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TRANSTORNO ESQUIZOFRENIFORME. Descreve uma condição com um início súbito e curso benigno associados com sintomas de humor e obnubilação da consciência. Os sintomas da doença são semelhantes aos da esquizofrenia; contudo, com o transtorno esquizofreniforme, os sintomas duram pelo menos um mês, mas menos de seis meses. Em contraste, para um paciente satisfazer os critérios diagnósticos para esquizofrenia, os sintomas devem estar presentes por pelo menos seis meses. Indivíduos com transtorno esquizofreniforme retornam a seu nível basal de funcionamento após a resolução do transtorno. • Epidemiologia Pouco se sabe a respeito da incidência, da prevalência e da proporção entre os sexos do transtorno esquizofreniforme. Ele é mais comum em adolescentes e adultos jovens, e sua incidência é menos da metade da esquizofrenia. Uma taxa cinco vezes maior do transtorno foi encontrada em homens em comparação a mulheres. Foram relatadas uma taxa de prevalência em um ano de 0,09% e uma taxa de prevalência ao longo da vida de 0,11%. Especificamente, os parentes de pacientes com transtorno esquizofreniforme são mais propensos a apresentar transtornos do humor do que os parentes de daqueles com esquizofrenia, e mais propensos a ter diagnóstico de transtorno do humor psicótico do que os parentes daqueles com transtornos bipolares. • Etiologia A causa do transtorno esquizofreniforme não é conhecida. Em geral, enquanto alguns têm um transtorno semelhante à esquizofrenia, outros têm sintomas semelhantes aos de um transtorno do humor. Devido ao desfecho via de regra positivo, o transtorno provavelmente tenha semelhanças com a natureza episódica dos transtornos do humor. Entretanto, alguns dados indicam uma relação próxima com a esquizofrenia. Confirmando a relação com os transtornos do humor, diversos estudos demonstraram que pacientes com transtorno esquizofreniforme, como um grupo, têm mais sintomas afetivos (sobretudo mania) e um desfecho melhor do que pacientes com esquizofrenia. Além disso, a maior ocorrência de transtornos do humor nos parentes de indivíduos com transtorno esquizofreniforme indica uma relação importante. Portanto, os dados biológicos e epidemiológicos são mais consistentes com a hipótese de que essa categoria diagnóstica defina um grupo de pacientes, alguns dos quais têm um transtorno semelhante à esquizofrenia e outros uma condição que lembra um transtorno do humor. • Imagens do cérebro Um déficit de ativação relativo na região pré-frontal inferior do cérebro enquanto o paciente está realizando uma tarefa psicológica específica da região (o Teste Wisconsin de Classificação de Cartas), relatado em pacientes com esquizofrenia, também foi observado naqueles com transtorno esquizofreniforme. Um estudo mostrou que o déficit se limita ao hemisfério esquerdo e encontrou comprometimento da supressão da atividade estriatal limitado ao hemisfério esquerdo durante o procedimento de ativação. Os dados podem ser interpretados como indicando uma semelhança fisiológica entre a psicose da esquizofrenia e a psicose do transtorno esquizofreniforme. Outros fatores do sistema nervoso central, ainda não identificados, podem levar ao curso de longo prazo da esquizofrenia ou ao curso mais abreviado do transtorno esquizofreniforme. Apesar do indivíduos esquizofrênicos apresentarem dilatação nos ventrículos, o aumento ventricular no transtorno esquizofreniforme não está correlacionado com medidas de desfecho ou com outras medidas biológicas. • Outras medidas biológicas Ainda que os estudos de imagem cerebral indiquem uma semelhança entre transtorno esquizofreniforme e esquizofrenia, pelo menos um estudo da atividade eletrodérmica mostrou uma diferença. Indivíduos com esquizofrenia nascidos durante os meses de inverno e primavera (um período de alto risco para o nascimento desses pacientes) tiveram condutâncias cutâneas hiporresponsivas, mas essa associação era ausente naqueles com transtorno esquizofreniforme. A importância e o significado desse único estudo são difíceis de interpretar, mas os resultados sugerem cautela ao se pressuporem semelhanças entre pacientes com uma e outra condição. Dados de pelo menos um estudo de rastreamento visual nos dois grupos também indicam que eles podem diferir em algumas medidas biológicas. • DIAGNÓSTICO E CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS Este é um transtorno psicótico agudo com um início rápido e com ausência de uma fase prodrômica longa. Embora muitos indivíduos com o transtorno possam vivenciar comprometimento funcional na época de um episódio, é improvável que relatem um declínio progressivo no funcionamento social e ocupacional. O perfil de sintoma inicial é o mesmo da esquizofrenia, uma vez que dois ou mais sintomas psicóticos (alucinações, delírios, discurso e comportamento desorganizados ou sintomas negativos) devem estar presentes. Sintomas schneiderianos de primeira linha são observados com frequência. Além disso, uma maior probabilidade de turbilhão e confusão emocional é encontrada, cuja presença pode indicar um prognóstico positivo. Mesmo que sintomas negativos possam estar presentes, eles são um tanto raros no transtorno esquizofreniforme e são considerados aspectos prognósticos ruins. Por definição, pacientes com transtorno esquizofreniforme retornam a seu estado basal em seis meses. Em alguns casos, a doença é episódica, com mais de um episódio ocorrendo após longos períodos de remissão total. Se a duração combinada da sintomatologia exceder a seis meses, o diagnóstico de esquizofrenia deve ser considerado. • DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL É importante, primeiro, diferenciar transtorno esquizofreniforme de psicoses que podem se originar de condições clínicas. Isso é feito por meio de uma história e um exame físico detalhados e, quando indicado, exames laboratoriais ou estudos de imagem. Uma história detalhada de uso de medicamentos, incluindo medicamentos sem receita e produtos fitoterápicos, é fundamental, porque muitos agentes terapêuticos também podem produzir uma psicose aguda. Embora nem sempre seja possível diferenciar psicose induzida por substâncias de outros transtornos psicóticos transversalmente, um início rápido de sintomas psicóticos em um paciente com história significativa de uso de substâncias deve levantar a suspeita de uma psicose induzida por substância. Essa história detalhada e um exame toxicológico também são importantes a fim de planejar o tratamento para um indivíduo com uma primeira manifestação de psicose. A duração dos sintomas psicóticos é um fator que diferencia transtorno