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Conceito de meio ambiente e meio ambiente como bem jurídico Apresentação O meio ambiente, bem protegido pelo ordenamento jurídico, é o conjunto de aspectos naturais, físicos e populacionais e de interações entre estes. Também são aspectos culturais e artificiais criados pelo homem. Esses conceitos são provenientes de estudos científicos e de convenções internacionais, como a noção de "meio ambiente humano" decorrente da Conferência de Estocolmo, em 1972. Nesta Unidade de Aprendizagem, você vai aprender o conceito de meio ambiente natural e as modalidades artificial e cultural. Além disso, você vai ver o conceito de meio ambiente como bem jurídico e suas repercussões práticas. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Descrever o conceito de meio ambiente.• Analisar os conceitos de meio ambiente natural, artificial e cultural.• Aplicar o conceito de meio ambiente como bem jurídico.• Infográfico O meio ambiente natural é composto por aspectos físicos e populacionais, sendo os primeiros aqueles relacionados ao ar, à terra, às águas e à luz. Neste Infográfico, você vai ver as legislações vinculadas a cada um desses aspectos do meio ambiente e os respectivos bens tutelados por elas. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://statics-marketplace.plataforma.grupoa.education/sagah/2a4311fa-888f-46f1-b977-7fa6dbfeb3fc/2ebb3bb5-a1b9-4bdd-a989-1c94743ff23e.jpg Conteúdo do livro As diversas concepções de meio ambiente natural, artificial e cultural são conceitos-chave para a compreensão do meio ambiente como bem jurídico. O primeiro conceito é relacionado aos aspectos físicos e populacionais dos ecossistemas; o segundo, relacionado às criações do homem; já o terceiro, um grupo especial de construtos físicos e imateriais do ser humano que caracterizam sua evolução e conceituação como ser civilizado e culto. Acompanhe, agora, um trecho do capítulo Conceito de meio ambinete e meio ambiente como bem jurídico, parte do livro Direito e legislação ambiental, produzido para esta Unidade de Aprendizagem, que relaciona os conceitos-chave de meio ambiente como bem jurídico. Boa leitura. MEIO AMBIENTE Magnum Koury de Figueiredo Eltz Revisão técnica: Vanessa de Souza Machado Mestre e Doutora em Ciências Graduada em Ciências Biológicas Catalogação na publicação: Karin Lorien Menoncin CRB – 10/2147 M499 Meio ambiente [recurso eletrônico] / Ronei Tiago Stein ... [et al.]; [revisão técnica : Vanessa de Souza Machado]. – Porto Alegre : SAGAH, 2018. ISBN 978-85-9502-573-8 Engenharia de produção. 2. Meio ambiente. I. Stein, Ronei Tiago. CDU 502 Conceito de meio ambiente e meio ambiente como bem jurídico Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Conceituar meio ambiente. � Diferenciar os conceitos de meio ambiente natural, artificial e cultural. � Aplicar o conceito de meio ambiente como bem jurídico. Introdução O meio ambiente, bem protegido pelo ordenamento jurídico, é o conjunto de aspectos naturais, físicos e populacionais e o conjunto de interações entre esses aspectos. Também são aspectos culturais e artificiais criados pelo homem. Esses conceitos são provenientes de estudos científicos e de convenções internacionais, como a noção de meio ambiente humano, decorrente da conferência de Estocolmo em 1972. Neste capítulo, você vai ler sobre o conceito de meio ambiente natural e as modalidades artificial e cultural. Além disso, verá o conceito de meio ambiente como bem jurídico e as suas repercussões práticas. Conceito de meio ambiente O meio ambiente, tal como descrito nas ciências naturais, a exemplo do trabalho de Linhares (1998, p. 435), é retratado pelo: [...] meio físico formado pelo ar, pela luz, pela temperatura, pela umidade, pelo tipo de solo, pela água e pelos sais minerais, chamados de fatores abióticos ou biótipo; sendo que a reunião e a interação da comunidade com o ambiente físico formam um sistema ecológico ou ecossistema. Assim, uma floresta — com sua vegetação, seus animais, seu tipo de solo e seu clima característico — forma um