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APG 05 - O quadril que estala Objetivos Compreender os fatores de risco, fisiopatologia, manifestações clínicas, diagnóstico e tratamento da displasia congênita de quadril. Entender os testes de diagnósticos da displasia congênita de quadril. Diferenciar as más formações ósseas. Displasia congênita A Displasia De Desenvolvimento do Quadril é uma condição anormal do quadril ao nascimento, em que ocorre: Perda total da relação articular entre a cabeça femoral e o acetábulo; ou, quando apesar da relação anatômica descrita estar mantida, ela pode ser facilmente alterada. Quando totalmente, define-se o quadril luxável ou, quando parcialmente, o quadril subluxável. A displasia implica progressiva deformidade do quadril, em que o fêmur proximal, o acetábulo e a cápsula são defeituosos. A luxação da cabeça do fêmur pode ocorrer no útero (fetal ou pré- natal), no nascimento (perinatal) ou depois dele (pós-natal). Os achados clínicos e radiográficos, assim como as modificações patológicas, dependem do tempo de deslocamento. A luxação do quadril é dividida em três grandes categorias: a teratológica, que ocorre antes do nascimento e envolve graves deformidades do acetábulo, da cápsula e do fêmur proximal, associada a outras malformações, como mielomeningocele, artrogripose múltipla congênita, agenesia lombossacral e anomalias cromossômicas; a neurológica, em decorrência dos desequilíbrios musculares pós-natais, como na paralisia cerebral; e a típica, que ocorre em crianças normais. Anatomia: Como todas as demais articulações, o quadril é o resultado de um elemento intermediário coxofemoral, cartilagíneo, que se inicia em uma fenda articular do embrião. Esse esboço extremamente maleável é o centro dos primeiros pontos de ossificação (diáfise femoral, ílio, ísquio e púbis), que concentram ao redor da articulação as cartilagens de crescimento, das quais dependem não só o comprimento e o tamanho dos elementos ósseos, mas também a morfologia articular. O componente femoral, possui um maciço cartilagíneo de crescimento que isola os três centros de ossificação (cabeça femoral, trocânter maior e trocânter menor) e uma grande cartilagem de conjugação, destinada ao crescimento da diáfise. Mais tarde, divide-se em três setores, sendo que o maior e mais ativo se converte na cartilagem subcapital. No nascimento, essas três cartilagens de mesma origem separam a diáfise da epífise (futuro núcleo cefálico) e das apófises (futuros trocânteres maior e menor). No entanto, ao nascimento, nenhuma dessas extremidades é visível na radiografia, pois seu núcleo secundário aparecerá somente mais tarde. É importante lembrar a estrutura, a origem e a evolução idêntica dessas três cartilagens de conjugação, sendo que, ao final do crescimento, o período de fusão é quase o mesmo. O conjunto forma um maciço cartilaginoso compacto. Para que a morfologia do acetábulo esteja definida, duas estruturas se somam: o núcleo do teto acetabular prolonga-se até a borda posterior, podendo formar um verdadeiro núcleo da parede posterior; o limbo fibrocartilagíneo, intimamente unido ao núcleo secundário, do qual é impossível sua dissociação radiográfica ou macroscópica, forma o complexo anatômico chamado de lábio (lábrum). Qualquer alteração de um afeta o outro, prejudicando a forma arredondada e circunferencial externa da cavidade, fator de retenção da cabeça femoral. A adaptação entre o fêmur e o acetábulo deve ser recíproca. Ambos os elementos, orientados um ao outro, devem ser perfeitamente congruentes e concêntricos. Apesar do período de deflexão neonatal, que modifica em mais de 100° a orientação do fêmur, e do período de carga e de marcha com apoio monopodal alternado, fêmur e pelve adaptam seu crescimento e moldam-se um ao outro. A formação do acetábulo necessita da presença do núcleo cefálico. Os diversos fatores mecânicos (deflexão, carga, esforços musculares, movimentos, etc.) são indispensáveis para a morfologia normal ao final do crescimento. Três elementos interferem nesse processo: 1.Cartilagem subcapital. Une o núcleo à metáfise, assegura o comprimento do colo do fêmur e o crescimento de toda a sua extremidade superior, representando 20% do crescimento definitivo do membro inferior. Reage, essencialmente, às forças de pressão durante a carga, na marcha e na contração muscular. 