Prévia do material em texto
TECNOLOGIA DE ALIMENTOS Fernanda Robert de Mello Métodos de conservação de alimentos Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Apontar os métodos de conservação de alimentos pelo uso do calor. � Identificar os métodos de conservação de alimentos pelo uso do frio. � Reconhecer a conservação de alimentos pelo controle da umidade. Introdução A conservação de alimentos se impõe em todas as fases que procedem o seu consumo, podendo ser obtidas por meio de vários processos. Com a necessidade de aumentar a vida útil das matérias-primas e também das preparações prontas, com o passar do tempo, foram desenvolvidos métodos e equipamentos para a manutenção da qualidade dos alimentos. Os processos de conservação se baseiam na destruição, total ou parcial dos microrganismos capazes de alterar o alimento, na modificação, ou na eliminação de um ou mais fatores (intrínsecos ou extrínsecos) que são essenciais, de modo que o alimento não se torne favorável ao desenvolvimento microbiano. No tratamento térmico, utilizam-se temperaturas que eliminam os micror- ganismos, destruindo parte ou toda a microbiota. Outros métodos procuram dificultar a multiplicação, como no caso do frio e da redução da umidade. Neste capítulo, você vai compreender os métodos de conservação de alimentos pelo uso do calor, do frio e também pelo controle da umidade. Conservação de alimentos pelo calor A utilização do calor como método de conservação tem como objetivo destruir e/ou reduzir o número de microrganismos deteriorantes e patogênicos nos alimentos. Além disso, o uso dessa forma de energia serve para inativar as enzimas autolíticas, naturalmente presentes nos alimentos, que são respon- sáveis pelos processos de sua deterioração e putrefação. Isso propicia que os alimentos permaneçam aptos ao consumo por muito mais tempo. A ação do calor sobre os microrganismos é variável. Ela depende, prin- cipalmente, da espécie e da quantidade de unidades formadoras de colônias (UFC) de microrganismos presentes, das características gerais do alimento e da forma de aplicação do calor, na qual se considera a temperatura, o tempo de aplicação e o meio de aquecimento, quando se trata de calor úmido ou seco, por exemplo. O calor aplicado aos alimentos não mata toda a carga microbiana em um só momento. Ao contrário, a morte dos microrganismos ocorre de forma gradual, com o passar do tempo. Do ponto de vista matemático, essa redução microbiana é classificada como redução exponencial. A forma gradual de redução microbiana significa que os microrganismos apresentam resistência ao calor, tecnicamente denominada resistência térmica. Tal característica se expressa como valor D e representa o tempo (em minutos), durante o qual uma população microbiana deve ser submetida a determinada temperatura para se obter a destruição de 90% dessa população. O valor D equivale, portanto, ao tempo de morte térmica específico para cada espécie microbiana. Quanto maior for a quantidade de microrganismos e maior sua resistência térmica específica, maior será o valor D. No processamento térmico dos alimentos, adotam-se, normalmente, com- binações de tempo e temperatura previamente estabelecidos e que não variam entre as diferentes bateladas de produção. Assim, por exemplo, na pasteurização do leite, costuma-se usar o binômio com temperatura-tempo entre 72 e 75 °C por 15 segundos. Se, por ocasião da ordenha das vacas, não forem adotados cuidados no momento de higienizar as tetas ou o equipamento de ordenha, o leite obtido ficará contaminado por microrganismos. Assim sendo, com base no valor D, a pasteurização pode não eliminar totalmente a carga microbiana presente, acarretando prejuízos, tanto para a qualidade do leite, quanto para a saúde do consumidor. Os principais métodos de conservação de alimentos pelo calor são: pasteu- rização, esterilização, tindalização, branqueamento e apertização. Pasteurização A pasteurização é um tipo de tratamento térmico empregado quando: (i) o alimento a ser conservado (p. ex., leites e sucos) é susceptível a danos quanto à exposição a altas temperaturas; (ii) os agentes microbianos causadores das Métodos de conservação de alimentos64 alterações apresentam baixa termorresistência; e (iii) os agentes competitivos podem ser eliminados sem prejudicar os agentes benéficos, requeridos em um determinado processo de fermentação (p. ex., na fabricação de iogurtes). Na pasteurização, parte dos microrganismos presentes nos alimentos é destruída, sendo recomendado, em sequência, o emprego de cuidados com- plementares, como: o uso da refrigeração (no caso do leite), a adição de açúcar (leite condensado) e/ou o estabelecimento de condições anaeróbias, como o fechamento a vácuo de recipientes. No caso da pasteurização rápida (HTST, do inglês high temperature and short time), pode ser citado, como exemplo, o beneficiamento do leite, em que o produto é submetido à temperatura de 72 °C por 15 segundos e, em sequência, é refrigerado a 5 °C. Isso é possível pela passagem do líquido por trocadores de calor, a uma vazão que permite o contato do leite com a temperatura de 72 °C durante 15 segundos. Na pasteurização lenta (LTLT, do inglês low temperature, long time), o leite é empregado a uma temperatura de 62 °C durante 30 minutos. Esse tipo de tratamento é recomendado para pequenas unidades industriais, pois o fator limitante é o tamanho do recipiente a ser utilizado para o aquecimento da matéria-prima. Esterilização A esterilização consiste no aquecimento de alimentos a uma temperatura elevada, durante minutos ou segundos, com a finalidade de destruir todos os microrganismos presentes e inativar as enzimas capazes de deteriorar o alimento durante a estocagem (FELLOWS, 2006). Uma das desvantagens desse tratamento térmico é a perda do valor nutritivo e das características organolépticas do alimento, além do custo elevado. Temperaturas e tempos específicos dependem do tipo de alimento em questão: produtos com baixa acidez e líquidos, como o leite, são mais sus- ceptíveis aos microrganismos e às bactérias patogênicas que os produtos com alta acidez, como os sucos de frutas. As combinações de tempo e temperatura utilizadas nesse tipo de proces- samento térmico causam efeitos na maioria dos pigmentos naturais presentes nos alimentos, na textura, no aroma e na viscosidade. Para contornar tais alterações indesejáveis, são adicionados corantes, amaciantes e outros aditivos químicos sintéticos. O processamento térmico causa hidrólise dos lipídios e dos carboidratos, mas esses nutrientes continuam presentes e o valor nutricional final, em 65Métodos de conservação de alimentos relação a esses macronutrientes, não é afetado. Em relação às proteínas, pode ocorrer perda de 10 a 20% dos aminoácidos durante o tratamento térmico. A redução do teor do aminoácido essencial lisina pode atingir até 25% e é proporcional à intensidade do aquecimento. A perda de triptofano e metionina fica entre 6 e 9%. As gorduras mudam de estado físico quando estão sob efeito do calor. Em geral, são sólidas em temperatura ambiente (gorduras de origem animal) e derretem facilmente com o aumento desta. As gorduras sólidas e líquidas (óleos vegetais) atingem temperaturas mais elevadas que a água, sendo muito utilizadas para fritar e dourar os alimentos. Embora esse método permita a conservação durante um razoável período de tempo, elevadas temperaturas destroem algumas vitaminas, alteram outros nutrientes e, consequentemente, modificam o valor nutritivo, o sabor, a cor e a consistência do alimento. A ultrapasteurização ou pasteurização UHT (do inglês ultra-high tempe- rature – temperatura ultra alta) é um processo de esterilização de alimentos por aquecimento. O líquido