ecossistema. O mesmo podemos dizer de um lago, um oceano, um tronco de árvore e até mesmo um simples aquário. A palavra ecologia vem dos termos gregos oikos — que significa casa e, por extensão, ambiente — e logos — que significa estudo —, sendo o ramo da biologia que trata das interações entre o meio físico (ar, solo, luz e clima) e as populações (fauna e flora). Conforme Canotilho (1998), é possível, no âmbito jurídico, optarmos por um conceito estrito de ambiente, centrado nos componentes ambientais naturais descritos, ou por um conceito amplo de ambiente, também conhecido como conceito holístico, centrado nos componentes ambientais humanos e ambientais não humanos (isto é, não apenas o ambiente natural, mas também o construído). A Conferência de Estocolmo de 1972 trouxe como conceito o meio am- biente humano, em que: O homem é ao mesmo tempo obra e construtor do meio ambiente que o cerca, o qual lhe dá sustento material e lhe oferece oportunidade para desenvolver-se intelectual, moral, social e espiritualmente. Em larga e tortuosa evolução da raça humana neste planeta chegou-se a uma etapa em que, graças à rápida aceleração da ciência e da tecnologia, o homem adquiriu o poder de trans- formar, de inúmeras maneiras e em uma escala sem precedentes, tudo que o cerca. Os dois aspectos do meio ambiente humano, o natural e o artificial, são essenciais para o bem-estar do homem e para o gozo dos direitos huma- nos fundamentais, inclusive o direito à vida mesma (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1972). Dessa forma, o meio ambiente humano — cujo conceito é previsto na Conferência de Estocolmo de 1972, da qual o Brasil é signatário — abarca os conceitos de meio ambiente natural e meio ambiente construído, de modo que o conceito de meio ambiente para o Direito é híbrido entre aspectos físicos, populacionais, éticos, culturais e sociais. Esses aspectos são reiterados pela Conceito de meio ambiente e meio ambiente como bem jurídico16 Conferência Rio-92, também ratificada pelo Brasil e que compõe parte dos direitos fundamentais pátrios por força do § 2º do art. 5º da Constituição Federal, que equipara os princípios e direitos provenientes de tratados inter- nalizados pelo Brasil como direitos fundamentais. Nesse sentido, devemos interpretar, de maneira sistêmica, o art. 225, caput, da Constituição Federal, que trata do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, de modo que os aspectos físicos, populacionais, culturais e sociais humanos integram o conceito meio ambiente, e a parcela ecologicamente equilibrado trata das relações entre esses diferentes elementos (BRASIL, 1988a). Também devem ser alargados os dispositivos do art. 3º da Lei nº. 6.938, de 31 de agosto de 1981, I, que restringem o conceito de meio ambiente ao conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas. Devemos interpretar o dispositivo a partir de uma leitura integrada em relação ao conceito de poluição como degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente (BRASIL, 1981): � prejudiquem o bem-estar da população; � e/ou criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; � revelem uma amplitude maior do que é possível extrair da própria lei da Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA). Nesse sentido, é pertinente a lição de Farias (2007, p. 444): O inciso I do art. 3º da Lei nº 6.938/81 define o meio ambiente como “o con- junto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”. A doutrina desdobrou o conceito de meio ambiente em quatro aspectos: meio ambientenatural, meio ambiente artificial, meio ambiente cultural e meio ambiente do trabalho. O meio ambiente natural ou físico é o constituído pelos recursos naturais propriamente ditos e pela correlação recíproca de cada um destes em relação aos demais. O meio ambiente artificial é o construído ou alterado pelo ser humano, sendo constituído pelos edifícios urbanos e pelos equipamentos comunitários. O meio ambiente cultural é o patrimônio histórico, artístico, paisagístico, ecológico, científico e turístico e constitui-se tanto