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02 28 (Lista - Aulas 3 e 4, A Idade Média e o Trovadorismo)

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Profª. Cristiane 
Literatura 
 
Página 1 de 10 
Aulas 3 e 4: A Idade Média e o Trovadorismo 
 
Começaremos nossas aulas sobre escolas literárias. 
Concentraremos nosso estudo na língua portuguesa, seus 
principais autores portugueses e brasileiros e suas obras 
mais significativas. 
O texto mais antigo encontrado em galego-português, 
“Cantiga da Guarvaia”, de 1198 (ou 1189)1, dedicada por 
Paio Soares de Taiverós a Maria Paes Ribeiro, a Ribeirinha, 
marca o início da literatura (escrita) em língua portuguesa e 
das escolas literárias. 
No mundo non me sei parelha 
mentre me for como me vai, 
ca já moiro por vós – e ai!2 
mia senhor branca e vermelha.3 
queredes que vos retraia4 
quando vos eu vi en saia!5 
Mau dia me levantei, 
que vos enton não vi fea!6 
E, mia senhor, dês aquel di’ai! 
me foi a mi mui mal,7 
e vós, filha de don Paai8 
Moniz, e bem vos semelha 
d’haver eu por vós guarvaia9 
pois eu, mia senhor, d’alfaia 
nunca de vós houve nen hei 
valia d’ua correa.10 
Paio Soares de Taveirós. Cantiga da Garvaia. In: Massaud Moisés. A 
literatura portuguesa através dos textos. 25 ed. SP: Cultrix, 1998, p. 20. 
 
 
Sobre esse texto, o prof. Massaud Moisés comenta (p. 
21/22): 
A presente cantiga [...] é de equívoca classificação, 
porquanto apresenta simultaneamente elementos lírico-
amorosos e satíricos. O trovador nos dá a impressão de 
encobrir, sob o manto da reverência imposta por sua 
condição de cavalheiro em “serviço amoroso” de uma 
dama, suas setas embebidas em sarcasmo ou despeito. 
Por essa causa e pelo fato de o texto ainda apresentar 
várias dúvidas aos filólogos, a canção vem resistindo 
valentemente à sondagem dos estudiosos, que continuam 
a discordar quanto à sua interpretação. Decerto, algo de 
sua peregrina e persistente beleza resultará justamente do 
caráter dúbio assumido pelo sentimento do trovador em 
relação à cortesã de D. Sancho I. [...] 
Portanto, quer-me parecer que o trovador, havendo sido 
beneficiado com os favores da dama, padece por se 
recordar do bem recebido ou do mal que lhe ficou na 
lembrança. Mas também padece por despeito, quem sabe 
 
1 Estudos mais recentes revelam que esse texto data do início 
do século XIII, aproximadamente, 1215. Seguimos aqui, porém, 
uma bibliografia embasada em Massaud Moisés e Segismundo 
Spina, que ainda fazem uso da data até então consagrada. 
2 Não conheço ninguém no mundo igual a mim, enquanto me 
acontecer o que me acontece, pois eu morro por vós – ai! 
3 A alvura e o rosado da tez feminina (ou a cor ruiva de seus 
cabelos) ou a cor da guarvaia, peça do vestuário de Corte e de 
luxo, provavelmente de cor escarlate. 
4 Retratar, descrever, relatar; afastar-se de, retirar-se ou ainda 
desistir de, renunciar a. 
resultante de a dama se lhe tornar antipática ao admitir que 
agora, visto ter sido promovida à categoria de favorita do 
Rei, era merecedora do manto da Corte. Movido pelo 
ressentimento, insurge-se contra a circunstância de ela 
pretender a “guarvaia” só por vaidade e petulância, ou para 
com a vestimenta apagar a memória das antigas 
concessões. [...] E insurge-se ainda porque da Ribeirinha 
jamais recebera presente algum, não os favores, que já os 
merecera, mas os benefícios que, como dama alçada ao 
nível régio, ela poderia conceder-lhe. 
 
Para entender melhor os textos produzidos nesse período, 
porém, devemos antes entender o contexto histórico, 
filosófico e artístico que marca o fim da Idade Média. 
 
1. O contexto histórico-filosófico medieval 
 
O historiador medievalista francês Jacques Le Goff defende 
a ideia de que Idade Média não existe: 
[...] Esse período de quase mil anos, que se estende da 
conquista da Gália por Clóvis até o fim da Guerra dos Cem 
Anos, é uma fabricação, uma construção, um mito, quer 
dizer, um conjunto de representações e de imagens em 
perpétuo movimento, amplamente difundidas na sociedade, 
de geração em geração, em particular pelos professores do 
primário [...] para dar à comunidade nacional uma forte 
identidade cultural, social e política. 
[...] A aparição de um conceito desvalorizante de “idade 
média”, quer dizer, literalmente, de “época intermediária”, é 
consequência de um duplo fenômeno cultural e religioso. 
Resulta da vontade manifesta dos humanistas italianos, 
desde o século XIV, de retornar às fontes da Antiguidade 
Clássica em sua pureza e autenticidade filológicas [...]. O 
século XVIII assume e aperfeiçoa essa divisão ternária da 
história (Antiguidade, Idade Média, tempos modernos) para 
melhor celebrar a vitória das Luzes sobre o obscurantismo 
clerical e o triunfo de uma civilização refinada sobre a 
grosseria e a barbárie desses longínquos séculos de ferro. 
No entanto [...] a expressão “Idade Média” começa a tornar-
se, entre os eruditos europeus, um termo técnico mais 
neutro, desprovido de conotação pejorativa, confortável 
para designar um período recuado no tempo. 
Jacques Le Goff e Jean-Claude Schmitt. Dicionário 
temático do Ocidente medieval. São Paulo: 
Edusc/Imprensa Oficial, 2002, p. 538. 
Assim, percebemos que o próprio conceito de Idade 
Média traz, indiretamente, uma visão etnocêntrica de 
mundo. Se perguntássemos a um homem do século X se 
5 Estar sem manto, ser vista na intimidade ou estar de luto. 
6 Mau dia aquele [em que vos vi sem manto], pois vi que não 
sois feia. 
7 E, minha senhora, desde aquele dia, ai!, venho sofrendo dum 
grande mal. 
8 A palavra filha ou tem sido considerada substantivo, ou verbo 
– “filhar ” significaria tomar de presente, apropriar-se. 
9 “Por intermédio de vós” ou “por amor de vós” ou “para vós” 
ou “em troca de vós”. 
10 Eu, minha senhora, de vós nunca recebi a coisa mais 
insignificante. 
 
