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PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA Prof.a Tania Beatriz Iwaszko Marques PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR Marília/SP 2023 “A Faculdade Católica Paulista tem por missão exercer uma ação integrada de suas atividades educacionais, visando à geração, sistematização e disseminação do conhecimento, para formar profissionais empreendedores que promovam a transformação e o desenvolvimento social, econômico e cultural da comunidade em que está inserida. Missão da Faculdade Católica Paulista Av. Cristo Rei, 305 - Banzato, CEP 17515-200 Marília - São Paulo. www.uca.edu.br Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem autorização. Todos os gráficos, tabelas e elementos são creditados à autoria, salvo quando indicada a referência, sendo de inteira responsabilidade da autoria a emissão de conceitos. Diretor Geral | Valdir Carrenho Junior PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 5 SUMÁRIO CAPÍTULO 01 CAPÍTULO 02 CAPÍTULO 03 CAPÍTULO 04 CAPÍTULO 05 CAPÍTULO 06 CAPÍTULO 07 CAPÍTULO 08 CAPÍTULO 09 CAPÍTULO 10 CAPÍTULO 11 CAPÍTULO 12 08 17 24 33 41 47 56 68 75 83 93 103 INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DESENVOLVIMENTO MÉTODOS DE PESQUISA DO DESENVOLVIMENTO DESENVOLVIMENTO PSICOSSEXUAL DESENVOLVIMENTO PSICOSSOCIAL I: LACTÂNCIA, INFÂNCIA PRECOCE, IDADE DO JOGO, IDADE ESCOLAR DESENVOLVIMENTO PSICOSSOCIAL II: ADOLESCÊNCIA, INÍCIO DA VIDA ADULTA DESENVOLVIMENTO PSICOSSOCIAL III: IDADE ADULTA, VELHICE, VELHICE AVANÇADA DESENVOLVIMENTO AFETIVO-EMOCIONAL DESENVOLVIMENTO COGNITIVO I: CONCEITOS BÁSICOS DESENVOLVIMENTO COGNITIVO II: ESTÁDIOS DO DESENVOLVIMENTO; ESTÁDIO SENSÓRIO MOTOR DESENVOLVIMENTO COGNITIVO III: ESTÁDIO PRÉ-OPERATÓRIO, ESTÁDIO OPERATÓRIO CONCRETO, ESTÁDIO OPERATÓRIO FORMAL DESENVOLVIMENTO MORAL DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 6 SUMÁRIO CAPÍTULO 13 CAPÍTULO 14 CAPÍTULO 15 112 125 133 DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR I: PRIMEIRA INFÂNCIA DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR II: SEGUNDA INFÂNCIA DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR III: TERCEIRA INFÂNCIA PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 7 INTRODUÇÃO O bebê humano nasce extremamente frágil, sem nenhuma condição de sobrevivência, se deixado à própria sorte. Ele deverá passar por um longo processo de desenvolvimento até que adquira habilidades físicas que lhe permitam ter autonomia e agilidade em seus movimentos. Do ponto de vista psicológico, esse processo dura toda a vida, pois sempre há aspectos a serem aprendidos e modificados. Neste livro, serão estudados vários aspectos do desenvolvimento humano e, para introduzir essa temática, no capítulo 1, você conhecerá alguns aspectos históricos e no capítulo 2 algumas metodologias utilizadas nas pesquisas sobre psicologia do desenvolvimento. A partir do capítulo 3, você estudará vários aspectos do desenvolvimento humano, começando pela teoria do desenvolvimento psicossexual de acordo com a psicanálise. Nos capítulos 4, 5 e 6 estudará a teoria do desenvolvimento psicossocial de Erik Erikson, que estuda todo o ciclo vital, através de nove diferentes fases desde o nascimento até a velhice avançada. No capítulo 7, você conhecerá a importância do desenvolvimento afetivo-emocional desde os primórdios da vida. Os capítulos 8, 9 e 10 apresentam o processo de desenvolvimento cognitivo a partir da teoria de Piaget. Você conhecerá os principais conceitos bem como os quatro diferentes estádios, que são o sensório-motor, o pré-operatório, o operatório concreto e o operatório formal. No capítulo 11, o foco do estudo é o desenvolvimento moral e no 12 é o desenvolvimento da linguagem, duas áreas exclusivas dos seres humanos. Os capítulos 13, 14 e 15 fecham o livro com o estudo do desenvolvimento psicomotor na primeira, na segunda e na terceira infâncias. Espero que você aproveite a leitura deste livro e que os demais materiais indicados possam auxiliar no aprofundamento desses temas. Bons estudos! PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 8 CAPÍTULO 1 INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DESENVOLVIMENTO Introdução A psicologia do desenvolvimento pode ser definida como a área da psicologia que se interessa pelo estudo do “desenvolvimento do ser humano em todos os seus aspectos: físico-motor, intelectual, afetivo-emocional e social – desde o nascimento até a idade adulta” (BOCK; TEIXEIRA; FURTADO, 1999, p. 97). Para quem trabalha com pessoas, é necessário conhecer como elas se desenvolvem e como diferentes fatores afetam esse processo. Neste capítulo, você encontrará uma introdução ao estudo da psicologia do desenvolvimento. Iniciaremos por alguns aspectos históricos, conhecendo os primeiros estudos, as principais correntes da psicologia do desenvolvimento, uma breve reflexão sobre o papel da hereditariedade e do meio no estudo do desenvolvimento humano. Conhecerá, também, as nomenclaturas convencionalmente utilizadas para designar as diferentes etapas cronológicas ao longo da vida, já que elas são necessárias para acompanhar o foco de estudo deste livro que é o desenvolvimento humano. Aspectos históricos Ao contrário da aprendizagem, que já despertava o interesse de filósofos da Antiguidade e da Idade Média (DELVAL, 2002), o desenvolvimento humano demorou a se tornar um tema de interesse. Philippe Ariès (1986) chama a atenção para o fato de que a criança era considerada como um adulto em miniatura, o que é possível verificar pela representação de crianças em pinturas renascentistas, como a apresentada na capa de seu livro História social da criança e da família, que você vê na Figura 1. PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 9 Figura 1: Capa de Livro de Ariès. Fonte: A autora ISTO ESTÁ NA REDE Vídeo Poder de vida ou morte sobre os filhos? Disponível em: https://youtube.com/shorts/loKs0zX8xaA?feature=share3 Primeiros estudos Apenas no século XVIII começam a surgir escritos sistemáticos sobre o desenvolvimento humano. De acordo com o psicólogo espanhol Juan Delval (2002, p. 36), os primeiros trabalhos sobre o desenvolvimento da criança foram “biografias ou estudos monográficos de um único sujeito, tomando observações sistemáticas ao longo de seu desenvolvimento”. Considera-se o primeiro trabalho desse tipo o do filósofo alemão Dietrich Tiedmann (1748-1803) que você pode ver na Figura 2. Durante dois anos e meio, o filósofo observou e fez anotações sobre o desenvolvimento de seu filho. Sua hipótese era de que as características humanas são adquiridas mediante a experiência (DELVAL, 2002). Figura 2. Filósofo alemão Dietrich Tiedmann Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Dietrich_Tiedemann https://youtube.com/shorts/loKs0zX8xaA?feature=share3 https://pt.wikipedia.org/wiki/Dietrich_Tiedemann PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 10 O naturalista inglês Charles Darwin (1809-1882), apresentado na Figura 3, que é conhecido por causa da sua teoria sobre A origem das espécies, também fez anotações a respeito das observações sobre o desenvolvimento de um de seus filhos (DELVAL, 2002). Figura 3. Charles Darwin Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Charles_Darwin O fisiologista inglês Wiliam Preyer (1841-1897), apresentado na Figura 4, também fez observações sobre o desenvolvimento de um filho.Durante três anos fez observações e anotações sobre seu filho ao menos três vezes por dia (DELVAL, 2002). Figura 4. William Preyer Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/William_Preyer Ângela Maria Brasil Biaggio (1940-2003), de quem tive a honra de ser aluna, foi uma importante pesquisadora brasileira sobre o desenvolvimento humano, mais https://pt.wikipedia.org/wiki/Charles_Darwin https://pt.wikipedia.org/wiki/William_Preyer PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 11 especificamente sobre o desenvolvimento moral, especialmente a partir da obra de Kohlberg. Sua foto pode ser vista na Figura 5. Figura 5: Ângela Biaggio Fonte: https://www.scielo.br/j/pcp/a/LxLhtPjQBMxhxzNrDLtYMJF/?lang=pt# Seu livro Psicologia do desenvolvimento, cuja capa você pode ver na Figura 6, tem 24 edições e foi utilizado na formação de várias gerações de psicólogos e educadores. Figura 6. Capa de livro de Biaggio Fonte: A autora. Biaggio (1985) faz uma síntese na forma de um quadro da evolução das teorias do desenvolvimento no século XX, por meio da relação entre conteúdo, metodologia e teoria. Esse quadro pode ser analisado na Figura 7. https://www.scielo.br/j/pcp/a/LxLhtPjQBMxhxzNrDLtYMJF/?lang=pt PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 12 Figura 7. Evolução da psicologia do desenvolvimento Fonte: BIAGGIO (1985, p. 27). Arnold Gesell (1880-1961) foi um psicólogo, pediatra e professor alemão que estudou o desenvolvimento humano, interpretando as mudanças por meio de um inevitável processo de maturação, decorrente da passagem do tempo. Sua metodologia era descritiva, pois se dedicava à descrição dos comportamentos de milhares de crianças observadas em cada faixa etária. Na Figura 8, você pode ver Arnold Gesell realizando uma experiência com um bebê. Figura 8. Arnold Gesell Fonte: https://www.gesell-yale.org/pages/dr-arnold-gesell O educador e psicólogo americano, Leonard Carmichael (1898-1973), que pode ser visto na Figura 9, utilizava a metodologia correlacional, que se baseia na