Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Curso de Oftalmologia Veterinária MÓDULO III AFECÇÕES DA CÓRNEA Atenção: O material deste módulo está disponível apenas como parâmetro de estudos para este Programa de Educação Continuada. É proibida qualquer forma de comercialização do mesmo. Os créditos do conteúdo aqui contido são dados aos seus respectivos autores descritos na bibliografia consultada. 65 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores 66 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores MÓDULO III Afecções da córnea Capítulo 8 – Ceratites ulcerativas A córnea possui características peculiares com importância cirúrgica prática, o que inclui ser transparente, brilhante, lisa e avascular. A ceratite ulcerativa é uma das mais comuns e será estudada nesse capitulo. Úlceras em geral A ulceração corneal consiste na perda de uma ou mais camadas da córnea. É uma das doenças oculares mais comuns no cão. Úlceras superficiais não complicadas cicatrizam-se rapidamente, e com mínima formação de cicatriz, ao passo que, úlceras profundas complicadas podem prejudicar a visão devido à cicatrização corneal. A ceratite ulcerativa grave pode levar à perda do olho devido à endoftalmite, glaucoma, perfuração e Phthisis bulbi secundários. A úlcera de córnea pode ser classificada de acordo com vários quesitos, conforme a Tabela 02. TABELA 02. Classificação das ceratites conforme o agente, profundidade, grau de infecção e causa. Agente Profundidade Grau de infeção Causa Bacteriana Fúngica Viral Superficial Profunda ou estromal Descemetocele Perfuração Simples Complicada Traumática Química Indolente 67 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores As úlceras corneais superficiais não complicadas geralmente ocorrem secundárias a um trauma menor, autotraumatismo, xampus, irritação mecânica, anormalidades nos cílios, na estrutura e função palpebral e ceratoconjuntivite seca. Já as complicadas cicatrizam-se lentamente, e são chamadas também de persistentes ou indolentes, tendendo a recidivar. São reconhecidas pelas suas características, como borda elevada circundando o epitélio, que não está aderido ao estroma corneal. As estromais profundas podem ser divididas em progressivas e não progressivas, sendo que as não progressivas são manejadas medicamentosamente. Intervenção cirúrgica é indicada nas progressivas e descemetoceles, que são causadas geralmente por traumas, infecções, ceratoconjuntivite seca e processos degenerativos. A córnea normal é avascular. A penetração de neovasos e de imunoglobulinas na córnea é impedida pelo compacto tecido estromal. Estes aspectos tornam as reações patológicas corneais lentas, crônicas e de difícil tratamento. Alterações que seriam brandas em outros tecidos são significativas na córnea. A regeneração do epitélio ocorre por reepitelização, envolvendo mecanismos de migração, diferenciação celular e mitose. O estroma cicatriza-se mais lentamente por estar em um estado relativo de inatividade metabólica. Nas injúrias complicadas ou com grande perda de tecido estromal, ocorre cicatrização vascularizada, a inflamação celular é mais extensa e há invasão da área por vasos sanguíneos originados pelo plexo límbico. Durante a cicatrização corneal normal, proteases e colagenases são produzidas, auxiliando na remoção das células desvitalizadas e detritos da córnea. Células epiteliais corneais, fibroblastos, leucócitos polimorfonucleares e algumas bactérias produzem colagenases e proteases. A produção exacerbada pela combinação da produção endógena e de bactérias pode levar à progressão da úlcera, tornando-a refratária, até exposição da membrana da Descemet, conseqüente perfuração corneal e perda da função visual. Raças braquicefálicas são mais pré-dispostas a ulcerações corneais pela maior exposição ocular, pela presença de pregas cutâneas nasais, e pela lagoftalmia. Estas características tornam os olhos mais expostos a traumas acidentais. A primeira manifestação clínica do animal é dor e fotofobia, seguidas por blefarospasmo, lacrimejamento (exceto na ceratoconjuntivite seca), opacidades branco-azuladas (edema), secreção mucosa a mucopurulenta, hiperemia conjuntival, uveíte reflexa, miose e por fim neovascularização corneal. A neovascularização denota uma ulceração complicada. A dor é mais acentuada nas úlceras superficiais, pois nesta parte da córnea as terminações nociceptivas são mais numerosas. Durante a reepitelização pode ocorrer deposição de