Logo Passei Direto
Buscar

Ferramentas de estudo

Material
páginas com resultados encontrados.
páginas com resultados encontrados.
left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

Prévia do material em texto

2013
História Medieval
Prof. Fabiano Dauwe
Prof. Thiago Juliano Sayão
Prof. Itamar Siebert
Copyright © UNIASSELVI 2013
Elaboração:
Prof. Fabiano Dauwe
Prof. Thiago Juliano Sayão
Prof. Itamar Siebert
Revisão, Diagramação e Produção:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI
Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri 
UNIASSELVI – Indaial.
 930
 D244h Dauwe, Fabiano
 História medieval / Fabiano Dauwe; Thiago Juliano Sayão; 
 Itamar Siebert. Indaial : Uniasselvi, 2013.
 
 284 p. : il
 
 ISBN 978-85-7830- 717-2
1. História do mundo antigo. 2. História medieval.
 I. Centro Universitário Leonardo da Vinci.
III
apresentação
Prezado(a) acadêmico(a)!
Nesta disciplina, vamos estudar a Idade Média. É um período histórico 
fascinante, que nos “transporta” facilmente a um mundo fantástico, repleto 
de guerreiros bárbaros, servos feudais, cavaleiros em armaduras, cruzados 
e sarracenos. Esse parece ser um mundo tão distante do nosso e, ao mesmo 
tempo, tão familiar que mexe profundamente com a nossa imaginação, 
como comprova a enorme quantidade de livros, seriados, contos de fadas 
e filmes que existem sobre a Idade Média; para completar, o período parece 
(especialmente há alguns anos) “estar na moda”.
O objetivo deste Caderno de Estudos, além de transmitir a você alguns 
conhecimentos sobre os acontecimentos que são tradicionalmente estudados 
nesse período - e que realmente são importantes -, é quebrar em parte a visão 
tradicional e limitada sobre esse período de mil anos. Ao contrário do que 
acredita o senso comum, a Idade Média foi um período repleto de inovações 
tecnológicas, mudanças sociais, econômicas e demográficas profundas e 
constantes, intensas trocas culturais e uma economia comercial fortemente 
globalizada, em que a cultura letrada foi preservada e, em determinadas 
partes do mundo, floresceu como nunca havia acontecido antes.
Se toda essa imagem nova parece estranha, considerando o que 
sabemos sobre a Idade Média na Europa, isso ficará claro quando observarmos 
esse período a partir de uma perspectiva diferente. Não apenas vamos repensar 
o que ocorreu na própria Europa (e como isso ocorreu), mas também veremos 
a história de outras regiões muito mais dinâmicas, naquela época, do que a 
sociedade agrária, fechada e beligerante que surgiu com o fim do Império 
Romano do Ocidente. Há muito mais na Idade Média do que a Europa, e 
desfazer essa imagem eurocêntrica é fundamental para entendermos não 
apenas o período que desejamos estudar como o próprio período histórico em 
que vivemos. Hoje, não é mais possível olharmos para o mundo simplesmente a 
partir de um predomínio dos países tradicionalmente poderosos: o mundo está 
fragmentado demais, geopoliticamente falando, para que isso seja suficiente.
O caderno que você tem em mãos é uma reformulação da edição 
original. Nesta versão, algumas discussões foram ampliadas, outras foram 
inseridas. A estrutura do caderno foi ligeiramente alterada, mas manteve-se 
uma organização baseada, na medida do possível, em critérios cronológicos.
A primeira unidade deste caderno trata dos primórdios da Idade 
Média; inicialmente, uma discussão teórica e historiográfica sobre o seu 
significado, seguida dos eventos fundantes desse período: a queda do Império 
IV
Romano, a política e a religião nos primeiros séculos, tanto na Europa quanto 
no novo mundo muçulmano.
 A segunda unidade concentra-se nas grandes civilizações da época e 
suas realizações: Império Romano do Oriente (Bizantino), mundo islâmico e 
Europa feudal. 
A terceira unidade trata dos eventos que transformaram a sociedade 
feudal e deram origem ao mundo moderno que será objeto de estudos futuros: 
as Cruzadas, o avanço mongólico e a chamada Baixa Idade Média.
A intenção deste caderno não é esgotar o tema, mas dar a você uma 
visão muito resumida do que um professor de História precisa saber para 
ensinar Idade Média aos seus alunos em sala de aula.
 Alguns dos temas aqui abordados talvez não estejam no currículo 
tradicional das escolas. No entanto, é fundamental que você tenha em mente, 
o tempo todo, que, se deseja ser um bom professor, terá que conhecer muito 
bem o assunto que ensinará, o que significa, no mínimo, conhecer mais do que 
o material que utilizará em sala de aula. Este caderno não pode, nem pretende 
apresentar tudo: em vez disso, o objetivo é trazer uma visão diferente sobre 
aquela história contada, para que você possa observar os livros de História 
com um olhar mais crítico. 
Portanto, não cometa o erro de ler pouco sobre algum tema ou de 
achar que algumas páginas (ou alguns tópicos resumidos) dirão tudo o que 
você precisa saber sobre um assunto. 
Não pare e tenha sempre em mente as razões que levaram você a 
desejar saber o suficiente sobre isso para ser capaz de ensinar outras pessoas.
Bons estudos!
Fabiano Dauwe
Thiago Juliano Sayão
Itamar Siebert
V
UNI
Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para 
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, 
há novidades em nosso material.
Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o 
material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato 
mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. 
O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação 
no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir 
a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.
Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, 
apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade 
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. 
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para 
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto 
em questão. 
Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas 
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa 
continuar seus estudos com um material de qualidade.
Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de 
Desempenho de Estudantes – ENADE. 
 
Bons estudos!
Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos 
materiais ofertados a você e dinamizar ainda mais 
os seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza materiais 
que possuem o código QR Code, que é um código 
que permite que você acesse um conteúdo interativo 
relacionado ao tema que você está estudando. Para 
utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos 
e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar 
mais essa facilidade para aprimorar seus estudos!
UNI
VI
VII
UNIDADE 1 - AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA ........................................................................... 1
TÓPICO 1 - INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS SOBRE A IDADE MÉDIA ................................. 3
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 3
2 SOBRE O CONCEITO DE IDADE MÉDIA ................................................................................... 4
 2.1 A IDADE MÉDIA E O SENSO COMUM .................................................................................... 4
 2.2 OS SIGNIFICADOS DA IDADE MÉDIA .................................................................................... 6
 2.2.1 Imaginando ................................................................................................................................ 6
 2.2.2 O problema em julgar o passado ............................................................................................6
 2.2.3 Evitando o anacronismo .......................................................................................................... 7
 2.2.4 O conceito de “idade média” é anacrônico! .......................................................................... 8
3 O CONCEITO DE IDADE MÉDIA APÓS O RENASCIMENTO .............................................. 9
 3.1 NA REFORMA RELIGIOSA ......................................................................................................... 9
 3.2 NO ILUMINISMO .......................................................................................................................... 9
 3.3 O ROMANTISMO E A IDADE MÉDIA ..................................................................................... 10
 3.4 A PERSPECTIVA LIBERAL ........................................................................................................... 11
 3.5 A PERSPECTIVA MARXISTA ....................................................................................................... 12
4 CONCEITOS MODERNOS ............................................................................................................... 12
5 FAZ SENTIDO FALAR EM “UMA” IDADE MÉDIA? ................................................................. 13
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. 15
RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... 17
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 18
TÓPICO 2 - A IDADE MÉDIA NA HISTORIOGRAFIA .............................................................. 19
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 19
2 TEORIAS SOBRE O INÍCIO DA IDADE MÉDIA ....................................................................... 20
 2.1 A IDADE MÉDIA E A QUEDA DO IMPÉRIO ROMANO ....................................................... 20
 2.1.1 Os contemporâneos: Vegécio e Salviano ............................................................................... 20
 2.1.2 Uma visão Iluminista: Gibbon e a “decadência moral” ...................................................... 21
 2.1.3 Os grandes sistemas civilizadores: Toynbee ......................................................................... 22
 2.2 A TEORIA DOS MÚLTIPLOS FATORES .................................................................................... 22
 2.3 TEORIAS DO COLAPSO AMBIENTAL ...................................................................................... 24
 2.4 TEORIAS DA TRANSFORMAÇÃO ............................................................................................ 25
3 TEORIAS SOBRE O FINAL DA IDADE MÉDIA ......................................................................... 27
 3.1 A TEORIA CLÁSSICA ................................................................................................................... 27
 3.2 A EXPLICAÇÃO A PARTIR DAS PERIODIZAÇÕES ............................................................... 28
 3.3 JACQUES LE GOFF E A “LONGUÍSSIMA IDADE MÉDIA” .................................................. 29
 3.4 QUAL PERIODIZAÇÃO ADOTAR? .......................................................................................... 30
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. 31
RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................................... 34
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 35
TÓPICO 3 - ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA ....................................................... 37
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 37
suMário
VIII
2 O AUGE E A DECADÊNCIA DO IMPÉRIO ROMANO ............................................................. 37
 2.1 POR QUE A DECADÊNCIA? ....................................................................................................... 39
 2.1.1 O fim das conquistas militares ................................................................................................ 39
 2.1.2 A crise do século III .................................................................................................................. 40
 2.2 OS REFORMADORES: DIOCLECIANO E CONSTANTINO .................................................. 43
 2.3 AS ORIGENS REMOTAS DO FEUDALISMO ............................................................................ 45
3 OS BÁRBAROS NO IMPÉRIO DO OCIDENTE .......................................................................... 47
 3.1 OS HUNOS ...................................................................................................................................... 48
 3.2 A QUEDA DE ROMA .................................................................................................................... 50
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. 51
RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 54
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 55
TÓPICO 4 - O ESTADO E A IGREJA NA IDADE MÉDIA ............................................................ 57
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 57
2 OS REINOS BÁRBAROS ................................................................................................................... 57
3 O REINO FRANCO ............................................................................................................................. 60
 3.1 O REINADO DE CARLOS MAGNO ........................................................................................... 62
 3.1.1 O Renascimento Carolíngio ..................................................................................................... 63
 3.1.2 A divisão do Império ................................................................................................................ 63
 3.2 NOVOS INVASORES ..................................................................................................................... 64
4 A IGREJA NA ALTA IDADE MÉDIA ............................................................................................. 65
 4.1 SANTO AGOSTINHO .................................................................................................................. 65
 4.2 O ARIANISMO ............................................................................................................................... 66
 4.3 OS BÁRBAROS E A IGREJA ......................................................................................................... 67
 4.4 A REGRA DE SÃO BENTO ........................................................................................................... 68
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. 70
RESUMO DO TÓPICO 4 ....................................................................................................................... 73
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................74
TÓPICO 5 - AS ORIGENS DO ISLAMISMO ................................................................................... 75
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 75
2 UMA NOVA FÉ: O ISLAMISMO ..................................................................................................... 76
 2.1 OS PRIMÓRDIOS: A ARÁBIA DO SÉCULO VII ....................................................................... 77
 2.2 MAOMÉ E A CRIAÇÃO DO ISLAMISMO ................................................................................ 78
 2.3 MORTE E SUCESSÃO DE MAOMÉ ............................................................................................ 79
3 OS PRINCÍPIOS BÁSICOS DO ISLAMISMO ............................................................................. 80
 3.1 OS CINCO PILARES DO ISLÃ ..................................................................................................... 82
 3.2 O ALCORÃO ................................................................................................................................... 83
 3.3 O DIREITO ISLÂMICO: OS HADITHS, AS SUNAS E A SHARIA ......................................... 85
 3.3.1 As escolas de interpretação da lei ........................................................................................... 86
 3.4 O MODELO DE CONDUTA DO PROFETA .............................................................................. 87
 3.5 O MISTICISMO ISLÂMICO: O SUFISMO .................................................................................. 87
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. 89
RESUMO DO TÓPICO 5 ....................................................................................................................... 92
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 93
UNIDADE 2 - O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS ............................................... 95
TÓPICO 1 - A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL ........................................... 97
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 97
2 AS ORIGENS DO IMPÉRIO ROMANO DO ORIENTE ............................................................. 98
 2.1 A QUEDA DO IMPÉRIO ROMANO NA PERSPECTIVA ORIENTAL .................................. 98
IX
 2.2 A PERIODIZAÇÃO DA HISTÓRIA BIZANTINA .................................................................... 99
 2.3 O REINADO DE JUSTINIANO .................................................................................................... 100
 2.3.1 A revolta de Nika ...................................................................................................................... 101
 2.3.2 As reformas de Justiniano ........................................................................................................ 102
 2.4 A TRANSFORMAÇÃO DO IMPÉRIO ........................................................................................ 103
 2.5 AS PERDAS BIZANTINAS NA ÁFRICA .................................................................................... 104
3 CONSTANTINOPLA .......................................................................................................................... 105
 3.1 A CIDADE ........................................................................................................................................ 107
 3.2 MÉSIA, A PRINCIPAL AVENIDA DE CONSTANTINOPLA ................................................. 108
 3.3 O HIPÓDROMO ............................................................................................................................. 111
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. 113
RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... 115
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 116
TÓPICO 2 - RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL ...................... 117
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 117
2 AS CONTROVÉRSIAS RELIGIOSAS BIZANTINAS ................................................................. 117
 2.1 O NESTORIANISMO ..................................................................................................................... 117
 2.2 A ICONOCLASTIA ........................................................................................................................ 118
 2.2.1 A justificativa teológica do conflito ........................................................................................ 119
 2.2.2 As motivações sociais do conflito ........................................................................................... 121
 2.3 O GRANDE CISMA ....................................................................................................................... 122
3 O AUGE DO IMPÉRIO DO ORIENTE: A DINASTIA MACEDÔNICA ................................. 125
 3.1 A CRISTIANIZAÇÃO DA RÚSSIA ............................................................................................. 126
4 A DECADÊNCIA ................................................................................................................................. 128
 4.1 MOTIVOS ECONÔMICOS E POLÍTICOS DO DECLÍNIO DE 
 CONSTANTINOPLA ..................................................................................................................... 128
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. 132
RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................................... 135
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 136
TÓPICO 3 - A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO 
 ISLAMISMO ..................................................................................................................... 137
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 137
2 O AVANÇO MUÇULMANO ............................................................................................................. 137
 2.1 O CALIFADO RASHIDUN ........................................................................................................... 139
 2.2 O CALIFADO OMÍADA ................................................................................................................ 140
 2.3 O CALIFADO ABÁSSIDA ............................................................................................................. 142
 2.4 A PAX ISLAMICA E A QUEBRA DA UNIDADE ...................................................................... 143
3 MAIS POVOS SE UNEM AO ISLÃ ................................................................................................. 144
 3.1 A CONQUISTA DO MAGREBE E DE AL- ANDALUS ............................................................ 144
 3.2 OS TURCOS E OS MONGÓIS ...................................................................................................... 146
 3.3 A AMPLITUDE DOS DOMÍNIOS MUÇULMANOS: DA ÁFRICA À CHINA .................... 1474 A CULTURA MUÇULMANA ............................................................................................................ 148
 4.1 AS ARTES ........................................................................................................................................ 148
 4.1.1 Os arabescos .............................................................................................................................. 148
 4.1.2 A caligrafia ................................................................................................................................. 149
 4.1.3 A arquitetura ............................................................................................................................. 150
 4.1.4 Literatura .................................................................................................................................... 151
 4.1.5 Outras artes ................................................................................................................................ 152
 4.2 A FILOSOFIA E AS CIÊNCIAS ..................................................................................................... 152
 4.2.1 A Educação ................................................................................................................................ 152
X
 4.2.2 A Filosofia .................................................................................................................................. 152
 4.2.3 As ciências ................................................................................................................................. 153
 4.3 AS MULHERES E O ISLAMISMO ............................................................................................... 154
 4.4 O ISLÃ E OS “INFIÉIS” ................................................................................................................. 156
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. 157
RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 159
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 160
TÓPICO 4 - O FEUDALISMO .............................................................................................................. 161
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 161
2 SOBRE O CONCEITO DE FEUDALISMO .................................................................................... 161
 2.1 AS ORIGENS DO CONCEITO DE FEUDALISMO ................................................................... 162
 2.2 CRÍTICAS AO CONCEITO DE FEUDALISMO ......................................................................... 163
 2.3 OS FEUDALISMOS: LOMBARDIA, GRÃ-BRETANHA E OUTROS 
 LUGARES ........................................................................................................................................ 164
3 OS MODELOS DE FEUDALISMO .................................................................................................. 165
 3.1 O MODELO CLÁSSICO DE FEUDALISMO .............................................................................. 165
 3.1.1 A homenagem ........................................................................................................................... 165
 3.1.2 O feudo ....................................................................................................................................... 166
 3.1.3 As obrigações servis ................................................................................................................. 167
 3.2 A PERSPECTIVA MARXISTA ....................................................................................................... 167
4 AS ORIGENS DO FEUDALISMO ................................................................................................... 169
 4.1 A FRAGMENTAÇÃO DO IMPÉRIO CAROLÍNGIO ................................................................ 169
 4.2 OUTROS FATORES ........................................................................................................................ 169
 4.3 EM RESUMO ................................................................................................................................... 171
5 FUGINDO AO ESQUEMA ................................................................................................................ 171
 5.1 REVENDO CONCEITOS ............................................................................................................... 172
 5.2 AS COMUNICAÇÕES ................................................................................................................... 172
 5.3 A ECONOMIA ................................................................................................................................ 173
 5.4 A NATUREZA E O TEMPO MEDIEVAIS ................................................................................... 174
6 O AUGE DO FEUDALISMO ............................................................................................................. 174
 6.1 O FIM DAS INVASÕES BÁRBARAS ........................................................................................... 176
 6.2 A PRIMOGENITURA ..................................................................................................................... 176
 6.3 A PRESSÃO ECONÔMICA ........................................................................................................... 178
 6.4 A EXPANSÃO INTERNA DA SOCIEDADE .............................................................................. 178
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. 180
RESUMO DO TÓPICO 4 ....................................................................................................................... 182
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 184
UNIDADE 3 - A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES .................................................... 185
TÓPICO 1 - AS TRANSFORMAÇÕES DO SÉCULO XI E AS CRUZADAS .............................. 187
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 187
2 AS ORIGENS HISTÓRICAS DAS CRUZADAS .......................................................................... 187
 2.1 O SÉCULO XI, PERÍODO DE CONQUISTAS ............................................................................ 187
 2.1.1 Os turcos seljúcidas .................................................................................................................. 187
 2.1.2 Os primeiros tempos da reconquista ibérica ........................................................................ 188
 2.1.3 As conquistas normandas ........................................................................................................ 189
 2.2 A CRISE NA IGREJA NO SÉCULO XI ........................................................................................ 190
 2.3 A ECONOMIA EUROPEIA NO SÉCULO XI ............................................................................. 191
 2.4 O CONCÍLIO DE CLERMONT .................................................................................................... 191
3 AS MOTIVAÇÕES PARA AS CRUZADAS ................................................................................... 191
XI
 3.1 MOTIVAÇÕES ECONÔMICAS ...................................................................................................191
 3.2 MOTIVAÇÕES RELIGIOSAS ........................................................................................................ 192
 3.3 MOTIVAÇÕES POLÍTICAS .......................................................................................................... 192
4 AS CRUZADAS .................................................................................................................................... 193
 4.1 OUTRAS CRUZADAS ................................................................................................................... 195
 4.2 O FIM DAS CRUZADAS ............................................................................................................... 195
 4.3 AS CRUZADAS VISTAS PELOS ÁRABES ................................................................................. 196
 4.4 AS PERSEGUIÇÕES AOS JUDEUS NAS CRUZADAS ............................................................. 200
RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... 201
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 203
TÓPICO 2 - AS CONQUISTAS MONGÓLICAS ............................................................................. 205
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 205
2 A ÁSIA CENTRAL ANTES DE GENGIS KHAN .......................................................................... 206
 2.1 A CHINA DA DINASTIA TANG ................................................................................................. 206
 2.2 A ROTA DA SEDA ......................................................................................................................... 208
3 GENGIS KHAN E AS CONQUISTAS MONGÓLICAS .............................................................. 210
 3.1 A EXPANSÃO MONGOL .............................................................................................................. 211
 3.2 SOB DOMÍNIO MONGÓLICO ................................................................................................... 212
 3.3 A PAX MONGOLICA .................................................................................................................... 213
4 CONSEQUÊNCIAS DAS INVASÕES MONGÓLICAS .............................................................. 214
 4.1 NA CHINA ...................................................................................................................................... 214
 4.2 NO MUNDO MUÇULMANO ...................................................................................................... 215
 4.3 NA EUROPA ................................................................................................................................... 216
RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................................... 218
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 219
TÓPICO 3 - A IGREJA E A CULTURA NA IDADE MÉDIA ......................................................... 221
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 221
2 A REFORMA ECLESIÁSTICA DO SÉCULO XI ........................................................................... 221
 2.1 O QUE SIGNIFICAVAM “REFORMA” E “IGREJA”? ............................................................... 222
 2.2 A IGREJA NO SÉCULO XI ............................................................................................................ 222
 2.3 O MOVIMENTO REFORMISTA .................................................................................................. 223
 2.3.1 O celibato clerical ...................................................................................................................... 223
 2.3.2 O Monasticismo ........................................................................................................................ 224
 2.3.3 Os cátaros e a Inquisição .......................................................................................................... 226
3 AS UNIVERSIDADES ........................................................................................................................ 227
4 O RENASCIMENTO DO SÉCULO XII ........................................................................................... 231
 4.1 A CONTRIBUIÇÃO GRECO-ÁRABE ......................................................................................... 231
 4.2 A REDESCOBERTA DOS CLÁSSICOS NOS ÁRABES ............................................................. 232
 4.3 A ESCOLÁSTICA ............................................................................................................................ 234
LEITURA COMPLEMENTAR 1 ........................................................................................................... 236
LEITURA COMPLEMENTAR 2 ........................................................................................................... 237
LEITURA COMPLEMENTAR 3 ........................................................................................................... 237
RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 239
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 240
TÓPICO 4 - O RENASCIMENTO COMERCIAL E URBANO ...................................................... 241
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 241
2 A ERA DO PREDOMÍNIO ISLÂMICO DO COMÉRCIO .......................................................... 241
 2.1 O EFEITO DAS CONQUISTAS MONGÓLICAS ....................................................................... 243
3 O COMÉRCIO NA EUROPA ............................................................................................................ 244
XII
 3.1 AS FEIRAS MEDIEVAIS ................................................................................................................ 245
 3.2 A FORMAÇÃO DOS BURGOS ..................................................................................................... 246
4 A VIDA URBANA NA BAIXA IDADE MÉDIA ............................................................................ 247
 4.1 DEMOGRAFIA E URBANISMO .................................................................................................. 247
 4.2 O SISTEMA CORPORATIVO ....................................................................................................... 249
 4.3 A FORMAÇÃO DA BURGUESIA ................................................................................................ 251
5 O MOVIMENTO COMUNAL E AS CIDADES LIVRES ............................................................. 253
LEITURA COMPLEMENTAR 1 ........................................................................................................... 256
LEITURA COMPLEMENTAR 2 ........................................................................................................... 257
RESUMO DO TÓPICO 4 ....................................................................................................................... 259
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 261
TÓPICO 5 - AS CORTES MEDIEVAIS ..............................................................................................263
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 263
2 AS PRIMEIRAS FORMAS DE REINTEGRAÇÃO POLÍTICA .................................................. 263
 2.1 OS EFEITOS DO COMÉRCIO ....................................................................................................... 264
 2.2 OS TIPOS DE NOBREZA FEUDAL ............................................................................................. 264
3 AS DISPUTAS ENTRE PODERES PARTICULARES E UNIVERSAIS .................................... 266
4 A GUERRA DOS CEM ANOS E O NASCIMENTO DA MONARQUIA 
 ABSOLUTISTA .................................................................................................................................... 268
5 AS MULHERES E A SOCIEDADE ................................................................................................... 270
LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................. 271
RESUMO DO TÓPICO 5 ....................................................................................................................... 272
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 273
REFERÊNCIAS ........................................................................................................................................ 275
1
UNIDADE 1
AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade tem por objetivos:
• compreender os conceitos de Idade Média formulados por historiadores 
ao longo dos tempos;
• identificar os principais fatores que levaram à queda do Império Romano 
do Ocidente;
• conhecer o processo de formação dos reinos bárbaros;
• perceber o papel que a religião desempenhou na constituição do mundo 
feudal;
• caracterizar a religião e a sociedade muçulmanas, compreendendo sua 
formação histórica.
Esta unidade está dividida em cinco tópicos. Ao final de cada um deles você 
encontrará atividades que o(a) ajudarão a refletir e fixar os conhecimentos 
abordados.
TÓPICO 1 – INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS SOBRE A IDADE MÉDIA
TÓPICO 2 – A IDADE MÉDIA NA HISTORIOGRAFIA
TÓPICO 3 – ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
TÓPICO 4 – O ESTADO E A IGREJA NA IDADE MÉDIA
TÓPICO 5 – AS ORIGENS DO ISLAMISMO
Assista ao vídeo 
desta unidade.
2
3
TÓPICO 1
UNIDADE 1
INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS SOBRE A 
IDADE MÉDIA
1 INTRODUÇÃO
Prezado(a) acadêmico(a), estamos iniciando nossos estudos sobre a Idade 
Média. É um período que você certamente já viu, muitas vezes, representado no 
cinema, em livros, na televisão e na imaginação das pessoas. Os contos de fadas, 
as histórias do Rei Arthur, os filmes e seriados sobre cavaleiros, todos parecem 
representar uma época com características muito particulares e sobre a qual 
pensamos que sabemos muito.
No entanto, essa é uma sensação perigosa. Estamos tão acostumados a ver 
uma certa representação da Idade Média e tão acostumados a pensar o período 
como a era do feudalismo, do predomínio da Igreja e dos cavaleiros, que nem nos 
damos conta de que pode haver muito mais para observar. 
Até mesmo em nossos estudos no colégio, quando estudamos alguma coisa 
sobre as invasões bárbaras, o feudalismo, as Cruzadas e o renascimento urbano, 
acreditamos que isso dá conta de explicar o início, o desenvolvimento e o final 
da Idade Média. Isso, claro, para não falar do rótulo “medieval” que as piores 
coisas recebem: fala-se em “condições de tratamento medievais”, “instrumentos 
de tortura medievais”, “mentalidades medievais” e “técnicas de produção 
medievais”. Nesses casos, a palavra medieval significa, respectivamente: “atroz”, 
“cruéis”, “retrógradas” e “rudimentares”. Essas descrições, além de historicamente 
incorretas, traduzem uma falta de cuidado tremenda com as palavras e reforçam 
estereótipos absurdos.
Ao mesmo tempo, existe outra questão fundamental que precisa ser levada 
em consideração. A história da Idade Média, como a estudamos, padece de um vício 
muito grave de eurocentrismo. Ou seja, está completamente focada na história da 
Europa,- mais especificamente da Europa Ocidental: França, Alemanha, Inglaterra 
-, e ignora completamente outras regiões, como o mundo muçulmano, onde uma 
cultura, muito distinta, estava em seu auge.
Este Caderno de Estudos tem uma dupla finalidade: ao mesmo tempo 
pretende transmitir a você informações essenciais sobre essas características da 
Idade Média e provocar em você o questionamento dessa visão tão unilateral e 
eurocêntrica.
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
4
Quando isso acontecer, você verá uma época completamente diferente: 
dinâmica, inovadora e vibrante, simplesmente o oposto da tradicional e injusta 
imagem de “Idade das Trevas”.
2 SOBRE O CONCEITO DE IDADE MÉDIA
Antes de iniciarmos os estudos sobre a Idade Média, é importante discutir 
os significados desse conceito. Como você vai perceber, não falaremos ainda neste 
tópico o que a Idade Média foi, nem como surgiu, caracterizou-se ou terminou. 
Teremos muito tempo para isso neste caderno. Este tópico servirá para discutirmos 
o próprio sentido do termo Idade Média e os cuidados que devemos ter ao analisá-
lo. 
Vamos, por enquanto, apenas supor que você tem uma noção do que 
signifique Idade Média, que você aprendeu no Ensino Médio e talvez tenha 
complementado com algumas leituras próprias. É exatamente essa visão que nos 
interessa por enquanto, porque essa é, provavelmente, a visão que seus futuros 
alunos terão quando começarem a ter aulas sobre o assunto.
2.1 A IDADE MÉDIA E O SENSO COMUM
Dificilmente vamos encontrar algum período histórico tão carregado de 
imagens errôneas e caricaturais quanto a Idade Média. Você conhece muito bem 
várias delas: encontra essas imagens com frequência na televisão, no cinema e em 
outros meios de comunicação e na fala das pessoas. É muito provável que você 
mesmo carregue vários desses preconceitos e nem saiba. Mas, para estudarmos 
adequadamente a Idade Média, precisamos antes tomar consciência disso.
AUTOATIVIDADE
Prezado(a) acadêmico(a), vamos fazer uma pesquisa? Entreviste dez ou 
mais pessoas que você conhece, de preferência de diferentes idades e origens 
sociais, fazendo-lhes as seguintes perguntas: “O que você sabe sobre a Idade 
Média?” e “Como você sabe disso?” Ah! Não se esqueça de também responder 
às perguntas VOCÊ MESMO, de preferência ANTES de seguir adiante em suas 
leituras e de entrevistar os seus conhecidos!
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS SOBRE A IDADE MÉDIA
5
As respostas provavelmente vão girar em torno de diversas ideias 
preconcebidas e clichês, como o cavaleiro andante salvando uma donzela presa 
na torre do castelo, matando dragões ou derrubando os adversários com sua 
lança nos torneios; a Inquisição e seus cruéis métodos de tortura, Rei Arthur e 
os cavaleiros da Távola Redonda, os servos explorados pelos senhores feudais e 
pela Igreja; bárbaros saqueando tudo o que viam pela frente, nobres vestidos em 
roupas de couro rudimentar e armaduras de metal prestando homenagens uns aos 
outros e forjando alianças militares, padres obesos e beberrões e dezenas de outros 
estereótipos.
Provavelmente, ninguém (a menos que você entreviste um estudioso do 
assunto) descreverá a Idade Média como uma época de inovações tecnológicas e 
filosóficas; do surgimento de culturas inovadoras, da invenção do amor cortês e de 
alguns dos nossos costumes de higiene mais básicos.
 No entanto, a Idade Média real geralmente está mais próxima disso do que 
dos clichês do senso comum, que, às vezes, são pura ficção, como no caso do Rei 
Arthur e seus cavaleiros, dos dragões e, também, das donzelas nas torres.
Prezado(a) acadêmico(a), se você já é, ou quando se tornar professor, que tal 
solicitar aos alunos uma pesquisa sobre algum evento histórico da épocaocorrido fora da 
Europa durante esse período.
Mas, provavelmente, o clichê (ou, antes, o chavão) mais comum será o apelido 
de Idade das Trevas, que esse período histórico ganhou há muito tempo e do qual 
ainda não foi possível livrá-lo. 
Cabe a nós, como historiadores e professores de História, tentar mudar a ideia 
que as pessoas têm sobre a Idade Média, criticando as imagens que são difundidas 
por nossa cultura e demonstrando a importância crucial desses mil anos, para que 
nos tornássemos o que somos hoje.
SUGESTÃO DE LEITURAS
Caro(a) acadêmico(a), veja aqui uma lista de livros dedicados a desmistificar a Idade Média:
PERNOUD, Régine. O Mito da Idade Média. Lisboa: Europa-América, 1977.
DUBY, Georges. A Europa e a Idade Média. São Paulo: Martins Fontes, 1988.
LE GOFF, Jacques. Para um novo conceito de Idade Média: tempo, trabalho e cultura no 
Ocidente. Lisboa: Estampa, 1980.
UNI
DICAS
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
6
2.2 OS SIGNIFICADOS DA IDADE MÉDIA
Agora que já tomamos consciência do nosso desconhecimento sobre a 
Idade Média, trataremos de entender o seu significado.
2.2.1 Imaginando
IMAGINE!
Prezado(a) acadêmco(a)! Antes de começar, vamos fazer um exercício de ficção!
Vamos imaginar que, por algum fenômeno misterioso, chegasse às nossas 
mãos um livro de História escrito daqui a mil anos. Esse livro contaria toda a 
história do III Milênio, desde o ano 2000 até o final do século XXX. E vamos 
imaginar que o mundo em que ele foi escrito fosse completamente diferente do 
nosso. 
Talvez uma grande crise, uma catástrofe ambiental ou mesmo uma 
transformação gradual do mundo que conhecemos criasse uma sociedade 
completamente diferente da atual. Imaginemos que a maioria das coisas que hoje 
nos parecem importantes não exista mais daqui a mil anos, ou não sejam mais 
úteis, ou tenham mudado completamente de sentido.
Neste nosso exercício de ficção, vamos imaginar, também, que os estudiosos 
do século XXXI considerem que nós vivemos hoje o momento em que a sociedade 
anterior, que eles entenderiam como organizada, começou a entrar em decadência, 
e que muita coisa ruim teria acontecido nos séculos seguintes por causa dos nossos 
preconceitos, nossos defeitos morais, das nossas escolhas erradas, ou da nossa 
inexperiência. Para completar, vamos imaginar que muitas invenções essenciais à vida 
nesse futuro só teriam sido inventadas lá pela metade do III Milênio.
2.2.2 O problema em julgar o passado
Agora, pense sobre o que você acharia de um historiador do futuro que 
descrevesse a época em que vivemos como uma era de ignorância, porque 
acreditávamos em coisas que ele considerava absurdas, fazíamos coisas que 
ele considerava ridículas, submetíamos-nos a autoridades que ele considera 
inaceitáveis, não conhecíamos muitas coisas essenciais à vida no ano 3000 e 
nos preocupávamos com coisas que, na opinião dele, eram erradas ou pouco 
importantes. E que isso tudo, para ele, é prova de que os homens do início do 
século XXI eram primitivos, ignorantes e supersticiosos, estúpidos, e que vivíamos 
em uma época de decadência. Que a época em que ele estivesse escrevendo deixou 
UNI
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS SOBRE A IDADE MÉDIA
7
2.2 OS SIGNIFICADOS DA IDADE MÉDIA para trás. E que, por isso, ele resolvesse chamar a nossa época de Idade das Trevas, 
um longo período de ignorância, superstição, estupidez generalizada e decadência.