busca em “estabelecer relações entre variáveis” (BIAGGIO, 1985, p. 28). https://www.gesell-yale.org/pages/dr-arnold-gesell PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 13 Figura 9. Leonard Carmichael Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/Leonard_Carmichael A fase experimental tem o americano Albert Bandura (1925-2021), cuja foto você pode ver na Figura 10, como um dos seus principais representantes. A metodologia experimental se baseia em estudos realizados em laboratório, com controle de variáveis, tentando evidenciar a mudança provocada em uma variável dependente, a partir da manipulação de uma variável independente. Figura 10. Albert Bandura Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/Albert_Bandura Hereditariedade e meio Basicamente, o que diferencia uma teoria psicológica das outras está na importância atribuída ao papel da hereditariedade e do meio na causa dos comportamentos e na formação da personalidade. A explicação pode estar em um dos polos ou em diferentes https://en.wikipedia.org/wiki/Leonard_Carmichael https://en.wikipedia.org/wiki/Albert_Bandura PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 14 relações entre os dois elementos ou mesmo na síntese entre vários fatores, incluindo esses dois e outros. Os estudos da teoria da aprendizagem social centram seu foco nos aspectos ambientais, por meio da pesquisa experimental, que, como você já leu, manipula a variável independente para produzir variações nas variáveis dependentes. As demais teorias, que serão estudadas neste livro, Psicologia Genética, Psicanálise, Desenvolvimento Psicossocial – atribuem a causalidade do processo de desenvolvimento à síntese entre hereditariedade e meio, incluindo, inclusive, outros fatores (CÓRIA-SABINI, 1993). J. B. Watson, criador da teoria behaviorista, realizou, em 1913, pesquisas que ficaram conhecidas como exemplos de maus tratos aos sujeitos. Ele tenta provar o papel do meio na origem de fobias. ISTO ESTÁ NA REDE Vídeo O pequeno Albert Disponível em: https://www.google.com/search?q=watson+behaviorismo+peqeuno+al bert&client=firefox-b-d&sxsrf=APwXEdfXkM1rTxHU01xPFSbG2FuSyHCxLA%3A1683593 763480&ei=I5pZZLzvHMqrqtsPm9GJwA4&ved=0ahUKEwj8jN_Bg-f-AhXKlWoFHZtoAug Q4dUDCA4&uact=5&oq=watson+behaviorismo+peqeuno+albert&gs_lcp=Cgxnd3Mtd2l6 LXNlcnAQAzIHCCEQoAEQCjIICCEQFhAeEB06CggAEEcQ1gQQsAM6CggAEIoFELADEEM 6DwguEIoFEMgDELADEEMYAToSCC4Q1AIQigUQyAMQsAMQQxgBOhIILhCKBRDUAhDI AxCwAxBDGAE6BQgAEIAEOgYIABAWEB46CAgAEBYQHhAPOgUIIRCgAUoECEEYAFDSD 1jVImDUJWgBcAF4AIABzwKIAa4ekgEGMi0xMC40mAEAoAEByAEUwAEB2gEGCAEQAR gI&sclient=gws-wiz-serp#fpstate=ive&vld=cid:48efe75c,vid:kIZBQgMCEyk Principais correntes da psicologia do desenvolvimento Existem muitas teorias e, de acordo com Biaggio (1985), as principais teorias do desenvolvimento são a teoria do desenvolvimento intelectual de Piaget, a psicanálise e a teoria da aprendizagem social. Neste livro, as duas primeiras serão abordadas em capítulos específicos. A teoria da aprendizagem social não fará pare do escopo desta obra, pois, apesar da sua importância no estudo do comportamento humano, não se debruça sobre o desenvolvimento propriamente dito, entendo-o como aprendizagem. A teoria do desenvolvimento psicossocial também será analisada neste livro. No quadro da figura 11, você vê uma síntese dessas teorias. PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 15 Escola Local Objeto de estudo Psicologia Genética Suíça Construção das estruturas cogntiivas/ Desenvolvimento cognitivo Psicanálise Áustria Inconsciente / Desenvolvimento psicossexual Aprendizagem Social Estados Unidos Comportamento Desenvolvimento Psicossocial Estados Unidos Fases do ciclo vital Figura 11: Algumas teorias da psicologia do desenvolvimento Fonte: Da autora. Classificações cronológicas convencionais Ao longo dos capítulos deste livro, você verá que alguns termos se repetirão, com relação às idades cronológicas. Portanto, anote estes termos. Da fecundação até oito semanas de vida embrionária, o nome do ser humano em formação é embrião. Feto é o nome que se dá ao bebê em formação, após oito semanas de vida embrionária até o fim da gestação. Recém-nascido é o nome desde o nascimento aos 28 dias. Bebê é a criança dos 28 dias até dois anos de idade. Também chamado de lactente. Criança é o termo usado genericamente para todas as pessoas até 12 anos incompletos, mas mais especificamente para maiores de dois anos até 12 incompletos (MICHAELIS, s.d.). A adolescência vai dos 12 anos até 18 anos incompletos e a puberdade se caracteriza pelo aparecimento dos caracteres sexuais secundários. Os caracteres sexuais primários são os presentes no nascimento (OUTEIRAL, 1994). Na Figura 12, você tem um quadro mais completo, com classificações cronológicas. Figura 12. Classificações cronológicas convencionais Fonte: GALLAHUE; OZMUN: GOODWAY (2013 p. 28) PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 16 Estas são algumas divisões utilizadas. Ao longo deste livro, você conhecerá outras divisões, de acordo com as teorias e a área do desenvolvimento estudada. Conclusão Neste capítulo, você teve contato com algumas informações relevantes para iniciar o estudo do desenvolvimento humano. Você conheceu alguns aspectos históricos, tais como os primeiros estudos, o papel da hereditariedade e do meio na explicação sobre como ocorre o desenvolvimento humano e algumas divisões cronológicas usuais. No próximo capítulo, vocêestudará algumas das principais metodologias de pesquisa no estudo do desenvolvimento humano. PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 17 CAPÍTULO 2 MÉTODOS DE PESQUISA DO DESENVOLVIMENTO Introdução É comum observarmos os fenômenos que acontecem à nossa volta e tentarmos dar explicações. As explicações são buscadas em eventos que estiveram próximos no tempo ou no espaço. Algumas vezes, esses eventos podem ter relação entre si e outras vezes não. Os eventos estarem próximos pode ser uma casualidade e as explicações que daí resultam podem gerar comportamentos supersticiosos. Por exemplo, se seu time ganhar quando você estiver usando a camiseta do time, pode atribuir a vitória à sua roupa. Outro comportamento supersticioso é acreditar que ocorram mais partos na lua cheia. A ciência, ao contrário da superstição, utiliza métodos para verificar se, de fato, há uma relação de causa e efeito entre diferentes variáveis e como acontecem os fenômenos. Existem muitos diferentes métodos e instrumentos para realizar pesquisas nas mais diversas áreas do conhecimento humano. A metodologia da pesquisa é uma área muito ampla e, neste capítulo, você conhecerá alguns dos principais métodos que são utilizados nas pesquisas sobre desenvolvimento humano, cada um deles com suas vantagens e desvantagens. Métodos de pesquisa no estudo do desenvolvimento humano Ao serem questionadas sobre o melhor método de pesquisa no estudo do desenvolvimento e do comportamento humano, Inhelder, Bovet e Sinclair (1977, p. 30) afirmaram que “um método não é bom ou mau em si. Ele não pode ser julgado senão em função dos problemas ao qual é chamado a resolver e que, por sua vez, são orientados por perspectivas epistemológicas mais ou menos explícitas.” Ao ler uma pesquisa, pense sempre nisso. Identifique o problema a ser respondido e então pense se a metodologia utilizada pode ou não responder à pergunta proposta. Por exemplo, se você quer saber o que as crianças pensam sobre a escola, deve perguntar a elas e não aos professores. Se perguntar aos professores, será uma outra pesquisa. Se você quiser estudar o efeito do uso do computador sobre a aprendizagem da leitura em crianças em idade de alfabetização, não basta você acompanhar algumas PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 18 crianças que usam o computador, pois muitas variáveis afetam a aprendizagem das crianças, já que o uso do computador é apenas uma parte da sua vida. Na Figura 1, você pode ver a apresentação sintética de vários métodos de pesquisa no estudo do desenvolvimento humano, cada um deles com suas vantagens e seus inconvenientes e limitações e cada um deles adequado para um tipo ou outro de resposta que se está buscando. Aqui não se esgotam as metodologias de pesquisa nesta área. Para outras áreas, existem outras metodologias de pesquisa. Neste livro, você estudará várias áreas do desenvolvimento e várias teorias, sendo que cada uma delas utilizou ferramentas apropriadas para encontrar suas respostas. Métodos de pesquisa: observação pura ou natural O primeiro método de pesquisa apresentado na Figura 1 é a observação pura ou natural, que é aquela metodologia utilizada nos primeiros estudos, sobre os quais você já leu no capítulo 1. Ela é feita no ambiente natural da criança, podendo ser na própria casa, na própria escola ou em uma praça onde costuma brincar. Não há intervenção do pesquisador que só observa e anota o que lhe chama a atenção, porém, sem um foco completamente delimitado. Na observação natural ou pura você observa e anota o que lhe chamar a atenção, sem uma definição prévia do que observar. A observação pura pode fornecer dados muito relevantes sobre o comportamento da criança em seu ambiente natural, o que certamente é mais interessante do que em ambiente de laboratório. Porém, algumas condutas podem acontecer com uma baixa frequência e exigir um tempo muito longo de observação. Figura 1. Métodos de pesquisa no estudo do desenvolvimento Fonte: DELVAL (2002, p. 50). PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 19 Como exemplo da dificuldade desse tipo de observação, recorro a um exemplo que ocorreu ao longo do desenvolvimento de meu filho Bruno, em que pude observar um único exemplo de imitação diferida. Porque tive que presenciar a cena original e a cena que estava sendo imitada, situação que ocorreu com intervalo de horas. Se presenciasse apenas uma das cenas não teria condições de saber se uma cena representava a imitação da outra. Imitação diferida é uma imitação que ocorre sem a presença do modelo imitado e será analisada em um dos capítulos dedicados ao estudo do desenvolvimento cognitivo. Métodos de pesquisa: observação estruturada A observação estruturada, ao contrário da observação natural ou pura, é realizada em condições definidas. Em geral, ocorre em laboratório, ou seja, em um ambiente que foi planejado e preparado para a atividade, e previamente são estabelecidos parâmetros para a observação. Por ser organizada quanto aos padrões de conduta a serem observados e quanto ao tempo, o pesquisador pode centrar sua atenção no comportamento que lhe interessa e pode fazer comparações entre sujeitos ou entre o sujeito e ele próprio em diferentes momentos. Um exemplo de observação estruturada consiste em verificar se uma criança deixada sozinha em uma sala com um pote de doces mexe nele ou não e, se o fizer, quanto tempo demora para fazer isso. Como a criança não está em seu próprio ambiente natural, o seu comportamento pode não corresponder ao que faria, o que consiste em uma das limitações do método. Além disso, esse tipo de estudo não abre muitas possibilidades para o aparecimento de novidades, pois o pesquisador está focado em um comportamento específico. ISTO ESTÁ NA REDE O psicólogo Walter Mischel realizou uma série de estudos sobre autocontrole, utilizando o que ficou conhecido como Teste do Marshmallow. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=OKNu1qjgXaA Métodos de pesquisa: questionários e testes Os questionários e testes são materiais com perguntas fixas que são aplicados de forma padronizada a muitos sujeitos. Uma de suas vantagens é que a coleta de dados https://www.youtube.com/watch?v=OKNu1qjgXaA PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 20 é fácil, não demandando muito treinamento de quem os aplica. A aplicação é rápida, porque pode ser aplicada simultaneamente a várias pessoas e permite a comparação de respostas entre sujeitos. Por exemplo, você pode pedir o auxílio de professores de uma escola e os instruir a aplicar um questionário aos seus estudantes no período de aula. Assim, em pouco tempo você pode obter as respostas ao questionário de alunos de uma escola inteira. Porém, só se pode obter o resultado e não o processo. As perguntas são previamente organizadas e não há lugar para o surgimento de novidades. Um exemplo de testes padronizados são os testes de QI (Quociente Intelectual), que mede a idade mental em relação à idade cronológica. A famosa escala dos franceses Binet e Simon foi criada porque o governo francês queria entender os estudantes “com dificuldade de aprendizagem na escola da rede pública francesa no ano de 1905. Essa escala mensurava a inteligência de acordo com a idade do aprendiz, ou melhor, idade mental.” (SANTOS, 2008, online). ISTO ESTÁ NA REDE Os primórdios dos testes psicológicos de inteligência são apresentados pelo psicólogo Tiago André. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=rEQxieZTVok Na psicologia, existe uma área específica que trabalha com testes e questionários padronizados, chamadade psicometria. Psicometria é o “conjunto de processos e métodos utilizados nos estudos de psicologia para medir a força e a duração dos processos mentais” (MICHAELIS, sd). Métodos de pesquisa: método clínico piagetiano O método clínico parte de um núcleo comum de questionamentos que permite seguir o pensamento da pessoa pesquisada. Permite acompanhar em profundidade o seu pensamento, tirando dúvidas e levantando hipóteses ao longo da realização dos experimentos. Permite acompanhar o raciocínio da criança e entender o seu processo de desenvolvimento cognitivo. Porém, uma de suas dificuldades é que requer grande treinamento por parte do investigador. Outra dificuldade é que a aplicação é individual. A análise dos dados é difícil e requer um profundo conhecimento teórico e https://www.youtube.com/watch?v=rEQxieZTVok PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 21 a comparação entre as respostas dos sujeitos requer muita habilidade, pois respostas parecidas em conteúdos podem revelar raciocínios diferentes, enquanto respostas diferentes em conteúdo podem revelar raciocínios semelhantes. ISTO ESTÁ NA REDE Neste vídeo, é possível acompanhar uma aula da autora sobre a teoria e a prática do método clínico piagetiano. Disponível em: https://youtu.be/RyNtaP1Dr04 Métodos de pesquisa: método experimental O método experimental consiste na manipulação de uma variável independente para verificar o efeito sobre uma variável dependente. Por exemplo, aumentar o número de crianças em uma sala e verificar o efeito sobre as verbalizações. Permite identificar as causas e os efeitos. Para isso, contudo, é necessário ter hipóteses muito bem elaboradas para que a relação entre as variáveis seja comprovada e faça sentido. Em geral, usa grandes quantidades de sujeitos e os dados são submetidos à análise estatística, que relaciona as variáveis. ISTO ESTÁ NA REDE Albert Bandura, um importante teórico da teoria da aprendizagem social, criou um famoso experimento, com um boneco João Bobo, para mostrar que a violência é provocada pela imitação de modelos. Disponível em: https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&q=experiment o+jo%C3%A3o+o+bobo#fpstate=ive&vld=cid:c50dd0d4,vid:3mFyq7A8DwI Delineamentos evolutivos Estudar as mudanças que ocorrem em um ou vários sujeitos ao longo do tempo requer procedimentos específicos, que são os delineamentos evolutivos. De acordo com Delval (2002), os delineamentos evolutivos são utilizados quando se quer estudar o desenvolvimento, ou evolução, ao longo do tempo, de uma conduta, capacidade ou representação. Na figura 2, você pode conhecer as três possibilidades de delineamentos evolutivos. https://youtu.be/RyNtaP1Dr04 PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 22 ANOTE ISTO O delineamento da pesquisa inclui vários aspectos entre os quais o objetivo, o tamanho e as características da amostra, a seleção dos participantes, as variáveis a serem estudadas, os procedimentos, os instrumentos e as técnicas de coleta de dados. O estudo longitudinal permite acompanhar um grupo de sujeitos ao longo do tempo. Como os mesmos sujeitos são acompanhados ao longo do tempo, pode-se verificar a mudança de suas condutas. Porém, é muito difícil realizar estudos longitudinais, porque o acompanhamento das mesmas pessoas costuma ter vários inconvenientes, como a recusa em permanecer na pesquisa, mudanças de endereço, mortes etc. O estudo transversal é realizado com sujeitos de diversas faixas etárias, porém o estudo é realizado com todos os sujeitos numa mesma época, com a tentativa de reproduzir por meio desses diferentes grupos o caminho percorrido pelos indivíduos ao longo do seu desenvolvimento. A coleta de dados é muito mais fácil do que no delineamento longitudinal, pois permite estudar um grupo grande de sujeitos em pouco tempo. Porém, os dados não pertencem aos mesmos sujeitos. O número grande de sujeitos pode compensar essa dificuldade. Figura 2. Tipos de delineamentos evolutivos Fonte: DELVAL (2002, p. 49) PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 23 O método longitudinal-transversal ou misto combina os dois modelos. Vários grupos de sujeitos de diferentes idades são acompanhados por um tempo muito menor do que seria necessário em um estudo longitudinal. A coleta de dados é muito mais fácil do que no estudo longitudinal, mas ainda apresenta a desvantagem de não serem os mesmos sujeitos acompanhados e estudados ao longo do tempo. ISTO ESTÁ NA REDE Faço parte, como sujeito de pesquisa, de dois estudos longitudinais. Um deles é o Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto - ELSA Brasil, que existe desde 2002, envolve 15 mil pessoas e cujo objetivo é investigar a saúde do adulto brasileiro. Vários artigos já foram produzidos e a pesquisa ainda não tem uma data para terminar. Disponível em: http://elsabrasil.org/ O outro estudo longitudinal de que faço parte é o Nutrinet Brasil, que trata de questões alimentares. No dia 21 de abril de 2023 já contava com 107.134 participantes e ainda está aberto para receber mais colaboradores. Disponível em: https://nutrinetbrasil.fsp.usp.br/ Conclusão Neste capítulo, você teve contato com alguns dos mais importantes métodos utilizados nas pesquisas sobre o desenvolvimento humano, que são a observação pura, a observação estruturada, os questionários e testes, o método clínico e o método experimental. Cada método tem suas vantagens e suas desvantagens. A escolha por um método ou por outro depende do tipo de problema que se quer responder, depende da pergunta de pesquisa. Você conheceu, também, os delineamentos evolutivos que são longitudinal, transversal e misto e aprendeu que cada um deles tem vantagens e desvantagens. http://elsabrasil.org/ https://nutrinetbrasil.fsp.usp.br/ PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 24 CAPÍTULO 3 DESENVOLVIMENTO PSICOSSEXUAL