Profª. Cristiane 
Literatura 
 
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ele sabia que se encontrava na Idade Média, responderia 
ele: “Média entre que tempos?” Adotaremos, porém, essa 
nomenclatura por ser consagrada e por estar hoje 
“desprovida de conotação pejorativa”. 
No século IX, Carlos Magno busca construir um novo 
império a partir do modelo romano, empresa que fracassou, 
já que as grandes realizações medievais foram obras 
coletivas, e não individuais. Após a partilha do mundo 
carolíngio, surgiu o feudalismo como meio de defesa militar 
da Europa ocidental, assolada agora por invasores. No 
século XI, porém, a Cavalaria já se tornava um 
anacronismo. Segundo o professor Segismundo Spina, 
especialista em literatura medieval, 
[...] A estrutura feudal constituía, sem dúvida, um grande 
progresso: como sistema organizado, rudimentar, embora, 
não só visava à segurança do mundo cristão, como a 
fortificar progressivamente o poder dos senhores, criando, 
então, do mais alto suserano ao mais desprezível dos 
servos, uma hierarquia na qual se fixavam pela primeira vez 
os direitos e os deveres de cada um. Esta união e proteção 
mútua foram determinadas pela necessidade da 
manutenção da paz contra os invasores; e ao redor das 
igrejas fortificadas e dos castelos, esboçam-se as cidades, 
que vão paulatinamente adquirindo consciência de sua 
personalidade política, surgindo assim o movimento 
comunal; os castelos de madeira vão sendo substituídos 
pelos de pedra, e os grandes senhores, articulando à sua 
suserania os vassalos que deles necessitam auxílio e 
proteção. 
A cavalaria, como organização paramilitar e 
complementar do Feudalismo, tornou-se a expressão 
combativa, guerreira, moral e religiosa dessa sociedade. 
[...] O cavaleiro tinha diante de si, a partir da investidura de 
suas armas, um código que lhe prescrevia o temor de Deus 
e a manutenção da religião cristã, o serviço leal a seu rei, a 
proteção dos fracos e indefesos, o desprezo das 
recompensas pecuniárias, o respeito à honra das mulheres. 
Segismundo Spina. A lírica trovadoresca. 4 ed. 
SP: Edusp, 1996, p. 19. 
 
Professor de retórica, Santo Agostinho (354-430) 
sintetiza elementos da cultura antiga com o cristianismo e 
põe em relevo uma interação entre a fé e arazão. Para ele, 
o mistério da fé não é impenetrável ou incompreensível e, 
uma vez aceito pela fé, devemos procurar analogias que o 
esclareçam: “antes, crê para entender”. Houve muitos 
teólogos importantes depois dele (Santo Anselmo, padre 
Aberlardo, Guilherme de Ockham), mas talvez o mais 
destacado seja São Tomás de Aquino (1225-1274). 
Fortemente apoiado nas ideias aristotélicas e agostinianas, 
Tomás não separa teologia e filosofia11, apesar de não as 
confundir. Para ele, a filosofia se estabeleceria plenamente 
na integração com a teologia, fundada em argumentos de 
ordem racional. 
O período que corresponde ao que consideramos o 
“Trovadorismo galego-português” é o que o historiador John 
Huizinga chamou de “outono da Idade Média”. Para o 
professor do departamento de filosofia da PUC/SP Carlos 
Arthur Nascimento, não podemos nos esquecer de que 
outono, além de conotar declínio: 
 
11 Aqui, o termo conota a filosofia da Antiguidade Clássica. 
[...] é uma estação deslumbrante nos países 
temperados. As folhas estão morrendo, mas não é isso que 
chama a atenção: é o espetáculo das cores. Como diz outro 
historiador da Idade Média, Jacques Le Goff: “num tal 
momento da história, os contrastes aparecem com uma 
evidência extraordinária, e é então que se pode 
compreender melhor o que é uma civilização; e então que 
vêm plenamente à luz as tensões que aí se albergam”. 
Carlos Arthur Nascimento.O que é filosofia medieval. 1 ed. 7 
SP: Brasiliense, 2004, p. 71. (Coleção Primeiros Passos.) 
 
Há outros aspectos que contextualizam o período medieval. 
Por enquanto, atemo-nos ao que nos permite entender em 
linhas gerais a cultura do homem medieval e seu processo 
de criação artística e literária. 
 
2. A dualidade do mundo medieval 
 
 
Hieronymus Bosch, O trítico fechado: a criação do mundo, 
óleo sobre tábua, 220 x 195 cm, Museu do Prado 
 
 
 
“O jardim das delícias terrenas” (datação incerta), obra 
do pintor flamengo Hieronymus Bosch (1450-1516), é uma 
boa maneira de nos aproximarmos da cultura medieval. Os 
três painéis, que descrevem a história do mundo a partir da 
criação, apresentam o paraíso terrestre ao lado esquerdo 
(o gênesis, “Jardim do Éden”), o inferno ao lado direito e, no 
centro, uma celebração dos prazeres da carne, que dão 
nome à obra. O quadro fechado alude ao terceiro dia da 
criação do mundo e, ao se abrir, fecha-se simbolicamente 
o trítico início-meio-fim. Se notarmos que há cenas atípicas 
do que se acredita ser o imaginário medieval (Eva não sai 
da costela de Adão, signos de fustigação irrompem na tela 
e, mesmo no Paraíso, há imagens de luxúria, pecado, 
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Hieronymus_Bosch_-_The_Garden_of_Earthly_Delights_-_The_exterior_(shutters).jpg
 
Profª. Cristiane 
Literatura 
 
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relações hétero e homossexuais, estranhas estruturas que 
aprisionam e oprimem as personagens etc.), devemos nos 
perguntar pelo ideário do pintor. Será que ele condena ou 
elogia esse mundo que descreve? A leitura tradicional 
defende que ele ironiza o mundo para moralizá-lo por meio 
de ácidas críticas. 
Mas essa não é a única visão aceitável. O quadro de 
Bosch é um bom mote para pensarmos sobre a dualidade 
medieval entre a cultura oficial (clerical e feudal) e a cultura 
popular. Sobre o amor estilizado dos fins da Idade Média, 
diz Huizinga, em sua já citada obra: 
Somos antes inclinados a imaginar que existiam duas 
camadas sobrepostas de civilização, não obstante serem 
contraditórias. Ao lado do estilo cortês, de origem literária e 
recente, as formas primitivas da vida heroica mantiveram 
sua força: porque uma civilização complicada como a dos 
fins da Idade Média não podia deixar de ser herdeira de 
uma infinidade de concepções, motivos, formas eróticas 
que ora colidiam, ora se misturavam. 
Huizinga. O declínio da Idade Média. Ulissea, 1996. p. 103. 
 