a ser esterilizado é aquecido durante um curto período de tempo (cerca de 1-2 segundos) a uma temperatura de 140 a 150 °C, o suficiente para matar ou neutralizaresporos bacterianos, e é imediatamente resfriado a uma temperatura inferior a 32 °C. O produto UHT mais conhecido é o leite, mas esse processo também é usado em sumos de frutas, cremes, iogurtes, vinhos, sopas e outros. O leite que sofre o processo UHT (conhecido como longa vida) tem uma vida de prateleira ou validade garantida de até 180 dias antes de ser aberto, quando embalado hermeticamente. Tindalização Esse método foi proposto pelo físico inglês John Tyndall. O processo consiste em submeter o alimento a temperaturas que podem ser de 60 a 90 °C, durante alguns minutos, diversas vezes, intercaladas por períodos de resfriamento. Assim, o produto é aquecido e, em sequência, refrigerado por 24 horas, período em que os esporos tomam a forma vegetativa. Em sequência, procede-se o novo aquecimento. O número de aque- cimentos pode variar de 3 a 12 para a obtenção do nível de esterilização desejado. A vantagem do método está em preservar as qualidades orga- nolépticas do produto. Métodos de conservação de alimentos66 Branqueamento Esse processo consiste em mergulhar o alimento em água aquecida ou insuflar vapor sobre este, durante um curto espaço de tempo, que vai de 2 a 10 minutos. É recomendado o imediato resfriamento em água fria. O branqueamento é indicado para frutas e hortaliças, cuja principal fina- lidade é inativar enzimas. Esse tratamento é comumente recomendado antes dos processos de congelamento, desidratação e apertização. Nesses casos, o tratamento de branqueamento evita a ocorrência da alteração de cor, sabor, aroma, textura e valor nutritivo. No processo de apertização (produção de enlatados), o branqueamento possui por objetivos: (i) remover os gases dos tecidos; (ii) inativar as en- zimas; (iii) promover a desinfecção externa do produto e das embalagens; (iv) fixar cor e textura; e (v) pré-aquecer o produto, o que diminui o tempo de uso da autoclave. Apertização O processo de apertização foi patenteado em 1809, pelo confeiteiro pa- risiense Nicolas Appert. Ele ganhou o prêmio de 12.000 francos por ter descoberto um processo que possibilita a conservação de alimentos por um longo período de tempo. O prêmio foi proposto em concurso estipulado pelo imperador Napoleão. O processo descoberto por Appert consistia em acondicionar os produtos em jarros hermeticamente fechados com rolhas e, então, aplicar calor por meio de banhos em água aquecida por um determinado período de tempo. O tempo de aplicação foi definido empiricamente. Em 1810, Peter Durand patenteou um processo semelhante, porém empre- gando latas. Esta era confeccionada em chapas de ferro revestidas de estanho. Em 1813, o exército e a marinha britânica começaram a utilizar carnes, sopas e várias combinações de legumes enlatados. Duas latas deixadas pelo Capitão Edward Parry em sua expedição ao Ártico, em 1824, foram descobertas em 1911 (87 anos depois) em boas condições. Estas, que continham ervilha e carne de boi, respectivamente, foram abertas e consumidas na Inglaterra. Um grande impulso ao processo de apertização foi dado em 1904, com a invenção das latas recravadas pela Sanitary Can Company. Até então, as latas eram lacradas com o uso de soldas. Atualmente, há vários modelos de recravadeiras, que são as máquinas utilizadas no fechamento das latas. 