A principal queixa que poderíamos fazer seria: 
Ei, não é justo você nos julgar por coisas que nós não podemos saber como serão 
um dia! Nós vivemos agora, não no futuro, e nossas preocupações são as que fazem sentido 
para nós hoje. Se você se preocupasse em entender como vivemos, compreenderia por que 
pensamos dessa forma e por que fazemos essas coisas. Você não está nos estudando, está só 
nos chamando de ignorantes por não sermos como você!
AUTOATIVIDADE
ANÁLISE
Tente pensar em outras argumentações que poderíamos fazer para discordar 
de uma visão tão parcial e tão inadequada sobre nós e nosso tempo. Em sua 
opinião, esse tipo de perspectiva revela mais sobre o período que está sendo 
discutido ou sobre quem está criticando? O que levaria alguém a tratar dessa 
forma uma cultura passada?
Foi exatamente isso o que fizeram os primeiros estudiosos que se 
preocuparam em descrever o período que hoje conhecemos por Idade Média! 
Entusiasmados por um enorme otimismo em relação ao mundo em que viviam, 
olharam para o milênio anterior e só conseguiram ver ignorância, superstição, 
decadência. Não que esse período que estudavam de fato fosse assim; simplesmente 
foi assim que esses estudiosos o entenderam. Tratando com desprezo essa “longa 
noite de mil anos”, chamaram-na de Idade das Trevas ou de Idade Média, um 
longo hiato entre a Idade Antiga (a época de glória de uma cultura que eles 
consideravam superior) e a sua própria, que chamaram de Renascimento, quando 
aqueles valores antigos, supostamente perdidos na ignorância anterior, foram 
recuperados
2.2.3 Evitando o anacronismo
De volta ao nosso historiador do futuro: se você fosse descrever a nossa 
época, você diria que nós vivemos hoje em um período de decadência e ignorância? 
Pode ser até que você discorde de muita coisa que existe hoje, mas 
provavelmente não chamaria o século XXI de Idade das Trevas. Muito menos diria 
que esse período é simplesmente uma preparação para um tempo no futuro em 
que as pessoas serão realmente felizes, por pensarem de uma maneira que nós nem 
sabemos ainda qual é, ou por terem tecnologias que ainda nem foram inventadas. 
Como você poderia saber o que vai acontecer no futuro?
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
8
É como imaginar alguém reclamando, lá por 1820: “Puxa vida! Seria 
muito mais fácil descobrir informações se já tivessem inventado o computador!” 
Antes de alguma coisa como essa ter sido inventada, dá para imaginar alguém se 
lamentando que ela não existisse?
Prezado(a) acadêmico(a)! Esse tipo de atitude é um anacronismo: é atribuir a uma 
certa época características de outra diferente. Nesse caso, uma retroprojeção: supor que o 
passado tem, ou deveria ter, características parecidas com o presente. Isso é uma característica 
das histórias ou das ficções históricas mal escritas, e é muito mais comum do que se imagina. 
Tente perceber alguns exemplos disso em livros de História, filmes e no senso comum! Quem 
sabe, até em frases que você mesmo já tenha ouvido ou dito...
Essa retroprojeção traz, ainda, um esnobismo cronológico: achar que, uma vez que no 
passado não existiam algumas coisas que consideramos óbvias (porque são soluções que hoje 
nós conhecemos), as pessoas que viviam naquela época seriam estúpidas. Por esse motivo, 
fizemos a brincadeira com uma era que veria a nossa época como de ignorância...
2.2.4 O conceito de “idade média” é anacrônico!
É claro que as pessoas que viveram na Idade Média não se referiam ao seu 
próprio tempo como “Idade Média”, muito menos como “Idade das Trevas”! 
Acredita-se que o termo Idade das Trevas tenha sido criado por Francesco 
Petrarca (1304-1374) por volta da década de 1330, ou seja, nos primeiros instantes 
da renovação cultural renascentista. Por ser da região da Toscana, na atual Itália, e 
um representante do período florentino do Renascimento, Petrarca entendia que a 
queda de Roma teria trazido a decadência da cultura clássica, com o surgimento de 
uma nova raça de homens violentos, analfabetos e incultos: os bárbaros. 
Assim, do ponto de vista da cultura, um véu de escuridão teria se colocado 
sobre o mundo neste período, o que justificaria entender o período anterior como 
uma Idade das Trevas.
Perceba que Petrarca viveu no século XIV – durante, portanto, o período histórico 
tradicionalmente considerado como Idade Média, que só se encerraria em 1453. De acordo 
com as periodizações históricas mais comuns, portanto, Petrarca era um ‘homem medieval’. 
Ora, se um “homem medieval” critica os “tempos medievais” anteriores e louva a sua própria 
época como diferentedisso, não lhe parece que a divisão tradicional é, pelo menos, uma 
simplificação exagerada?
NOTA
UNI
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS SOBRE A IDADE MÉDIA
9
Prezado(a) acadêmico(a), ficou claro por que não devemos julgar o passado? 
Mesmo quando dispomos de muitas fontes, sabemos tão pouco sobre o passado que não 
somos capazes de compreendê-lo razoavelmente. E mesmo se pudéssemos, que direito 
teríamos de supor que somos melhores do que os que vieram antes de nós?
Lembre-se sempre disso, pois é tentador criticar os hábitos e as decisões das pessoas do 
passado. Os historiadores não têm o direito de fazer isso e têm o dever de chamar a atenção 
de quem faz.
3 O CONCEITO DE IDADE MÉDIA APÓS O RENASCIMENTO
3.1 NA REFORMA RELIGIOSA
Durante a Reforma Religiosa (século XVI), a Idade Média foi vista como 
um momento de corrupção da Igreja Católica, quando a Igreja detinha um poder 
político e econômico enorme e os padres eram pecadores. Sendo assim, os 
reformadores podiam se apresentar como restauradores da moralidade na religião, 
como representantes de uma fé mais pura e mais simples, mais semelhante à Igreja 
primitiva. Inversamente, a Reforma Católica difundiu uma imagem da Idade 
Média como um período de harmonia religiosa, como seria de se esperar em um 
momento em que a Europa inteira seguia a “única verdadeira fé”.
Não lhe parece que a visão de Idade Média que os reformadores protestantes e 
católicos criaram dizia muito mais sobre o que eles próprios pensavam a respeito da Igreja 
Católica da época em que viviam do que sobre a Idade Média em si?
3.2 NO ILUMINISMO
Durante o Iluminismo (século XVIII), a Razão passou a ser entendida como 
a única forma de se alcançar um conhecimento verdadeiro. A Fé, nesse momento, 
passou a ser entendida como um sinal de tudo o que era atrasado e que deveria 
ser destruído, o que incluía o poder político da Igreja. Entendendo a Idade Média 
como a Idade da Fé, os iluministas tinham uma visão bastante negativa do período, 
reforçando as visões anteriores de decadência. 
O historiador inglês Edward Gibbon, um dos grandes representantes dessa 
perspectiva, foi categórico em atribuir o “declínio e queda do Império Romano” 
(título de sua grande obra) ao “triunfo da barbárie e da religião”.
NOTA
IMPORTANT
E
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
10
3.3 O ROMANTISMO E A IDADE MÉDIA
O Romantismo surgiu no final do século XVIII e ganhou força no século 
seguinte como um movimento ideologicamente oposto ao Iluminismo. 
Os românticos inverteram o sentido que os iluministas haviam dado 
para a Idade Média. Passaram a vê-la como um momento idílico, do auge da 
religiosidade, de grandes feitos de cavalaria e de exaltação dos sentimentos mais 
puros da humanidade, em oposição ao frio racionalismo e anticlericalismo dos 
iluministas e dos excessos da Revolução Francesa. 
Os nacionalistas foram buscar na Idade Média, especialmente nos últimos 
séculos, a origem de seus países, e os burgueses viam no período as origens de seu 
poder. 
Ao fazerem isso, criaram “ficções históricas” perigosas, como a ideia 
de que os países europeus foram formados por grupos étnicos coesos e que 
habitavam aquelas regiões havia muitos séculos: ideia que, no início do século XX, 
descambaria para a ideologia nazifascista. Dentre os principais “ideólogos” dessa 
verdadeira “Era de Ouro Medieval” encontram-se: o francês Jules Michelet e o 
holandês Jacob Burckhardt.
Perceba como, em todas as visões da Idade Média, do Renascimento ao 
Romantismo, o período foi analisado a partir de preconceitos dos estudiosos, motivados 
pelo momento histórico em que viviam, com isso servindo a propósitos políticos muito bem 
determinados. Ou seja, os estudiosos ‘usaram’ a Idade Média como arma política ou ideológica 
para demonstrar que seus próprios objetivos mereciam ser perseguidos.
 LEITURA!
Caro(a) acadêmico(a), para saber mais sobre a evolução do conceito de Idade Média, leia o 
texto “A Idade Média de Jacques Le Goff”, publicado em: LE GOFF, Jacques. Uma longa Idade 
Média. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008.
IMPORTANT
E
DICAS
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS SOBRE A IDADE MÉDIA
11
3.3 O ROMANTISMO E A IDADE MÉDIA 3.4 A PERSPECTIVA LIBERAL
Há uma corrente historiográfica bastante influente, de caráter liberal, que 
pautou grande parte das interpretações sobre a Idade Média que surgiram no 
século XIX e século XX. 
Essa historiografia, surgida entre os intelectuais ligados ao partido Whig 
(Liberal) inglês, entende a História como a narrativa dos eventos e circunstâncias 
que levaram a sociedade a atingir, na época atual, o que se considera o ponto 
culminante da civilização. 
Essa visão histórica extremamente otimista tem, contudo, graves problemas 
metodológicos: 
	É teleológica: considera que existe um “caminho” a ser percorrido pela 
“civilização”, e cada cultura está em um ponto determinado dele e deverá seguir 
atingindo os demais um por um.
 É unívoca: considera que o caminho que foi percorrido pela civilização ocidental 
é o único possível e que todas as “civilizações” um dia trilharão esse mesmo 
caminho. Portanto, despreza tudo o que não tiver perdurado até hoje como 
sendo uma “relíquia” sem utilidade.
 É naturalizante: considera que existem noções inquestionáveis, como se surgidas 
da natureza – “progresso”, “civilização” etc.
 É eurocêntrica – ou, antes, anglocêntrica ou francocêntrica: considera que a 
Europa é o grande centro de civilização e, como tal, a única região digna de ser 
estudada, ou concentra-se ainda mais, conforme o estudioso, na Idade Média 
inglesa ou francesa.
 É personalista: considera que os “grandes homens”, e muito raramente 
grandes mulheres, são os responsáveis, com sua iniciativa e habilidade, pela 
movimentação da História, sempre na direção “correta”, a do “progresso”. Isto 
é, para eles, o triunfo do liberalismo, ou então, com sua resiliência, tentam barrar 
esse avanço.
 É maniqueísta: identifica com o “lado certo” os “grandes homens” que 
contribuíram para tornar a civilização o que ela é hoje, e com o “lado errado” 
aqueles que supostamente tentaram opor-se a essa “torrente irresistível”.
Uma análise liberal da Idade Média perceberia, então, as mudanças 
ocorrendo pela iniciativa de pessoas como: Constantino, Justiniano, Carlos Magno, 
as Cruzadas, o Rei Ricardo Coração de Leão, dentre outros. E, sobretudo, pelos 
“burgueses”, que promoveram, com seus interesses particulares, a quebra do 
sistema feudal e sua substituição pelo sistema capitalista.
 
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
12
Em oposição a essas mudanças estariam perfilados os sarracenos, os 
senhores feudais resistentes ao capitalismo e a Igreja Católica, entre outros.
Prezado(a) acadêmico(a), essa perspectiva liberal não lhe parece, ao mesmo 
tempo, excessivamente simplista (além de preconceituosa) e perturbadoramente familiar? 
Esta é, a grosso modo, a interpretação da história que se apresenta em grande parte dos 
livros de História de nível escolar! Fora dessa perspectiva, os livros costumam trazer apenas 
breves descrições sobre os modos de produção feudal e capitalista, baseadas no pensamento 
marxista (ver a seguir), sem, contudo, tecer qualquer consideração sobre os aspectos críticos 
do marxismo.
3.5 A PERSPECTIVA MARXISTA
O marxismo entende a luta de classes como sendo a força que movimenta 
a História. Para esta perspectiva, é - a partir da tomada de consciência das classes 
sociais desfavorecidas que as revoluções acontecem e que os modos de produção 
são transformados.
 Os estudos marxistas sobre a Idade Média concentram-se, geralmente, na 
análise do feudalismo como modo de produção com características específicas e, 
em certa medida, opostas às do capitalismo que o sucedeu. 
A análise marxista tradicional não se aprofunda nas origens do feudalismo, 
tomando-o como uma realidade unívoca. Estudos marxistas mais recentes fogem 
a essa simplificação.
4 CONCEITOS MODERNOS
Você se lembra do nosso historiador do futuro,aquele que falou tão mal 
da época em que vivemos? Já reclamamos de sua parcialidade. Outra objeção a 
ele poderia ser: Além do mais, nós e você não somos assim tão diferentes. Somos todos 
seres humanos e temos as mesmas necessidades. O que muda é a forma de satisfazer essas 
necessidades e as complicações que nós inventamos para satisfazê-las ou impedir que isso 
aconteça. Sem falar que você é nosso descendente, o seu mundo surgiu a partir do nosso, e 
tudo o que você considera importante apareceu, um dia, a partir do que nós tínhamos em 
nossa época.
É em uma linha de argumentação mais próxima a essa que a historiografia 
entende a Idade Média atualmente: em vez de tentarem fazer juízos de valor ou 
“romantizar” o período, colocando os seus preconceitos e a sua visão de mundo 
nos estudos sobre a época, os historiadores preferem, hoje em dia, entender a Idade 
Média a partir do que ela realmente teria sido. 
NOTA
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS SOBRE A IDADE MÉDIA
13
Ou, então, do que podemos descobrir a partir das fontes disponíveis, 
desvendando as práticas, as mentalidades e a visão de mundo dos homens e 
mulheres medievais. Isso permite um entendimento mais adequado e mais fiel 
sobre o período, em vez de simplesmente ‘usar-se’ a Idade Média para finalidades 
indevidas, como uma propaganda política ou ideológica.
Ao fazerem isso, os historiadores vêm descobrindo uma Idade Média 
extremamente complexa, original e carregada de inovações tecnológicas e culturais, 
em uma imagem muito diferente daquela que a maioria das pessoas tem como 
verdadeira. Cabe a nós, historiadores e professores de História, a transmissão dessa 
nova ideia e, aos poucos, a mudança do senso comum a respeito deste período tão 
longo, tão importante e tão fascinante da história do Ocidente. 
Jacques Le Goff é um historiador filiado à chamada Ecole des Annales, movimento 
historiográfico francês surgido no início do século XX a partir das obras de Marc Bloch e Lucien 
Febvre, que contou com os trabalhos de historiadores como Fernand Braudel, Georges Duby e 
outros. Na perspectiva dos Annales, o historiador deve buscar fazer uma “história total”. Ou seja, 
compreender a história da forma mais ampla possível, levando em consideração muito mais 
do que a economia ou a política: categorias como mentalidades, imaginário e representações 
tornam-se importantes. A perspectiva de Le Goff sobre a Idade Média é tributária dessa 
abordagem.
A Idade Média foi uma época de inúmeras inovações tecnológicas. Para saber 
mais a respeito, sugerimos a leitura de:
BARK, William Carroll. Origens da Idade Média. Riao de Janeiro: Zahar, 1979, p. 125-140, ou o 
artigo de Ênio José Toniolo, “O progresso técnico na Idade Média”, disponível em:<http://www.
lepanto.com.br/EstPrgIdM.html>.
5 FAZ SENTIDO FALAR EM “UMA” IDADE MÉDIA?
A imagem simplista que temos da Idade Média não consegue dar conta de 
descrever praticamente nada desse período. Na verdade, a imagem de cavaleiros 
andantes e senhores feudais, além de ser uma ficção que simplifica exageradamente 
essa época - só corresponderia ao período final da Idade Média da Europa Ocidental, 
e, mesmo assim, representa melhor algumas regiões europeias do que outras. Todo 
o período inicial, entre a queda de Roma e a consolidação do feudalismo – que é o 
período tratado nesta Unidade 1 –, exige uma descrição muito diferente dessa. Da 
mesma forma, o sistema feudal que vai existir nessa região (e só entre os séculos 
NOTA
DICAS
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
14
X a XIII, aproximadamente) é muito diferente do formato muito mais brando, 
que vigorou no Império Bizantino, e absolutamente distinto do modo de vida dos 
muçulmanos nos primeiros séculos do Islã – que serão vistos na Unidade 2. 
Além disso, o feudalismo da Europa Ocidental muito diferente em cada 
região. Foi mais “típico”, digamos assim, na França e na Alemanha do que na Itália 
e em Portugal. E como teria sido na Rússia? Na Suécia? No norte da Espanha? Na 
Polônia? E isso para nem mencionarmos o Egito, a África ao sul do Saara, a China, 
as estepes da Mongólia, o Sudeste Asiático, o Japão... Muito menos o continente 
americano!
Como você pôde perceber, o conceito de Idade Média foi criado por estudiosos 
europeus para explicar a história de suas regiões de origem – sem levar em consideração se 
as características de outras regiões, como o mundo islâmico ou o Império Bizantino, eram 
ou não semelhantes a essas. Ou seja, o conceito de Idade Média é eurocêntrico! Precisamos 
questionar esse eurocentrismo e buscar interpretações sobre o mundo mais globais. Por que 
é que nós, no Brasil do século XXI, contamos a história da forma como os europeus a viam no 
século XIX e esquecemos que existia muita coisa no mundo fora de lá?
Em resumo, temos que ter cuidado ao estudar a Idade Média, para não 
cairmos numa simplificação exagerada, que termina por prejudicar a nossa 
compreensão sobre o período. Pior ainda, se generalizarmos as características 
da Idade Média, transformando-a em uma “idade do feudalismo”, estaremos 
falseando a verdade, ignorando aspectos essenciais dessa própria história ou, 
mesmo, apresentando os elementos “externos” a ela (como os muçulmanos) sob um 
ponto de vista maniqueísta, como as grandes ameaças (felizmente malsucedidas) 
à “nossa” cultura. Ou seja, estaremos recaindo nos mesmos preconceitos e 
supersimplificações que desejamos e precisamos combater.
Maniqueísmo é quando se pressupõe que existem apenas dois lados possíveis em 
uma determinada questão, um deles identificado com o “bem” e o outro com o “mal”.
Caro(a) acadêmico(a)! Régine Pernoud (1909-1998), historiadora e 
arquivista francesa, foi uma grande especialista em Idade Média, e deu muito 
destaque à presença feminina nesse período. Apresentamos aqui um trecho de seu 
livro Pour en finir avec le Moyen Age (traduzido em Portugal como “O mito da Idade 
UNI
NOTA
TÓPICO 1 | INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS SOBRE A IDADE MÉDIA
15
Média”), no qual ela se dedica a atacar os preconceitos comuns sobre o tema. Neste 
trecho, Pernoud fala sobre as origens do feudalismo e sobre o choque de culturas 
na época.
Um poder centralizado ao último ponto, o do Império Romano, desmorona-
se no decurso do século V. Na confusão que se segue, os poderes locais manifestam-
se; é por vezes um chefe de grupo que reúne à sua volta os seus companheiros de 
aventuras; outras vezes, também o senhor dum domínio que tenta assegurar à sua 
sociedade e a si próprio uma segurança que o Estado já não garante. 
Com efeito, as trocas tornam-se difíceis, pois o exército já lá não está para 
conservar nem fiscalizar as estradas; por isso, mais do que nunca, a terra é a única 
fonte de riqueza. Essa terra é preciso protegê-la. Não se vê nascer hoje em alguns 
países, onde os pacíficos habitantes se consideram ameaçados pelo aumento da 
delinquência, polícias semelhantes? Isso pode fazer compreender o que se produziu 
então; um pequeno cultivador, impotente para assegurar sozinho a sua segurança 
e a da sua família, dirige-se a um vizinho poderoso que tem a possibilidade de 
manter homens armados, este consente em defendê-lo, em troca do que este lhe 
dará uma parte das suas colheitas. 
Um beneficiará duma garantia, o outro, o senhor, senior, o ancião, o patrão 
ao qual se dirigiu, achar-se-á mais rico, mais poderoso e, portanto, mais capaz 
de exercer a proteção que se espera dele. Finalmente, mesmo que se trate da pior 
das hipóteses, imposta pelas circunstâncias difíceis, em princípio, o mercado 
aproveitará tanto de um como de outro. É um acto de homem para homem, um 
contrato mútuo que a autoridade superior não sanciona, e não sem motivo, mas 
que se conclui sob juramento, numa altura em que o juramento, sacramentum, acto 
sagrado, tem um valor religioso.
Tal é, em geral, o esquema das relações que se criam nos séculos V e VI; 
certamente que as modalidades são muito diversas, segundo as circunstâncias 
de tempo e de lugar; elas conduzem, em definitivo, a esse estadoque se chama, 
muito justamente, feudal. Baseia-se, com efeito, no fief, feodum. O termo, de 
origem germânica ou celta, designa o direito que se desfruta sobre qualquer bem, 
geralmente uma terra: não se trata duma propriedade, mas dum usufruto, dum 
direito de uso.
A evolução precipita-se devido à mistura de populações que se faz na 
época. O movimento de migração, que se chama as grandes invasões, nos séculos 
V e VI, nem sempre teve o aspecto de conquista violenta que lhe supõem; muitos 
povos — pensemos, por exemplo, no dos Burgúndios — instalaram-se nas terras 
na qualidade de trabalhadores agrícolas. 
LEITURA COMPLEMENTAR
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
16
Dentro de um milhar de anos, com o recuo do tempo, o historiador que 
estudar o século XX não deixará de estabelecer comparações com a Alta Idade 
Média. Não conhece o nosso século movimentos de migração que fazem que, 
em França, por exemplo, mais de três milhões e meio de trabalhadores sejam 
algerianos, marroquinos, espanhóis e portugueses, que se encontrem na Holanda 
e na Alemanha turcos, jugoslavos?... A única diferença está nas facilidades de 
transporte, que a Alta Idade Média não conheceu. Em consequência disso, uma 
vez fixado, era, em princípio, para toda a vida que o trabalhador estrangeiro se 
estabelecia com a mulher e os filhos na quinta que o proprietário, que se chamava 
«galo-romano», não queria trabalhar.
O movimento não se processava sem trazer problemas, que foram 
resolvidos de forma muito mais liberal da que se seria levado a crer. Assim, a 
primeira pergunta a fazer àquele que, perseguido por um delito, comparecia 
perante um tribunal é: «Qual é a tua lei?» Com efeito, ele é julgado segundo a sua 
lei, e não sob a da região em que se encontra. Daí a extrema complexidade desse 
Estado feudal e a diversidade dos costumes que aí se instauram. 
Aos historiadores instruídos no direito romano, com as suas bases 
uniformes e uniformemente aplicáveis, isso pode parecer o cúmulo do arbitrário; 
na época as distorções são certamente muito grandes duma região para a outra, 
mas, aí ainda, nós aproximamo-nos dessas concepções, pois hoje compreendemos 
melhor que a justiça, a verdade, consiste em julgar cada um segundo a sua lei.
FONTE: PERNOUD, Régine. O mito da Idade Média. Lisboa: Europa-América, 1979, p. 58-60.
17
Neste tópico, você viu que:
 O conceito de Idade Média continua sujeito a uma série de preconceitos e 
simplificações que nos impedem de compreender a importância deste período.
 Durante muito tempo, as interpretações que se fizeram sobre a Idade Média 
eram parciais e serviam de arma política ou ideológica para os seus criadores. 
Foi assim, no Renascimento e no Iluminismo, que a viam como uma Idade das 
Trevas, e no Romantismo, que inverteu essa visão.
 O termo “Idade Média” é uma simplificação exagerada, que esconde as variações 
regionais e as transformações sociais ao longo de todo esse tempo.
 Para estudar a Idade Média ou qualquer outro período histórico, devemos evitar 
os perigos do julgamento do passado, do anacronismo e do eurocentrismo.
 Atualmente, a preocupação dos historiadores é compreender a Idade Média a 
partir dos registros da própria época, que revelam uma Idade Média muito rica 
e muito complexa, totalmente afastada da ideia de “Idade das Trevas”.
RESUMO DO TÓPICO 1
18
1 Identifique, em um livro didático qualquer de Ensino Médio, no capítulo (ou 
capítulos) correspondente(s) à Idade Média:
a) Qual é a perspectiva, dentre as que analisamos nos itens 3 e 4 deste tópico, 
que melhor descreve a forma como a Idade Média é tratada pelo(s) autor(es) 
do livro?
b) Qual o nível de profundidade com que civilizações como a bizantina e a 
muçulmana são tratados?
c) Pelo que você pôde perceber, o tema da Idade Média foi tratado de forma 
adequada? Que complementações você sente que precisaria fazer em sala de 
aula para melhorá-lo?
AUTOATIVIDADE
19
TÓPICO 2
 A IDADE MÉDIA NA HISTORIOGRAFIA
UNIDADE 1
1 INTRODUÇÃO
Se desejarmos estudar e ensinar Idade Média de forma adequada, 
precisaremos ir além do que o senso comum fala a respeito desse período e estudar 
as interpretações feitas pelos historiadores do assunto. Mas isso não significa, 
apenas, conhecer os “fatos” que contribuíram para a transição da Antiguidade 
para o mundo medieval. Estudar História é interpretar, é questionar a validade 
das teorias, dos conceitos e das interpretações, tentando sempre compreender 
como surgiram, ou seja, situá-las em um contexto histórico.
Para um historiador, esse procedimento é ainda mais importante do que 
o conhecimento dos “fatos” ou “eventos” históricos. Afinal, fatos e eventos não 
existem soltos por aí. Só existem quando um historiador estabelece a sua validade.
 Por isso, antes de determinarmos que “acontecimentos” levaram à 
dissolução do Império Romano e ao surgimento do período medieval, precisamos 
saber o que foi essa transição, se houve efetivamente uma transição (até mesmo, 
em alguns casos, o que se entende por “transição”) e que características teve. 
Só assim seremos capazes de selecionar adequadamente os “fatos” que 
compõem a história que vamos contar. É por esse motivo que discutiremos as 
interpretações dos estudiosos (a historiografia) neste tópico. Antes, portanto, 
dos “fatos” que são tradicionalmente considerados como explicativos da crise do 
mundo antigo.
No tópico anterior discutimos algumas questões teóricas relevantes quando 
se tenta compreender um período histórico tão complexo como a Idade Média. 
Este tópico aprofundará algumas questões, discutindo-as mais diretamente do 
ponto de vista da produção dos historiadores sobre o período. Em resumo, no 
tópico anterior aprendemos a questionar as “verdades recebidas” sobre a Idade 
Média. Neste tópico vamos aprender como fazer isso!
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
20
2 TEORIAS SOBRE O INÍCIO DA IDADE MÉDIA
Diversas teorias foram propostas por estudiosos, ao longo do tempo, 
para explicar as origens desse período histórico que se denomina Idade Média. 
Alguns estudiosos formularam teorias elaboradas a respeito, de caráter moral ou 
econômico, e outros procuraram manter-se mais atentos à enorme complexidade 
do processo. É importante conhecermos algumas delas, sempre considerando que 
essas teorias carregam elementos da época em que foram criadas.
Inicialmente, porém, é interessante nos questionarmos até que ponto existe 
uma vinculação automática entre os fenômenos históricos que denominamos a 
“queda do Império Romano” e o “surgimento da Idade Média”. Essa vinculação 
nos parece óbvia, por estarmos habituados a ela.
Aliás, tradicionalmente, a própria definição de Idade Média é o período 
posterior à queda. No entanto, como veremos a seguir, não são todos os estudiosos 
(Henri Pirenne é uma exceção) que atribuem uma relação tão forte de causa e efeito 
entre os dois fenômenos.
2.1 A IDADE MÉDIA E A QUEDA DO IMPÉRIO ROMANO
HISTORIOGRAFIA
Prezado(a) acadêmico(a), discutiremos a seguir algumas das teorias ou interpretações que 
foram feitas ao longo do tempo sobre o declínio do Império Romano e o surgimento da Idade 
Média. 
Preste atenção não apenas ao conteúdo das teorias, mas tente observar a época em que a 
teoria foi criada, o local em que o seu formulador viveu e sua origem social ou cultural, pois 
isso é fundamental para compreender o seu sentido.
2.1.1 Os contemporâneos: Vegécio e Salviano
As explicações mais antigas para a queda do Império Romano foram 
elaboradas por cronistas que viveram no período, tais como Publius Flavius 
Vegetius (Vegécio) e Salviano. Pouco se sabe sobre esses autores. 
Vegécio viveu por volta do ano 450 e escreveu sobre a tecnologia militar do 
Império Romano tardio e início da Idade Média. Salviano vinha de uma família 
abastada, possivelmente nobre, e foi sacerdote cristão no início do século V. Eram, 
portanto, contemporâneos (ou seja, viveram na mesma época) do processo de 
queda do Império. Eram também romanos, cristãos e letrados,o que demarca uma 
posição sociocultural muito específica e privilegiada.
NOTA
TÓPICO 2 | A IDADE MÉDIA NA HISTORIOGRAFIA
21
Para Vegécio, a entrada de germânicos (“bárbaros”) no exército teria 
enfraquecido militarmente o Império, pois o novo exército carecia do treinamento 
e da lealdade do antigo e a noção de cidadania da população. 
Salviano descreve o processo de ruína e de perda da liberdade dos 
pequenos camponeses, constrangidos pelos impostos e pelas difíceis condições em 
que estavam, com os saques e destruições de cidades pelos bárbaros. Confrontado 
com a incômoda questão de “como um império que adotou a verdadeira religião 
foi capaz de se dissolver?”, explicou as invasões como um castigo de Deus aos 
romanos, por sua infinita corrupção.
AUTOATIVIDADE
Quais são as características em comum entre as visões de Vegécio e Salviano? 
Eles percebiam a “transição” como uma queda de um mundo antigo ou o 
surgimento de um novo? A que fatores eles atribuíam essa mudança? Percebiam 
isso como decadência ou como progresso? Por que você acha que eles pensavam 
dessa forma?
2.1.2 Uma visão Iluminista: Gibbon e a “decadência moral”
O historiador inglês Edward Gibbon (1737-1794) é considerado um dos 
primeiros grandes estudiosos a analisar a queda do Império Romano a partir de 
fontes documentais. 
Em seu monumental “Declínio e queda do Império Romano”, Gibbon 
atribuiu a queda de Roma a uma perda da virtude cívica de seus cidadãos. Para 
ele, a grandeza e o poder do Império teriam causado a “decadência moral” de seus 
habitantes, que teriam perdido o interesse ou a habilidade de adotar um modo de 
vida viril. 
Gibbon (2005) entendia que o Cristianismo teria tido um impacto devastador 
sobre o Império Romano, pois introduzia uma nova ética que privilegiava a busca 
da salvação e de uma vida melhor após a morte. Essa nova forma de pensar 
teria facilitado as invasões bárbaras, ao atrofiar o tradicional espírito marcial dos 
romanos e diminuir o seu desejo de se sacrificarem pelo Império.
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
22
AUTOATIVIDADE
Perceba que a visão de Gibbon guarda algumas semelhanças, mas muitas 
diferenças em relação à de Vegécio e Salviano. Quais são as principais? A que 
fatores se pode atribuir essa diferença, se o objeto de estudo era, supostamente, 
o mesmo? Justifique.
SUGESTÃO DE LEITURA
O livro “Declínio e queda do Império Romano”, de Edward Gibbon, é uma leitura obrigatória 
para quem desejar entender a fundo o processo de surgimento da Idade Média. Além de 
detalhado e muitíssimo bem redigido, o livro, escrito no século XVIII, é hoje um documento 
histórico importantíssimo, pois mostra como um estudioso viu esse processo há mais de 
200 anos e por ser um dos grandes exemplos de como se escrevia História antes da grande 
transformação do século XIX.
2.1.3 Os grandes sistemas civilizadores: Toynbee
O historiador britânico Arnold J. Toynbee, baseado na ideia do apogeu e 
declínio das civilizações, explicou a decadência do Império Romano a partir de 
características econômicas e sociais da própria sociedade romana. 
Para ele, o Império Romano já continha, desde a sua formação, os elementos 
que o tornariam inviável posteriormente. A economia romana não era baseada 
no comércio com outros povos ou na inovação tecnológica, mas unicamente na 
exploração das terras conquistadas e na escravização das populações. No momento 
em que as conquistas cessaram, a autoridade política do imperador lentamente 
declinou, até finalmente entrar em colapso. No século V, o poder do imperador 
era meramente simbólico, a ponto de Odoacro, o líder dos hérulos que conquistou 
Roma em 476, nem o desejar para si.
2.2 A TEORIA DOS MÚLTIPLOS FATORES
Algumas explicações sobre a queda do Império Romano não se concentram 
em um aspecto específico, seja ele moral, político ou econômico. Ao contrário, 
entendem que um movimento tão longo e tão dramático como este não pode ser 
atribuído a algumas causas fortuitas nem teria acontecido continuamente, sem 
qualquer tentativa de se revertê-lo. Três estudos são especialmente característicos 
dessa linha de pensamento.
DICAS
TÓPICO 2 | A IDADE MÉDIA NA HISTORIOGRAFIA
23
2.1.3 Os grandes sistemas civilizadores: Toynbee
John B. Bury, nos anos 1920, atribuiu a queda do Império a uma série 
de fatores e dedicou-se a derrubar a teoria da “queda moral” de Gibbon, 
considerando-a “simplista”. Para ele, o que ocorreu foi uma série de ocorrências 
infelizes em sequência, de crise econômica e uma crescente dependência dos povos 
germânicos para o exército a uma perda de vigor moral que gerou uma falta de 
lideranças firmes.