Introdução Ao longo do ciclo de vida do ser humano, várias mudanças ocorrem e são estudadas a partir de diversos enfoques. Um desses enfoques é o desenvolvimento psicossexual, apresentado pelo criador da psicanálise Sigmund Freud. Talvez você já tenha se feito algumas dessas perguntas. Por que algumas pessoas, ao beberem álcool, fazem coisas que não fariam sem a bebida? Por que, algumas vezes, quando alguém está muito irritado com uma pessoa é possível sonhar que a está matando? Por que, em alguns sonhos, há alguém nos perseguindo? Por que, às vezes, estamos falando com uma pessoa e a chamamos pelo nome de outra? As explicações para algumas dessas situações podem ir além de nossa lógica consciente e é preciso recorrer à noção de inconsciente. Neste capítulo, você irá conhecer alguns conceitos importantes da psicanálise como o conceito de inconsciente, o id, o ego e o superego, o desejo do saber e a teoria do desenvolvimento psicossexual, com suas diversas fases. Psicanálise Sigmund Freud (1856-1939) foi um médico austríaco que revolucionou a compreensão do comportamento humano, ao criar a psicanálise, que tem como objeto de estudo o inconsciente. Antes de Freud, o foco dos estudos psicológicos estava no consciente, e Freud demonstrou a força do inconsciente sobre o comportamento humano e sobre a formação da personalidade. O termo psicanálise, além de ser o nome de uma teoria, também representa um método de investigação e uma forma de tratamento. Neste capítulo, o nosso foco é a psicanálise enquanto teoria que explica o comportamento humano a partir do inconsciente (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 1999). As conclusões de Freud, que você vê na Figura 1, baseiam-se na análise de pacientes adultos. Ele próprio não fezpesquisas sistemáticas com crianças para corroborar PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 25 suas descobertas. Por essa razão, muitos autores discutem se psicanálise é ou não ciência. Apesar dessa discussão, é inegável o fato de que a psicanálise provocou mudanças sobre a forma de pensar o mundo e sobre a forma de compreender as relações interpessoais, especialmente sobre a importância dos cuidados para com as crianças e sobre a importância dos pais para o desenvolvimento infantil (KUPFER, 1989). Figura 1. Sigmund Freud aos 66 anos de idade Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Sigmund_Freud Surgimento da psicanálise Freud (1979) era médico e suas primeiras publicações são sobre neurologia. Considera-se o início da psicanálise o ano de 1900, com a publicação de A interpretação dos sonhos, porém esse não é o início de sua carreira. Suas descobertas se deram por meio da análise clínica de seus pacientes, ou seja, foram estudos de caso. Enquanto as outras teorias da época estudavam a consciência e a razão, a psicanálise recupera a necessidade de se estudar a afetividade, tendo o inconsciente como o seu objeto de estudo (HOTHERSALL, 2019). ISTO ESTÁ NA REDE Freud além da alma é um filme de 1962 que retrata os anos iniciais da carreira de Freud. Não é um documentário. Trata-se de uma história romanceada, baseada em fatos. Disponível em: https://www.facebook.com/cpc.psi/videos/freud-al%C3%A9m-da- alma-1962/1005942306590534/ https://pt.wikipedia.org/wiki/Sigmund_Freud https://www.facebook.com/cpc.psi/videos/freud-al%C3%A9m-da-alma-1962/1005942306590534/ https://www.facebook.com/cpc.psi/videos/freud-al%C3%A9m-da-alma-1962/1005942306590534/ PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 26 Conceitos importantes A primeira explicação de Freud para o funcionamento mental, chamada de primeira tópica, dividia o aparelho psíquico em consciente, pré-consciente e inconsciente. Os conteúdos conscientes são os que estão acessíveis, os pré-conscientes são aqueles facilmente acessáveis, com pequeno esforço. Os inconscientes são aqueles conteúdos que não estão acessíveis ao nosso pensamento. Conteúdos que causam sofrimento podem ser afastados da consciência, tornando-se inconscientes, por meio de um mecanismo de defesa chamado de recalque (FREUD, 1979). O fato de determinados conteúdos serem inconscientes não significa que não afetem a nossa vida. Ao contrário, eles afetam a nossa vida sem que tenhamos consciência da causa do sofrimento psíquico. Sem ter consciência, torna-se mais difícil se propor a realizar as mudanças necessárias. Você já deve ter ouvido alguém falar: “Meus relacionamentos dão errado, porque os homens são todos iguais”. Se a pessoa não se der conta de que é ela que está buscando pessoas que são iguais em determinado aspecto, ela continuará a fazer essas mesmas escolhas. No início de seu trabalho, Freud utilizou a hipnose como como forma de acesso ao inconsciente. Ao criar a psicanálise, abandonou a hipnose e utilizou outras vias de acesso ao inconsciente: associação livre, interpretação dos sonhos, análise dos atos falhos. Associação livre consiste em falar tudo o que vier à mente, mesmo que pareçam ser conteúdos desconexos. Atos falhos são erros que todos cometem no seu dia a dia, como errar palavras, chamar o atual namorado pelo nome do anterior ou se confundir com o horário de um compromisso. Esses erros podem revelar aspectos inconscientes de quem os comete (FREUD, 1979). A segunda tópica, que foi uma segunda explicação para o aparelho psíquico, divide-o em id, ego e superego. O id quer a gratificação total e imediata, sem limites ou regras. O superego é a internalização das regras, sendo o responsável pela autoimposição de limites. O ego precisa encontrar um equilíbrio entre os desejos do id, as restrições do superego e os limites da realidade. Ao nascer, a criança é totalmente id. Ela não em noções de regras e é regida pelo princípio do prazer, querendo a gratificação imediata de suas necessidades. O superego tem seu surgimento a partir do Complexo de Édipo, que será explicado na sequência. O ego vai se constituindo ao longo da vida. A inteligência é uma função do ego. Tanto id quanto ego e superego têm partes conscientes e inconscientes (KUPFER, 1989). PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 27 ISTO ESTÁ NA REDE Este pequeno vídeo de 2min 28 s, da Enciclopédia Britânica, traz um breve relato sobre a vida de Freud. A narração e as legendas estão em inglês, mas vale a pena ver as imagens. Disponível em: https://www.msn.com/en-us/video/other/who-was-sigmund- freud/vi-AA14NReV Desenvolvimento psicossexual Freud iniciou seu trabalho com o objetivo de tratar seus pacientes, porém seu legado vai muito além do trabalho clínico individual. Deixou uma importante compreensão sobre o desenvolvimento infantil. Descobriu que as experiências ao longo do desenvolvimento deixam marcas na vida, determinando a diferença entre uma vida psíquica saudável e a doença e o tipo de personalidade que a pessoa terá (FREUD, 1979). ISTO ESTÁ NA REDE - Vídeo A sexualidade a partir da psicanálise https://www.youtube.com/watch?v=mZ0rV1Ix40Y O ambiente em que Freud vivia, a Áustria do final do século XIX e início do século XX, era de grande repressão sexual. Ele deu-se conta de que os conteúdos sexuais estavam muito presentes nas causas dos sofrimentos de seus pacientes. A princípio, pensou que, quando crianças, essas pessoas tinham sido vítimas de abuso sexual. Porém, percebeu que essa explicação não correspondia à realidade. A partir daí, ampliou o conceito de sexualidade, não a restringindo ao sexo genital, como se costuma entender. Freud incluiu nesse conceito outras formas de gratificação, inicialmente a partir da satisfação com o próprio corpo, depois voltando-se a outras pessoas (FREUD, 1979). ANOTE ISTO Parafilias - práticas sexuais não convencionais, rejeitadas socialmente, como, por exemplo, o exibicionismo, o fetichismo, a pedofilia, o sadomasoquismo etc. (DICIONÁRIO MICHAELIS on line). Disponível em https://michaelis.uol.com.br/ moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/parafilia/ https://www.msn.com/en-us/video/other/who-was-sigmund-freud/vi-AA14NReV https://www.msn.com/en-us/video/other/who-was-sigmund-freud/vi-AA14NReV https://www.youtube.com/watch?v=mZ0rV1Ix40Y https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/parafilia/ https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/parafilia/ PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 28 Existem várias parafilias. Alguns tipos de parafilias são crimes, como aquelas que envolvem sujeitos vulneráveis ou que não contam com a permissão do outro. Alguns tipos de parafilias: • Sadismo – prazer sexual com sofrimento do parceiro • Masoquismo – prazer sexual em sentir dor ou imaginar que a sente • Pedofilia ou hebefilia – prazer sexual com crianças • Frotteurismo – prazer sexual por tocar ou esfregar em pessoa não consentiu • Exibicionismo – prazer sexual em exibir o órgão genital ao outro • Pigmalionismo – atração sexual por estátuas • Necrofilia – atração sexual por pessoa morta • Edipismo – impulso sexual por parentes próximos • Zoofilia – prazer sexual com animais • Coprolalia – prazer sexual por palavras obscenas • Coprofilia – prazer sexual pelo contato com fezes • Coprofagia – prazer sexual na ingestão de fezes • Urolagnia – prazer sexual que envolve micção, ruído de urina, urinar no parceiro • Dolismo – atração sexual por bonecas ou manequins Especialmente no texto intitulado Três ensaios sobe a teoria da sexualidade, escrito em 1905, FREUD(1979) apresenta de forma organizada as fases do desenvolvimento infantil. Freud