esquizofreniforme de outras síndromes. A esquizofrenia é diagnosticada se a duração das fases prodrômica, ativa e residual for maior que seis meses; sintomas que ocorrem por menos de um mês indicam um transtorno psicótico breve. Em geral, um diagnóstico desse transtorno não requer que um estressor maior esteja presente. Às vezes, é difícil diferenciar transtornos do humor com aspectos psicóticos de transtorno esquizofreniforme. Além disso, transtorno esquizofreniforme e esquizofrenia podem ser altamente comórbidos com transtornos do humor e de ansiedade. Outros fatores de confusão são o fato de sintomas de humor, como perda de interesse e prazer, serem difíceis de diferenciar de sintomas negativos, de avolição e de anedonia. Alguns sintomas de humor também podem estar presentes durante o curso inicial da esquizofrenia. Uma história longitudinal completa é importante para esclarecer o diagnóstico porque a presença de sintomas psicóticos apenas durante períodos de distúrbio do humor é uma indicação de um transtorno do humor primário. • CURSO E PROGNÓSTICO O curso do transtorno esquizofreniforme, na maior parte das vezes, é definido nos critérios. É uma doença psicótica que dura mais de um mês e menos de seis meses. A questão real é o que acontece às pessoas com a doença ao longo do tempo. A maioria das estimativas de progressão para esquizofrenia varia entre 60 e 80%. O que acontece aos outros 20 a 40% atualmente não é conhecido. Alguns terão um segundo ou terceiro episódiodurante o qual irão deteriorar para uma condição mais crônica de esquizofrenia. Poucos, entretanto, podem ter apenas esse único episódio e então continuar com suas vidas, que é evidentemente o desfecho desejado por todos os médicos e pelos familiares, embora provavelmente seja uma ocorrência rara e não deva ser considerada como provável. • TRATAMENTO A hospitalização, frequentemente necessária para tratar indivíduos com transtorno esquizofreniforme, permite a avaliação, o tratamento e a supervisão efetiva do comportamento do paciente. Os sintomas psicóticos em geral podem ser tratados com um curso de 3 a 6 meses de medicamentos antipsicóticos (p. ex., risperidona). Vários estudos mostraram que pacientes com esse transtorno respondem ao tratamento com antipsicóticos com muito mais rapidez do que os que apresentam esquizofrenia. O uso de lítio, carbamazepina ou valproato pode ser indicado para tratamento e profilaxia se o paciente tiver um episódio recorrente. Psicoterapia costuma ser necessária para ajudar os pacientes a integrar a experiência psicótica em sua compreensão de suas próprias mentes e vidas. A ECT pode ser indicada para alguns pacientes, especialmente para aqueles com aspectos catatônicos ou depressivos acentuados. Por fim, a maioria dos pacientes com transtorno esquizofreniforme progride para esquizofrenia apesar do tratamento. Nesses casos, deve ser formulado um plano de tratamento consistente com uma doença crônica. TRANSTORNO DELIRANTE Delírios são crenças fixas, falsas, que não estão de acordo com a cultura. Eles estão entre os sintomas psiquiátricos mais interessantes devido à grande variedade de crenças falsas que podem ser mantidas por tantas pessoas e porque são difíceis de tratar. O diagnóstico de transtorno delirante é feito quando uma pessoa exibe delírios não bizarros de pelo menos um mês de duração que não podem ser atribuídos a outros transtornos psiquiátricos. Não bizarro significa que o delírio deve ser sobre situações que podem ocorrer na vida real, tal como ser seguido, infectado, amado a distância, e assim por diante; ou seja, eles geralmente têm a ver com fenômenos que, mesmo não sendo reais, são possíveis. Vários tipos de delírios podem estar presentes, e o tipo predominante é especificado quando o diagnóstico é feito. • Epidemiologia Uma avaliação precisa da epidemiologia do transtorno delirante é dificultada por sua relativa raridade, bem como pelas recentes alterações em sua definição. Além disso, o transtorno pode ser sub- -relatado, porque os indivíduos delirantes raramente buscam ajuda psiquiátrica, a não ser que sejam forçados a isso por suas famílias ou por ordens judiciais. Mesmo com tais limitações, no entanto, a literatura apoia o fato de que essa condição, embora incomum, tem uma taxa bastante estável. A prevalência de transtorno delirante nos Estados Unidos é estimada em 0,2 a 0,3%. Portanto, é muito mais raro do que a esquizofrenia, que tem uma prevalência de cerca de 1%, e do que os transtornos do humor, cuja prevalência é de cerca de 5%. A incidência anual de transtorno delirante é de 1 a 3 novos casos por 100 mil pessoas. A idade média de início é em torno dos 40 anos, mas varia entre os 18 e os 90 anos. Existe leve preponderância de pacientes do sexo feminino. Os homens têm mais probabilidade de desenvolver delírios paranoides do que as mulheres, que tendem mais a desenvolver delírios de erotomania. Muitos pacientes são casados e estão empregados, mas pode haver alguma associação com imigração recente e condição socioeconômica baixa. • Etiologia Como ocorre com todos os transtornos psiquiátricos maiores, a causa do transtorno delirante é desconhecida. Ademais, os pacientes hoje classificados com o transtorno provavelmente apresentem um grupo heterogêneo de condições em que os delírios são o sintoma predominante. O conceito central sobre a causa desse transtorno é sua distinção da esquizofrenia e dos transtornos do humor. Ele é muito mais raro do que qualquer um deles, com início mais tardio do que a esquizofrenia e predominância feminina menos pronunciada do que os transtornos do humor. O acompanhamento de longo prazo indica que o diagnóstico de transtorno delirante é bastante estável, sendo que menos de um quarto dos pacientes são, por fim, reclassificados como tendo esquizofrenia, e menos de 10% como tendo um transtorno do humor. Esses dados indicam que o transtorno delirante não é simplesmente um estágio inicial do desenvolvimento de um ou desses dois transtornos mais comuns. • Fatores biológicos Uma ampla gama de condições médicas não psiquiátricas e de substâncias, incluindo fatores biológicos bem definidos, podem causar delírios, mas nem todas as pessoas que têm um tumor cerebral, por exemplo, manifestam delírios. Fatores singulares e ainda não compreendidos no cérebro e na personalidade de um indivíduo provavelmente sejam relevantes para a fisiopatologia específica do transtorno delirante. As condições neurológicas mais comumente associadas com delírios afetam o sistema límbico e os gânglios da base. Pacientes cujos delírios são causados por doenças neurológicas e que não demonstram comprometimento