Esse pensamento vai ao encontro das ideias de um dos 
mais importantes teóricos da literatura contemporânea, 
Mikhail Bakhtin. Em seu consagrado livro A cultura popular 
na Idade Média e no Renascimento, o autor discorre sobre 
as múltiplas manifestações da cultura popular no período 
representado (as formas dos ritos e espetáculos, obras 
cômicas verbais e diversas formas e gêneros do 
vocabulário familiar e grosseiro) e afirma: 
[...] o mundo infinito das formas e manifestações do riso 
opunha-se à cultura oficial, ao tom sério, religioso e feudal 
da época. Dentro da sua diversidade, essas formas e 
manifestações – as festas públicas carnavalescas, os ritos 
e cultos cômicos especiais, os bufões e tolos, gigantes, 
anões e monstros, palhaços de diversos estilos e 
categorias, a literatura paródica, vasta e multiforme etc. – 
possuem uma unidade de estilo e constituem partes e 
parcelas da cultura cômica popular, principalmente da 
cultura carnavalesca, única e indivisível. 
[...] Todos esses ritos e espetáculos organizados à 
maneira cômica apresentavam uma diferença notável, uma 
diferença de princípio, poderíamos dizer, em relação às 
formas do culto e às cerimônias do Estado feudal. 
Ofereciam uma visão do mundo, do homem e das relações 
humanas totalmente diferente, deliberadamente não oficial, 
exterior à Igreja e ao Estado; pareciam ter construído, ao 
lado do mundo oficial, um segundo mundo e uma segunda 
vida aos quais os homens da Idade Media pertenciam em 
maior ou menor proporção, e nos quais eles viviam em 
ocasiões determinadas. Isso criava uma espécie de 
dualidade de mundo, e cremos que, sem levá-la em 
consideração, não se poderia compreender nem a 
consciência cultural da Idade Média, nem a civilização 
renascentista. Ignorar ou subestimar o riso popular na Idade 
Média deforma também o quadro evolutivo histórico da 
cultura europeia nos séculos seguintes. 
Mikhail Bakhtin. A cultura popular na Idade Média e no Renascimento: o 
contexto de François Rebelais. 5 ed. SP: Annablume/Hucitec, 2002, p. 4. 
 
 Bakhtin acredita que as imagens grotescas do fim 
da Idade Média, presentes não só na obra de François 
Rebelais (autor francês do século XVI, contemporâneo de 
Miguel de Cervantes e de William Shakespeare, em cuja 
obra tampouco faltaram traços grotescos), mas também na 
de Bosch, Bruegel, o Velho, e em afrescos e baixos-relevos 
que decoravam as catedrais e mesmo igrejas rurais dos 
séculos XII e XIII: 
São imagens ambivalentes e contraditórias que 
parecem disformes, monstruosas e horrendas, se 
consideradas do ponto de vista da estética “clássica”, isto 
é, da estética da vida cotidiana pré-estabelecida e 
completa. A nova percepção histórica que as trespassa 
confere-lhes um sentido diferente, embora conservando 
seu conteúdo e matéria tradicional: o coito, a gravidez, o 
parto, o crescimento corporal, a velhice, a desagregação e 
o despedaçamento corporal etc., com toda a sua 
materialidade imediata, continuam sendo os elementos 
fundamentais do sistema de imagens grotescas. São 
imagens que se opõem às imagens clássicas do corpo 
humano acabado, perfeito e em plena maturidade, 
depurado das escórias do nascimento e do 
desenvolvimento. 
[...] Além disso, esse corpo aberto e incompleto 
(agonizante-nascente ou prestes a nascer) não está 
nitidamente delimitado do mundo, confundido com os 
animais e as coisas. É um corpo cósmico e representa o 
conjunto do mundo material e corporal, em todos os seus 
elementos. Nessa tendência, o corpo representa e encarna 
todo o universo material e corporal, concebido como o 
inferior absoluto, como um princípio que absorve e dá à luz, 
como um sepulcro e como um seio corporais, como um 
campo semeado que começa a brotar. 
Mikhail Bakhtin, op. cit., p. 23-24. 
 
 
Hieronymus Bosch, Cruz às costas, Palácio Real, Espanha. 
 
Apesar de Bosch ser um pintor do século XV, percebemos 
em sua obra que certas características dessa dualidade 
perpassam toda a Idade Média, especialmente o “outono” 
dessa época. A literatura não oficial – cantigasde origem 
popular, por exemplo, sobretudo as satíricas – também 
pode ser analisada sob essa mesma ótica. Para entender 
as manifestações literárias desse período, estudaremos o 
Trovadorismo. 
 
 
Profª. Cristiane 
Literatura 
 
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3. Trovadorismo (1198-1418) 
 
Não se sabe exatamente quais são as origens da poesia 
trovadoresca, mas acredita-se que venha de Provença seu 
influxo mais próximo. No século XI, essa região meridional 
da França se tornou um centro de atividade lírica, devido ao 
grande luxo oferecido aos artistas da Corte pelos senhores 
feudais, e exportou para diversas regiões da Europa, 
inclusive para os salões de Borgonha, a canção, o “cantar 
d’amor”. A velha poesia nacional portuguesa, oriunda de um 
lastro poético advindo da România – cujo agente criador era 
a mulher em suas cantigas d’amigo, que estudaremos com 
mais vagar – soma-se à nova forma importada, e nascem a 
poesia palaciana e a popular, que coexistiriam até pouco 
depois da morte de D. Dinis, em 1340, para renascer com 
o Cancioneiro Geral, de Garcia de Resende, em 1516. Por 
estar fortemente comprometidos com a música e 
relativamente com a dança, dá-se o nome de cantigas a 
esses poemas trovadorescos. Troubadour era o nome dado 
ao poeta provençal, que assim se chamava porque 
“encontrava” (trouver, em francês, é “encontrar”) as rimas 
para suas canções – daí a denominação do período. Em 
Portugal, chamavam-se “trovadores” os poetas músicos 
que compunham suas próprias cantigas (letra e melodia); 
“jogral”, o bobo da corte, o mímico, o bailarino; “segrel”, o 
trovador profissional (andarilho), e “menestrel”, o músico. 
Porque havia unidade linguística entre Portugal e a 
região da Galícia12, o idioma das cantigas é o galego-
português. As cantigas galego-potuguesas subdividem-se 
em líricas (cujo tema é o amor) e satíricas (cujo tema é a 
zombaria). 
 
