras pessoas, relacionamentos semelhantes aos que foram formados em seus primeiros anos. Isso significa que, se as relações construídas com seus progenitores eram próximas e permeadas por afetos positivos, suas relações na vida adulta provavelmente também serão assim; e o contrário, infelizmente, também é verdadeiro (PAPALIA et al., 2009). Para estudar as formas de apego, também chamado de vínculo, Bowlby e seus seguidores utilizaram o que ficou conhecido como Experimento da Situação Estranha, um ensaio conduzido em laboratório que analisava as reações de bebês ao serem separados de suas mães, e depois ao se encontrarem novamente com elas. Como resultado desses experimentos, eles descreveram três principais tipos de vínculo, ou apego, que as 52 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM crianças desenvolvem com seus cuidadores principais, aos quais foi acrescentado um quarto tipo, por estudiosos que fizeram releituras dessa teoria. Os três tipos descritos por Bowlby (1989, apud ABREU, 2005) e Ainsworth (1978, ABREU, 2005) foram o apego seguro, o apego evitativo e o apego resistente/ambivalente (ABREU, 2005; PAPALIA, 2009). O tipo que foi acrescentado posteriormente foi o apego desorganizado/desorientado (MAIN & SOLOMON, 1986, apud ABREU, 2005). TIPOS DE APEGO Os três tipos descritos por Bowlby e Ainsworth foram o apego seguro, o apego evitativo e o apego resistente/ ambivalente. O apego desorganizado/desorientado foi acrescentado a essa lista posteriormente. • Apego seguro: nesse tipo de apego, a criança vê a mãe (ou seu cuidador principal) como alguém que lhe oferece um apoio seguro, um porto seguro. Bebês que têm apego seguro ficam ressentidos quando a mãe se distancia, e ficam alegres quando ela retorna para perto deles. Como resultado do vínculo seguro que estabeleceram, essas crianças sentem-se à vontade para explorar seu entorno, e retornam para 53 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO perto da mãe sempre que sentem a necessidade de reaver a segurança. Quando observadas em situações em que sua mãe estava ausente, como, por exemplo, em creches, essas crianças apresentavam mais abertura para a cooperação e maior capacidade intelectual do que as outras, e eram mais populares (ABREU, 2005; PAPALIA et al., 2009); • Apego evitativo: nesse tipo de apego, a criança não vê a mãe como uma base segura, e não a procura quando sente necessidade de apoio. Quando a mãe sai do ambiente, a criança não chora nem fica ressentida; e quando a mãe volta, a criança tem a tendência de evitá-la. Crianças com apego evitativo não se sentem confortáveis no colo da mãe, mas também não gostam de ser colocadas no chão. Os pais de crianças com apego evitativo geralmente oscilam entre a disponibilidade/prestatividade e o afastamento emocional, e, frequentemente, ameaçam abandonar seus filhos a fim de coagi-los e controlá-los (ABREU, 2005; PAPALIA et al., 2009); • Apego resistente/ambivalente: nesse tipo de apego, a criança apresenta sentimentos ambíguos em relação à mãe. Quando ela sai do ambiente, eles 54 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM experimentam sentimentos de raiva e insegurança; quando ela volta, eles buscam proximidade, mas ao mesmo tempo agem de forma agressiva e hostil, chutando-a e se contorcendo. Crianças com apego resistente não costumam explorar o ambiente, pois não se sentem suficientemente seguras para isso. De acordo com a teoria, essas crianças acreditam que, se buscarem ajuda ou apoio de seus cuidadores, não serão acolhidas, e sim, rejeitadas (ABREU, 2005; PAPALIA et al., 2009); • Apego desorganizado/desorientado: de acordo com a teoria, esse é o tipo de apego menos seguro de todos. Nesse tipo, as crianças apresentam um padrão mais confuso de apego, vivenciando instabilidade de sentimentos e afetos, e parecem estar sempre se sentindo amedrontadas. Os pais de crianças com apego desorganizado/desorientado com frequência têm traumas emocionais que não foram resolvidos, que podem incluir abuso físico e sexual, e muitas vezes esperam que seus filhos lhes ofereçam algum suprimento das carências emocionais, ao invés de eles mesmos exercerem esse papel (ABREU, 2005; PAPALIA et al., 2009). 