67Métodos de conservação de alimentos A aplicação de calor é importante para a destruição de patógenos e microrganismos deteriorantes para a desnaturação de enzimas e para o amolecimento de tecidos. Entretanto, reações indesejáveis podem ocorrer em paralelo. É o caso das reações de degradação de vitaminas, proteínas e cor, das reações de escurecimento e das reações de alteração de textura. Conservação de alimentos pelo frio O método mais comum de conservar alimentos consiste no uso do frio ou na redução da temperatura. Obter frio significa retirar o calor, de modo a reduzir a temperatura do produto a níveis desejados. O abaixamento da temperatura inibe a ação das enzimas ou dos micróbios, porém, contrariamente ao calor ou à irradiação, não os elimina. A refrigeração como método de preservação é cada vez mais utilizada, pois mantém intactas as características sensoriais e nutritivas dos alimentos. Existem microrganismos que podem estar presentes nos alimentos em contagens toleráveis. Isso significa que, dependendo do tipo de alimento e do tipo de microrganismo, poderemos consumir com certa carga microbiológica, sem que haja prejuízos para a qualidade do alimento e sem consequências para a nossa saúde. Todos os microrganismos têm temperaturas ótimas para o seu crescimento e reprodução, sendo assim, o princípio básico da conservação pelo frio é manter a temperatura abaixo da ideal para o crescimento e a proliferação microbiana. Da mesma forma, as reações enzimáticas ocorrem em temperaturas ideais, sendo assim, o princípio para minimizá-las é o mesmo: manter a temperatura abaixo da ideal. Em geral, a duração da conservação dos alimentos aumenta quando estes são mantidos em temperaturas mais baixas. É daí que resulta a in- formação de que o controle das temperaturas de refrigeração seja crucial, pois qualquer aumento da temperatura dos alimentos pode favorecer o crescimento de microrganismos, levando à sua deterioração ou à multi- plicação de bactérias patogênicas. Existem dois tipos de conservação pelo frio: a refrigeração e o congela- mento. Cada um se adequa ao tipo de alimento e ao tempo de conservação que se deseja atingir. Métodos de conservação de alimentos68 Refrigeração Podemos definir refrigeração como o abaixamento da temperatura de um produto, visando a manter a qualidade pela diminuição das velocidades das reações de deterioração que possam ocorrer neste. Nesse processo, apesar de não ocorrer a eliminação dos microrganismos, inibe-se o ciclo de reprodução e, consequentemente, retarda-se a deterioração dos alimentos quando atacados. Para manter os alimentos refrigerados, utilizam-se temperaturas acima do ponto de congelamento, entre 0 e 7 °C, para não ocorrer mudança de fase da água do alimento. Usa-se essa técnica como meio básico temporário até que se aplique outro método, ou seja realizado o consumo do alimento. Os impactos sobre as propriedades nutricionais e sensoriais dos alimen- tos são mais fracos na refrigeração, porém, conseguimos atingir tempos de conservação menores que no processo de congelamento. Fatores a serem considerados no armazenamento de produtos refrigerados: � Temperatura: a temperatura de refrigeração a ser escolhida depende do tipo de produto, do tempo e das condições de armazenamento. Pode acontecer de produtos do mesmo tipo, mas com variedades diferentes, variarem muito a temperatura de armazenamento. � Umidade relativa: a umidade do ar dentro da câmara varia conforme o alimento a ser conservado e está diretamente relacionada com a quali- dade do produto. Uma umidade muito baixa leva à perda de umidade do alimento, podendo ocorrer desidratação, e uma umidade muito alta pode facilitar o crescimento microbiano. Cada alimento tem uma umidade relativa ótima já conhecida. Para armazenamentos longos, recomenda-se o uso de embalagens apropriadas e que a umidade relativa não oscile mais que de 3 a 5%, em geral, esta deve ser mantida entre 80 e 90%. � Circulação do ar: a distribuição de calor dentro da câmara se dá pela circulação do ar que permite manter a composição e a temperatura uniformes. O ar da câmara deve ser renovado diariamente. � Luz: preferencialmente, o local deve ser mantido às escuras e, se for necessário, pode-se empregar lâmpadas ultravioletas a fim de reduzir o crescimento de