O historiador russo radicado nos EUA Mikhail Rostovtzeff entendeu a 
queda de Roma a partir das dificuldades econômicas que o Império sofreu a partir 
do século III, e das quais não foi possível recuperar-se completamente. A moeda, 
que antes baseava seu valor na quantidade de ouro, prata ou bronze que continha, 
passou a ser cunhada com ligas de metais sem valor, gerando uma grande inflação. 
No entanto, Rostovtzeff continuava a perceber, como fazia Gibbon, o surgimento 
da Idade Média como uma falência do mundo clássico, o que ainda guardaria, em 
sua perspectiva, uma visão de decadência.
William Carroll Bark elaborou uma abordagem diferente para a questão, 
preferindo entender o fim do Império não como uma época de trevas. Ao contrário, 
Bark (1979, p. 48) afirma que “o início da Idade Média foi uma época de inovações 
e descobertas, e que a regressão da civilização no Ocidente, partindo do nível 
romano, foi uma ocorrência feliz”.
 Para Bark, o Império Romano do Ocidente caiu apesar das tentativas 
de mantê-lo inteiro, ou mesmo por causa delas. As reformas de Diocleciano 
e Constantino, mais do que conter as mudanças, terminariam por acelerá-las. 
Para Bark (1979, p. 141), “um ponto decisivo da evolução da tradição ocidental 
foi atingido no período entre 300 e 600 de nossa era, quando a velha civilização 
clássica pagã chegou a um ponto morto no Ocidente”. 
Essa mudança se caracterizou por uma transformação completa na forma 
de se ver o mundo, ditada pelas necessidades da nova sociedade em gestação, que 
era essencialmente diferente do mundo clássico romano. 
Nas palavras de Bark:
Foram muitos os outros, orientais, gregos, celtas e alemães, que inventaram 
ou adaptaram formas de arte, conhecimento e ciência estrangeiras, que se 
fizeram necessárias e que existiam no novo mundo ocidental, constantemente 
modificado. 
Muitos de seus trabalhos, especialmente parte de sua produção literária, 
parecem extremamente ingênuos e inúteis a nossos olhos, e é essa a principal 
razão pela qual sua época foi chamada de Idade das Trevas.
Repetimos, essa denominação se baseia num raciocínio falaz. Poderíamos 
concluir igualmente, após um estudo comparativo da Grécia clássica e das 
realizações da engenharia moderna norte-americana, que a Grécia dificilmente 
merece ser chamada de civilizada. Está muito mais próximo da verdade dizer 
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
24
que o gênio criador dos primeiros homens medievais não estava, ou não se 
exercia, no conhecimento literário do velho modelo clássico. 
Seu objetivo era expressar-se de outras formas e operar sob a égide de 
finalidades e valores diferentes. Se temos de fazer comparação, essas novas 
formas devem participar delas. Não foi apenas por acaso, no final das contas, 
que as cidades, sociedades, artes e artesanatos de uma Europa posterior e mais 
adiantada se diferenciaram tanto dos gregos e romanos. Isso ocorreu porque se 
orientaram numa direção decididamente diferente, desde a época de sua origem 
na longa idade do desmoronamento e lenta regeneração da Europa Ocidental. 
(BARK, 1979, p. 108).
Em uma linha relativamente semelhante, o antropólogo Joseph Tainter 
(1990) argumentou que a queda do Império Romano não foi desastrosa para todos. 
O sistema agrícola romano, baseado em grandes propriedades exploradas por 
colonos ricos e em grande parte ociosas, deulugar a uma forma de produção mais 
eficiente. 
A quebra do Estado liberou os cidadãos menos abastados de uma enorme 
carga de obrigações tributárias e civis, o que significaria, em parte, uma melhoria 
nas condições de vida. A análise de ossadas anteriores e posteriores ao século V 
permite verificar que a nutrição melhorou após a queda.
2.3 TEORIAS DO COLAPSO AMBIENTAL
Algumas teorias recentes vinculam a queda do Império Romano a um 
colapso ambiental da sociedade. O sistema agrícola ineficiente e a devastação das 
florestas teriam gerado erosão e, em regiões do norte da África, salinização do solo. 
O êxodo rural decorrente dessa degradação teria agravado, por sua vez, as 
condições de saúde nas cidades, predispondo as populações a epidemias de varíola, 
cólera e outras doenças.
Também os processos de produção de gêneros e transporte de água 
encanada levaram a uma contaminação da população urbana com metais pesados. 
O chumbo, especialmente, é extremamente danoso ao organismo humano, 
atacando os sistemas nervoso, renal, cardiovascular e reprodutivo. Em longo 
prazo, essa contaminação e os desastres ambientais e sanitários prejudicariam o 
crescimento populacional, o que ajudaria a explicar o decréscimo populacional no 
império a partir de meados do século III.
TÓPICO 2 | A IDADE MÉDIA NA HISTORIOGRAFIA
25
Prezado(a) acadêmico(a), perceba como as interpretações sobre a queda do 
Império Romano acompanham de perto as preocupações da época dos seus autores. Gibbon 
(2005) pensa em termos morais no Iluminismo.
Toynbee (1986) fala em crise de civilizações, e algumas teorias atuais falam em crise ambiental. 
Não é coincidência: os estudiosos sempre estão sujeitos, em suas interpretações, aos dilemas 
e problemas de suas próprias épocas.
2.4 TEORIAS DA TRANSFORMAÇÃO
Alguns estudiosos questionaram a vinculação tradicional entre a queda de 
Roma e o surgimento da Idade Média, argumentando que a civilização romana 
não foi destruída: apenas transformou-se, lentamente, para gerar o que seria a 
futura Idade Média.
Uma teoria que segue essa linha foi criada por Henri Pirenne, no início do 
século XX. Pirenne discordava do marco tradicional da queda do Império Romano, 
estabelecido por Gibbon como a queda de Roma em 476 sob os exércitos de Odoacro. 
Para ele, os reinos germânicos não representaram o fim do Império Romano, mas 
uma continuidade deste, apenas em um formato ligeiramente diferente.
 HISTORIOGRAFIA
As teses de Henri Pirenne tiveram influência muito grande sobre alguns de seus conterrâneos, 
que viriam a elaborar os pressupostos da escola historiográfica dos Annales – especialmente 
Marc Bloch, Lucien Febvre e Fernand Braudel. Bloch rejeitava a história dos eventos e advogava 
estudos baseados na interpretação de fenômenos sociais. Febvre trabalhou com a noção de 
rupturas e permanências na história. Braudel desenvolveu a teoria do mundo mediterrâneo, 
ao redor do qual as trocas culturais permitiriam uma homogeneização da civilização. Busque 
mais informações sobre esses autores e tente relacionar a teoria de Pirenne com essas ideias.
De acordo com Pirenne (2010), a estrutura econômica dos reinos germânicos 
pôde manter-se baseada nas rotas comerciais do Mar Mediterrâneo, como havia 
acontecido sob Roma, por causa da capacidade do Império Bizantino de manter a 
paz e a liberdade comercial sobre a região, entre os séculos V e VI. 
NOTA
NOTA
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
26
Foi somente no momento em que os muçulmanos ocuparam o entorno do 
Mar Mediterrâneo que esses reinos foram forçados a abandonar a estrutura econômica 
mediterrânea e a se interiorizar.
 Desta maneira, teria sido o domínio muçulmano do Mar Mediterrâneo, 
no século VII, muito mais do que as invasões germânicas, o principal fator de 
desagregação do modo de vida romano e o gerador da sociedade medieval.
Essencialmente, a tese de Pirenne considera os fatores econômicos e 
produtivos como mais importantes, para a descrição do mundo medieval como 
sendo distinto da Antiguidade, do que os fatores étnicos ou políticos. Mesmo que 
a unidade do Império Romano ou sua “latinidade” não fossem mais tão sólidas 
quanto antes, o mundo dos séculos IV a VIII guardaria enormes semelhanças 
com o período anterior, por ainda se basear na mesma forma de produção e de 
circulação de mercadorias. 
Antes da mudança do eixo de forças no Mediterrâneo, com o avanço 
muçulmano, as modificações eram importantes, mas não decisivas. Os povos 
germânicos romanizavam-se e cristianizavam-se aos poucos, o que não configurava 
uma ruptura cultural.
A tese de Pirenne é controversa, por se basear essencialmente em uma análise 
economicista da História e por considerar o reino franco como continuador do Império 
Romano, em uma forma adequada à nova sociedade românico-germânica europeia, e 
em resposta ao avanço do Islã. 
Diversos historiadores já tentaram demonstrar que o comércio mediterrâneo, 
embora de fato continuasse a existir entre a queda do Império do Ocidente e a 
conquista muçulmana, não seria suficiente para explicar uma continuidade entre o 
mundo antigo e os reinos romano-germânicos até o século VII.
SUGESTÃO DE LEITURA!
Prezado(a) acadêmico(a), se você tiver interesse nas teorias de Henri Pirenne, procure seu 
clássico sobre o assunto:
PIRENNE, Henri. Maomé e Carlos Magno. O impacto do Islã sobre a civilização europeia. Rio 
de Janeiro: PUC-RIO/Contraponto, 2010. 
Obs.: O livro foi publicado na França logo após a morte de Pirenne, em 1835.
Muitos foram os críticos da tese de Pirenne. Citamos alguns:
BARK, William Carroll. Origens da Idade Média. Rio de Janeiro: Zahar, 1979, p. 16-48.
HODGETT, Gerald A.J. História social e econômica da Idade Média. Rio de Janeiro: Zahar, 
1975, p. 55-60.
LOPEZ, Robert S. Mohammad and Charlemagne: a Revision. Speculum, XVIII (1943), p. 14-38.
DICAS
TÓPICO 2 | A IDADE MÉDIA NA HISTORIOGRAFIA
27
AUTOATIVIDADE
REFLETINDO...
Quando Pirenne estabelece como marco inicial da Idade Média o avanço do 
Islamismo, que sentidos para a história ele está, implícita ou explicitamente, 
atribuindo? Quais os significados que ele dá para os marcos tradicionais e 
para o marco que ele próprio estabelece? Perceba que um dos “marcos” dessa 
controvérsia é o papel que os povos germânicos teriam entre a tomada do 
Império (século V) e o confronto com o Islã (século VII). Perceba também que 
a coroação de Carlos Magno se torna, na análise de Pirenne, um símbolo que 
demarca uma transformação significativa. O que você pensa a respeito disso?
3 TEORIAS SOBRE O FINAL DA IDADE MÉDIA
Além das controvérsias sobre o período e as causas do início da Idade 
Média, há divergência entre os historiadores sobre as causas e o momento do final 
do período. Essas divergências refletem, como você pode imaginar, perspectivas 
particulares de cada estudioso sobre os significados da Idade Média e, também, da 
Idade Moderna. 
Não nos estenderemos, agora, nesse ponto. Veremos apenas algumas das 
perspectivas mais comuns sobre o tema.
3.1 A TEORIA CLÁSSICA
A maioria das interpretações sobre o final da Idade Média está baseada na 
ideia do renascimento comercial, que teria levado, de um lado, ao fortalecimento 
da burguesia e, de outro lado, ao enfraquecimento do feudalismo. Esses dois 
fenômenos costumam vir relacionados, como se se tratasse de uma “troca de 
guarda” nas relações de domínio social e dos modos de produção: o fortalecimento 
do comércio e da burguesia levaria necessariamente ao enfraquecimento do poder 
dos senhores feudais.
Esta relação não é totalmente absurda. Existe, de fato, uma vinculação 
entre a perda do poder senhorial, baseado na posse da terra, com a formação da 
burguesia, que acontece no momento em que o dinheiro volta a circular na Europa 
Ocidental.
 No entanto, precisamos apontar que essa explicação não é, em si mesma, 
satisfatória:
1. A transformação da sociedade medieval na sociedade moderna não se deu 
apenas por motivações econômicas. Há uma série de transformações culturaisUNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
28
envolvidas nesse processo e elas não podem ser explicadas simplesmente pelo 
retorno do comércio.
2. A transformação não aconteceu de forma homogênea: cada região fez a 
“transição” de sua versão local de “Idade Média” para sua versão local de 
“Idade Moderna” em seu próprio período histórico, à sua própria maneira e 
com suas próprias características.
3. A transformação não foi completa: estudiosos como Mikhail Bakhtin, Robert 
Darnton e outros mostram que a cultura popular na Idade Moderna guardava 
muitos elementos medievais, e as estruturas políticas feudais só foram extintas 
após as Revoluções: Gloriosa (na Inglaterra), Industrial, Francesa e Russa.
Talvez, em parte, o argumento possa ser resumido da seguinte forma: a 
Idade Média, se é que é possível resumir com esse termo um período tão longo e 
tão complexo, é complexa demais para caber em qualquer tentativa de definição, 
explicação e conceitualização.
 A única forma de compreendermos esse período é analisá-lo em detalhes, 
relacionando a maior quantidade de fatores possíveis e levando sempre em conta 
a influência global nos casos locais.
3.2 A EXPLICAÇÃO A PARTIR DAS PERIODIZAÇÕES
Estabelecer marcos para o início e o fim de um determinado período é 
uma ferramenta útil e, ao mesmo tempo, perigosa. Seria ingênuo acreditar que 
um determinado acontecimento, por mais relevante que seja, vai alterar sozinho 
toda a percepção de mundo das pessoas, a ponto de precisar ser considerado como 
originador de uma nova “era”. Eras são conceitos criados pelos historiadores, e 
as periodizações, além de demarcarem os limites iniciais e finais desses períodos, 
servem para simbolizar e sintetizar as explicações que esses historiadores trazem 
para o período.
Vários momentos já foram propostos para demarcar o final da Idade Média. 
O marco tradicional adotado na historiografia francesa é o ano de 1453, em que 
ocorreram tanto a tomada de Constantinopla pelos turcos como o final da Guerra 
dos Cem Anos. 
Na historiografia alemã costuma-se delimitar o início da Idade Moderna 
com a publicação das 95 Teses de Martinho Lutero, que marcou a Reforma 
Religiosa, em 1517. 
Há também quem defina a descoberta da América, em 1492, como o marco 
fundamental do início da Era Moderna. Cada uma dessas datas, como você pode 
imaginar, já traz em si uma explicação do que seria a Idade Média e o período que 
a sucedeu. O historiador dá pistas muito importantes sobre a interpretação que 
deseja para a história que está contando ao determinar onde ela termina.
TÓPICO 2 | A IDADE MÉDIA NA HISTORIOGRAFIA
29
Mas mais importante, talvez, do que definir um “ponto de virada”, é 
perceber que qualquer periodização é arbitrária e reducionista e que a história é 
muito mais complexa do que pode ser expresso por uma datação. As datações têm 
finalidades sobretudo didáticas, ainda que, ao serem estabelecidas, determinem 
uma teoria explicativa sobre os períodos históricos que tem também finalidades 
políticas e ideológicas.
AUTOATIVIDADE
Prezado(a) acadêmico(a), você consegue imaginar quais seriam as 
“explicações” para o surgimento e para o final da Idade Média que são 
apresentadas por historiadores que usam os marcos que já vimos até agora? 
Queda de Roma/tomada do Mediterrâneo pelos árabes, para o início; 
tomada de Constantinopla/descoberta da América/Reforma Religiosa, para o 
final? Você consegue imaginar outras possíveis periodizações? Conseguiria 
sintetizá-las entre dois eventos? Consegue perceber que essas sintetizações são 
completamente arbitrárias?
3.3 JACQUES LE GOFF E A “LONGUÍSSIMA IDADE MÉDIA”
Jacques Le Goff, um dos mais renomados medievalistas (estudiosos da 
Idade Média) franceses, caracteriza o período medieval a partir de uma perspectiva 
mais ampla do que a maioria dos historiadores. Do ponto de vista econômico e 
social, especialmente entre os segmentos populares, Le Goff (2008) considera que 
as características da Idade Média mantiveram-se muito fortemente em meio à 
cultura popular até muito além do século XVI. 
Do ponto de vista cultural e das mentalidades, especialmente entre as classes 
populares, a Idade Média teria se estendido, com poucas alterações fundamentais, 
até a Revolução Industrial.
De acordo com Le Goff, o Renascimento não se constituiu numa ruptura 
assim tão grande com a Idade Média, como Petrarca e outros pretendiam que ele 
fosse. Houve, aliás, outros renascimentos antes do ocorrido entre os séculos XIV e 
XVI: o Renascimento Carolíngio nos séculos VIII-IX, a Escolástica nos séculos XII-
XIII, para não mencionar os períodos de florescimento cultural em outras culturas, 
como a islâmica e a bizantina. 
“Renascimentos”, portanto, são relativamente comuns, e ocorreram 
também em épocas consideradas “atrasadas”.
Le Goff (2008) explica essa tese a partir de algumas constatações. A perspectiva 
humanista formulada pela Igreja durante a Idade Média - especialmente após a 
Escolástica – baseou até mesmo a Declaração dos Direitos do Homem surgida na 
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
30
Revolução Francesa. As noções medievais de trabalho e a organização do tempo 
medieval prevaleceram na Europa até o advento da Revolução Industrial. Claro 
que houve mudanças profundas entre 1450 e 1850, mas para Le Goff é possível 
perceber continuidades importantes.
3.4 QUAL PERIODIZAÇÃO ADOTAR?
O período conhecido como “Baixa Idade Média” é, como praticamente 
todos os conceitos históricos (e você nos verá criticando muitos deles), sujeito a 
muitas controvérsias, seja na determinação de seus marcos inicial e final, como na 
descrição de suas características. 
A historiografia francesa costuma dividir a Idade Média em Alta Idade 
Média, Idade Média Central e Idade Média Tardia. A britânica, em Idade Média 
Inicial (Early Middle Ages), Alta (High M.A.) e Tardia (Late M.A.). Nas línguas 
latinas, os historiadores preferem falar em Alta e Baixa Idade Média ou outros 
termos. Como se pode ver, a periodização varia imensamente e o mesmo termo 
pode se referir a períodos muito diferentes.
Neste Caderno de Estudos utilizamos, tanto quanto possível, todos esses 
conceitos: consideramos a “Baixa Idade Média” o período posterior ao ano 1000 – 
do século XI até o século XV, aproximadamente. Falaremos, no entanto, também 
em Idade Média Tardia, correspondendo ao final da Baixa Idade Média, a partir 
de 1200, aproximadamente. 
Essas divisões, é claro, são completamente arbitrárias e, como você já deve 
ter percebido, não correspondem a divisões precisas nas sociedades: têm uma 
finalidade sobretudo didática. Entendemos, porém, que essa divisão da Baixa 
Idade Média em duas partes é útil, por razões que ficarão mais claras na Unidade 
3. 
Em nossa definição, portanto, a Baixa Idade Média “propriamente dita” 
(1000-1200) marca, grosso modo, o auge do sistema feudal, e a Idade Média Tardia 
corresponde justamente ao “desmonte” desse sistema.
Prezado(a) acadêmico(a), apresentamos a você um trecho de um livro de 
Gerald Hodgett intitulado “História social e econômica da Idade Média”. Nesse 
trecho, o autor faz uma discussão historiográfica sobre o tema do comércio na 
Alta Idade Média, colocando diversos pontos de vista. É interessante para você 
perceber como esse tipo de discussão costuma ser conduzido pelo historiador e 
como, apesar de parecer à primeira vista uma discussão árida, ela pode conter 
elementos interessantes. Boa leitura!
TÓPICO 2 | A IDADE MÉDIA NA HISTORIOGRAFIA
31
LEITURA COMPLEMENTAR
Prezado(a) acadêmico(a), apresentamos a você um trecho de um livro de 
Gerald Hodgett intitulado “História social e econômica da Idade Média”. Nesse 
trecho, o autor faz uma discussão historiográfica sobre o tema do comércio na Alta 
Idade Média, colocando diversos pontos de vista. É interessante para você perceber 
como esse tipo de discussão costuma ser conduzido pelo historiador e como, 
apesar de parecer à primeira vista uma discussão árida, ela pode conter elementos 
interessantes. Boaleitura!
HISTÓRIA SOCIAL E ECONÔMICA DA IDADE MÉDIA
Gerald Hodgett
 [...] A tese de Pirenne foi que após 570, aproximadamente, o comércio através 
do Mediterrâneo começou mesmo a expandir-se até o princípio do século VIII.
Em seu famoso livro Mahomet et Charlemagne, ele expressou a opinião de 
que o comércio mediterrâneo, “le grand commerce”, foi desfeito não pelas invasões 
germânicas do século V, mas pelos avanços islamíticos em fins do século VII. Isso 
foi o que causou o declínio da economia da Europa durante o período carolíngio, 
e Pirenne acreditava que, a partir de 700, aproximadamente, teve início uma era 
de estagnação. Julgou que, como resultado direto dessa estagnação econômica, os 
governantes carolíngios foram forçados a adotar uma economia dominial onde a 
produção se concentrava nas grandes villae, uma economia que estava muito pouco 
distante de uma economia de troca direta – “um período sombrio de estagnação e 
retrocesso na vida econômica”.
 Essa interrupção no comércio resultou da descontinuidade daquilo 
que o vinha mantendo em movimento, a saber, abundantes ofertas de ouro de 
Constantinopla, que era obtido nas minas da Núbia. Após a conquista do Egito pelos 
islamitas em 641, o Império viu-se privado dessa fonte de oferta de metais preciosos. 
Alguns papiros ainda conseguiam atravessar, como demonstra o privilégio 
concedido a Corbie em 718, mas, de modo geral, após meados do século VII, o ouro 
bizantino não mais chegava ao Ocidente e os mercadores bizantinos passaram a 
compensar a perda do comércio ocidental voltando-se para a Ucrânia. Ao redor de 
700, portanto, o foco do comércio bizantino voltou-se para o Oriente, como havia 
ocorrido no final do século IV e século V. 
O esvaziamento do comércio através do Mediterrâneo fez que os carolíngios 
se voltassem para o Norte, onde havia uma atividade comercial centralizada ao 
redor da foz do Reno em Duurstede e em Quentovic, nas proximidades de Etaples 
no Passo de Calais. A prata tomou o lugar do ouro e espalhou-se no Sul da Frância 
como sendo a moeda corrente para o comércio que lá prosperava. 
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
32
No julgamento de Pirenne, o abandono do ouro era um indício seguro do 
declínio de “le grand commerce”. O Império Carolíngio foi assolado pelas incursões 
de sarracenos e de nórdicos, os quais não pôde impedir. Dopsch discordou da tese 
de Pirenne acerca de uma economia em estagnação e insistiu em que não houve 
interrupção brusca entre o comércio merovíngio e o carolíngio.
Certos aspectos das opiniões de Pirenne não são mais aceitáveis pelos 
estudiosos. Baynes julgou que suas alusões aos mercadores sírios mencionados por 
Gregório de Tours não provavam a continuidade do comércio1. Lopez, apesar de 
concordar que, culturalmente, o avanço islamítico foi mais disruptivo do mundo 
romano do que haviam sido as ocupações germânicas, discorda em muitos detalhes 
econômicos2. Argumenta particularmente que muitos dos “desaparecimentos” na 
Europa ocidental, que, para Pirenne, coincidiram com o controle da Europa ocidental 
pelos muçulmanos, não foram contemporâneos, quer em relação ao avanço árabe, 
quer um em relação ao outro. [...] Como Lopez demonstrou, a oferta de papiro 
não cessou com a conquista do Egito; pelo contrário, as fábricas, que contavam em 
grande parte com o trabalho de cristãos, continuaram a produzi-lo e os muçulmanos 
a exportá-lo para Constantinopla, onde o Código de Justiniano, ainda em vigor, 
exigia que certos documentos fossem redigidos em papiro. [...]
Portanto, é incorreto dizer que o avanço muçulmano causou o término do 
comércio mediterrâneo. A ruptura ocorreu cerca de cinquenta anos mais tarde e foi 
o resultado das hostilidades entre o Império e o Islã. Essas hostilidades provocaram 
a interrupção da circulação das moedas de ouro bizantino nos territórios islamíticos 
e na área do Mediterrâneo em geral. 
O papiro desapareceu por completo somente no século X, quando os 
egípcios pararam de fabricá-lo, pois o papel havia assumido seu lugar nos domínios 
islamíticos. O imperador em Constantinopla, e gradualmente toda a Europa 
ocidental, passaram a utilizar o pergaminho, sendo que apenas o Papado resistiu à 
mudança até, aproximadamente, o fim do século X. 
Dessa forma, os argumentos de Pirenne sobre o papiro são fracos e sua tese 
de que houve um súbito abandono por parte dos carolíngios da cunhagem em ouro 
merovíngia não pode ser mantida, pois, tanto Carlos Magno como Luís, o Piedoso, 
cunharam moedas de ouro. Como disse Renouard, ele não conseguiu substanciar 
sua tese de que a vida econômica na Europa ocidental se manteve com a mesma 
intensidade até o século VIII3.
Entretanto, como escreveu Vercauteren, nem todas as teorias de Pirenne 
podem ser derrubadas4. O conhecimento mais moderno e bem informado registra 
uma flutuação no comércio entre o início do século IV e o fim do século IX. Na 
bacia do Mediterrâneo, o comércio declinou no século IV e o princípio do século V, 
sendo revitalizado no século VI e princípio do VII e novamente reduzido no fim 
do século VII e princípio do VIII, permanecendo, provavelmente, em baixo nível 
durante todo o século IX.
TÓPICO 2 | A IDADE MÉDIA NA HISTORIOGRAFIA
33
Nem as invasões germânicas nem o avanço muçulmano mataram-no 
completamente, e havia a compensação de vínculos comerciais em outros lugares. 
No Norte, o comércio floresceu no século VI, em fins do século VIII e no século IX, 
estando relacionado a um grande renascimento do comércio efetuado pelos vikings, 
que estabeleceram vínculos comerciais da Escandinávia até Constantinopla através 
da Rússia. 
É indubitável que as trocas comerciais como um todo, entre a Europa 
ocidental e a oriental, declinaram devido à diminuição do poder de compra (ouro) 
no Ocidente5, mas se esse declínio foi catastrófico, é uma questão em aberto. Parece 
que a procura efetiva potencial de artigos orientais teria sido satisfeita, pois, em fins 
do século X, os grandes senhores eclesiásticos e leigos dispunham de muita riqueza 
acumulada em barras de ouro e joias que foram fundidas e utilizadas quando, ao 
aproximar-se o fim daquele século e durante o seguinte, o comércio começou a 
revitalizar-se. Lopes julga que a oferta de ouro pode ter sido insuficiente e que isso 
pode ter refreado o crescimento econômico do século XI, mas o comércio do século 
V ao IX não foi limitado seriamente pela falta de metal precioso. Seja como for, 
parece que seria razoável admitir-se a possibilidade de um declínio em relação ao 
florescente comércio da Roma imperial que prevaleceu durante os primeiros 250 
anos da era cristã. 
Deve-se atentar constantemente para um fato: para escrever a história do 
comércio europeu durante esses seis ou sete séculos, dispomos de pouco mais 
que referências ocasionais em crônicas e alguns dados arqueológicos em forma de 
descoberta de moedas.
NOTAS [conforme o original]
1 N.H. Baynes, “Pirenne and the unity of the Mediterranean world”, J. Rom. Studies, 
XIX (1929), 230-5.
2 R. S. Lopez, “Mohammed and Charlemagne: a Revision”.
3 Y. Renouard, Hommes d’Affaires Italiens (Paris, Colin, 1949), p. 8.
4 F. Vercauteren, “Monnaie et circulation monétaire en Belgique e dans le Nord de 
la France du Ve au XIe siècle”, Settimane di studio... di studi sull’alto medioevo, 
Spoleto, VIII (1961), 279-311.
5 No que concerne às razões monetárias que levaram à substituição do ouro pela 
prata no Ocidente, ver P. Grierson: “The monetary reforms of ’Abd al-Malik”, J. of 
the Economic and Social History of the Orient, III, 3 (1960), 241 e ss.
FONTE: HODGETT, Gerald A.J. História social e econômica da Idade Média. Rio de Janeiro: 
Zahar, 1975, p. 56-60.
34
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico você viu que:
	O início da Idade Média costuma ser associado à queda do Império Romano, 
embora nem todos os estudiosos concordem com essa perspectiva.
	Edward Gibbon, no século XVIII, entendia a queda do Império Romano como 
uma perda da virtude moral, e que o advento do Cristianismoteria favorecido 
as invasões bárbaras.
	Toynbee considerava que o Império Romano já continha em si os elementos que 
levariam à sua derrocada.
	Henri Pirenne, divergindo da maioria dos estudiosos, considera que a queda 
do Império Romano não foi o momento fundante da Idade Média; a grande 
transformação teria sido posterior, quando do fechamento do comércio 
mediterrâneo em consequência do avanço muçulmano.
	A teoria clássica sobre o final da Idade Média vincula o enfraquecimento do 
feudalismo ao ressurgimento do comércio.
	Jacques Le Goff considera que a Idade Média se estende, de alguns pontos de 
vista econômicos e sociais, até o século XVIII.
35
1 Que relações podem ser estabelecidas entre a ideia de Gibbon e o contexto 
histórico em que ele vivia, de difusão dos ideais iluministas?
2 Baseado nas teorias apresentadas nesta seção, tente elaborar uma explicação 
abrangente para a decadência do Império Romano do Ocidente e o surgimento 
do mundo medieval.
AUTOATIVIDADE
Assista ao vídeo de
resolução da questão 2
36
37
TÓPICO 3
ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
UNIDADE 1
1 INTRODUÇÃO
No tópico anterior tratamos da forma como os estudiosos interpretaram a 
transformação do mundo antigo na sociedade medieval. Agora, conheceremos os 
eventos que levaram a essa transformação, para podermos, nós mesmos, avaliar 
o processo. Isso ocorreu no período que se costuma chamar, atualmente, de 
Antiguidade Tardia: um período situado, de forma imprecisa, entre os primórdios 
da era Cristã e a quebra do poder político romano, seja com as invasões germânicas, 
seja com o avanço muçulmano.
Você perceberá, à medida que for tomando conhecimento de detalhes 
dessa transformação, que vários dos preconceitos mais comuns sobre a Idade 
Média, especialmente no que se refere aos povos germânicos, estão vinculados a 
esse período, mas não têm razão de ser. 
No final do tópico, as leituras complementares escolhidas reforçarão mais 
ainda essa nossa afirmação e trarão um panorama mais amplo sobre o quotidiano 
dos homens do início do período medieval. Boa leitura!
2 O AUGE E A DECADÊNCIA DO IMPÉRIO ROMANO
As conquistas militares sempre estiveram no centro da estrutura do 
Estado romano e foram elas que possibilitaram a grandeza e a glória do Império. 
A conquista de territórios possibilitava a ampliação das áreas sob o comando de 
Roma, garantindo a paz ao livrar as fronteiras da presença dos povos bárbaros. 
Com as conquistas, eram transformados em escravos (e, geralmente, transferidos 
para outras partes do Império). Foi essa quantidade enorme de escravos que 
UNI
Prezado(a) acadêmico(a)!
Vamos falar sobre o processo de transformação do Império Romano na cultura 
medieval. Repare, ao longo do texto, que várias das características medievais estão surgindo 
nesse momento. 
38
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
pôde manter o modo de vida luxuoso dos patrícios romanos. No entanto, como a 
escravidão era baseada essencialmente nos prisioneiros de guerra, era necessário 
conquistar terras sem parar, sob risco de o sistema econômico entrar em colapso.
No entanto, muitas conquistas significavam muitos problemas. Havia a 
necessidade de ocupar essas regiões, fundar e manter cidades e garantir o bem-
estar dos romanos que lá vivessem. Regiões muito distantes eram de difícil 
controle e os transportes terrestres não eram tão bons quanto os marítimos. Por 
esse motivo, o Império Romano pôde desenvolver-se com facilidade ao redor do 
Mar Mediterrâneo, ao passo que enormes regiões na Europa, ao norte dos rios Reno 
e Danúbio, permaneceram de fora, servindo de lar a dezenas de povos nômades 
e externos à cultura romana (chamados ‘bárbaros’ por eles). Com o tempo, a 
administração dessa máquina militar e administrativa tornou-se excessivamente 
cara, especialmente pela necessidade de se manter um exército muito grande e 
muito poderoso, e as conquistas se tornaram inviáveis. 
O reinado de Trajano assistiu à máxima expansão do Império, com a 
breve conquista da Armênia e da Mesopotâmia, em 116-177 d.C. A partir desse 
momento, as conquistas praticamente cessaram e a estrutura econômica baseada 
no escravismo lentamente entrou em decadência.
FIGURA 1 – IMPÉRIO ROMANO EM SUA MÁXIMA EXTENSÃO, SOB TRAJANO (177 D.C.)
FONTE: Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/0/00/
Roman_Empire_Trajan_117AD.png/800px-Roman_Empire_Trajan_117AD.png>. Acesso 
em: 15 fev. 2013.
TÓPICO 3 | ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
39
2.1 POR QUE A DECADÊNCIA?
Provavelmente, você vai se perguntar: como é possível que um império tão 
extenso e poderoso como o romano entrasse em decadência? A resposta é complexa 
e envolve diversos fatores: sociais, culturais, políticos e religiosos. A própria 
preocupação que temos com a “decadência” de Roma já é, em si só, significativa: 
desde Gibbon, pelo menos, essa é uma questão que assombra os estudiosos.
Como vimos no tópico anterior, os estudiosos sempre analisam a História a partir 
de questões com que se deparam em sua própria época. Seria a preocupação com a queda do 
Império Romano um reflexo do temor de decadência da nossa própria sociedade?
Ocorre que o Império Romano era mais frágil do que parecia. Mesmo 
hoje, as modernas estratégias de administração e as tecnologias avançadas de 
comunicações e transportes nem sempre são suficientes para garantir a eficiência 
do governo de um território tão extenso como era o do Império Romano, que dirá 
há mais de 1.500 anos!
A aparente pujança do Império era ilusória ou no mínimo uma memória de 
um passado distante. Toynbee (1986) considerava, como vimos no tópico anterior, 
que o Império já havia sido criado em um formato politicamente disfuncional 
e que a autoridade do imperador foi mantida à custa de muito sangue, pois do 
contrário seria insustentável. 
Não havia um sistema eficiente e seguro de arrecadação de tributos, 
por isso o Império não dispunha de recursos suficientes para manter uma 
burocracia funcional. O resultado era uma concentração exagerada de poder e 
riqueza nas mãos do imperador. No entanto, dependia da força do exército e de 
conspirações palacianas para manter-se no poder. 