de bens de natureza material quanto imaterial. E o meio ambiente do trabalho é o conjunto de fatores que se relacionam às condições do ambiente de trabalho. Dessa forma, ainda que a legislação pátria não tenha definido, de maneira expressa, a opção por uma conceituação ampla de meio ambiente, a doutrina 17Conceito de meio ambiente e meio ambiente como bem jurídico assim o entende com base no disposto nas Conferências de Estocolmo de 1972 e Rio-92, ambas ratificadas pelo ordenamento jurídico brasileiro. O meio ambiente não é composto apenas por elementos naturais, como o ar, o solo, a terra e os aspectos climáticos; ele também é composto pelos aspectos populacionais, ou seja, da presença de seres vivos que representam a flora e a fauna e também os aspectos artificiais criados pelo homem como expressão de sua cultura ou pelas necessidades criadas pela civilização. Meio ambiente natural, artificial e cultural Uma vez compreendida a amplitude do conceito geral de meio ambiente, englobando as modalidades de meio ambiente natural, artificial e cultural, passaremos à caracterização dessas classificações de sistemas relacionais entre aspectos físicos, populacionais e metafísicos. De acordo com Milaré (2013, p. 161): Em toda a superfície do globo terrestre encontramos elementos ou ambientes naturais, cuja composição e concentração variam conforme as diferentes regiões. Apesar dessas diferenças, são estreitamente relacionados e, exata- mente por isso, constituem ecossistemas. Tais componentes são: o ar, a água, o solo, a flora e a fauna. Assim, o meio ambiente natural, como visto em seu aspecto ecológico, trata dos componentes físicos (ar, água, solo) e populacionais (flora e fauna) que compõem determinada região. Por exemplo, em uma unidade de conservação (UC), como é o caso do Parque Nacional Aparados da Serra, situado no Estado do Rio Grande do Sul, o meio ambiente é composto pelos aspectos geológicos do local (com solo basáltico caracterizado por histórico vulcânico associado àquele ambiente, consequentemente restringindo o crescimento de vegetação e impossibili- tando a penetração das raízes na rocha, o que resulta em população vegetal de gramíneas e arbustos no local), pela presença de aves e espécies de porte médio e baixo especializadas para o convívio com esse tipo de vegetação e Conceito de meio ambiente e meio ambiente como bem jurídico18 pela presença de espécies de invertebrados e aves que se apresentam nesse local. A Figura 1 mostra um exemplo de solo vulcânico. Figura 1. Vulcão Teide, localizado na África. Fonte: Ondacaracola/Shutterstock.com. Dessa forma, é possível vislumbrar a complexidade do conceito de meio ambiente natural, que considera aspectos meteorológicos, geológicos, geográ- ficos, paleontológicos, zoológicos, fitológicos, histológicos e suas diversas interações, compondo características de determinadas regiões chamadas de biomas (macroambientes) — quando são consideradas regiões amplas, como Pampa, Cerrado, Amazônia, entre outras — e microambientes — ao serem observadas localidades específicas. Os aspectos populacionais, em relação à flora e à fauna, possuem tratamento especial no nosso ordenamento jurídico a partir da proteção da diversidade das espécies que as compõem. Nesse sentido, Milaré (2013, p. 209) refere que: Além do termo biodiversidade, usa-se igualmente a expressão diversidade biológica. Segundo a Convenção da Biodiversidade, “ diversidade biológica significa a viabilidade de organizamos vivos de todas as origens e os com- plexos ecológicos de que fazem parte: compreendendo ainda a diversidade dentro das espécies, entre as espécies de ecossistemas”. A importância da inter-relação entre as espécies e o próprio meio físico que habitam e transformam é o próprio fundamento da criação de parques, como o 19Conceito de meio ambiente e meio ambiente como bem jurídico mencionado Aparados da Serra, que constituem as chamadas UCs, espécie de santuário para a livre manifestação do meio ambiente natural. Esses santuários estão previstos na Lei nº. 9.985, de 18 de julho de 