fungos e bactérias. � Composição da atmosfera de armazenamento: o efeito conservador da refrigeração pode ser potencializado se for combinado com o con- trole da composição de gases da atmosfera de armazenamento. Isso porque os alimentos, após a colheita, continuam respirando, havendo um aumento na taxa de gás carbônico, o que afeta algunsprocessos 69Métodos de conservação de alimentos fisiológicos, acelerando a sua deterioração. A composição atmosférica ideal é de 3% de oxigênio, 5% de gás carbônico e 92% de nitrogênio. � Características dos alimentos refrigerados: a refrigeração não altera drasticamente o valor nutritivo dos alimentos, já que as reações químicas são reduzidas. Porém, foi detectada, em algumas hortaliças, a redução de certas vitaminas, mesmo em curto período de refrigeração. Na aplicação do frio, devem ser considerados os seguintes aspectos: � o alimento deve ser sadio, pois o frio não restitui uma qualidade perdida; � a aplicação do frio deve ser feita o mais cedo possível, após a colheita, abate ou preparo do alimento; � durante todo o tempo, desde o preparo até o consumo, o emprego do frio não deve ser interrompido; � os alimentos com princípios de deterioração, conservados pelo frio, ao serem trazidos à temperatura ambiente, estragam-se rapidamente, além disso, as toxinas são conservadas pelo frio. Congelamento É a redução da temperatura abaixo do ponto de congelamento dos alimentos. A congelação indica que a água se transformou em cristais de gelo. Por isso, esse processo é considerado um método de conservação, pois a formação de cristais de gelo impede que os microrganismos utilizem a água para se multiplicar. Esse fenômeno é designado como redução da atividade de água, da qual resulta que praticamente não haja multiplicação de microrganismos nos alimentos congelados, dependendo da temperatura atingida. Embora haja microrganismos que não resistam à congelação, não é esse método que deve ser utilizado para eliminá-los, mas, sim, o calor. As tempe- raturas que, em geral, são utilizadas hoje para congelar os alimentos estão na faixa de -25 a -2 °C, propiciando que eles possam ser conservados por períodos de 1 a 2 anos. As temperaturas de congelação entre -25 e -18 °C proporcionam maior garantia de conservação, pois, nesse caso, quase 100% da água se encontra na forma de gelo. As temperaturas entre -12 e -10 °C não garantem a mesma durabilidade, pois nem toda a água se encontra na forma de gelo. O processo de congelamento dos alimentos pode ser realizado de forma lenta ou rápida, resultando em diferentes consequências para o produto. Métodos de conservação de alimentos70 � Congelamento lento: nesse processo, que dura de 3 a 12 horas, a temperatura vai gradativamente abaixando até chegar na tempe- ratura desejada. Os primeiros cristais são formados no interior da célula, forçando a água migrar desse interior, o que causa a ruptura de algumas paredes celulares. Quando ocorre o descongelamento, grandes quantidades de f luidos celulares são liberadas, provocando alterações na qualidade nutricional e organoléptica (como perda de nutrientes e modificações de textura e aparência). Esse suco liberado é rico em vitaminas hidrossolúveis, sais minerais e proteínas. � Congelamento rápido: congelamento no qual a queda da temperatura é muito brusca, congelando a água dos espaços intercelulares imediata- mente, formando pequenos cristais de gelo sem danificar as membranas celulares. O processo é ideal, pois, ao descongelar, o alimento reassume suas condições iniciais, sem que haja perda significativa de nutrientes e propriedades sensoriais. A temperatura mais utilizada é de -25 °C, com circulação de ar, ou de -40 °C, com ou sem circulação de ar. Após o congelamento, a armazenagem é feita a -18 °C. Conservação de alimentos pelo controle de umidade Assim como nós, os microrganismos necessitam de água