55 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO TEORIA DO APEGO E APRENDIZAGEM Idealmente, um ambiente saudável para a aprendizagem seria formado por professores e por alunos que desenvolveram apego seguro com seus cuidadores nos primeiros anos de vida. Como esse cenário não é possível, uma vez que as pessoas vivenciam as mais diversas experiências emocionais no início de suavida, temos como resultado disso o desenvolvimento dos mais diversos tipos de apego, e isso vai influenciar as relações que vão construir com outras pessoas. Frente a isso, é importante que o professor compreenda as formas diferentes de vinculação que as crianças podem desenvolver em relação a ele. Por outro lado, é importante que ele também tenha em mente que os sentimentos que seus alunos direcionam a ele em geral são inconscientes, e resultam da forma de vínculo que aprenderam a construir durante seus primeiros anos de vida. Além disso, também é fundamental que o professor busque compreender as formas de vínculo que desenvolveu com seus progenitores, durante sua infância, porque isso vai ajudá-lo a compreender as relações que estabelece com seus alunos, bem como os resultados que isso traz sobre 56 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM seu ensino. Caso os resultados sejam negativos, ele pode trabalhar para superar essas dificuldades, o que trará efeitos positivos sobre seu trabalho, aumentando as chances de sucesso no ensino. TEORIA BIOECOLÓGICA DE BRONFENBRENNER A teoria de Urie Bronfenbrenner (1917-2005) também trouxe contribuições importantes para o estudo do desenvolvimento humano. Ela é conhecida como teoria ecológica, uma vez que considera o efeito de diferentes sistemas sobre o processo de desenvolvimento, analisando a interação desses sistemas sobre a formação da personalidade. A teoria ecológica é uma teoria do desenvolvimento desenvolvida por Urie Bronfenbrenner que considera o efeito de diferentes sistemas sobre o processo de desenvolvimento, analisando a interação desses sistemas sobre a formação da personalidade. Ela passou por algumas modificações; mas, em sua versão mais recente, ela defende que existem quatro principais aspectos que interagem e atuam sobre o indivíduo em desenvolvimento: a pessoa, o processo, o contexto e o tempo (MARTINS & SZYMANSKI, 2004). 57 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO • Pessoa: aqui estão incluídos todos os aspectos relacionados à individualidade. Eles compreendem as características biológicas, características de personalidade, os valores pessoas e as metas do indivíduo; • Processo: na teoria ecológica, o desenvolvimento é visto como um processo, que ocorre de forma progressiva, e que resulta em interações cada vez mais complexas entre o indivíduo e seu ambiente; • Contexto: no contexto, estão incluídos os diferentes ambientes em que o indivíduo convive: família, trabalho, escola, comunidade, e a cultura/sociedade em que ele vive. Esses ambientes influenciamo indivíduo de forma direta e indireta; • Tempo: o tempo se refere ao contexto histórico, ou seja, à época em que se dá o desenvolvimento da pessoa, uma vez que cada época tem seus pressupostos e costumes, e também às várias mudanças pelas quais ela passa ao longo de seu tempo de vida (MARTINS & SZYMANSKI, 2004). 58 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM O ambiente escolar, incluindo sua cultura e valores, representa um contexto que tem efeitos importantíssimos sobre o desenvolvimento das pessoas. Além disso, ele promove o aprendizado de conteúdos que permitem que o pensamento delas, bem como sua relação com o mundo, se torne mais complexo. Por fim, a escola geralmente está presente na vida das pessoas por um tempo prolongado, o que implica que a influência da escola sobre o desenvolvimento individual é marcante e definitiva. CONSIDERAÇÕES FINAIS Durante a leitura, pudemos perceber a importância do estudo do desenvolvimento humano para o campo da aprendizagem. Como foi observado, o ser humano é composto por diferentes aspectos, e esses diferentes aspectos interagem de diversas formas para formar cada um de nós, nos tornando únicos. Vimos que o desenvolvimento humano é o campo de estudos que se debruça sobre as mudanças pelas quais as pessoas passam ao longo de seu ciclo de vida; vimos também que, na infância e na adolescência, essas mudanças são intensas e marcantes, e que o processo de aprendizagem é um dos aspectos que participa nessas mudanças. 59 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO Também aprendemos sobre algumas teorias do desenvolvimento humano, e pudemos compreender conceitos centrais de cada uma dessas teorias. As diferentes teorias do desenvolvimento humano, apesar de enxergarem o processo de desenvolvimento sob diferentes óticas, não são auto excludentes, mas complementares. Os diferentes conceitos apresentados por cada uma das teorias podem se somar para nos ajudar a compreender o ser humano e seu desenvolvimento sob várias perspectivas, tornando nossa visão mais abrangente e completa. E tudo isso serve, em última instância, para nos ajudar a atingir mais sucesso na tarefa de promover o aprendizado de nossos alunos. Conhecer o desenvolvimento humano e os aspectos físicos, cognitivos, sociais e psicológicos que o influenciam também pode contribuir para que nós nos tornemos pessoas melhores. Por quê? Porque o estudo desse tema nos ajuda