 
 
3.1.1. Cantigas líricas de amor 
 
Aqui, o trovador, representado por um eu lírico13 
masculino, confessa, de forma dolorosa e elegíaca, sua 
angustiada experiência passional diante da mulher amada, 
dama inacessível a seus apelos, entre outras razões, por 
 
12 Essa afirmação é controversa. Aqui, baseamo-nos em 
Massaud Moisés. A literatura portuguesa. 33 ed. São Paulo: 
Cultrix, p. 20. 
13 Chama-se “eu lírico” a voz que canta o poema, que nem 
sempre se identifica com o autor. Numa cantiga de amigo, por 
exemplo, o autor é sempre um homem, e o eu lírico, feminino. 
ser de superior estirpe social. Ao sofrimento interior, segue-
se a certeza da inutilidade da súplica, ou a “coita14 d’amor”. 
Esse eu lírico eleva a mulher e empreende a chamada 
“vassalagem amorosa”, dirigindo-se a ela com respeito e 
subserviência (mia dona, mia senor15). Orientado pelas 
regras do “amor cortês”, o trovador deveria mencionar seu 
amor comedidamente, para não desagradar a amada, à 
qual se referia por pseudônimo ou cujo nome francamente 
ocultava. Num tom de murmúrio ou súplica, as estrofes (na 
época, chamadas cobras) da canção confessam o 
sofrimento do trovador num círculo vicioso que se repete 
monotonamente até o fim. O estribilho (ou refrão) que 
remata cada cobra geralmente fala sobre esse sentimento 
de dor amorosa, ideia fixa para a qual o trovador não 
encontrava outra expressão. Vejamos um exemplo desse 
tipo de cantiga, de autoria de um dos mais conhecidos 
trovadores portugueses, o rei D. Dinis (1261-1325), amante 
dos poetas e da cultura e fundador da Universidade de 
Lisboa, a primeira do país, em 1290. 
 
En gran coita, senhor,16 
que peior que mort’é, 
vivo, per boa fé,17 
e polo voss’ amor 
 esta coita sofr’eu 
 por vós, senhor, que eu 
 
Vi polo meu gran mal, 
e melhor mi será 
 
de morrer por vós já 
e, pois meu Deus non val, 
 esta coita sofr’eu 
 por vós, senhor, que eu 
 
Polo meu gran mal vi, 
e mais mi val morrer 
ca18 tal coita sofrer, 
pois por meu mal assi 
 esta coita sofr’eu 
 por vós, senhor, que eu 
 
Vi por gran mal de mi, 
Pois tan coitad’ and’ eu. 
D. Dinis. In: Massaud Moisés, op. cit., p. 23. 
 
Sobre o amor cortês, comenta o medievalista Jacques Le 
Goff: 
 [...] Na lírica, o amor cortesão aparece como uma 
relação virtualmente adúltera: a dama é casada, é objeto de 
uma corte amorosa e de uma súplica cujos mensageiros 
são os poemas. A súplica amorosa é calcada no modelo 
feudovassálico. “Minha senhora” (mi dona, “meu senhor”, 
em occitânico), tal é o termo de requerimento: o poeta está 
ao serviço da dama assim como o vassalo ao do senhor; 
ele deve-lhe “homenagem”, cerimônia pela qual um 
cavaleiro se declara o homem de um senhor. Certamente, 
os gestos de um ritual feudal não são aqui especificados, 
14 Que significa “sofrimento” e dá origem também a “coito” e 
“coitado”. 
15 Minha senhora. 
16 Senhor = senhora. 
17 Com toda a verdade. 
18 Ca = do que. 
 
Profª. Cristiane 
Literatura 
 
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mas trata-se de uma questão de “posse” (no vocabulário 
social, “tomar posse de um feudo”) pelo beijo. Após ter bem 
“servido” sua dama, o poeta talvez terá direito a um 
guerredon (“recompensa”, isto é um olhar, um beijo, talvez 
uma declaração de amor, sempre incerta, ou mesmo uma 
verdadeira união carnal, o que se chama “o algo a mais”). 
[...] Entretanto, a ética do amor cortesão não se resume à 
imitação do serviço feudal: no âmbito do que surge como 
uma verdadeira religião do amor, a dama é objeto de um 
culto. A alegoria do Deus Amor serve para revelar a 
submissão ao sentimento que, doravante, é a única razão 
de viver do poeta. 
Jacques Le Goff e Jean-Claude Schmitt. Dicionário temático do Ocidente 
medieval. São Paulo: Edusc/Imprensa Oficial, 2002, p. 48. 
 
Enganam-se, porém, aqueles que imaginam que o amor 
cortês idealiza a mulher dentro dos moldes da Igreja. 
Segundo o mitologista Joseph Campbell, na visão do clero, 
a ideia trovadoresca do verdadeiro amor era muito 
perigosa, porque contrariava o tipo de matrimônio 
consagrado pela Igreja. Na verdade, a forma como os 
trovadores cantavam seu sentimento pela mulher amada 
revolucionou a forma de amar corrente até então. Foram os 
trovadores os responsáveis por transformar a ideia de amor 
e aproximá-la à que temos hoje, do amor como derivado do 
encontro de olhares entre duas pessoas, que brota da 
descoberta da identificação com o outro e de que a união 
física é apenas o sacramento. Na Antiguidade, o amor era 
impessoal, era simplesmente Eros, deus que alimenta o 
princípio sexual, ou Ágape, o sentimento de compaixão – o 
amor espiritual. O individualismo amoroso apregoado pela 
tradição trovadoresca é revolucionário, na medida em que 
individualiza um homem que, até então, vivia numa 
sociedade pautada no coletivo. A idealização da mulher 
amada decorre, sim, do impacto espiritual do amor que 
pode levar ao plano físico, mas não ocorre o contrário, ou 
seja, o interesse meramente físico não pode levar ao 
espiritual. O amor de Tristão por Isolda seria um exemplo 
desse sentimento louvado pelos trovadores: 
[...] Na história de Tristão, depois que eles bebem a 
poção amorosa, a camareira, ao se dar conta do que tinha 
acontecido, vai a Tristão e diz: “Você bebeu sua morte.” E 
Tristão responde: “Por minha morte você entende esta dor 
de amor?” Porque esse era o ponto básico, o indivíduo 
devia sentir a enfermidade do amor. Não há nada mais no 
mundo capaz de preencher a sensação de identidade como 
a experiência do amor. Tristão diz: “Se por minha morte 
você entende esta agonia de amor, isto é a minha vida. Se 
por minha morte você entende a punição que sofreremos 
se formos descobertos, eu aceito isso. E se por minha morte 
você entende a punição eterna nas chamas do inferno, 
aceito isso também.” 
Joseph Campbell. O poder do mito. 
SP: Palas Athena, 1990, p. 200. 
 