intelectual tendem a apresentar delírios complexos, semelhantes aos dos afetados por transtorno delirante. De modo inverso, pacientes com transtorno neurológico e comprometimento intelectual muitas vezes têm delírios simples, ao contrário dos delírios de pacientes com transtorno delirante. Portanto, esse transtorno pode envolver o sistema límbico ou os gânglios da base de pessoas com funcionamento cerebral cortical intacto. O transtorno delirante pode surgir como uma resposta normal a experiências anormais no ambiente, no sistema nervoso periférico ou no sistema nervoso central (SNC). Portanto, se tiverem experiênciassensoriais errôneas de serem seguidas (p. ex., ouvir passos), as pessoas podem passar a acreditar que estão, de fato, sendo seguidas. Essa hipótese baseia-se na ocorrência de experiências do tipo alucinatório que precisam ser explicadas, mas sua presença no transtorno delirante não foi comprovada. • Fatores psicodinâmicos Os médicos têm uma forte impressão clínica de que muitos pacientes com transtorno delirante são socialmente isolados e atingiram níveis de realização mais baixos do que o esperado. As teorias psicodinâmicas específicas sobre a causa e a evolução dos sintomas delirantes envolvem suposições a respeito de pessoas hipersensíveis e de mecanismos de defesa do ego, tais como formação reativa, projeção e negação. As contribuições de Freud- Sigmund Freud acreditava que os delírios, mais do que sintomas do transtorno, são parte de um processo de cura. Freud formulou a teoria de que a negação e a projeção são usadas pelo indivíduo para se defender de tendências homossexuais inconscientes. De acordo com a teoria psicodinâmica clássica, as dinâmicas subjacentes à formação dos delírios em pacientes do sexo feminino são as mesmas que nos do sexo masculino. Estudos cuidadosos de pessoas com delírios não conseguiram confirmar as teorias de Freud, embora estas possam ser relevantes em alguns casos individuais. De modo geral, não há uma incidência mais alta de ideação ou atividade homossexual em indivíduos com delírios do que em outros grupos. A principal contribuição de Freud, entretanto, foi demonstrar o papel da projeção na formação do pensamento delirante. A pseudocomunidade paranoide- Norman Cameron descreveu sete situações que favorecem o desenvolvimento de transtornos delirantes: uma forte expectativa de receber tratamento sádico; situações que aumentam a desconfiança e a suspeita; isolamento social; situações que aumentam a inveja e o ciúme; que diminuem a autoestima; que fazem as pessoas verem seus próprios defeitos nos outros; e as que aumentam o potencial de ruminação sobre prováveis significados e motivações. Quando a frustração decorrente de qualquer combinação dessas condições excede o limite tolerável, as pessoas se tornam retraídas e ansiosas, percebem que algo está errado, buscam uma explicação para oproblema e cristalizam um sistema delirante como solução. A elaboração do delírio para incluir pessoas imaginárias e a atribuição de motivações malévolas a pessoas reais e imaginárias resultam na organização da pseudocomunidade – uma comunidade percebida de conspiradores. Essa entidade delirante hipoteticamente reúne medos e desejos projetados para justificar a agressividade do paciente e para oferecer um alvo tangível para suas hostilidades. Outros fatores psicodinâmicos. Observações clínicas indicam que muitos, senão todos, pacientes paranoides vivenciam falta de confiança nos relacionamentos. Uma hipótese associa essa desconfiança a um ambiente familiar consistentemente hostil, muitas vezes com uma mãe supercontroladora e um pai distante ou sádico. O conceito de Erik Erikson de confiança versus desconfiança no início do desenvolvimento é um modelo útil para explicar a suspeita do paranoide, que nunca teve a experiência saudável de ter suas necessidades satisfeitas pelo que Erikson denominou os “provedores externos” e que, por isso, tem uma desconfiança geral de seu ambiente. Mecanismos de defesa. Pacientes com transtorno delirante usam principalmente os mecanismos de defesas formação reativa, negação e projeção. A formação reativa é empregada como defesa contra agressividade, necessidades de dependência e sentimentos de afeição e transforma a necessidade de dependência em independência ferrenha. Pacientes usam a negação para evitar a consciência de uma realidade dolorosa. Consumidos pela raiva e pela hostilidade e incapazes de encarar a responsabilidade por tais sentimentos, projetam seu ressentimento e a raiva nos outros e utilizam esse recurso para se protegerem do reconhecimento de impulsos inaceitáveis em si mesmos. Outros fatores relevantes. Os delírios foram relacionados a uma variedade de fatores adicionais, como isolamento social e sensorial, privação socioeconômica e transtornos da personalidade. Os surdos, os deficientes visuais e possivelmente os imigrantes com pouca habilidade em uma nova língua podem ser mais vulneráveis à formação de delírios do que o resto da população. A vulnerabilidade aumenta com o avanço da idade, e o transtorno delirante e outras características paranoides são comuns em idosos. Em resumo, múltiplos fatores estão associados com a formação de delírios, e a fonte e a patogênese dos transtornos delirantes ainda precisam ser elucidadas. • Diagnósticos e características clínicas. • Estado mental Descrição geral. Os pacientes costumam estar bem arrumados bem vestidos, sem evidências de desintegração aparente da personalidade ou das atividades diárias, mas podem parecer excêntricos, estranhos, desconfiados ou hostis. Às vezes, são contenciosos e podem deixar essa inclinação clara para o examinador. A característica mais notável de pacientes com transtorno delirante é que o exame do estado mental mostra que são bastante normais, exceto por um sistema delirante acentuadamente anormal. Eles podem tentar engajar os médicos como aliados em seus delírios, mas estes não devem fingir aceitar os delírios, pois isso confunde ainda mais a realidade e abre caminho para o surgimento da desconfiança entre o paciente e o terapeuta. Humor, sentimentos e afeto. O humor do indivíduo é compatível com o conteúdo de seus delírios. Um paciente com delírio de grandeza é eufórico; aquele com delírios persecutórios é desconfiado. Qualquer que seja a natureza do sistema delirante, o examinador pode perceber algumas características depressivas leves. Distúrbios perceptuais. Por definição, pacientes com transtorno delirante não têm alucinações proeminentes ou contínuas. Alguns têm outras experiências alucinatórias – em geral, mais auditivas do que visuais. Pensamento. O transtorno do conteúdo