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25 de agosto de 2015. Aula 3 da Teoria da Pena
Professor: Renato Dantas
Penas Restritivas de Direitos
Se a pena é um mal necessário, devemos, num Estado Social e Democrático de Direito, buscar aquela que seja suficientemente forte para a proteção dos bens jurídicos essenciais, mas que, por outro lado, não atinja de forma brutal a dignidade da pessoa humana. As raízes iluministas do princípio da proporcionalidade fazem com que hoje, passados já três séculos, colhamos os frutos de um direito penal que visa ser menos cruel e procura observar os direitos fundamentais do homem.
Há casos em que podemos substituir a pena de prisão, por outras alternativas, evitando-se, assim, os males que o sistema carcerário acarreta, principalmente com relação àqueles presos que cometeram pequenos delitos e que se encontram misturados com delinqüentes perigosos. Nesse sentido são as lições de Manoel Pedro Pimentel quando afirma: “O fracasso da prisão como agência terapêutica foi constatado, relativamente às penas de curta duração, logo depois de iniciada a prática do encarceramento como pena. É antiga, portanto, a idéia de que o ambiente do cárcere deve ser evitado, sempre que possível, nos casos em que a breve passagem do condenado pela prisão não enseje qualquer trabalho de ressocialização. Por outro lado, essas pequenas condenações não se prestam a servir como prevenção geral, acrescentando-se o inconveniente de afastar o sentenciado do convívio familiar e do trabalho, desorganizando, sem nenhuma vantagem, a sua vida”.
As penas substitutivas à prisão, apesar das posições em contrário, são uma solução, mesmo que parcial, para o problema relativo à resposta do Estado quando do cometimento de uma infração penal. Com fundamento nesse pensamento, a parte geral do CP, que já tinha previsão de penas substitutivas, teve o seu rol ampliado e suas condições de cumprimento modificadas pela Lei nº 9.714, de 25 de novembro de 1998, que veio, assim, atender aos anseios da comunidade jurídica.
Espécies de penas restritivas de direitos
Com o advento da Lei nº 9.714/98, foi ampliado o rol das penas restritivas de direitos elencadas pelo art. 43 do CP. Duas foram adicionadas e outra recebeu um acréscimo. Nos termos do referido artigo, as penas restritivas de direitos são: 1º) prestação pecuniária; 2º) perda de bens e valores; 3º) prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas; 4º) interdição temporária de direitos; e 5º) limitação de fim de semana.
Com a nova redação dada ao art. 43, foram criadas as penas de prestação pecuniária e de perda de bens e valores, sendo, ainda, admitida a prestação de serviços a entidades públicas.
Com relação às penas restritivas de direitos, é importante salientar que, embora o art. 44 diga que são autônomas, na verdade, até a edição da Lei nº 11.343/2006, não existiam tipos penais nos quais a pena prevista no seu preceito secundário fosse única e exclusivamente a restrição de direitos. Tais penas, agora, como regra, são substitutivas, ou seja, primeiramente aplica-se a pena privativa de liberdade e, quando possível, presentes os requisitos legais, procede-se à sua substituição.
Embora o CP as trate como penas restritivas de direitos, nem todas possuem essa natureza. Como bem destacou Cezar Roberto Bitencourt, “a denominação penas ‘restritivas de direitos’ não foi muito feliz, pois, de todas as modalidades de sanções sob a referida rubrica, somente uma refere-se especificamente à ‘restrição de direitos’. As outras: prestação pecuniária e perda de bens e valores são de natureza pecuniária; prestação de serviços à comunidade e limitação de fim de semana referem-se mais especificamente à restrição de liberdade do apenado”.
Requisitos para a substituição
O art. 44 do CP elenca os requisitos necessários e indispensáveis para que o juiz possa levar a efeito a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos. São requisitos considerados cumulativos, ou seja, todos devem estar presentes para que se possa realizar a substituição. Dois deles, segundo entendemos, são de ordem objetiva (incisos I e II) e o terceiro de natureza subjetiva (inciso III, do art. 44).
Faremos, em seguida, a análise de cada um, isoladamente.
O primeiro requisito, de ordem objetiva, diz ser possível a substituição quando aplicada pena privativa de liberdade não superior a 4 anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo (art. 44, I, do CP).
A primeira exigência contida no inciso I diz respeito à quantidade da pena. A substituição somente se viabiliza se a pena aplicada não for superior a quatro anos, nos casos de infração dolosas, uma vez que para os delitos culposos a lei não fez qualquer ressalva com relação ao limite de pena aplicada. Sendo dolosa a infração penal, se a pena aplicada não for superior a quatro anos, teremos de verificar, ainda, se o crime foi cometido com o emprego de violência ou grave ameaça à pessoa, uma vez que, nesses casos, mesmo a pena permanecendo no limite estipulado pelo inciso I, o agente não poderá ser beneficiado com a substituição.
A primeira indagação que se levanta é a seguinte: se uma das finalidades da substituição é justamente evitar o encarceramento daquele que teria sido condenado ao cumprimento de uma pena de curta duração, nos crimes de lesão corporal leve, de constrangimento ilegal ou mesmo de ameaça, onde a violência e a grave ameaça fazem parte desses tipos, estaria impossibilitada a substituição? Entendemos que não, pois se as infrações penais se amoldam àquelas consideradas de menor potencial ofensivo, sendo o seu julgamento realizado até mesmo no Juizado Especial Criminal, seria um verdadeiro contrassenso impedir justamente nesses casos a substituição. Assim, se a infração penal for da competência do Juizado Especial Criminal, em virtude da pena máxima a ela cominada, entendemos que mesmo que haja o emprego de violência ou grave ameaça será possível a substituição.
A inexistência da reincidência em crime doloso é o segundo requisito exigido pelo inciso II. Isso quer dizer que, se qualquer uma das duas infrações penais que estão sendo colocadas em confronto, a fim de aferir a reincidência, for de natureza culposa, mesmo sendo o réu considerado tecnicamente reincidente, isso não impedirá a substituição. Ou seja, exige a lei, como fator impeditivo da concessão da substituição, a reincidência dolosa, isto é, tanto a infração penal anterior como a posterior são de natureza dolosa. Caso contrário, aberta estará a possibilidade de aplicação de pena substitutiva à prisão.
Embora, pelo menos inicialmente, a reincidência dolosa impeça a substituição, o § 3º do art. 44 do CP fez uma ressalva no sentido de que se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face de condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime.
Portanto, o juiz terá de avaliar se, mesmo tendo havido condenação anterior por crime doloso, sendo concedida a substituição, ela atingirá a sua dupla finalidade: evitar o desnecessário encarceramento do condenado, impedindo, com isso, o seu contato com presos que cumprem penas em virtude da prática de infrações graves, afastando-o do ambiente promíscuo e dessocializador do sistema penitenciário, bem como se a substituição também trará em si o seu efeito preventivo. Caso o julgador perceba que em caso de substituição da pena de prisão pela restrição de direitos, em razão da condenação anterior, esta não surtirá qualquer efeito, deve prevalecer a regra do inciso III do art. 43, ficando impossibilitada a substituição.
Em todo caso, se houver condenação pela prática do mesmo crime anterior, sendo o condenado reincidente específico, também não se permitirá a substituição, de acordo com a última parte do § 3º do art. 44 do CP.
O requisitode natureza subjetiva encontra-se no inciso III do art. 44 do CP, que, juntamente com os dois anteriores, possibilita a substituição desde que a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.
Esse terceiro requisito serve de norte ao julgador para que determine a substituição somente nos casos em que se demonstrar ser ela a opção que atenda tanto o condenado quanto a sociedade. Pena restritiva de direitos não quer significar impunidade, ou mesmo descaso para a proteção dos bens jurídicos mais importantes tutelados pelo Direito Penal. A pena, como diz a última parte do caput do art. 59 do CP, deve ser necessária e suficiente para a reprovação e prevenção do crime. 
Duração das penas restritivas de direitos
Diz o art. 55 do CP que as penas restritivas de direitos referidas nos incisos III, IV, V e VI do art. 43 terão a mesma duração da pena privativa de liberdade substituída, ressalvado o disposto no § 4º do art. 46.
Na verdade, embora o art. 55 faça menção ao inciso III do art. 43 do CP, esse inciso foi vetado pelo Poder Executivo, razão pela qual somente as penas de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana é que terão a mesma duração das penas privativas de liberdade aplicadas.
Assim, transitada em julgado a sentença que aplicou a pena restritiva de direitos, o juiz da execução, de ofício ou a requerimento do MP, promoverá a execução, podendo, para tanto, requisitar, quando necessário, a colaboração de entidades públicas ou solicitá-la a particulares (art. 147 da LEP).
Prestação pecuniária
A prestação pecuniária, segundo o § 1º do art. 45 do CP, consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou a entidade pública ou privada, com destinação social, de importância fixada pelo juiz, não inferior a um salário mínimo nem superior a 360 salários mínimos. O valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil, se coincidentes os beneficiários. 
Quando o juiz do processo de conhecimento condena o réu à pena de prestação pecuniária, vários detalhes devem ser observados: 
1º) a vitima e seus dependentes tem prioridade no recebimento da prestação pecuniária, não podendo o juiz determinar o seu pagamento da entidade publica ou privada quando houver aqueles;
2º) nas infrações penais onde não havia vitima, a exemplo do delito de formação de quadrilha ou bando ( art. 288 do CP), poderá a apresentação pecuniária ser dirigida a entidade publica ou privada com destinação social; 
3º) a condenação tem os seus limites estipulados em no mínimo 1 (um) salário mínimo e no máximo 360 (trezentos e sessenta) salários;
4º) o valor pão a vitima ou a seus dependentes será deduzido do montante em ação de reparação civil, no caso de serem coincidentes os beneficiários. 
Para que a pena privativa de liberdade possa ser substituída pela prestação pecuniária, não há necessidade de ter ocorrido um prejuízo material, podendo ser aplicada nas hipóteses em que a vítima sofra um dano moral. 
Perda de bens e valores
Preconiza o § 3º do art. 45 do CP que a perda de bens e valores pertencentes aos condenados dar-se-á, ressalvada a legislação especial, em favor do Fundo Penitenciário Nacional, e seu valor terá como teto, o que for maior, o montante do prejuízo causado ou do proveito obtido pelo agente ou por terceiro, em conseqüência da prática do crime.
Os bens de que trata o parágrafo podem ser móveis ou imóveis. Valores são tanto a moeda corrente depositada em conta bancária como todos os papéis que, a exemplo das ações, representam importâncias negociáveis na bolsa de valores.
Ressaltando a diferença existente entre a perda de bens e valores e o confisco previsto no CP, Luiz Flávio Gomes assevera que “só cabe o confisco dos instrumentos do crime e dos produtos do crime ou do proveito obtido com ele, isto é, bens intrinsecamente antijurídicos; por seu turno, a perda de bens não requer sejam bens frutos de crime. O que o condenado vai perder são seus bens ou valores legítimos, os que integram seu patrimônio lícito. Nesse caso, portanto, dispensa-se a prova da origem ilícita deles”.
Devemos destacar que a redação do inciso XLV do art. 5º da CF, que, embora asseverando que nenhuma pena passará da pessoa do condenado, ressalva a possibilidade de a obrigação de reparar o dano e a decretação de perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido.
A redação do dispositivo constitucional nos permite concluir que, embora sendo uma pena, poderá decretação do perdimento de bens, ser estendida aos sucessores do condenado e contra eles executada até o limite do valor do patrimônio transferido. Nesse sentido é o entendimento de Luiz Flávio Gomes, quando aduz que “tanto a pena nova de perda de bens como a prestação pecuniária, esta nada mais é que uma antecipação da reparação dos danos, podem ser estendidas aos sucessores. Ambas exprimem as exceções constitucionais, valendo observar que a mesma lição não se pode extrair no concernente à multa”.
Prestação de serviços à comunidade ou a entidade públicas
A prestação de serviços à comunidade ou a entidade públicas consiste na atribuição de tarefas gratuitas ao condenado, que serão por ele levadas a efeito em entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos e outros estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais, sendo que as tarefas que lhe serão atribuídas devem ser de acordo com as suas aptidões, devendo ser cumpridas à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho (art. 46, §§ 1º, 2º e 3º).
Uma vez concedida a substituição pelo juiz do processo de conhecimento, transitada em julgado a sentença penal condenatória, os autos serão remetidos ao juízo da execução.
Conversão das penas restritivas de direitos
A pena restritivas de direitos converte-se em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta. No cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos, respeitando o saldo mínimo de 30 dias de detenção ou reclusão (art. 44, § 4º, do CP). 
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