 
 
 
19 Existem raros casos de um eu lírico masculino que enfoca a 
mulher. Há um exemplo na parte dos exercícios. 
20 No Trovadorismo,considera-se paralelismo a repetição de 
expressões idênticas em séries de estrofes paralelas. 
21 Pinheiro. 
3.1.2. Cantigas líricas de amigo 
 
Esse tipo de cantiga focaliza o outro lado da relação 
amorosa: apesar de o compositor ainda ser um home, um 
eu lírico feminino canta sua saudade do homem amado19. 
É uma mulher oriunda de camadas populares (pastora, 
camponesa, ribeirinha) que em geral confessa seu 
abandono (em razão da guerra ou de outra mulher) à mãe, 
às amigas, aos pássaros, aos arvoredos, às fontes, aos 
riachos. Ao passo que a cantiga de amor é idealista, a de 
amigo é realista, pois traduz um sentimento espontâneo, 
natural e primitivo por parte da mulher. 
Abaixo, reproduzimos outra composição de D. Dinis, o 
rei trovador, em que podemos apreciar características 
típicas das cantigas de amigo: a pastora (portanto, eu lírico 
feminino) interroga o pinheiro sobre seu amigo (eufemismo 
para amante), bem-amado ausente. Observe o rigoroso 
paralelismo20, tendência da poesia popular medieval. 
 
– Ai flores, ai flores do verde pino21, 
se sabedes novas do meu amigo? 
 ai, Deus, e u é22? 
 
– Ai flores, ai flores do verde ramo, 
se sabedes novas do meu amado? 
 ai, Deus, e u é? 
 
Se sabedes novas do meu amigo, 
aquel que mentiu do que pôs23 comigo? 
 ai, Deus, e u é? 
 
Se sabedes novas do meu amado, 
aquel que mentiu do que mi á jurado? 
 ai, Deus, e u é? 
 
– Vós me preguntades pólo voss’ amigo? 
E eu bem vos digo que é san’ e vivo24: 
 ai, Deus, e u é? 
 
Vós me preguntades pólo voss’ amado? 
E eu ben vos digo que é viv’ e sano: 
 ai, Deus, e u é? 
 
E eu ben vos digo que é san’ e vivo 
E seerá vosc’ant’ o prazo saído25: 
 ai, Deus, e u é? 
 
E eu ben vos digo que é viv’ e sano 
e seerá vosc’ ant’ o prazo passado: 
 ai, Deus, e u é? 
D. Dinis. In: Massaud Moisés. A literatura portuguesa através 
 dos textos. 25 ed. São Paulo: Cultrix, p. 28-29. 
 
3.2. Cantigas satíricas 
 
Canções de vida boêmia, encontravam nos meios 
tabernários seu lugar ideal. Não raro compostas pelos 
mesmos trovadores da poesia lírico-amorosa, 
documentam, apesar disso, os meios populares de seu 
tempo. Admitiam linguagem chula e expressões de baixo 
calão, e seu tom erótico muitas vezes beira a pornografia. 
Aqui reencontramos o grotesco de que falamos no início da 
aula. 
22 E onde está? 
23 Combinou. 
24 São e vivo. 
25 E estará convosco quando terminar o prazo de serviço militar. 
 
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3.2.1. Cantigas satíricas de escárnio 
 
São aquelas em que a sátira se constrói indiretamente, 
por meio da ironia e do sarcasmo. Geralmente fazem uso 
de termos ou expressões ambíguas para que a crítica não 
seja explícita. Vejamos uma cantiga de escárnio composta 
por Pêro Garcia Burgalês, trovador galego da segunda 
metade do século XIII. 
 
Rui Queimado morreu con amor 
en seus cantares, par26 Sancta Maria, 
por ua dona que gran ben queria, 
e, por se meter por mais trobador, 
porque lh’ela non quis [o] ben fazer, 
fez-s’el en seus cantares morrer, 
mas ressurgiu depois ao tercer dia! 
 
Esto fez el por ua as senhor 
Que quer gran ben, e mais vos en diria: 
porque cuida que faz i maestria27, 
e nos cantares que fez a sabor28 
de morrer i29 e desi30 d’ar viver31; 
esto faz El que x’o pode fazer, 
mas outr’omen per ren non [n] o faria. 
 
E non há já de as morte pavor, 
senon as morte mais la temeria, 
mas sabe bem, per as sabedoria, 
que viverá, dês32 quando morto for, 
e faz-[s’]em seu cantar morte prender, 
desi ar viver: vede que poder 
que lhi Deus deu, mais que non cuidaria. 
 
E, se mi Deus a min desse poder, 
Qual oi33’ el há, pois morrer, de viver34, 
Jamais morte nunca temeria. 
Pêro Garcia Burgalês. In: Massaud Moisés, op. cit., p. 33-34. 
 
Sobre ela, comenta o prof. Massaud Moisés: 
Esta cantiga enquadra-se entre as de escárnio, visto que 
Pêro Garcia procura mofar de Rui Queimado com “palavras 
cobertas que hajam dous sentidos. [...] No tocante à matéria 
da canção, Pêro Garcia satiriza o vezo que tinha esse poeta 
[Rui Queimado] e não poucos outros confrades de seu 
tempo, de confessar, nas suas cantigas, que se consumia 
de amor pela “dona” de seus cuidados. Mas como sua 
reiterada morte fosse apenas lírica, o trovador acabou por 
cair em ridículo. [...] Por fim, cabe salientar o seguinte ponto: 
embora a cantiga de escárnio tenda, no geral, a ser à clef 
(quer dizer: referir-se a circunstâncias e pessoas 
encobertas ou dissimuladas), o cantar de Pêro Garcia ainda 
nos diz alguma coisa graças à sua equação humana, viva 
 
26 Por. 
27 Porque pensa que tem talento. 
28 Gosto. 
29 Aí. 
30 Depois. 
31 Ar = re; reviver, de novo, outra vez. 
32 Desde. 
33 Hoje. 
34 Pois morrer, de viver = viver depois de morrer. 
35 Feia. 
36 Trova, cantiga. 
37 Agora. 
nos dias que correm, na medida em que perdura a 
dissociação entre o poeta-criador e o poeta-homem: Rui 
Queimado morria como poeta, em imaginação, ao passo 
que, como homem, se mantinha vivo. 
Massaud Moisés, op. cit., p. 34-35. 
 
3.2.2. Cantigas satíricas de maldizer 
 
São aquelas em que a sátira é feita aberta, direta e 
agressivamente. Utilizam-se de linguagem objetiva, sem 
disfarces. Em grande parte delas, explicita-se o nome 
daquele a quem o trovador dirige sua crítica. A maior parte 
das cantigas satíricas são de maldizer. Veja um exemplo: 
 
Ai dona fea35! foste-vos queixar 
porque vos nunca louv’en meu trobar36 
mais ora37 quero fazer um cantar 
em que vos loarei38 toda via39; 
e vedes como vos quero loar: 
dona fea, velha e sandia40! 
 