para a sua manu- tenção. Ela, como solvente universal, serve, por exemplo, para transportar os nutrientes para todo o espaço intracelular e para solubilizar nutrientes, que, na sua forma original, não poderiam ser aproveitados pelos microrganismos. A conservação por controle de umidade consiste na retirada de água do alimento, ou seja, na sua desidratação. O objetivo principal da redução da ativi- dade de água de alimentos é a redução das taxas de alterações microbiológicas. Existem, ainda, outros objetivos adicionais, como a redução de alterações químicas, a redução de custos com embalagem, transporte e distribuição, além da conveniência. Sabe-se que o grupo de microrganismos de maior importância em alimentos é o das bactérias, porque nelas se encontram inúmeras espécies deteriorantes, principalmente as patogênicas. As bactérias se caracterizam por necessitarem, nos alimentos, de muita água livre para a sua multiplicação, também conhecida como atividade de água (Aa, ou, em inglês, Aw). Em alimentos com muita água livre, como as carnes in natura, alguns embutidos cárneos (salsichas, mortadelas), frutas e leite, a atividade de água 71Métodos de conservação de alimentos apresenta valores entre 0,96 e 0,98, o que indica que quase 100% da água presente nesses alimentos está disponível para a multiplicação dos micror- ganismos. Tais alimentos são, portanto, os mais expostos à deterioração ou à contaminação por bactérias patogênicas. A conservação pelo controle da umidade é um método que consiste na aplicação de calor para a remoção da água. Dependendo da intensidade do calor, obtém-se a concentração dos componentes, ou a secagem ou desidratação por meio da retirada máxima de água dos alimentos. Os alimentos que sofreram concentração ou desidratação exigem cui- dados especiais em relação às embalagens e aos locais de estocagem. Por serem desidratados, absorvem água com muita facilidade. Assim, se as embalagens forem danificadas, por exemplo, ocorrerá absorção de umidade do ambiente, o que pode levar ao desenvolvimento de bolores, à multiplicação de bactérias, ou mesmo à germinação de esporos, gerando perda de produtos. Os principais métodos de conservação de alimentos pelo controle de umi- dade são: concentração, desidratação e liofilização. Concentração Na concentração, remove-se a água dos alimentos até valores entre 30 e 60% por evaporação. Esse método é amplamente utilizado na produção de sucos concentrados e de doces e geleias de frutas. Considerando que os produtos finais permanecem com um teor de umidade ainda elevado, faz-se necessário adotar um método de conservação complementar, como o congelamento, no caso de sucos, ou o tratamento térmico antes do envase, aplicado à massa de tomate, a doces em pasta e a geleias de frutas. Existem vários tipos de equipamentos que funcionam com diferentes temperaturas para a retirar a umidade dos alimentos. Para a obtenção de alimentos concentrados, por exemplo, são utilizados evaporadores, que normalmente funcionam com temperaturas próximas a 100 °C. Existem, por outro lado, evaporadores a vácuo, cujas temperaturas são mais baixas, entre 50 e 60 °C. Desidratação/Secagem Na desidratação ou secagem, os alimentos são expostos ao ar aquecido ou colocados em contato com superfícies quentes para que ocorra a eliminação máxima da umidade. A atividade de água (aa) final dos produtos atinge Métodos de conservação de alimentos72 valores iguais ou inferiores a 0,60, indicando que praticamente toda a água do alimento foi retirada e que, consequentemente, a atividade bacteriana se torna inviável. Essa redução da aa faz com que os alimentos possam ser mantidos em temperatura ambiente durante sua vida de prateleira. Como exemplos, podem ser citadas as especiarias (temperos), as frutas desidratadas, como a banana passa e o tomate seco, e alguns alimentos, como leite em