2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). No entanto, o meio ambiente natural e suas características, em geral, são protegidos, mesmo nas cidades ocupadas pelo homem, uma vez que este compõe parte da população dos ecossistemas urbanos e rurais e também depende do equilíbrio dessas relações para sua própria sobrevivência, daí a noção de meio ambiente equilibrado de que trata o art. 225 da Constituição Federal. O conceito de meio ambiente, no entanto, não se limita às interações eco- lógicas, como visto no conceito de meio ambiente humano da Conferência de Estocolmo de 1972, abrangendo também as modificações realizadas pelo homem em seu processo de civilização e realização de sua cultura. Dessa forma, Milaré (2013, p. 272) defende que: A visão holística do meio ambiente leva-nos a considerar o seu caráter social, uma vez que é definido constitucionalmente como um bem de uso comum do povo, Caráter ao mesmo tempo histórico, porquanto o meio ambiente resulta das relações do ser humano com o mundo natural no decorrer do tempo. Essa visão faz-nos incluir no conceito de ambiente — além dos ecossistemas naturais — as sucessivas criações do espírito humano que se traduzem nas suas múltiplas obras. Por isso, as modernas políticas ambientais consideram relevante ocupar-se do patrimônio cultural, expresso em realizações signifi- cativas que caracterizam, de maneira particular, os assentamentos humanos e as paisagens ao seu entorno. Dessa forma, fazem parte do conceito de meio ambiente, protegido em nossa legislação, as criações do homem, que compõem um bem metafísico ligado à sua identidade, ética e construção social. Como ensina o autor: Esses espaços trabalhados pela cultura (que é o produto mais significativo da nossa espécie) acumulam incontáveis artifícios do homo sapiens, que também compõem a sua ambiência resultante da “interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas”, como ensina José Afonso da Silva. Uma vez aceito o caráter holístico do meio ambiente como produto das intera- ções e relações da sociedade humana como mundo natural, o meio ambiente construído ou artificial, passa a ser objeto das políticas ambientais. Sendo assim, por decorrência ele cai sob a alçada do Direito, não apenas do Direito do Ambiente, mas ainda de outros ramos da ciência jurídica, nomeadamente o Direito Urbanístico e regulamentações específicas (MILARÉ, 2013, p. 291). Conceito de meio ambiente e meio ambiente como bem jurídico20 O meio ambiente é composto pelo meio ambiente artificial, construído pelo ser humano, ao mesmo tempo que constitui um meio ambiente cultural, pois advêm de sua criatividade e construção civilizatória os construtos físicos (como prédios residenciais, comerciais e construções institucionais, como bancos, escolas, creches, clubes, entre outras) e as construções metafísicas culturais (como música, artes cênicas, artes plásticas e literatura). Dessa forma, o meio ambiente artificial e cultural criado pelo ser humano reflete a própria noção de civilização que herdamos da Grécia helênica, na qual a construção de teatros, congressos e espaços de convivência pública definem a própria civilização. Esses espaços aumentaram durante o período romano clássico (com a inclusãode casas de espetáculos populares, estradas pavimentadas, aquedutos e sistema cloacal) e os períodos medievais (com a expansão dos templos religiosos, muros protetivos e outras características físicas que marcam a presença do homem enquanto dominador e criador do próprio meio ambiente). Com isso, toda forma construída pelo ser humano, reconhecida como exemplo da sua evolução histórica e cultural, é compreendida como patrimônio de um meio ambiente cultural. Assim, como o restante das construções físicas humanas efêmeras no tempo, esses espaços são considerados parte de um conceito mais amplo de meio ambiente construído ou artificial. Assim, em que pese a Conferência de Estocolmo de 1972 servir como alerta ao ser humano do que seu desenvolvimento civilizatório exacerbado estaria causando graves desequilíbrios ao meio ambiente