No momento em que os imperadores decidiram (ou precisaram) interromper 
as conquistas, cessou o crescimento, cessaram os recursos para o Exército (que já 
eram mal geridos) e lentamente declinou a autoridade imperial.
2.1.1 O fim das conquistas militares
As conquistas não poderiam mesmo prosseguir indefinidamente. Apesar 
de sua finalidade ser a exploração dos recursos e a escravização das populações, 
conquistar uma determinada região implicava trazê-la para o mundo romano, 
e, consequentemente, colonizá-la. Isso significava a concessão de terras para 
colonos ricos, a construção de estradas, a transferência de população para o local, 
NOTA
40
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
o estabelecimento de uma burocracia e uma estrutura urbana em alguns lugares 
e a manutenção de tropas legionárias enquanto a região ainda oferecesse riscos 
de insurreição ou estivesse na fronteira do Império. Por vezes, as legiões ficavam 
muitas décadas estacionadas na mesma região.
Avançar, às vezes, era arriscado. Rios largos como o Reno e o Danúbio 
eram fronteiras naturais relativamente fáceis de manter, mas conquistar a margem 
oposta deixaria as novas regiões vulneráveis. A menos que toda a nova região de 
vastas planícies fosse ocupada até o próximo rio, o custo de manter legiões voltadas 
para regiões abertas poderia ser proibitivo. Na Bretanha, a solução encontrada foi 
construir a Muralha de Adriano, para isolar os povos gaélicos do norte. Em outras 
regiões, como a Germânia, os conflitos eram inevitáveis.
A conquista da Dácia (atual Romênia), em 105-106 d.C., demonstrou com 
clareza essa dificuldade. A região, localizada além-Danúbio, era a única do Império 
que não tinha uma barreira natural em sua fronteira exterior, e sua colonização foi 
tarefa complexa e que em poucos anos malogrou. A grande diminuiçãopopulacional 
(os dácios foram escravizados e movidos para outras regiões do império) não foi 
compensada pelo afluxo de imigrantes de outras regiões do Império, de modo que 
a região ficou bastante despovoada. A instabilidade militar e o despovoamento 
das províncias limítrofes levaram ao seu abandono pelo Imperador Aureliano em 
271.
2.1.2 A crise do século III
No início do século III, o império estava enfraquecido e ameaçado por 
dois inimigos poderosos: os diversos povos germânicos ao norte, e o Império 
Sassânida (de origem persa) a leste. A necessidade de garantir a segurança das 
duas fronteiras gerava gastos extraordinários e uma tensão permanente entre os 
comandantes militares e o imperador. As dificuldades fariam o Império mergulhar 
em uma profunda crise econômica durante pelo menos metade do século III (235-
285).
O final das conquistas militares gerou, como vimos, uma diminuição da 
oferta de escravos no Império. Apesar de a condição escrava ser hereditária, os 
escravos conseguiam, aos poucos, libertar-se e a seus descendentes dessa situação, 
e não havia mais como repor esse tipo de trabalho. 
Por outro lado, não havia na Roma imperial uma situação econômica que 
favorecesse o trabalho livre, muito menos o assalariado, em grande escala, de 
modo que os escravos pudessem simplesmente ser absorvidos em uma economia 
urbana de mercado. Muito ao contrário, a crise e a concentração de legiões nas 
fronteiras enfraqueceram as rotas comerciais entre as províncias. 
O resultado foi uma diminuição do poderio econômico das cidades e um 
verdadeiro êxodo urbano. Preocupados em garantir sua sobrevivência, muitos 
romanos buscaram seu sustento no campo, onde poderiam produzir seu próprio 
TÓPICO 3 | ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
41
alimento, mas deviam oferecer alguma compensação para o chefe local, único 
capaz de garantir efetivamente sua segurança. 
Mas, e o Estado? Como vimos, o Estado romano não era forte o bastante 
para garantir a segurança da população, e os imperadores viviam assolados por 
conspirações.
 Em parte, a crise do período entre 235 e 285 foi gerada pela fórmula da 
sucessão imperial. Como não havia um sucessor direto, a disputa era intensa, e 
quase todos os imperadores desse meio século (dos 25 imperadores, houve apenas 
duas exceções) foram mortos em combate ou assassinados. 
Junte-se a isso e às dificuldades econômicas uma série de epidemias de 
peste, e torna-se fácil compreender de que forma o império mergulhou em uma 
crise tão profunda.
FIGURA 2 - O IMPÉRIO PERSA DA DINASTIA SASSÂNIDA (226-651)
FONTE: Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/f/f0/Sassanid_
Empire_226_-_651_%28AD%29.GIF/769px-Sassanid_Empire_226_-_651_%28AD%29.
GIF>. Acesso em: 15 fev. 2013.
42
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
OS SASSÂNIDAS
Os Sassânidas foram uma dinastia persa que reinou no chamado Segundo Império Persa, entre 
226 e 651 d.C. Seu primeiro período de apogeu, entre 309-379, coincidiu em grande parte 
com o período de queda do Império Romano. Seus territórios iam, em sua máxima extensão, 
da Líbia à Índia, do Iêmen ao lago Baikal (Rússia), chegando a incluir toda a Ásia Menor (atual 
Turquia). Sua religião era o Zoroastrismo. O Império Persa durou até o momento da grande 
expansão árabe do século VII, quando, enfraquecido pelos conflitos com o Império Bizantino, 
não resistiu ao avanço fulminante do Islã.
FIGURA 3 - MÁSCARA DE OURO REPRESENTANDO O REI SASSÂNIDA 
YAZDGIRD III
FONTE: Disponível em: <http://iranpoliticsclub.net/library/english-
library/222-years1/images/Yazdgird%20III%20 
Sassanid%202.jpg>. Acesso em: 14 nov. 2012.
No Oriente, o antigo Império Persa se reorganizava sob os Sassânidas 
e assustava os imperadores romanos. No norte, os germânicos (chamados de 
“bárbaros” pelos romanos) começavam a entrar no Império. Mesmo nas províncias 
africanas havia pressão de povos vizinhos, como os garamantes.
NOTA
TÓPICO 3 | ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
43
O termo “bárbaros” significava, originalmente, estrangeiros – para os gregos, eram 
os que não falavam seu idioma. Os romanos do final do Império viam os bárbaros germânicos 
com temor, e depreciavam a sua cultura por não terem uma organização social tão sofisticada 
quanto a do Império. Com o tempo, o termo “bárbaro” ganhou o sentido de violento ou 
ignorante, de modo que precisamos tomar cuidado com o seu uso.
Prezado(a) acadêmico(a), você consegue perceber como é tendenciosa a 
denominação “invasões bárbaras”? E como é fácil perceber ‘de que lado estava’ quem criou 
essa denominação? O termo em alemão, para as ‘invasões bárbaras’, pode ser traduzido como 
“migração dos povos”. (Como você pode imaginar, os alemães, que são descendentes dos 
povos ‘invasores’, não iriam referir-se como “bárbaros” a seus próprios ancestrais)!
2.2 OS REFORMADORES: DIOCLECIANO E CONSTANTINO
Diocleciano (284-305) pôs fim à maior parte dos conflitos ao iniciar 
reformas profundas, que teriam consequências muito importantes para o 
futuro do Império. Fortaleceu o exército, permitindo o recrutamento dos 
bárbaros, neutralizou o Senado e, em 286, dividiu o império em uma parte 
ocidental, entregue ao seu grande amigo Maximiano, e uma parte oriental – 
que daria origem ao Império Bizantino –, que conservou para si. Essa divisão 
marcava uma profunda distinção que já havia entre as metades do Império e 
que se acentuariam muito nos séculos seguintes.
FONTE: Disponível em: <http://go.hrw.com/venus_images/0304MC05.gif>. Acesso em: 20 maio 
2012.
ATENCAO
UNI
44
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
FIGURA 4 - A DIVISÃO DO IMPÉRIO ROMANO POR DIOCLECIANO, 395 D.C.
FONTE: Disponível em: <http://go.hrw.com/venus_images/0304MC05.gif>. Acesso 
em: 15 fev. 2013.
O Império Bizantino será estudado na Unidade 2 deste Caderno de Estudos.
Além disso, nomeou dois césares, para auxiliar os imperadores: Constâncio 
foi o César de Maximiano e Galério, o de Diocleciano. Este sistema, conhecido 
como tetrarquia, só foi eficiente durante o reinado de Diocleciano, devido em 
parte às relações de amizade entre os governantes. A partir de 305, com a renúncia 
dos imperadores em favor dos césares, o sistema entrou em crise. No ano seguinte, 
Constantino, filho de Constâncio, foi proclamado imperador por suas tropas.
Dentre suas realizações, fundou a cidade de Constantinopla e tornou-a 
capital do Império. Constantino também é conhecido por suas ações em relação 
ao Cristianismo: em 313, liberou o culto e, anos mais tarde, tornou-se ele próprio 
um cristão.
Com a conversão de Constantino, a Igreja passou a desfrutar de uma posição 
bastante poderosa na política romana, como veremos no Tópico 4 desta unidade.
ESTUDOS FU
TUROS
ESTUDOS FU
TUROS
TÓPICO 3 | ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
45
2.3 AS ORIGENS REMOTAS DO FEUDALISMO
Como dissemos anteriormente, a divisão do Império consolidava uma cisão 
que já existia entre as partes ocidental e oriental. Essa divisão não era simplesmente 
geográfica: havia muitas diferenças entre as duas partes do Império.
Uma das principais diferenças era econômica. A parte oriental era muito mais 
rica do que a ocidental, por ter ocupação muito mais antiga e intensa, um comércio 
mais vigoroso e cidades mais populosas. Por mais que tentassem preservar o seu 
ouro, os imperadores do Ocidente, ao contrário de seus equivalentes orientais, não 
conseguiam conter a fuga ou a estocagem de recursos, e o resultado foi uma séria 
crise inflacionária. Com o dinheiro perdendo praticamente todo o seu valor, cada 
vez mais a economia monetária, baseada no ouro e em outros metais, foi sendo 
substituída por uma economia natural no Império ocidental.
Economia natural: é o nome que se dá a uma forma de produção que não envolve 
o uso do dinheiro. Nesse tipo de produção, as pessoas em geral se dedicam à subsistência, e os 
poucos produtos restantes são trocados por mercadorias de valor equivalente.
AUTOATIVIDADE
Tente imaginar a vida moderna baseando-se nas trocas de produtose 
em pagamentos in natura. Seria possível? Se o dinheiro não circulasse entre nós, 
seria viável vivermos em cidades? Como as pessoas fariam para sobreviver?
Isso gerou tremendas consequências para o Império. Os impostos e salários 
começaram a ser pagos in natura, o que era muito vantajoso para os soldados e os 
funcionários civis. O desperdício na cobrança de impostos que a cobrança in natura 
causava forçou o Imperador Diocleciano a reforçar o exército com os bárbaros, que 
eram pagos em terras. Os colonos mais pobres ficavam arruinados com a exigência 
de pagamento dos impostos e ameaçavam abandonar suas fazendas, pondo em 
risco a produção agrícola.
NOTA
46
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
Antes de continuar a leitura, imagine que atitudes os imperadores romanos 
poderiam tomar para tentar conter esse abandono das fazendas.
A solução encontrada foi obrigar os trabalhadores a permanecerem para 
sempre em suas atividades e, mais tarde, tornar hereditária essa condição. Dessa 
forma, os colonos pobres, tanto os pequenos proprietários como os arrendatários, 
se tornavam cada vez mais dependentes de um senhor poderoso e presos à terra 
em que viviam: começavam a tornar-se servos.
Servo é um termo que vem do latim servus, ‘escravo’. Apesar disso, os servos 
não eram escravos: estavam presos não a um senhor, mas à terra em que viviam. Mesmo 
assim, ao contrário do que se costuma pensar, a escravidão continuou existindo na Europa 
durante a Idade Média; apenas era mais rara. Geralmente, os escravos eram capturados de 
povos estrangeiros, especialmente muçulmanos, e havia muitos cristãos escravizados em 
terras islâmicas.
No final do século IV, a situação havia melhorado um pouco. A tendência à 
economia natural e à feudalização pôde ser revertida no Oriente, onde o dinheiro 
voltou a ser utilizado para pagar os impostos e salários, mas isso não foi possível 
no império ocidental. Em parte, isso pode ser explicado pela capacidade que o 
Império oriental tinha de resistir à pressão dos povos bárbaros. Como dispunha 
de muito dinheiro, o imperador de Constantinopla podia pagar aos invasores para 
que fossem embora, coisa que o imperador do Ocidente não conseguia fazer.
Observe que, até esse momento, as explicações para o colapso do Império 
Romano praticamente não fizeram menção aos bárbaros. Isso mostra que a ideia, muito 
comum, de que o Império teria caído simplesmente por causa das invasões bárbaras não é 
totalmente correta. O Império Romano do Ocidente já estava em franca decadência quando 
as invasões do século V ocorreram.
UNI
IMPORTANT
E
UNI
TÓPICO 3 | ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
47
3 OS BÁRBAROS NO IMPÉRIO DO OCIDENTE
Desde o final do século II, os povos bárbaros vizinhos ao Império Romano 
estavam sendo progressivamente assentados como colonos em terras imperiais, na 
condição de foederati (federados), uma estratégia diplomática romana para conter 
os invasores, ao garantir a sua submissão (em latim, foedus).
Esses povos federados ganhavam o direito a ter um governo próprio e 
estavam isentos dos impostos romanos, mas deviam fornecer soldados ao exército 
quando necessário. Os romanos que vivessem em regiões dos foederati continuavam 
sujeitos às leis romanas. Dentre os povos federados nos séculos III e IV estão os 
francos, os godos (divididos em dois ramos, os ostrogodos e os visigodos), os 
alamanos, os saxões, os vândalos e vários outros.
Perceba que não estamos falando de pequenos bandos, mas de tribos inteiras, às 
vezes, milhares de pessoas, assentadas em terras romanas e mantendo sua autonomia e sua 
cultura no interior do Império!
AUTOATIVIDADE
De que formas as alianças com os foederati representavam um indício 
de fraqueza do Império Romano? Tente pensar em todas as razões que puder.
Havia problemas, porém, nessa aliança, para os romanos: os germânicos 
entendiam a condição de foederati como um contrato assinado entre líderes, não 
entre estados. Portanto, a aliança vencia, no seu entendimento, quando da morte 
do imperador romano. Isso se tornou problemático, especialmente nos séculos IV 
e V, quando os povos federados começaram a sofrer uma pressão intensa de um 
novo e terrível inimigo: os hunos.
O terror inspirado por esse povo nômade levou diversos povos a 
atravessarem as fronteiras do Império e lá se fixarem, inicialmente com a 
concordância dos romanos. Os godos, que tiveram seus dois reinos nas estepes 
ao norte do Mar Negro destruídos pela presença dos hunos, foram os primeiros, 
em 376. Dois anos depois, eles entraram em confronto com as legiões romanas na 
Batalha de Adrianópolis. A vitória dos godos, atribuída à força de sua cavalaria e 
aos sérios erros estratégicos do exército imperial, é considerada um dos grandes 
marcos da decadência final do poderio romano. A partir deste momento, diversos 
povos germânicos se estabeleceriam dentro do Império e começariam a constituir 
seus domínios.
ATENCAO
48
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
Como você provavelmente já sabia ou já percebeu, o que chamamos de reinos 
bárbaros (que serão vistos com mais detalhe no próximo tópico) surgiram dos domínios que os 
germânicos passaram a conquistar. O grande sentido de lealdade dos germânicos a seus líderes 
lhes deu o status de reis, e as leis próprias que eles podiam seguir lhes davam autonomia como 
reinos. Posteriormente, a associação desses reis com a Igreja consolidou a aura de divindade 
que estava associada à nobreza.
Uma tentativa de invasão da Itália foi rechaçada pelo general Estilicão (que 
era de origem vândalo-romana). Após a morte de Estilicão, o chefe godo Alarico 
comandou um cerco a Roma e, em 410, tomou a cidade e saqueou-a durante três 
dias. 
São Jerônimo descreveria o saque de Roma em tom de lamentação, da 
seguinte forma:
Quem acreditaria que Roma, edificada pelas vitórias sobre todo o 
universo, viesse a cair; que tivesse sido simultaneamente a mãe das 
nações e o seu sepulcro; que as costas do Oriente, do Egito e da África, 
outrora pertencentes à cidade dominadora, fossem ocupadas pelas 
hostes dos seus servos e servas; que em cada dia a santa Belém recebesse 
como mendigos pessoas de um e outro sexo que haviam sido nobres e 
possuidoras de grandes riquezas? (apud ESPINOSA, 1981, p. 9).
À medida que os povos germânicos invadiam com mais intensidade o 
Império, os hunos começaram a se tornar cada vez mais ameaçadores ao próprio 
Império Romano.
3.1 OS HUNOS
Há muitas controvérsias sobre a unidade étnica e linguística desse povo 
– como, de resto, também entre os povos germânicos. Os hunos eram uma 
confederação de povos nômades, provavelmente originários das estepes da 
Ásia Central (região entre o Mar de Aral e a Mongólia), que falavam uma língua 
provavelmente aparentada ao turco. 
O historiador de origem grega Amiano faz uma descrição dos hunos que 
dá uma demonstração clara do terror que esses homens infundiam nos romanos:
Todos eles têm membros compactos e firmes, pescoços grossos, e são 
tão prodigiosamente disformes e feios que os poderíamos tomar por 
animais bípedes ou por toros desbastados em figuras que se usam nos 
lados das pontes.
ATENCAO
TÓPICO 3 | ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
49
Tendo, porém, o aspecto de homens, embora desagradáveis, são rudes 
no seu modo de vida, de tal maneira que não têm necessidade nem de 
fogo nem de comida saborosa; comem as raízes das plantas selvagens 
e a carne semicrua de qualquer espécie de animal que colocam entre as 
suas coxas e os dorsos dos cavalos para as aquecer um pouco.
Vestem-se com tecidos de linho ou com as peles de ratos silvestres 
cosidas umas às outras, e esta veste serve tanto para uso doméstico como 
de fora. Mas uma vez que meteram o pescoço numa túnica desbotada, 
não a tiram ou mudam até que pelo uso quotidiano se faça em tiras e 
caia aos pedaços. (apud ESPINOSA, 1981, p. 4-5).
FIGURA 5 - COMPARAÇÃO ENTRE UM SOLDADO GERMÂNICO (ESQUERDA), UM 
OFICIAL HUNO (CENTRO) E UM GUERREIRO HUNO (DIREITA)
FONTE: Disponível em: <http://www.ernak-horde.com/huns.jpg>.Acesso em: 18 out. 
2012.
Além de assustadores em sua aparência e seus modos, os hunos 
amedrontavam os romanos por serem extraordinários guerreiros: sob o comando 
de Átila (406-453), ameaçaram a unidade do Império do Oriente, chegaram às 
portas de Constantinopla e de Roma (embora não tenham saqueado nenhuma das 
duas cidades) e, entre os dois eventos, chegaram a colaborar com o Império do 
Ocidente na luta contra os visigodos.
Os hunos chegaram a criar um império nômade que se estendia da atual 
Alemanha até os montes Urais (na Rússia, no limite tradicional entre a Europa e a 
Ásia), e do Mar Negro e rio Danúbio até o Mar Báltico, ao norte. Com a morte de 
Átila, os hunos foram rapidamente dominados e seu império desmoronou.
50
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
FIGURA 6 - OS DOMÍNIOS HUNOS EM 450 D.C. 
FONTE: Disponível em: <http://www.emersonkent.com/images/maps/roman_
hunnic_empire_450.jpg>. Acesso em: 18 out. 2012.
Os domínios dos hunos, em sua máxima extensão, estendiam-se do rio Reno (na 
fronteira da Alemanha) até as proximidades do mar Cáspio, e da atual Estônia até o rio Danúbio.
3.2 A QUEDA DE ROMA
O colapso do império huno coincidiu com um enfraquecimento cada vez 
maior do Império Romano, que não conseguia mais honrar os acordos ou pagar 
os tributos que devia aos foederati. Em 476 d.C., Odoacro, líder dos hérulos, depôs 
Rômulo Augusto (ou Augústulo, como foi muitas vezes chamado, em alusão ao seu 
caráter fraco, o último imperador romano) e abriu caminho para a desagregação 
completa do império do Ocidente. A partir daí, consolidam-se os vários reinos 
comandados por germânicos, e novas ondas de imigração tornariam irreversível o 
processo de feudalização da Europa.
Prezado(a) acadêmico(a), apresentamos na Leitura Complementar a seguir 
o início do 4º Capítulo do livro Origens da Idade Média, de William C. Bark, 
onde o autor discute em linguagem informal as modificações pelas quais o mundo 
romano passou nos primeiros cinco ou seis séculos da nossa Era. Repare que, em 
um certo trecho do texto, o autor se dedica a atacar a teoria de Henri Pirenne sobre 
a permanência do mundo romano com os germânicos. Você consegue identificar 
onde? Releia o trecho correspondente no Tópico 2, se for necessário.
UNI
TÓPICO 3 | ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
51
LEITURA COMPLEMENTAR
ORIGENS DA IDADE MÉDIA
William C. Bark
Se Júlio César ou Adriano, que muito viajaram pelo mundo civilizado 
de suas respectivas épocas, tivessem podido visitar a Europa do século V ou VI, 
teriam encontrado muitas alterações intrigantes na aparência externa do mundo 
que conheceram. Essas modificações, bastante acentuadas no Oriente, no Ocidente 
teriam sido ainda mais evidentes, especialmente no estado das cidades, grandes e 
pequenas, na composição e disposição dos exércitos, o caráter do transporte e do 
comércio, as ocupações quotidianas e mesmo a roupa do povo.
Ambos teriam sem dúvida considerado o Ocidente romano como 
inteiramente decadente. Mesmo assim, o teriam reconhecido. Embora César sem 
dúvida se pudesse aborrecer com o estado das armas romanas e Adriano entristecer-
se com a sorte de suas grandes cidades, a “deterioração” que teriam encontrado seria 
pelo menos a deterioração de um ambiente, mais ou menos familiar, de criações e 
costumes romanos. 
Muito mais surpreendente teria sido a descoberta, se lhes fosse possível fazê-
la, de que por maiores que parecessem as modificações externas, eram pequenas se 
comparadas a certas alterações mais sutis da perspectiva, dos valores, dos modos de 
pensar e das aspirações. A evolução política, econômica e social [...] foi um movimento 
de repulsão às velhas práticas romanas, mas no qual ainda se identificavam as antigas 
instituições que haviam provocado. As demais modificações representavam um 
movimento no sentido de alguma coisa nova e inteiramente estranha à experiência 
de um César ou um Adriano, e dentro em breve se expressariam no comportamento 
externo, bem como no pensamento e no sentimento.
Os edifícios, ruas, teatros, obras de engenharia de uma grande cidade, nem 
sempre desaparecem quando os que foram capazes de planejá-los e executá-los 
já não existem. O túmulo de um imperador pode durar vários séculos, servindo 
posteriormente como palácio papal, e um palazzo pode continuar existindo como 
casa de cômodos. Mesmo assim, ainda há modificações: a roupa lavada é pendurada 
nas janelas da casa de cômodos, minaretes são acrescidos à Santa Sofia. 
As modificações no reino do pensamento são mais difíceis de perceber. O 
sentido verdadeiro de uma instituição como o exército, ou o sistema de administração 
política, pode sofrer uma transformação vital sem se revelar em ajustes de nomes e 
aspectos. Nessas circunstâncias, uma organização social aparentemente vigorosa, 
uma religião, por exemplo, ou um sistema fiscal, pode tornar-se mera casca que não 
denuncia externamente a profunda alteração que sofreu.
A função do estudo histórico é interpretar a modificação como um todo, 
manter especificamente os sentidos internos que não se mostram na aparência 
externa. Não é necessário dizer que isso nem sempre é fácil. Como já vimos, o 
52
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
vinho sírio era transportado para a França no século II, e também no século VI. O 
produto era o mesmo, o meio de transporte o mesmo, a fonte e o destino os mesmos: 
nada mais provável, portanto, que as condições continuassem as mesmas, que as 
circunstâncias predominantes no Mediterrâneo perdurassem. 
A história não pode ser escrita sem analogias semelhantes, baseadas nesse 
tipo de fatos. Não obstante, nessa interpretação o historiador pode deixar de 
identificar novas evoluções de aspecto não familiar, pode passar sobre o trigo para 
ir ocupar-se do joio. Pode estar descrevendo o lado de fora de uma casca, deixando 
a impressão de que se trata mais do que de uma simples casca.
O objetivo deste capítulo é examinar quatro aspectos diferentes do novo 
mundo que se formava atrás da casca do velho, e era parcialmente obscurecido por 
ela. A modificação que marcou época, ou a série de modificações, ocorridas entre os 
séculos IV-V e IX-X, foram tanto internas como externas: 1) na forma pela qual os 
homens pensavam e nos objetos de seus pensamentos; 2) na forma pela qual viviam 
e se expressavam; 3) naquilo que julgavam compensador fazer; e 4) na forma pela 
qual o faziam. O que estava realmente ocorrendo nesse período — isto é, o que os 
homens faziam e os pensamentos que os levavam a tal ação — era muito diverso 
do que ocorrera na época do poderio romano. [...]
A tese primordial [...] deste trabalho como um todo é a de que algo novo, 
distinto e essencialmente original começou na parte europeia ocidental do Império 
Romano, que seus elementos são identificáveis a partir do século IV, e alguns até 
mesmo antes. Esse “algo de novo” talvez se compreenda melhor como uma nova 
atitude para com a vida. Nos séculos de sua formação, ela é parcialmente obscurecida 
pelas aparências externas dos remanescentes romanos, mais familiares e mais 
evidentes, pela turbulência da época e pela escassez de nossas fontes. 
Grande parte das informações que mais gostaríamos de ter não pareceu aos 
contemporâneos como merecedora de ser preservada, sob qualquer forma; outra 
parte perdeu-se para nós em incêndios, guerras, mau trato. Talvez a pior ameaça 
de todas tenham sido certas ideias fixas poderosas: a preocupação com a imensa 
epopeia do declínio e queda, a opinião “autorizada” de que o princípio da Idade 
Média foi uma época de ignorância supersticiosa e letargia geral, animada apenas 
por instantes de violência e crueldade bárbaras. [...]
Sabemos agora que a Idade das Trevas não foi de trevas. Ignorância, letargia, 
desordem, existiram então como hoje, e longe estiveram de predominar numa 
época ansiosa de conhecimento, vigorosa em seu modo de viver e de se expressar, 
e idealista nas suas construções. 
Talvez não seja demais dizer que a sociedade medieval tinha formasfuncionais com que a idade antiga nem sonhara, formas essas que levaram a fins 
jamais imaginados em épocas anteriores. Por “funcional” entendo que era uma 
sociedade ativa, trabalhadora, experimentadora, cometendo erros frequentemente, 
mas também utilizando a energia de seu povo muito mais integralmente que suas 
TÓPICO 3 | ANTECEDENTES: A ANTIGUIDADE TARDIA
53
predecessoras, e finalmente permitindo a esse povo um desenvolvimento muito 
mais amplo e mais livre. 
O fato de que as condições, acontecimentos e povos se tivessem reunido 
de tal forma no princípio da Idade Média foi extremamente feliz para os atuais 
herdeiros da tradição ocidental.
FONTE: BARK, William C. Origens da Idade Média. Rio de Janeiro: Zahar, 1979, p. 97-101.
54
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico você viu que:
 O Império Romano estava desgastado com o fim das conquistas militares no 
século II, e iniciou um longo processo de decadência. Apesar de revertido 
parcialmente em alguns momentos, esse processo levou a uma ruralização 
progressiva da sociedade romana.
 Os imperadores Diocleciano e Constantino fizeram reformas profundas na 
tentativa de salvar o Império da decadência. Dentre elas, a divisão do Império 
em Oriental e Ocidental e a aceitação de bárbaros no exército.
 Os bárbaros passaram a ser assentados no interior do Império na condição de 
federados, tendo direito a seguir suas próprias leis e com grande autonomia em 
relação a Roma.
 Os hunos foram um povo especialmente temido por bárbaros e romanos, e a 
pressão que eles faziam acelerou a queda do Império.
55
1 Explique a relação entre a crise do escravismo e a decadência do Império 
Romano.
2 Estabeleça uma relação entre a pressão dos bárbaros e as crises políticas do 
Império.
3 Como foi dito no tópico anterior, William C. Bark acredita que o Império 
Romano caiu por causa das tentativas de mantê-lo. Encontre neste tópico 
elementos que permitam confirmar essa teoria.
AUTOATIVIDADE
56
57
TÓPICO 4
O ESTADO E A IGREJA NA IDADE MÉDIA
UNIDADE 1
1 INTRODUÇÃO
O período compreendido entre os séculos V e X, aproximadamente, costuma 
ser denominado pelos historiadores de Alta Idade Média. Foi um período marcado 
pela criação de reinos que, em um lento processo, promoveriam a integração entre 
as culturas tão diferentes dos romanos e dos germânicos, por meio da religião 
cristã. Esses reinos, no entanto, não tinham a unidade e a estabilidade que havia 
tido o Império Romano, de modo que, por volta do ano 1000, a ordem política da 
Europa era claramente fragmentada.
A única instituição que se manteve unida, nesse momento de 
fragmentação, foi a Igreja. De fato, a única noção de unidade que havia entre 
os homens medievais era a Cristandade. Neste tópico vamos estudar esse 
duplo processo de desagregação política e a unidade religiosa.
SUGESTÃO DE LEITURA
Prezado(a) acadêmico(a), uma boa obra de referência para aprofundar seus conhecimentos 
acerca dos temas abordados neste tópico é: LE GOFF, Jacques. A Civilização do Ocidente 
Medieval. Bauru: Edusc, 2005.
Como vimos no tópico anterior, a presença dos bárbaros completou o 
processo de desagregação do Império Romano do Ocidente. Até o século V, diversos 
povos haviam invadido o Império, e começaram a criar domínios relativamente 
independentes (inicialmente na condição de foederati), que se tornariam os 
chamados reinos germânicos. 
2 OS REINOS BÁRBAROS
UNI
58
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
Quem eram os POVOS BÁRBAROS?
Constituíam os povos de origem germânica que habitavam as regiões ao norte, ao nordeste 
da Europa e noroeste da Ásia, na época do Império Romano. Os romanos se utilizavam da 
expressão "bárbaros" para designar todos aqueles que residiam nas regiões situadas além das 
fronteiras do Império Romano, e em especial que não falavam o latim, a língua oficial do 
Império.
Os reinos germânicos enfrentaram grandes dificuldades e dependiam da 
cooperação entre romanos e germânicos. Sem tradição de governos centralizados, 
os bárbaros confiavam muito mais na autoridade pessoal do líder e na sua 
capacidade de manter as tribos unidas do que nos preceitos do Direito Romano. A 
assimilação era dificultada pelas leis romanas, que não permitiam a realização de 
casamentos entre romanos e estrangeiros. Sendo assim, em muitas regiões levou 
mais de um século para que um processo de miscigenação realmente pudesse se 
iniciar.
Outro problema enfrentado pela maioria dos reinos bárbaros era religioso: 
no processo de migração, os bárbaros haviam sido, em sua maioria, cristianizados 
pela corrente ariana do Cristianismo. Para os católicos romanos, o arianismo era 
uma heresia, e os povos germânicos que a adotavam eram vistos, muitas vezes, 
como inimigos.
Arianismo é o nome que se dá a uma dissidência – ou heresia, na terminologia 
usada pelo Catolicismo romano – do Cristianismo que surgiu no início do século IV. A 
controvérsia gerada pelo arianismo será estudada em breve.
UNI
ESTUDOS FU
TUROS
TÓPICO 4 | O ESTADO E A IGREJA NA IDADE MÉDIA
59
FIGURA 7 - OS REINOS BÁRBAROS
FONTE: Disponível em: <http://www.igm.mat.br/homepage/joao_afonso/J.A/figuras_inhumas/
reinos%20barbaros.jpg>. Acesso em: 20 fev. 2013.
Os principais povos germânicos a estabelecer reinos foram:
 Anglo-Saxões: anglos, saxões, jutos, frísios e outros povos instalaram-se na foz 
do rio Reno. Alguns grupos migraram para a ilha da Grã-Bretanha no século V, 
dominaram as populações celtas originais e criaram reinos que durariam até a 
invasão dos normandos (vikings) em 1066.
 Burgúndios: fundaram um reino no início do século V, destruído pelos hunos. 
Em 443, criam novo reino que seria destruído pelos francos cerca de um século 
depois.
 Francos: criaram o mais poderoso e mais importante reino bárbaro, que será 
estudado em detalhes a seguir.
 Ostrogodos: o maior dos reis ostrogodos, Teodorico, foi educado em 
Constantinopla e criou na Itália o primeiro reino que reuniu pacificamente 
romanos e germânicos. Com a sua morte, o reino começou a decair e em 553 foi 
conquistado pelo Império Bizantino.
 Suevos: em 410, estabeleceram um reino na Galícia (norte de Portugal e costa 
atlântica da Espanha), destruído em 585 pelos visigodos.
 Vândalos: após invadirem a Península Ibérica entre 407 e 409, foram expulsos 
de lá pelos romanos e visigodos. Invadiram a África do Norte em 429, onde 
fundaram um reino poderoso. (Santo Agostinho morreu durante essa invasão 
60
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
em Hipona, a segunda maior cidade do novo reino). De lá, em 455, comandaram 
uma expedição que saqueou Roma. A violência do saque deu ao termo vândalo 
o sentido de arruaceiro e violento.
	Visigodos: estabelecidos na Península Ibérica a partir de 418, seu reino duraria 
até a conquista dos muçulmanos, no século VII. Após a invasão, muitos 
atravessaram os Pirineus e se tornaram colaboradores dos francos.
A imagem que se tem dos povos bárbaros como incapazes de criar um reino 
organizado, por não conhecerem as tradições e as leis romanas, não é correta. Observe-se, 
por exemplo, o caso de Teodorico, rei ostrogodo. Essa imagem é preconceituosa porque parte 
da ideia de que os germânicos eram ignorantes e incapazes de elaborar governos sofisticados, 
coisa que só os civilizados romanos teriam condições de fazer.