2.Cartilagem do trocânter maior. Dela depende o maciço externo metafisário e a determinação do ângulo de varização. É solicitada pelas forças de tração, que dependem principalmente do glúteo médio. O enfraquecimento ou a paralisia desse músculo desencadeia o valgismo do colo femoral. 3.Cartilagem em Y. Tal cartilagem tem sob sua responsabilidade o crescimento, a morfologia do acetábulo e 50% do desenvolvimento da pelve. Ao nascer, o acetábulo é imaturo, plano e insuficiente, circundado por estruturas fibrocartilaginosas do limbo e da cápsula articular. Epidemiologia: A incidência no Brasil é de 1 ou 2 casos a cada 1000 RN. E o sexo mais prevalente é o feminino. Mais comum na raça branca, e em relação a lateralidade, temos que, no Brasil, a distribuição aproximada é: Bilateral: 23,9%, Lado direito: 47,8% e Lado esquerdo: 28,2%. Associação com outras deformidades: Torcicolo congênito: 20% apresentam DDQ. Pé metatarso varo: 10% apresentam DDQ. Pé plano valgo: 10% apresentam DDQ. Peso médio do RN: 3.245 g, Altura média do RN: 48,6 cm, Idade materna média: 24 anos, Apresentação fetal cefálica: 95,66% e Apresentação fetal pélvica: 4,35%. Etiologia: • Fator genético: Pesquisa realizada na unicamp mostrou que mostra que uma alta porcentagem de parentes próximos dos pacientes com DDQ apresentavam alterações na avaliação do quadril em RN. • Posição intrauterina: Há maior incidência nos RN que, ao nascimento, estavam em apresentação pélvica (15,7%) comparados aos que estavam em apresentação cefálica. A flexão do quadril, durante os últimos meses de gestação, nas posições pélvica ou cefálica, aliada à frouxidão ligamentar, pode evoluir para displasia residual ou subluxação, mostrando que essa posição é importante como causa de displasia do desenvolvimento do quadril. Na posição pélvica, o fêmur do feto em flexão e rotação externa pode ser forçado para fora do acetábulo, predispondo a criança a nascer com o quadril instável, subluxado ou luxado. • Posição após o nascimento: A forma de vestir a criança, envolvendo-a em mantas que forçam a posição de adução do quadril, poderia causar DDQ. Fisiopatologia: O quadril do neonato é uma articulação relativamente instável porque a musculatura não está desenvolvida, as superfícies cartilaginosas são deformáveis com facilidade e os ligamentos são frouxos. É possível haver posicionamento exagerado em flexão aguda e adução do quadril na vida intrauterina, sobretudo em fetos com apresentação pélvica. Essa situação pode causar estiramento excessivo da cápsula posterior do quadril, o que deixa a articulação instável após o parto. A frouxidão pode refletir a história familiar ou a presença do hormônio materno relaxina na circulação fetal. Na instabilidade, o quadril está contido e reduzido, mas está “frouxo”, instável e, por conseguinte, passível de luxação, em decorrência da frouxidão capsuloligamentar. Pode haver displasia concomitante. Na displasia, ocorre desenvolvimento inadequado da articulação do quadril, incluindo o acetábulo, a cabeça femoral ou ambos. No recém-nascido, a displasia, sem instabilidade ou luxação, é assintomática, e o exame físico é normal. O diagnóstico é eventual e possível apenas por ultrassonografia. Quando tal condição vem acompanhada de instabilidade ou luxação, as manobras de Barlow confirmamo diagnóstico na avaliação por imagem. Por essa razão, o diagnóstico isolado costuma ser estabelecido muito tarde, quando a evolução alcança subluxação e luxação, com sinais clínicos mais evidentes na criança maior, como a limitação da abdução, o sinal de Galeazzi e o sinal de Trendelenburg na idade da marcha. Em certos