pó, farinhas, açúcar mascavo, massa alimentícia, entre outros. A desidratação dos alimentos tam- bém traz como vantagem a facilidade de estocagem e de transporte, graças à redução de volume e peso. Por outro lado, a manutenção da qualidade desses produtos requer controle das embalagens e do local de armazenamento para que eles não absorvam a umidade do ambiente. A absorção da umidade do ambiente favorece a multi- plicação, tanto de bactérias, quanto de fungos, levando à deterioração, e pode, além disso, favorecera multiplicação de bactérias patogênicas. Para a secagem de alimentos, são usados fornos ou estufas, comumente chamados de secadores de cabine, e secadores de túnel, que funcionam com temperaturas entre 45 e 85 °C. Já os atomizadores, empregados na secagem de leite em pó, trabalham com ar aquecido entre 180 e 230 °C. Nesse caso, a secagem do alimento é instantânea, porque, além de ser submetido a tempe- raturas elevadas, o alimento é atomizado, gerando partículas muito pequenas, à semelhança de um jato de spray. Liofilização Visto que o calor aplicado na desidratação dos alimentos sempre provoca alguma perda das características sensoriais e nutricionais, a liofilização tem sido utilizada como método alternativo de retirada da umidade dos alimentos. A liofilização se processa, basicamente, em duas etapas. Primeiramente, procede-se com a congelação convencional do alimento a fim de obter a concentração dos nutrien- tes. A seguir, o alimento é colocado em câmaras a vácuo, com temperaturas entre 40 e 50 °C, para que os cristais de gelo passem ao estado de vapor sem serem derretidos. A passagem dos cristais de gelo (estado sólido) ao estado gasoso (vapor d’água) é denominada de sublimação. Isso permite que o alimento perca a umidade sem danos à sua estrutura celular, mantendo intactas as suas características. Esse método requer, porém, um investimento de capital muito elevado, de modo que os produtos liofilizados atinjam preços pouco competitivos. 73Métodos de conservação de alimentos FELLOWS, P. J. Food processing technology: principles and pratice. New York: Ellis Horwood, 1988. Leituras recomendadas CAMARGO, A. C.; WALDER, J. M. M. Conservação pelo frio. rev. 2006. Disponível em: <http://www.cena.usp.br/irradiacao/CONSERVACAO_PELO_FRIO.HTM>. Acesso em: 10 nov. 2015. EVANGELISTA, J. Tecnologia dos alimentos. 2. ed. São Paulo: Ateneu, 2000. FOUST, A. S. et al. Princípios de operações unitárias. 2. ed. Rio de Janeiro: LTC, 1982. FRANCO, B. D. G. M.; LANDGRAF, M. Microbiologia de alimentos. São Paulo: Atheneu, 2002. FREITAS, A. C.; FIGUEIREDO, P. Conservação por utilização de baixas temperaturas. In: CONSERVAÇÃO de Alimentos. Lisboa: [s.n.], 2000. p. 129-136. GAVA, A. J. Princípios de tecnologia de alimentos. São Paulo: Nobel, 1983. GAVA, A. J.; SILVA, C. A. B.; FRIAS, J. R. G. Tecnologia de alimentos: princípios e aplicações. São Paulo: Nobel, 2008. GERMANO, P. M. L.; GERMANO, M. I. S. Higiene e vigilância sanitária de alimentos. São Paulo: Varela, 2001. MESSANO, A. J. G. P. Processamento de alimentos: refrigeração e congelamento. 2010. Disponível em: <http://accaciamessano.com.br/wpcontent/ uploads/downlo- ads/2011/07/REFRIGERA-CONGELA-ALM-2010.pdf>. Acesso em: 10 nov. 2015. OETTERER, M. Fundamentos de ciência e tecnologia de alimentos. Barueri, SP: Ma- nole, 2006. ORDÓÑEZ, J. A. Tecnologia de alimentos: componentes dos alimentos e processos. Porto Alegre: Artmed, 2005. POTTER, N. N. Food science. New York: Academic, 1995. SILVA, J. A. Tópicos da tecnologia de alimentos. São Paulo: Varela, 2000. TOLEDO, R. T. Fundamentals of food process engineering. New York: Chapman e Hall, 1991. VASCONCELOS, M. A. S.; MELO FILHO, A. B. Técnico em alimentos: conservação de alimentos. Recife: EDUFRPE, 2010. Referência 77Métodos de conservação de alimentos Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. Conteúdo: