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Prévia do material em texto

Aspectos sociolinguísticos da Língua Brasileira de Sinais
Prof. Roberto de Freitas Junior
Descrição
Apresentação dos modelos teóricos da Sociolinguística no contexto da Libras: a Sociolinguística Variacionista e a Sociolinguística Interacional.
Propósito
Discutir os principais conceitos da Sociolinguística Variacionista e da Sociolinguística Interacional articulados com a realidade das comunidades
usuárias de Libras, a fim de ampliar a visão sobre língua e sociedade.
Preparação
Tenha à mão um dicionário de Linguística para consultar os termos específicos da área. Na Internet, você pode acessar o Dicionário de Termos
Linguísticos, hospedado no Portal da Língua Portuguesa.
Objetivos
Módulo 1
Variação linguística e a mudança na língua
Identificar os tipos de variação linguística e a mudança na língua.
Módulo 2
Sociolinguística e o contexto educacional da Libras
Relacionar a Sociolinguística com o contexto educacional da Libras.
Introdução
Algumas questões importantes relacionadas aos aspectos sociolinguísticos da Língua Brasileira de Sinais são:
Como explicar o fato de que falantes de uma mesma língua a usem de modo tão diferente?
Você já reparou como uma pessoa modifica seu modo de falar, quando se encontra em uma festa com amigos ou quando está em uma
reunião de trabalho?
Notou como pessoas de diferentes grupos sociais escolhem palavras e expressões específicas?
E o que dizer da dificuldade que pessoas mais idosas às vezes apresentam para entender a fala de adolescentes e vice-versa?
Essas questões nos apontam para alguns fenômenos ou processos que verificamos no uso de determinada língua e que nos interessam aqui.
Estudaremos os diferentes tipos de variações pelas quais as línguas passam, como isso se relaciona com a mudança em determinada língua e
como os aspectos sociais e linguísticos interferem no diálogo com textos distintos, sem deixar de considerar em todas essas questões o contexto
da Libras, a Língua Brasileira de Sinais.
1 - Variação linguística e a mudança na língua
Ao �nal deste módulo, você identi�cará os tipos de variação linguística e a mudança na língua.

Os estudos linguísticos e a sociolinguística
Uma das maiores contribuições da Linguística sobre o funcionamento e a natureza da linguagem advém da corrente Sociolinguística, que tem por
princípio básico o estudo da linguagem em diferentes recortes e realidades sociais.
Será por meio da Sociolinguística que trataremos do uso da língua e das situações de variação e mudança, pois essa corrente se localiza no campo
dos estudos da linguagem como uma área de teorização e investigação que observa aspectos relacionados à variação e à mudança linguística.
A Sociolinguística também trata de tendências relacionadas aos usos que diferentes grupos sociais fazem da língua, e das ideologias e relações de
poder envolvidas no processo de percepção, legitimação e estigmatização dessas formas de uso da língua.
A Sociolinguística se impõe como um campo de ação diverso, na medida em que se desdobra em áreas da
interface linguagem/sociedade, trazendo contribuições para o entendimento das relações interacionais, para a
descrição linguística em diferentes momentos do curso de formação da língua e para o enriquecimento de outras
áreas, como a educação e a política.
Ao focalizar o uso real e efetivo da língua por indivíduos socialmente localizados, a Sociolinguística se coloca no campo das ciências humanas e
sociais, subsidiando discussões voltadas para o valor ou reconhecimento das formas de expressão de grupos majoritários e minoritários.
Comentário
No contexto da discussão sobre as línguas de sinais, línguas de minorias linguísticas compostas por indivíduos surdos, por exemplo, a
Sociolinguística traz informações importantes para o combate ao preconceito linguístico.
Aqui vamos tomar dois direcionamentos, a fim de entender um pouco sobre alguns princípios da Sociolinguística e como essa corrente dialoga com
as discussões sobre a Libras e sua comunidade linguística. Trataremos, portanto, das duas grandes áreas, tradicionalmente falando, da
Sociolinguística:

A Variacionista

A Interacional
A sociolinguística
No início da década de 1960, William Labov, que posteriormente se tornaria um dos maiores linguistas da história, desenvolveu dois grandes
estudos:
Uma grande investigação sobre o inglês falado na ilha Martha's Vineyard, em Massachusetts, Estados Unidos.
Um estudo de mesma natureza, com o dialeto falado na cidade de Nova York.
Em ambos os estudos, seu objetivo era mostrar:
O papel crucial dos fatores sociais na explicação da variação linguística.
O autor identificou que a variação de usos linguísticos de funções e significados semelhantes era altamente controlada e organizada por fatores
ligados aos perfis sociais de seus falantes, além de fatores internos de seus dialetos.
A partir dos estudos de Labov, foi superada a ideia de que a variação linguística seria aleatória e não sistêmica. A ideia de que a variação seria
ordenada tornou-se um contraponto ao pensamento de que a língua se organizaria estruturalmente a despeito de seus falantes e seus usos
diversos.
Resumindo
A variação linguística passou a ser entendida como objeto não aleatório, baseando-se na correlação existente entre fatores linguísticos e sociais.
Vários pontos são identificados a partir dessa discussão, dos quais destacamos:
O fato da heterogeneidade sistematizada
A despeito da irregularidade observada no uso da língua, existe um conceito de homogeneidade advindo de certa concepção linguística que
consiste em entender a língua como um sistema fechado de regras e possibilidades, como um objeto homogêneo, estruturalmente consistente e
previsível, a partir de suas próprias possibilidades internas de arranjo.
Essa é a concepção estruturalista da língua.
Nesse sentido, o uso individual da língua é visto como o lugar do caos, da não regularidade, o lugar onde múltiplas formas surgem, como as formas
menos legitimadas de um grupo social. Por outro lado, a dimensão coletiva ou social da língua representa o regular, o sistêmico, o homogêneo.
Uso individual da língua
Caos
Uso coletivo ou social da língua
Regularidade
O fato da heterogeneidade
sistematizada
O aparato metodológico
variacionista
A relação entre variação e
mudança linguísticas