casos, o diagnóstico pode ser ainda mais tardio, aparecendo na idade adulta sob a forma de dor em consequência de artrose precoce do quadril. Conforme Barlow, 60% dos casos de instabilidade isolada se estabilizam na primeira semana e 90% até o terceiro mês de vida. Os outros 10% tendem a evoluir para subluxação e luxação. Na experiência do autor, isso ocorre na instabilidade com displasia não diagnosticada e/ou não tratada de modo precoce. Na subluxação, existe perda parcial do contato articular. É o termo usado para descrever achados radiográficos que indicam hipoplasia do acetábulo e deslocamento parcial da cabeça do fêmur em relação ao seu encaixe no acetábulo. Na luxação, há perda total do contato articular entre a cabeça femoral e o acetábulo. Ambos os casos vêm acompanhados de maior ou menor displasia. A.Quadril normal ou instável. B.Displásico. C.Displásico com subluxação ou luxação. D.Luxado. Diagnóstico Clínico O diagnóstico varia de acordo com a idade da criança, o grau de deslocamento da cabeça femoral (instável, subluxada ou luxada) e quanto à condição do deslocamento, se pré-natal, perinatal ou pós- natal. • De 0 a 6 meses: No recém-nascido, o diagnóstico clínico de luxação do quadril é feito pelo teste de Ortolani, e o de instabilidade, pelo teste de Barlow. Porém é importante se atentar para realizar uma inspeção e palpação bem feitos, procurando por: • Assimetria de pregas nas coxas e poplíteas • Encurtamento aparente do fêmur (sinal de Galeazzi positivo). Quando o quadril estiver em abdução, o outro em adução parecerá mais curto. O diagnóstico de fêmur curto congênito, nesses casos, não pode ser ignorado. • Assimetria das pregas inguinais Na figura,há Sinais físicos que sugerem DDQ. A e B: Assimetria das pregas nas coxas e na região poplítea. C: Encurtamento aparente do fêmur, sinal de Galeazzi -positivo. D: Pregas inguinais normais. E:Assimétricas, positivo à esquerda, estendendo-se posterior e lateralmente à abertura anal. O lado direito é normal. F: Positivo à direita. G:Bilateral, sugerindo luxação posterior bilateral dos quadris. • Dos 6 aos 12 meses Com o progressivo deslocamento posterolateral e cranial da cabeça femoral, aumentam as alterações anatômicas na articulação. Contratura em adução do quadril: a abdução do quadril luxado é progressivamente limitada.E há Encurtamento aparente da coxa, sinal de Galeazzi positivo. A,Limitação da abdução do quadril esquerdo. B.Sinal de Galeazzi positivo. • Postura em rotação externa do membro inferior: com o quadril e o joelho em extensão, o membro inferior fica posicionado em rotação externa. • Assimetria das pregas glúteas: as pregas ficam assimétricas e são mais acentuadas na luxação unilateral. • Após a marcha Somando-se aos achados descritos, a criança anda com claudicação por conta da fraqueza do glúteo médio e do encurtamento aparente do membro afetado. Em ortostatismo, apresenta lordose lombar excessiva, rotação externa do membro inferior, trocânter maior proeminente e sinal de Trendelenburg positivo. Com o aumento da contratura em adução do quadril, ocorre geno valgo compensatório. Diagnóstico por imagem Ultrassonografia: O quadril do recém-nascido é cartilaginoso, e a cabeça femoral não é visível ao raio X. Por isso, até os 6 meses de vida, é mais bem avaliado pela ultrassonografia, que identifica as estruturas cartilagíneas do acetábulo, da cabeça e do colo do fêmur.3 Dois métodos são usados para avaliar o quadril: o estático de Graf, que analisa o fêmur proximal e o contorno da pelve, e o dinâmico de Harcke, que emprega a ultrassonografia em tempo real, o que permite o exame dinâmico, com o quadril em movimento, fundamentando-se na reprodução das manobras de Barlow e Ortolani. O método de Graf mede a displasia cartilagínea, e o de Harcke, a estabilidade do quadril. Radiografia: As radiografias do quadril do recém- nascido são de difícil execução e interpretação. Nessa idade, a cabeça femoral não está calcificada, e grande parte do acetábulo é