pigmentos de melanina em resposta não específica da córnea a uma reação inflamatória, causando perda parcial da transparência. O exame oftálmico de rotina é suficiente para estabelecer o diagnóstico e severidade da lesão. Um exame complementar como a biomicroscopia com lâmpada de fenda é apropriado para avaliação precisa da profundidade da lesão e condição da córnea, respectivamente. Na realização do teste de fluoresceína, o corante, com propriedade hidrofílica, não adere ao epitélio, que é lipofílico. Desta forma, qualquer solução de descontinuidade do epitélio que exponha o estroma naturalmente hidrofílico, vai promover a fixação do corante nesta camada (Figura 36). FIGURA 36: Representação esquemática do corante de fluoresceína em úlceras de córnea superficial e estromal. A - corte frontal. B – corte sagital. 68 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores Se a úlcera ultrapassar os limites do estroma e atingir as camadas mais profundas como a membrana de Descemet ou o endotélio. A lesão aparecerá como um halo, contornando todo o diâmetro da lesão, pois as camadas inferiores ao estroma também são lipofílicas, não fixando o corante, a exemplo do epitélio (Figura 37). FIGURA 37: Representação esquemática do corante de fluoresceína em úlceras que ultrapassaram os limites do estroma e atingiram a membrana de Descemet. A - corte frontal. B – corte sagital. Observe que o fundo da úlcera não retém o corante. A lesão profunda, observada após o teste de fluoresceína apresenta-se corada em tom verde e as bordas edemaciadas. A córnea, em geral, pode apresentar-se com uma névoa azulada, dificultando a visualização da câmara anterior, devido ao edema. Se a lesão não corar o centro, uma descemetocele se estabeleceu. O estroma foi totalmente danificado e a lesão apresenta a membrana de Descemet ao centro. Observa-se então uma área edematosa na córnea com centro claro. Se a membrana se tornar afilada ou aumentar a pressão intra-ocular pode formar uma “hérnia”, condição denominada descemetocele (Figura 38). 69 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores FIGURA 38: Esquema representativo da descemetocele. A - corte frontal. B – corte sagital. Distrofia corneal, “Flórida spots”, e perfuração corneal são comumente diagnosticadas erroneamente como ceratite ulcerativa ou descemetocele. A distrofia corneal é causada por distúrbios metabólicos, onde precipitados de cálcio, lipídeos e colesterol se depositam na córnea. Esta patogênese não cora com fluoresceína e não é tratável. A “Flórida spots” apresenta-se como pequenos pontos circulares de opacidades estromal, a causa é desconhecida e a lesão é negativa para fluoresceína. A perfuração corneal geralmente é diagnosticadaerroneamente como descemetocele, pois o humor aquoso tende a coagular e tamponar a perfuração, gerando uma aparência esbranquiçada e abaulada, característica da membrana de Descemet. Em injúrias maiores a íris prolapsa em direção ao local da perfuração. Após o diagnóstico, o tratamento pode ser dividido em três etapas conforme a necessidade e evolução. A primeira etapa consiste na determinação da etiologia e conseqüente correção ou eliminação, inclusive de infecção bacteriana. A segunda etapa consiste na prevenção de sua progressão, através de inibidores de proteases, e a terceira consiste em promover condições ótimas para a sua cicatrização. Seja através de medicamentos ou procedimentos cirúrgicos como a realização de flaps de terceira pálpebra, conjuntivais, transposição córneo-escleral, aplicação de membranas biológicas ou de adesivos cirúrgicos e suturas. É necessário também 70 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores 71 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores promover analgesia corneal, pois a superfície desta estrutura é rica em terminações nociceptivas. Atropina tópica a cada 08 ou 12 horas é indicada, pois espasmos na musculatura ciliar, seguido de miose, potencializam o reflexo de dor. A atropina relaxa a musculatura, promovendo alívio da dor, além de prevenir a formação de sinéquias anteriores devido à uveíte secundária ou reflexa. Seu uso é recomendado por um período de cinco dias. Inibidores de proteases e colagenases (enzimas que destroem colágeno) são bons coadjuvantes no tratamento, pois eliminam as enzimas que podem retardar o processo cicatricial, sendo os mais utilizados a acetilcisteína tópica, EDTA, soro e heparina, a cada 6-8 horas, ou 1-2 horas em úlceras