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A dispepsia é uma síndrome de dor epigástrica e de desconforto pós-prandial (critérios segundo o consenso de Roma IV) no qual há ausência de sintomas sistêmicos (exemplo: febre). O epigástrio limita-se à região acima do umbigo e abaixo do apêndice xifoide, delimitado pelas linhas hemiclaviculares. Sintomas no hipocôndrio direito devem direcionar para doenças do fígado e vias biliares e no andar inferior do abdome, às doenças pélvicas e intestinais. A duração também tem importância: devem ter surgido há pelo menos 6 meses e estar presentes por 3 meses – não pode ser um quadro agudo porque é uma doença crônica. - conceitos • Dor epigástrica: dor na região do epigástrio. A sensação é subjetiva; • Pirose epigástrica: sensação de queimação na região do epigástrio; • Plenitude pós-prandial: sensação desagradável de que a comida permanece prolongadamente no estômago; • Saciedade precoce: sensação de que o estômago está cheio logo após começar a comer, desproporcional ao volume ingerido; • Azia: regurgitação ácida ou amarga – refluxo gastroesofágico se pirose é retroesternal. - epidemiologia A dispepsia é uma síndrome muito frequente, com prevalência nos países ocidentais em torno de 20%. Mais de 75% dos casos são de dispepsia funcional, uma doença multifatorial benigna, cujo tratamento, mesmo com diferentes abordagens, quase sempre apresenta resultados modestos. Observação: é funcional quando tem alteração do funcionamento sem identificação da alteração estrutural. O achado de câncer gástrico na abordagem da síndrome é muito pequeno, em média menos de 2% dos casos. Existe maior prevalência de doença de refluxo gastroesofágico sobre a úlcera péptica. Esse fenômeno tem sido observado no mundo todo, e uma explicação é a diminuição da infecção gástrica pelo Helicobacter pylori, em função de melhora na condição sanitária das populações e do aumento da obesidade na população em geral. - fatores de risco IDADE • Adenocarcinoma gástrico é mais frequente em pacientes com 60-70 anos; • A úlcera péptica, embora possa ocorrer em qualquer idade, é mais frequente na faixa dos 40 a 50 anos; • A doença do RGE é um problema com predomínio em bebês. Após, retorna a importância aos 40-50 anos; • Dispepsia funcional é mais comum em jovens; • Em idosos os sintomas dispépticos são secundários a distúrbios degenerativos – DM (alterações autonômicas). ANTECEDENTES MÓRBIDOS E FAMILIARES • Câncer gástrico e úlcera péptica têm componente familiar; • Diversas doenças podem comprometer especificamente o aparelho digestivo alto e determinar sintomas dispépticos. É um exemplo clássico a esclerodermia, que compromete o esôfago distal e pode levar a formas graves de doença de refluxo gastroesofágico; Síndrome dispéptica Propedêutica clínica 2 Na dispepsia, o antecedente de uma doença péptica previamente diagnosticada sugere recidiva da doença, porque ela tende a evoluir em crises. SEXO O câncer gástrico, a pancreatite crônica e a úlcera péptica são mais frequentes no homem, enquanto a doença de refluxo e a colecistopatia têm maior incidência na mulher. A dispepsia funcional é discretamente mais frequente na mulher. H. PYLORI Trata-se de uma bactéria Gram-negativa, espiralada, que consegue infectar o estômago e que, quando não erradicada, pode perdurar por toda a vida e causar uma gastrite assintomática, úlcera péptica ou câncer gástrico. A diferença entre úlcera e erosão está de acordo com a camada afetada. Úlcera afeta a mucosa e submucosa, podendo atingir a camada muscular e até mesmo perfurar e sangrar. A erosão é uma ferida superficial, só afeta a mucosa. HÁBITOS E VÍCIOS • Estão associados ao tabagismo o câncer de esôfago, estômago e pâncreas, bem como a úlcera péptica e a doença de refluxo; • Já o alcoolismo está associado à pancreatite crônica, à hepatopatia e, quando da ingestão aguda e volumosa, à gastrite; • A ingestão abusiva de sal, alimentos defumados e conservas é um risco para o câncer gástrico. Alguns alimentos pioram os sintomas, mas não causam a doença (café, pimenta, alimentos gordurosos, doces, mastigação insuficiente, volume exagerado); • O uso de medicamentos, em especial o de anti- inflamatórios, que tem se popularizado muito ao longo do tempo, pode ser causa de úlcera péptica e sangramento gastrointestinal. Quadro clínico O quadro clínico da dispepsia não permite diagnóstico diferencial das dispepsias pépticas, porque o exame clínico é habitualmente normal e as queixas clínicas são semelhantes, exceção feita à doença de refluxo gastroesofágico, quando os sintomas típicos estão presentes: pirose retroesternal, regurgitação e azia. - abordagem da RGE Metade dos casos de doença de refluxo tem a endoscopia digestiva alta normal; se considerados dispépticos. Se considerados dispépticos (erradamente), o diagnóstico será de dispepsia funcional, que tem fisiopatologia e tratamento diverso da doença de refluxo. - abordagem da dispepsia Pedir EDA pois a história e exame físico não esclarece. - abordagem do paciente Na abordagem do paciente com dispepsia devemos avaliar se é típica ou não, se há sinais ou sintomas de alarme. A caracterização da dispepsia como típica (estar relacionada ou não à digestão) é menos importante do que a identificação de sintomas de alarme (sinais ou sintomas que denotam gravidade