natural, com o qual possui relação biológica indissociável, a conceituação de meio ambiente equilibrado contempla tanto os aspectos naturais a serem protegidos quanto a própria noção de civilidade humana enquanto bem ambiental a ser tutelado, buscando-se uma harmonia entre o estilo de vida humano e o meio ambiente que ele integra. Meio ambiente como bem jurídico Uma vez compreendido o conceito de meio ambiente e suas modalidades natural, artificial e cultural, passaremos à compreensão desses conceitos como bens jurídicos. Historicamente, como ensina Milaré (2013, p. 119-120), o Direito Romano determinava os bens naturais físicos como de uso comum: Et quidem naturali iure comunia sunt omnium haec: aër et aqua profuens et mare et per hoc litora maris (“Por direito natural são comuns todas as coisas seguintes: o ar, a água corrente, o mar e o seu litoral”). Essa noção de bens comuns, no entanto, 21Conceito de meio ambiente e meio ambiente como bem jurídico advém de uma impossibilidade fática de apropriação desses bens naturais, uma vez que não é possível estocar o ar, conter a água corrente e o oceano por suas proporções; ao mesmo tempo que se reconhecem como direitos de uso comum pela influência desses elementos naturais como condicionantes da vida humana, tal como compreendemos atualmente. No ordenamento jurídico brasileiro, o Código Civil de 1916 já havia inserido a noção de bem de uso comum do povo (art. 66, I), com a inclusão, no mínimo, dos seguintes bens (BRASIL, 1916): � mares; � rios; � estradas; � ruas; � praças. As praias foram também incluídas nessa categoria pela Lei nº. 7.661, de 16 de maio de 1988, de modo que foram apenas reafirmados valores civiliza- dos romanos já presentes em nosso sistema jurídico por influência de nossa colonização portuguesa (BRASIL, 1988b). Uma evolução conceitual dessa proteção viria justamente com o advento da Constituição Federal de 1988, com a proteção do direito fundamental ao meio ambiente equilibrado (art. 225) e a função social e ambiental da propriedade (arts. 5º, XXIIII, e 170, III e VI), complementados com a inclusão da função social da propriedade no Código Civil de 2002, que relativiza os bens privados em relação aos interesses difusos e coletivos tutelados pelo Estado. Segundo Canotilho (1998), conforme vimos, é clara e crescente a preo- cupação da sociedade contemporânea com os problemas provocados pelo desenvolvimento; conforme exposto nas Conferências de Estocolmo (1972), Rio (1992) e mais recentemente na Rio+20 e na Conferência de Paris sobre o Clima de 2015. Segundo o autor: A generalização dessa convicção — operada a nível não apenas nacional, mas internacional, dada a inevitável propensão para a “mundialização” dos problemas ambientais — está na base da emergência recente do ambiente como bem digno de proteção ou tutela jurídica, o mesmo é dizer, na base da sua transmutação de mero interesse socialmente relevante em autêntico bem jurídico (CANOTILHO, 1998, p. 25). Sobre o conceito de bem jurídico, o autor lembra que se trata da noção de se pretender: “[...] abranger valores ou interesses que se apresentam em estreita Conceito de meio ambiente e meio ambiente como bem jurídico22 conexão com os interesses gerais da sociedade, tomados enquanto tais e não enquanto valores de cunho estreitamente individual” (CANOTILHO, 1998, p. 25). O autor reforça que o bem jurídico, ainda que possua (como é o caso) di- mensões individuais, deve sempre ser visto como bem jurídico da coletividade: É esta “socialização” do conceito que para nós tem mais interesse, já que o ambiente (apesar de também ser um direito fundamental pertencente a todos e a cada um de nós) é, sem dúvida, um interesse coletivo, com uma dimensão social que nunca poderá ser esquecida (CANOTILHO, 1998, p. 25). Dessa forma, conforme Milaré (2013, p. 120): O Poder Público passa a figurar não como proprietário de bens ambientais — das águas e da fauna —, mas como um gestor ou gerente, que administra bens que não são dele e, por isso, deve explicar convincentemente sua gestão. A aceitação dessa concepção