Ai dona fea! se Deus mi perdon! 
e pois havedes tanto gran coraçon 
que vos eu loe en esta razon41, 
vos quero já loar toda via; 
e vedes qual será a loaçon42: 
dona fea, velha e sandia! 
 
Dona fea, nunca vos eu loei 
en meu trobar, pero43 muito trobei; 
mais ora já un bon cantar farei 
en que vos loarei toda via; 
e direi-vos como vos loarei: 
dona fea, velha e sandia! 
 
Sobre essa canção, Massaud Moisés afirma: 
[...] Sua estrutura revela nitidamente o caráter popular 
desse tipo de cantiga: além de se arquitetarem segundo o 
esquema paralelístico, as cobras44 finalizam em estribilho45. 
Quanto ao conteúdo, é fácil imaginar as causas da inventiva 
do trovador: com certeza, a mulher a que ele destina a sátira 
se julgara merecedora duma cantiga de amor e, quem sabe, 
das atenções do poeta. Este, na resposta, observa as leis 
do comedimento, visto a interlocutora possuir os defeitos 
que tornavam improcedente e ridícula sua pretensão. [...] 
Atente-se para o fato de que a sátira trovadoresca, 
sobretudo na vertente de maldizer, por circular em 
ambientes tabernários46, somente por exceção apresentava 
a moderação de João Garcia de Guilhade: não raro acolhia 
expressões mais chulas e licenciosas do que é capaz a 
Língua Portuguesa. 
Massaud Moisés, op. cit., p. 35-36. 
38 Louvarei. 
39 Sempre, completamente. 
40 Louca. 
41 Mereceis a justiça de eu louvá-la. 
42 Louvor. 
43 Porém. 
44 A estrofe recebia o nome de “cobra”, e os versos eram as 
“palavras”. 
45 Refrão. 
46 Referente a taberna, estabelecimento onde se vendem vinho 
e outras bebidas; botequim. 
 
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Repare como esta última cantiga tem aspectos de 
escárnio, e a anterior, de maldizer. Isso ocorre porque a 
distinção existente entre esses dois tipos de canção nem 
sempre é válida; inúmeras vezes encontraremos textos 
satíricos que misturarão características. 
 
Curiosidade 
 
 
 
Além das Cantigas, o Trovadorismo também conheceu 
outra forma de produção literária: as novelas de cavalaria. 
Durante o reinado de D. Afonso III, no século XIII, essas 
produções penetraram em Portugal por meio da fidalguia e 
da realeza. Originária da Inglaterra ou da França, a matéria 
cavaleiresca pode ser dividida em três ciclos: bretão 
arturiano (tem como tema o Rei Artur e seus cavaleiros), 
carolíngio (acerca de Carlos Magno) e clássico (novelas de 
temasgreco-latinos). A única novela que nos restou em 
língua portuguesa foi A demanda do Santo Graal, terceira 
parte de uma trilogia. Retrato místico da Idade Média, 
corresponde à reação da Igreja Católica ao desvirtuamento 
da cavalaria. Cristianizando a lenda pagã do Santo Graal, o 
herói aí não está a serviço de seu senhor, mas de sua 
salvação sobrenatural. Porque todo amor carnal é 
considerado pecaminoso e a virgindade é louvada como o 
estado de pureza, apenas três cavaleiros conseguem obter 
a graça de ver o Santo Graal, cálice em que José de 
Arimateia colheu o sangue de Cristo na cruz: Galaaz, filho 
de Lancelote do Lago, fiel escudeiro do Rei Artur, e Persival 
– ambos virgens – e Boorz – casto47. Acompanhe um 
excerto de A demanda do Santo Graal, em português 
arcaico. 
Véspera de Pinticoste foi grande gente assüada em 
Camaalot, assi que podera homem i veer mui gram gente, 
muitos cavaleiros e muitas donas mui bem guisadas. El-rei, 
que era ende mui ledo, honrou-os muito e feze-os mui bem 
servir; e toda rem que entendeo per que aquela corte seeria 
mais viçosa e mais leda, todo o fez fazer. 
Aquel dia que vos eu digo, direitamente quando queriam 
poer as mesas – esto era ora de noa – aveeo que üa 
donzela chegou i, mui fremosa e mui bem vestida. E entrou 
no paaço a pee, como mandadeira. Ela começou a catar de 
 
47 Aquele que só pratica o sexo dentro do casamento. 
üa parte e da outra, pelo paaço; e perguntavam-na que 
demandava. 
– Eu demando – disse ela – por Dom Lançarot do Lago. 
É aqui? 
– Si, donzela – disse üu cavaleiro. Veede-lo: stá aaquela 
freesta, falando com Dom Gualvam. 
Ela foi logo pera el e salvô-o. Ele, tanto que a vio, 
recebeo-a mui bem e abraçou-a, ca aquela era ua das 
donzelas que moravam na Insoa da Lediça, que a filha 
Amida del-rei Peles amava mais que donzela da sua 
companha i. 
– Ai, donzela! – disse Lançalot –que ventura vos adusse 
aqui, que bem sei que sem razom nom veestes vós? 
– Senhor, verdade é; mais rogo-vos, se vos aprouguer, 
que vaades comigo aaquela foresta de Camaalot; e sabede 
que manhãa, ora de comer, seeredes aqui. 
– Certas, donzela – disse el – muito me praz; ca teúdo e 
soom de vos fazer serviço em tôdalas cousas que eu poder. 
Entam pedio suas armas. E quando el-rei vio que se 
fazia armar a tam gram coita, foi a el com a raïa e disse-lhe: 
– Como leixar-nos queredes a atal festa, u cavaleiros de 
todo o mundo veem aa corte, e mui mais ainda por vos 
veerem ca por al – deles por vos veerem e deles por averem 
vossa companha? 
– Senhor, – disse el – nom vou senam a esta foresta 
com esta donzela que me rogou; mais cras, ora de terça, 
seerei aqui. 
Entom se saío Lançarot do Lago e sobio em seu cavalo, 
e a donzela em seu palafrem; e forom com a donzela dous 
cavaleiros e duas donzelas. E quando ela tornou a eles, 
disse-lhes: 
– Sabede que adubei o por que viim: Dom Lançarot do 
Lago se irá comnosco. 
Entam se filharom andar e entrarom na foresta; e nom 
andarom muito per ela que chegarom a casa do ermitam 
que soía a falar com Gualaz. E quando el vio Lançarot ir é 
a donzela, logo soube que ia pera fazer Gualaaz cavaleiro, 
e leixou sua irmida por ir ao mosteiro das donas, ca nom 
queria que se fosse Gualaaz ante que o el visse, ca bem 
sabia que, pois se el partia dali, que nom tornaria i, ca lhe 
convenria e, tanto que fosse cavaleiro, entrar aas venturas 
do reino de Logres. E por esto lhe semelhava que o avia 
perdudo e que o nom veeria a meude, e temia, ca avia em 
ele mui grande sabor, porque era santa cousa e santa 
creatura. 
Quando eles cheguarom aa abadia, levarom Lançarot 
pera üa camara, e desarmarom-no. E vëo a ele a abadessa 
com quatro donas, e adusse consigo Gualaaz: tam fremosa 
cousa era, que maravilha era; e andava tam bem vesådo, 
que nom podia milhor. E a abadessa chorava muito com 
prazer. Tanto que vio Lançarot, disse-lhe: 
– Senhor, por Deos, fazede vós nosso novel cavaleiro, 
ca nom queriamos que seja cavaleiro por mão doutro; ca 
milhor cavaleiro ca vós nom no pode fazer cavaleiro; ca bem 
crcemos que ainda seja tam bõo que vos acharedes ende 
bem, e que será vossa honra de o fazerdes; e se vos el 
ende nom rogasse, vó-lo devíades de fazer, ca bem 
sabedes que é vosso filho. 
– Gualaaz – disse Lançalot – queredes vós seer 
cavaleiro? 
 
