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LARISSA FERREIRA RAFAEL DA SILVA THORR MARTINEZ PEREIRA VINAGRE VICTORIA SILVA SANTOS HÉRNIA INGUINO-ESCROTAL BILATERAL EM EQUINO DA RAÇA MANGALARGA MINEIRO: RELATO DE CASO SANTOS, DEZEMBRO DE 2023 2 LARISSA FERREIRA RAFAEL DA SILVA THORR MARTINEZ PEREIRA VINAGRE VICTORIA SILVA SANTOS HÉRNIA INGUINO-ESCROTAL BILATERAL EM EQUINO DA RAÇA MANGALARGA MINEIRO: RELATO DE CASO SANTOS, DEZEMBRO DE 2023 Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Medicina Veterinária da Universidade São Judas Tadeu como requisito parcial à obtenção do título de Médico Veterinário. Orientadora: Juliana Placido Guimarães Rosa Unimonte. 3 HÉRNIA INGUINO-ESCROTAL BILATERAL EM EQUINO DA RAÇA MANGALARGA MINEIRO Larissa Ferreira Rafael Da Silva¹, Thorr Martinez Pereira Vinagre², Victoria Silva Santos³ RESUMO Durante o processo de migração testicular, diversos são os processos essenciais a serem garantidos, como o auxílio dos órgãos da cavidade abdominal que promovem a entrada dos testículos para a bolsa escrotal recém- formada. Devido ao grande comprimento intestinal da espécie, existe uma pré- disposição ao encarceramento em aberturas, como por exemplo, as hérnias inguinais advindas do deslocamento da porção final do jejuno ou do íleo, que se estendem até a bolsa escrotal. A palpação direta, transretal e a ultrassonografia da bolsa testicular confirmam o diagnóstico. Este trabalho tem como objetivo relatar um caso de hérnia inguino-escrotal em equino da raça mangalarga marchador, maior raça nacional de equinos, avaliando seu diagnóstico e tratamento. Um equino da raça mangalarga marchador, com 6 anos de idade, não castrado, pesando 350kg, foi admitido na Unidade Didática Clínica Hospitalar (UDCH) da Universidade de São Paulo, Campus Fernando Costa apresentando aumento de volume testicular (bilateral) que após o diagnóstico de hérnia inguino-escrotal bilateral foi encaminhado à cirurgia de herniorrafia escrotal associada a orquiectómia e enteroanastomose. No pós-operatório, o animal apresentou Paralisia de nervo radial em membro toráxico direito e dez dias após o procedimento houve a abertura dos pontos abdominais e inguinais do animal. Embora o período tenha sido conturbado, após 52 dias do procedimento cirúrgico, o animal recebeu alta. Palavras-Chave: Herniorrafia. Orquiectómia. Enteroanastomose. Cirurgia. Pós- operatório 4 BILATERAL INGUINO SCROTAL HERNIA IN AN EQUINE OF THE MANGALRGA MINEIRO BREED ABSTRACT During the testicular migration process, there are several essential processes to be guaranteed, such as the help of the organs in the abdominal cavity that promote the entry of the testicles into the newly formed scrotum. Due to the large intestinal length of the species, there is a predisposition to entrapment in openings, such as inguinal hernias resulting from the displacement of the final portion of the jejunum or ileum, which extends to the scrotum. Direct, transrectal palpation and ultrasound of the testicular sac confirm the diagnosis. This work aims to report a case of inguinal-scrotal hernia in a Mangalarga Marchador horse, the largest national breed of horse, evaluating its diagnosis and treatment. A 6- year-old, non-castrated, manga-larga marching horse, weighing 350kg, was admitted to the Hospital Clinical Didactic Unit (UDCH) of the University of São Paulo, Fernando Costa Campus, presenting an increase in testicular volume (bilateral) that after the diagnosis of bilateral inguinoscrotal hernia was referred to scrotal herniorrhaphy surgery associated with orchiectomy and enteroanastomosis. Postoperatively, the animal presented radial nerve palsy in the left thoracic limb and ten days after the procedure, the animal's abdominal and inguinal points were opened. Although the period was turbulent, 52 days after the surgical procedure, the animal was discharged. Keywords: Herniorrhaphy. Orchiectomy. Enteroanastomosis. Surgery. Postoperative INTRODUÇÃO Os equinos ocupam um rebanho extenso e diversificado em todo território brasileiro, com 5,7 milhões de animais espalhados por todo território participando na vida do ser humano em atividades rurais, criação, esporte e lazer tendo grande importância econômica e social. (SILVA, 2017) 5 Dentre as afecções que mais ocorrem rotineiramente na clínica de equinos, os quadros de abdome agudo são os mais frequentemente atendidos, indo de quadros mais simples aos mais severos, podendo levar o animal a óbito. As causas podem ser as mais diversas como problemas gástricos, mudanças alimentares, alimentação de baixa qualidade, aerofagia, características físicas (idade, sexo e raça), parasitas dentre outras (GONÇALVEZ et al., 2002 & DIAS et al., 2013) A hérnia inguino-escrotal faz parte de um dos quadros que se encaixam em doença abdominal nos equinos, sendo comum na espécie, podendo ser classificada como hereditária ou causada por esforço, principalmente durante a cobertura (THOMASSIAN, 2005) e até mesmo classificadas como diretas e indiretas, onde as diretas constituem no estrangulamento de alças através da túnica vaginal parietal ocupando o subcutâneo e as indiretas apenas com a presença das alças na túnica vaginal (REED et al, 2004). Os sinais clínicos da hérnia inguino-escrotal adquirida consistem em uma cólica aguda com aumento do escroto, podendo ser unilateral ou bilateral (MUNROE, 2011) segundo François et al (2023) o prognóstico depende da viabilidade das alças acometidas e segundo Reed et al (2004) a taxa de sobrevivência é superior a 75% dos animais em 6 meses. O diagnóstico segue o padrão para a síndrome cólica, deve ser feito avaliando o estado geral do animal, que pode apresentar alterações em frequência cardíaca e respiratória, coloração mucosas, testículos com aumento de tamanho uni ou bilateral, rigidez e com baixa temperatura, a análise de líquido peritonial pode apresentar alterações dependendo da viabilidade das alças acometidas. É possível ainda realizar uma apalpação retal a perceber as alças de intestino delgado se direcionando ao escroto e ultrassonografia que pode sugerir a presença de conteúdo na bolsa escrotal. (AMARAL & FROES, 2014) O tratamento depende do quadro clínico do animal, podendo ser feito por redução manual por manipulação da bolsa escrotal com aplicação de bandagens de suporte que também pode ser realizada através de apalpação retal, mas não é tão recomendada devido ao risco de laceração. O tratamento cirúrgico mais 6 recomendado nos casos agudos, com redução do conteúdo herniário e fechamento do anel (MUNROE, 2011). RELATO DE CASO Foi encaminhado no dia 25 de dezembro de 2020 a Unidade Didática Clínica Hospitalar (UDCH) da Universidade de São Paulo, campus Fernando Costa um equino, macho, 6 anos, não castrado, raça Mangalarga Mineiro, pelagem castanha, pesando 350kg que foi atendido por uma veterinária em sua propriedade no dia anterior que o encaminhou ao hospital com suspeita de hérnia inguino escrotal. No exame físico apresentou seus dois testículos edemaciados com dor a apalpação, taquicardia com frequência cardíaca em 48 batimentos por minuto, normopneico com frequência respiratória em 16 movimentos por minuto, mucosas levemente congestas, motilidade intestinal ausente, temperatura retal em 37,8º C, sem pulso digital nos membros. Seus exames laboratoriais de amostras sanguíneas apresentaram proteína em 7,2 g/dL, lactato 5,2 mmol/L, pH em 7,0. A suspeita principal era de hérnias inguino escrotal com encarceramento devido ao estado geral do animal e a amostra de lactato alta, por isso o animal foi encaminhado a cirurgia onde seria confirmada o diagnóstico e iniciar o devido tratamento.Antes de encaminhá-lo ao centro cirúrgico realizou-se prévia tricotomia na região do abdome e o animal foi levado a sala de indução onde foi iniciada pela equipe de anestesia a medicação pré-anestésica e indução do paciente, usado xilazina a 1,1mg/kg por via Intravenosa e após 5 minutos para a indução foi realizado cetamina a 2mg/kg também por via intravenosa. Durante o procedimento o animal foi mantido em plano anestesista com isoflurano com CAM de 1,3%. 