esclarece que, ao falar de sexualidade, não está usando o termo no sentido leigo do termo, que se refere ao relacionamento genital entre adultos. Freud se refere aos pontos de interesse da criança ao longo do desenvolvimento. A partir dessas constatações, criou uma teoria sobre o desenvolvimento da sexualidade a partir das fases oral, anal, fálica, latência e genital. ISTO ESTÁ NA REDE - Vídeo Três ensaios sobre a teoria da sexualidade – Introdução Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=aZSsUQ7yq8s Desenvolvimento psicossexual: fase oral A primeira fase do desenvolvimento psicossexual, segundo Freud, é a fase oral. Nessa fase, a fonte de gratificação da criança encontra-se na boca. Ao nascer, a região https://www.youtube.com/watch?v=aZSsUQ7yq8s PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 29 da boca é muito mais sensibilizada do que outras regiões do corpo. Na Figura 2, Eva, com 5 dias de vida, suga a própria mão, que acidentalmente ficou perto da boca. Figura 2. Fase oral Fonte: Acervo pessoal da autora. Tudo a criança leva à boca. Não se tata de fome, mas é sua forma de se relacionar com o mundo. Por isso, é necessário estar sempre atento à criança, pois ela leva tudo à boca. Uma pessoa pode desenvolver fixações nessa fase se sofrer grandes frustrações. Transtornos alimentares podem estar relacionados a dificuldades na fase oral. Relacionamentos de extrema dependência também podem revelar traços da fase oral. Há algumas décadas, era comum ouvir que os bebês deveriam ser alimentados de três em três horas e não nos intervalos. Ora, sabe-se que o bebê recém-nascido não tem força suficiente para sugar até se alimentar e cansa facilmente. Dorme e logo se acorda porque continua com fome. ISTO ESTÁ NA REDE Neste pequeno vídeo, eu falo para você porque o bebê pequeno faz mamadas curtas e a cada pouco tempo. Disponível em: https://youtube.com/shorts/J3sy7x7AnuA?feature=share3 O bebê acaba de sair do conforto do útero e tem que aprender a viver no mundo externo, cheio de desconfortos até então desconhecidos. O colo lhe dá conforto. Então, quando o bebê de fase oral chora, não se trata de manha. Trata-se de alguma necessidade que não está sendo satisfeita. O choro é a maneira que o bebê tem de manifestar suas necessidades. https://youtube.com/shorts/J3sy7x7AnuA?feature=share3 PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 30 Algumas situações como um desmame abrupto ou a retirada repentina do bico podem causar grandes frustrações, com as quais o bebê pode não ter condições de lidar, pois não tem ainda outras maneiras de encontrar o conforto que a mamada e o bico proporcionam. Mais adiante, ele irá abandonar tanto o peito quanto o bico, não porque não sejam bons, mas porque há outras coisas a serem descobertas. Porém, se o bebê continuar precisando do peito e do bico, mesmo com a passagem do tempo, é porque não está conseguindo adquirir autonomia para isso e precisa de atenção. A retirada abrupta, ao invés de resolver a situação, produzirá mais estresse, com o qual ele não conseguiu aprender a lidar. Se você conhecer alguém que enfrenta esse tipo de situação, recomende a ajuda de um psicólogo infantil. ISTO ESTÁ NA REDE Neste pequeno vídeo, eu respondo para você se é bom ou não trocar a chupeta por um brinquedo, fato que costuma ocorrer com frequência na época do Natal. Disponível em: https://youtu.be/s-76H_R5bBU Desenvolvimento psicossexual: fase anal A fase anal corresponde à época em que a atenção da criança se volta ao controle dos esfíncteres anais. Corresponde à época em que a criança adquire um maior controle sobre seu corpo, podendo se deslocar sem ajuda. O controle sobre o corpo inclui a capacidade de reter ou expulsar as fezes. Esta fase é marcada por um uso intenso do não. Da mesma forma que na fase oral, problemas na fase anal também podem gerar dificuldades na vida adulta. Por exemplo, uma criança que tenha sido forçada ao controle esfincteriano em uma idade muito precoce pode desenvolver, na sua vida adulta, um hábito compulsivo de limpeza ou de acumulação (FREUD, 1979). Desenvolvimento psicossexual: fase fálica A fase fálica é a terceira fase do desenvolvimento psicossexual e ocorre em torno dos três a cinco anos de idade. Mesmo que ela tenha estado na presença de pessoas nuas, é apenas nesta fase que a criança se dá conta das diferenças anatômicas entre os sexos e procura entendê-las. É na fase fálica que ocorre o Complexo de Édipo e se dá o surgimento do superego. https://youtu.be/s-76H_R5bBU PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 31 No Complexo de Édipo, a mãe é o objeto de desejo do menino, e o pai é o rival que impede seu acesso ao objeto desejado. Ele procura então ser o pai para ter a mãe, escolhendo-o como modelo de comportamento, passando a internalizar as regras e as normas sociais representadas e impostas pela autoridade paterna (BOCK, TEIXEIRA, FURTADO, 1999, p. 75). Apesar de Freud usar os termos pai e mãe, pode-se ler como função materna e função paterna, ou seja, as pessoas que ocupam essas funções na vida da criança. A psicanálise mostra que essas funções precisam ser desempenhadas por duas pessoas diferentes, mesmo que se alternem nesses papeis. ANOTE ISTO O termo Complexo de Édipo foi criado com inspiração na tragédia Grega Édipo Rei, escrita por Sófocles em 427 a.C. Édipo não foi criado por seus pais biológicos e não os conhece. Mata seu pai, sem saber quem era, e se casa com a viúva Jocasta, que é sua mãe. Fonte: SÓFOCLES (2004) Desenvolvimento psicossexual: latência Na latência, a criança tem uma diminuição da curiosidade sobre a sexualidade e seu próprio corpo e tem um aumento de curiosidade sobre o mundo que a cerca, voltando-se mais para os estudos, período que costuma coincidir com a entrada na escola de ensino fundamental. A fase de latência segue até o início da puberdade. Desenvolvimento psicossexual: fase genital A fase genital inicia com as modificações produzidas pela puberdade. Ao nascer, a criança apresenta os caracteres sexuais primários e na puberdade surgem os caracteres sexuais secundários. Nessa fase, o interesse se volta para um foco externo a ela, que pode ser outra pessoa ou não. Ver as parafilias. Desejo de saber Para a psicanálise, o que você aprende não equivale ao que é ensinado pelo professor, já que a aprendizagem depende de processos inconscientes. Para Freud (KUPFER, 1989), educar é uma profissão impossível, pois não se pode controlar os efeitos do PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 32 ensino sobre a aprendizagem do outro. Além disso, a aprendizagem depende do desejo de aprender. Apesar de o desejo de aprender não garantir a aprendizagem, sem ele ela não ocorre. Transferência Outro conceito psicanalítico importante para a área da educação é o de transferência. Esse conceito foi criado por Freud (HOTHERSALL, 2019) para explicar a relação estabelecida pelo paciente com seu médico. Surge no tratamento analítico um “amor que se volta para o analista, desempenhando um papel [...] revelador do passado [...] (KAUFMANN, 1996, p. 548). Esse amor dedicado ao médico seria uma repetição inconsciente do relacionamento da criança com os seus pais. Da mesma forma, Freud explica que pode surgir na relação docente-estudante um amor de transferência e afirma que se aprende por amor a alguém (KUPFER, 1989). ISTO ESTÁ NA REDE Vídeo Paradigma psicanalítico na educação 2 Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=eqTjj2PXU9kConclusão Neste capítulo, você conheceu a psicanálise, uma das importantes teorias sobre o desenvolvimento infantil. A psicanálise teve um grande impacto sobre a forma de interpretar o mundo, seja na literatura, no teatro, no cinema e na educação, ressaltando o papel do inconsciente na determinação de nossos comportamentos. A teoria do desenvolvimento psicossexual revolucionou a forma como se entende o ser humano e a necessidade de maiores cuidados à criança, especialmente nos primeiros anos de vida. https://www.youtube.com/watch?v=eqTjj2PXU9k PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 33 CAPÍTULO 4 DESENVOLVIMENTO PSICOSSOCIAL I: LACTÂNCIA, INFÂNCIA PRECOCE, IDADE DO JOGO, IDADE ESCOLAR Introdução O psicanalista Erik Erikson ampliou o estudo freudiano sobre os estágios do desenvolvimento psicossexual e criou a teoria do desenvolvimento psicossocial. A teoria freudiana foi ampliada em dois sentidos. No primeiro sentido, Erikson ampliou o espectro das preocupações freudianas, assinalando não apenas as questões relacionadas ao próprio corpo da criança, mas também os efeitos da sociedade sobre ela. No segundo sentido, ampliou as idades estudadas, preocupando-se com o desenvolvimento humano até o fim da vida. Neste capítulo, você irá conhecer a teoria do desenvolvimento psicossocial de Erik Erikson (1976a, 1976b, 2000; ELKIND, 1978) e os estágios de 1 a 4, ou seja, lactância, infância precoce, idade do jogo, e idade escolar, cada um deles com suas principais características e reflexos sobre os estágios posteriores. A teoria do desenvolvimento psicossocial A teoria do desenvolvimento psicossocial foi criada pelo psicanalista Erik Erikson (1902-1994), que você vê na Figura 1. Figura 1. Erik Erikson Fonte: FEIST; FEIST; ROBERTS (2015, p.145). PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 34 As ideias de Erik Erikson resultaram de pesquisas do tipo antropológico, histórico, sociológico e clínico. Ele acreditava que as formas como