jurídica vai conduzir o Poder Público a melhor informar, a alargar a participação da sociedade civil na gestão dos bens am- bientais e a ter que prestar contas sobre a utilização dos bens “de uso comum do povo”, concretizando um “Estado Democrático e Ecológico de Direito” (arts. 1º, 170 e 225). Assim, ao tutelar o meio ambiente equilibrado como um bem jurídico em seus aspectos naturais, culturais e artificiais, o ordenamento jurídico figura como garantidor do equilíbrio entre esses aspectos a partir da fiscalização das atividades privadas, de sua limitação quando necessário e da tutela do desrespeito a esses direitos a partir de suas ferramentas de responsabilidade. Os bens jurídicos são conceitos especialmente protegidos pelo ordenamento jurídico. Alguns de seus exemplos clássicos são a vida, a liberdade, a propriedade e a igual- dade. Sua proteção, no entanto, é configurada de acordo com um caso concreto. Por exemplo, para proteger o bem “meio ambiente”, é necessária uma situação concreta ou hipotética que possa feri-lo. Como é o caso da contaminação de rios por uma determinada indústria. Nesse caso concreto, o Estado possui ferramentas, como a ação popular, em caso de ato de empresa pública, ou ação civil pública, em caso de contaminação por empresa de direito privado, para buscar a reparação por meio do devido processo legal. Além disso, o Estado possui instrumentos de tutela administrativa e tutela penal para buscar a cessação de comportamentos lesivos a esse bem jurídico. 23Conceito de meio ambiente e meio ambiente como bem jurídico Conforme complementa Canotilho (1998, p. 26): O enorme relevo que assume a consideração do ambiente como bem jurídico autônomo não é, todavia, suficiente para dar a compreender toda a importância que a disciplina jurídica do ambiente assume em ordenamentos jurídicos — como o português — que consagram clara e inequivocamente um direito dos cidadãos ao ambiente. Isso porque o direito a um meio ambiente equilibrado não figura um simples bem jurídico previsto no ordenamento jurídico, mas sim é integrante da categoria de direitos fundamentais ou cláusulas pétreas constitucionais em determinados países: É por exemplo esse o caso do Brasil, cuja Constituição de Outubro de 1988 dispõe expressamente “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações” (CANOTILHO, 1998, p. 27). Assim, ao mesmo tempo que o meio ambiente equilibrado como um bem jurídico aponta-o como um valor especial protegido pela sociedade, seu alçamento a direito fundamental caracteriza a importância dos aspectos que o compõem para a própria existência da humanidade tal como a concebemos, uma vez que integra o quadro formado por direitos de liberdade, igualdade, à vida e ao de- senvolvimento econômico. Isso porque todos os demais direitos dependem desse equilíbrioessencial à própria saúde e mesmo à vida do ser humano como parte de um ecossistema integrado e aperfeiçoado por sua evolução cultural e civilizatória. 1. Leia o que segue e assinale a alternativa correta. O conceito de meio ambiente, como previsto na literalidade do art. 3º da Lei nº. 6.938/1981 — “Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: I — meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas” —, compreende a(s) conceituação(ões) de: I. meio ambiente natural; II. meio ambiente construído; III. meio ambiente cultural. Conceito de meio ambiente e meio ambiente como bem jurídico24 a) Apenas a afirmativa I está correta. b) Apenas a afirmativa II está correta. c) Apenas as afirmativas I e III estão corretas. d) Apenas as afirmativas II e III estão corretas. e) Apenas a afirmativa III está correta. 2. Leia o que segue e assinale a alternativa que preenche corretamente a lacuna. O meio ambiente _________________ é o conjunto de interações entre aspectos físicos, climáticos e populacionais dentro de construções artificiais onde se estabelecem relações de labor. a) Natural. b) Cultural. c) Urbano. d) Rural. e) Do trabalho. 