do pensamento, na forma de delírios, é o sintoma-chave do transtorno delirante. Os delírios geralmente são sistematizados e caracterizados como possíveis (p. ex., delírios de ser perseguido, de ter um cônjuge infiel, de estar infectado com um vírus ou de ser amado por uma pessoa famosa). Esses exemplos de conteúdo delirante contrastam com o conteúdo delirante bizarro e impossível de alguns indivíduos com esquizofrenia. O sistema delirante em si pode ser complexo ou simples. Os pacientes não apresentam outros sinais de transtorno do pensamento, embora alguns possam ser verborrágicos, circunstanciais ou idiossincrásicos quando falam sobre os delírios. Os médicos não devem pressupor que todos os cenários improváveis sejam delirantes, e a veracidade das crenças deve ser verificada antes de seu conteúdo ser rotulado como delirante. Sensório e cognição ORIENTAÇÃO. Pacientes com transtorno delirante não costumam ter anormalidades na orientação, a menos que tenham um delírio específico sobre uma pessoa, lugar ou tempo. MEMÓRIA. A memória e outros processos cognitivos estão intactos em pacientes com transtorno delirante. Controle dos impulsos. Os médicos devem avaliar pacientes com transtorno delirante para a presença de ideação ou planos de agir segundo o material delirante por meio de suicídio, homicídio ou outra violência. Embora a incidência desses comportamentos não seja conhecida, os terapeutas não devem hesitar em perguntar ao paciente sobre planos suicidas, homicidas ou outras formas de violência. A agressividade destrutiva é mais comum naqueles com história de violência; se houve sentimentos agressivos no passado, os terapeutas devem investigar como os pacientes lidaram com esses sentimentos. Se o indivíduo não puder controlar seus impulsos, é provavável que a hospitalização seja necessária. Discutir abertamente como a hospitalização pode ajudar o paciente a obter mais controle sobre seus impulsos ajuda a promover a aliança terapêutica. Julgamento e insight. Pacientes com transtorno delirante praticamente não têm entendimento algum de sua condição e são quase sempre levados ao hospital pela polícia, por membros da família ou por empregadores. O julgamento pode ser mais bem avaliado investigando- se o comportamento passado, presente e planejado do paciente. Confiabilidade. Pacientes com transtorno delirante tendem a fornecer informações confiáveis, exceto quando estas contrariam seu sistema delirante. • TIPOS Tipo persecutório s pacientes com esse subtipo estão convencidos de que estão sendo perseguidos ou prejudicados. As crenças persecutórias muitas vezes estão associadas com rabugice, irritabilidade e raiva, e o indivíduo que se deixa levar pela raiva pode às vezes ser agressivo ou mesmo homicida. Outras vezes, esses indivíduos podem se tornar preocupados com litígios formais contra seus supostos perseguidores. Em contraste com os delírios persecutórios da esquizofrenia, a clareza, a lógica e a elaboração sistemática do tema persecutório no transtorno delirante são uma marca notável dessa condição. A ausência de outra psicopatologia, de deterioração da personalidade ou de déficit na maioria das áreas de funcionamento também contrasta com as manifestações típicas da esquizofrenia. Tipo ciumento O transtorno delirante com delírios de infidelidade foi denominado paranoia conjugal quando limitado ao delírio de que o cônjuge foi infiel. O epônimo síndrome de Otelo foi usado para descrever um ciúme mórbido decorrente de múltiplas preocupações. O delírio em geral afeta os homens, muitas vezes aqueles sem nenhuma história psiquiátrica. Pode aparecer subitamente e serve para explicar uma variedade de eventos presentes e passados envolvendo o comportamento do cônjuge. Essa condição é difícil de tratar e pode diminuir apenas com separação, divórcio ou morte do cônjuge. O ciúme acentuado (geralmente denominado ciúme patológico ou mórbido) é um sintoma de muitos transtornos – incluindo esquizofrenia (na qual pacientes do sexo feminino apresentam essa característica com maior frequência), epilepsia, transtornos do humor, abuso de drogas e alcoolismo –, cujo tratamento é direcionado ao transtorno primário. O ciúme é uma emoção poderosa; quando ocorre no transtorno delirante ou como parte de outra condição,pode ser potencialmente perigoso e foi associado a violência, sobretudo com suicídio e homicídio. Os aspectos legais do sintoma foram observados repetidamente, em especial seu papel como motivo de assassinatos. No entanto, abusos físicos e verbais ocorrem com mais frequência do que ações extremas entre indivíduos com esse sintoma. Cautela e cuidado ao decidir como lidar com tais apresentações são essenciais não apenas para o diagnóstico, mas também do ponto de vista da segurança. Tipo erotomaníaco Na erotomania, que também tem sido referida como síndrome de Clérambault ou psychose passionelle, o indivíduo tem a convicção delirante de que outra pessoa, em geral de condição social superior, está apaixonada por ele(a). Esses pacientes também tendem a ser solitários, retraídos, dependentes e sexualmente inibidos, bem como a ter níveis baixos de funcionamento social ou ocupacional. Os seguintes critérios operacionais foram sugeridos para o diagnóstico de erotomania: (1) uma convicção delirante de comunicação amorosa, (2) o objeto de posição muito superior, (3) o objeto sendo o primeiro a se apaixonar, (4) o objeto sendo o primeiro a tomar iniciativas, (5) início súbito (em um período de sete dias), (6) o objeto permanece inalterado, (7) o paciente racionaliza o comportamento paradoxal do objeto, (8) curso crônico e (9) ausência de alucinações. Além de ser o sintoma-chave em alguns casos de transtorno delirante, sabe-se que ocorre também na esquizofrenia, no transtorno do humor e em outros transtornos orgânicos. Indivíduos com erotomania com frequência apresentam certas características: geralmente são mulheres pouco atraentes com empregos de nível baixo que levam vidas solitárias e retraídas, são solteiras e têm poucos contatos sexuais e escolhem amantes secretos que diferem bastante delas. Essas pessoas exibem o que foi chamado de conduta paradoxal, o fenômeno delirante de interpretar todas as negações de amor, não importa o quanto sejam claras, como afirmações secretas de amor. O curso pode ser crônico, recorrente ou breve, e a separação do objeto de amor pode ser a única intervenção satisfatória. Embora os homens em geral sejam menos atingidos por essa condição, podem ser mais agressivos e possivelmente violentos em sua busca de amor. Por isso, os homens com essa condição predominam nas populações forenses. O objeto da agressividade