a pessoa interage com o ambiente e consigo própria mudam ao longo do ciclo vital. O autor dividiu o ciclo vital em oito estágios, de acordo com essas formas como a pessoa realiza essa interação. Após sua morte, sua esposa Joan Erikson acrescentou um nono estágio na edição revisada de O ciclo de vida completo (ERIKSON, 2000), o que se tornou necessário devido ao aumento da expectativa de vida nos últimos cem anos. Na Figura 2 você vê um quadro síntese com esses estágios. Estágio Nome Idade Crise 1º Lactância Primeiro ano confiança básica x desconfiança básica 2º Infância precoce Segundo e terceiro anos autonomia x vergonha e dúvida 3º Idade do jogo De três a cinco anos iniciativa x culpa 4º Idade escolar Dos seis aos 12 anos diligência x inferioridade 5º Adolescência Da puberdade ao início da idade adulta identidade x confusão de identidade 6º Início da vida adulta Dos 19 aos 30 anos intimidade x isolamento 7º Idade adulta Dos 31 aos 60 anos generatividade x estagnação 8º Velhice Originalmente, dos 60 até o final da vida. Modificado para 60 a 80 anos integridade x desespero 9º Velhice avançada Acima dos 80 anos desenvolvimento interior x limitações físicas e mentais. Força básica: Gerotranscendência. Capacidade para transcender as limitações corporais e experimentar uma compreensão mais universal da vida e focalizar nos aspectos iminentes da própria morte. Figura 2. Os estágios do desenvolvimento psicossocial de acordo com Erik Erikson Fonte: Elaborado pela autora. Na sequência deste capítulo, você estudará os quatro primeiros desses estágios do desenvolvimento psicossocial, que são a lactância, a infância precoce, a idade do jogo e a idade escolar. Primeiro estágio: Lactância O primeiro estágio do desenvolvimento psicossocial de Erikson é a lactância e corresponde ao primeiro ano de vida. Em termos etários, corresponde à fase oral do desenvolvimento psicossexual de Freud. Porém, Erik Erikson estende sua análise para além da importância da boca. PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 35 Para Erikson, a lactância é representada pelo termo oral-sensorial, pois, além da boca, acredita que o bebê se relaciona com o mundo com todos os seus sentidos. Ao longo do primeiro estágio, a crise psicossocial básica pela qual passam os bebês é a de confiança básica X desconfiança básica. Se têm suas necessidades atendidas, os bebês tendem a desenvolver a confiança básica. “Todavia, eles aprendem desconfiança básica se não encontram correspondência entre suas necessidades orais-sensoriais e o ambiente” (FEIST; FEIST; ROBERTS, 2015, p.151). O afeto é uma das necessidades do bebê. Na Figura 3, Anycandra de 11 meses, recebe aconchego do colo. Figura 3. Construção da confiança básica Fonte: Acervo pessoal da autora. Embora seja importante que o sentimento de confiança predomine sobre o de desconfiança, o bebê precisa experienciar os dois, pois apenas confiança torna a criança completamente ingênua e vulnerável ao mundo. Se predominar a desconfiança, sobressaem “a frustração, raiva, hostilidade, cinismo ou depressão” (FEIST; FEIST; ROBERTS, 2015, p. 152). ANOTE ISTO • Lactância - fase da vida em que a criança é amamentada. • Lactação - amamentação; secreção e excreção de leite. • Lactente - a criança que mama. • Lactante - quem produz leite. Se a crise confiança básica X desconfiança básica for resolvida de forma satisfatória, surge a esperança. Se esse conflito não for vivido de forma satisfatória, prevalece “o PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 36 retraimento, a patologia central do lactente. Com pouco a esperar, eles se retiram do mundo externo e começam a jornada em direção a graves transtornos psicológicos” (FEIST; FEIST; ROBERTS, 2015, p. 152). Segundo estágio: Infância precoce A infância precoce é o segundo estágio do desenvolvimento psicossocial conforme Erikson e ocorre nos segundo e terceiro anos de vida da criança. Em termos etários, corresponde à fase anal do desenvolvimento psicossexual de Freud. Assim como no primeiro estágio, da lactância, também neste estágio Erikson estendeu a visão sobre o campo de interesse da criança. Para Erikson, “as crianças pequenas obtêm prazer não só ao dominarem o músculo esfincteriano, mas também ao dominarem outras funções corporais como urinar, caminhar, jogar, segurar, entre outras” (FEIST; FEIST; ROBERTS, 2015, p. 152). Nesse estágio, a criança vai construindo um maior controle sobre seu ambiente e sobre seu próprio corpo. Ao mesmo tempo em que tem mais autocontrole e controle sobre o mundo, também começa a sentir dúvida e vergonha, já que nem sempre é bem-sucedida nos seus movimentos de autonomia e precisa de ajuda, como se vê na Figura 4. Figura 4. Aumento de autonomia, mas nem sempre Fonte: Acervo pessoal da autora Erikson denominou o modo de relação com o mundo como anal-uretral-muscular. Nesse estágio, a criança aprende a ter controle sobre seu próprio corpo, seja nas questões de limpeza, controlando seus esfíncteres, mas também com relação à mobilidade. Aprende a controlar as fezes, expulsando ou retendo. Pode se aproximar da mãe ou se afastar. Pode aproximar-se dos objetos ou atirá-los longe. Esse movimento em que a criança apresenta comportamentos opostos leva a uma crise psicossocial de autonomia X vergonha e culpa. PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 37 Da mesma forma que no conflito do primeiro estágio, a criança precisa vivenciar os dois polos, agora representados pela autonomia e pela vergonha e dúvida. A autonomiadepende da confiança básica, e, se predomina o sentimento de autonomia, a criança desenvolve sua força básica que é a vontade. Se, no estágio anterior, tiver predominado a desconfiança, a criança terá dificuldade para desenvolver o controle sobre o próprio corpo, vencendo a vergonha e a dúvida. “Vergonha é um sentimento de autoconsciência, de ser olhado e estar exposto. Dúvida, por sua vez, é o sentimento de não estar certo, o sentimento de que algo permanece oculto e não pode ser visto” (FEIST; FEIST; ROBERTS, 2015, p. 153). Ao vencer a vergonha e a dúvida, sobressai-se a compulsão, que é uma vontade inadequada. As consequências disso se fazem sentir em idades posteriores: “pouca vontade e muita compulsividade se transportam para a idade do jogo como falta de propósito e para a idade escolar como falta de confiança” (FEIST; FEIST; ROBERTS, 2015, p. 153). Terceiro estágio: Idade do jogo A idade do jogo é o terceiro estágio do desenvolvimento psicossocial. Em termos de idade, estende-se em torno dos 3 aos 5 anos de vida, equivalente à fase fálica do desenvolvimento psicossexual. Na teoria freudiana, a fase fálica é marcada pelo Complexo de Édipo (FREUD, 1979). Como diz o nome, o jogo prevalece, como se vê na Figura 5. Figura 5. Idade do jogo Fonte: Acervo pessoal da autora. Para Erikson, além do Complexo de Édipo, desenvolvem-se algumas importantes habilidades na criança: “a locomoção, as habilidades de linguagem, a curiosidade, a PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 38 imaginação e a capacidade de estabelecer objetivos” (FEIST; FEIST; ROBERTS, 2015, p. 153). Para Erikson, a relação da criança com o mundo na idade do jogo se dá por meio de um modelo genital-locomotor. Ao mesmo tempo em que se interessa por questões relacionadas às diferenças anatômicas e de comportamento e de reprodução, adquire mais autonomia na locomoção, caminhando, correndo e saltando com facilidade. Ao mesmo tempo, o seu jogo ganha em iniciativa e em imaginação. O crescimento da capacidade imaginativa, em que pode se colocar em diferentes papéis, não só lhe proporciona iniciativa, mas também o sentimento de culpa. Assim, quando consegue se deslocar e imaginar com mais intensidade, sobrevém um sentimento de culpa. Iniciativa X culpa é o conflito básico da idade do jogo. Os dois sentimentos devem ser vivenciados, mas, se prevalecer a iniciativa desenfreada, pode surgir o caos e a falta de princípios morais. Se a culpa se sobrepuser, surge ou uma moral compulsiva ou muita inibição. A inibição é a patologia central neste estágio. Se o conflito for resolvido de forma adequada, desenvolve-se o propósito, que é a força básica da idade do jogo. Quando o propósito vence, a criança consegue seguir seus objetivos, competir em jogos e tem o interesse em vencer. Começa a compreender as noções de certo e de errado, que se desenvolverá posteriormente, servindo de base à moral. Quarto estágio: Idade escolar O quarto estágio do desenvolvimento psicossocial conforme Erikson é a idade escolar, abrangendo a faixa etária dos seis aos 12 anos de idade. O autor compara com o estágio freudiano de latência. O mundo da criança expande-se e aumenta o convívio social com amigos e professores. A criança interessa-se mais pelo saber e busca a competência. “As crianças empenham-se com diligência em ler e escrever, caçar e pescar, em aprender as habilidades requeridas por sua cultura” (FEIST; FEIST; ROBERTS, 2015, p. 154). PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 39 Figura 6. Fase escolar Fonte: Acervo pessoal da autora. A idade escolar é uma fase em que as crianças se dedicam mais a conhecer como funciona o mundo em que vivem, voltando sua energia para as tecnologias, para a sua cultura e as formas e normas das interações sociais. Na Figura 6, Wendell preparado para um evento na escola. A idade escolar é um momento de grande desenvolvimento social e a crise que marca este estágio é a diligência