3 O REINO FRANCO
No entanto, de todos os povos bárbaros, o que teve mais sucesso em criar e 
consolidar um reino foram os francos. As razões para isso têm a ver, entre outros 
fatores, com a conversão dos francos ao cristianismo católico, que facilitou a sua 
aceitação pelas populações galo-romanas.
Os francos eram uma confederação de tribos, nem todas etnicamente 
aparentadas, que viviam nos limites do Império Romano pelo menos desde o 
século III. No final do século V, Clóvis, o primeiro rei franco, adotou o cristianismo 
católico e tornou os francos aliados naturais da Igreja de Roma. Clóvis ampliou os 
domínios francos e, após sua morte, os domínios foram divididos em dois reinos,Nêustria e Austrásia. O costume franco de dividir o reino entre todos os herdeiros 
enfraqueceu aos poucos os reinos e permitiu o fortalecimento político dos prefeitos 
do palácio (ou mordomos, do latim major domus). 
De meros administradores do palácio, com o tempo passaram a cobrar os 
impostos, administrar o exército e nomear os condes e duques; eram inclusive os 
tutores dos herdeiros do trono. O cargo terminou por se tornar hereditário. Os reis 
merovíngios dessa época, sem poder, ficaram conhecidos como os reis indolentes.
Em 732, o prefeito do palácio Carlos Martel derrotou os muçulmanos que, 
após destruírem o reino visigodo e ocuparem quase toda a Península Ibérica, 
avançaram sobre os francos. A vitória em Poitiers deu a Martel um enorme 
prestígio, que lhe permitiu centralizar o poder sobre todos os reinos francos. Seu 
filho, Pepino, o Breve, venceu os lombardos e doou terras à Igreja, que viriam a 
se tornar os Estados Pontifícios. Em 751, ele destronou Childerico III, o último rei 
merovíngio, e criou a nova dinastia Carolíngia.
ATENCAO
TÓPICO 4 | O ESTADO E A IGREJA NA IDADE MÉDIA
61
Com a morte de Pepino, o Breve, seu filho Carlos assumiu o trono. Seu 
reinado foi caracterizado por uma grande ampliação nos domínios francos (ver 
mapa a seguir) e por uma valorização da cultura. Carlos Magno, como ficou 
conhecido, consolidou a aliança entre os francos e a Igreja e, como um prêmio à 
sua lealdade e às suas conquistas e forma de garantir a predominância do papado 
sobre o governante mais poderoso do Ocidente na época, o Papa Leão III coroou-o 
“imperador romano” no Natal de 800.
FIGURA 8 – O REINO FRANCO DE CLÓVIS A CARLOS MAGNO
FONTE: Disponível em: <http://fr.wikipedia.org/wiki/Image:Frankish_empire.jpg>. Acesso em: 20 
fev. 2013.
A coroação foi controversa, porque o papa ignorou a existência do Império 
Bizantino, formalmente era o legítimo continuador do Império Romano. No 
entanto, o papa alegou que o trono bizantino encontrava-se vago (pois era ocupado 
por uma mulher), para consolidar seu poder no Ocidente.
É claro que a explicação para a atitude do papa vai muito além do 
“machismo” e da “prepotência ocidental”. A coroação de Carlos Magno que 
atendia a um duplo propósito: o desejo dos governantes francos de expandir seu 
poder e a intenção dos papas de consolidar sua versão de religiosidade cristã como 
hegemônica.
 E os adversários eram os mesmos: internamente, os povos bárbaros 
com seus reinos rivais e seu cristianismo ariano, e externamente, muçulmanos. 
Depois, os próprios bizantinos, com seu desejo de expandir seus domínios e 
62
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
suas divergências político-religiosas com Roma. A coroação de Carlos Magno 
consolidou uma vinculação muito próxima entre a autoridade papal e o poder no 
Ocidente e separou irreversivelmente os domínios e os rituais religiosos de cristãos 
católicos e ortodoxos.
3.1 O REINADO DE CARLOS MAGNO
Para melhor administrar seu reinado, Carlos Magno dividiu-o em condados 
e, nas fronteiras, as marcas, que delegou a nobres de sua confiança (os condes e 
marqueses, respectivamente), com amplos poderes em suas regiões. O rei tentou 
criar um sistema imperial organizado, com uma reforma monetária e funcionários 
que fiscalizavam a atuação dos nobres, os missi dominici.
 No entanto, essa estrutura não conseguiu centralizar o poder em suas mãos: 
aos poucos, os vínculos de doação e vassalagem se tornaram mais importantes 
do que a lealdade ao rei e o poder na Europa Ocidental tornou-se cada vez mais 
fragmentado.
FIGURA 9 - MAPA: REINO FRANCO EM 814, MOSTRANDO SUAS DIVISÕES TRADICIONAIS E AS 
CIDADES QUE SERVIAM DE PARADA AO REI
FONTE: Disponível em: <http://www.moneymuseum.com/imgs/ximages/image/ 
2010/8/I_EN_63655_8.jpg>. Acesso em: 20 out. 2012.
TÓPICO 4 | O ESTADO E A IGREJA NA IDADE MÉDIA
63
3.1.1 O Renascimento Carolíngio
Durante os reinados de Carlos Magno e de seu filho, Luís, o Piedoso, surgiu 
um movimento de renascimento cultural e intelectual que ficou conhecido como 
Renascimento Carolíngio. Carlos Magno trouxe estudiosos (em sua maioria 
religiosos) para sua corte em Aachen (Aix-la-Chapelle, em francês) e copiou 
muitos manuscritos antigos usando a recém-criada caligrafia carolíngia. Quase 
toda a herança greco-romana que era conhecida durante a Idade Média se deve 
a essa iniciativa. Os livros ganharam um cuidado especial, com encadernações 
riquíssimas e muito elaboradas.
Carlos Magno, ele próprio analfabeto até a idade adulta, entendeu bem 
a importância da educação. Seus estudiosos, comandados por Alcuíno de York, 
instituíram os currículos do trivium (gramática, lógica e retórica) e do quadrivium 
(aritmética, geometria, música e astronomia) e criaram obras literárias originais em 
latim medieval.
FIGURA 10 – MANUSCRITO DO SÉCULO X. EXEMPLO DA CALIGRAFIA CAROLÍNGIA
FONTE: Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/en/7/72/
CarolingianMinuscule.jpeg>. Acesso em: 14 fev. 2013.
3.1.2 A divisão do Império
Após a morte de Luís, o Piedoso, em 840, seus filhos lutaram para organizar 
a sucessão. Pelo Tratado de Verdun (843), a parte ocidental ficou com Carlos, o 
Calvo; a oriental com Luís, o Germânico; e a região central com Lotário. Após 
a morte de Lotário, em 855, as lutas entre seus herdeiros fragmentaram todo o 
Império, garantindo ainda mais poder para a nobreza rural. No leste, o reino de 
Luís deu origem ao Reino da Alemanha, mais tarde o Sacro Império Romano-
Germânico.
64
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
FIGURA 11 – DIVISÃO DO IMPÉRIO CAROLÍNGIO APÓS OS TRATADOS DE VERDUN 
(843) E MEERSEN (870)
FONTE: Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/d/d7/843-
870_Europe.jpg>. Acesso em: 15 fev. 2013.
O Sacro Império Romano-Germânico surgiu como uma tentativa de manter 
a vinculação entre o poder temporal (do rei) e o poder da Igreja. Apesar do nome, era 
politicamente fragmentado, aproximando-se muito mais de uma confederação de domínios 
feudais do que de um reino. O governante recebia o título de imperador romano, e o posto não 
era hereditário: o imperador era eleito pelos principais nobres. O império sobreviveu ao fim da 
Idade Média e foi desfeito apenas em 1806, durante as conquistas napoleônicas.
3.2 NOVOS INVASORES
No final do século IX, nova onda de invasões aterrorizou a Europa. Do 
Oriente vieram os magiares, que se fixariam mais tarde na Hungria. Do norte, os 
temíveis vikings (ou normandos, os “homens do norte”) atingiram toda a região da 
Inglaterra e França até serem cristianizados e se assentarem na região conhecida 
como Normandia (na França). Sua presença, como piratas ou comerciantes, 
estendeu-se por toda a região do Báltico, Mar Mediterrâneo e mesmo o Oriente 
Médio: os vikings estabeleceram contatos comerciais com os muçulmanos e estão 
ligados à formação da Rússia de Kiev e da Liga Hanseática.
NOTA
TÓPICO 4 | O ESTADO E A IGREJA NA IDADE MÉDIA
65
4 A IGREJA NA ALTA IDADE MÉDIA
O Cristianismo surgiu na Palestina, no início do Império Romano, e aos 
poucos começou a se tornar uma força significativa dentro da sociedade romana. 
As ideias de salvação da alma, igualdade entre os homens e caridade tinham 
muita repercussão entre as camadas mais pobres da sociedade, especialmente 
entre os escravos. As perseguições feitas pelos imperadores romanos, pela 
recusa dos cristãos a venerarem os deuses imperiais, aumentavam a simpatia ao 
movimento que, no século IV, já era majoritário entre a população do Império.
Em vista disso, o Imperador Constantino proibiu as perseguições aos cristãos 
e, mais tarde, converteu-se ele próprio à religião. A conversão de Constantino 
pode ou não ter sido uma jogada política, mas o fato é que ele conseguiu, dessa 
forma, manter um controle sobre a religião, associando-a aos interesses do Estado 
romano. Em meados do século VIII, essa relação seria invocada e invertida, e a 
coroação de Carlos Magno simbolizava o domínio da Igreja sobre a Monarquia.
4.1 SANTO AGOSTINHOUma das figuras mais importantes para o desenvolvimento da Cristandade 
medieval foi Santo Agostinho de Hipona (354-430), que elaborou grande parte dos 
fundamentos religiosos do Cristianismo. Para elaborar sua teologia, Agostinho 
baseou-se, principalmente, na filosofia de Platão e dos neoplatônicos, adaptando-
as às preocupações religiosas.
FIGURA 12 - REPRESENTAÇÃO TRADICIONAL DE SANTO 
AGOSTINHO DE HIPONA 
FONTE: Disponível em: <http://lifeondoverbeach.files.wordpress.
com/2011/06/augustine-of-hippo.jpg>. Acesso em: 23 out. 
2012.
66
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
Essa “cristianização de Platão” pode ser entendida como um símbolo da adaptação 
que fizeram os homens da Antiguidade Tardia e da Alta Idade Média do pensamento clássico, 
embora há quem veja nisso um sinal inequívoco de decadência. A Leitura Complementar, no 
final deste tópico, ajudará você a refletir melhor sobre o assunto.
4.2 O ARIANISMO
A Igreja, criada como uma analogia do Império, tinha uma estrutura 
rígida, que se fundou cada vez mais na primazia do bispo de Roma, considerado 
o sucessor de São Pedro (desde Leão I, em meados do século V), sobre os demais. 
Isso significava a necessidade de se manter uma única autoridade suprema na 
Terra, assim como havia uma única divindade no Céu.
Isso levou a Igreja a se defrontar com algumas questões bastante delicadas, 
não só pela necessidade de explicá-las de um ponto de vista teológico, como 
pelas implicações políticas que elas traziam. Na época, não havia a separação, 
nem política nem filosófica, entre religião e poder, e as ameaças à doutrina eram 
também ameaças ao poder do papa. Era necessário combater as dissidências – em 
grego, heresias – a fim de preservar a unidade da religião.
Não estamos querendo dizer, com isso, que a motivação para combater as 
heresias fosse simplesmente política, ou seja, que os papas estivessem preocupados apenas 
em manter o seu poder diante das ameaças. Entender o combate às heresias apenas do ponto 
de vista político é tão incorreto quanto entendê-lo apenas do ponto de vista teológico. Como 
dissemos, não havia uma separação clara entre as duas categorias.
Uma das heresias mais importantes da Idade Média foi o já mencionado 
arianismo, nome dado em razão de seu fundador, Ário de Alexandria (c. 250–336). 
O ponto mais controverso da teologia de Ário era a sua ideia de que Jesus Cristo 
tinha sido criado por Deus, não igual a Ele. Da mesma forma, o Espírito Santo 
seria uma criação de Deus, e estaria subordinado a Cristo, como Cristo a Deus. 
Em outras palavras, o arianismo negava a ideia da Santíssima Trindade, o que era 
potencialmente destrutivo para a Igreja Católica.
Para tentar solucionar a controvérsia gerada pelo arianismo, o Imperador 
Constantino convocou o primeiro Concílio Ecumênico da história do Cristianismo, 
em Niceia (325), na atual Turquia. O resultado do Concílio foi avassalador: dos 250 
NOTA
ATENCAO
TÓPICO 4 | O ESTADO E A IGREJA NA IDADE MÉDIA
67
4.2 O ARIANISMO
a 318 bispos que se estima que compareceram (de acordo com as várias contagens), 
apenas dois apoiaram Ário. O Concílio estabeleceu o chamado Credo Nicênico, 
que reafirmava toda a doutrina católica e que, com modificações, é recitado até 
hoje, em praticamente todas as denominações religiosas do Cristianismo.
Caro(a) acadêmico(a), veja a seguir uma tradução do conteúdo original do 
Credo Nicênico (em itálico, os trechos que hoje não fazem parte do Credo regular, 
mas que eram, como se verá, os pontos centrais):
Creio em um Deus, Pai Todo-poderoso, Criador do céu e da terra, e de 
todas as coisas visíveis e invisíveis; e em um Senhor Jesus Cristo, o unigênito Filho 
de Deus, gerado pelo Pai antes de todos os séculos, Deus de Deus, Luz da Luz, verdadeiro 
Deus de verdadeiro Deus, gerado não feito, de uma só substância com o Pai; pelo qual 
todas as coisas foram feitas; o qual por nós homens e por nossa salvação, desceu 
dos céus, foi feito carne pelo Espírito Santo da Virgem Maria, e foi feito homem; e foi 
crucificado por nós sob o poder de Pôncio Pilatos. Ele padeceu e foi sepultado; 
e no terceiro dia ressuscitou conforme as Escrituras; e subiu ao céu e assentou-se 
à direita do Pai, e de novo há de vir com glória para julgar os vivos e os mortos, 
e seu reino não terá fim. E no Espírito Santo, Senhor e Vivificador, que procede do 
Pai e do Filho, que com o Pai e o Filho conjuntamente é adorado e glorificado, que falou 
através dos profetas. Creio na Igreja una, universal e apostólica, reconheço um só 
batismo para remissão dos pecados; e aguardo a ressurreição dos mortos e da 
vida do mundo vindouro.
FONTE: Extraído de ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura: A Doutrina Reformada das Escrituras. São 
Paulo: Os Puritanos, 1998, p. 179-80. 
4.3 OS BÁRBAROS E A IGREJA
O rei, entre os bárbaros, tinha um papel sagrado: visto como de origem 
divina, era o chefe dos ofícios religiosos, muito mais do que um simples líder 
militar. Por isso, a conversão dos povos bárbaros era uma tarefa relativamente 
simples: bastava converter o líder, e o seu povo se converteria com ele. Isso tornava 
o trabalho dos missionários mais fácil, em um primeiro momento, mas exigia um 
longo trabalho de catequização para que a nova tradição religiosa fosse assimilada 
adequadamente, sem alterações ou deturpações. 
O arianismo teve um papel especialmente importante na Idade Média, 
porque a maioria dos povos bárbaros que entravam no Império foi cristianizada 
sob essa forma. Quando os reinos germânicos foram formados, no século V, alguns 
de seus criadores eram arianos havia mais de um século. Os romanos, no entanto, 
eram majoritariamente trinitários (católicos), e isso gerou sérias dificuldades de 
adaptação com os recém-chegados.
68
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
4.4 A REGRA DE SÃO BENTO
Como dissemos, o trabalho de cristianização dos povos germânicos não se 
resumia à conversão do rei. Após esse processo, que era antes uma formalidade, 
era preciso ensinar a religião a todo o povo, o que levou décadas ou até mesmo 
séculos, em alguns casos. 
A conversão dos povos germânicos implicava, mais do que o ensinamento 
de preceitos religiosos, a introdução de uma cultura completamente diferente, que 
terminou por ser mesclada às culturas locais, criando-se uma forma híbrida de 
cultura e de práticas religiosas, que passou a ser o modo de vida medieval.
FIGURA 13 - SÃO BENTO DE NÚRCIA, AUTOR DA REGRA QUE 
ORGANIZAVA A VIDA DOS MOSTEIROS MEDIEVAIS. A 
PINTURA É DE FRA ANGÉLICO
FONTE: Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/
commons/thumb/7/73/Fra_Angelico_031.jpg/220px-Fra_
Angelico_031.jpg>. Acesso em: 23 out. 2012.
Para essa tarefa, foi muito importante a constituição de um clero regular, 
ou seja, submetido a regras, a uma rígida disciplina. Em 534, São Bento de Núrcia 
(480-547) elaborou a sua Regra, baseando-se em algumas já existentes, mas com 
muito mais clareza e simplicidade.
Hilário Franco Júnior (2004, p. 70) faz a seguinte reflexão sobre a Regra:
Por ela, a vida do monge beneditino transcorre em função do preceito do 
ora et labora. Oração e trabalho num duplo sentido, numa dupla forma 
de alcançar Deus: rezar é combater as forças maléficas, contribuindo 
TÓPICO 4 | O ESTADO E A IGREJA NA IDADE MÉDIA
69
4.4 A REGRA DE SÃO BENTO para a salvação não apenas da alma do próprio monge, mas também de toda a sociedade; trabalhar é afastar a alma de seus inimigos, a 
ociosidade e o tédio, é alcançar por meio dessa forma de ascese uma 
fonte de alegria. Tanto quanto o trabalho manual, o intelectual, a leitura 
de textos sagrados, prepara a alma para a oração. Enfim, orar é uma 
forma de trabalhar, trabalhar é uma forma de orar.
VOCÊ SABIA?
Quando o Papa Bento XVI explicou, dias após a sua eleição, em 2006, a razão para escolher 
seu nome, mencionou o trabalho importantíssimo de São Bento na evangelização da Europa.
Os centros monásticos constituídos dessa forma passaram a ser, então, os 
locais onde os monges pudessem conviver comos pagãos (ou com os arianos) e 
trazer auxílio e soluções para os seus problemas quotidianos. Assim, os religiosos 
ganhavam reputação entre os bárbaros e, de quebra, promoviam a fusão das 
culturas de uma forma mais intensa e duradoura. 
Os monges que atuavam nessa verdadeira frente de batalha foram muito 
mais do que simples transmissores de uma mensagem religiosa, verdadeiros 
agentes de transformação cultural. Buscavam completá-la com uma atuação direta 
e constante nas comunidades, de modo a demonstrar a superioridade do modo de 
vida cristão sobre as antigas práticas pagãs.
Perceba que esses monges serviram como o elo de ligação entre essas duas 
culturas tão diferentes, o que explica, em parte, o caráter central que a religião teve durante a 
Idade Média.
Caro(a) acadêmico(a), apresentamos um trecho de William C. Bark sobre 
Santo Agostinho e a difícil tarefa de adaptar a cultura clássica às necessidades 
medievais.
NOTA
UNI
70
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
LEITURA COMPLEMENTAR
A vida intelectual do novo mundo na Idade Média teve um molde 
inteiramente diverso da antiguidade clássica — principalmente helênica. Um dos 
pontos cruciais da história do pensamento foi o momento em que os gregos não só 
começaram a adquirir conhecimento, como ocorrera até então, mas a especular sobre 
ele, a unir a ciência e a filosofia. O legado dessa união não se exauriu nunca, embora 
os romanos não o pudessem apreciar devidamente e embora desde o início da Idade 
Média os europeus ocidentais o tivessem por vezes utilizado de uma forma que 
sem dúvida pareceria estranha aos que originalmente recolheram aquela fortuna.
No Último Império, o fogo grego ardeu muito obscuramente. A ciência 
perdeu a vitalidade e a velha união com a filosofia se dissolveu. Houve novas 
necessidades a serem satisfeitas: para os intelectuais, a recordação das glórias da 
Academia não tinha mais utilidade do que para os fazendeiros desapropriados de 
Salviano a lembrança da grandeza do nome romano e da liberdade de seus ancestrais. 
A filosofia contraiu nova aliança, dessa vez com a teologia. A partir de 
então, durante alguns séculos, a vida intelectual se processaria sob a orientação da 
Igreja. O conhecimento do passado foi em parte mantido e transformado, em parte 
virtualmente ignorado. 
Os líderes cristãos, acima de todos Santo Agostinho, lutaram com energia 
e êxito para reorganizar os padrões do pensamento e adaptar o conhecimento 
clássico e as realizações intelectuais que se conservaram aos novos objetivos da 
vida humana. Uma vida na qual a salvação se havia tornado a principal finalidade 
do homem educado.
Santo Agostinho tem, merecidamente, um lugar de destaque. De todas as 
tarefas impostas ao intelecto humano, talvez a mais difícil seja a de perceber, em 
período de enormes modificações fundamentais, o que está morto e destituído de 
sentido, e então conceber, aperfeiçoar e propagar valores mais adequados à nova era.
 A maioria dos homens, em todas as épocas, e muito mais em épocas de 
agitação do que nas de estabilidade, se apega firme e cegamente àquilo que lhe é 
familiar e aceito, evitando o frio desconforto do reajustamento mental e espiritual. Ao 
reconhecer o que estava morto, ou agonizante, e ao dar sentido ao que estava vivo e 
nascia, Santo Agostinho teve poucos pares. As Confissões e a Cidade de Deus bastam 
para nos mostrar como lhe era poderosa a atração do passado. Sua superioridade 
está no reconhecimento de que, para a sua geração e para as gerações futuras, nas 
condições de vida que deviam imperar, as vozes de Platão e do resto eram apenas 
ecos de um túmulo. Não repudiou a inspiração de Platão, utilizou-a. Mas escolheu 
apenas aquilo que considerava de valor, adaptou-o às novas condições e fez dele 
parte da estrutura intelectual que teria sido incompreensível à Academia.
É cabível indagar da história se há alguma razão válida para supor que o 
gênio humano chamejou com menos brilho quando os homens, por boas razões 
TÓPICO 4 | O ESTADO E A IGREJA NA IDADE MÉDIA
71
pessoais e da época, transferiram o pensamento especulativo da ciência-filosofia 
para a teologia-filosofia. Presumivelmente, os homens do Último Império e do 
princípio da Idade Média nasceram com a mesma capacidade de pensar, inquirir e 
evoluir intelectualmente que os homens de qualquer outra época. A questão, então, 
não é se tinham capacidade, mas se podiam ou desejavam usá-la, e como a usavam. 
Devemos fazer aqui uma distinção entre a atitude de fins do período clássico e início 
do medieval, tal como mencionada na discussão das opiniões de Pirenne sobre a 
decadência da cultura clássica.
É perceptível, antes do século IV, um declínio não universal, mas generalizado, 
da qualidade das obras intelectuais e literárias pertencentes à tradição clássica. Essa 
tradição perdera muita vitalidade e seus adeptos já não pareciam convictos de que 
os assuntos de que tratavam tivessem muito sentido. 
Os pensadores e autores da tradição patrística, ao contrário, estavam 
imbuídos de uma completa fé na força daquilo que para eles era vital -, e sobre 
isso escreveram com energia e segurança, na apologética, na exegese, na homilética, 
em obras sobre a organização eclesiástica, sobre ascetismo e hagiografia, sobre 
controvérsias doutrinárias.
 Nossa época supõe geralmente que essa produção, particularmente na última 
forma, representa uma perda de tempo. Tal não é, porém, a opinião daqueles que 
conhecem tais obras bem e reconhecem o lugar que lhes cabe no desenvolvimento 
dos processos de pensamento do homem ocidental. Muitas das controvérsias 
versaram assuntos fúteis e áridos, muitas foram inspiradas por motivos econômicos 
e políticos, ou por interesses pessoais, e seu estilo se reveste mais de paixões do 
que de inteligência. 
Não obstante, é certo que as polêmicas teológicas frequentemente se ocuparam 
de assuntos de imorredouro interesse para a humanidade, que frequentemente 
eram cheias de sinceridade e brilhantismo e que deram um estímulo grande ao 
desenvolvimento de um método de pensamento que é agudo, inquisitivo e lógico. 
Sua contribuição para a formação, nos séculos posteriores, da filosofia escolástica 
— um dos pontos altos na evolução do pensamento ocidental — é bastante bem 
conhecida para ser descrita aqui.
Devemos, portanto, ser extremamente cautelosos no julgamento das 
realizações intelectuais da Idade Patrística, em comparação com as da antiguidade 
clássica. Devemos reconhecer as divergências dos antigos padrões, a simplificação 
e mesmo o abandono de certas áreas do conhecimento. 
Formular, porém, uma condenação geral da vida intelectual da época como 
decadente, retrogressiva e obscura é simplesmente abrir caminho para a deformação 
da realidade histórica e tornar sua compreensão impossível. Não há como negar 
que certos males como pobreza, instabilidade e violência se tornaram piores após 
a época de São Jerônimo e Santo Agostinho, antes que melhorassem, e que os 
empreendimentos intelectuais sofreram, como todas as outras manifestações vitais. 
72
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
O essencial é que pelo século IV uma nova atitude intelectual para com o 
mundo já se firmara, e que essa atitude não era necessariamente superior ou inferior 
à da antiguidade clássica, mas simplesmente diferente, e que as circunstâncias 
e natureza de seu desenvolvimento eram da maior importância. É de duvidar 
que qualquer atitude mental e espiritual menos consistente, agressiva e menos 
convencida de sua missão pudesse ter preparado as tempestades que iam envolver 
a Europa ocidental nos séculos futuros.
FONTE: Bark (1979, p. 102-105)
73
RESUMO DO TÓPICO 4
Neste tópico você viu que:
 Os reinos bárbaros que se formaram com o fim do Império Romano do Ocidente 
tiveram grandes dificuldades por causa do choque cultural com os romanos, das 
tradições políticas germânicas e dos conflitos religiosos.
 O reino bárbaro mais poderoso foi o dos francos, que conseguiu o apoio da 
Igreja e consolidouo seu domínio sobre grande parte do Ocidente.
 O maior dos reis francos, Carlos Magno, promoveu um movimento de 
recuperação cultural chamado Renascimento Carolíngio.
 A Igreja medieval, preocupada em fortalecer seu poder e afirmar-se como a 
única via de salvação, teve que enfrentar diversas heresias; a mais importante 
delas foi o arianismo, que questionava a divindade de Jesus Cristo.
 Os grandes responsáveis pela evangelização da Europa foram os monges, 
especialmente os beneditinos. Nesse processo, eles ajudaram a desenvolver uma 
cultura totalmente nova, fundindo os elementos cristãos, romanos e germânicos.
74
AUTOATIVIDADE
1 Quais as razões da forte aliança celebrada entre a Igreja e os reis francos?
2 Discorra sobre o papel da Igreja na organização da sociedade medieval. 
Assista ao vídeo de
resolução da questão 1
75
TÓPICO 5
AS ORIGENS DO ISLAMISMO
UNIDADE 1
1 INTRODUÇÃO
Desde o início do século XXI, o Islamismo parece estar o tempo todo em 
evidência. Os atentados de 11 de setembro de 2001, a crise no Oriente Médio, as 
polêmicas sobre símbolos religiosos na Europa, tudo parece apontar para uma 
tensão entre Ocidente e Oriente, entre cristãos e muçulmanos. A ideia de um 
“choque de civilizações” é controversa e exagerada, mas não temos como negar 
que existe pelo menos um estranhamento entre o mundo ocidental e os valores do 
Islamismo.
A polêmica tese do “choque de civilizações”, elaborada pelo cientista político 
Samuel Huntington, diz que os conflitos mundiais, neste período pós-Guerra Fria, serão travados 
entre civilizações, não entre ideologias. Huntington aponta principalmente a tensão entre o 
mundo ocidental (europeu e norte-americano), com seus valores democráticos, seculares e 
racionalistas, e o mundo islâmico, entendido por ele como detentor de valores opostos a esses.
Esse estranhamento não é recente; pelo contrário, vem desde a época do 
surgimento do Islã. Além das questões religiosas, que tanto aproximam como 
afastam cristãos e muçulmanos, os seguidores dessas religiões entraram em guerra 
incontáveis vezes na História e, de certa forma, esse confronto ajudou a criar o 
mundo que conhecemos hoje.
No entanto, não é apenas pelos conflitos com o Ocidente que devemos 
compreender o Islamismo. O surgimento dessa religião, a cultura que ela criou e 
as relações dos muçulmanos com os outros povos são eventos extraordinários por 
si sós. 
 Nas grandes cidades muçulmanas, abastecidas com sistemas de esgoto, 
iluminação noturna, universidades e bibliotecas públicas, viviam mercadores de 
todas as partes do mundo conhecido, de Portugal à China, das estepes da Rússia à 
África ao sul do Saara, que abasteciam os bazares com todos os tipos imagináveis 
de produtos e de experiências culturais. 
NOTA
76
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
Poetas, filósofos e cientistas tinham à sua disposição, em árabe ou persa, 
obras gregas de Aristóteles há muito esquecidas no Ocidente. Judeus, muçulmanos 
e cristãos conviviam em harmonia, sem perseguições religiosas nem discriminações 
por causa de etnia ou religião. 
Se na chamada Antiguidade Clássica o mundo “civilizado” falava grego e 
latim, um viajante do século VIII ou do XII não teria dúvidas: o auge da civilização 
humana naquela época parecia ser um povo que falava árabe e rezava voltando-se 
para Meca.
SUGESTÕES DE LEITURA
Prezado(a) acadêmico(a), existem diversos livros que podem nos dar uma visão mais precisa 
sobre o mundo muçulmano, dos pontos de vista político e cultural. Quatro obras, facilmente 
acessíveis no mercado editorial brasileiro, podem servir de referência mais imediata:
Para uma visão mais factual do mundo islâmico, ver o livro de:
● GIORDANI, Mário Curtis. História do mundo árabe medieval. Petrópolis: Vozes, 1997.
 O livro é parte de uma série de títulos que o autor escreveu sobre História Geral, em um estilo 
bastante descritivo e detalhado, mas como costuma ocorrer em obras dessa magnitude, sem 
o compromisso com uma reflexão teórico-metodológica mais aprofundada. É um bom ponto 
de partida, mas vale a pena complementá-lo com obras posteriores.
Para discussões mais recentes e mais críticas sobre o mundo islâmico, ver:
● HOURANI, Albert. Uma história dos povos árabes. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
● MAALOUF, Amin. As Cruzadas vistas pelos Árabes. São Paulo: Brasiliense, 1988.
● SAID, Edward. Orientalismo. O Oriente como invenção do Ocidente. São Paulo: Companhia 
das Letras, 2008.
2 UMA NOVA FÉ: O ISLAMISMO
O Islamismo é, hoje, a segunda maior religião do mundo em número de 
seguidores, e a que cresce mais rapidamente, de acordo com o U.S. Center for 
World Mission. Em todo o mundo, são cerca de 1,5 a 1,8 bilhão de muçulmanos, 
e esse número vem aumentando consistentemente, não apenas pelo crescimento 
demográfico nas regiões de população muçulmana, mas por conversões em países 
em que o Islã não é a religião original.
Ao mesmo tempo, o imaginário ocidental atribui um papel muito negativo 
ao Islã. Estamos habituados a associar os muçulmanos à imagem de guerra 
e fanatismo religioso, para não mencionar a suposta intolerância em relação às 
mulheres, que são constantemente noticiadas pela mídia televisiva e jornalística.
 No entanto, é importante termos em mente que essa visão ocidental 
pejorativa sobre os árabes é um estereótipo reducionista e, muitas vezes, mentiroso, 
criado em parte por ignorância e em parte intencionalmente, como propaganda 
UNI
TÓPICO 5 | AS ORIGENS DO ISLAMISMO
77
política de guerra. Reduzir o Islã ao terrorismo fundamentalista é tão errado 
quanto seria considerar todos os cristãos como fanáticos religiosos dispostos a 
passar no fio da espada qualquer um que duvide de sua fé. 
É claro que existem, nas duas religiões, pessoas dispostas a isso, mas é 
claro, também, que essas pessoas são uma ínfima minoria em populações que são, 
em sua quase totalidade, pacíficas.
Como estudiosos de História, não nos cabe julgar o Islã e, muito menos, 
aceitar sem questionamento as visões preconceituosas criadas sobre ele. Por isso, 
precisamos conhecer o que é o Islã, como surgiu e por que tem obtido esse sucesso 
extraordinário.
2.1 OS PRIMÓRDIOS: A ARÁBIA DO SÉCULO VII
O Islamismo surgiu na Península Arábica, uma região desértica localizada 
entre a África e o Oriente Médio, ao sul da Palestina. A proximidade com culturas 
muito antigas, como as do Egito, da Etiópia, do Levante (Síria, Líbano e Jordânia), 
do Iêmen e do Irã (terra dos impérios de Ciro e Xerxes, e dos impérios Parto e 
Sassânida), fez dessa região uma zona de convergência cultural e religiosa 
privilegiada desde tempos muito remotos. A população da península organizava-
se, essencialmente, entre os beduínos – tribos nômades de língua árabe que viviam 
no deserto – e os moradores das cidades, como Meca. 
Não devemos, contudo, entender os nômades do deserto da Arábia como 
povos isolados. Segundo o historiador Ciro Flamarion Cardoso (1994), os beduínos 
mantinham estreitas relações com os povos sedentários dos centros urbanos da 
península e do Oriente Próximo, através do comércio e como soldados dos exércitos 
imperiais bizantinos ou sassânidas.
As relações com os sedentários, marcadas por uma complementaridade 
ecológica e econômica, variaram muito no plano político. Hoje se sabe que 
as acusações de banditismo, de barbárie, de pilhagens, de invasões feitas aos 
nômades, muitas vezes, se originam, de fato, na propaganda dos Estados urbanos 
desejosos de impor tributos ou outras obrigações às tribos das estepes, desertos ou 
montanhas (CARDOSO, 1994, p. 40).
Os beduínos estavam organizados, desde cerca de 1500 a.C., em comunidades 
formadas a partir de famílias patriarcais. Os líderes dessas comunidades eram 
chamados de xeques (literalmente, “anciãos”). 
As diversas tribos nômades que viviam na região central da Arábia 
(desértica) estavam em constantes disputas pelos oásis – os raros locais onde 
existia água e pastagem para os animais (carneiros, ovelhas e camelos). No entanto,a Arábia não é composta apenas de desertos: no litoral do Mar Vermelho e do 
Oceano Índico, um intenso comércio mercantil floresceu com as regiões próximas 
ao Mar Vermelho, no Golfo Pérsico e no Oceano Índico. As caravanas cameleiras 
78
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
atravessavam o deserto rumo ao norte, onde as regiões vassalas do Império 
Sassânida ofereciam enormes oportunidades comerciais. Além disso, o clima 
ameno do sul da Arábia permitia o desenvolvimento da agricultura e da pecuária.
Essas populações eram, em sua maioria, politeístas, embora alguns 
indivíduos, que tinham contato com as regiões próximas, adotassem alguma das 
religiões dos povos vizinhos, como: Judaísmo, Cristianismo ou Zoroastrismo. 
Certamente, essas religiões eram conhecidas dos primeiros muçulmanos, como se 
pode verificar pela grande vinculação dos episódios narrados no Alcorão com a 
tradição religiosa judaico-cristã.
Com tudo isso, como podemos verificar, a Arábia, embora 
predominantemente desértica, estava plenamente inserida no contexto econômico 
e social das regiões próximas.
2.2 MAOMÉ E A CRIAÇÃO DO ISLAMISMO
A religião muçulmana viria a unificar todas essas populações, diversificadas 
e politeístas, em torno da crença em um único deus. Até o advento do Islamismo, 
os árabes cultuavam os astros e as manifestações da natureza e tinham como um 
de seus objetos de veneração a “pedra negra”, guardada na Caaba, em Meca. 
Segundo a tradição, ela teria sido enviada por Deus a Adão e seria originalmente 
branca: teria se tornada negra devido aos pecados dos homens.
A cidade de Meca foi construída sobre um oásis, e tornou-se desde muito 
cedo um importante centro religioso e comercial. Na época do nascimento de 
Maomé (ca. 570 d.C.), a cidade era governada pela tribo dos coraixitas, grupo que 
enriqueceu com as transações comerciais e as peregrinações dos que se dirigiam à 
cidade para fazer votos aos deuses na Caaba.
“ca.” (em itálico) é uma abreviatura consagrada do latim circa, que quer dizer 
“cerca de”; na dúvida, substituir o “ca.” por “cerca de”,
Maomé (ou Muhammad, na grafia árabe) nasceu entre os coraixitas, embora 
não fizesse parte dos segmentos mais abastados da tribo. Órfão desde cedo, foi 
criado pelo tio Abu Talib e tornou-se mercador e pastor. 
Aos 25 anos, casou-se com Khadija, uma rica viúva comerciante. Aos 
40 anos, Maomé começou a ter visões em que um anjo o incitava a proclamar a 
existência de um deus único. Embora logo tenha arregimentado seguidores, a 
pregação de Maomé trouxe-lhe a ira dos comerciantes da cidade, que temiam 
perder os negócios voltados aos cultos politeístas. 
UNI
TÓPICO 5 | AS ORIGENS DO ISLAMISMO
79
2.2 MAOMÉ E A CRIAÇÃO DO ISLAMISMO
Perseguidos em Meca, Maomé e seus seguidores refugiaram-se em 622 
na cidade de Yathrib (que passou a se chamar Medina), onde os preceitos do 
Islamismo começaram a ser organizados e sistematizados. Aos poucos, os cidadãos 
de Medina foram se convertendo à nova fé e Maomé passou a dispor de um 
efetivo de guerreiros capaz de vencer o conflito entre as duas cidades. Finalmente, 
conquistaram Meca em 630.
A ida de Maomé e seus seguidores para Medina, chamada Hégira, é considerada 
pelos muçulmanos como o momento fundamental da sua religião. Os muçulmanos não 
entendem a Hégira como uma fuga, mas como uma migração. A partir desse momento, o 
Islamismo se organizou como sistema político e religioso.
O CALENDÁRIO ISLÂMICO
O calendário islâmico é contado a partir da migração de Maomé a Medina. Portanto, o ano 1 
AH (Ano da Hégira) inicia-se em 622 d.C. O calendário islâmico não segue uma contagem solar 
(ou seja, o ano não tem 365,25 dias), mas puramente lunar. O ano é composto de 12 meses de 
28 ou 29 dias, que se iniciam sempre quando a Lua crescente é avistada ao pôr do Sol. Dessa 
forma, o ano tem cerca de 11 dias a menos do que o do nosso calendário. Portanto, embora 
tenham decorrido 1390 anos entre a Hégira e o ano de 2012, o ano islâmico que se iniciou em 
15 de novembro de 2012 foi 1434 AH.
2.3 MORTE E SUCESSÃO DE MAOMÉ 
Após a conquista de Meca, a população local converteu-se rapidamente 
ao Islã e Maomé dispôs de uma grande força militar para lançar conquistas por 
toda a Península Arábica. Recomendando a prática do jihad – termo normalmente 
(mas de forma inapropriada, conforme interpretações islâmicas) traduzido como 
“guerra santa”, Maomé contou com a ajuda dos fiéis para conquistar toda a 
Península Arábica em dois anos.
Nos últimos meses de sua vida, Maomé promoveu o último evento 
fundamental da religião islâmica: a peregrinação à Caaba, que passou a ser 
obrigatória aos fiéis uma vez na vida, da forma como Maomé a fez.
 
Após a morte do Profeta, em 632 d.C. (ano 10 d.H.), o poder político passou 
a ser disputado entre o genro de Maomé, Ali, e seu grande amigo Abu Bakr, que 
foi escolhido pela comunidade como novo líder. A disputa gerou uma cisão 
religiosa entre os muçulmanos, que passaram a se dividir entre xiitas e sunitas, 
respectivamente, conforme o reconhecimento da autoridade de Ali e de Abu Bakr. 
IMPORTANT
E
NOTA
80
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
Prezado(a) acadêmico(a), é muito importante desfazermos algumas concepções 
equivocadas e, muitas vezes, mal-intencionadas que se tem, na nossa cultura, sobre alguns 
termos do Islamismo. Em particular, os termos jihad e xiita precisam ser bem compreendidos. 
Jihad não é sinônimo de guerra santa, mas, de acordo com algumas interpretações, é uma 
atitude de defesa da fé, em todas as suas formas. Xiita, igualmente, não é sinônimo de fanático, 
mas é o nome de uma das divisões religiosas do Islamismo. Os xiitas não são mais nem menos 
“fanáticos” (nunca use esse termo!) do que os sunitas, os católicos, os protestantes, os bahá’i 
ou os membros de qualquer outra facção religiosa.
O termo xiita significando fanático (e, portanto, “perigoso”) foi popularizado no Ocidente por 
grupos políticos ultraconservadores, no contexto da rivalidade política entre EUA e Irã que se 
seguiu à Revolução Islâmica promovida pelo Aiatolá Khomeini, em 1979. Traduz, portanto, um 
discurso político reacionário, calculado para despertar o pânico na opinião pública e justificar 
intervenções militares. Perceba que, hoje, apenas veículos de comunicação ultraconservadores 
utilizam o termo xiita com esse sentido. Pelo bem da atitude crítica que um professor de 
História deve ter, elimine essa expressão de seu vocabulário (inclusive no famigerado “ecoxiita”) 
e, sempre que necessário, chame a atenção das pessoas para isso.
3 OS PRINCÍPIOS BÁSICOS DO ISLAMISMO
O Islamismo é uma religião monoteísta, ou seja, o muçulmano acredita na 
existência de um único deus – chamado, em árabe, de Allah. Este é o mesmo deus dos 
judeus e dos cristãos, e também é este o nome que os cristãos que falam árabe utilizam 
para se referir a Deus. O Islamismo, além disso, é uma religião abraâmica, ou seja, 
baseia-se na tradição religiosa judaica, que via em Abraão o patriarca fundamental. 
Por isso, o Islã aceita essa tradição religiosa, contida na Torá judaica e na Bíblia cristã, 
apesar de dar interpretações distintas a muitas das passagens que ali estão.
Pela tradição muçulmana, o Islã representa a mensagem verdadeira de 
Deus, que havia sido corrompida por interpretações anteriores, mas que teria sido 
revelada em toda a sua pureza a Maomé. O propósito da vida, para os muçulmanos, 
é louvar e servir a Deus. O termo islã vem da palavra árabe para “submissão”.
IMPORTANT
E
TÓPICO 5 | AS ORIGENS DO ISLAMISMO
81
ÁRABE OU MUÇULMANO?
Costuma haver grande confusão entre os termos “árabe” e “muçulmano”. Árabe é a designação 
de uma etnia, formada por pessoas que nasceram, ou cujos ancestrais vieram da Península 
Arábica e que falam a língua árabe, de origem semita. Nesse sentido, é árabe a maioria dos 
habitantes da atual Arábia Saudita, mas também dos Emirados Árabes Unidos, Egito, Iraque e 
outros países, mas não a maioria dos iranianos, turcos, afegãos ou nigerianos. 
Em umsentido mais restrito, árabe pode designar uma nacionalidade, aplicada aos moradores 
dos Emirados Árabes Unidos.
Muçulmano é a designação dos fiéis de uma religião, de pessoas que reconhecem em Maomé 
o profeta, e que seguem seus preceitos.Pessoas de qualquer etnia podem ser muçulmanas 
e, curiosamente, os árabes são, há muitos séculos, minoria no Islã: dos dez países islâmicos 
mais populosos hoje, apenas o Egito é etnicamente árabe. Há, também, árabes que não são 
muçulmanos, como é o caso da maioria dos libaneses (cristãos). 
A principal diferença entre essas três religiões é, essencialmente, a seguinte: 
● Os judeus esperam a vinda de um Messias, enviado por Deus para libertá-los.
● Os cristãos identificam esse Messias com a figura de Jesus Cristo. 
● Os muçulmanos consideram que não existe um Messias divino; há apenas 
profetas, dos quais Maomé é o último e mais perfeito. Jesus Cristo (a quem os 
muçulmanos denominam Issa) não é, para eles, o filho de Deus. É apenas um 
profeta anterior a Maomé.
Prezado(a) acadêmico(a), o que estamos falando aqui sobre o Islamismo não tem, 
de nenhuma forma, a intenção de “confundir suas crenças”, nem de “doutrinar” ou “converter” 
você. Os próprios autores, aliás, nem muçulmanos são... Mas o Islamismo é uma das maiores 
religiões do mundo e o seu surgimento influenciou enormemente a história mundial, e é 
por esse motivo que precisamos, como historiadores, conhecê-lo de forma relativamente 
detalhada, independente de convicções religiosas. Se isso faz ou não sentido para você, é 
questão inteiramente pessoal. O mesmo valerá, no futuro, para qualquer outra religião ou 
perspectiva filosófica que você estudar.
Lembre-se: para ser um bom estudioso ou professor de História, é preciso manter a cabeça 
aberta a várias perspectivas, buscar conhecer os diversos lados possíveis de uma questão e não 
julgar as atitudes ou as crenças de ninguém. Por isso, não leia sobre o Islamismo (ou qualquer 
outra religião) pensando “isso não é verdade, porque eu sei/o padre disse/ não tem lógica/ na 
Bíblia fala que...”; essa atitude é inadequada para quem deseja estudar História.
No fim das contas, para os historiadores, pouco importa se uma coisa é ou não “verdadeira”, 
ou se existe ou não uma “Verdade”. O que importa é como as pessoas entenderam e lidaram 
com isso.
E quando você mesmo(a) for professor(a), incite seus alunos a fazerem a mesma coisa.
ATENCAO
ATENCAO
82
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
3.1 OS CINCO PILARES DO ISLÃ
Os preceitos básicos do Islamismo podem ser resumidos nos cinco pilares, 
que são:
1. O testemunho: o fiel deve repetir a fórmula “só há um Deus e Maomé é o 
seu profeta”. Deus é único, onipotente, onisciente, senhor absoluto da Terra 
e da vontade dos homens. Sabe e controla tudo o que acontece, aconteceu e 
acontecerá. Maomé é, para o muçulmano, o último profeta que existirá, pois sua 
mensagem é perfeita.
2. As preces: o fiel tem a obrigação de rezar cinco vezes ao dia. A prece é feita 
recitando-se versos do Alcorão em língua árabe, com o corpo voltado na direção 
de Meca (se o fiel não conseguir descobrir qual o lado correto, basta supor). 
Pode ser feita em uma mesquita ou em qualquer outro lugar onde o fiel esteja
FIGURA 14 - MUÇULMANOS REALIZANDO AS PRECES, VOLTADOS PARA A CAABA 
EM MECA
FONTE: Disponível em: <http://www.neurosoup.com/mosque_prayer.jpg>. Acesso 
em: 17 out. 2012.
3. Os tributos: o fiel tem a obrigação de dar parte dos seus rendimentos para 
auxiliar aos pobres ou necessitados. Essa contribuição, chamada zakat, é 
diferente da esmola, que é opcional: o zakat é uma obrigação religiosa.
4. O jejum: o fiel é obrigado a guardar jejum de comida e bebida, enquanto 
houver luz natural, no mês do Ramadã. Essa obrigatoriedade pode ser 
dispensada para crianças ou pessoas enfermas. Além do jejum, nesse período 
o fiel está proibido de manter relações sexuais.
TÓPICO 5 | AS ORIGENS DO ISLAMISMO
83
5. A peregrinação: o fiel deve viajar a Meca, em peregrinação, pelo menos uma vez 
na vida, se suas condições econômicas assim lhe permitirem. Uma vez em Meca, 
deverá cumprir uma série de rituais ao redor da Caaba e em outros pontos na 
cidade.
Segundo Maria Yedda Leite Linhares (1989), “o Islã não é apenas o 
conjunto dos dogmas teológicos e normas sociais [...], é, antes de tudo, um tipo de 
comunidade civil guiada pelas leis do Corão e por uma herança cultural comum”. 
(LINHARES, 1989, p. 20). 
FIGURA 15 - O SANTUÁRIO DA CAABA EM 2008, DURANTE A ÉPOCA DA 
PEREGRINAÇÃO DOS MUÇULMANOS (HAJJ)
FONTE: Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/
commons/9/92/Al-Haram_mosque_-_Flickr_-_Al_Jazeera_English.
jpg>. Acesso em: 19 jul. 2012.
3.2 O ALCORÃO
O Alcorão é o livro sagrado dos muçulmanos. De acordo com a tradição 
islâmica, o Alcorão representa com perfeição a palavra de Deus e existe desde 
sempre. Por esse motivo, é chamado de “O Livro Incriado”. Ele teria sido 
simplesmente revelado a Maomé em 114 capítulos, ou suras, das quais 92 ditadas 
em Meca e as outras 22 suras em Medina. 
O conteúdo do Alcorão vai muito além das questões estritamente religiosas: 
traz preceitos morais, interpretações islâmicas de episódios da tradição religiosa 
judaica, legislação e situações do quotidiano. Por isso é frequentemente utilizado 
como referência básica para os sistemas legais dos países que adotam o Islamismo 
como religião oficial.
84
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
Prezado(a) acadêmico(a), você já viu algumas vezes, neste tópico, falar em “tradição 
islâmica”. Com esse termo estamos nos referindo a pontos centrais da crença muçulmana, 
que não constam diretamente do Alcorão (ou mesmo das Sunas ou dos Hadiths), mas que 
foram interpretados dessa forma pelos estudiosos da religião. Algumas dessas tradições podem 
parecer absurdas ou totalmente contrárias à razão. Mas lembre-se: o compromisso da tradição 
islâmica não é com a razão e sim com a interpretação do Livro Sagrado. Toda religião parte de 
pressupostos que parecem absurdos aos não crentes, mas não cabe ao historiador julgar se 
esses preceitos têm alguma validade racional, teológica ou metafísica.
De acordo com a tradição sunita, o Alcorão não foi escrito por Maomé. Ele 
teria recebido a revelação das suras diretamente de Allah, e estas eram anotadas 
por pessoas próximas a ele. Temendo que o conteúdo do livro se perdesse, o 
primeiro califa, Abu Bakr, ordenou a transcrição do livro pouco tempo após a 
morte de Maomé. 
Foi apenas no reinado do terceiro califa, Uthman Ibn Affan (às vezes, 
traduzido em português como Osman ou Omã), que o texto final, como é conhecido 
hoje, foi consolidado a partir das diferentes versões que já existiam. O texto final 
foi copiado e difundido para toda a ummah (mundo islâmico) que, àquela altura, 
como veremos, já era bastante extensa. 
Já os xiitas, talvez por não reconhecerem a autoridade de Abu Bakr, em 
função dos conflitos que surgiram na sucessão de Maomé, atribuem ao próprio 
profeta essa tarefa. Os estudiosos do assunto consideram em sua maioria que os 
sunitas estão corretos. Independentemente das desavenças, o conteúdo do Alcorão, 
para ambos os ramos do Islã, é idêntico.
FIGURA 16 - PÁGINAS DO ALCORÃO RICAMENTE TRABALHADAS
FONTE: Disponível em: <http://www.alquranacademy.co.uk/images/quran22.
jpg>. Acesso em: 17 out. 2012.
IMPORTANT
E
TÓPICO 5 | AS ORIGENS DO ISLAMISMO
85
“CORÃO” OU “ALCORÃO”?
O termo “Alcorão”, utilizado, frequentemente, para descrever o nome do livro sagrado dos 
muçulmanos, popularizou-se em Portugal durante a ocupação islâmica, na Idade Média. O 
prefixo “al” representa, na língua árabe, o artigo definido “o”; em português, passou a ser utilizado 
em centenas de palavras de origem árabe que foram incorporadas ao idioma: algodão, alface, 
alcaide, aldrava, algibeira, almoxarifado, almanaque, e muitas outras. O termo “Alcorão” segue a 
mesma regra. “Alcorão” significa “a recitação”.
Recentemente, temos visto na imprensa o termo “Corão”. É a tradução direta dotermo utilizado 
em francês (Coran) e inglês (Koran ou, como tem sido comum hoje, Qur’an), entre outras 
línguas, para designar o livro. Lembre-se de que a França e a Inglaterra não foram ocupadas pelos 
árabes, então não fizeram essa incorporação do “al”. Termos de origem árabe que em português 
incorporam o artigo (arroz, açúcar, algodão), não o fazem em francês (riz, sucre, coton) nem em 
inglês (rice, sugar, cotton). Em português, os dois termos são corretos, mas é preferível o termo 
clássico “Alcorão”.
Os muçulmanos tratam o Alcorão como uma revelação divina diretamente 
recebida por Maomé. Por esse motivo, consideram heresia atribuir-lhe a autoria 
do livro; segundo eles, o autor do Alcorão é o próprio Deus.
Apenas para você ter uma ideia do estilo e do conteúdo do Alcorão, 
apresentamos os primeiros versículos da sura 96, chamada Al-Alaq (“O Coágulo”). 
Este trecho é considerado, por quase todos os intérpretes do Alcorão, como os 
primeiros versos revelados a Maomé. À direita, também para você ter uma ideia 
do estilo de escrita árabe, o texto original (que é lido da direita para a esquerda).
Em nome de Deus, o Clemente, o Misericordioso.	 ِميِحَّرلا	ِنَمْحَّرلا	ِهَّللا	ِمْسِب
1 Recita em nome de teu Senhor que criou,	 َقَلَخ	يِذَّلا	َكِّب	َر	ِمْساِب	ْأ	َرْقا
2 Criou o homem de sangue coagulado.	 ٍقَلَع	ْنِم	َناَسنِإْلا	َقَلَخ
3 Recita. E teu senhor é o mais generoso,	 ُم	َرْكَأْلا	َكُّب	َرَو	ْأ	َرْقا
4 Que ensinou com a pena, يِذَّلا	َمَّلَع	ِمَلَقْلاِب
5 Ensinou ao homem o que ele não sabia. َمَّلَع	َناَسنِإْلا	اَم	ْمَل	ْمَلْعَي
 FONTE: O Alcorão. Tradução de Mansour Chalitta. Rio de Janeiro: Best Bolso, 2011, p. 479.
3.3 O DIREITO ISLÂMICO: OS HADITHS, AS SUNAS E A SHARIA
Além dos preceitos do Alcorão, os muçulmanos baseiam-se também em 
outros textos, que geralmente vêm para confirmar os ditos de Maomé ou garantir 
a aprovação ou desaprovação de uma determinada prática e que constituem, 
juntamente com o Alcorão, a base da jurisprudência islâmica. 
Dentre esses textos encontramos três fontes principais:
NOTA
86
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
 os Hadiths, que são extensas compilações das tradições e das declarações 
de Maomé sobre os mais variados assuntos ou de interpretações feitas sobre 
essas declarações por doutores da lei, das quais as mais respeitadas são as de 
Muhammad al-Bukhari;
 as Sunas, descrição daquilo que Maomé fazia, acreditava ou aprovava. Alguns 
estudiosos consideram as sunas e os hadiths equivalentes. Ao contrário dos 
sunitas, que baseiam sua conduta nas sunas (daí o nome), os muçulmanos xiitas 
não aceitam a maior parte das sunas e têm suas próprias compilações; e
 a Sharia, o código moral e religioso do Islã, que trata dos mais variados aspectos da 
legislação e da vida quotidiana dos muçulmanos: alimentação, higiene, conduta, 
vestimenta, comércio etc.
3.3.1 As escolas de interpretação da lei
Durante os primeiros 200 anos do Islamismo, surgiram quatro escolas 
de interpretação da lei islâmica. As três primeiras escolas (Hanafita, Malikita e 
Shafiita) guardam diversas semelhanças entre si, mas a quarta escola, Hanbalita, é 
mais tradicionalista e conservadora. 
As três primeiras escolas consideram todas as quatro como igualmente 
ortodoxas, mas os hanbalitas não retribuem a reverência. Os hanbalitas eram 
pouco expressivos até o início do século XVII, quando a corrente wah habi tornou-
se mais poderosa. 
Atualmente, os wahabitas são a doutrina religiosa dominante na Arábia 
Saudita e sua associação com os hanbalitas explica a interpretação severa que se dá 
à sharia na Arábia Saudita atual e que nas últimas décadas tornou-se mais popular 
entre grupos fundamentalistas islâmicos em diversas outras regiões. 
Mesmo entre os muçulmanos, são severas as críticas ao fundamentalismo 
da interpretação da sharia naquele país.
TÓPICO 5 | AS ORIGENS DO ISLAMISMO
87
3.3.1 As escolas de interpretação da lei
FIGURA 17 - Mapa: A distribuição das escolas de interpretação da lei (Fiqh) pelo mundo 
islâmico. Nos tons mais escuros, os locais de predominância xiita
FONTE: Disponível em: <http://ayshawazwaz.files.wordpress.com/2010/02/
muslimdistribution3b.jpg>. Acesso em: 25 nov. 2012.
3.4 O MODELO DE CONDUTA DO PROFETA
Por fim, outro guia para a conduta dos muçulmanos é o exemplo do Profeta. 
Os muçulmanos consideram Maomé um modelo de conduta a ser imitado, e por 
isso vários de seus hábitos foram incorporados pelos muçulmanos. Alguns críticos 
do Islã (mesmo críticos “de dentro”) condenam o recurso exagerado a isso, pois, 
em última análise, isso tenderia a perpetuar práticas da Arábia do século VIII – 
anacrônicas, portanto.
3.5 O MISTICISMO ISLÂMICO: O SUFISMO
Outro elemento muito importante para a constituição da cultura e 
da sociedade islâmica foi o misticismo muçulmano, denominado sufismo. O 
misticismo sufi parece ter sido influenciado por práticas oriundas de outras 
culturas, talvez mesmo do Cristianismo bizantino, mas tem suas características 
profundamente vinculadas à cultura onde se originou.
 Uma mescla de tradições árabes, persas, levantinas (ou seja, do Levante, 
região da Síria e Palestina) e, posteriormente, das outras culturas incorporadas ao 
Islã, como a turca.
O sufismo desenvolveu-se ao longo dos primeiros séculos do Islã, 
primeiramente como um modelo de conduta interior, que buscava respostas 
para como o fiel deveria proceder diante de Deus. Com o tempo, tornou-se uma 
doutrina do amor divino e, posteriormente, uma busca de Deus interna e pessoal, 
o que colocou o sufismo em conflito com a autoridade dos ulemás (doutores da Lei) 
e, na visão desses, até mesmo com o Alcorão.
 
88
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
Controvérsias políticas à parte, o sufismo continha, efetivamente, uma 
ameaça em potencial à autoridade da sharia. Seu objetivo era a busca de Deus pela 
verdade interior, não pelas determinações legais. Por volta de 1500, quase todos os 
muçulmanos eram sufis. Como se pode ver, o Islamismo tem “formatos” que não 
condizem em nada com a ideia de fundamentalismo que se faz dele, assim como 
tem doutrinas intransigentes que não aceitam nenhuma perspectiva diferente da 
sua (é o caso dos wahabitas – ver item 3.3.1).
O sufismo guarda uma notável semelhança, mantidas as devidas proporções, 
com o misticismo das ordens monásticas cristãs. Centenas de ordens sufis surgiram 
ao longo dos quase 1500 anos de Islã, e elas mantinham entre si grandes diferenças, 
muitas delas exigindo uma postura ascética dos seus seguidores.
 O sufismo foi muito importante como mecanismo difusor de cultura, pois 
tem como um de seus fundamentos a transmissão de seus preceitos, e também 
como agente estabilizador da sociedade, ao tomar para si a responsabilidade de 
manutenção de escolas, orfanatos, bibliotecas, hospitais e mesquitas.
 Por tudo isso, foi um dos elementos fundamentais de difusão do Islã entre 
os povos conquistados, do estabelecimento de uma certa homogeneidade cultural 
no mundo muçulmano, e do notável florescimento cultural ocorrido entre os 
séculos VIII – XIII, aproximadamente, que ficou conhecido como “A Era de Ouro 
do Islã”.
A “Era de Ouro” do Islamismo será estudada na Unidade 2 deste caderno.
Caro(a) acadêmico(a), apresentamos agora alguns trechos do livro 
Introdução ao Islã, de Muhammad Hamidullah (Rio de Janeiro: Sociedade 
Beneficente Muçulmana do Rio de Janeiro, 1993), que traz descrições sobre o 
quotidiano dos muçulmanos. Para os que têm interesse, vale a pena uma leitura 
mais abrangente do texto. Boa leitura!
ESTUDOS FU
TUROS
TÓPICO 5 | AS ORIGENS DO ISLAMISMO
89
LEITURA COMPLEMENTAR
INTRODUÇÃO AO ISLAM
Muhammad Hamidullah
521. Em seguida, vem o nascimento involuntário, quando nasce uma criança 
numa família muçulmana. Imediatamente após a parteira terminar o seu trabalho, 
pronuncia-se o adan no ouvido direito da criança, e a icáma no seu ouvido esquerdo, 
de modo a fazer com que a primeira coisa que o recém-nascido escute seja o 
testemunho da fé, o chamado ao louvor doCriador e o pedido de graças pelo seu 
bem-estar. O adan, ou “Chamado à Oração”, é o seguinte: “Deus é o Maior”, (quatro 
vezes), “Eu testemunho que não há outra divindade, além de Deus” (duas vezes). 
“Testemunho que Mohammad é o Mensageiro de Deus” (duas vezes). “Vinde para 
a oração” (duas vezes). “Vinde para a salvação” (duas vezes). “Deus é o Maior” 
(duas vezes). “Não há outra divindade, além de Deus”. A icáma ou a preparação 
para a oração, é formulada nos seguintes termos: “Deus é Maior! Deus é Maior! 
Testemunho que não há outra divindade além de Deus; testemunho que Mohammad 
é o Mensageiro de Deus! Vinde para a oração; vinde para a salvação; a oração está 
prestes a começar; a oração está prestes a começar; Deus é Maior; Deus é Maior. 
Não há outra divindade além de Deus”.
Os Primeiros Anos de Vida
522. Quando se cortam, pela primeira vez, os cabelos da criança, costuma-se 
distribuir o equivalente ao peso destes em prata ou o valor correspondente em 
dinheiro, entre os pobres. Se se dispõe de meios para tanto, abate-se uma cabra ou 
uma ovelha, para festejar a ocasião com os pobres e com os amigos.
523. Não há uma idade específica, mas a circuncisão é feita, no menino, quando 
ainda em tenra idade. Para os adultos convertidos isto não é obrigatório.
524. Quando a criança chega à idade adequada para iniciar os seus estudos, logo 
após os primeiros quatro anos, organiza-se uma festa em família, ocasião em que 
a criança recebe a sua primeira lição. Para promover um augúrio, lê-se, diante da 
criança, os primeiros cinco versículos da 96ª Surata do Alcorão, que consistem 
da primeira revelação que sobreveio ao iletrado Profeta do Islã, e que se refere à 
leitura e à escrita. Faz-se a criança repetir palavra por palavra esse texto. Eis uma 
tradução [...]: “Em nome de Deus, o Clemente, o Misericordioso. 1. Lê, em nome 
do teu Senhor, que criou; 2. Criou o homem de um coágulo. 3. Lê, que teu Senhor é 
Generosíssimo, 4. Que ensinou através do cálamo, 5. Ensinou ao homem o que este 
não sabia. (96ª Surata, versículos 1-5). [...]
90
UNIDADE 1 | AS ORIGENS DA IDADE MÉDIA
Morte
535. O muçulmano moribundo, em seu leito de morte, deve procurar pronunciar 
a seguinte profissão de fé: “Não há outra divindade além de Deus, Mohammad é o 
Mensageiro de Deus.” As pessoas que estiverem ao redor do moribundo poderão 
ajudar, repetindo essa fórmula, para a pessoa que está nos estertores da morte.
537. É proibido gastar com fausto em sepulcros, que devem ser os mais simples 
possíveis; devemos, ao invés disso, gastar tais valores com os pobres e com aqueles 
que merecem e rogar a Deus para que a recompensa dessa caridade seja dada ao 
falecido.
Hábitos Gerais
538. Além das horas dedicadas diariamente às orações e o jejum anual, certos 
hábitos são recomendados aos muçulmanos. O mais importante é o de estudar 
continuamente o texto e a tradução do Alcorão, meditar sobre o seu conteúdo, para 
assimilar as suas diretrizes na vida quotidiana. O que pode causar mais felicidade 
do que a invocação da Palavra de Deus?
539. Devemos dizer Bismil-lah (i.é, em nome de Deus) quando estivermos para 
começar qualquer ato, e alhamdulil-lah (i.é, louvado seja Deus) ao terminar o mesmo. 
Quando se pretende ou se promete algo para o futuro, deve-se dizer imediatamente 
inchaal-lah (i.é., se Deus quiser).
540. Quando dois muçulmanos se encontram, saúdam-se, dizendo: As-salamu 
‘alaikum (que a paz esteja convosco). Pode se responder do mesmo modo, ou dizer 
Wa’alaiht-mus-salaam (que a paz esteja convosco).
541. Devemos nos habituar a glorificar Deus, ao nos deitarmos e levantarmos: 
Subhanallah (glorificado seja Deus) é a fórmula mais simples. Devemos, também, 
invocar a misericórdia de Deus para com o Profeta, usando, por exemplo, a seguinte 
fórmula: Al-lá-humma sal-li’ala Mohammad wa baarik wa sal-lim (i.e., que Deus abençoe 
Mohammad e lhe dê paz).
542. O Profeta preferia o lado direito. Quando calçava as sandálias, calçava primeiro 
o pé direito, e depois o esquerdo, e exatamente o contrário quando as tirava; quando 
vestia uma camisa, vestia primeiro o braço direito, depois o esquerdo; quando 
penteava o cabelo, penteava-o primeiro do lado direito, e depois do esquerdo; ao 
entrar numa casa, ou na mesquita, fazia-o primeiro com o pé direito, depois com o 
TÓPICO 5 | AS ORIGENS DO ISLAMISMO
91
esquerdo; mas quando entrava no banheiro, fazia-o primeiro com o pé esquerdo, 
e, ao sair, com o pé direito na frente. Quando tirava a roupa, calçados, etc., despia 
primeiro o braço, perna ou pé esquerdo. Quando distribuía algo, ele começava 
sempre pelos que estavam à sua direita e terminava com os que estavam à esquerda.
FONTE: HAMIDULLAH, Muhammad. Introdução ao Islam. Rio de Janeiro: Sociedade Beneficente 
Muçulmana do Rio de Janeiro, 1993.
92
RESUMO DO TÓPICO 5
Neste tópico você viu que:
 O Islamismo é uma religião monoteísta fundada por Maomé, na região da 
Arábia, no século VII.
 O marco inicial do Islamismo acontece com a migração de Maomé e seus 
seguidores (a Hégira), da cidade de Meca para Medina, em 622 d.C.
 Os princípios básicos do Islamismo são a crença em um único deus (chamado 
Allah), nas profecias de Maomé, na palavra divina (o Alcorão) e nos cinco 
pilares.
 Os cinco pilares do Islã são o testemunho, as cinco preces diárias, o pagamento 
dos tributos, o jejum no mês do Ramadã e a peregrinação a Meca, ao menos uma 
vez na vida.
 O Alcorão, livro sagrado dos muçulmanos, contém, além da palavra de Deus, 
na visão dos muçulmanos, também preceitos morais e legais detalhados, que 
serviram para organizar o direito islâmico (a sharia).
 Além do Alcorão, a sharia retira seus preceitos dos hadiths e das sunas, que 
reúnem declarações e práticas de Maomé.
 Existem diversas correntes dentro do Islã. As mais importantes são os sunitas e 
os xiitas.
 Também o misticismo islâmico (sufismo) teve papel importante na difusão e 
aperfeiçoamento do Islamismo.