progressivas. Recomenda-se a preparação de solução a 5% de acetilcisteína; para isso, podem-se usar substitutos da lágrima (Lacrima®) e aceticilsteína (Fluimucil® - 10 ou 20 % - solução para inalação) até atingir a concentração apropriada. O soro sangüíneo tem promovido bons resultados, é indicado a cada seis horas e a solução estéril precisa ser mantida em geladeira, sendo substituída a cada quatro dias. Na rotina do Hospital Veterinário – UFPR – Campus Palotina, tem-se usado o soro sangüíneo, com bons resultados. A antibioticoterapia deve ser realizada com antibióticos de largo espectro como tobramicina ou ciprofloxacina, 3-4 vezes ao dia; porém, quando a úlcera for progressiva, a terapia deve ser agressiva, com aplicações a cada 1-2 horas. Estudos recentes demonstraram que o Triticum vulgare (Bandvet® - FV), a cada 12 horas produz excelentes resultados. A regeneração da córnea somente continua otimizada se a alimentação com nutrientes completos for providenciada. Entre outros fatores, as vitaminas A e C têm papéis importantes no crescimento de ceratócitos, auxiliando no processo de cicatrização e remodelação da ferida, e podem ser usadas em casos mais graves. O sulfato de condroitina (Dunason colírio® - FH) a cada 8 horas fornece substrato para regeneração corneal e é medicamento apropriado para úlceras mais graves. Alguns fatores podem retardar a cicatrização, como irritantes mecânicos (pêlos e exsudatos), microrganismos, enzimas líticas, materiais com pH não 72 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores fisiológico, tensão osmótica, algumas medicações como corticóides e anestésicos tópicos. Os corticóides potencializam em até 14 vezes a colagenase, e diminuem o mecanismo de resistência contra infecções; porém, diminuem a vascularização e, portanto, o transporte de células inflamatórias e a atividade fibroblástica, inibindo a formação de cicatrizes hipertrofiadas, quelóide e edema. Rigorosos critérios devem ser adotados para o início da terapia com corticóides, sendo o principal, a total cicatrização da córnea. Medicamentos antiinflamatórios não esteróides, quando administrados topicamente, inibem a regeneração do estroma corneal, similarmente ao esteroidal tópico. A Tabela 3 apresenta abordagens terapêuticas para os diferentes estágios de desenvolvimento das úlceras corneais. TABELA 3 – Resumo das abordagens terapêuticas nos diversos tipos de úlceras. Úlcera Antibiótico Midriático Anticolagenolíticos Debridamento Recobrimento Superficial + + + + - Bordas desprendidas + + + +++ +/- Em evolução ++ ++ +++ -- +++ Descemetocele +++ ++ +++ -- +++ A terapia cirúrgica consiste basicamente em recobrir a úlcera, fornecendo boa proteção mecânica, subsídios tróficos e elementos de defesa para a córnea injuriada. Inúmeras são as técnicas utilizadas, entre elas os flaps conjuntivais, os flaps de terceira pálpebra, transposições córneo-esclerais, aplicação de membranas biológicas, suturas e aplicação de adesivos cirúrgicos. As suturas podem deformar a córnea por repuxá-la, mesmo em pequenas amplitudes. A aplicação de membranas biológicas como cápsula renal e membranas amnióticas conferem apenas proteção mecânica à úlcera. Já os adesivos cirúrgicos, se forem de origem biológica, como as colas de fibrina que possuem afinidade pelo colágeno, estimulam a migração de fibroblastos para o local da ferida. Os adesivos sintéticos como o cianoacrilato, possuem ação bactericida, porém são irritantes aos tecidos. O recobrimento com a membrana nictitante exige suturas ancoradas na pálpebra superior ou na conjuntiva bulbar dorsolateral. A sutura na membrana nictitante deve passar abaixo da cartilagem, porém não deve perfurar a conjuntiva para não expor o fio de sutura à córnea. Os fios são passados na pálpebra superior e protegidos com cáptons para não lesar a pele (Figura 39). Outra técnica consiste em ancorar a sutura na conjuntiva, fixando a membrana nictitante na conjuntiva bulbar dorsolateral, utilizando-se dois ou três pontos sob padrão Wolf. FIGURA 39: Representação esquemática da técnica do flap de terceira pálpebra. Nas duas técnicas o fio de sutura utilizado é o náilon 4-0 ou 5-0. As suturas são removidas 10-14 dias após. Enxertos conjuntivais proporcionam maior vantagem diante do recobrimento com membrana nictitante, já que pela conjuntiva, um grande número de vasos sangüíneos atinge a córnea, carreando nutrientes, células de defesa e imunoglobulinas. Existem várias técnicas de recobrimento, uma delas consiste em um flap pedicular (Figura 40). 73 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores FIGURA 40: Representação esquemática da técnica de flap de conjuntiva. A – corte frontal. B – corte sagital. O pedículo é preparado a partir da conjuntiva bulbar dorsolateral ou dorso medial. A dissecção tem início com pequena incisão conjuntival perpendicular ao limbo. A conjuntiva é divulsionada na direção da posição 12 horas. A úlcera é ocluída com o enxerto suturado firmemente ao estroma da córnea em torno do leito receptor, por meio de suturas simples interrompidas de náilon 8-0. Para recobrimento 360º, que é um procedimento tecnicamente mais fácil que o flap conjuntival, é necessário a dissecção perilimbar em 360º, tração da conjuntiva e sutura em bolsa de fumo. Nesta técnica, a córnea fica completamente recoberta (Figura 41). 74 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores FIGURA 41: Representação esquemática do recobrimento em 360º. A – sutura pré-aplicada. B – sutura concluída. Após três semanas,o pedículo conjuntival é seccionado. Se a córnea estiver negativa para fluoresceína, terapia com corticóide tópico pode ser acrescentada, reduzindo a neovascularização e formação de cicatrizes. Úlcera refratária (indolente) Também conhecida como Síndrome da erosão corneana superficial, úlcera indolente, ou “úlcera do Boxer”, esta é uma doença com predisposição racial, que acomete cães das raças Boxer, Corgi, Poodle, Samoieda e Golden Retriever. A lesão é decorrente da separação do epitélio corneano do estroma, e está associada a hemidesmossomos defeituosos, que provocam uma proliferação anormal de estroma, causando edema das células basais. Geralmente, a área afetada é de 3 a 4 mm e tem contorno irregular, causa dor e se cora com fluoresceína. O olho deve ser medicado com colírio antibiótico de amplo espectro, quatro vezes ao dia, por dois dias antes da cirurgia e dez dias após. Seu uso deve ser combinado com colírio de atropina 1%, três vezes ao dia, pelo mesmo período. O 75 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores tratamento clínico isolado não confere bons resultados. Recomenda-se procedimento cirúrgico conforme a técnica de ceratotomia em grade. Neste procedimento, o epitélio corneano é removido com auxílio de uma espátula para remoção de corpo estranho ou cotonete estéril. O epitélio é removido até que o epitélio normalmente aderente seja alcançado na borda da lesão (Figura 42). São feitas incisões paralelas no estroma, seguidas de outras perpendiculares, com uma agulha 13x0,4 e não excedendo 25% da profundidade do estroma (Figura 43). FIGURA 42: Representação esquemática da remoção do epitélio com cotonete estéril. A – corte sagital. B – corte frontal. O recobrimento da terceira pálpebra é recomendado logo após a ceratotomia em grade, como forma de reduzir vascularização posterior e eventual fibrose corneana, devendo ser mantido por 21 dias, juntamente com a medicação tópica. 76 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores FIGURA 43: Representação esquemática da técnica de ceratotomia em grade para úlcera indolente. Ulceras por álcali As úlceras causadas por álcali são mais comuns em filhotes pelo comportamento curioso. Freqüentemente os agentes envolvidos são produtos de limpeza. Clinicamente observa-se a córnea azulada, blefarospasmos e fotofobia. A córnea, quando submetida ao teste da fluoresceína, cora-se completamente. Queimaduras químicas na córnea provocam destruição limbal e impedem a reepitelização. Nestas situações ocorre perfuração ou conjuntivalização e perda permanente da visão. Estudos experimentais recentes revelaram que o transplante limbal (usando o olho contralateral como doador) fornece vascularização à córnea e impedem a perfuração ou conjuntivalização quando for associado à terapia tópica adequada para úlcera de córnea. Preconiza-se limpeza copiosa do olho, antibioticoterapia a cada 2 horas (colírio de tobramicina ou ciprofloxacina) e atropina colírio 1% a cada 12 horas. No pós-operatório mantém-se colar elisabetano por cerca de 10 dias. 77 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores Foi realizado na UFPR – Campus Palotina, transplante limbal em um caso clínico de queimadura química na córnea de um cão, com resultados excelentes. A Figura 44 mostra a técnica de transplante de limbo em um paciente com queimadura química. FIGURA 44: A - paciente canino com úlcera de córnea por queimadura química. B – pós-cirúrgico