pode não ser o indivíduo amado, mas seus companheiros ou protetores, que são vistos como obstáculos. A tendência a violência entre homens com erotomania pode levar primeiro a contato com a polícia, e não psiquiátrico. Em certos casos, o ressentimento e a raiva em resposta à ausência de reação a todas as formas de comunicação do amor pode crescer o suficiente para colocar o objeto de amor em perigo. Os chamados assediadores, que seguem continuamente seus amantes imaginários, costumam ter delírios. Ainda que a maioria dos assediadores seja de homens, as mulheres também apresentam esse comportamento, e ambos os grupos têm alto potencial para violência. Tipo somático O transtorno delirante com delírios somáticos foi chamado de psicose hipocondríaca monossintomática. A condição difere de outros transtornos com sintomas hipocondríacos no grau de comprometimento da realidade. No transtorno delirante, o delírio é fixo, indiscutível e apresentado de forma intensa, pois o paciente está totalmente convencido de sua natureza física. No entanto, pessoas com hipocondria muitas vezes admitem que seu medo da doença é, em grande parte, infundado. O conteúdo do delírio somático pode variar muito de caso para caso. Existem três tipos principais: (1) delírios de infestação (incluindo parasitose); (2) delírios de dismorfofobia, como deformidade, feiura e tamanho exagerado de partes do corpo (essa categoria parece mais próxima do transtorno dismórfico corporal); e (3) delírios de odores corporais desagradáveis ou halitose. Essa terceira categoria, às vezes denominada síndrome de referência olfativa, parece ser um pouco diferente da categoria dos delírios de infestação, uma vez que pacientes com a primeira têm idade de início mais precoce (média de 25 anos), predominância masculina, estado civil solteiro e ausência de tratamento psiquiátrico anterior. Em outros aspectos, os três grupos, embora individualmente baixos em prevalência, parecem se sobrepor. O início dos sintomas com o tipo somático do transtorno delirante pode ser gradual ou súbito. Na maioria dos pacientes, a doença é contínua, ainda que a gravidade do delírio possa variar. Estado de alerta exacerbado e alta ansiedade também caracterizam indivíduos com esse subtipo. Alguns temas se repetem, como preocupações com infestação, na parasitose delirante, preocupação com aspectos corporais, com os delírios dismórficos e preocupações delirantes com odor do corpo, que às vezes são referidas como bromose. Na parasitose delirante, fenômenos sensoriais táteis muitas vezes estão associados com as crenças delirantes. Esses pacientes raramente se apresentam para avaliação psiquiátrica, e, quando o fazem, é de modo geral no contexto de uma consultoria psiquiátrica ou um serviço de ligação. Em vez disso, costumam consultar um médico especialista específico para uma avaliação. Portanto, esses indivíduos são encontrados com mais frequência em consultórios de dermatologistas, cirurgiões plásticos, urologistas, especialistas em aids e, às vezes, em dentistas ou gastrenterologistas. Tipo misto A categoria tipo misto aplica-se a pacientes com dois ou mais temas delirantes. Esse diagnóstico deve ser reservado para casos em que não predomine um único tipo de delírio. Tipo não especificado Essa categoria é reservada para casos em que o delírio predominante não se encaixa nas categorias anteriores. Um exemplo possível são certos delírios de identificação equivocada, como, por exemplo, a síndrome de Capgras, que recebeu o nome do psiquiatra francês que descreveu a illusion des sosies, ou a ilusão de sósias. O delírio dessa síndrome é a crença de que uma pessoa familiar foi substituída por um impostor. Outros descreveram variantes da síndrome, especificamente o delírio de que perseguidores ou familiares podem assumir a aparência de estranhos (fenômeno de Frégoli) e o delírio muito raro de que pessoas conhecidas podem se transformar em outras por vontade própria (intermetamorfose). Esses transtornos não apenas são raros como podem estar associados com esquizofrenia, demência, epilepsia e outros transtornos orgânicos. Os casos relatados foram predominantemente em mulheres, apresentavam características paranoides associadas e incluíam sentimentos de despersonalização ou desrealização. O delírio pode ser breve, recorrente ou persistente. Não está claro se um transtorno delirante pode aparecer com tal delírio. Os delírios de Frégoli e de intermetamorfose têm conteúdo bizarro e são improváveis, mas o da síndrome de Capgras é um candidato possível para transtorno delirante. O papel da alucinação ou do distúrbio perceptual nessa condição ainda precisa ser explicado. Houve casos que se manifestaram após danos cerebrais súbitos. TRANSTORNO POR USO DE OUTRA SUBSTÂNCIA E TRANSTORNOS ADITIVOS Os transtornos mentais induzidos por substância/medicamento são potencialmente graves, geralmente temporários, mas às vezes desenvolvem-se síndromes persistentes do sistema nervoso central (SNC) no caso dos efeitos de substâncias de abuso, medicamentos ou de várias toxinas. Elas se distinguem dos transtornos por uso de substância, nos quais um grupo de sintomas cognitivos, comportamentais e fisiológicos contribui para o uso continuado de uma substância apesar dos problemas significativos relacionados a ela. As drogas mais sedativas (sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos e álcool) podem produzir transtornos depressivos proeminentes e clinicamente significativos durante a intoxicação, enquanto há mais chances de se observar condições de ansiedade durante as síndromes de abstinência dessas substâncias. Também, durante a intoxicação, as substâncias mais estimulantes (p. ex., anfetaminae cocaína) provavelmente estarão associadas a transtornos psicóticos induzidos por substância e a transtornos de ansiedade induzidos por substância, sendo que episódios depressivos maiores induzidos por substância são observados durante a abstinência. Tanto as drogas mais sedativas quanto as mais estimulantes têm chances de produzir perturbações sexuais e de sono significativas, porém temporárias. De modo geral, para que o transtorno sob observação seja considerado um transtorno mental induzido por substância/medicamento, evidências devem indicar a baixa probabilidade de que ele seja mais bem explicado por uma condição mental independente. Esta provavelmente será observada se o transtorno mental estiver presente antes da intoxicação ou abstinência grave ou da administração do medicamento ou, com exceção de vários transtornos persistentes induzidos por substância, prolongar-se durante mais de um mês após a interrupção de abstinência