7 Para o procedimento, o animal foi colocado sob a mesa em decúbito dorsal, iniciamos a anti-sepsia do escroto e abdome pensado na possibilidade de uma laparoscopia, utilizando clorexidina degermante e clorexidina alcoólico. O procedimento foi iniciado com a incisão de pele elíptica na região inguinal, seguindo com a tesoura metzembaum curva, já sendo possível visualizar a alça presente no local (Figura 1), estando com aparência extremamente congesta e repleta, mostrando o motivo do encarceramento. Devido a repleção da alça presentes no local e seu estado de integridade foi necessário realizar a abertura do abdome para laparoscopia a fim de detectar a extensão de danos na alça, retirando-as do saco herniário para realizar a castração do animal e fechamento do anel inguinal. Ao iniciar esses procedimentos e expormos as alças para fora da cavidade, visualizamos uma porção de cerca de 4 metros de intestino delgado, especificamente de jejuno, com estrangulamento e comprometimento circulatório devido ao encarceramento (Figura 2) optando então pela enterectomia e anastomose da região afetada. Figura 1 – Alça congesta exposta após incisão inguinal; Para realizar a enterectomia foi realizado a ordenha do intestino a fim de remover o conteúdo presente, isolarmos a porção que seria seccionada com uma pinça intestinal Doyen e cortando com o bisturi, para a anastomose utilizou-se a técnica término-terminal unindo as duas extremidades com sutura de Lembert 8 Modificado. Enquanto a secção era realizada, uma segunda equipe realiza a castração pela técnica aberta e fechamento do anel herniário. Figura 2 – Porção de jejuno retirada devido comprometimento tecidual. No fim da cirurgia, com um total de 7 horas de duração o cavalo foi colocado de volta a sala de indução com um capacete protetor ligado a uma corda para auxiliar seu retorno, a mesma corda também é colocada na cauda do animal com o mesmo intuito. Após 10 horas aguardando-o retornar do plano anestésico, levantou-se o animal e notou-se que ele apresentou claudicação de grau IV em membro torácico direito que, após avaliação, foi visto que os sintomas eram decorrentes de uma paralisia de nervo radial. O cavalo foi encaminhado ao tronco de contenção onde teve seus membros colocados no gelo como prevenção para laminite e no membro que apresentou a paralisia foi feito uma tala de apoio (Figura 3), também começamos uma infusão de lidocaína a 50mcg/kg/min e infusão de ringer lactato para hidratação a 2L/h pelo qual permaneceu por 30 horas. O paciente apresentou em suas primeiras horas de recuperação refluxo gástrico de cerca de 5L/h , TPC em 2-3 segundos, mucosas hipercoradas, motilidade intestinal baixa, hematócrito em 58%. Exame físico foi repetido a cada 1 hora nas primeiras 24 9 horas da cirurgia e laboratoriais como hematócrito e proteína foram repetidos a cada 4 horas para acompanhar sua evolução. Os medicamentos receitados para o pós-cirúrgico incluíram gentamicina a 6,6 mg/kg SID via intravenosa diluída em 1L de solução de ringer lactato durante 7 dias, flunixina meglumina a 1,1mg/kg BID via intravenosa durante 6 dias e meia dose do mesmo por mais 5 dias, benzilpenicilina potássica a 12,5 mg/kg QID via intravenosa diluída em 1L de solução ringer lactato durante 4 dias. Também foi administrado dipirona monohidratada a 25mg/kg por via intravenosa nos quadros de febre apresentados pelo animal e metoclopramida a 0,25 mg/kg como protetor gástrico, dexametasona a 0,1 mg/kg por via intravenosa e DM Gel® aplicado sob a pele do animal em apenas uma