cartilagíneo. A radiografia da pelve em posição anteroposterior neutra pode ser adequada para traçar linhas de referência e obter medidas para o diagnóstico de displasia do acetábulo, subluxação ou luxação do quadril no bebê. As radiografias do quadril do recém- -nascido são de difícil execução e interpretação. Nessa idade, a cabeça femoral não está calcificada, e grande parte do acetábulo é cartilagíneo. Contudo, por volta dos 2 ou 3 meses de vida em diante, as radiografias passam a ser importantes para o diagnóstico correto. Tratamento O suspensório de Pavlik é utilizado em quadris instáveis ou displásicos, podendo ser usado em crianças até os 6 meses de idade. O ideal é que, nas crianças com quadris instáveis, ou seja, luxáveis, ele seja empregado logo nas primeiras semanas de vida, pois, nesses casos, a manutenção da redução tende a promover uma rápida estabilização. O método consiste em manter a flexão do quadril em 90° com a ajuda das tiras anteriores e, por meio das tiras posteriores, evitar a adução. O ajuste deve ser periódico, acompanhando o crescimento da criança; posições errôneas podem provocar dano à articulação ou lesões cutâneas. Deve ser constantemente reavaliado pelo médico, para ver a evolução do quadro e avaliar a melhora do desenvolvimento articular para liberação do aparelho. Em crianças com quadris luxados e irredutíveis e naquelas com mais de 6 meses de vida, o tratamento torna-se mais complexo, e uma redução sob anestesia torna-se necessária, podendo ser associada à cirurgia para liberar ou facilitar o procedimento. Nesses casos, é necessária a imobilização com aparelho gessado que englobe abdome/pelve e os membros inferiores e que deve ser usado por vários meses. Quando o diagnóstico é tardio, após o início da marcha, geralmente é necessária uma cirurgia mais complexa para reposicionamento da cabeça femoral. OBS.... A.Raio X mostrando quadril luxado, displasia com aumento do ângulo acetabular, neoacetábulo e cabeça, colo e fêmur menos desenvolvidos que o lado oposto, que também é displásico. B.Peça anatômica mostrando essas alterações. A.Luxação superior e lateral. B.Redução do quadril pós-Pavlik. Manobras utilizadas Teste de Ortolani: Coloca-se a criança em posição supina em mesa de exame firme. A criança precisa estar relaxada, não chorar nem resistir ao exame. Examina-se um lado do quadril de cada vez. Com uma mão, estabiliza-se a bacia; com a outra, colocam-se os dedos médio e o indicador no trocânter maior e abraça-se a coxa com a mão e o polegar sobre o joelho. Não se coloca o polegar no triângulo femoral, pois isso pode causar dor e reação da criança. A manobra é realizada com delicadeza. Não se pode comprimir demais os dedos sobre a coxa do bebê. Com o quadril fletido em 90°, abduz-se a coxa e, com o dedo indicador ou o médio, empurra-se, de baixo para cima e de fora para dentro, pelo trocânter maior, a cabeça femoral para dentro do acetábulo. O examinador sente o ressalto de redução do quadril. A seguir, aduz-se o quadril. A cabeça femoral irá se deslocar para fora do acetábulo com ressalto de saída. Não se pode esquecer que esse é um teste de sensibilidade e não de força. O ressalto é sentido nos dedos, não pelos ouvidos por meio de ruídos do tipo clunck, como descrito em muitas publicações. É importante não confundiro ressalto de entrada e saída da cabeça femoral com o roçar miofascial da banda iliotibial, ou dos glúteos no trocânter maior, ou, ainda, o fenômeno do vácuo articular no quadril. A subluxação da patela, durante o exame, também pode causar crepitação, confundindo o exame. Teste de Barlow: Esse teste é feito para o diagnóstico de instabilidade do quadril. A criança é colocada da mesma forma que para o teste de Ortolani. A extensão do quadril aumenta a sua instabilidade, enquanto a hiperflexão deixa-o mais estável. O quadril deve ser testado em 45° de flexão e 5 a 10° de adução, ou seja, em posição de instabilidade. Com os dedos indicador e médio por cima do trocânter maior e o polegar