aguda, intoxicação grave ou uso de medicamentos. Quando os sintomas são observados apenas durante delirium (i.e., delirium por abstinência de álcool), o transtorno mental deve ser diagnosticado como delirium, e a síndrome psiquiátrica que ocorre durante o delirium também não deve ser diagnosticada separadamente, já que muitos sintomas (incluindo perturbações no humor, ansiedade e teste de realidade) são habitualmente observados durante estados de agitação e confusão. • Características Diagnósticas As características essenciais do transtorno psicótico induzido por substância/medicamento são delírios e/ou alucinações proeminentes (Critério A), que são considerados como devidos aos efeitos fisiológicos de uma substância/medicamento (i.e., droga de abuso, medicamento ou exposição a toxina) (Critério B). As alucinações que o indivíduo percebe que são induzidas por substância/medicamento não são incluídas aqui, devendo ser diagnosticadas como intoxicação por substância ou abstinência de substância acompanhada do especificador “com perturbações da percepção”. Um transtorno psicótico induzido por substância/medicamento é distinguido de um transtorno psicótico primário por meio da análise do início, do curso e de outros fatores. No caso de drogas de abuso, precisa haver evidências da história, do exame físico ou achados laboratoriais de uso de substância, intoxicação ou abstinência Os transtornos psicóticos induzidos por substância/medicamento surgem durante, ou logo após, exposição a um medicamento ou após intoxicação por substância ou abstinência, mas podem persistir por semanas, ao passo que os transtornos psicóticos primários podem anteceder o início do uso de substância/medicamento ou podem ocorrer em períodos de abstinência sustentada. Quando iniciados, os sintomas psicóticos podem continuar enquanto persistir o uso da substância/medicamento. Outra consideração é a presença de características atípicas de um transtorno psicótico primário (p. ex., idade de início ou curso atípicos). Por exemplo, o surgimento de delírios de novo em uma pessoa com mais de 35 anos, sem história conhecida de algum transtorno psicótico primário, sugere a possibilidade de um transtorno psicótico induzido por substância/medicamento. Mesmo uma história anterior de transtorno psicótico primário não descarta a possibilidade de transtorno psicótico induzido por substância/medicamento. Diferentemente, fatores que sugerem que os sintomas psicóticos são mais bem justificados por um transtorno psicótico primário incluem persistência de sintomas psicóticos durante período de tempo substancial (i.e., um mês ou mais) após o término da intoxicação por substância ou abstinência aguda de substância ou após o término do uso de um medicamento, bem como história prévia de transtornos psicóticos primários recorrentes. Outras causas de sintomas psicóticos precisam ser levadas em consideração mesmo em pessoas com intoxicação por substância ou abstinência, porque problemas com uso de substância não são raros entre indivíduos com transtornos psicóticos não induzidos por substância/medicamento. Além das quatro áreas de domínio de sintomas identificadas nos critérios diagnósticos, a avaliação dos sintomas dos domínios cognição, depressão e mania é fundamental para que sejam feitas distinções importantes entre os vários transtornos do espectro da esquizofrenia e outros transtornos psicóticos. • DESENVOLVIMENTO E CURSO O início do transtorno pode variar muito de acordo com a substância. Por exemplo, fumar uma dose elevada de cocaína pode produzir psicose em minutos, ao passo que pode haver necessidade de dias ou semanas com elevadas doses de álcool e uso de sedativos para produzir psicose. Transtorno psicótico induzido por álcool, com alucinações, costuma ocorrer somente após ingestão pesada e prolongada de álcool em indivíduos com transtorno moderado a grave por uso de álcool, e as alucinações são geralmente de natureza auditiva. Transtornos psicóticos induzidos por anfetamina e cocaína partilham características clínicas similares. Delírios persecutórios podem rapidamente surgir logo após uso de anfetamina ou de um simpatomimético de ação semelhante. A alucinação com insetos ou vermes rastejantes sob ou sobre a pele (formigamento) pode levar ao ato de coçar e a grandes escoriações. Transtorno psicótico induzido por substância/medicamento pode, algumas vezes, persistir quando o agente ofensivo é removido, podendo ser difícil inicialmente distingui-lo de um transtorno psicótico independente. RAPS (REDE DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL) Hoje temos uma Rede de Atenção Psicossocial (raps) que é composta por serviços e equipamentos, tais como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) tipo I, II e III, CAPS Álcool e outras drogas, CAPS Infantil, Serviço Residencial Terapêutico (SRT), Núcleo de Assistência a Saúde da Família, Ambulatórios de Saúde Mental, leitos em hospital geral, Serviços de Urgência e Emergência, e o cuidado prestado pelas Unidades Básicas de Saúde, além dos Centros de Convivência e outros espaços de socialização. O trabalho em rede visa a atender as demandas de saúde mental dos usuários e de suas famílias, partindo de uma concepção ampliada da complexidade do cuidado em saúde, focado em aspectos relacionados à qualidade de vida e acesso aos bens e serviços essenciais para a promoção de uma vida saudável. Assim, o caráter intersetorial do trabalho em rede, com a participação da educação, habitação, saúde, lazer e trabalho, ganha relevância na organização e gestão do trabalho em saúde com vistas a avançar nos princípios de integralidade, universalidade e descentralização das ações em saúde. O SUS e a RAPS utilizam um conjunto de propostas e condutas terapêuticas que se chama Projeto Terapêutico Singular (PTS). O PTS é configurado como uma ferramenta única de cuidado, construída coletivamente no trabalho em equipe e exclusiva para cada pessoa, através da participação do próprio usuário e dos demais envolvidos. No PTS, é preciso delimitar fronteiras daquilo que é possível e impossível, dentro de um ideal de baixa exigência para a adesão ao cuidado. O PTS não é estático ou imutável, ele pode e deve ser revisto durante todo o caminhar do cuidado, sempre buscando o protagonismo do usuário nessa construção. A R A P S é c o n s t i t u í d a p o r s e t e componentes. Cada um deles compreende um conjunto de ações e serviços que têm o propósito de atender às diferentes necessidades dos usuários e seus familiares, nos mais diversos territórios. Esses serviços são chamados de pontos de atenção. 