imediato após transplante de dois fragmentos de limbo do olho contralateral. C e D – observe neovascularização após 15 dias. Capítulo 9 – Outras ceratopatias Ceratite superficial crônica - Pannus É caracterizado pelo crescimento de um tecido fibrovascular, semelhante a tecido de granulação, de coloração rósea e pigmentação escura, sobre a conjuntiva, limbo e córnea, na região ventrotemporal. As raças mais predispostas a esta afecção são o Pastor Alemão, Greyhound e o Husky Siberiano, com idade média entre 3 e 5 anos de idade. A causa é imunomediada, mas fatores como exposição excessiva a 78 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores 79 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores raios ultravioletas da luz solar e poluentes do ar podem deflagrar este tipo de reação. O diagnóstico é baseado nas características das lesões e análise citopatológica (infiltrado difuso de linfócitos e plasmócitos). Geralmente a lesão é bilateral. Recomenda-se o tratamento com imunomoduladores como a ciclosporina, a cada 8h, associado à glicocorticóide tópico a cada 8h. Geralmente pode-se reduzir freqüência de ambos num período de um a três meses. O tratamento é contínuo. Em casos mais graves e com invasão estromal, preconiza-se a ceratectomia superficial associada a técnicas de proteção e suporte. Os fatores agravantes também deverão ser evitados. Distrofia corneal O termo distrofia corresponde a uma condição de hereditariedade, embora não esteja presente necessariamente no nascimento. Afeta o epitélio, estroma, membrana de Descemet e endotélio e pode ser progressiva e bilateral. A distrofia corneana é incomum e ocorre em diversas raças. Já a distrofia endotelial, em sua maioria, é progressiva e permanente, acometendo, sobretudo, as raças Boxer, Dachshund e Poodle. Pode ser observada opacidade branco-acinzentada, prateada ou cristalina, no estroma corneano. O tratamento é basicamente cirúrgico, através da ceratectomia, que pode ser parcial ou completa. A incisão deve ser realizada no limbo, e a profundidade da mesma é obtida com uso de um bisturi adequado. Com auxílio de um cautério, contém-se a hemorragia decorrente da alta vascularização. Separam-se as lamelas corneanas com um instrumento para dissecção, também chamado de elevador corneano de Martinez. O estroma deve ser removido em uma única porção em direção ao limbo, que é incisado com uma tesoura. Como terapia de suporte recomenda-se o recobrimento de terceira pálpebra e uso de antibióticos e atropina, como já descrito anteriormente. 80 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores Ceratoconjuntivite seca (CCS) É a inflamação da córnea e conjuntivas causada pela baixa produção da fase aquosa da lágrima. A deficiência da fase aquosa provoca irritação mecânica contínua e predispõe à infecção bacteriana secundária. A lágrima é composta por três fases. A mais externa é a lipídica, produzida pelas glândulas tarsais e tem como função impedir a evaporação da fase aquosa. A fase média é a mucosa, produzida pelas células caliciformes e tem como função promover a aderência entre as duas outras fases. A aquosa é a que está em contato direto com a córnea e é produzida pelas glândulas lacrimais principais (60 a 70%) e glândula da terceira pálpebra (30 a 40%). A causa mais comum é a imunomediada, representando cerca de 80% de todos os casos. Seguem as causas iatrogênicas por remoção da glândula da terceira pálpebra ou aplicações de medicamentos que podem causar toxidade ao tecido glandular (sulfas por longos períodos): aplasia, hipoplasia ou atrofia da glândula, doenças sistêmicas como cinomose e causas neurogênicas como lesões nas vias aferentes para o estímulo à produção de lágrima. As raças Pinscher,Lhasa apso, Shih tzu, Bulldog inglês, Cocker, entre outras, são mais predispostas. Os sinais clínicos dependem da gravidade do caso. Nos casos agudos, observa-se falta de brilho na córnea, secreção, blefarospasmo com ou sem úlcera de córnea. Em casos mais crônicos, observa-se opacidade, pigmentação, neovascularização, superfície corneal irregular, secreção e úlcera de córnea. Geralmente a secreção ocular é espessa. O diagnóstico é baseado no histórico e sinais clínicos e pela realização do exame oftalmológico completo, incluindo teste de Shirmer. Consideram-se valores acima de 25 mm como excesso de produção, entre 15 e 25 mm como normal, entre 05 e 15 mm estão os animais com suspeitas de olho seco, entre 01 e 05 mm confirma-se a afecção e 0 mm como ceratoconjuntivite seca absoluta. Em animais com triquíase proveniente do excesso de dobras nasais, como ocorre nos Pequineses e Shih tzu, os pêlos que tocam a córnea podem agir como sifões, removendo lágrima da córnea e predispondo à doença. 