3. Leia o que segue e assinale a alternativa correta. O meio ambiente artificial é composto por construções humanas, de forma distinta do conceito de meio ambiente natural concedido pelas interações físicas, químicas e biológicas naturais. Dessa forma, compõem o meio ambiente artificial: I. elementos de infraestrutura; II. biomas; III. zoológicos. a) Apenas a afirmativa I está correta. b) Apenas a afirmativa II está correta. c) Apenas a afirmativa III está correta. d) Apenas as afirmativas I e II estão corretas. e) Apenas as afirmativas I e III estão corretas. 4. O meio ambiente natural é composto por elementos físicos (como o ar, a terra, a luz e o clima) e elementos populacionais (como a flora e a fauna), que são sujeitos do bem jurídico meio ambiente equilibrado. Enquanto a flora representa as populações vegetais, a fauna representa a população de: a) insetos. b) aracnídeos. c) invertebrados. d) anelídeos. e) animais em geral. 5. Leia o que segue e assinale a alternativa correta. A flora compõe o meio ambiente como bem jurídico, como previsto no art. 225 da Constituição Federal, e é parte do meio ambiente natural, junto com os seus aspectos físicos e populações representadas pela fauna. São exemplos desse componente do meio ambiente natural: I. gramíneas; II. hortaliças; III. bactérias. a) Apenas a afirmativa I está correta. b) Apenas a afirmativa II está correta. c) Apenas a afirmativa III está correta. d) Apenas as afirmativas I e II estão corretas. e) Apenas as afirmativas I e III estão corretas. 25Conceito de meio ambiente e meio ambiente como bem jurídico BRASIL. Lei nº. 3.071, de 1º de janeiro de 1916. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. 1916. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L3071.htm>. Acesso em: 20 dez. 2017. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988a. BRASIL. Lei nº. 7.661, de 16 de maio de 1988. Institui o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro e dá outras providências. 1988b. Disponível em: <http://www.planalto.gov. br/ccivil_03/leis/l7661.htm>. Acesso em: 20 dez. 2017. BRASIL. Lei nº. 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providên- cias. 1981. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6938.htm>. Acesso em: 20 dez. 2017. CANOTILHO, J. J. G. et al. Introdução ao Direito do ambiente. Lisboa: Universidade Aberta, 1998. FARIAS, T. Q. Meio ambiente do trabalho. Revista Direito e Liberdade, Mossoró, v. 6, n. 2, jan./jun. 2007. LINHARES, S. et al. Biologia: programa completo. São Paulo: Ática, 1998. MILARÉ, E. Direito do ambiente. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração de Estocolmo sobre o ambiente humano. 1972. Disponível em: <http://www.silex.com.br/leis/normas/estocolmo. htm>. Acesso em: 20 dez. 2017. Leitura recomendada NARDY, A. et al. Princípios de Direito Ambiental: na dimensão internacional e comparada. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. Conceito de meio ambiente e meio ambiente como bem jurídico26 Conteúdo: Dica do professor O meio ambiente é composto por aspectos naturais e artificiais, sendo o segundo grupo composto de construções humanas civilizatórias e culturais. Nesta Dica do Professor, vamos explorar o meio ambiente artificial e suas espécies, bem como a legislação, onde encontra "eco" em nosso ordenamento jurídico. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/cee29914fad5b594d8f5918df1e801fd/e360a847b0fea4758089474206e0b3cc Exercícios 1) O conceito de meio ambiente, está previsto na sua literalidade no art. 3o da Lei no 6.938/81, na sequinte maneira: "Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: I - meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas". Considerando o texto do art. 3o Lei no 6.938/81, defina qual(ais) conceitos compreende, na sua literalidade, o conceito de meio ambiente: I – Meio ambiente natural. II – Meio ambiente construído. III – Meio ambiente cultural. A) Apenas I está correta. B) Apenas II está correta. C) I e III estão corretas. D) II e III estão corretas. E) Apenas III está correta. 