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El respondeo baldosamente: 
– Senhor, se prouvesse a vós, bem no queria seer, ca 
nom há cousa no mundo que tanto deseje como honra de 
cavalaria, e seer da vossa mão, ca doutra nom. no: queria 
seer, que tanto vos auço louvar e preçar de cavalaria, que 
nenhüu, a meu cuidar, nom podia seer covardo nem mao 
que vós fezéssedes cavaleiro. E esto é üa das cousas do 
mundo que me dá maior esperança de seer homem bõo e 
bõo cavaleiro. 
– Filho Gualaaz – disse Lançalot – stranhamente vos fez 
Deos fremosa creatura. Par Deos, se vós nom cuidades 
seer bõo homem ou bõo cavaleiro, assi Deos me conselhe, 
sobejo seria gram dapno e gram malaventura de nom 
seerdes bõo cavaleiro, ca sobejo sedes fremoso. 
E ele disse: 
– Se me Deos fez assi fremoso, dar-mi-á bondade, se 
lhe prouver; ca, em outra guisa, valeria pouco. E ele querrá 
que serei bõo e cousa que semelhe minha linhagem e 
aaqueles onde eu venho; e metuda ei minha sperança em 
Nosso Senhor. E por esto vos rogo que me façades 
cavaleiro. 
E Lançalot respondeo: 
– Filho, pois vos praz, eu vos farei cavaleiro. E Nosso 
Senhor, assi como a el aprouver e o poderá fazer, vos faça 
tam bõo cavaleiro como sodes fremoso. 
E o irmitam respondeo a esto: 
– Dom Lançalot, nom ajades dulda de Galaaz, ca eu vos 
digo que de bondade de cavalaria os milhores cavaleiros do 
mundo passará. 
E Lançalot respondeo: 
– Deos o faça assi como eu queria. 
Entam começarom todos a chorar com prazer quantos 
no lugar stavam. 
Augusto Magne (Ed.). A demanda do Santo Graal, 
Rio de Janeiro: INCM, 1944, vol. 3. 
_______________________________________________ 
 
Exercícios 
 
1. (UFPA) Leia a cantiga trovadoresca a seguir: 
 
Pois naci nunca vi Amor 
e ouço d´el sempre falar. 
Pero [Mas] sei que me quer matar 
mais rogarei a mia senhor 
que me mostr´ aquel matador 
ou que m´ampare del melhor. 
 
Pero nunca lh´eu fige [fiz] ren [nada] 
por que m´el aja del matar, 
mais quer´eu mia senhor rogar, 
polo [pelo] gran med´en que me ten, 
que me mostr´ aquel matador 
ou que m´ampare del melhor! 
[...] 
E pois Amor á [tem] sobre mi [mim] 
de me matar tan gran poder, 
e eu non o posso veer, 
rogarei mia senhor assi 
que mi-amostr´ aquel matador 
ou que m´ampare del melhor. 
Nuno Fernandes Torneol, Cancioneiro da Ajuda, n. 80. 
 
Acerca do poema, é correto afirmar: 
a) O amor é tratado como uma entidade autônoma de que 
o eu lírico busca defender-se. 
b) Os versos “mais rogarei a mia senhor/que me mostre 
aquel´matador” traduzem uma atitude de súplica 
respeitosa, que contraria os ideais do amor cortês. 
c) No verso “Pois naci nunca vi Amor” manifesta-se um eu 
lírico feminino, o que justifica a classificação do texto como 
cantiga de amigo. 
d) A métrica do poema, dado o uso predominante do 
octossílabo, não está de acordo com os padrões da cantiga 
de amor. 
e) A presença do refrão em dístico permite-nos classificar o 
poema como uma cantiga de amigo. 
 
2. (MACK-SP) 
 
Ai dona fea! foste-vos queixar 
porque vos nunca louv’en meu trobar 
mais ora quero fazer um cantar 
em que vos loarei toda via; 
e vedes como vos quero loar: 
dona fea, velha e sandia! 
 
Assinale a alternativa correta a respeito do trecho de João 
Garcia de Guilhade. 
a) É cantiga satírica 
b) Foi o primeiro documento escrito em língua portuguesa 
c) Trata-se de cantiga de amigo 
d) Foi escritra durante o Humanismo (1418-1527) 
e) Faz parte do Auto da Feira 
 
3. (VUNESP) 
 
Sedia la fremosa seu sirgo torcendo 
 
 Sedia la fremosa seu sirgo torcendo, 
 Sa voz manselinha fremoso dizendo 
 Cantigas d’amigo. 
 
 Sedia la fremosa seu sirgo lavrando,Sa voz manselinha fremoso cantando 
 Cantigas d’amigo. 
 
– Par Deus de Cruz, dona, sey que avedes 
 Amor muy coytado que tan ben dizedes 
 Cantigas d’amigo. 
 
 Par Deus de Cruz, dona, sey que andades 
 D’amor muy coytada que tan ben cantades 
 Cantigas d’amigo. 
 
– Avuytor comestes, que adevinhades, 
Estevão Colelho, Cantiga n. 321, Cancioneiro da Vaticana. 
 
Estava a formosa seu fio torcendo 
(paráfrase de Cleonice Berardinelli) 
 
 Estava a formosa seu fio torcendo, 
 Sua voz harmoniosa, suave dizendo 
 Cantigas de amigo. 
 