X inferioridade. A diligência se refere ao empenho, à capacidade de se ocupar com algo e concluí-lo e à capacidade de cooperação. Por outro lado, se o trabalho da criança não for suficiente para que ela o conclua, surge o sentimento de inferioridade. Como nos estágios anteriores, os dois sentimentos - diligência e inferioridade - devem ser vivenciados para que a criança possa chegar à superação desse estágio. O sentimento de inferioridade, desde que não seja exagerado, leva à busca por melhorar. Se o sentimento de inferioridade é exagerado, paralisa a atividade produtiva e pode destruir o sentimento de competência, podendo levar à uma regressão à fase anterior, surgindo a inércia, que é a patologia central da idade escolar. A força básica da idade escolar é a competência, em que a criança consegue usar suas habilidades para resolver problemas (ERIKSON, 1976a, 1976b, 2000). PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 40 Conclusão Neste capítulo, você conheceu a teoria do desenvolvimento psicossocial, criada pelo psicanalista Erik Erikson que, partindo do modelo desenvolvido por Freud, ampliou-o, incluindo outros aspectos além da sexualidade. Erikson, sem se descuidar dos aspectos biológicos do crescimento, considerava a importância do papel da sociedade na resolução dos conflitos de cada faixa etária. Além disso, ampliou a quantidade de estágios do desenvolvimento, estudando as várias etapas do ciclo vital até o envelhecimento e a morte. Você estudou os quatro primeiros estágios do ciclo vital de acordo com Erikson que são: a lactância, a infância precoce, a idade do jogo e a idade escolar. Nos próximos capítulos, você estudará os outros estágios. PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 41 CAPÍTULO 5 DESENVOLVIMENTO PSICOSSOCIAL II: ADOLESCÊNCIA, INÍCIO DA VIDA ADULTA Introdução O ser humano passa por muitas mudanças ao longo do seu ciclo vital. Diferentes teorias foram criadas para explicar esse processo. Uma dessas teorias é a criada pelo psicanalista Erik Erikson que dividiu o ciclo vital em oito estágios. Posteriormente, em função do aumento da expectativa de vida no último século (IBGE), foi acrescido um nono estágio. No capítulo anterior, você estudou os quatro primeiros estágios do desenvolvimento psicossocial, de acordo Erikson: lactância, infância precoce, idade do jogo e idade escolar. Neste capítulo, você continuará a conhecer os estágios do desenvolvimento psicossocial, a partir do estudo da adolescência e do início da vida adulta, o quinto e o sexto estágios do desenvolvimento psicossocial, respectivamente. Quinto estágio: Adolescência O interesse sobre a adolescência é recente, podendo ser situado na segunda metade do século XX. Nessa época, começou a transcorrer um tempo maior entre o fim da infância e o início da vida adulta, pois o grande progresso na industrialização exigiu uma maior formação e a demora para o ingresso no trabalho. Puberdade e adolescência às vezes são usadas como sinônimos, mas representam distintos fenômenos. A puberdade é um fenômeno biológico, pelo qual passam todos os seres humanos. Consiste no aparecimento dos caracteres sexuais secundários, que são os pelos, a menstruação, o crescimento de seios etc. que indica o início da capacidade reprodutiva (OUTEIRAL, 1994). A adolescência é um fenômeno bem mais complexo e, por isso, alguns autores falam em adolescências, já que não existe “um critério claro para definir a fase que vai da puberdade até a idade adulta. Essa confusão acontece porque a adolescência não é uma fase natural do desenvolvimento humano, mas um derivado da estrutura socioeconômica” (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA;1999, p. 291). PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 42 Do ponto de vista legal, a definição para a adolescência é objetiva. Para o Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990), é criança quem tem de zero a 12 anos incompletos, ou seja, até o dia anterior a completar 12 anos é criança e no dia em que completa 12 anos torna-se adolescente. É adolescente quem tem de 12 a 18 anos incompletos. Perante a lei, a pessoa é adolescente até o dia anterior a completar 18 anos. No dia em que completa 18 anos é considerada adulto. ISTO ESTÁ NA REDE Lei nº 8069, de 13 de julho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm Segundo a teoria de Erik Erikson (1976 a, 1976 b, 2000), o conflito pelo qual passa o adolescente é o da identidade X confusão de identidade e a sua tarefa básica é a construção de uma nova identidade. O estágio da adolescência, segundo Martorell (2014, p. 312), é uma fase de confusão de identidade, que também é denominada de “confusão de função”. A construção da nova identidade depende de muitos fatores além dos biológicos, entre os quais os étnicos, os culturais, os econômicos e os sociais. Sendo assim, trata-se de um fenômeno complexo, que pode até não existir em algumas culturas ou em diferentes classes sociais. O psicanalista gaúcho José Outeiral (1994, p. 71) afirma que, para sair dessa confusão e construir sua própria identidade, o adolescente identifica-se com várias pessoas, como mãe, pai, família, professores, amigos, ídolos e a sociedade mais ampla. Segundo o autor, “O novo corpo é habitado por uma nova mente”. O corpo muda muito rapidamente, enquanto a identidade se constrói lentamente. A confusão de papeis, típica da adolescência, é definida por Bock, Furtado e Teixeira (1999, p. 203) como: “Uma vontade de ser criança e adulto ao mesmo tempo”. Esse conflito é muito bem retratado em Alice no país das maravilhas. A construção da identidade ocorre “com ‘turbulências’ com ‘idas e vindas’, provocando perplexidade e confusão nos adultos” (OUTEIRAL, 1994, p. 72), que se esquecem de que também foram adolescentes e que também passaram por essa confusão. Para Martorell (2014, p. 312), a identidade adulta surge quando são realizadas certas conquistas: “a escolha de uma profissão ou ocupação, a adoção dos valores pelos quais se guiará pela vida e o desenvolvimento de uma identidade sexual que satisfaça”. Esse processo depende de vários fatores. Anacleto e Fonseca (2021) consideram que https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 43 “a ideia de adolescência é tributária da discursividade contemporânea, ou seja, ela é efeito de uma produção política e social que demarca uma diferença com o infantil”. O corpo muda, mudam a identidade adolescente e os relacionamentos. Não apenas o adolescente se vê de maneira distinta como passa a ver as outras pessoas de maneira diferente do que costumava ver. Durante a infância, os pais são idealizados, são considerados perfeitos. Na adolescência, porém, o adolescente passa a ver os pais como pessoas normais, com acertos e erros. A adolescência exige independentizar-se, com “a transformação de vínculos infantis de relacionamento por um outro tipo e vínculo mais maduro, mais independente e mais adulto” (OUTEIRAL, 1994, p. 16). Segundo Outeiral (1994), a família toda adolesce junto e muitos adultos acabam se identificando com o comportamento adolescente. É interessante ressaltar que pais de adolescente, em geral, estão vivendo um outro momento de crise no ciclo vital, que é a crise da meia idade. Na Figura 1, é retratada a adolescência. Os amigos passam a ocupar o papel central nos relacionamentos e no grupo o adolescente se identifica e busca sentir-se aceito, adotando padrões semelhantes no cabelo, nas roupas, no vocabulário e nos comportamentos. Apesar disso, segundo Steinberg (2008), em caso de divergências de valores, os valores familiares continuam sendo os mais importantes. Figura 1. Adolescência Fonte: Acervo pessoal da autora. PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 44 Muitas mudanças intensas são percebidas na adolescência, sendo muitas vezes chamada de “época da rebeldia adolescente, envolvendo um turbilhão emocional, conflitos com a família, segregação da sociedade adulta, comportamento imprudente e rejeição dos valores adultos” (MARTORELL, 2014, p. 319). Apesar disso, a maioria dos adolescentes apresenta padrões adequados de comportamento. As mudanças são esperadas, mas parece haver um exagero quanto à rebeldia. Segundo Outeiral (1998, p. 18), o “processo de estabelecimento de novos vínculos com a família e a sociedade, não mais em termos infantis, e si, dentro de um modelo mais adulto, é uma das tarefas básicas da adolescência”. Para Erikson (1976a, 1976b), a adolescência é uma crise normativa, ou seja, faz parte do processo de desenvolvimento normal. Maurício Knobel (in ABERASTURY e KNOBEL, 1992) descreveu a Síndrome da Adolescência Normal com as seguintes características: busca de si mesmo e da identidade; tendência grupal; necessidade de intelectualizar e fantasiar; crises religiosas; deslocalização temporal; evolução sexual manifesta; atitude social reivindicatória; contradições sucessivas em todas as manifestações da conduta; separação progressiva dos pais; constantes flutuações do humor. A adolescência, com todas essas manifestações, é “absolutamente necessária, para o adolescente que, nesse processo, vai estabelecer a sua identidade” (KNOBEL in ABERASTUTY; KNOBEL, 1992, p. 9). O adolescente, embora se separe gradativamente de seus pais, precisa deles para conter sua ansiedade. Quando prevalece a confusão de papéis, predomina o comportamento delinquente. Segundo Elkind (1978, p. 8): Alguns jovens procuram uma “identidade negativa”, uma identidade oposta a que lhes foi atribuída pela família e pelos amigos. Possuir uma identidade como “delinquente”, às vezes, pode ser preferível a não ter qualquer identidade Segundo Erik Erikson, a força básica da adolescência é a fidelidade, ou fé em sua própria ideologia, que surge quando vence a construção de uma identidade. Por outro lado, quando vence a confusão de papéis, pode gerar o adiamento de responsabilidades da vida adulta. PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 45 ISTO ESTÁ NA REDE O Ministério da Saúde (BRASIL, 2018), lançou uma cartilha específica para cuidar dos adolescentes, especificamente aqueles em vulnerabilidade social: Proteger e cuidar do adolescente na atenção básica. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/proteger_cuidar_ adolescentes_atencao_basica_2ed.pdf Sexto estágio: Início da vida adulta O sexto estágio do desenvolvimento psicossocial é o início da vida adulta, que surge quando o adolescente consegue construir a sua identidade. O início da vida adulta situa-se aproximadamente entre os 19 e os 30 anos de idade. As idades, porém, não são o mais significativo para indicar os limites. A delimitação da vida adulta inicial está muito mais focada nas características, sendo o início dessa fase marcado pela intimidade e o final marcado pela generatividade. As tarefas a serem enfrentadas pelos jovens adultos são o desenvolvimento da genitalidade madura, a superação do conflito intimidade x isolamento e a construção da força básica que é o amor. Enquanto a sexualidade adolescente está marcada pela busca da sua identidade, no jovem adulto está marcada pela genitalidade, pelo compartilhamento com outrapessoa, conforme se vê na Figura 2. O conflito básico é o da intimidade X isolamento. A intimidade é a capacidade para se vincular com outra pessoa, porém sem perder a própria identidade. Na intimidade é possível construir uma intimidade mútua. Figura 2. Início da vida adulta Fonte: Acervo pessoal da autora. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/proteger_cuidar_adolescentes_atencao_basica_2ed.pdf https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/proteger_cuidar_adolescentes_atencao_basica_2ed.pdf PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 46 O isolamento, segundo Erikson (1976a, p. 137) é “a incapacidade de arriscar a própria identidade compartilhando a verdadeira intimidade”. Ora, se o adolescente não construiu uma identidade, não tem como compartilhá-la com alguém. Erikson lembra que os dois polos são necessários para a superação do conflito básico desta fase. Porém, a intimidade em excesso “pode diminuir o senso de identidade do ego” (FEIST; FEIST; ROBERTS, 2015 p. 157), podendo resultar em dificuldade para enfrentar a próxima etapa. O isolamento excessivo também é prejudicial, pois leva a uma falta de intimidade, não podendo levar ao amor. O amor é a força básica do início da vida adulta. Surge quando o jovem adulto encontra um equilíbrio entre a intimidade e o isolamento, podendo manter sua identidade própria e, ao mesmo tempo, ser capaz de estabelecer um relacionamento através da confiança mútua. Segundo Feist, Feist e Roberts (2015, p. 157), “Amor maduro significa comprometimento, paixão sexual, cooperação, competição amizade”. Apesar de alguma exclusividade ser necessária para a vida adulta, pois escolhas e exclusões são feitas, a patologia central do início da vida adulta é a exclusividade. A exclusividade patológica ocorre quando impede a cooperação, a competição e o comprometimento, que fazem prosperar o amor e a intimidade. Conclusão Neste capítulo, você conheceu mais dois estágios do ciclo vital de acordo com a teoria do desenvolvimento psicossocial de Erik Erikson, o quinto e o sexto estágios, adolescência e início da vida adulta, respectivamente. Cada um dos estágios, com seus conflitos básicos e sua força principal. No próximo capítulo, você conhecerá os três estágios do desenvolvimento psicossocial que ainda não foram apresentados, que são a idade adulta, a velhice e a velhice avançada. PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 47 CAPÍTULO 6 DESENVOLVIMENTO PSICOSSOCIAL III: IDADE ADULTA, VELHICE, VELHICE AVANÇADA Introdução O ciclo de vida completo foi estudado por Erik Erikson (1976a, 1976b, 2000), que o dividiu em oito estágios. Contudo, a expectativa de vida aumentou muito depois da escrita de sua teoria na década de 1940. Após a morte do autor, a sua esposa Joan Erikson acrescentou mais um estágio, o da velhice avançada. Neste capítulo, você conhecerá três estágios do ciclo vital, de acordo com a teoria do desenvolvimento psicossocial. São o sétimo, o oitavo e o nono, respectivamente, idade adulta, velhice e velhice avançada. Após a apresentação dos estágios, você encontrará um quadro síntese, com os oito primeiros estágios, elaborado pelo próprio Erikson. ANOTE ISTO • Expectativa de vida – Idade estimada que será atingida por uma pessoa ou um grupo ou uma população, que tenha nascido em certa época e em certo lugar. • Longevidade – O tempo que, de fato, vive uma pessoa ou um grupo ou uma população. Sétimo estágio: Idade adulta O sétimo estágio do desenvolvimento psicossocial é o da adultez intermediária, que vai dos 31 aos 60 anos. Na época em que Erikson propôs essa faixa etária, a expectativa de vida era bastante diferente da atual. Atualmente, considera-se que a adultez intermediária, também conhecida como meia idade, inicia aos 40 anos de idade e vai até os 60 anos de idade ou 65 anos, no caso dos países desenvolvidos. PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 48 A idade adulta é marcada, como os demais estágios, por vários desafios, com a necessidade de uma nova identidade, tanto individual como social e, segundo Erickson (1976a, 1976b, 2000), é marcada pelo conflito entre generatividade X estagnação. O modo de adaptação é a procriatividade, sendo o cuidado a sua a força básica, enquanto a rejeição é o seu aspecto patológico. O interesse por essa fase da vida, da mesma forma que a infância e a adolescência, também é recente. Em função do aumento da expectativa de vida da população, o termo apareceu pela primeira vez em um dicionário no ano de 1895, de acordo com Lachmann (2004). A delimitação das faixas etárias tem apresentado variação em função de mudanças demográficas que estão ocorrendo no mundo todo em que a expectativa de vida vem aumentando, inclusive no Brasil (IBGE). A meia idade ou adultez intermediária “pode ser um tempo de declínio e perda, ou de domínio, competência e crescimento”, sendo que variados fatores colaboram para isso, tais como “a saúde, gênero, raça/etnia, o nível socioeconômico, a coorte e a cultura, bem como a personalidade, a situação conjugal e parental e o emprego” (PAPALIA; MARTORELL, 2022, p. 1659). A meia idade costumava ser analisada apenas nas relações com os filhos e com os pais já idosos, porém, atualmente, vem se destacando mais a possibilidade de mudanças que esse estágio oferece (LACHMAN, 2004). Segundo Erikson (1976b), o sétimo estágio também tem seu desafio, cujo desfecho pode ser positivo ou negativo. Você compreenderá, na sequência, o que significa o conflito generatividade X estagnação. Generatividade é a capacidade de deixar um legado para as futuras gerações, por meio de uma contribuição à sociedade. Erikson (2000, p. 67) salienta que a virtude presente nessa capacidade é o cuidado: “um compromisso amplo no sentido de cuidar das pessoas, dos produtos e das ideias com as quais a pessoa aprendeu a se importar”. A estagnação, ao contrário, ocorre quando as pessoas não conseguem encontrar um significado, não conseguem deixar um legado, tornando-se mais “centradas em si mesmas, indulgentes e estagnadas” (PAPALIA; MARTORELL, 2022, p. 1760). Na medida em que na meia idade os filhos já cresceram e a carreira já está consolidada, pode surgir a generatividade, que se caracteriza por um interesse não só pelos próprios filhos, mas com o futuro da sociedade em geral. Por outro lado, as pessoas “que não chegam a formar um senso de generatividade caem num estado de absorção em si mesmas, em que as necessidades e comodidades pessoais são a preocupação dominante”, chamado de estagnação (ELKIND, 1978, p. 3). PSICOLOGIA DE DESENVOLVIMENTO E DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR PROF.a TANIA BEATRIZ IWASZKO MARQUES FACULDADE CATÓLICA PAULISTA | 49 A generatividade tem múltiplas formas de manifestação, podendo ser, entre outras coisas, “por meio de ensino ou aconselhamento, da produtividade ou criatividade, da autogeração ou do autodesenvolvimento” (PAPALIA; MARTORELL, 2022, p. 1763). As pessoas que apresentam níveis mais altos de generatividade são as mesmas que apresentam mais satisfação com a vida (McADAMS; AUBIN, 1992). Na Figura 1, a generatividade se manifesta pela dedicação a uma nova área, a música, mas poderia ser por meio da vida política, da religião, as artes, do voluntariado etc. Figura 1. Vida adulta Fonte: Acervo pessoal da autora. Para Wethington (2000), não é muito correto falar em crise da meia idade, pois nem todas as pessoas passam por ela e conflitos existem em todos os estágios. Como em todos os outros estágios, existe um conflito a ser enfrentado, consistindo em “uma transição psicológica que envolve mudanças ou transformações significativas na percepção do significado, propósito ou direção da própria vida” (PAPALIA;
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