2) Conjunto de interações entre aspectos físicos, climáticos e populacionais dentro de construções artificiais em que se estabelecem relações de labor. O enunciado anterior expressa o conceito de meio ambiente: A) natural. B) cultural. C) urbano. D) rural. E) do trabalho. O meio ambiente artificial é composto por construções humanas, de forma distinta do conceito de meio ambiente natural, que lhe é concedido pelas interações físicas, químicas e 3) biológicas naturais. Dessa forma, compõe o meio ambiente artificial: I – Elementos de infraestrutura. II – Biomas. III – Zoológicos. A) Apenas I está correta. B) Apenas II está correta. C) Apenas III está correta. D) I e II estão corretas. E) I e III estão corretas. 4) O meio ambiente natural é composto de elementos físicos, como o ar, a terra, a luz e o clima, e de elementos populacionais, como a flora e a fauna, que são sujeitos do bem jurídico meio ambiente equilibrado. Enquanto a flora representa as populações vegetais, a fauna representa a população de: A) insetos. B) aracnídeos. C) invertebrados. D) anelídeos. E) animais em geral. 5) A flora que compõe o meio ambiente como bem jurídico, tal como previsto no art. 225 da Constituição Federal, é parte do meio ambiente natural, juntamente com seus aspectos físicos e populações representadas pela fauna. São exemplos desse componente do meio ambiente natural: I – Gramíneas. II – Hortaliças. III – Bactérias. A) Apenas I está correta. B) Apenas II está correta. C) Apenas III está correta. D) I e II estão corretas. E) I e III estão corretas. Na prática O meio ambiente como bem jurídico e a sua extensão conceitual têm repercussões práticas muito interessantes, em especial na área da tutela de seus aspectos. Um bom exemplo encontra-se na responsabilidade civil por danos ao patrimônio cultural. Caso o conceito de meio ambiente seja compreendido de maneira restrita, se aplicariam aos danos ao patrimônio as regras gerais de responsabilidade civil, em que o indivíduo ou a organização que não gere, pela natureza de sua atividade, risco a esses bens jurídicos incorreria em responsabilidade por culpa. Seria então prerrogativa do Estado a comprovação de conduta imperita,negligente ou imprudente do cidadão ou pessoa jurídica para que este indenizasse os prejuízos causados. Compreendendo o patrimônio cultural como parte do "meio ambiente equilibrado", aplica-se a regra do § 3º do art. 225 da Constituição Federal, que rege a aplicação da responsabilidade independente de culpa em relação aos danos causados ao meio ambiente. Dessa forma, a amplitude do conceito de meio ambiente afeta de forma direta a aplicabilidade da responsabilidade objetiva por danos ao patrimônio cultural. O STJ, em entendimento reiterado em jurisprudência, defende a aplicação da incidência desse dispositivo, bem como do art. 14, I, da Lei nº 6.938/81, que reitera a responsabilidade objetiva do poluidor aos casos de ofensa ao patrimônio cultural. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://statics-marketplace.plataforma.grupoa.education/sagah/26f99a77-b0c1-4ee1-92da-93420eb4a209/12ea3d08-2e96-423e-8b8b-066fe367fad1.jpg Saiba + Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: Afinal, o que é Meio Ambiente? O vídeo a seguir apresenta mais sobre o conceito alargado de meio ambiente, tal como contemplado em nosso ordenamento jurídico. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Construção Sustentável E Meio Ambiente Do Trabalho O artigo a seguir analisa as práticas dos atores sociais quanto às condições de trabalho no contexto de sustentabilidade, urbanização, cidade e meio ambiente. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. Meio ambiente cultural, regulação, poder administrativo sancionador e responsabilidade civil do Estado O artigo a seguir discute sobre o patrimônio cultural imaterial e a possibilidade de utilização dos instrumentos do poder de polícia sobre este. Aponte a câmera para o código e acesse o link do conteúdo ou clique no código para acessar. https://www.youtube.com/embed/tPGtO8EFwwk https://www.indexlaw.org/index.php/revistadtmat/article/view/1233/1664 http://ucs.br/etc/revistas/index.php/direitoambiental/article/view/3905