1. Atenção Básica em Saúde - Nesse âmbito, uma conquista importante foi a criação e implantação da Estratégia Saúde da Família (ESF) nas unidades de saúde. O cuidado nas Unidades Básicas de Saúde é norteado pelos princípios e diretrizes da Política Nacional da Atenção Básica, que tem a ESF consagrada como estratégica na ordenação das redes de atenção à saúde. Propõe caráter territorial com relações de vínculo com usuários e famílias, o acesso universal e contínuo aos serviços e, a integração das ações de prevenção, tratamentoe reabilitação, reafirmando-se enquanto política acolhedora, resolutiva e que avança na gestão e coordenação do cuidado em rede. – A ESF tem um papel fundamental na atenção da saúde mental da população. É uma proposta de mudança do modelo tradicional orientado pela biomedicina para um modelo centrado no indivíduo na sua integralidade, suas relações familiares e socioculturais. A concepção de saúde adotada pela ESF é mais ampla, assim como o entendimento dos determinantes do processo saúde-doença. Com isso, a articulação entre saberes técnicos, populares e a mobilização de recursos institucionais e comunitários são necessários para o enfrentamento de problemas de saúde. – No trabalho da ESF o ambiente de cuidado são os espaços de vida como: a rua, as instituições, o CAPS, e o território, espaço comum de todos os sujeitos. Nesses espaços há a necessidade de se recriar formas de aproximação, de contato e de vínculo através da articulação entre os profissionais, usuários, serviços e territórios. Assim, as ações de cuidado exigem a participação de diferentes atores sociais, serviços e setores, tendo em vista um cuidado centrado no usuário, nas suas demandas de saúde, suas relações sociais e o seu território de vida. – Deste modo, parte da compreensão de que para cuidar da saúde da população em seu território é preciso conhecer as famílias, identificando os modos de vida, as dificuldades de saúde e, principalmente, articular e compartilhar o cuidado destas com outras redes na perspectiva da integralidade. Para isso, a gestão do cuidado na ESF exige uma aproximação com recursos existentes, e assim otimizá-los no cuidado do território, fomentando diferentes possibilidades de redes que consigam responder às demandas dos usuários e famílias. Equipe de Consultório na Rua O que é? - A Equipe de Consultório na Rua é um grupo de multiprofissionais que atua em unidades móveis, de forma itinerante e frente aos diferentes problemas e necessidades de saúde da população em situação de rua. O que faz? - A Equipe oferta ações e cuidados de saúde para a população em situação de rua, considerando suas diferentes necessidades de saúde. Amplia o acesso à saúde dessa população, à rede de atenção e proporciona, de maneira mais oportuna, a atenção integral à saúde. Desenvolve também ações compartilhadas e integradas às unidades básicas, CAPS, serviços de Urgência e Emergência, instituições componentes do Sistema Único de Assistência Social e outras instituições públicas da sociedade civil. 2. Atenção Psicossocial Especializada Esse componente é constituído pelas diferentes modalidades de Centros de Atenção Psicossocial. ★ CAPS (Centro de atenção psicossocial) O que é? - O CAPS é um ponto de atenção constituído por uma equipe multiprofissional, a qual atua sob a ótica interdisciplinar e realiza, prioritariamente, o acompanhamento de pessoas com sofrimento ou transtornos mentais graves e persistentes, incluindo aquelas com necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas, ou outras situações clínicas que impossibilitem estabelecer laços sociais e realizar projetos de vida. - Esse ponto de atenção atua de forma territorial – em situações de crise ou nos diversos momentos do processo de reabilitação psicossocial –, e é considerado um serviço estratégico para agenciar e ampliar as ações de saúde mental. - O CAPS deve, portanto, organizar-se tanto para ser porta aberta às demandas de saúde mental do território como para identificar populações específicas e mais vulneráveis, as quais devem ser objeto de estratégias diferenciadas de cuidado. O que faz? - O CAPS provê acompanhamento longitudinal de pessoas com problemas graves de s a ú d e m e n t a l e d e s u a s f a m í l i a s . Ta l acompanhamento se dá, prioritariamente, a partir de espaços coletivos, dentro e fora do serviço, de forma articulada com os outros pontos de atenção da rede de saúde e das demais redes, visando sempre à construção de novos lugares sociais e à garantia dos direitos. Projetos Terapêuticos Singulares, que, em sua construção, envolvem usuários, famílias e seus contextos, requerendo constantes mediações dos profissionais em abordagens territoriais. O Centro também realiza apoio matricial a outros pontos de atenção, garantindo sustentação qualificada tanto nos acompanhamentos longitudinais quanto nas ações de urgência e emergência. - Os CAPSs são serviços de portas abertas, que devem acolher, sem agendamento, novos usuários. A partir desse acolhimento, a equipe multiprofissional irá elaborar, em parceria com o usuário e sua família, um projeto terapêutico singular. - Os CAPS atuam, também, fora do espaço da sua unidade, buscando parcerias na comunidade e com outros serviços públicos, a fim de facilitar e mediar as relações dos usuários com pessoas e instituições. Esse trabalho é o que permite a reabilitação psicossocial de pessoas que, pelo sofrimento, pela sua condição social e pelo estigma, vivem excluídas das relações na sociedade. O trabalho dos profissionais do CAPS é, portanto, realizado tanto no serviço em si quanto no território, por isso requer conhecimento e relação com esse território. - Há diversas modalidades de CAPS: I, II, III, álcool e drogas (AD) e infantojuvenil. Os CAPS III e CAPS AD III funcionam 24 horas. - Um importante marco para a alteração nas formas de cuidar em saúde mental no Brasil foi o ano de 1987, momento em que ocorreu o início da implantação dos serviços substitutivos aos hospitais psiquiátricos, denominados Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). - Estes CAPS são compostos por uma equipe interdisciplinar que pode incluir psicólogos, médicos, fisioterapeutas, assistentes sociais, arteterapeutas, terapeutas ocupacionais, enfermeiros, entre outros, e atendem pessoas com sofrimento psíquico severo e persistente. - O principal objetivo é promover, por meio de atendimentos individuais, grupais, familiares e atividades comunitárias, o fortalecimento dos direitos civis, do apoio familiar e comunitário, facilitando a autonomia e a reinserção social do usuário e de sua família. 