aplicação a fim de reduzir os sintomas da paralisia do membro. Receitados também os cuidados com a limpeza e curativo dos pontos cirúrgicos no abdome, que foram iniciados no dia seguinte ao procedimento, para ser feito com iodo tópico e da região escrotal com iodo degermante e pomada antimicrobiana, mantendo-o com uma cinta abdominal. Dois dias depois foram adicionados mais medicações a ficha do animal incluindo ceftiofur a 4,4 mg/kg SID via intravenosa por 15 dias, omeprazol a 2g/animal SID por via oral junto em 10 ml do suplemento vitamínico Suprafort®. Por 27 dias. Durante suas primeiras horas de recuperação o animal ainda estava apático, com motilidade intestinal baixa e teve febre de 39,0º onde foi aplicado a primeira dose de dipirona e 39,5º na hora seguinte, necessitando uma segunda dosagem de dipirona. Os medicamentos foram iniciados 8h após o animal se levantar, quando ele se apresentou mais estável, com um intervalo de cerca de 1 hora entre cada um deles. Também foi iniciado a terapia de eletroacupuntura a fim de tratar o membro paralisado e a crioterapia para tratar o mesmo membro e prevenir a laminite nos demais. 10 Figura 3 – Animal no tronco de contenção recebendo eletroacupuntura e crioterapia Após 2 dias do procedimento com a diminuição do refluxo gástrico decidiu- se retirar a sonda do cavalo e levá-lo para uma baia iniciando assim oferta controlada de alimento para o animal, oferecendo a proporção de uma mão de feno previamente molhado ou capim verde a cada 1 hora que foi progressivamente aumentada conforme a adaptação e resposta do animal. No dia seguinte foi feito uma infusão de 10ml de cálcio e 2ml de cloreto de potássio diluído em soro de ringer lactato a 2L/h por via intravenosa para reposição eletrolítica e hidratação por 10 horas pois as fezes do animal ainda se apresentavam com silabas ressecadas. Dez dias após o procedimento foi observado que houve uma abertura dos pontos da derme nas regiões abdominal e inguinal do animal (Figura 4), sendo necessário alterar o protocolo de tratamento desses pontos. Na região abdominal passou-se a lavar a região com água corrente e detergente neutro, higienizar com gazes embebidas em iodo degermante finalizando com iodo tópico, pomada antibiótica e fechando com a cinta, repetindo o tratamento 3x por dia sendo que em uma das vezes se adicionava açúcar junto a pomada para auxiliar na cicatrização. Para a região inguinal manteve-se a limpeza com iodo degermante, aplicação de iodo tópico, pomada antibiótica e spray de prata. 11 Figura 4 – A: Pontos abdominais abertos; B: Pontos inguinais abertos. Novos medicamentos foram adicionados a ficha do cavalo devido seu estado geral, onde ele se apresentava deitado na baia por alguns períodos. Para isso incluiu-se fenilbutazona a 2,2 mg/kg BID por via intravenosa por 2 dias, passando para meia dose no 3º dia e para SID por mais 4 dias. Oxitetraciclina LA a 10mg/kg SID por via intravenosa diluída em solução fisiológica de 500ml por 7 dias. Outra complicação apresentada 23 dias após a cirurgia foi o edema e supuração, chegando a apresentar uma região de ulceração, no membro pélvico esquerdo do cavalo (Figura 5) e feridas no dorso causados por atrito da cinta abdominal. O membro foi tratado duas vezes ao dia com limpeza com água e sabão, lavagem com diluição de 50ml de gentamicina e aplicação de sedenho com iodo tópico. As feridas do dorso foram tratadas com limpeza com iodo degermante, pomada antibiótica e óleo ozonizado e o uso da cinta foi passado somente para o horário da tarde. A B 12 Figura 5 – A: Membro pélvico esquerdo edemaciado; B – Ulceração no membro pélvico esquerdo com supuração tecidual Com um mês após o procedimento a região dos pontos da cirurgia já seapresentaram mais cicatrizadas e o protocolo de tratamento foi alterado para limpeza com iodo degermante e aplicação de pomada antibiótica com óleo ozonizado. Nessa