no terço médio da coxa (não em cima do trocânter menor), empurra-se a cabeça femoral, lateral e posteriormente, na tentativa de deslocar o quadril. Quando o quadril é instável, a cabeça femoral se desloca para fora do acetábulo, por meio do ressalto de saída. A seguir, desfaz-se a compressão lateroposterior e, de maneira delicada, abduz-se e flexiona-se o quadril. A cabeça femoral será reduzida para dentro do acetábulo, com o ressalto de entrada. Em caso de dúvida, testa-se o quadril em posição de maior instabilidade, ou seja, com maior extensão e adução. No quadril subluxado, a cabeça femoral não consegue ser empurrada para fora do acetábulo, não ocorre o ressalto de saída, somente um deslizamento, e uma leve telescopagem pode ser sentida, já que o quadril está parcialmente luxado. Sinal de Hart: o paciente é posicionado em decúbito dorsal horizontal (DDH), com os joelhos em flexão máxima e o quadril dobrado a 90°, e realiza-se a sua adução, para que seja avaliada a contratura em adução dos quadris. Na presença de tensão dos adutores, haverá limitação da adução; Manobra de Trendelenburg, positiva quando presente, indica insuficiência do músculo glúteo médio. Pode ser causada por alteração neurológica ou mecânica do músculo e, no caso da luxação, por alteração do braço de alavanca. O paciente, em pé, apoiando-se apenas no membro a ser examinado, não consegue manter a linha horizontal da pelve; verifica-se, então, a “queda” da nádega contralateral (inclinação da pelve). Ao andar, o paciente desvia o tronco em direção ao músculo debilitado, em cada fase de apoio. Diferenciar as más formações ósseas A doença de Legg-Calvé-Perthes (DLPC) é definida como uma ne-cro-se isquêmica ou avascular do núcleo secundário de ossi-fi--cação da epífise proximal do fêmur durante o desenvolvimento da criança, podendo ocorrer dos 2 aos 16 anos de vida. Dos tecidos que formam a epífise femoral proximal da criança, apenas o centro secundário de ossificação, composto por tecido ósseo, é que está parcial ou totalmente acometido. A porção óssea epifisária recebe sua nutrição pelos ramos epifisários diretos, uma vez que a placa de crescimento, a partir dos 2 anos de vida até o seu fechamento, representa uma barreira para a passagem dos vasos metafisários. Na doença, os vasos epifisários laterais e anteriores e os cervicais ascendentes la-terais (ramos da artéria circunflexa femoral medial) estão afetados e constituem uma área de avascularidade em de-terminado local da cabeça óssea femoral, produzindo necrose óssea. O episódio de isquemia parece fugaz e único, não se repetindo depois. Ainda que alguns autores acre-ditem que a isquemia seja repetida em surtos intermitentes, a necrose não parece ser progressiva quanto à extensão do acometimento, instalando-se sempre no canto anterior e lateral da epífise e estendendo- se para a região posterior e medial da cabeça. A patogenia é caracterizada, desse modo, pela existência de segmento ósseo privado de sua circulação em articulação de carga, e, por isso, está necrosado e morto. Ele passará por um período de amolecimento, tornando-se vulnerável e deformável durante o processo de reparação. A etiologia é desconhecida. Entretanto, em uma pesquisa de 1957 o autor estabeleceu os padrões de suplência arterial nas várias faixas etárias e formulou a hipótese de que o surto isquêmico ocorreria devido a uma mudança de padrão da circulação nutriente de uma para outra fase do crescimento esquelético. Dentre as possíveis causas, podem-se citar trombose decorrente de fibrinólise (coagulopatia/trombofilia), aumento da viscosi-dade san-guínea, infartos de repetição, aumento da pressão hidrostática intracapsular (sinovite) – colabando os vasos retinaculares que correm junto ao colo femoral – e alterações lipídicas. Parece mais provável que a sinovite se-ja o estágio inicial da doença e não a causa propriamente dita. A teoria unificada sugere a combinação dos fatores descritos. Sendo assim, um trauma menor em criança suscetível (p. ex., com deficiência das proteínas S e C) desencadearia a formação de pequenos êmbolos metafisários, elevando a pres-são venosa no colo femoral, propagando-se para a cabeça, onde ocorre o infarto. O quadro clínico inicial pode ser de dor e claudicação, relacionadas à atividade física ou, às vezes, confundidas com alguma espécie de trauma. Na imagem abaixo, em A.Predomínio de grande área de necrose no início da fragmentação. B.Final da fragmentação. C.Reossificação quase completa. D.Fase residual. Torcicolo Muscular Congênito O torcicolo muscular congênito é a causa mais comum de deformidade cervical na criança até o 2o mês de vida. Está relacionado à fibrose de uma parte ou de todo o músculo esternocleidomastóideo. Acredita-se que seja resultado de uma resposta cicatricial do músculo esternocleidomastóideo secundária a um mau posicionamento intrauterino ou traumatismos de parto. Apesar de ser uma doença de evolução benigna, na maior parte dos casos, doentes que não apresentam resolução do problema até o final do 1o ano de vida podem desenvolver uma deformidade progressiva da coluna e do crânio, se não tratados de forma adequada. O diagnóstico do torcicolo muscular congênito é feito clinicamente. Na maior parte das vezes, a deformidade é aparente já ao nascimento. Alguns recém-nascidos podem apre-sentar uma deformidade discreta que passa despercebida no pós-parto, mas o diagnóstico é feito na maioria dos casos até o 2o mês de vida. o exame físico, nota-se o posicionamento da cabeça com uma inclinação do pavilhão auditivo para o lado afetado e o mento rodado contralateralmente à contratura muscular. A movimentação passiva da cabeça e da região cervical apresenta restrição. Nas crianças com menos de 2 meses de vida, pode-se palpar uma tumoração indolor no esternocleidomastóideo. Apesar disso a doença tem evolução benigna e o tratamento consiste em acompanhamento clínico e fisioterapia. (cirurgias são realizadas somente em casos que a doença persiste após 1 ano de idade). Osteogênese Imperfeita Grupo de doenças hereditárias, bem definidas, que apresentam fragilidade óssea excessiva. As consequências são fraturas de repetição, que evoluem para deformidades progressivas do esqueleto. Essas deformidades somam-se às manifestações extraósseas, que envolvem os dentes e outros órgãos devido ao comprometimento do tecido conjuntivo. Etiologia: Exames histológicos e bioquímicos realizados em portadores de osteogênese imperfeita demonstraram que o defeito do colágeno é o respon-sá-vel básico pela expressividade da síndrome. O colágeno é composto por cadeias moleculares de proteínas, sendo a glicina uma das principais moléculas de interligação das espirais de polipeptídeos. A principal forma de colágeno do tecido ósseo é o tipo I, que representa cerca de 90% do colágeno corporal, sendo também o maior componente da pele. Sua estrutura é composta por duas cadeias 1(I), codificadas pelo gene COL1A1, lo-calizado nocromossomo 17, e uma cadeia a2(I), -codificada pelo gene COL1A2, localizado no cromossomo. Uma falha genética, causando a substituição de um aminoácido por outro dentro das cadeias dos polipeptídeos (p. ex., glicina pela arginina ou cisteína), modifica toda a organização do esqueleto proteico. O resultado pode ser a produção de colágeno defeituoso ou em quantidade diminuída, causando o espectro de alterações. Manifestações esqueléticas: A fragilidade óssea caracteriza o estigma básico da osteogênese imperfeita, resultando em fraturas múltiplas por traumas mínimos. O processo estende-se a todo o esqueleto, tanto axial como periférico. Na forma mais grave ou doença de Vrolik (tipo II), as fra-turas ocorrem intraútero, resultando em encurtamento acen-tuado dos membros Manifestações extraesqueléticas: surdez, defeitos no tecido conjuntivo e defeitos dentários. Tratamento consiste no uso de fármacos na tentativa de obter aumento da resistência óssea dos portadores de osteogênese imperfeita e na prevenção de fraturas e deformidades.