As pesquisas de Labov e toda a prática sociolinguística variacionista mostraram, entretanto, que a suposta homogeneidade linguística, prevista pela
perspectiva estruturalista, poderia ser questionada pela ideia de heterogeneidade sistematizada.
O que vem a ser essa heterogeneidade sistematizada?
Trata-se de um fato verificável em qualquer língua natural ao notarmos que a variação linguística é controlada e fortemente condicionada por
fatores inerentes à língua e por outros a ela externos: os fatores sociais.
Há, portanto, uma dimensão probabilística nesse contexto: a tendência de que determinados usos ocorram em dado contexto, graças à ação desse
conjunto de fatores.
Atenção!
É um grande erro acharmos que o modo diferenciado como as pessoas se expressam para dizer a mesma coisa possa ser classificado
simplesmente como resultado de escolhas aleatórias, ignorância, déficit cognitivo e tantos outros argumentos que costumamos testemunhar
quando o assunto é a maneira diferenciada como todos nós nos expressamos.
Qualquer fenômeno de variação linguística é explicável, portanto, por um conjunto de fatores relacionados que pode apontar o modo como as
possibilidades de usos para um mesmo sentido se distribuem na língua.
É nessa combinação de fatores que identificaremos o que há de sistemático na heterogeneidade linguística. A visão de homogeneidade linguística
estruturalista é posta em xeque pela proposta da heterogeneidade sistematizada da Sociolinguística, que mostra que nada na língua é, por assim
dizer, caótico.
Exemplos do funcionamento da variação
Gerúndio e ressilabi�cação
Para falar dos fatores que explicam o funcionamento sistêmico da variação, vejamoso caso dos gerúndios no português do Brasil (PB):
Há um fenômeno de variação no uso do gerúndio, a realização ou apagamento do fonema /d/.
Atualmente, observamos brasileiros usando as formas mais tradicionais /ando/, /endo/ e /indo/, mas também é comum encontrarmos o seu uso
com apagamento, como verificamos inclusive no registro escrito das formas <andano>, <bebeno> e <vino>. Podemos levantar várias hipóteses
sobre os fatores internos e fatores externos relacionados ao fenômeno em questão.
Fatores internos
Se pensarmos em termos de fatores internos, veremos que talvez esse seja um fenômeno relacionado à possibilidade de ressilabificação, isto é, de
reestruturação das sílabas: o apagamento do fonema /d/ não compromete a recuperação do sentido da palavra, já que o último fonema da sílaba
anterior é uma consoante que é reanalisada como parte da nova sílaba em conjunto com a vogal final e guardando o morfema marcador do
gerúndio.
Esse condicionamento está previsto pelas possibilidades de articulação das palavras no português do Brasil, e o exemplo nos mostra que existem
fatores internos do sistema linguístico do português que se relacionam à questão do apagamento do fonema /d/ nesse contexto. Não se trata,
portanto, de um acontecimento (um fenômeno) aleatório.
Fatores externos
Se pensarmos em termos de fatores externos, veremos que talvez pessoas com maior grau de escolaridade apresentem menos o apagamento que
pessoas de menor grau de escolarização. Veremos, talvez, que pessoas de determinada região geográfica apresentem menos o apagamento em
comparação com pessoas de outras regiões do país.
Podemos nos perguntar sobre o que estaria contribuindo para essa variação regional. Talvez percebamos que, a depender do grau de formalidade
de dada situação linguística, as pessoas possam estar mais ou menos sujeitas a realizar o apagamento do fonema em questão.
Vale notar que estamos falando de realizações que ocorrem inconscientemente, o que evidencia a sistematicidade natural do fenômeno de variação,
aqui exemplificado.
Gerúndio no PB e portugês de Portugal
A heterogeneidade linguística pode ser identificada, também, a partir do exemplo apresentado, se compararmos a variedade do português de
Portugal e a do PB.
A variedade europeia prevê o uso da forma [ESTAR + a + Verbo no infinitivo] para construções no gerúndio, como
em <estou a cantar> e <estou a beber>.
Vemos aqui outro desdobramento sobre a discussão da variação e sobre o fato de ela ser, ou não, prevista a partir de fatores diversos. Se
pensarmos no português brasileiro e no português europeu como uma mesma língua, teremos um caso de variação regionalmente orientada e que
revela implicações internas ainda mais complexas e específicas de cada variedade.
Vemos, assim, que a diversidade linguística pode ser descrita por fatores internos e externos aos usos, às variedades, aos dialetos etc.
Resumindo
Considerando os conjuntos de fatores (internos e externos) à língua, e que atuam na realização (articulação) ou no apagamento do fonema /d/,
vemos que tal fenômeno não é algo que acontece de modo aleatório ou não previsível. Trata-se de um fenômeno que pode ser cientificamente
descrito.
Os tipos de variações linguísticas
O tratamento científico sobre a variação linguística permite a identificação de ao menos três agrupamentos, três tipos de variações linguísticas, que
são diastrática (social), diatópica (regional) e diafásica (estilística/registro).
Tais agrupamentos são identificados no uso de qualquer língua natural, independentemente de serem línguas orais ou de sinais.
Os fenômenos podem acontecer em qualquer nível da língua:
Nível fonológico
Na pronúncia
Nível semântico/lexical
Entre as palavras
Nível morfossintático
N ã d f
Mas, lembre-se:
Em todos os níveis, esses fenômenos estarão sujeitos tanto à pressão de fatores linguísticos quanto sociais.
Vamos conhecer agora cada um dos três tipos de variações linguísticas:
O agrupamento das variações diastráticas aponta para os fenômenos que apresentam condicionamentos de ordem não especificamente
linguística, mas de orientação social. Assim, identifica-se a distribuição de usos específicos em subgrupos de macrogrupos sociais.
É possível localizar e explicar, por exemplo, as diferenças na distribuição de formas de mesmo sentido, existentes nas falas de indivíduos de
sexos ou gêneros diversos, crianças e idosos, pessoas com diferentes graus de escolarização e assim por diante.
A variação diastrática corresponde aos diferentes modos de uso da língua em função da classe social ou do grau de escolaridade.
As variações diatópicas, por sua vez, são aquelas em que verificamos diferenças de usos entre subgrupos regionais de um grupo maior. É
possível localizar diferenças de usos entre falantes, explicáveis em decorrência da localização em que se encontram.
Assim, a variação diatópica é a que se dá na dimensão geográfica, do espaço. Os diferentes dialetos de uma língua ou os regionalismos (o
dialeto carioca, o dialeto caipira etc.) são exemplos de variação diatópica.
A alternância entre “mexerica”, nas regiões Sudeste e Centro-Oeste no Brasil, e bergamota, na região Sul, também ilustra a variação diatópica.
Os fenômenos de variação que compõem o agrupamento das variações diafásicas são aqueles que refletem como o uso da língua é sensível
ao contexto de uso, ao registro, às situações comunicativas diversas e que nos levam a optarmos, em geral, inconscientemente, por registros
mais ou menos formais e adequados de usos.
Assim, a variação diafásica corresponde às diferenças de modalidades expressivas, ou seja, os diferentes usos de uma mesma língua em
função do contexto, da situação de comunicação, da atividade profissional etc.
Por exemplo, a maneira de um professor se expressar em sala de aula, em um discurso professoral ou acadêmico, é distinta do jeito como se
expressa em uma roda de conversa com amigos.
Na construção das frases
Nível discursivo-pragmático
Em como o discurso é construído
Variações diastráticas 
Variações diatópicas 
Variações diafásicas 
Vejamos um exemplo que reúne os três tipos de variação.
Exemplo
Imagine o seguinte diálogo:
- Zé, desta vez cheguei bem cedinho para não perder a cavalgada!
- Poxa, fiz ocê madrugá! Coitado!
Nesse pequeno diálogo, podemos ilustrar o funcionamento dos três agrupamentos de variações que estudamos até aqui:
O uso das formas <ocê> e <madrugá>, sem a pronúncia do /R/ final, pode estar associado à fala de pessoas com menor grau de escolaridade,
opondo-se a formas como <você> e <madrugar>, as quais possivelmente surgiriam com maior probabilidade nas falas de grupos de maior
escolarização, ilustrando a variação diastrática.
O uso das formas <você> e <ocê>, por exemplo, ilustra um tipo de variação existente entre a fala de pessoas de centros urbanos e pessoas do
interior, uma variação regional, ou seja, diatópica.
O uso de <cedinho>, <Poxa!> e <Coitado!> aponta para o grau de informalidade da situação comunicativa. Em situações mais formais, os itens
<cedo>, <Lamento!> e <Pobre rapaz!> seriam preferidos, ilustrando um caso de variação diafásica.
A variação linguística nas línguas de sinais também se materializa por fatores linguísticos, em geral, relacionados a seus parâmetros fonológicos e
a fatores sociais ligados aos seus usuários.
No âmbito da variação diastrática, identificamos diferenças na forma dos sinais DIA, PAI, SIM e NUNCA. Tais sinais são tradicionalmente
denominados como sinais soletrados, graças ao uso da datilologia, quando foram incorporados à Libras via empréstimo do PB.
atilologia
É a representação ortográfica, via uso do alfabeto manual, usada pelos usuários de línguas de sinais para a representação de palavras das línguas orais
que ainda não possuem um sinal específico na Libras, como nome de pessoas, lugares e termos técnicos.
Alfabeto da Língua Brasileira de Sinais.
A importância dessas palavras no uso diário, sua frequência de uso e vários outros fatores relacionadosà sua incorporação nesse sistema fizeram
com que elas sofressem erosão fonológica, uma alteração importante na maneira como são representadas e que indica perda da soletração e a
emergência de um único sinal, em bloco.
De algum modo, esses sinais guardam semelhança com as formas datilológicas originais, mas são diferentes. Usuários da Libras mais novos
podem, portanto, usar os sinais DIA, PAI, SIM e NUNCA de maneira diferenciada de falantes mais velhos, por não terem sido expostos com maior
frequência às formas datilológicas originais, indicando uma mudança linguística importante nesse sistema linguístico.
Exemplos de variações em Libras
O sinal NUNCA, originado a partir da soletração N-U-N-C-A, passa a ser realizado com as configurações de mão em <N> e <U>, alternadamente e
com mais velocidade, sem a realização das letras referentes à palavra no português, como pode ser visto na imagem a seguir:
Sinal de Nunca com as configurações de mão em <N> e <U>.
Na Libras, alguns exemplos clássicos de variação diatópica consistem nos sinais correspondentes às palavras BRANCO, TREM, ÔNIBUS, PESSOA e
FRUTA.
Os conceitos <branco> e <trem> em Libras são formalmente representados por um item lexical (um sinal) no Rio de Janeiro e outro em São Paulo.
Isso também ocorre com <ônibus> e <pessoa>, que apresentam formas diferentes no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul. Com o item <fruta>, há
uma forma em Pernambuco e outra nos demais estados brasileiros.
O sinal de FRUTA, no Rio de Janeiro e em vários locais do Brasil, é o mesmo de MAÇÃ, acrescido da palavra VÁRIOS [MAÇÃ + VÁRIOS], conforme
vemos na figura a seguir:
Sinal de Fruta no Rio de Janeiro e em vários locais do Brasil.
Em Pernambuco, entretanto, a palavra FRUTA é apresentada na configuração da letra <F< do alfabeto manual, com localização na bochecha do
usuário, que é pressionada pelo dedo indicador.
Na composição do sinal, há ainda o movimento esquerda-direita da mão. Novamente, a diferença de representação formal do sinal FRUTA, que é
orientada por distribuição regional, é um exemplo de variação diatópica.
A alternância de uso de idiomatismos típicos de contextos comunicativos de menor grau de formalidade e de outras expressões de mesmo sentido
pode exemplificar a variação diafásica em Libras: seus usuários saberão qual forma usar em qual contexto comunicativo apesar da semelhança de
sentido. Do mesmo modo, a interpretação para Libras de discursos políticos, em geral da maior formalidade, apresentará marcas linguísticas mais
associadas ao registro formal dessa língua.
Resumindo
A variação linguística, em suma, reflete a diversidade linguística, por sua vez, espelhada na diversidade sociocultural das comunidades linguísticas,
inclusive a da comunidade surda.
A visão da heterogeneidade sistematizada reflete a imbricada teia que constitui os grupos, em todas as suas interfaces e seus perfis, e revela as
idiossincrasias do nível individual. Assim, os conceitos de dialeto e de idioleto emergem na discussão sociolinguística, apontando para as variantes
usadas pelos múltiplos agrupamentos sociais, no caso dos dialetos, e para a língua falada ou sinalizada do indivíduo, no caso dos idioletos.
Características sociais, identitárias, históricas e culturais desses grupos são refletidas na língua, que emerge como espelho do seu contexto social
maior, mas que também funciona como fator identitário no nível do indivíduo.
O aparato metodológico variacionista
Uma das maiores contribuições do advento da Sociolinguística Variacionista, ou Teoria da Variação, foi a incorporação de uma metodologia,
proposta para a análise e interpretação dos fenômenos de variação, contemplando a observação da interação dos fatores, linguísticos e
extralinguísticos, condicionantes dos fenômenos observáveis.
A incorporação do tratamento estatístico para as análises sociolinguísticas, portanto, permite a observação do que é ou não relevante em termos de
condicionamentos estruturantes dos fenômenos em variação. Assim, atrelada à identificação de dado fenômeno variável está a observação sobre
as formas em competição, as variantes linguísticas, sobre as quais se voltará a investigação.
As variantes linguísticas são as diferentes formas identificadas na língua e que expressam o mesmo sentido, o
mesmo valor de verdade. As variáveis independentes são o conjunto de fatores, linguísticos ou extralinguísticos,
relacionado ao uso de uma ou outra forma em competição.
Segue-se, então, uma sequência, mais ou menos fixa, mais ou menos ordenada, de etapas metodológicas que embasam a investigação científica
para a descrição dos fenômenos da língua:
Levantamento do(s) corpus/corpora para identi�cação de dados
Coleta e registro de dados
Formação da amostra
Delimitação dos per�s sociais dos indivíduos
Levantamentos de hipóteses
Transcrição
Submissão ao tratamento estatístico
Análises
Por meio da análise estatística sobre como os diferentes grupos sociais usam a língua, é possível identificar os fatores significativamente
relevantes para a explicação das regularidades da variação. Ela se dá da seguinte forma:
Os fatores envolvidos nos condicionamentos sobre os usos das formas podem ser diversos. As variáveis linguísticas são as de natureza fonológica,
morfossintática, semântica e discursivo-pragmática.
As variáveis extralinguísticas, de orientação mais social, podem ser resumidas em: idade, região, gênero/sexo, estrato social, grau de escolarização
etc., podendo ainda serem adicionadas variáveis relacionadas ao contexto de uso das formas e seus gêneros discursivos.
A relaçāo entre variaçāo linguística e mudança
A terceira observação, vinda a partir da perspectiva sociolinguística, consiste na relação existente entre variação e mudança. Se a heterogeneidade
linguística é controlada a partir de fatores condicionantes específicos, esses mesmos fatores podem ajudar a explicar os motivos que levam
determinada forma competidora, em variação, a ser implantada no sistema não mais em contexto de alternância, mas como única possibilidade,
implicando a mudança.
Atenção!
Em primeiro lugar, é preciso salientar que fenômenos em variação não significam necessariamente mudança linguística em curso. O dinamismo da
língua é refletido na variação e na mudança, mas isso não significa dizer que toda variação aponte necessariamente para um processo de mudança
linguística em curso.
Considere, por exemplo, o caso dos pronomes “você” e “Vossa Mercê” no português brasileiro (PB).