 Estava a formosa sentada, bordando, 
 Sua voz harmoniosa, suave cantando 
 Cantigas de amigo. 
 
– Por Jesus, senhora, vejo que sofreis 
 De amor infeliz, pois tão bem dizeis 
 Cantigas de amigo. 
 
 
 
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 Por Jesus, senhora, eu vejo que andais 
 Com penas de amor, pois tão bem cantais 
 Cantigas de amigo. 
 
– Abutre comeste, pois que adivinhais. 
Cleonice Berardinelli. Cantigas de trovadores medievais em português 
moderno. Rio de Janeiro: Org. Simões, 1953. p 58-59. 
 
O paralelismo é um dos recursos estilísticos mais comuns 
na poesia lírico-amorosa trovadoresca. Consiste na ênfase 
de uma ideia central, às vezes repetindo expressões 
idênticas, palavra por palavra, em séries de estrofes 
paralelas. A partir destas observações, releia o texto de 
Estevão Coelho e responda: 
a) O poema se estrutura em quantas séries de estrofes 
paralelas? Identifique-as. 
b) Que ideias centrais são enfatizadas em cada série 
paralelística? 
 
4. (UFPA) 
Soneto da contrição 
Eu te amo, Maria, te amo tanto 
Que meu peito me dói como em doença 
E quanto mais me seja a dor intensa 
Mais cresce na minha alma o teu encanto. 
 
Como a criança que vagueia o canto 
Ante o mistério da amplidão suspensa 
Meu coração é um vago de acalanto 
Berçando versos de saudade imensa. 
 
Não é maior o coração que a alma 
Nem melhor a presença que a saudade 
Só te amar é divino, e sentir calma... 
E é uma calma tão feita de humanidade 
Que tão mais te soubesse pertencida 
Menos seria eterno em tua vida. 
Vinicius de Moraes. Soneto da contrição. In: J. G. de Araújo Jorge (Org.). 
Antologia da nova poesia brasileira. 1 ed. Rio de Janeiro: Vecchi, 1948. 
 
Esse poema de Vinícius de Moraes situa a mulher num 
plano superior, deificado, e reserva ao sujeito poético 
masculino um papel submisso. Exatamente assim, no 
contexto medieval, surgia a mulher nas cantigas de: 
a) escárnio 
b) maldizer 
c) amigo e amor 
d) amigo 
e) amor 
 
5. (UNIFESP) 
Senhor feudal 
 
Se Pedro Segundo 
Vier aqui 
Com história 
Eu boto ele na cadeia. 
Oswald de Andrade 
 
O título do poema de Oswald remete o leitor à Idade Média. 
Nele, assim como nas cantigas de amor, a ideia de poder 
retoma o conceito de 
a) fé religiosa. 
b) relação de vassalagem. 
c) idealização do amor. 
d) saudade de um ente distante. 
e) igualdade entre as pessoas. 
6. (FAAP) Leia com atenção a seguinte estrofe, pertencente 
ao “Soneto de separação”, de Vinicius de Moraes: 
 
Fez-se de amigo próximo o distante 
Fez-se da vida uma aventura errante 
De repente, não mais que de repente. 
 
Tomemos a palavra AMIGO. Todos conhecem o sentido 
com que esta forma linguística é usualmente empregada no 
falar atual. Contudo na Idade Média, como se observa nas 
catingas medievais, a palavra “amigo” significou: 
a) colega 
b) companheiro 
c) namorado 
d) simpático 
e) acolhedor 
 
7. (MACK) O paralelismo, uma técnica de construção 
literária nas cantigas trovadorescas, consistiu em: 
a) unir duas ou mais cantigas com temas paralelos e recitá-
las em simultaneidade. 
b) um conjunto de estrofes ou um par de dísticos em que 
sempre se procura dizer a mesma ideia. 
c) apresentar as cantigas, nas festas da corte, sempre com 
o acompanhamento de um coro. 
d) reduzir todo o refrão a um dístico. 
e) pressupor que há sempre dois elementos paralelos que 
se digladiam verbalmente. 
 
8. (MACK) Assinale a afirmativa correta com relação ao 
Trovadorismo. 
a) Um dos temas mais explorados por esse estilo de época 
é a exaltação do amor sensual entre nobres e mulheres 
camponesas. 
b) Desenvolveu-se especialmente no século XV e refletiu a 
transição da cultura teocêntrica para a cultura 
antropocêntrica. 
c) Devido ao grande prestígio que teve durante toda a Idade 
Média, foi recuperado pelos poetas da Renascença, época 
em que alcançou níveis estéticos insuperáveis. 
d) Valorizou recursos formais que tiveram não apenas a 
função de produzir efeito musical, como também a função 
de facilitar a memorização, já que as composições eram 
transmitidas oralmente. 
e) Tanto no plano temático como no plano expressivo, esse 
estilo de época absorveu a influência dos padrões estéticos 
greco-romanos. 
 
9. (MACK) Assinale a alternativa incorreta a respeito do 
Trovadorismo em Portugal. 
a) Durante o Trovadorismo, ocorreu a separação entre 
poesia e a música. 
b) Muitas cantigas trovadorescas foram reunidas em livros 
ou coletâneas que receberam o nome de cancioneiros. 
c) Nas cantigas de amor, há o reflexo do relacionamento 
entre o senhor e vassalo na sociedade feudal: distância e 
extrema submissão. 
d) Nas cantigas de amigo, o trovador escreve o poema do 
ponto de vista feminino. 
e) A influência dos trovadores provençais é nítida nas 
cantigas de amor galego-portuguesas. 
 
 
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10. (ESPCEX) É correto afirmar sobre o Trovadorismo que 
a) os poemas são produzidos para ser encenados. 
b) as cantigas de escárnio e maldizer têm temáticas 
amorosas. 
c) nas cantigas de amigo, o eu lírico é sempre feminino. 
d) as cantigas de amigo têm estrutura poética complicada. 
e) as cantigas de amor são de origem nitidamente popular. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Gabarito 
 
1. a) 2. a) 
 
3. 
a) A cantiga reproduzida é estruturada em duas séries de 
estrofes paralelas. As duas primeiras estrofes (ou cobras) 
têm estrutura paralelística, assim como a terceira e a 
quarta. 
b) Na primeira série paralelística, o eu lírico enfoca uma 
bela mulher do povo que, ao costurar e bordar, canta 
cantigas de amigo. Na segunda série de estrofes paralelas, 
o eu lírico passa a ser o interlocutor dessa senhora e dela 
se apieda porque, ao perceber que canta cantigas de 
amigo, nota o sofrimento que carrega, sua coita d’amor. 
 
4. e) 5. b) 6. c) 
 
7. b) 8. d) 9. a) 
 
10. c)

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