altura o animal já estava se alimentando normalmente com feno e ração. No dia 16/02/2021, 52 dias após o procedimento, o animal já estava com todas suas feridas devidamente cicatrizadas, incluindo as dos pontos cirúrgicos, do membro e do dorso, e com todos os seus parâmetros dentro dos padrões desejáveis ele foi liberado de alta para casa. DISCUSSÃO As hérnias inguinais podem ser tanto congênitas como adquiridas, sendo as congênitas mais comuns em potros e com menores complicações, já as adquiridas ocorrem mais comumente nos garanhões, podendo ocorrer por excesso de pressão intra-abdominal durante o serviço, exercícios extenuantes ou trauma abdominal, deslocando o intestino pelo canal inguinal formando a hérnia (AUER et al, 2019; WHITE, EDWARDS; 2001). A B 13 No animal citado nesse relato, não temos um histórico e não foi observado nenhuma atividade ou exercício exagerado realizado pelo animal que possamos nos basear como causa da hérnia gerada. Os sinais de dor e sinais clínicos são os mesmos apresentados nos quadros de abdome agudo como: olhar para os flancos, deitar e rolar, coicear o abdômen, cavar com as patas dianteiras, elevação de frequências cardíacas, respiratória, alterações de coloração de mucosas, diminuição do trânsito intestinal (ALLEN; TYLER, 1990). No caso apresentado, os parâmetros de temperatura, frequência cardíaca e frequência respiratória do animal não apresentavam alterações, mas a apalpação dos testículos mostrou incomodo exagerado, além de que foi relatado pela veterinária que atendeu o animal previamente na propriedade que o cavalo deitava e rolava e olhava para os flancos. No tocante aos exames laboratoriais, as concentrações de proteínas do plasma se alteram quando a uma grande resposta sistêmica à inflamação (THRALL et al, 2015). Nos equinos, as proteínas de fase aguda estão associadas à natureza e grau de lesão entérica utilizado como meio de mensuração para a evolução do quadro (DE COZAR et al, 2020). No estudo realizado por Costa (2019) o lactato sérico é um bom indicador de avançada isquemia de alças, direcionando a tratativa para o caso e prognóstico do animal. Enquanto Taschetto (2022) mostra em seu estudo que a média de lactato sérico em animais sobreviventes foram 3,43mmol/L e 2,42 mmol/L, respectivamente e, nos animais que não resistiram foi de 4,84 e 7,13 mmol/L. Nesse caso, o cavalo apresentou uma proteína de amostra sanguínea de 7,2 g/dL, resultado dentro do valor de referência. Já o lactato indicava uma provável isquemia de alças, o qual poderia justificar o quadro clínico de dor que animal apresentava, em que o lactato da amostra sanguínea obteve um resultado de 5,2 Mmol/L. De acordo com o estudo feito por Taschetto (2022) o resultado de 5,2 Mmol/L é considerado um valor tão elevado, que poucos animais sobreviveriam. 14 Segundo Thomassian (2005), a hérnia inguino escrotal pode ser identificada através do exame de palpação na síndrome cólica, podendo ser auxiliado com ultrassonografia, no caso relatado a ultrassonografia foi o método escolhido para o diagnóstico, mas a palpação também poderia ser empregada até mesmo caso não houvesse a disponibilidade do aparelho ultrassonográfico. Keller (2015) e White et al (2001) citam que existe a possibilidade de redução manual da alça afetada através de redução per rectun e massagem externa guiada por ultrassonografia, mas se houver a preocupação com a viabilidade das alças pode ser feita a laparoscopia exploratória. Auer et al (2019) também cita a técnica, mas ressalta que pode ser utilizado nos estágios iniciais e possui risco de ruptura retal. Para o caso acima descrito, a redução manual não foi adotada pois os níveis de lactato sérico junto aos sinais clínicos do animal ja sugeriam uma alteração na viabilidade de suas alças sendo necessário à laparoscopia para melhor visualização de sua integridade no geral. Rio Tinto et al (2004) cita que nos casos em que as hérnias não estão encarceradas ou são tratadas precocemente é possível manter os testiculos do animal e realizando apenas fechamento parcial do anel inguinal externo e nos casos em que há encarceramento e compressão dos testículos e cordões espermáticos, sua viabilidade é afetada e necessita da castração. No caso do cavalo citado, o encarceramento ocorreu afetando a viabilidade dos dois testículos devido ao encarceramento bilateral, necessitando realizar a castração com retirada dos dois testículos. Segundo Eger e Johnson (1987) o total do de isoflurano administrado durante o período transcirúrgico influencia diretamente no tempo de recuperação anestésica do paciente. Para Massone (2003) o tempo de recuperação no período pós-anestésico está ligado a deficiências orgânicas do paciente que causam dificuldade na metabolização do anestésico ou a trauma cirúrgico intenso. O animal relatado apresentou um tempo cirúrgico prolongado e por isso, associado ao seu decúbito dorsal prejudicando sua capacidade pulmonar e de 15 pressão arterial, teve seu tempo de recuperação tardio que lhe sujeitando a complicações. Às complicações com os pontos cirúrgicos ocorrem, segundo Freeman (2019) em 40% dos cavalos submetidos à laparoscopia. Pagliosa e Alves (2004) ainda cita que procedimentos com mais de 2 horas de duração tem o dobro de chances de apresentarem essas complicações. Já as paralisias de nervos, incluindo a de nervo radial podem ocorrer pelo tempo prolongado da cirurgia e mau acolchoamento e posicionamento do animal na mesa cirúrgica. (TEIXEIRA NETO, 2000) Apesar de todos os cuidados pós cirúrgicos empregados ao animal do caso citado acima, ele apresentou a deiscência dos pontos da derme e teve a paralisia do nervo radial. Ambos podem ter sido causados pelo tempo extenso de procedimento. CONCLUSÃO O relato apresenta um caso desafiador de hérnia inguinoescrotal bilateral em um cavalo, destacando a importância da abordagem cirúrgica e dos cuidados pós-operatórios. A decisão de realizar a laparoscopia foi respaldada pelos sinais clínicos, incluindo a elevação do lactato sérico, sugerindo isquemia das alças intestinais. A complexidade do caso é evidenciada pela necessidade de enterectomia devido ao estrangulamento do jejuno. O manejo anestésico, apesar de bem detalhado, enfrentou desafios, refletindo-se na claudicação pós-operatória e nas complicações nos pontos cirúrgicos, incluindo deiscência e paralisia do nervo radial. Os cuidados pós-cirúrgicos abordaram diversas complicações, como ulcerações, edema e supuração no membro pélvico, exigindo uma abordagem multifacetada, incluindo terapia de eletroacupuntura e crioterapia. A administração de medicamentos, como antibióticos, anti-inflamatórios e analgésicos, visou promover a recuperação do animal. 16 A evolução do caso destaca a importância da monitorização contínua, ajustes no protocolo de tratamento conforme as necessidades e uma abordagem integrada para lidar com as diversas complicações surgidas. O desfecho positivo após um mês de cuidados intensivos demonstra a eficácia da equipe em superar os desafios enfrentados. REFERÊNCIAS ALLEN, D.; TYLER, D. Pathophysiology of acute abdominal disease. The equine acute abdomen. Philadelphia: Lea & Febiger White, 1990. p. 65-87. AUER J.A.; STICK J.A.; KÜMMERLE J.M.; PRANGE. T. Equine Surgery. 5 ed., St Louis: Elsevier, 2019, p 550-552. COSTA. A. H. C. 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Wandbook of equine colic - Woburn: Butterworth Heineman, 2001, p 66-67. 18 AGRADECIMENTOS Agradecemos a Professora Renata Guebara Sampaio Dória por ter autorizado o caso para nosso relato e a Médica Veterinária e Mestranda Brenda Valéria Dos Santos Oliveira, responsável pelo atendimento do paciente, pelo apoio e ajuda para melhor descrição do relato.
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