a refletir sobre nosso próprio desenvolvimento, quais as influências que sofremos ao longo da vida, como isso nos afeta hoje em dia e como isso influencia nosso trabalho e nossas relações. De posse dessa compreensão, podemos aprender a lidar de forma diferente com as situações e chegar a ter mais sucesso do ponto de vista pessoal, familiar, profissional etc. 60 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E DA APRENDIZAGEM Por fim, sugerimos que você prossiga seus estudos sobre os assuntos apresentados aqui, não se limitando ao que está escrito nessas últimas páginas, pois essa área do conhecimento é muito vasta, e se fôssemos procurar abordar tudo o que existe de publicação sobre o tema, precisaríamos de muitos e muitos livros. REFERÊNCIAS ABREU, C. N. Teoria Do Apego. Casa do Psicólogo, 2005. BEE, H.; BOYD, D. A Criança em Desenvolvimento. 12 ed. Artmed, 2009. CLONINGER, S. C. Teorías de la personalidad. Pearson Educación, 2002. HALL, C. S.; LINDZEY, G.; CAMPBELL, J. B. Teorias da personalidade. Artmed Editora, 2000. HAREVEN, T. Historical changes in the family and the life course: implications for child development. Monographs of the Society for Research in Child Development, p. 8-23, 1985. 61 TEORIAS DO DESENVOlVIMENTO LEITE, A. A. M.; SILVA, M. L. Um estudo bibliográfico da Teoria Psicossocial de Erik Erikson: contribuições para a educação. Debates em Educação, v. 11, n. 23, p. 148-168, 2019. MARTINS, E.; SZYMANSKI, H. A abordagem ecológica de Urie Bronfenbrenner em estudos com famílias. Estud. pesqui. psicol., Rio de Janeiro, v. 4, n. 1, jun. 2004. MOTA, M. E. Psicologia do desenvolvimento: uma perspectiva histórica. Temas em psicologia, v. 13, n. 2, p. 105-111, 2005. PAPALIA, D. E.; OLDS, S. W.; FELDMAN, R. D. Desenvolvimento humano. Porto Alegre: Artmed, 2009. POULAIN T., VOGEL M., KIESS W. Review on the role of socioeconomic status in child health and development. Curr Opin Pediatr, v. 32, n. 2, p. 308-314, Apr 2020. Disponível em: https:// pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31895161/. Acesso em: 12 jun. 2023. QUINTANA, S. M. et al. 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Teorias do desenvolvimento Introdução O desenvolvimento humano e seu campo de estudos Influências que atuam sobre o curso do desenvolvimento Teoria psicossexual de Freud Biografia de Freud O conceito de inconsciente Id, ego e superego Mecanismos de defesa Fases do desenvolvimento psicossexual Contribuições de Freud à educação Críticas à teoria Teoria psicossocial de Erikson O conceito de ego Estágios do desenvolvimento psicossocial Contribuições da teoria de Erikson Teoria do apego de Bowlby Tipos de apego Teoria do apego e aprendizagem Teoria bioecológica de Bronfenbrenner considerações finais Referências Teorias da aprendizagem Introdução A aprendizagem humana e seu campo de estudos Visões sobre o contato com o conhecimento Abordagens sobre aprendizagem Cosmovisão cristã Teoria comportamental de Skinner Biografia de Skinner Conceitos centrais Contribuições para a educação e críticas à teoria Teoria construtivista de Piaget e teoria histórico-cultural de Vygotsky Breve biografia e contexto histórico Organização, adaptação e equilibração Estágios do desenvolvimento cognitivo Desenvolvimento moral História de Vygotsky Vygotsky e a troika Vygotsky e a zona de desenvolvimento proximal e aprendizagem Contribuições das teorias de Piaget e Vygotsky para a educação Teoria sociocognitiva de Bandura Breve biografia de Albert Bandura Mecanismos de modelagem e imitação Determinismo recíproco na teoria sociocognitiva Contribuições da teoria de Bandura Considerações finais Referências As teorias do desenvolvimento e da aprendizagem na educação Introdução Teoria e prática na formação e atuação de professores Tipos de abordagem Tipos de natureza Tipos de procedimentos metodológicos Tipos de objetivos Considerações sobre pesquisa e teoria na educação O educador frente à diversidade teórica As teorias do desenvolvimento e da aprendizagem nas práticas pedagógicas Aplicação do behaviorismo na sala de aula Aplicação do cognitivismo na sala de aula Aplicação do construtivismo em sala de aula As teorias do desenvolvimento e da aprendizagem nas relações educativas Considerações finais Resumo Referências As dificuldades de aprendizagem Introdução Dificuldades e transtornos específicos da aprendizagem Dislexia, disgrafia, disortografia e discalculia Transtorno do déficit de atenção e hiperatividade, transtorno do espectro autista e deficiência intelectual Transtorno do Espectro Autista Deficiência intelectual A epistemologia convergente de Jorge Visca Processo de diagnóstico da dificuldade de aprendizagem na teoria de Jorge Visca Considerações finais Referências
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