81 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores Inicialmente recomenda-se tratar a causa gênica quando esta for identificada. Atualmente os medicamentos mais usados para o tratamento desta afecção são a ciclosporina (imunomodulador e lacrimomimético), antiinflamatórios esteroidais, antibióticos e substitutos da lágrima. Todos estes medicamentos são usados topicamente. Técnicas cirúrgicas como transposição do ducto parotídeo podem ser executadas em casos onde o paciente não responde à terapia convencional. A técnica está associada a complicações em longo prazo como blefarite, desconforto, deposição de sais de cálcio na córnea e alteração da microbiota. A ciclosporina (pomada ou colírio) de 1 a 2% deve ser prescrita de 2 a 3 vezes por dia. Dependendo da severidade do caso, esta freqüência pode ser reduzida para doses de manutenção em até uma vez a cada 24 horas. Esta redução é baseada em consultas periódicas e avaliação da produção lacrimal. Este fármaco, por ser imunomodulador, tem seu uso garantido nas CCS, pois a grande maioria é de causas imunomediadas. Alem desta função, o medicamento tem ação lacrimomimética. Colírios com glicocorticóides, na ausência de úlceras de córnea, podem ser usados em associação com a ciclosporina, com base na sua função imunossupressora. Não deve ser usado como terapia de manutenção, pois sua absorção pode causar efeitos colaterais importantes. Colírios de antibióticos, em caso de infecção como úlceras de córnea, devem ser prescritos a cada 6 horas, até a cicatrização da lesão. A tobramicina ou ciprofloxacina promovem bons resultados. Substitutos da lágrima (demulcentes oftálmicos) podem ser usados até a ciclosporina promover incremento na produção lacrimal, o que pode levar até 30 dias. Seu uso isolado não estimula a produção lacrimal e exige administração muito freqüente (a cada 2 horas). O Lácrima plus®, quando associado à acetilcisteína (Flui mucil® ampola 20%), na proporção 3:1 respectivamente, além de inibir a colagenase produzida por algumas cepas de bactérias, auxilia na dissolução da secreção purulenta, o que, na CCS costuma ser bastante espessa. Demulcentes como o Refresh gel® - FH aderem melhor à superfície ocular e podem ser usados a cada 8h. 82 Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores Dermóide Esta afecção caracteriza-se por um fragmento de pele, histologicamente normal, presente sobre a córnea, sobre a conjuntiva e podendo estender-se para as pálpebras. A condição é mais freqüente nas raças Pastor Alemão, São Bernardo, Dálmata e Dachshund. Não causa dor ou desconforto, mas pode predispor à infecção da córnea e conjuntiva. O tratamento é essencialmente cirúrgico, através de ceratectomia superficial. Neste procedimento o dermóide e as camadas superficiais da córnea e conjuntiva são removidos. Em casos onde a profundidade do dermóide exigir remoção de pelo menos um terço da espessura corneal, recomenda-se flap de conjuntiva. No pós- operatório deve-se prescrever tratamento para úlcera de córnea e incentivar o uso de colar elisabetano. O procedimento deve ser feito com boas fontes de iluminação e magnificação. Seqüestro corneal (cornea nigrum) Também conhecida como necrose corneana felina, é uma doença que não tem a etiologia conhecida, porém ocorre geralmente após doença inflamatória ou ulcerativa crônica. Herpesvirus felis pode ser uma causa freqüente dessa ceratite inicial e passos apropriados são tomados para tratar essa infecção, previamente ao tratamento do processo necrótico. Os principais sinais clínicos são lesão corneana focal e preto-amarronzada, córnea necrosada e não pigmentada, vascularização corneana, epífora e blefarospasmo. O diagnóstico é feito através da observação da lesão, que é característica. É comum deposição de pigmentos e neovascularização acentuada. O tratamento indicado é a remoção cirúrgica do tecido necrótico, através de ceratectomia superficial associada a enxerto conjuntival pediculado ou recobrimento com terceira pálpebra, em casos onde a remoção não envolveu camadas mais profundas da córnea. ----------------FIM DO MÓDULO III-------------- MÓDULO III Afecções da córnea Capítulo 8 – Ceratites ulcerativas Capítulo 9 – Outras ceratopatias
Compartilhar