em doença orgânica) Para as dispepsias sem complicações não se espera a presença de sintomas sistêmicos: febre, perda de peso, vômitos frequentes, anemia, adenomegalia e visceromegalia. A presença desses sintomas deve levar à suspeita de complicações de dispepsia péptica ou de doenças não pépticas com sintomas dispépticos − aí, se adequada, a necessidade de endoscopia precoce. • Complicação da síndrome dispéptica; • Doença não péptica com sintomas pépticos. Propedêutica clínica 3 Anamnese É importante perguntar e avaliar o sintomas, os sinais de alarme, a localização (epigástrio), procurar saber sobre os hábitos alimentares e vícios, quadro semelhante, antecedentes familiares e uso de medicações (principalmente de protetores gástricos que podem mascarar os sintomas e a periodicidade de sintomas da úlcera péptica: dói, come, passa (úlcera duodenal). Come, dói, passa, dói (úlcera gástrica). Úlcera péptica A úlcera péptica ocorre por causa de um desbalanço entre a agressão cloridropéptica e a resistência da mucosa gástrica. • Com exceção aos casos de hipersecreção gástrica como na síndrome de Zollinger-Ellison, no qual tumores produtores de gastrina determinam o aumento da agressão cloridropéptica. • A Helicobacter pylori age no antro gástrico diminuindo a ação das células D, que regulam a liberação da gastrina pelas células G, promovendo hipercloridria e lesão da mucosa por liberação de mediadores inflamatórios induzidos pela bactéria. • Os anti-inflamatórios, por sua ação no bloqueio da enzima ciclooxigenase (COX) 1 resultam em diminuição da produção de prostaglandina, substância importante na resistência da mucosa gástrica. DRGE A causa mais frequente dessa doença é o relaxamento transitório do esfíncter do esôfago inferior. Esse relaxamento permite o refluxo do conteúdo gástrico para dentro da mucosa esofágica, que não apresenta os mecanismos de defesa da mucosa gástrica. A ação do líquido do refluxo ácido nesse local pode determinar desde uma inflamação superficial até o surgimento de úlcera. A persistência da agressão pode levar ao surgimento de metaplasia intestinal local, capaz de evoluir para displasia e para o adenocarcinoma esofágico. São os fatores de risco: medicamentos, alimentos gordurosos, tabagismo, aumento da pressão abdominal (obesidade, refeição volumosa) e alterações anatômicas (hérnia hiatal). Dispepsia funcional É a dispepsia de fisiopatologia mais complexa e ainda pouco conhecida, muito embora uma doença benigna.Quase sempre é recidivante, e o estado psicológico do paciente tem muita importância na dificuldade do seu tratamento e nas recidivas da doença. Existem algumas hipóteses para sua fisiopatologia: infecção por H. pylori, hipercloridria, dismotilidade (retardo do esvaziamento) e infecção prévia (mecanismo autoimune). - abordagem da dispepsia A melhor abordagem para pacientes jovens deve ser a pesquisa do Helicobacter pylori por meios não invasivos e sua erradicação, quando testes positivos, deixando a endoscopia para pacientes com mais de 40 anos, a fim de afastar a neoplasia gástrica. Pacientes dispépticos com menos de 40 anos, que se mantêm sintomáticos após a erradicação da bactéria, devem ser abordados como portadores de dispepsia funcional. • Dispepsia em jovens e adultos com menos de 40 anos e sem sinais de alarme: tratamento empírico com supressão ácido por 4-6 semanas; • Dispepsia em pacientes com mais de 40 anos (faixa etária com risco para neoplasia gástrica) e com sinais de alarme: EDA com pesquisa de H. pylori. Casos clínicos • Homem de 52 anos de idade, tabagista, hipertenso não controlado, com antecedente familiar de diabetes, trabalhando como taxista e fazendo uso frequente de bebida alcoólica, relata há 6 meses crises de dor epigástrica de curta duração desencadeada com refeições pesadas e esforço físico. Tem usado o “medicamento para o fígado”, sem melhora. o Quais Síndromes são possíveis? Propedêutica clínica 4 • Mulher de 21 anos de idade relata epigastralgia e empachamento pós-prandial há 1 mês, com náuseas e vômitos frequentes, mais intensos pela manhã. Nega emagrecimento, uso de medicamentos e de álcool e tabaco. Apresenta irregularidade menstrual. É muito emotiva e reconhece que tem estado mais nervosa neste período. o Tem critérios de Roma? Se for qual a etiologia da dispepsia? • Homem de 32 anos de idade, com epigastralgia há 3 meses, relata melhora com a alimentação e despertar noturno com a dor, é fumante, mas nega uso de álcool e de medicamentos. Vem obtendo melhora com o uso de magnésia bisurada, que sua avó lhe ensinou, mas tem recidiva dolorosa toda vez que suspende o medicamento. Está muito preocupado, porque está desempregado há 6 meses e tem vivido à custa de pequenos expedientes. o Tem os critérios de Roma? Provável etiologia? Faria a EDA? • Mulher, 53 anos de idade, procedente de Minas Gerais, procurou ambulatório com queixa de disfagia há 6 anos, com piora no último ano. No início do quadro, conseguia manter alimentação adequada, necessitando ingerir mais líquidos durante as refeições. No momento, possui dificuldade para ingerir sólidos e líquidos, apresenta também queixa de regurgitação de alimentos não digeridos. o Qual a síndrome? Qual a etiologia? O que espera encontrar na EDA? Qual o mecanismo fisiopatológico?
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