Em um determinado intervalo de tempo, eles estiveram em variação (ou seja, competiam pela expressão do significado SEGUNDA PESSOA DO
SINGULAR).

A partir de uma abordagem
controlada para o estudo da
linguagem, é possível chegar
a conclusões embasadas
sobre os fatores que explicam
a aparentemente caótica, mas
regular natureza da variação.
A escolha criteriosa de um
conjunto de textos, orais,
escritos ou sinalizados,
consiste na observação dos
ambientes de uso em que
determinado fenômeno estará
mais suscetível a emergir.
Dessa escolha decorre o
trabalho de identificação, a
coleta e o registro das
diversas variantes linguísticas
e seus contextos, o que leva à
formação da amostra dos
dados a serem analisados.
A identificação dos fatores
sociais, contextuais
linguísticos e extralinguísticos
dos usos e a transcrição dos
dados permitirão o
levantamento de hipóteses
para as motivações
relacionadas à regularidade
do fenômeno.

Em algum momento do século XVIII, o “você” venceu a disputa: seu uso disparou, o de “Vossa Mercê” caiu a zero e, com isso, o sistema do PB
se modificou (LOPES; DUARTE, 2003).
Assim, a mudança linguística é prevista como resultado de algum tipo de fenômeno de variação que a antecede. Nesse sentido, os fatores
linguísticos e extralinguísticos envolvidos no processo de variação podem evidenciar gatilhos possíveis para alterações nos sistemas, para a
implantação de mudanças.
Duas importantes discussões surgem a partir dessa constatação,são elas:

A primeira diz respeito ao fato de a mudança ser gradual e ser atestada primariamente na fala das crianças. As formas em competição que se
tornam a regra do sistema tendem a ser verificadas na fala das gerações mais novas, servindo de indício para o processo de mudança em curso.

A segunda diz respeito à possibilidade de que a implantação de uma determinada forma não necessariamente se relacione com os parâmetros de
julgamentos sociais, sejam eles favoráveis ou não, sobre seu uso em tempos anteriores.
Os estudos sociolinguísticos de orientação histórico-temporal (diacrônicos) abordam diferentes momentos da língua (sincronias), nos quais
determinado fenômeno em variação ocorre, podendo atestar possível mudança ao detectarem tendência de implantação de uma forma em
detrimento do desaparecimento de outra.
É possível observar como determinado fenômeno pode estar apontando para uma mudança em curso, a partir do comportamento da variação em
diferentes grupos etários ao longo do tempo.
Da mesma maneira, o tratamento quantitativo associado à prática sociolinguística permite a observação de que a mudança linguística é fato
inerente às línguas e que ocorrerá naturalmente a despeito da influência de fatores como julgamentos sociais de usos linguísticos, convenções
linguísticas aprendidas na escola, normatizações linguísticas oficiais etc.
O que queremos salientar, portanto, é que a diversidade linguística prevê a diversidade dialetal, a coexistência de
variantes, como o padrão culto, a fala popular, a fala regional etc. O julgamento de valores relacionados a essas
formas é absolutamente independente de sua natureza linguística por si mesmo.
São julgamentos de orientação social, em geral, associados ao poder que a norma padrão exerce em toda a sociedade e que está refletido na
própria estratificação social e nas forças hegemônicas de dada sociedade.
A motivação para tais julgamentos também está no cerne de discursos preconceituosos que tendem, por exemplo, a colocar a Libras como uma
linguagem não verbal, não reconhecendo seu caráter de linguagem verbal, ou seja, como uma língua.
Comentário
Este julgamento de valores, mais recentemente, se reflete na resistência ao reconhecimento do uso de formas novas de gênero neutro nas línguas
do mundo, uma demanda de grupos minoritários que desejam ver na língua o espelhamento da identificação de gênero não binário.
A possibilidade de que determinada forma, objeto de estigmatização social em outros tempos, possa vir gradualmente a se tornar legitimada pelo
padrão culto de novos tempos é apenas mais uma evidência da inexistência de superioridade entre formas, idioletos, dialetos, enfim, entre línguas.
Exemplos diversos poderiam ser citados para demonstrar que as formas tidas como socialmente menos privilegiadas podem se tornar as formas
eleitas pela norma culta de outra época.
O pronome pessoal <a gente>, por exemplo, no PB passou a ser usado amplamente, inclusive em discursos altamente formais e monitorados, em
lugar do pronome <nós>. Um passeio diacrônico (ao longo da história de uma língua) sobre a trajetória de mudança da forma <as gentes> à forma
atual mostrará claramente a atuação de pressões internas e externas ao fenômeno, que chega à sincronia (determinado estágio ou estado de uma
língua) atual com uma carga ampliada de aceitabilidade de uso em contextos mais formais.
A pesquisa na área da Sociolinguística Variacionista pode trazer inúmeros benefícios para a documentação e ratificação da importância da Libras
para a comunidade surda brasileira, como:
Sociolinguística variacionista
Assista ao vídeo para conhecer alguns exemplos de tipos de variação linguística e possíveis situações de mudança linguística em línguas de sinais.
Vamos assistir!
É possível, por exemplo, aplicar a Teoria da Variação para a condução de estudos sobre diferentes tipos de variação a fim de observar
como ela se distribui no território nacional.
Por meio da teoria, também podemos compreender como os usuários de diferentes faixas etárias, gêneros, sexos e classes sociais
usam a língua em todo o Brasil e como os fatores estruturais podem interagir com os fatores sociais no processo de variação.
E, por fim, é possível verificar como a Libras, assim como qualquer sistema linguístico, evolui e passa por processos de mudanças
linguísticas, decorrentes de motivações endógenas (internas) da língua, da comunidade surda, do contato linguístico com o PB, pelo
avanço das novas tecnologias de comunicação, entre outros fatores.

Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
Leia o texto a seguir para responder às perguntas 1 e 2:
[...]
Levanta, preta, que o Sol tá na janela
Leva a gamela pro xaréu do pescador
A alforria se conquista com o ganho
E o balaio é do tamanho do suor do seu amor
Mainha, esses velhos areais
Onde nossas ancestrais acordavam as manhãs
Pra luta sentem cheiro de angelim
E a doçura do quindim
Da bica de Itapuã
[...]
(G.R.E.S. UNIDOS DO VIRADOURO. Samba-enredo 2020 – Viradouro de Alma Lavada.)
As palavras “balaio” e “mainha” são muito usadas na região da Bahia, sobre a qual o enredo se refere. Em outros locais do Brasil, as formas
utilizadas para tais conceitos podem ser “cesto” e “mãezinha”. O tipo de variação linguística que aponta para diferenças no âmbito regional é
denominado:
Parabéns! A alternativa B está correta.
O tipo de variação que espelha diferenças regionais de uso da língua é chamado de variação diatópica, manifestando falares regionais, dialetos
ou expressões tipicamente regionalistas.
Questão 2
Considere as afirmativas a seguir:
I - O uso da palavra “mainha” está fortemente associado a contextos de menor grau de formalidade; se um falante do dialeto baiano, em
situações de registro formal, preferir o uso da forma “mãe” no lugar de “mainha”, evidenciará uma variação diafásica.
II - A forma verbal “tá” no lugar de “estar”, caracterizando um registro informal da língua e muito próximo da oralidade, não é uma variação
linguística, já que a única maneira da língua a ser considerada é a língua-padrão.
III - A letra de um samba-enredo pode conter registros mais coloquiais ou informais da língua para efeitos de expressividade e adequação ao
seu contexto, caracterizando uma variação diafásica.
IV - Se o baiano prefere a forma afetuosa “mainha” e o povo de outros lugares prefere a forma carinhosa “mãezinha”, estão todos usando
termos de diferentes lugares para a mesma doce figura, caracterizando a variação diatópica.
Estão corretas somente as afirmativas:
A Variação diafásica
B Variação diatópica
C Variação diastrática
D Diacronia
E Diacronia
A I e II.
B I e III.
C I, II e III.
D I, III e IV.
Parabéns! A alternativa D está correta.
O tipo de variação que espelha as diferenças de registro de uso da língua é chamado de variação diafásica, conforme ilustrado nas afirmativas I,
II e III. No entanto, a afirmativa II contém erro ao não reconhecer que o uso da forma verbal “tá” é uma variação e que devemos considerar as
formas de variação da língua e não apenas a língua-padrão ou culta. A afirmativa IV apresenta corretamente uma situação de variação
diatópica, ou seja, diferentes expressões ou palavras para um mesmo referente em função da região dos falantes ou usuários da língua.
2 - Sociolinguística e o contexto educacional da Libras
Ao �nal deste módulo, você relacionará a Sociolinguística com o contexto educacional da Libras.
A sociolinguística interacional
Neste módulo, trataremos do segundo caminho teórico da Sociolinguística, a Sociolinguística Interacional, para identificarmos algumas relações
com a língua em geral e, posteriormente, com a Libras.
Diferentemente da perspectiva variacionista, que observa a língua a partir das variáveis estruturais e sociais que a definem, a Sociolinguística
Interacional propõe seu estudo na interação dialógica.

Sociolinguística Variacionista
Observa a língua a partir das variáveis estruturais.
Sociolinguística Interacional
E II, III e IV.
≠
Propõe o estudo da língua na interação dialógica.
Os principais nomes da Sociolinguística Interacional e que estão na base de sua estrutura são:

Erving Goffman
(1922-1982)
Antropólogo, sociólogo e escritor canadense.

John Gumperz
(1922-2013)
Sociolinguista norte-americano, mas nascido na Alemanha.

Dell Hymes
(1927-2009)
Linguista e antropólogo norte- americano.
Nessa proposta, o foco de investigação consiste na construção da interação, a partir de fatores micro e macrossociolinguísticos. Nesse sentido, a
Sociolinguística Interacional observa as estruturas sociais, históricas e culturalmente construídas que subjazem a toda interação verbal, o uso da
língua.
A conjunção de fatores linguísticos com fatores comportamentais e ideológicos é a base da construção dialógica e permeia todo o pensamento
sociolinguístico interacional.
Os estudiosos dessa área trabalham na busca do entendimento sobre como os usuários da língua criam, reforçam e replicam, no nível micro,
significados e crenças sociais do nível macro.
Comentário
Nessa perspectiva, a língua não é vista como uma estrutura formal per se (em si mesma, intrinsecamente), mas como o resultado das pressões
sociais e culturais diversas, espelhadas em seu contexto de uso, nas intenções comunicativas, nas escolhas linguísticas, nos perfis sociais de seus
usuários e nas relações de poder que mantêm entre si.
Assim, a Sociolinguística Interacional permite a observação das relações sociais, refletindo suas características no contexto de uso da língua, onde
se enquadram múltiplas comunidades linguísticas, de identidades próprias, e no contexto social macro, mais abrangente, onde se encontram as
crenças e os valores penetrados nos diferentes contextos sociais.
Trata-se, portanto, de uma perspectiva teórica e metodológica do estudo do uso da língua que envolve a Linguística
e outras áreas sociais, como a Psicologia, a Sociologia e a Antropologia, ao se dedicar ao que está na interface
língua, sociedade e cultura.
A natureza interdisciplinar da Sociolinguística Interacional garante, por consequência, material de análise importante para o entendimento das
sociedades em geral. A interpretação dos fenômenos atuantes na construção do evento comunicativo é alimentada pelo conhecimento oriundo de
diversas áreas e, ao mesmo tempo, permite a observação acerca das engrenagens sociais, subsidiando o trabalho dessas e de outras áreas das
humanidades.
Em termos metodológicos, há a preocupação do registro, seja por áudio, vídeo, anotações, transcrições ou qualquer modo de documentação, das
interações reais de comunicação. A observação dos aspectos do contexto comunicativo em articulação com os aspectos do contexto linguístico é
fundamental para a análise sociolinguística interacional.
Resumindo
Os estudos nessa área focalizam, portanto, as escolhas linguísticas, os aspectos do nível formal e funcional da língua e as questões culturais
comportamentais que inconscientemente interagem na construção dialógica do uso, revelando a simbiose natural entre língua e contexto social.
Assim, o uso da língua não é visto como objeto desconexo das pressões sociais contextuais atuantes na conversação, na aula, no atendimento
médico ou em qualquer forma de interação verbal e dialógica culturalmente construída. A Sociolinguística Interacional dialoga, nesse sentido, com
estas duas abordagens:
Análise do Discurso
A Análise do Discurso entende a interação verbal como lugar da materialização, da prática, dos valores sociais estabelecidos. Assim,
comportamentos e ideologias que perpassam o pensamento social vigente são entendidos como formados e reformados pela e na linguagem.
Pragmática
O nível de análise linguística em que observamos nosso conhecimento sobre como funciona o uso da língua, ao trabalhar no nível das implicaturas
conversacionais e dos subentendidos que refletem ideologias, valores e intenções dos interlocutores do conjunto micro e macrossocial.
Para exemplificar essa discussão, considere o texto de um meme, gênero digital muito popularizado atualmente, que diz o seguinte:
Mulheres para �carem bonitas vão ao salão de beleza. Homens para �carem bonitos vão a uma concessionária.
(Autor desconhecido)
Uma observação rápida sobre as implicaturas conversacionais presentes no meme permite verificar que se trata de um texto marcado por
ideologias muito difundidas no nível macrossocial.
A interpretação sobre as diferentes condições de beleza para homens e mulheres indica os seguintes pressupostos:
mplicaturas conversacionais
Correspondem àquilo que é implícito em determinado ato comunicativo. São inferências que advêm do contexto extralinguístico.
Vaidade feminina
Prevê a obrigação de mulheres irem ao salão de beleza para que sejam consideradas bonitas.
Interesse capitalista feminino
Indica que mulheres se aproximam afetivamente de homens de maior potencial financeiro.
O trabalho textual do meme é extremamente rico:
Há o uso do paralelismo das formas “mulheres para ficarem bonitas vão... e homens para ficarem bonitos vão...”;
Temos a oposição de valores sociais relacionados com a escolha das palavras <salão de beleza> e <concessionária>;
Existe a opção de falar dos homens após ter falado das mulheres etc.
Todos esses elementos, em conjunto, contribuem para a produção do efeito final de sentido no meme.
Perceba, ainda, que o texto desse meme circula na Internet geralmente associado a uma personagem cômica, como ocorre com uma das versões
em que vem associado à imagem do personagem Seu Madruga, do seriado televisivo “Chaves”.
Nesse caso, a escolha da imagem se dá vinculada a um personagem de uma série cômica, de classe social desfavorecida e que é constantemente
afastado pela personagem feminina com quem interage no enredo da série em questão.
Atenção!
O meme, como gênero discursivo, está associado à função de ironia e sarcasmo, o que não é diferente aqui. A única distinção, entretanto, é o fato de
aqui serem tratadas, em tom de comédia, ideologias completamente preconceituosas e nocivas à nossa sociedade, mascarando e normalizando o
que elas trazem de ruim do e para o conjunto social. Assim, tal meme representa a maneira como muitos pensam e, ao mesmo tempo, difunde
essas ideologias.
Um importante conceito emerge, ainda, no contexto da Sociolinguística Interacional, e merece aqui destaque: o conceito de competência
comunicativa, de Hymes (1974). A noção de competência comunicativa aponta para uma habilidade relacionada ao desempenho linguístico: a
capacidade que permite ao falante se comunicar de modo eficaz em situações comunicativas diversas e específicas.
A abordagem sociolinguística interacional e Libras
Todas as características até aqui citadas compõem desdobramentos do pensamento sociolinguista interacional e podem ser utilizadas para
analisarmos o uso da Libras em diferentes contextos de uso, em diversas situações de interação social.
É possível aplicar a metodologia de registro, coleta de dados e análise da Sociolinguística Interacional para estudarmos como se diferenciam, por
exemplo, uma conversa formal e uma conversa informal em Libras:
Alunas de escola bilíngue em Libras e português escrito.
• como se organizam linguisticamente;
• como ocorrem as trocas de turnos;
• como essas questões se relacionam com os papéis sociais exercidos pelos interlocutores;
• quais são os valores sociais macro e micro da comunidade surda revelados nas escolhas e na construção da interação dialógica.
É possível, ainda, pesquisar como usuários da Libras são mais ou menos comunicativamente eficazes na produção de diferentes tipos de textos e
gêneros discursivos aplicados a essa língua.
As abordagens sociolinguísticas variacionista e interacional na educaçāo de
surdos
Discutimos até aqui abordagens da Sociolinguística que refletem duas perspectivas sobre a interface linguagem e sociedade: a proposta
variacionista e a sociointeracional.
Articularemos agora algunsprincípios advindos dessas propostas com a educação de surdos e com a educação em geral. A Sociolinguística, como
área abrangente da Linguística, é um campo de reflexões teóricas e práticas que muito contribui para o pensar educacional no que diz respeito à
realidade linguística e ao ensino de línguas maternas (LM) e línguas adicionais (LA).
Nossa jornada é a seguinte:
Primeiramente, articulamos alguns princípios advindos da perspectiva variacionista para propormos uma reflexão sobre o papel linguístico social
e o do ensino das línguas proeminentes na comunidade surda no Brasil: a Libras e o PB.
Mais adiante, apresentaremos uma discussão, a partir do entendimento sobre heterogeneidade, diversidade e legitimação linguística, acerca da
importância de propostas de ensino linguística e socialmente adequadas para a educação de surdos.
Na sequência, desejamos articular princípios da proposta interacional ao contexto da educação de surdos, por meio de uma proposta que amplie
os conceitos de letramento e oralidade no contexto de uso das línguas de sinais.
Sociolinguística variacionista e libras como língua ou linguagem verbal
A visão variacionista da Sociolinguística destaca alguns aspectos que se tornam expoentes na discussão linguística no campo da surdez.
Inicialmente, é preciso destacar o reconhecimento das línguas de sinais como língua, em sua natureza e função
social de representação de determinado grupo linguístico.
Em sua natureza, a Libras possui as mesmas características de qualquer língua oral. Aspectos morfossintáticos, pragmáticos e discursivos são
objetivamente identificados nesse sistema, que ainda apresenta aparato articulatório adaptado ao nível fonológico. Também apresenta variação e
mudança linguísticas e é objeto de aquisição de linguagem, de crianças a adultos, tornando-se conhecimento cognitivamente armazenado, tal como
ocorre em qualquer contexto de aquisição de língua oral.
Em sua função social, a Libras é a língua usada pela comunidade surda brasileira, que nela se constitui como grupo social legítimo, de direitos
linguísticos e sociais como qualquer outro. Apresenta usos contextualmente motivados, reflete ideologias, relações de poder etc.
Atenção!
O relativismo cultural é um conceito que merece destaque nessa discussão. A ideia de que há línguas melhores que outras, culturas superiores a
outras e povos mais avançados que outros já foi superada há tempos e persiste apenas em pensamentos conservadores equivocados que, em
geral, não contemplam o fato da diversidade, inclusive, linguística.
Assim como não existem culturas melhores que outras, não existem dialetos melhores, línguas melhores ou modalidades superiores. Em outras
palavras, apesar de toda a tradição e erudição associada à língua escrita, por exemplo, a modalidade escrita em nada é superior à língua falada, ou à
sinalizada, assim como a modalidade oral não pode ser tida como superior à sinalizada.
A própria associação, um tanto errônea, que o senso comum aplica às línguas de sinais, ao conceito de linguagem não verbal revela o papel que a
(Socio)Linguística possui em função de desfazer enganos, de desconstruir preconceitos.
Sendo língua, em sua natureza e função social, a Libras não pode ser elencada no conjunto de linguagens não
verbais, como o teatro mudo, a mímica, a gravura e a dança, citando apenas algumas, mas deve ser reconhecida
como linguagem verbal de modalidade gesto-visual.
Sociolinguística e o contexto educacional da libras e do PB como LA para
surdos
Superada a questão sobre a natureza linguística da Libras e da não superioridade de línguas orais em relação às línguas de sinais, é preciso discutir
o papel exercido pelo ensino da Libras nas escolas e do PB como LA para surdos.
Iniciamos tal discussão tratando da situação plural em que se encontram os indivíduos surdos no Brasil e que apontam como realidade comum:

O bilinguismo

O multilinguismo
O contato linguístico entre a Libras e o PB é um fato importante para levarmos em conta, porque dele decorrem diversas questões importantes para
entendermos a caracterização da Libras, sua descrição e, principalmente, para compreender como essas línguas impactam a comunidade surda.
Os objetivos da inclusão dos surdos estão diretamente ligados ao reconhecimento da Libras como sua L1 (primeira língua) e do PB como sua L2
(segunda língua).
Nesse sentido, o ensino bilíngue torna-se uma necessidade, prevista pelas discussões advindas da Lei de Libras.
A abordagem Sociolinguística Educacional evidencia a necessidade de repensarmos o ensino de gramática nas escolas.
ei de Libras
Ela implica a garantia do ensino de Libras e do português escrito como L2. Assim, o cidadão surdo tem garantidos seus direitos e ampliadas suas
possibilidades de desenvolvimento, via ensino adaptado das línguas em questão. A Sociolinguística entra nesse contexto trazendo diversas
contribuições.
A noção de “erro” espelha a tendência de usarmos a norma-padrão como a forma ideal da língua, desconsiderando
o fato, já discutido aqui, da variação e mudança e da heterogeneidade linguística.
Abordagens educacionais equivocadas emergem no contexto escolar negligenciando a visão, sociolinguisticamente orientada, de que a língua é
diversa e de que cada comunidade linguística possui seu próprio sistema, legítimo em si e nas funções sociais cumpridas nas vidas de seus
usuários. Diferenças linguísticas e demandas específicas que podem diferenciar surdos e ouvintes são muito mais evidentes nesse contexto.
Imagine o seguinte diálogo entre João, um representante de falantes do dialeto caipira, e sua professora Marta, que representa os falantes da norma
culta escolarizada:
Exemplo
João: Quar são as nota qui tirei?
Marta: Quais são as notas que eu tirei, João!
João: Cumé qui vô sabê? Uai! Ocê feiz prova?
Marta: Além de não saber falar português, também não consegue entender o que eu falo. João, você precisa melhorar!
A correção da professora aponta para seu entendimento sobre o que seria a maneira ideal de falar. Tal atitude poderia evidenciar o não
reconhecimento da variante popular de interior do aluno como forma legítima de uso da língua. É curiosa a reação do aluno que sequer entende que
está sendo corrigido, levando à atitude do docente de chamar a sua atenção por não dominar o uso do padrão escolar.
A atitude da professora, em nosso diálogo imaginário, reflete ainda diversas atitudes comuns no contexto de educação de surdos e que mostram
posições e pensamentos equivocados sobre o que e como esses alunos precisam aprender, por exemplo.
Sobre esse assunto, podemos dizer que o ensino brasileiro avançou em direção a discussões mais atualizadas em documentos como os
Parâmetros Curriculares Nacionais de língua materna e de língua estrangeira (PCNLM e PCNLE).
É consensual o entendimento de que o ensino de gramática deva permitir ao aluno o desenvolvimento de habilidades sociolinguísticas que o
formem como poliglota da própria L1 e da L2, na medida em que se torna capaz de transitar linguisticamente nos diferentes espaços sociais onde o
uso da língua seja convencionalmente previsto de uma ou outra forma.
O ensino da gramática tradicional continua sendo pauta do currículo escolar, embora a abordagem educacional seja ampliada em função da
formação do aluno multilíngue, com percepção analítica mais abrangente sobre a língua em sua interface social.
Alunos da Escola Bilíngue Libras e Português escrito de Taguatinga são alfabetizados nos dois idiomas.
O mesmo pensamento deve orientar o ensino da Libras e do português do Brasil como L2 (PBL2) de surdos. A Sociolinguística Educacional aponta
para o entendimento das noções de adequação linguística e de aceitabilidade como mais apropriadas para o ensino de línguas maternas (LMs) e
línguas adicionais (LAs) do que a noção de erro pautada nos parâmetros da gramática tradicional.
Desenvolve-se, então, a habilidade no aluno de perceber e ser capaz de usar as formas mais convencionalmente previstas de uso linguístico,comunicativamente orientado, em contextos e gêneros discursivos específicos. Assim, a Sociolinguística Interacional torna-se uma base teórica
importante para o pensamento da prática educacional de surdos e ouvintes.
Sociolinguística interacional, letramento e sinalizaçāo como oralidade
O trabalho Da fala para a escrita: atividades de retextualização, de Marcuschi, estabelece a necessidade de reconhecimento sobre o domínio da
distinção de usos linguísticos de gêneros orais e escritos.
Nesse trabalho, o autor indica o contínuo existente entre os padrões de usos da língua socialmente orientados para se materializarem de modos
específicos em textos escritos e orais, desfazendo a visão dicotômica rígida que divide tanto língua falada de língua escrita quanto práticas de
letramento de práticas de oralidade.
Um dos suportes teóricos que sustenta a proposta de Marcuschi é de base sociolinguística interacional, por entender que a língua não pode ser
vista distante dos contextos de uso em que se materializa e se constitui de uma ou outra maneira. Assim, práticas de oralidade e letramento são
vistas como áreas complementares e como macroespaços de práticas sociais e culturais.
Tais práticas se apresentam sob formas ou gêneros textuais variados e podem ser realizadas de modo informal ou formal nos mais diversos
contextos de uso.
ralidade
Envolve as práticas sociais orais e interativas.
etramento
Envolve as diversas práticas de escrita na sociedade.
Oralidade e letramento são dois pontos de uma escala em que se encontram múltiplas possibilidades de
realizações textuais, orais e escritas, e que podem ser prototipicamente mais ou menos afastadas dos modelos
que representam o texto escrito formal e a informalidade da conversação.
Por fim, textos escritos podem apresentar características de oralidade e vice-versa.
O ponto que destacaremos é a necessidade de reconhecimento de que a sinalização também é uma forma de oralidade.
Se língua falada e língua escrita são definições que apontam para materializações de práticas de oralidade e letramento, a sinalização também pode
ser interpretada em uma mesma relação com as práticas sociais sinalizadas de uso da língua.
O usuário da Libras conversa em Libras, faz apresentações formais e informais em Libras, produz textos com
literariedade em Libras, ministra aulas em Libras e assim por diante. Similarmente, pelo domínio da L2 escrita, ele
também transitará nos diferentes espaços de letramentos, a partir daquilo que aprenderá na sua experiência
escolar.
A interpretação que atesta a existência de práticas de oralidade e de letramento é defendida como proposta de objeto de ensino. Por essa proposta,
caberá à escola, nas aulas de L1 e de L2, trabalhar o desenvolvimento do aluno no uso da língua em diferentes situações comunicativas abarcadas
nesses dois contextos.
Resumindo
Parte do conteúdo programático para o ensino da Libras como L1 e do PBL2 de surdos deveria ser voltado para o trabalho de práticas de oralidade
em Libras e para o trabalho de práticas de letramento no português, sua L2. Nesse caso, poderíamos até usar o termo “sinalidade” para oralidade.
Esse seria um trabalho de forte base teórica advinda da Sociolinguística Interacional e muito mais condizente com as práticas educacionais
tradicionais de uso da língua que se pautam apenas no ensino do padrão, na L1 ou na L2.
Há muito tempo a discussão sobre fracasso/evasão escolar e analfabetismo funcional acontece no Brasil. Não é diferente no contexto de ensino
para surdos. Abordagens equivocadas atrapalham o desenvolvimento do aluno.
A Sociolinguística traz contribuições de base científica que ajudam o entendimento dessas questões, ao apontar as discrepâncias que ocorrem
entre a compreensão que o senso comum tem sobre as línguas e o que a ciência linguística atesta. Seguir as orientações teóricas dessa área
apenas contribuirá para o desenvolvimento do ensino também no campo de educação de surdos.
A discussão sociolinguística no âmbito da surdez aponta particularmente para um ponto específico: os múltiplos
desdobramentos do conceito de preconceito linguístico.
Aluno de escola bilíngue em Libras e português escrito comenta sobre as dificuldades para se comunicar.
São comuns os discursos que refletem a visão de que:
• a Libras não é língua;
• o surdo não consegue aprender português;
• ouvintes não podem aprender línguas de sinais e apresentar desempenho nativo;
• o surdo não deve aprender português mesmo como L2 etc.
Todos esses pensamentos são ideologicamente orientados e possuem algum grau de prejulgamento e equívoco. Os equívocos começam na ideia
de que há línguas superiores a outras, passando pela visão absolutamente desprovida de fundamento científico de que os surdos não possuem as
condições necessárias para a aprendizagem de uma língua qualquer.
A Sociolinguística esclarece esses equívocos com relativa facilidade, como pudemos ver ao longo deste tema. Infelizmente, o peso social atribuído
à língua é muitas vezes utilizado para fins pouco acadêmicos, mas de orientação política, não contribuindo para o desenvolvimento humano real dos
indivíduos, pertençam eles a comunidades linguísticas majoritárias ou minoritárias.
Ideologia e preconceito linguístico em Língua de Sinais
Assista o vídeo a seguir para conhecer mais sobre os aspectos ideológicos e o preconceito linguístico relacionados ao uso e ensino de Libras.
Vamos assistir!

Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
A relação da Sociolinguística com o campo educacional nos ajuda a pensar sobre as noções de adequação e de aceitabilidade linguísticas.
Essas noções seriam as mais corretas tanto no ensino de línguas maternas quanto no ensino de línguas adicionais, ao mesmo tempo que nos
levam a questionar determinadas atitudes diante da falta de domínio que um aluno possa ter da língua ou variante de maior prestígio social.
Considerando essas afirmações e o que você estudou neste módulo, assinale a alternativa correta.
A
A adequação linguística consiste na ideia de que um texto não possibilita o ato comunicativo se estiver, de alguma maneira,
contrário às normas ortográficas e de concordância previstas na gramática tradicional.
B
A Sociolinguística não contribui para o desenvolvimento de propostas educacionais de qualidade porque condena e rejeita a
gramática tradicional e o uso culto da língua.
C A noção de erro, pautada no ensino da gramática tradicional, não contempla o fato da diversidade linguística.
D
A sala de aula de língua materna possui propostas sociolinguísticas absolutamente distintas da sala de línguas adicionais, pois
a Sociolinguística não se aplica a ambas.
E
A Sociolinguística traz implicações ao campo educacional estabelecendo quais usos da língua não podem ser aceitos na escola
ou nos atos comunicativos em geral.
Parabéns! A alternativa C está correta.
A visão tradicional de erro ignora o fato da diversidade linguística e de usos diversos. A Sociolinguística contribui para que a abordagem
educacional ou didática do ensino-aprendizado da língua não negligencie nem estigmatize os usos ou registros da língua distantes do padrão
ou da norma culta, ainda que a escola tenha a missão de tratar da gramática tradicional e levar o aluno também ao domínio da língua culta.
Questão 2
Assinale a alternativa que apresenta uma afirmação correta sobre a relação entre a Sociolinguística e o contexto educacional da Libras:
Parabéns! A alternativa D está correta.
Os estudos sociolinguísticos nos ajudam a compreender que, em Libras, parte do conteúdo previsto no objetivo de ensino deve tratar da
oralidade ou “sinalidade”, assim como no estudo da língua portuguesa como L2 do aluno surdo se deve trabalhar parte do conteúdo
programático com práticas de letramento.
Considerações �nais
Vimos que a Sociolinguística nos ajuda a identificar os tipos de variação que podem existir em determinada língua, além de perceber que parte
dessas variações poderesultar em uma mudança na própria língua. Também verificamos que a Sociolinguística é uma área que contribui para o
entendimento da Libras, sua descrição e seu entendimento, e para o fortalecimento da comunidade surda.
Ao tratar dos aspectos inerentes à variação e mudança das línguas, a abordagem sociolinguística apresenta uma das diversas características que
definem a Libras como língua natural, por mostrar suas semelhanças com outras línguas orais.
A
O reconhecimento de que a sinalização também é uma forma de oralidade é desnecessário, pois a Sociolinguística enfatiza a
superioridade do letramento.
B
Quem usa Libras com desempenho satisfatório, produzindo textos com literariedade em Libras, não tem como dominar com
bom desempenho a L2 escrita na sua experiência de aprendizado na escola.
C
Tanto nas aulas de L1 quanto nas de L2, a escola deve restringir sua proposta de ensino à oralidade, no caso do português, ou à
sinalidade, no caso da Libras.
D
No ensino de Libras como L1 e do PBL2 de surdos, parte do conteúdo deve contemplar as práticas de oralidade em Libras e as
práticas de letramento na L2.
E
As situações de comunicação em Libras e em PBL2 não são respaldadas como objeto de ensino e aprendizado a partir da
Sociolinguística Interacional.
Ao tratarmos dos aspectos linguísticos e sociais envolvidos no processo de construção interacional, você aprendeu que a Sociolinguística mostra
como o uso da língua reflete o comportamento ideológico e social de sua comunidade linguística, revelando aspectos importantes sobre seu
funcionamento interno.
Outra grande contribuição da Sociolinguística para a comunidade surda tem a ver com seu papel na construção de uma prática educacional mais
adequada para o ensino de línguas. Assim, ao se dedicar aos estudos voltados para a interface língua/sociedade, é possível desfazer preconceitos
sobre a natureza e função da linguagem, contribuindo com princípios mais consistentes sobre seu ensino.
Explore +
Se você sabe Libras e deseja conhecer um pouco mais sobre Sociolinguística em Libras, assista ao vídeo A Sociolinguística e os diferentes tipos de
variação linguística - Coleção Pontes Linguísticas, disponível no canal da Videoteca Acadêmica em Libras – UFRJ, no YouTube.
Leia o artigo Reflexões sociolinguísticas sobre Libras, de Angélica Rodrigues e Anderson da Silva, publicado na revista Estudos Linguísticos e
disponível no portal do GEL (Grupo de Estudos Linguísticos do Estado de São Paulo).
Leia o e-book Aprendizes surdos e escrita em L2: reflexões teóricas e práticas, organizado por professores da UFRJ e disponível gratuitamente na
Internet.
Referências
HYMES, D. Foundations in Sociolinguistics. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1974.
LOPES, Célia R. S., DUARTE, Maria Eugênia L. Vossa mercê > você e vuestra merced > usted: o percurso evolutivo ibérico. Linguística, ALFAL, v. 14,
2003.
MARCUSCHI, L. A. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. 10. ed. São Paulo: Cortez, 2010.
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Cultura das comunidades sinalizantes
Prof.ª Antonielle Martins
Descrição
Características das línguas de sinais e das comunidades surdas. Traços culturais das comunidades surdas:
literatura, humor e arte surda. Variações linguísticas, regionalismo e padronização das línguas de sinais.
Propósito
Compreender os conceitos relacionados às línguas de sinais e à perspectiva da comunidade surda para
tornar o mundo um lugar mais acessível.
Objetivos
Módulo 1
Línguas de sinais e comunidades surdas
Apontar equívocos e senso comum a respeito das línguas de sinais e comunidades surdas.
Módulo 2
Aspectos das culturas surdas
Reconhecer aspectos importantes das culturas surdas, como arte, literatura e humor.
Módulo 3
Padronização das línguas de sinais
Identificar as variações linguísticas e as contradições dos processos de padronização das línguas de
sinais.
Introdução
Apresentaremos conceitos relativos às línguas de sinais e à cultura das comunidades surdas.
As comunidades surdas são minorias linguísticas com artefatos culturais riquíssimos, marcadas pela
peculiaridade linguística.
As línguas de sinais são de modalidade visoespacial que, por meio das mãos, em articulação com o corpo e
a face, produzem sinais e discursos complexos. Organizada espacialmente diante da pessoa que produz a
língua, por meio de um sistema linguístico regrado, tem o mesmo status de qualquer outra língua.
No Brasil, temos a Língua de Sinais Brasileira (Libras), reconhecida pela Lei nº 10.436, de 24 de abril de
2002, como meio legal de expressão e comunicação da comunidade surda brasileira. Além dela, temos no

país línguas de sinais indígenas e de comunidades surdas locais.
A popular Lei de Libras é regulamentada pelo Decreto nº 5.626, de 24 de abril de 2005, que institui a
disciplina de Libras como componente curricular obrigatório nos cursos de licenciatura, fonoaudiologia e
pedagogia, bem como disciplina optativa nos demais cursos de instituições de ensino superior. Portanto,
esse decreto tem o intuito de disseminar a Libras e possibilitar que você curse essa disciplina e tenha
contato com aspectos interessantes do povo surdo.
1 - Línguas de sinais e comunidades surdas
Ao �nal deste módulo, você será capaz de apontar equívocos e senso comum a respeito das
línguas de sinais e comunidades surdas.
Linguagem de sinais é a língua dos surdos-mudos?
Vamos começar nossos estudos com alguns questionamentos:
A língua de sinais é universal?
Ela é a mesma em todos os países?
Todo surdo é mudo?
São exatamente essas questões – ou fatos que podem ser considerados interessantes a respeito das
línguas de sinais e das comunidades surdas – que veremos ao longo desse estudo.
Aqui temos dois equívocos frequentes de pessoas que não conhecem as comunidades surdas e as línguas
de sinais. Primeiro, o correto é língua e não linguagem de sinais.
As línguas de sinais (QUADROS; KARNOPP, 2004) possuem todos os níveis linguísticos existentes nas
línguas orais, ou seja, fonologia, morfologia, semântica, sintaxe e pragmática. Portanto, é tão língua quanto
a língua oral, apenas expressada e percebida por outra modalidade.
inguagem
Linguagem é uma capacidade humana. Nossa habilidade de produzir, desenvolver e compreender gestos,
músicas, artes em geral, além de língua, é possibilitada pela capacidade da linguagem. Já a língua é um
conjunto organizado de elementos que possibilitam a comunicação. A língua surge naturalmente nas
sociedades e nos grupos humanos. As línguas ainda podem ter diferentes modalidades, como a oral-auditiva,
no caso das línguas orais, ou visoespacial, no caso das línguas de sinais. Portanto, a Libras é uma língua
natural utilizada pela comunidade surda no Brasil.
Atenção!
Além de ser incorreto, do ponto de vista teórico, usar o termo “linguagem de sinais” é pejorativo, já que
diminui a língua de sinais, como se por meio dela não fosse possível expressar conceitos abstratos e
complexos, levando à ideia equivocada de que a Libras é apenas mímica, pantomima e gestos.
O segundo equívoco é o termo “surdo-mudo”. Trata-se de um termo antigo, ainda muito difundido por meio
de canais de comunicação. Veja mais sobre isso a seguir:
Mudo
A mudez ou afonia é a incapacidade total ou parcial de produzir fala, uma deficiência que nada tem a
ver com a surdez.
Surdo
Um surdo ou um deficiente auditivo pode aprender a falar frequentando um fonoaudiólogo e fazendo
fonoterapia, se assim desejar.
Portanto, o termo correto é apenas “Surdo”, e com frequência escrito com a primeira letra maiúscula,
demarcando uma concepção cultural das pessoas surdas em oposição a uma abordagem clínica e
normatizadora que tem o objetivo de consertar os corpos surdos (SKLIAR, 1999). Temos aqui uma
concepção sociológica, não clínica, do indivíduo surdo.
Os Surdos possuemuma língua, que no caso brasileiro é a Língua Brasileira de
Sinais (Libras), adquirida naturalmente, da mesma forma que pessoas ouvintes
aprendem a língua portuguesa.
No entanto, no caso das crianças surdas, temos uma peculiaridade, já que cerca de 95% dos bebês surdos
nascem em famílias ouvintes que não sabem língua de sinais e têm pouca ou nenhuma informação a
respeito das possibilidades de educação bilíngue para crianças surdas.
O bilinguismo surdo
Os indivíduos Surdos são uma minoria linguística e aprendem a língua de sinais de forma natural quando
entram em contato com seus pares, isto é, com a comunidade surda sinalizadora. A língua da comunidade
ouvinte, que é majoritária, é aprendida como segunda língua – no caso dos Surdos brasileiros, a língua
portuguesa.
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No entanto, por conta da falta de informações a respeito das possibilidades linguísticas de uma criança
surda, os pais tendem a optar primeiramente por intervenções clínicas e tecnologia assistiva, e com
frequência proibir a língua de sinais.
Comentário
É um equívoco cometido por alguns profissionais da área da saúde afirmar que a aquisição de uma língua
de sinais prejudica a fala. Esse argumento já foi refutado diversas vezes, já que a aquisição de uma língua
não atrapalha, de modo algum, a aprendizagem de outra.
Agora, observe a seguinte pergunta:
A linguagem de sinais resume-se ao alfabeto manual?
A resposta é não!
Você já viu uma lista do alfabeto com a respectiva soletração manual ou datilologia em Libras e pensou que,
caso decorasse aquelas configurações, conseguiria se comunicar plenamente com os Surdos?
Você pode ter respondido sim ou não. E não há problemas nisso porque falta conhecimento sobre a relação
entre o alfabeto e a língua de sinais.
O alfabeto manual, ou a soletração digital, é apenas um dos recursos utilizados por sinalizantes das línguas
de sinais. É um código que representa as letras do alfabeto como um empréstimo linguístico. Portanto,
soletrar não é um meio com um fim em si mesmo.
Atenção!
Um ponto importante ressaltado por Gesser (2009) é que a soletração digital, tanto na sua forma produtiva
(do ponto de vista de quem articula) quanto na receptiva (do ponto de vista de quem lê), pressupõe que a
pessoa seja alfabetizada.
Assim, como as crianças surdas que ainda não são alfabetizadas se comunicariam?
O Surdo/ouvinte não alfabetizado (leitura/escrita) na língua oral da comunidade ouvinte majoritária teria a
mesma dificuldade que um indivíduo iletrado para utilizar esse recurso.
Veja o alfabeto manual e aproveite para treinar seu nome em Libras:
Alfabeto manual.
Para a maioria das palavras e dos representantes no mundo real, existe uma forma de expressão em língua
de sinais que não requer o uso da soletração digital. No entanto, esse recurso é importante em alguns casos
específicos na língua de sinais.
O alfabeto manual não é uma língua, e sim um código de representação das letras alfabéticas. É, portanto,
um empréstimo linguístico da língua portuguesa ou de outra língua oral da comunidade ouvinte. Por
consequência, o alfabeto manual também não é universal, sendo, por exemplo, o alfabeto manual da Língua
Britânica de Sinais (BSL) completamente diferente do alfabeto manual da Libras.
asos especí�cos
Eis algumas situações em que o alfabeto manual se torna importante:
Para expressar nomes próprios e de locais específicos;
Quando o sinalizante não conhece o sinal apropriado;
Para intercomunicação entre línguas orais e de sinais, quando o objetivo é superar barreiras durante a comunicação;
Para um ouvinte alfabetizado aprender alguma língua de sinais;
Na sinalização de siglas como CPU, USB;
Para terminologias específicas.
Sinal NUNCA SOLETRADO e sinal NUNCA LEXICALIZADO.
Temos ainda um processo em que um sinal começa com a soletração manual e depois se transforma em
um sinal lexicalizado. Podemos citar como exemplo o sinal de NUNCA.
A Libras não é a língua portuguesa sinalizada
Nenhuma língua de sinais segue a mesma estrutura da língua oral.
A língua de sinais tem estrutura própria, e é autônoma, ou seja, independente
de qualquer língua oral em sua concepção linguística.
(GESSER, 2009)
Do ponto de vista da sociolinguística, o fato de a comunidade surda estar inserida e cercada pela
comunidade ouvinte majoritária faz com que as línguas de sinais estejam em contato direto com as línguas
orais – portanto, é natural ocorrerem empréstimos linguísticos.
Isso acontece com qualquer língua com que se esteja em contato. Quantos empréstimos da língua inglesa
nós, brasileiros, usamos no nosso cotidiano? Várias, correto?
Portanto, mesmo que existam empréstimos linguísticos, como a soletração manual, isso não quer dizer que
as línguas de sinais tenham suas raízes históricas nas línguas orais. As línguas de sinais emergem
naturalmente em suas comunidades surdas.
A língua de sinais é universal?
Certamente uma das crenças mais frequentes em relação à língua de sinais é que ela seria universal, que
todos os surdos ao redor do mundo se comunicariam com a mesma língua. Sabemos que as línguas orais
variam geograficamente.
Então, por que com as línguas de sinais seria diferente?
Seria muito interessante aprender uma língua de sinais e ser capaz de se comunicar com todos os surdos
do mundo, não é mesmo?
Mas isso não acontece. As línguas de sinais variam muito, até mesmo dentro de um país ou estado, como
veremos adiante.
Segundo Sofiato (2011), podemos citar como exemplos:
Um fato interessante é que a Libras tem forte influência da LSF e nenhuma influência da Língua Gestual
Portuguesa (LGP), de Portugal. Desse modo, podemos apenas determinar parentescos e influências entre
as línguas. A influência da LSF na Libras é apontada em vários trabalhos acadêmicos, conforme Sofiato
(2011) e Martins (2017).
Surdos franceses
Língua de Sinais Francesa (LSF)
Surdos norte-americanos
Língua de Sinais Americana (ASL)
Surdos brasileiros
Língua de Sinais Brasileira (Libras)
Os registros históricos sobre a educação de surdos no Brasil mostram que ela está presente desde a vinda
do Surdo francês Eduard Huet para fundar a primeira escola para surdos do país, o Instituto Nacional de
Educação de Surdos (INES), em 1857.
A influência da LSF sempre esteve presente na Libras. Aliás, também teve forte influência na ASL por meio
de Edward Miner Gallaudet, que foi até a França observar como os surdos franceses eram ensinados. Em
homenagem a Gallaudet, temos a única universidade específica para surdos no mundo, a Gallaudet
University, onde a ASL é a língua de instrução.
As línguas de sinais são línguas naturais das comunidades surdas, ricas e complexas, tão variáveis quanto
as línguas orais. Como afirma Gesser (2009), em qualquer lugar em que existam surdos existe língua de
sinais, e o que é universal é o impulso para comunicação dos indivíduos, não a língua em si.
Seria possível nos cinco continentes termos apenas uma língua de sinais?
É bem possível, na verdade, que as línguas de sinais tenham uma quantidade maior de variação que lembre-
se que, com a mudança das línguas orais, já que não possuem registro gráfico difundido.
A língua de sinais tem gramática?
Sim! As línguas de sinais são naturais da comunidade surda e possuem estrutura e gramática próprias.
Os estudos linguísticos das línguas de sinais começaram com William Stokoe na década de 1960. Stokoe,
considerado o pai da Linguística das línguas de sinais, fez análise linguística da ASL por meio das
publicações seminais como:
Estrutura da língua de sinais: um esboço dos sistemas de comunicação visual dos surdos americanos
(STOKOE, 1960);
Um dicionário de línguas de sinais americanas sobre princípios linguísticos (STOKOE; DOROTHY;
CRONEBERG, 1965).
Essas obras foram fundamentais para o reconhecimento do status linguístico das línguas de sinais,
permitindo desenvolvimentos teóricos e metodológicos de análise de línguas de sinais, de sua estruturação
interna e gramática.
A língua de sinais, comoafirmou Stokoe, tinha os mesmos parâmetros linguísticos das línguas orais, sendo
eles: fonologia, morfologia, sintaxe, semântica e pragmática.
Apesar das diferenças de modalidade de realização e percepção entre as línguas orais e as de sinais,
estas seguem princípios de organização estrutural semelhantes aos das línguas orais.
Stokoe analisou sinais da ASL em suas unidades mínimas e propôs três parâmetros constitutivos
independentes, como indicados a seguir.
Con�guração de mão
Forma que a mão e os dedos apresentam durante a articulação do sinal.
Localização
Lugar no corpo ou no espaço em que o sinal é articulado.
Movimento
Maneira como a mão se move no decorrer da articulação do sinal.
Posteriormente, mais dois parâmetros foram propostos por Battison (1974) e Friedman (1975): a orientação
da palma e os aspectos não manuais.
Esses cinco parâmetros, portanto, são itens de composição fonético-fonológica das línguas de sinais, e a
presença deles forma o sinal. É interessante lembrarmos que, enquanto nas línguas orais as expressões
faciais demarcam sentimentos e intensidades, nas línguas de sinais temos expressões faciais gramaticais.
Observe o sinal a seguir com os indicativos das unidades mínimas e lembre-se de que, com a mudança de
apenas um parâmetro, o significado do sinal é completamente diferente.
Sinal DESCULPA.
Sinal TELEFONE.
No Brasil, os primeiros trabalhos sobre Libras são de Ferreira-Brito (1995) e, posteriormente, Quadros e
Karnopp (2004). Temos também, lançado mais recentemente, um dicionário de Libras (CAPOVILLA et al.,
2017), com cerca de 14.500 entradas registradas.
A língua de sinais é apenas mímica/gestos e icônica?
Mais uma vez, a resposta é não! As línguas de sinais são naturais, complexas, recombinativas, arbitrárias e
também icônicas em certo grau.
Para compreendermos melhor, vamos retomar os conceitos de língua e iconicidade:
Para Saussure (1969), considerado o pai da Linguística, a língua, ou signo linguístico, é uma
convenção entre os membros de uma comunidade e estabelece significado e significante. Um som,
por si só, não possui nenhum significado. No entanto, se ele existe dentro de uma língua, esse som
passa a ter significado por meio de uma convenção. Portanto, para Saussure, a relação entre a forma
do referente e a forma das unidades básicas da língua falada, ou seja, palavras e morfemas, é
essencialmente arbitrária. Isso significa dizer que não há necessariamente uma relação natural entre
a língua (imagem acústica ou som) e o sentido a que ela remete (significante, representante no
universo).
Língua 
Iconicidade 
Iconicidade é a propriedade linguística contrária à arbitrariedade e se caracteriza pela semelhança,
em certos signos linguísticos, entre a forma (do sinal ou da palavra) e a “coisa” representada no
universo. Iconicidade também existe nas línguas orais e ocorre, por exemplo, em onomatopeias,
como “atchim” e “tique-taque”, e palavras onomatopaicas, como “sussurrar” e “zumbido”.
Segundo Taub (2001), que é uma importante pesquisadora das línguas de sinais, a iconicidade é
comum nas línguas orais e nas sinalizadas, e está presente em todos os níveis da estrutura
linguística, incluindo desde morfologia e sintaxe até itens lexicais singulares.
Mas e a língua de sinais? É só icônica?
Veja os seguintes sinais retirados do Dicionário da língua de sinais do Brasil, o maior dicionário impresso de
língua de sinais do mundo!
Sinal CASA.
Certamente, mesmo sem ser fluente em Libras, você consegue reconhecer esses sinais.
Agora observe este:
Sinal ARBRITÁRIO.
Segundo Martins (2017), se as línguas de sinais fossem constituídas apenas de elementos icônicos,
mímicos, pantomímicos e pictóricos, o significado deveria ser imediatamente compreendido por
observadores ingênuos. Se esse fosse o caso, as línguas sinalizadas não teriam o mesmo status das
línguas faladas.
Comentário
Ainda segundo a autora, a iconicidade de um sinal não decorre simplesmente da semelhança entre a forma
e o significado desse sinal, mas de um processo sofisticado em que os recursos fonéticos dos sinais
permitidos pela língua são construídos em analogia com a imagem associada ao referente. Esse processo
envolve uma quantidade substancial de trabalho conceitual, que inclui seleção de imagem, mapeamento
conceitual e esquematização de itens para se enquadrar nas regras da língua. A iconicidade só existe por
meio de esforços mentais dos seres humanos, e depende das nossas associações conceituais naturais e
culturais.
A arbitrariedade da relação entre significante e significado é que permite a recombinação generativa entre
as unidades mínimas abstratas que compõem a assim chamada “fonologia” das línguas de sinais. Em
sinais icônicos transparentes, algum aspecto da forma física do sinal se assemelha à imagem sensória
concreta do referente desse sinal. Assim, sinais icônicos transparentes podem representar analogicamente
apenas referentes mais concretos.
Sinal CASA.
Há um paradoxo interessante sobre a iconicidade das línguas de sinais. Klima e Bellugi (1979) e Martins
(2017) conduziram estudos explorando sistematicamente como a iconicidade poderia facilitar a
compreensão de sinais por ouvintes ingênuos nessa língua. Temos duas observações, em parte,
contraditórias entre si:
Quando expostos a sinais e a informações dos significados desses sinais, e solicitados a atribuir uma
nota para avaliar o grau de iconicidade desses sinais, observadores ingênuos tendem a atribuir notas
elevadas, e a buscar, nos sinais, aspectos que justifiquem, em maior ou menor grau, a sua forma a
partir de seu significado.
Quando expostos aos mesmos sinais, mas na ausência de informação acerca dos significados desses
sinais, e solicitados a adivinhar-lhes o significado, esses mesmos observadores ingênuos tendem a
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atribuir a esses sinais significados díspares e inadequados.
Esses estudos revelam que a maioria absoluta dos sinais é muito opaca, apesar de ser vista, quase sempre,
como bastante icônica. Interessante, não é mesmo?
A língua de sinais é ágrafa?
Mais uma vez: não!
Então as línguas de sinais possuem uma escrita única e difundida?
Também não. Vejamos:
A escrita é uma representação da língua falada ou sinalizada por meio de símbolos
gráficos; portanto, o sistema de escrita é um conjunto de símbolos.
Até pouco tempo atrás, as línguas de sinais eram consideradas uma língua sem escrita.
Veja a seguir mais sobre a origem da escrita de sinais no mundo:
França
A primeira tentativa de escrita de sinais de que se tem registro é a do francês Roch-Ambroise Auguste
Bébian, que publicou uma obra chamada Mimographie.
och-Ambroise Auguste Bébian
O professor da Guadalupe Roch-Ambroise Auguste Bébian (1789-1839) é uma figura essencial na história da
surdez. Considerado por seus contemporâneos surdos como o primeiro professor ouvinte que dominava
perfeitamente a linguagem de sinais, Bébian foi também professor dos pioneiros do movimento associativo de
surdos, o primeiro teórico de um modelo bilíngue para escolas para surdos e o primeiro a demonstrar que os
signos dos surdos podem ser escritos a partir da análise de suas formas.
Fonte: Oviedo (2009).
Estados Unidos
Nos Estados Unidos, há o sistema de notação de William Stokoe (1960) – sim, o mesmo que fez a descrição
fonético-fonológica das línguas de sinais. Também nos Estados Unidos temos o sistema de escrita de
línguas de sinais mais difundido, o Signwritting (SW), baseado em um sistema para grafar coreografias.
Grafia do sinal CASA em SW.
Os sistemas são como alfabetos e podem ser usados para grafar qualquer língua de sinais. Na imagem
anterior, temos um exemplo da grafia do sinal casa em SW. Preste atenção na transparência do sistema.
Alemanha
Na Alemanha, há o Sistema de Notação de Hamburgo (HamNoSys) desde a década de 1980.
Brasil
No Brasil, temos a Escrita das Línguas de Sinais (ELiS), o primeiro sistema de transcrição criado no país por
Mariângela Estelita Barros.
scrita das

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