3. A t e n ç ã o R e s i d e n c i a l d e C a r á t e r Transitório Esse componente é composto por dois pontos de atenção: as Unidades de Acolhimento (UA) e os Serviços de Atenção em Regime Residencial. ★ Unidades de Acolhimento O que são? - Pontos de Atenção com funcionamento 24 horas, referenciados exclusivamente pelos CAPS e que oferecem, em ambiente residencial, cuidados contínuos à saúde, de pessoas com necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas. Há duas modalidades de Ponto de Atenção: adulto e infantojuvenil (entre doze e dezoito anos completos). O que fazem? - Articulam, junto ao CAPS de referência, a constrição dos Projetos Terapêuticos Singulares para os usuários que apresentem acentuada vulnerabilidade social e/ou familiar e demandem acompanhamento terapêutico e protetivo de caráter transitório, em período de até seis meses. Obs: - Entendendo as UAs como “residências temporárias”, é importante a garantia de ambientes que permitam a privacidade e, também, q u e f a v o r e ç a m a c r i a ç ã o d e r e d e s d e pertencimento e de relações entre os que nela residem. Neste ponto de atenção é necessário apostar nos percursos de fortalecimento e/ou reconstrução de projetos de vida e, desse modo, um espaço que possibilite a garantia de suporte. Serviços de Atenção em Regime Residencial O que são? - Serviços de saúde de caráter residencial transitório, destinado a oferecer, por até nove meses, cuidados contínuos de saúde a adultos com necessidades clínicas estáveis decorrentes do uso de álcool e outras drogas. Esses serviços recebem demandas referenciadas pelos CAPS do território. O que fazem? - Oferecem cuidado residencial transitório a pessoas que requeiram, temporariamente, afastamento de seus contextos. Constituem a operacionalização dos Projetos Terapêuticos Singulares construídos junto aos CAPS e UBS e atuam de forma articulada junto aos demais pontos de atenção, favorecendo a construção de novasperspectivas para pessoas com problemas com drogas e suas famílias. 4. Urgência e Emergência Esse componente é constituído pelos pontos de atenção SAMU 192 e UPA 24 horas. ★ Serviço de Atendimento Móvel de Urgência – SAMU O que é? - O SAMU é um Ponto de Atenção destinado ao atendimento móvel de urgências e emergências nos territórios, incluindo as de saúde mental. O que faz? - A partir de acionamento telefônico (192) e regulação da demanda, o SAMU atende e/ou agencia o atendimento mediato ou imediato, articulando e favorecendo o acesso a outros pontos de atenção que se façam necessários na atenção hospitalar ou de seguimento longitudinal, como os CAPS e/ou UBS. ★ Unidade de Pronto Atendimento – UPA O que é? - A UPA é um Ponto de Atenção destinado ao pronto atendimento das demandas de urgência e emergência em saúde, incluindo aquelas consideradas de saúde mental. O que faz? - A Unidade realiza o acolhimento, a classificação de risco e a intervenção imediata nas situações e agravamentos que assim o requeiram, minimizando riscos e favorecendo seu manejo. Esse Ponto de Atenção se articula a outros, garantindo a continuidade do cuidado, de acordo com a necessidade. 5. Atenção Hospitalar Esse componente é constituído por Serviços Hospitalares de Referência para Atenção às pessoas com sofrimento ou transtorno mental, incluindo aquelas com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas (Leitos de Saúde Mental em Hospital Geral). Serviço Hospitalar ou Enfermaria Especializada em Hospital Geral O que é? - É um serviço que dispõe de leitos habilitados a oferecer suporte hospitalar em saúde mental nas enfermarias de clínica médica, pediátrica ou obstétrica em Hospital Geral. O acesso aos leitos nesses pontos de atenção deve ser regulado a partir de critérios clínicos, respeitados os arranjos locais de gestão: central regulatória ou por intermédio do CAPS de referência. O que faz? - Provê intervenções de curta ou curtíssima duração no restabelecimento de condições clínicas, ou na investigação de comorbidades responsáveis por agravamentos. Articula-se de forma imediata a outros pontos de atenção, garantindo a preservação de vínculos e a continuidade do cuidado. Obs: - A atenção hospitalar à saúde mental deve estar inserida nos hospitais gerais (não mais nos antigos hospitais psiquiátricos), aliada a outras especialidades médicas. Nesse modelo, leitos ou pequenas enfermarias de saúde mental realizam internações breves (a maioria de uma a três semanas) para casos agudos que necessitem de cuidado médico intensivo, ou que tragam complicações clínicas associadas aos transtornos mentais e ao uso prejudicial de drogas. 6. Estratégias de Desinstitucionalização Esse componente é constituído por Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT), Programa de Volta p a r a C a s a ( P V C ) e P r o g r a m a d e Desinstitucionalização. Serviço Residencial Terapêutico O que é? - O SRT são moradias inseridas na comunidade que visam a garantir às pessoas em situação de internação de longa permanência, em hospitais psiquiátricos ou Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (HCTP), a promoção de autonomia e o exercício de cidadania, buscando sua progressiva inclusão social. O que faz? - Acolhe, em ambiente residencial, um grupo de pessoas egressas de longas internações, favorecendo-lhes a retomada da gestão do cotidiano e de novos projetos de vida, a partir do apoio de profissionais e de outros pontos de atenção. O acesso a esse serviço é regulado e vinculado ao fechamento de leitos em instituições de caráter asilar. Os CAPS são referências desse serviço e, junto com as UBS, responsáveis pelo acompanhamento longitudinal das pessoas que habitam nessas residências. Programa de Desinstitucionalização O que é? - É uma estratégia que busca intensificar os processos de desinstitucionalização dos usuários em situação de internação de longa permanência, a p a r t i r d o f i n a n c i a m e n t o d e e q u i p e s multiprofissionais focadas exclusivamente nesses processos, nos territórios que estão situados. O que faz? - Entre as ações sob responsabilidade da Equipe de Desinstitucionalização está o apoio a equipes dos hospitais psiquiátricos, a fim de construir conjuntamente, a partir de vínculos estabelecidos dentro das instituições, o processo de desinstitucionalização dos moradores. A equipe em questão também elabora novos processos de t r a b a l h o t e r r i t o r i a i s , i n t e r s e t o r i a i s e regionalizados, articulando diferentes dispositivos. Vale mencionar que a equipe do programa é, geralmente, composta, por um médico com formação e experiência em saúde mental ou psiquiatria, um psicólogo, um assistente social, um terapeuta ocupacional e um enfermeiro. Referencias: Foi a bufa do Kaplan!!