93
1 Elabore uma síntese explicativa sobre o Islamismo.
AUTOATIVIDADE
Assista ao vídeo de
resolução da questão 1
94
95
UNIDADE 2
O MUNDO DAS SOCIEDADES 
TEOCRÁTICAS
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
A partir desta unidade você será capaz de:
• identificar as principais características dos períodos áureos das civiliza-
ções bizantina e muçulmana;
• refletir sobre a importância das civilizações do Oriente Médio para a pre-
servação e ampliação do conhecimento da Antiguidade Clássica;
• compreender o caráter global do comércio e das trocas culturais entre o 
mundo muçulmano e as demais regiões da Europa, Ásia e África entre os 
séculos VIII – XII d.C.;
• perceber a influência islâmica e bizantina na formação da identidade e da 
cultura da Europa Ocidental na Era Moderna;
• estabelecer a vinculação entre as civilizações construídas por bizantinos, 
muçulmanos e cristãos ocidentais com suas tradições religiosas: ortodoxa, 
islâmica e católica, respectivamente;
• apontar as características e as limitações conceituais do feudalismo e das 
sociedades feudais;
• observar a era feudal a partir de uma perspectiva mais ampla e mais com-
plexa do que a tradicional redução simplista da Europa medieval ao feu-
dalismo e à “Idade das Trevas”.
Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer e no final de cada 
um deles você encontrará atividades que contribuirão para sua reflexão e 
análise dos conteúdos adquiridos.
TÓPICO 1 – A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
TÓPICO 2 – RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO 
 ORIENTAL
TÓPICO 3 – A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO 
ISLAMISMO
TÓPICO 4 – O FEUDALISMO
Assista ao vídeo 
desta unidade.
96
97
TÓPICO 1
 A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO 
ORIENTAL
UNIDADE 2
1 INTRODUÇÃO
Houve um tempo em que arte, religião, cultura e política se fundiram a 
tal ponto que era impossível distinguir uma da outra. Nessa época, a fé movia 
os exércitos e era por eles transportada para novas regiões. As concepções sobre 
Deus moldavam não apenas a conduta daspessoas, mas a sua lealdade para com 
o Estado. Debates acalorados aconteciam a respeito de minúcias religiosas, e de 
seus desfechos dependiam reis, exércitos, estados e a vida dos camponeses. A 
arte refletia tudo isso, ora retratando imperadores, com a autoridade divina, 
ora escapando completamente à representação humana de Deus ou do Profeta, 
considerada blasfêmia.
Foi uma época contraditória. De um lado, como se pode ver, quase todos 
os aspectos da vida cotidiana ficavam sujeitos à religião; de outro, diversas regiões 
do mundo, em contato, sobretudo pela guerra e, novamente, pela diferença de 
crenças, prosperaram, cada uma a seu modo. Nesse longo período, as sociedades 
dividiam-se localmente por querelas religiosas ou por dificuldades de controle de 
vastos territórios por governantes fracos, mas permaneceram coesas por séculos.
Tudo isto aconteceu numa ampla região do mundo, do Oceano Atlântico 
até a Índia, durante um período de cerca de 500 anos. O período compreendido 
entre os séculos VIII e XIII, aproximadamente, foi o momento em que o Império 
Romano recuperou-se do traumático período de divisão e de esfacelamento de sua 
porção ocidental e constituiu duas unidades culturais coesas, mas radicalmente 
diferentes entre si. Ao mesmo tempo, mais ao sul, na Península Arábica, um profeta 
transformava os nômades que viviam em uma região desértica e esquecida do 
mundo em uma comunidade poderosa e agressiva, que com seu fervor religioso 
criou em pouco tempo o império mais vasto de que se tinha tido notícia.
Nesta unidade, estudaremos três regiões do mundo que, durante cerca 
de 500 anos, constituíram unidades culturais distintas, mas com características 
importantes em comum: com a religião ocupando parte importante da vida das 
pessoas, criaram-se em cada uma delas amálgamas sociais que perdurariam por 
muito tempo. 
Falaremos do Império Romano do Oriente (também chamado Império 
Bizantino), dos reinos cristãos romano-germânicos e do mundo islâmico. Você 
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
98
perceberá que, em todas essas sociedades, o período entre os séculos VIII e XIII foi 
de intensas transformações culturais, que moldaram o mundo de hoje de forma 
irreversível.
2 AS ORIGENS DO IMPÉRIO ROMANO DO ORIENTE
Caros acadêmicos!
A partir de agora iniciaremos uma leitura sobre o Império Romano do Oriente, na qual 
procuraremos destacar suas características marcantes. Você encontrará, ao longo do texto, 
referências bibliográficas, caso queira se aprofundar no assunto. Recomendamos a consulta 
em mapas, se houver dúvida acerca de alguma localização geográfica. Boa leitura!
2.1 A QUEDA DO IMPÉRIO ROMANO NA PERSPECTIVA 
ORIENTAL
Como já vimos, a divisão do Império Romano em quatro partes (Oriente, 
Itália, Danúbio e Reno) pelo imperador Diocleciano, em 284, introduziu a separação 
entre Ocidente e Oriente. Mas foi em 395, sob o governo de Teodósio, que o Império 
Romano foi cindido entre Império Romano do Ocidente, com capital em Milão, e 
Império Romano do Oriente, com capital em Constantinopla (atual Istambul, na 
Turquia).
A queda do Império Romano do Ocidente não afetou a parte oriental. 
Muito ao contrário, o Império Romano do Oriente - chamado pelos historiadores 
do século XIX de Império Bizantino - conheceu, a partir do século VI, um período 
de opulência.
 Constantinopla, na condição de capital do império e importante porto 
comercial do Oriente, centralizou o poder político e econômico durante toda a 
existência do Império Bizantino.
Perry Anderson explica, em seu livro “Passagens da antiguidade ao 
feudalismo” (2004), que o motivo determinante para a queda do império 
Ocidental está relacionado ao regime de trabalho escravo, praticado amplamente 
nas colônias romanas. Segundo Anderson (1985), a grande propriedade rural e a 
escravidão agrícola, no Império Romano do Ocidente, fizeram enfraquecer e “ruir 
todo o edifício imperial”. Por outro lado, no Oriente romano, a economia estava 
fundada no regime produtivo em pequenas propriedades e no comércio.
NOTA
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
99
2 AS ORIGENS DO IMPÉRIO ROMANO DO ORIENTE
O poder de Bizâncio (Império Bizantino) estava baseado em sua produção 
agrícola e na transação comercial entre Europa e Ásia. Segundo Perry Anderson 
(2004, p. 256-257), a ocupação romana encontrou na região dos Bálcãs “um meio 
ambiente costeiro e marítimo que já havia sido densamente povoado com cidades 
comerciais pela grande onda da expansão grega no período helenístico”. Portanto, 
a escravidão jamais se tornou um sistema econômico predominante no Império 
Romano Oriental, o que contribuiu com sua estabilidade econômica no século V.
A região dos Bálcãs corresponde ao Leste Europeu, onde se localizam os seguintes 
países: Turquia, Bulgária, Romênia, Sérvia, Croácia, Macedônia, Albânia e Grécia.
Prezado(a) acadêmico(a), é importante destacar que o termo “Império Bizantino” 
nunca foi utilizado na própria época. O termo é uma criação de historiadores do século XIX. 
Os próprios “bizantinos” referiam-se ao seu império como “Império Romano”, do qual se 
consideravam legítimos continuadores –, à sua capital como Constantinopla e a si mesmos 
como “romanos”, mesmo depois que a cultura tornou-se cada vez mais grega e a religião 
separou-se da católica romana.
2.2 A PERIODIZAÇÃO DA HISTÓRIA BIZANTINA
As fases da história do Império Romano Oriental, segundo Hilário Franco 
Júnior (1987), são as seguintes:
 Primeira fase: Alto Império (330-610)
 Segunda fase: Médio Império (610-1261) 
 Terceira fase: Baixo Império (1261-1453) 
O Alto Império foi marcado pelo reinado de Justiniano, conforme veremos 
a seguir, mas também pela revolta popular conhecida como Sedição de Nika, em 
532. Neste episódio, o povo se revoltou contra a alta dos impostos, destinados a 
financiar as expedições militares no Ocidente.
O Médio Império, por sua vez, representou o mais longo dos períodos. 
Nos primeiros momentos, os bizantinos sofreram com as invasões persas em 
NOTA
IMPORTANT
E
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
100
Jerusalém e árabes na Síria e no Egito. Porém, nesta mesma fase o império viveu, 
sob a dinastia dos Macedônicos, a segunda época de ouro.
Já o Baixo Império foi marcado pelo relativo reerguimento de 
Constantinopla, que havia sido saqueada pelos mercadores venezianos durante 
a Quarta Cruzada (1204). Após 1261, o Império Bizantino passou a depender dos 
grandes proprietários rurais e dos comerciantes de Veneza e Gênova, até a tomada 
definitiva da capital bizantina pelos muçulmanos em 1453. Portanto, estes últimos 
192 anos correspondem ao período de reclínio, no plano político e econômico, do 
Império Bizantino.
As Cruzadas eram expedições militares de caráter religioso, conduzidas, 
principalmente, por nobres cristãos na Idade Média, entre os anos de 1095 a 1270, com o fim de 
fazer a guerra denominada “santa” contra os muçulmanos. Buscavam reconquistar Jerusalém, 
a Terra Santa, e o túmulo de Cristo. As Cruzadas foram convocadas pelo Papa Urbano II, em 
nome de um projeto de união da Cristandade contra os “infiéis” – entenda-se “muçulmanos”. 
Este assunto será debatido no final desta unidade.
Assim, a tomada de Constantinopla pelos cruzados em 1204 contribuiu, de 
forma decisiva, para o declínio do Império Bizantino e da Igreja Ortodoxa. 
No próximo tópico estudaremos a disputa religiosa que motivou a separação da 
Igreja Católica. Como veremos, dividiu-se entre Igreja Católica Apostólica Romana (Ocidental) 
e Igreja Católica Ortodoxa (Oriental). 
2.3 O REINADO DE JUSTINIANO
O Império Romano do Oriente durou cerca de mil anos e, atravessou, 
de acordo com a perspectiva de historiadores, pelo menos duas eras de grande 
prosperidade. Em seu primeiro período áureo, sob o comando do Imperador 
Justiniano (527-565), uma grande extensão territorial foi reincorporada ao império 
do Oriente. A intenção de Justiniano era, declaradamente, conquistar os reinos 
germânicos para reunificartodas as regiões do antigo Império Romano.
Justiniano atingiu boa parte de seus objetivos. Os bizantinos reconquistaram 
os territórios que o Império Romano do Ocidente havia perdido, conquistando o 
NOTA
ESTUDOS FU
TUROS
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
101
norte da África, a Itália e o sul da Espanha. Expulsaram os vândalos do norte da 
África e os ostrogodos da Península Ibérica (Portugal e Espanha).
 A campanha, no entanto, enfraqueceu o Estado bizantino e abriu espaço 
para revoltas que, juntamente com a peste, mergulharam o Império no caos 
político, após a morte do imperador. Os reis que sucederam Justiniano, o Grande, 
não puderam manter os territórios ocidentais do Império, em razão das invasões 
dos lombardos, persas, árabes, eslavos e búlgaros. O Império Bizantino passou 
então a concentrar suas forças no Oriente, na defesa de suas fronteiras, no próprio 
território balcânico.
FIGURA 18 – DIMENSÕES DO IMPÉRIO BIZANTINO NA ÉPOCA DE JUSTINIANO
FONTE: Disponível em: <www.igm.mat.br/homepage/joao_afonso/J.A/figuras_inhumas/ 
imp._bizantino.jpg>. Acesso em: 1 ago. 2012. 
2.3.1 A revolta de Nika
Mas a política expansionista de Justiniano cobrou seu preço. As grandes 
despesas com o exército e o aumento do custo de vida, aliados a uma política 
impopular do imperador, levaram a uma grande revolta popular em Constantinopla, 
no ano de 532. 
A revolta iniciou-se no Hipódromo, de onde os manifestantes saíram no 
fim da tarde gritando “Níka” (em grego: “Vitória!”), e tomaram de assalto a cidade 
inteira. Nos dias seguintes, os manifestantes sitiaram o palácio do imperador e 
incendiaram alguns edifícios. O fogo se espalhou por toda a cidade e calcula-se 
que pelo menos um terço de Constantinopla tenha sido queimada, incluindo a 
catedral de Santa Sofia.
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
102
2.3.2 As reformas de Justiniano
Após o fim da revolta, Justiniano aproveitou a oportunidade para reformar 
a cidade de Constantinopla a partir das cinzas e tornou-a ainda mais magnífica. 
A catedral de Hagia Sophia foi reconstruída, na forma como existe ainda hoje. 
A catedral (também chamada de basílica, devido ao seu formato arquitetônico) 
representou o desejo de unificação das igrejas existentes em Bizâncio (Ortodoxa, 
Nestoriana e Monofisista).
FIGURA 19 - HAGIA SOPHIA, CONSTRUÍDA COMO BASÍLICA POR JUSTINIANO. OS TURCOS, 
POSTERIORMENTE, TRANSFORMARAM-NA EM MESQUITA E ERGUERAM AS 
TORRES (MINARETES) AO REDOR. ATUALMENTE É UM MUSEU
FONTE: Disponível em: <http://istanbulvisions.com/images/hagia_sophia_1.jpg>. Acesso em: 
17 nov. 2012.
Durante o governo de Justiniano foram reorganizadas também as 
estruturas jurídicas do Império. O Corpus Juris Civilis (Corpo do Direito Civil) foi 
elaborado a partir de uma revisão e sistematização do Direito Romano. O Código 
de Justiniano, como ficou conhecido, era formado pelas Novelas (constituições 
elaboradas pelos imperadores depois de 534), o Digesto (síntese da jurisdição 
romana) e as Institutas (manual aos estudantes). 
O Corpus Juris Civilis é um exemplo significativo da transformação cultural 
da herança romana (por meio dos códigos de leis) sob a perspectiva bizantina. Foi 
este Código que serviu de base para a elaboração dos sistemas jurídicos das nações 
modernas.
Assim, através do direito, da língua (latina) e da religião (cristã) foi 
consolidada a unidade do Império Bizantino sobre as bases da cultura herdada 
do Ocidente. Posteriormente, no entanto, essa cultura foi sendo transformada, aos 
poucos, até assumir um caráter especificamente grego, como veremos a seguir.
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
103
2.3.2 As reformas de Justiniano Outra característica fundamental da era de Justiniano foi a integração da 
Igreja no Estado. A partir desta união o imperador passou a ser ao mesmo tempo 
representante da Igreja (papa) e do Estado (césar). Édouard Perroy denominou esta 
concepção de governo de “cesaropapismo”. 
A representação do imperador enquanto personalidade sagrada pode ser percebida 
na arte bizantina, onde os mosaicos apresentam Justiniano com uma auréola em torno de sua 
cabeça. Essa representação é reservada exclusivamente para Cristo e os santos.
FIGURA 20 – REPRESENTAÇÃO EM MOSAICO DO IMPERADOR 
JUSTINIANO
FONTE: Disponível em: <www.portal planetasedna.com.ar/edad_
media_media07.jpg>. Acesso em: 4 ago. 2012.
2.4 A TRANSFORMAÇÃO DO IMPÉRIO
No início do século VII, o Império Romano do Oriente estava em 
calamidade. A crise econômica e o avanço dos monarcas sassânidas favoreciam 
as revoltas de povos integrantes do Império, como os ávaros e os eslavos. Muitos 
territórios conquistados por Justiniano haviam sido perdidos. O Império enfrentava 
dificuldades econômicas e políticas muito sérias. 
Sob o Imperador Heráclio (575-641), Constantinopla conseguiu recuperar 
grande parte de seu poder militar e econômico, mas passou a ser acossada 
(perseguida), também, pelos muçulmanos. 
NOTA
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
104
Heráclio tomou o poder em 610, após o assassinato do odiado Imperador 
Fócias, e começou um lento processo de substituição de parte da herança deixada 
pelos romanos. Heráclio decretou o grego como língua oficial do Império e 
adotou o título de Basileus, tradução grega para o Imperator romano. A partir desse 
momento, a cultura do Império tornou-se cada vez mais helênica e afastou-se, 
inclusive do ponto de vista religioso, de Roma.
Vejamos o que Édouard Perroy fala sobre o soberano de Constantinopla: 
Soberano absoluto, o imperador, o Basileus, sejam quais forem sua 
origem, a fonte militar e, muitas vezes, não hereditária de seu poder, é 
agora uma personalidade sagrada. Isto é comprovado pela etiqueta que, 
no seu palácio, verdadeira cidade interior fechada, o isola do comum 
dos homens e mesmo de seus cortesãos: imitação, em certos pontos, 
das tradições das monarquias orientais, mas fruto, também, de uma 
evolução interna. (PERROY, 1964, p. 40). 
Portanto, o Império Bizantino era um Estado autocrata, onde o poder 
político estava concentrado nas mãos do imperador. Ele era considerado por seu 
povo como um Deus vivo. O Basileus dispunha de poderes absolutos. 
A hereditariedade não era garantia de continuidade. Os golpes de Estado 
eram comuns em Bizâncio e resultavam, em último caso, no assassinato dos 
governantes. Segundo Hilário Franco Júnior, dos 107 imperadores que governaram, 
apenas 34 tiveram morte natural. Os demais foram mutilados ou assassinados. 
Por isso, a história de Bizâncio foi marcada pela alternância constante entre 
imperadores. 
Os bizantinos entendiam o imperador como um representante de Deus na Terra 
(teocracia). Por isso, uma das características políticas mais curiosas do Império era o fato de os 
golpes de Estado serem facilmente legitimados pela população. Acreditava-se que a deposição 
de um imperador era a vontade de Deus, e o golpista, caso tivesse sucesso, teria sido escolhido 
por Ele para aquela tarefa.
2.5 AS PERDAS BIZANTINAS NA ÁFRICA
Na época da divisão do Império Romano, parte das terras do Império 
Oriental estava em continente africano. Essas terras foram rapidamente perdidas 
para os árabes, assim que a expansão muçulmana se iniciou. Além do poderio 
militar e do fervor religioso dos árabes, outros elementos mais específicos da 
política e da religião bizantinas ajudam a explicar esse fenômeno, como nos explica 
o historiador tcheco Ivan Hrbek:
NOTA
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
105
O Império Bizantino cessou de exercer qualquer verdadeira influência 
na África no curso do século VII. O Egito foi rapidamente perdido e as tentativas 
esporádicas realizadas para reconquistá‑lo pelo mar fracassaram; algumas 
porções do litoral norte africano permaneceram, todavia, sob controle bizantino 
até o final do século, e guerras intestinas interromperam as ofensivas árabes por 
várias décadas. 
A Igreja Ortodoxa bizantina jamais fora muito poderosa nas províncias 
africanas:os egípcios permaneciam fortemente ligados à doutrina monofisista 
e as populações urbanas da África do Norte à Igreja Romana. As conquistas 
muçulmanas privaram em definitivo a Igreja Ortodoxa da fraca influência da 
qual ela gozara nos séculos precedentes. Embora a Núbia não tenha jamais 
pertencido ao Império Bizantino, as influências culturais e religiosas deste 
império ali permaneceram relativamente fortes, mesmo após a conquista do 
Egito pelos árabes, particularmente na Makuria, o mais central dentre os três 
Estados cristãos da Núbia que, contrariamente aos dois outros, adotaram o 
culto ortodoxo (melkita). 
A administração era calcada no modelo bizantino, as classes superiores 
vestiam‑se à moda bizantina e falavam grego. Porém, estes laços com a cultura 
e a religião bizantinas paulatinamente enfraqueceram-se e, ao final do século 
VII, o rei de Makuria introduziu o monofisismo em seu Estado, desde então 
unido à Nobádia do Norte. Esta evolução teve como efeito a reaproximação 
deste reino com o Egito copta e, parcialmente, com a Síria e a Palestina, onde 
alguns cristãos da Núbia encontravam eco para as suas convicções monofisistas.
Em sua luta contra a Pérsia, os bizantinos haviam buscado aliar-se à 
Etiópia- cristã, embora monofisista. A expansão árabe barrou-lhe o acesso ao 
Mar Vermelho e impôs um termo aos seus intercâmbios comerciais com a Índia, 
tornando tal aliança, pela mesma ocasião, impossível e vã. Identificando-se 
de mais em mais com o Estado e o povo etíopes, o cristianismo monofisista, 
hostil às outras crenças cristãs tanto quanto ao Islã, encontrou a sua própria 
identidade, que, nem no plano teológico ou no plano da expressão artística ou 
literária, nada devia aos modelos bizantinos. (HRBEK, 2010, p. 13-14).
3 CONSTANTINOPLA
Quando um estrangeiro em embaixada, ou mais simplesmente um humilde 
súdito do império, que a sorte não favoreceu, contempla Constantinopla do alto 
das colinas que a cercam, sua fama, levada de cidade em cidade e de aldeia em 
aldeia, torna-se uma esplendorosa realidade. No cruzamento das vias terrestres da 
Europa e da Ásia, Constantinopla está construída sobre o estreito canal marítimo, 
o Bósforo, que abre caminho ao Mar Negro e às terras da Ásia Central para o 
Mediterrâneo. A cidade prospera em uma situação natural privilegiada. No fim do 
século V de nossa era, Constantinopla conta com cerca de um milhão de habitantes; 
é a maior metrópole do império. (FÈVRE, 1991).
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
106
A fundação de Constantinopla remonta ao período de decadência do 
Império Romano. Após o século III, a unidade política e territorial do Ocidente 
romano foi ameaçada pelas lutas internas dos exércitos romanos das províncias 
(“anarquia militar”; 235-268) e pelas revoltas dos escravos. 
Diante da fragmentação do Império Ocidental, Constantino (272-337), 
sucessor de Diocleciano, empreendeu uma luta pelo restabelecimento da unidade 
imperial. 
A capital de seu império reunificado passou a se localizar na antiga colônia 
grega de Bizâncio, no Estreito de Bósforo, limite entre Europa e Ásia, que ele 
rebatizou como Nova Roma. O termo não caiu no gosto popular e a cidade logo 
passou a ser chamada Constantinopla (Cidade de Constantino).
Segundo Edward Gibbon, Constantino teria obedecido às “ordens de 
Deus” ao plantar “as perenes fundações de Constantinopla”. Tais “ordens” lhe 
teriam sido transmitidas em um sonho, quando ele dormia entre as muralhas de 
Bizâncio. 
O gênio tutelar da cidade, uma venerável matrona curvada ao peso dos 
anos e das enfermidades, subitamente, se transformara numa florescente 
donzela, adornada por suas próprias mãos com todos os símbolos da 
grandeza imperial. O monarca despertou, interpretou o auspicioso 
presságio e obedeceu sem hesitação à vontade do céu. (GIBBON, 2005, 
p. 295).
Portanto, o ato de fundação de Constantinopla esteve envolto por uma 
mentalidade sobrenatural, comum para a época. Ou seja, o mito de fundação 
da cidade de Constantino estava ligado à relação religiosa (espiritual) que os 
bizantinos mantinham com o ambiente mundano. Podemos dizer que “o mundo se 
dava pela fé”. Um exemplo disso está no valor atribuído aos sonhos, considerados 
como presságios, pois continham sinais que antecipavam o futuro. A interpretação 
dos sonhos fazia parte das práticas culturais bizantinas, herdadas dos gregos e 
romanos. A interpretação dos sonhos ou ciência dos sonhos foi reunida em textos 
por Achmet, entre 813 e o final do século XI, sob o título de a “Chave dos Sonhos”.
Mentalidade: é definida por Hilário Franco Júnior como “o plano mais profundo da 
psicologia coletiva, no qual estão os anseios, esperanças, medos, angústias e desejos assimilados 
e transmitidos inconscientemente, e exteriorizados de forma automática e espontânea pela 
linguagem cultural de cada momento histórico em que se dá essa manifestação”. (FRANCO 
Júnior, 2004, p. 184).
NOTA
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
107
3.1 A CIDADE 
A cidade de Constantinopla, abençoada por Deus, conseguiu sobreviver 
aos ataques dos povos bárbaros no século V. A razão para isso, é claro, tem menos 
a ver com a proteção divina do que com as reforçadas defesas da cidade e a grande 
disponibilidade de recursos (ouro) que podiam ser usados para subornar os 
invasores. Ambas as características deviam-se, em parte, à posição estratégica da 
cidade e à necessidade de garantir sua segurança.
Localizada na antiga região da Trácia, no continente europeu, na costa do 
pequenino Mar de Mármara e bem de frente para a Anatólia na Ásia, Constantinopla 
estava no lugar perfeito para compor uma ponte entre dois mundos.
A cidade foi construída em uma ponta, delimitada pelo Mar de Mármara e 
por um canal chamado Chifre de Ouro. Com isso, havia um único lado acessível por 
terra, no qual foi construída uma série de muralhas praticamente indevassáveis. 
Em toda a história do Império Bizantino, as muralhas de Constantinopla foram 
invadidas apenas duas vezes: durante a Quarta Cruzada, em 1204, quando a cidade 
foi saqueada, e sob o ataque otomano em 1453, quando o Império foi derrubado.
FIGURA 21 - DETALHE DAS MURALHAS EXTERNAS DE CONSTANTINOPLA, CONSTRUÍDAS 
POR TEODÓSIO. A MAIOR PARTE DAS MURALHAS FOI PRESERVADA NA 
MODERNA CIDADE TURCA DE ISTAMBUL
 FONTE: Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/1/1c/
Walls_of_Constantinople.JPG/800px-Walls_of_Constantinople.JPG>. Acesso em: 
23 set. 2012.
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
108
3.2 MÉSIA, A PRINCIPAL AVENIDA DE CONSTANTINOPLA
Agora, o convidamos a percorrer a Mésia, a principal avenida de 
Constantinopla e descobrir como em um passeio turístico a paisagem urbana da 
grande cidade do Oriente. Em nosso passeio virtual, podemos sentir de perto a 
pobreza e o luxo, experiência que encontramos apenas ao transitar pelas cidades-
capitais do mundo. 
Em Constantinopla, o povo vive comprimido em pequenos bairros, 
conjuntos de ruelas sombrias, pouco arejadas, onde se encontram as pobres 
moradas de um povo orgulhoso e arrogante, consciente de pertencer à mais 
civilizada das comunidades. 
As vielas serpenteiam entre as pequenas tabernas, casas construídas 
com tijolos e materiais baratos. Algumas casas grandes de encontros, as ínsulas, 
contrastam com esta desordem de tijolos e madeira, de telhas mal ajustadas. 
Dessa massa compacta emergem levas de crianças, nela vão e vêm as famílias. 
No centro desse bairro improvisado, de construção anárquica, uma 
pequena praça reúne a atividade econômica e acolhe os funcionários, os 
estrangeiros perdidos na grande cidade. Ali é distribuído, diariamente, o pão da 
anona, feito por ordem imperial com o precioso trigo do Egito, de acordo com a 
tradição romana que determina que o poder deve sustentar a plebe. 
Em troca de um tablete, a téssera, o cidadão de Constantinopla recebe o 
pão, marca tangível de sua vinculação à cidade imperial. Duas ou três escadas 
permitem ao visitante ou aorepresentante da autoridade que veio distribuir o 
pão deixar esse mundo sombrio, anônimo entre centenas de outros, para chegar 
ao topo da colina onde o luxo imperial impõe seu esplendor.
 Os muros avermelhados das casas pobres vão se espaçando e cedem 
lugar às altas casas de pedra que comunicam com o exterior por grandes janelas. 
As ruas alargam-se e um rumor crescente anuncia a proximidade da artéria vital 
da cidade, a Mésia.
A capital do grande Império Romano do Oriente encarna-se inteira 
nessa bela avenida, cujos pórticos em dois andares formam arcadas cobertas. A 
multidão barulhenta acotovela-se diante das lojas de luxo. Os ourives fascinam 
os estrangeiros, os ofícios ligados ao ouro e à prata, às peles, ocupam os melhores 
pontos da avenida transbordante de vida. 
O segundo andar, ornado de estátuas, serve de passeio, é o lugar em 
que toda a cidade se encontra. As livrarias atraem em seu santuário da cultura 
latina e grega os retóricos, sempre prontos a uma discussão inflamada sobre a 
natureza de Cristo ou sobre os escritos dos Pais da Igreja. 
A multidão colorida percorre sem cessar a parte central de Mésia, pois 
o eixo de Constantinopla atravessa a cidade, partindo das portas da cidade até 
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
109
3.2 MÉSIA, A PRINCIPAL AVENIDA DE CONSTANTINOPLA o Palácio Sagrado à beira do mar. A Mésia conduz o estrangeiro ou o mercador 
que percorreu as estradas da Europa da Porta de Ouro, aberta na gigantesca 
muralha teodosiana com sua dupla fortificação, até o centro do Império, o 
Palácio Sagrado. 
Outros caminhos retilíneos vêm ter à Mésia, de onde saem cavaleiros 
e passantes, carros carregados com as mercadorias comercializadas em todo o 
império. Toda riqueza de Constantinopla é oferecida ao egípcio, ao godo dos 
vales selvagens que cruzam os diversos fóruns ligados pela Mésia. Ao fórum de 
Arcadius, situado a oeste da cidade, sucede o fórum Bovis, do boi, onde uma 
gigantesca cabeça de boi esculpida em bronze serve para incinerar os resíduos. 
Trazido de Pérgamo, este objeto estranho é apenas a primeira maravilha 
que encontram o provinciano e o bárbaro, de quem zombam os vaidosos 
habitantes da capital do império. De olhos presos aos pórticos, à multidão, às 
estátuas e às cruzes de prata erigidas no alto dos fóruns, o estrangeiro entra na 
parte mais imponente na Mésia cercado por uma multidão cada vez maior. A 
diversidade da população aparece sob os traços de um godo ou de um sírio, ao 
lado de um grego, este representando a maioria autóctone.
Mais além do fórum Tauri, situado em pleno coração do promontório 
que forma a cidade, aumenta rapidamente a densidade de edifícios luxuosos. 
Banhos públicos, igrejas e mosteiros erguem-se nas belas ruas adjacentes. O 
palácio do Imperador Leão I está ao lado da Basílica de Teodósio, a estátua 
equestre do Imperador Arcádio domina o fórum. 
Ninguém pode deixar de ver a suposta grandeza desses herdeiros de 
Roma; a selvagem tutela dos bárbaros não é visível nos mármores e nos baixos-
relevos gravados em honra do Império de Constantino. O fórum de Constantino, 
distante do Palácio Sagrado algumas centenas de metros, ultrapassa todos os 
outros em luxo de edificação. É necessário impressionar a multidão; quando das 
festas religiosas ou imperiais, ou os desfiles de condenados, o povo pode entrar 
no magnífico fórum através de dois magníficos arcos de mármore branco. 
Os bárbaros vindos das estepes áridas extasiam-se e perdem-se na 
contemplação das estátuas de animais fabulosos. Mas a cruz de Constantino 
lembra que esta beleza profana não pode eclipsar o domínio de Cristo sobre a 
cidade, farol do cristianismo em meio à heresia e ao paganismo bárbaros. 
A parte mais atraente da Mésia conduz o passante até as proximidades 
do Palácio Sagrado, escondido por trás de suas fortificações, universo enigmático 
de onde saem, por vezes, grandiosos cortejos imperiais. 
O povo, ávido de luxo e esplendor, une seus farrapos aos mantos reais 
debruados de ouro dos aristocratas para ver o cortejo. Nessas ocasiões, a praça 
do Augusteon, ponto terminal da Mésia, abriga uma multidão efervescente, 
recolhida ou hostil segundo a cerimônia e o humor da cidade. 
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
110
O palácio, a Basílica de Santa Sofia e os serviços das grandes corporações 
do império concentram-se no Milhare de ouro, ponto central onde um arco do 
triunfo é o ponto de partida de todas as estradas do império. 
Aqui, às portas do palácio imperial, culminam a grandeza e a efervescência 
de Constantinopla. As procissões religiosas, ao sair da basílica, cruzam-se 
com os desfiles dos generais vitoriosos. Os desfiles unem o povo a seu senhor 
imperial, o basileu, sucessor dos soberanos romanos por escolha divina e, mais 
frequentemente, pelo poder das armas. (FÈVRE, 1991, p.15-17).
FIGURA 22 - RECONSTITUIÇÃO DE VISTA AÉREA DE CONSTANTINOPLA DURANTE O IMPÉRIO 
ROMANO DO ORIENTE. À ESQUERDA E ABAIXO, O MAR DE MÁRMARA. O CANAL À 
DIREITA É O CHIFRE DE OURO
FONTE: Disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/File:Bizansist_touchup.jpg>. Acesso em: 23 
set. 2012.
Mésia, Mese ou Mesê se referem à mesma rua, a Rua do Meio, a principal de 
Constantinopla. Agora procure localizá-la no mapa que segue. Localize-a também na vista 
aérea da cidade, na figura anterior.
NOTA
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
111
FIGURA 23 - MAPA DE CONSTANTINOPLA, ONDE APARECE A AVENIDA MÉSIA (MESE), 
LIGANDO UM DOS PÓRTICOS À CATEDRAL DE SANTA SOFIA (ESTRELA MAIS 
ESCURA). AO SUL DA CATEDRAL, O HIPÓDROMO (O EDIFÍCIO ALONGADO)
FONTE: Disponível em: <http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Byzantine_Constantinople.
png>. Acesso em: 15 fev. 2013.
3.3 O HIPÓDROMO
As corridas de cavalos eram muito populares entre os romanos da 
Antiguidade, e mantiveram-se como o “esporte nacional” dos bizantinos. Em 
Constantinopla, o Hipódromo (do grego hippos = cavalo; drómos = corrida) era 
mais do que uma simples pista de corrida. Era o local onde as discussões políticas 
aconteciam, onde os negócios eram fechados. As altas apostas feitas nos vencedores 
eram capazes de criar e destruir fortunas do dia para a noite.
O Hipódromo havia sido construído ainda na época da Bizâncio grega 
e foi reformado por Constantino. Desde a época pré-bizantina, as torcidas se 
organizavam ao redor de quatro equipes (Demes), identificadas pelas cores: verdes, 
azuis, brancos e vermelhos. 
As equipes eram mais do que agremiações esportivas: na época bizantina, 
as duas únicas equipes que se mantiveram – azul e verde – formavam verdadeiros 
partidos políticos. Os grupos serviam como válvula de escape para as inquietações 
populares, disputas religiosas, pretendentes ao trono etc. Isso explica o motivo de 
a revolta de Nika ter se iniciado no Hipódromo.
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
112
FIGURA 24 - CONCEPÇÃO ARTÍSTICA DO HIPÓDROMO DE CONSTANTINOPLA, 
EXIBIDA NO MUSEU TOPKAPI SARAYI, EM ISTAMBUL
 FONTE: Disponível em: <http://phdiva.blogspot.com.br/2011/08/hippodrome-in-
constantinople.html>. Acesso em: 14 out. 2012.
Apresentamos aqui um trecho do clássico de Steven Runciman “A 
civilização bizantina”. Steven Runciman é um dos mais destacados historiadores 
ingleses que trataram do Império Romano do Oriente e das Cruzadas. 
Neste trecho, o autor discorre sobre a marcante influência bizantina na 
cultura e na religiosidade russa. Boa leitura.
TÓPICO 1 | A FORMAÇÃO DO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
113
LEITURA COMPLEMENTAR
BIZÂNCIO E OS POVOS ESLAVOS
Steven Runciman
Um dos mais belos capítulos do Legado Bizantino é a profunda influência 
de Constantinopla na formação cultural dos eslavos e de outros povos (como os 
búlgaros), que na região balcânica se colocaram ao alcance da ação civilizadora de 
Bizâncio. Tatakis observa que os eslavos se deixaram impregnar tão profundamente 
pela influência bizantina que ainda hoje é difícil separar na civilização daqueles 
povos o que é propriamente eslavo doque é bizantino.
 Quem pretender estudar a fundo a formação e a evolução da alma eslava 
terá que partir do estudo da própria civilização bizantina. O grande veículo da 
penetração bizantina foi naturalmente a Igreja Ortodoxa. Graças à religião é que 
se conservou através dos séculos de dominação turca o espírito de patriotismo dos 
povos balcânicos. «Durante quatro séculos, no Oriente balcânico, a Igreja Ortodoxa 
manteve o patriotismo cristão, e à sua sombra se preparou, no curso do século 
XVIII, o grande movimento donde, ao raiar do século XIX, saíram o despertar das 
nacionalidades oprimidas e sua independência». Não podemos evidentemente 
estudar em todos os seus aspectos o legado bizantino aos povos eslavos. 
Tal estudo resultaria provavelmente em substanciosos volumes. Limitar-
nos-emos aqui apenas a citar como exemplo dessa marcante influência a civilização 
russa. Com efeito, a Rússia dos Czares permaneceu, «até a aurora do século XX, em 
todas as manifestações de sua vida, a mais fiel imagem de Bizâncio desaparecida».
Durante séculos os russos haviam sentido o influxo da civilização bizantina, 
sobretudo através da atuação da Igreja. Quando Constantinopla caiu em poder 
dos turcos, numerosos emigrados gregos procuraram a Rússia, provocando aí um 
movimento de renovação cultural paralelo ao Renascimento Ocidental. O casamento 
(1472) de Ivan III, grande príncipe de Moscou, com Sofia, a última dos Paleólogos, 
selou a convicção de que a capital russa deveria ser considerada a sucessora 
política de Bizâncio. Com a criação do patriarcado de Moscou em 1589, os russos 
reivindicaram também a sucessão religiosa de Bizâncio. 
«Nunca, daí por diante, a Rússia dos czares esqueceu as ambições que lhe 
impunha essa herança, nem deixou modificar-se o espírito que lhe havia instilado 
sua educação bizantina. Ainda recentemente, se se quisesse fazer ideia do que foi o 
mundo bizantino, seria para a corte de São Petersburgo e para o Kremlin de Moscou 
que valeria a pena dirigir os olhos. Em nenhuma parte, mais que na Rússia czarista, 
se havia conservado a imagem fiel de Bizâncio desaparecida». 
Essa imagem era bem visível na concepção russa do poder imperial (o czar 
era o lugar-tenente de Deus na Terra), na etiqueta, no luxo da corte, na íntima ligação 
existente entre a Igreja e o Estado, no esplendor das cerimônias litúrgicas, no grande 
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
114
número de mosteiros e no prestígio enorme desfrutado pelos monges. Os exemplos 
da influência bizantina na Rússia poderiam ser multiplicados indefinidamente.
 A consciência de serem sucessores e continuadores dos Basileus levou os 
czares a orientarem a política externa russa no sentido de Constantinopla. Santa 
Sofia foi o sonho constante de várias gerações russas: «Substituir na cúpula da 
grande Igreja o crescente pela cruz de ouro, tal foi o fim ideal que, desde séculos, 
a Rússia se propôs, ao mesmo tempo em que sonhou libertar os povos cristãos do 
jugo otomano e apossar-se de Tsaringrad, «indissoluvelmente ligada à ideia do 
czarismo cristão». «O dia em que Moscou se fez herdeira de Bizâncio fixou para 
séculos a política do império dos czares». 
A espiritualidade bizantina imprimiu-se de tal modo no povo russo que a 
encontramos nas obras de romancistas como Dostoievsky (que pinta magistralmente 
a alma atormentada pelo vivo sentimento do pecado e pela consciência da 
imperfeição humana em sedenta busca da perfeição) e de pensadores como Berdiaeff 
(cuja síntese filosófica pretende focalizar o homem em toda a sua espiritualidade).
FONTE: RUNCIMAN, Steven. A civilização bizantina. Tradução de Waltensir Dutra. Rio de Janeiro: 
Zahar, 1977, p. 286-287.
115
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico você viu que:
 A queda do Império Romano do Ocidente não afetou diretamente o lado oriental, 
que se manteve estável e organizado pelos próximos mil anos.
 O Império Romano do Oriente, chamado pelos historiadores de Império 
Bizantino, foi a estrutura política mais estável da Europa durante a Idade Média.
 O reinado mais significativo da primeira etapa da história bizantina foi o de 
Justiniano. Ele expandiu as fronteiras do império, editou o Codex Juris Civilis, 
código de leis, e promoveu reformas em Constantinopla.
 Aos poucos, o Império Romano do Oriente assumiu características próprias, 
seja na língua – o grego –, seja na religião.
 Constantinopla situava-se no Estreito de Bósforo, entre a Europa e a Ásia, e 
tornou-se uma grande metrópole durante o período bizantino.
 As muralhas de Constantinopla eram praticamente indevassáveis, e a cidade só 
foi ocupada duas vezes: na 4ª Cruzada (1204) e na tomada pelos turcos otomanos 
(1453).
116
AUTOATIVIDADE
1 Como vimos, os habitantes do Império Romano do Oriente consideravam-
se herdeiros diretos e legítimos do Império Romano, e assim intitulavam-se. 
A partir de um certo momento, contudo, é possível perceber alguma ruptura 
entre os costumes e a organização social oriental em relação à dos romanos, 
o que de fato nos permite falar em uma cultura especificamente “bizantina”. 
Quando isso ocorre e devido a que fatores?
2 Que relação simbólica é possível traçar entre o fim das conquistas militares 
e essa “helenização” do Império Romano do Oriente?
117
TÓPICO 2
RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO 
ROMANO ORIENTAL
UNIDADE 2
1 INTRODUÇÃO
O Império Romano do Oriente, conhecido pelos historiadores desde o 
século XIX como Império Bizantino, como o continuador do Império Romano da 
Antiguidade, foi uma entidade política muito particular. Durou mais de mil anos – 
a rigor, os marcos temporais tradicionais da Idade Média delimitam a sua duração 
e abarcou uma grande quantidade de populações de diferentes origens e religiões. 
Como é de se imaginar, em um império tão duradouro, houve períodos de grande 
prosperidade econômica e outros de crise.
Neste tópico, vamos complementar nossos estudos sobre o Império Romano 
do Oriente, analisando dois aspectos importantes de sua história: as disputas 
religiosas, tanto internas quanto externas, e o período de maior prosperidade, 
durante a dinastia Macedônica.
2 AS CONTROVÉRSIAS RELIGIOSAS BIZANTINAS
O Império Bizantino foi palco de uma série de controvérsias religiosas ao 
longo de sua história. Muitas delas ocorreram em função de disputas religiosas e 
políticas no início da história do Cristianismo. Vejamos brevemente algumas das 
mais relevantes.
2.1 O NESTORIANISMO
Em 428, Nestório, patriarca de Constantinopla, propôs a ideia de que Jesus 
Cristo, ao contrário do que dizia a doutrina oficial da Igreja, tinha duas naturezas 
distintas: divina e humana. Isso era entendido por seus opositores como rebaixando 
a condição de Cristo e da Virgem Maria, e foi condenado pelos Concílios de Éfeso 
(431) e de Calcedônia (451).
As motivações para a disputa eram tanto religiosas quanto políticas. 
Nestório era de Antioquia, cidade que, na época, rivalizava em importância com 
Alexandria e onde as influências de teólogos como Diodoro de Tarso e Teodoro de 
Mopsuestia, que divergiam consideravelmente da doutrina ortodoxa, eram mais 
fortes. O triunfo de uma das perspectivas teológicas significaria, também, o triunfo 
de seu defensor e da região de onde ele provinha.
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
118
2.2 A ICONOCLASTIA
As desavenças quanto ao uso de certos elementos no culto católico eram 
antigas. A “Querela das Imagens” (728-842) foi um dos significativos conflitos 
envolvendo imagens (de Cristo, de Maria, dos santos etc.) nos cultos religiosos. 
Naquele importante episódio da história, os imperadores bizantinos 
proibiram que os fiéis cultuassem imagens. Os partidários das ideias desses 
imperadores ficaram conhecidos como iconoclastas.Por isso, a iconoclastia se 
transformou em uma doutrina bizantina, nos séculos VIII e IX, que repudiava a 
representação e veneração de imagens (estátuas, pinturas ou qualquer outro objeto 
utilizado em cerimônias religiosas).
Iconoclastia significa,literalmente, “a destruição dos ícones”. Esse 
movimento gerou um conflito que durou mais de um século (728 a 842, com uma 
“trégua” entre 787 e 814). Novamente, assim como no nestorianismo, a controvérsia 
surgiu por motivações religiosas e políticas, embora diversos aspectos relativos 
ao confronto não sejam muito bem entendidos. Isso se dá, em parte, porque os 
iconoclastas, ao serem derrotados ao final, tiveram sua perspectiva silenciada 
pelos vencedores.
Nestório foi excomungado, mas seus seguidores fugiram para terras do 
Império Sassânida e estabeleceram a Igreja Persa, apesar da perseguição dos 
zoroastrianos. Os nestorianos deram origem a vários ramos da igreja cristã oriental, 
que prosperaram mesmo em terras islâmicas, e chegaram até à China.
FIGURA 25 - KRYSTÓS PANTOKRÁTOR (CRISTO TODO-PODEROSO), 
ÍCONE BIZANTINO DO SÉCULO XIII. MOSAICO 
LOCALIZADO NA BASÍLICA DE SANTA SOFIA
 FONTE: Disponível em: <http://www.iconsexplained.com/iec/
pics/058_christ_pantocrator_205x250.jpg>. Acesso em: 14 
out. 2012. 
TÓPICO 2 | RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
119
2.2 A ICONOCLASTIA
Dentre os motivos para o confronto, historiadores (como Toynbee) 
apontam a influência do avanço muçulmano – com sua proibição de representar 
a figura humana ou a tensão entre os povos periféricos do império, defensores da 
iconoclastia, e os moradores mais abastados de Constantinopla, de origem grega, 
contrários a ela. Essa última interpretação carrega em si características de conflito 
de classe e é corrente, como se pode imaginar, na historiografia marxista.
Ao final, a posição iconoclasta foi derrotada, ao custo de um grande desgaste 
político e econômico. Além do mais, as soluções que foram encontradas para a 
questão em diversos concílios afastaram ainda mais a Igreja de Constantinopla da 
de Roma.
2.2.1 A justificativa teológica do conflito
Como vimos, não é fácil saber as justificativas e motivações dos iconoclastas, 
porque seus oponentes, como acontece com frequência, ao vencerem o conflito, 
ganharam o direito de contar a história a seu modo. Podemos, no entanto, tentar 
vislumbrar nas entrelinhas da história dos vencedores, alguns elementos que 
expliquem o conflito.
No texto que segue podemos ver a sanção (documento com força de lei) 
da Igreja Bizantina, condenando o uso das imagens em cerimônias religiosas. 
Este documento foi publicado no ano de 754, no Palácio de Hiereia, que ficava às 
margens do Estreito de Bósforo. O documento foi retirado do livro de Fernando 
Espinosa intitulado “Antologia de textos históricos medievais”. 
Sob a inspiração do Espírito Santo, julgamos que a arte ilegítima de 
pintar criaturas vivas é uma blasfêmia contra a doutrina fundamental da nossa 
salvação – nomeadamente a encarnação de Cristo. Para que serve a loucura 
do pintor que com as suas mãos maculadas tenta modelar aquilo que poderá 
apenas ser entendido no coração e confessado com a boca? 
Faz uma imagem e chama-lhe Cristo. O nome Cristo significa Deus 
e homem. Consequentemente, pintou a natureza divina que não pode ser 
representada. Refugiam-se na desculpa: “Representamos apenas o corpo de 
Cristo”. Mas como é que esses loucos ousam separar o corpo da natureza divina? 
Caem no abismo da impiedade, porque atribuem ao corpo uma subsistência 
em si próprio, e isto introduz uma quarta pessoa na Trindade. 
Mas, se alguém disser: podemos ter razão no que respeita às imagens 
de Cristo, mas não está certo para nós proibir também as imagens da 
simultaneamente imaculada e sempre gloriosa Mãe de Deus, replicaremos que 
a Cristandade rejeitou a totalidade do paganismo. Se alguém pensar trazer 
de novo para a vida os santos por meio de uma arte morta descoberta pelos 
pagãos, torna-se culpado de blasfêmia. Quem ousará com uma arte gentílica 
pintar a Mãe de Deus? A escritura diz: “Deus é um espírito”, e também: “Não 
farás nenhuma imagem esculpida”. (ESPINOSA, 1981, p. 63).
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
120
Prezado(a) acadêmico(a), gostaríamos de destacar duas questões levantadas 
neste texto. A primeira diz respeito ao significado atribuído à Cristandade. Como 
vimos, a religião cristã ocupava um lugar de destaque na sociedade bizantina. Nesse 
sentido, a sociedade bizantina era permeada pela concepção sagrada do mundo. 
Isto quer dizer que o mundo ganhava sentido através da relação sobrenatural - os 
acontecimentos cotidianos eram entendidos de acordo com determinadas crenças. 
Assim, Cristandade é entendida como o sentimento coletivo que unia os 
bizantinos à comunidade cristã. Entretanto, esse sentimento só pode ser entendido 
nos contextos de lutas contra outras sociedades, sejam eles povos politeístas ou 
monoteístas (que acreditam em um único deus).
Nesse sentido, a batalha contra os povos muçulmanos, a partir do século 
VII, foi decisiva para reforçar o sentimento de Cristandade. Segundo Hilário Franco 
Jr. (1987, p. 41), os bizantinos “passaram a se ver como um povo eleito, destinado 
a defender toda a Cristandade” [...], e “se tornaram um instrumento de Deus face 
aos infiéis” (muçulmanos). 
FIGURA 26 - EXEMPLO DE IGREJA OBEDIENTE AO ESPÍRITO 
ICONOCLASTA BIZANTINO: IGREJA DE HAGIA IRENE, 
EM ISTAMBUL
FONTE: Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/
commons/thumb/6/6b/Irenekirken.jpg/250px-Irenekirken.
jpg>. Acesso em: 14 out. 2012.
TÓPICO 2 | RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
121
2.2.2 As motivações sociais do conflito
O texto a seguir nos ajuda a entender tanto a origem da idolatria, o culto 
das imagens religiosas, quanto as implicações sociais ligadas à “Querela das 
Imagens”. Neste sentido, vemos que os imperadores iconoclastas, chefes militares, 
estavam interessados na dominação dos territórios da Anatólia (Ásia Menor; sul da 
Turquia, nas proximidades dos Montes Taurus) administrados por determinados 
mosteiros, os quais asseguravam seu prestígio sobre o povo através do culto aos 
ícones.
 O texto pode ser encontrado no livro: “História Medieval”, de Jacques 
Heers: 
As imagens, ícones, dos personagens divinos, aceitas inicialmente para 
instruir os fiéis nos mistérios da fé cristã, tornaram-se tão numerosas que 
suscitaram estranhos fervores, práticas religiosas particulares, verdadeiras 
devoções populares. Eram encontradas em toda a parte: afrescos ou mosaicos 
nas cúpulas e nas paredes das igrejas, relevos de marfim ou madeira pintados, 
placas de bronze douradas ou esmaltadas expostas no dia de festa do santo e 
associadas diretamente ao ritual dos ofícios. 
Os sacerdotes usavam pequenos ícones e cada lugar os possuía também, 
alvos de minuciosas atenções. Essas imagens representavam o Cristo, a Virgem e 
todos os santos protetores e curandeiros. O povo atribuía-lhes um poder divino 
certo e via neles muito mais do que simples representações figuradas. Venerava-
os, prestava-lhes homenagem, suplicava-lhes, esperando os milagres. 
Alguns ícones eram reputados como sobrenaturais e seus poderes 
sobrepujavam os de todos os outros. As massas populares corriam em 
peregrinação aos mosteiros que expunham os mais insignes e abandonavam-se a 
devoções extravagantes, práticas idólatras que lembravam ainda as superstições, 
encantamentos e ritos mágicos do paganismo.
Esses excessos provocavam, em alguns meios mais rigoristas, uma viva 
reação. Leigos, sacerdotes lembram as condenações ou as admoestações dos 
primeiros doutores da Igreja e invocam a abolição do culto das imagens. Assim, 
chocam-se claramente: os iconólatras favoráveis às imagens e os iconoclastas, 
hostis; estes dois partidos, no século VIII, dividem todo o Império. 
Do ponto de vista social, os partidários de uma religião sensível, ligada 
a algumas crenças primitivas, de maneira geral o povo, as mulheres, os monges, 
opõem-se aos que são capazes de manter na prática religiosa uma espiritualidade 
mais elevada, o verdadeiro sentido do cristianismo; estes se encontram nos 
meios do imperador, da nobreza e do alto clero.
De fato, não se trata somenteda veneração das imagens sagradas, mas 
do direito mesmo de representar Deus e suas criaturas.
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
122
Mas a querela traduz também o cisma entre as províncias orientais, fiéis 
a um certo rigor espiritual, influenciadas talvez pelas proibições lançadas pelo 
Islã ou pelo judaísmo sobre a representação da pessoa humana e, por outro lado, 
a Grécia e a capital, ferozmente fiéis ao culto das imagens. 
Alguns historiadores pensam também que a atitude dos cristãos da Ásia 
foi ditada pela esperança de converter mais facilmente muçulmanos e judeus, no 
Império ou nas fronteiras. Leão, o Isauro, e todos os imperadores iconoclastas 
são de origem oriental, ao passo que duas mulheres, ambas gregas, Irene e depois 
Teodora, restabelecem os ícones assim que podem. O exército, decididamente 
iconoclasta, é formado principalmente por soldados da Ásia ou da Armênia. 
(HEERS, 1985, p. 258-259). 
 Diante disso, prezado(a) acadêmico(a), podemos ver que a luta em torno 
do culto das imagens estava relacionada aos desejos do Império em expandir seus 
domínios. Dessa forma, quanto maior o número de pessoas convertidas à religião 
oficial, maior a extensão e o poder de Bizâncio. Nesse sentido, as propriedades 
dos conventos, tomadas pelos imperadores iconoclastas, eram repartidas entre os 
soldados-camponeses como forma de garantir a posse da terra pelo Império. 
Por outro lado, a Querela significou o combate sistematizado contra os 
cultos pagãos, ligados às religiões politeístas (as crenças que cultuam mais de um 
deus), como veremos no documento histórico que será apresentado a seguir.
2.3 O GRANDE CISMA
As divergências a respeito do dogma, da liturgia e das práticas religiosas, as 
questões de precedência, envenenadas pelos conflitos políticos, explicam os cismas 
que separam as igrejas do Oriente e do Ocidente. O patriarca de Constantinopla, 
que permanece após as invasões árabes, o único chefe dos cristãos no Oriente, 
suporta mal a supremacia romana e tenta libertar-se; rejeita toda a ingerência do 
papa. (HEERS, 1985).
Desde o início do Cristianismo, havia divergências doutrinárias. Às vezes, 
elas apareciam na forma de uma contestação direta à doutrina ortodoxa, que era 
rechaçada (heresias); em outras, as divergências ganhavam dimensões maiores 
(como na iconoclastia). Com a divisão do Império Romano, as divergências 
políticas foram acompanhadas de divergências religiosas, e aos poucos, as igrejas 
de Roma e das demais dioceses afastaram-se.
Segundo Waldir Freitas Oliveira (1987), o final da Antiguidade foi marcado 
pelas disputas religiosas, uma vez que a doutrina cristã ainda não estava definida. 
Igualmente, os cismas, ou desacordos religiosos, giravam em torno das questões 
doutrinárias (conjunto de ideias) entre as diferentes igrejas cristãs da Idade Média. 
TÓPICO 2 | RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
123
2.3 O GRANDE CISMA
Contudo, o Grande Cisma ou Cisma do Oriente representou a separação 
definitiva entre os ramos do catolicismo grego e romano, e a vitória dos ortodoxos 
sobre os demais credos.
Já vimos que o Imperador Honório aproximou o Império Bizantino da 
cultura grega e que os patriarcados (sedes religiosas, equivalentes à de Roma) 
de Antioquia e Alexandria rivalizavam em importância. Ao mesmo tempo, no 
Ocidente, os papas sentiam a necessidade de sustentar sua proeminência religiosa 
em bases políticas, o que levou à aliança da Santa Sé com os imperadores francos 
(como vimos na Unidade 1).
Os conflitos e divergências (cismas) acerca da natureza de Cristo e das 
liturgias fizeram parte do cotidiano de Bizâncio. Segundo Hilário Franco Júnior 
(1987), a religião ocupava um lugar de destaque na vida da população do Império, 
problemas políticos e sociais acabavam por tomar aspectos religiosos. A luta 
por emancipação e autonomia de Constantinopla, na última década da dinastia 
Macedônica (867-1059), foi acompanhada pela luta da Igreja Ortodoxa em se 
autogovernar, pois até então ela estava sujeita às determinações do papado romano. 
A liturgia consiste no conjunto de elementos e de práticas relacionadas aos cultos 
religiosos de uma igreja ou seita religiosa: missa, orações, cerimônias, sacramentos, objetos de 
cultos.
Podemos perceber, então, que uma série de divergências políticas, culturais 
e religiosas contribuiu para afastar, progressivamente, os patriarcas de Roma (o 
papa) e de Constantinopla.
 
Em 1054, o Papa Leão IX escreveu ao patriarca de Constantinopla, Miguel 
Cerularius, exigindo que este reconhecesse que Roma tinha a primazia (privilégio) 
em assuntos religiosos. 
Vamos ler um trecho da carta:
Sois acusado de ter condenado publicamente a Igreja Apostólica e 
Latina sem um julgamento ou uma prova. E a razão principal desta 
condenação, a qual demonstra uma presunção sem exemplo e uma 
impudência inacreditável, é que a Igreja Latina ousa celebrar a 
comemoração da paixão do Senhor com pão ázimo. Como é bem vossa 
uma acusação tão gratuita, um tão pernicioso exemplo de arrogância! 
“Colocais a vossa boca no céu, enquanto a vossa língua, caminhando 
através do mundo” (Salmo LXXIII, 9) procura por meio de argumentos 
humanos e conjecturas arruinar e subverter a antiga fé. (ESPINOSA, 
1981, p. 66).
NOTA
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
124
Vocabulário
Pão ázimo: pão sem fermento, utilizado nos rituais da Páscoa judaica e para a fabricação da 
hóstia.
Pernicioso: nocivo.
Conjecturas: suposições, afirmações baseadas em dados não comprovados. 
O que podemos apreender de imediato da carta? O descontentamento do 
Papa em relação ao fechamento das “Igrejas Latinas” sob a acusação de se utilizar 
a hóstia durante a comemoração “da paixão do Senhor”. Leão IX se baseava na 
suposta Doação de Constantino, em que o antigo imperador daria a Roma esse 
privilégio. Mas, como muitos já desconfiavam, o documento é uma falsificação.
Caro(a) acadêmico(a), a intenção aqui não é aprofundar um debate teológico 
(discussão sobre doutrinas religiosas), apenas apresentar, por meio de um
documento de época, um dos motivos que levou à separação definitiva dos católicos: a 
discórdia em relação aos ritos. Resumidamente, as disputas entre as igrejas (nestoriana, 
monofisista, ortodoxa) representaram verdadeiras lutas pelo poder.
A recusa do patriarca, aliada a algumas controvérsias religiosas, levou 
ambos a excomungarem-se mutuamente e declararem a outra igreja como herética. 
O Grande Cisma (palavra que significa “separação”), como ficou conhecido, 
selou definitivamente a separação entre as igrejas do Ocidente e do Oriente – que 
passaram a ser conhecidas, respectivamente, como “Católica” e “Ortodoxa”. A 
separação mantém-se até hoje, apesar de tentativas recentes de aproximação.
O Grande Cisma gerou uma considerável tensão entre Leste e Oeste 
e teve influência direta na iniciativa dos guerreiros da IV Cruzada em saquear 
Constantinopla.
REMISSÃO À LEITURA
No site: <http://www.fosja.com.br/curiosidades.htm#003>, você encontrará informações 
sobre as diferenças entre os rituais das Igrejas: Ocidental e Oriental. 
NOTA
NOTA
UNI
TÓPICO 2 | RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
125
3 O AUGE DO IMPÉRIO DO ORIENTE: A DINASTIA MACEDÔNICA
As decisões políticas dos imperadores partiam de Constantinopla, capital 
do Império e principal porto. Ali, também governaram Basileus descendentes de 
uma mesma família; estes, por sua vez, compunham dinastias que comandaram 
o Estado por longos períodos. Um exemplo foi a dinastia dos Macedônicos, que 
governou o Império por 192 anos (867-1059). Foi durante o governo dos Macedônios 
que as fronteiras do Império alargaram-se novamente para dar lugar à segunda 
Idade de Ouro bizantina.
Como vimos, o governo de Justiniano (527-565) foi o primeiro período áureo 
do Império Bizantino, caracterizado pela retomada de parte dos territórios tomados pelos 
bárbaros. A segunda idade de ouro veio no século X, com o avanço das tropas de Bizâncio 
sobre as possessõesislâmicas.
O período de domínio da dinastia macedônica foi de constantes guerras 
contra os muçulmanos, ao sul, e contra os eslavos, ao norte; os triunfos militares 
garantiram a prosperidade econômica, pois Constantinopla conquistou novamente 
a supremacia marítima sobre o Mediterrâneo oriental. 
FIGURA 27 - IMPÉRIO ROMANO DO ORIENTE (MAIS CLARO) EM SEU AUGE, SOB A DINASTIA 
MACEDÔNICA (1025 D.C.). 
FONTE: Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/ 
archive/a/a7/20120813164218%21Map_Byzantine_Empire_1025-en.svg>. Acesso em: 23 
set. 2012.
NOTA
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
126
Embora fosse menor do que sob Justiniano, o império da dinastia Macedônica, 
em parte justamente por isso, era mais forte. A região pontilhada no mapa foi alternadamente 
dominada por bizantinos e muçulmanos.
O domínio da marinha bizantina no Mar Mediterrâneo foi de extrema 
importância para a manutenção do comércio medieval e da prosperidade bizantina. 
As cidades italianas de Veneza e Gênova puderam, dessa maneira, adquirir artigos 
de luxo e especiarias: tecidos de seda e linho, perfumes, joias, porcelana, tapetes, 
objetos de marfim, pimenta, cravo, canela – da Índia e da China. As trocas mercantis 
só foram interrompidas, definitivamente, com a tomada de Constantinopla pelos 
turcos otomanos (muçulmanos) em 1453.
FIGURA 28 - MOEDA RETRATANDO O IMPERADOR BASÍLIO I, FUNDADOR DA 
DINASTIA MACEDÔNICA
FONTE: Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/6/66/
Solidus-Basil_I_with_Constantine_ 
and_Eudoxia-sb1703.jpg>. Acesso em: 14 out. 2012.
3.1 A CRISTIANIZAÇÃO DA RÚSSIA
Muito importante para a história posterior foi o contato, que se iniciou 
durante a dinastia macedônica, entre o Império Bizantino e os povos russos. Esses 
povos, de origem eslava, estavam sendo organizados politicamente por uma 
elite comercial de varegues (povos de origem viking “russificados”), que havia 
estabelecido rotas comerciais na grande planície russa a partir do Mar Báltico. 
A partir da planície, os varegues (chamados de Rus) expandiram seus 
domínios e entraram em conflito com magiares (húngaros), cazares (do atual 
Cazaquistão), búlgaros e bizantinos.
NOTA
TÓPICO 2 | RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
127
3.1 A CRISTIANIZAÇÃO DA RÚSSIA
Os cazares são um povo aparentado aos turcos (assim como os hunos e os 
mongóis) que ocupam, até hoje, as vastas planícies do Cazaquistão. Durante a Idade Média, sua 
organização militar e seu domínio sobre enormes extensões de terra os tornavam fundamentais 
como “fiéis da balança” do poder entre bizantinos, sassânidas e árabes. No século IX, os líderes 
cazares converteram-se ao judaísmo.
Logo, os bizantinos perceberam que, se deixassem de ser oponentes, os 
eslavos seriam excelentes aliados, e assim procuraram cristianizá-los. Foram 
auxiliados nisso pelo trabalho missionário dos irmãos Cirilo e Metódio (ca. 680), 
que introduziram a religião cristã entre os russos e traduziram a Bíblia para o 
idioma local (chamado de eslavônico).
A aliança militar, celebrada entre o Rei Vladimir I e o Imperador Basílio 
II, levou à cristianização da Rússia pelos ortodoxos, e abriu caminho para uma 
aliança que permitiu o desenvolvimento de ambas as regiões. 
Quando Constantinopla entrou em decadência, a Rússia manteve-se como 
o grande centro do cristianismo ortodoxo, ainda que seguindo uma liturgia própria 
e em língua local.
FIGURA 29 - CATEDRAL DE SÃO BASÍLIO, EM MOSCOU, A MAIS CONHECIDA 
IGREJA ORTODOXA RUSSA
FONTE: Disponível em: <http://www.destination360.com/europe/russia/images/s/
churches.jpg>. Acesso em: 14 out. 2012.
NOTA
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
128
4 A DECADÊNCIA
A Cruzada de 1204 foi financiada pela cidade comercial de Veneza, que 
disputava com Gênova o monopólio comercial na Europa. Portanto, a guerra posta 
em prática pelos cruzados ultrapassou a dimensão religiosa, vindo a funcionar 
fundamentalmente como uma luta pelo domínio das principais rotas comerciais 
controladas por Constantinopla. As cruzadas favoreceram o enriquecimento dos 
comerciantes que, aproveitando-se das viagens, foram criando novas oportunidades 
de comércio. Governar Constantinopla significou, acima de tudo, ter o controle 
sobre o comércio entre Ocidente e Oriente, entre Europa e Ásia.
4.1 MOTIVOS ECONÔMICOS E POLÍTICOS DO DECLÍNIO 
DE CONSTANTINOPLA
No texto que segue, retirado do livro “O Império Bizantino”, de Hilário 
Franco Jr. (1987, p. 55-57), são apresentados os principais motivos do declínio 
econômico e político de Constantinopla. Com a paulatina supremacia comercial dos 
venezianos e da tomada de poder da aristocracia rural, deu-se início à decadência 
de Bizâncio.
Já em 922, os venezianos recebiam de Basílio I liberdade de comércio no 
porto de Constantinopla, pagando uma taxa inferior à de outros estrangeiros. A 
verdadeira penetração latina, porém, começou mais tarde, quando, precisando 
de ajuda contra os normandos, Bizâncio chamou os venezianos, também 
temerosos de um crescente poder por parte daqueles. 
Assim, em 1082, Veneza recebia isenção total de taxas alfandegárias, 
um bairro de Constantinopla e liberdade de trânsito em todo o império, com 
exceção do Mar Negro. Mas, para contrabalançar a crescente influência dos 
venezianos, Bizâncio precisou, no começo do século XII, conceder privilégios 
comerciais a Pisa. Como isso não se revelou suficiente, também os genoveses 
receberam vantagens para fazer frente ao poderio veneziano. Mas tudo o que 
Bizâncio conseguiu com essa política foi transferir para seu próprio território a 
rivalidade e as guerras que opunham Veneza e Gênova. O império tornava-se “o 
teatro e a vítima” (Diehl) daquelas disputas comerciais.
De fato, foi procurando apossar-se definitivamente e com exclusividade 
do comércio bizantino que Veneza soube explorar as divergências político-
religiosas entre Ocidente e Bizâncio, de forma a fazer a Quarta Cruzada trabalhar 
a seu favor. 
Desta maneira é que se estabeleceu o Império Latino de Constantinopla 
(1204-1261), que beneficiou fundamentalmente os interesses mercantis 
venezianos. Por causa disso, Gênova ajudou a reconstituição do Império 
Bizantino, que em troca lhe entregava praticamente o domínio sobre seu 
comércio. Chegou-se mesmo a cobrar uma taxa de todos os navios não genoveses 
TÓPICO 2 | RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
129
4 A DECADÊNCIA – inclusive bizantinos – que se dirigissem ao Mar Negro. Bizâncio perdera o 
controle sobre seus próprios territórios. Portanto, à hegemonia econômica 
veneziana no Império Bizantino seguia-se a hegemonia genovesa.
Um cronista bizantino lamentava-se dizendo que “os latinos aumentavam 
continuamente seus benefícios e seu poderio no mar. Os gregos se debilitavam 
progressivamente, e cada dia somava uma desgraça a mais à calamidade dos 
dias anteriores”. 
Paralelo ao declínio do comércio exterior e consequente à economia 
urbana, o triunfo da grande propriedade não só rompia o equilíbrio entre 
cidade e campo, como levava a aristocracia a cobrar sua decisiva participação 
nas estruturas do Império. Os grupos sociais intermediários, que nas cidades e 
no campo permitiram durante bom tempo uma fonte de ingressos essencial para 
a fazenda do império e possibilitaram a estabilidade do Estado, estavam agora 
esfacelados.
Os grandes proprietários que sempre se opuseram ao rígido centralismo 
e intervencionismo estatal, em sua luta pelo poder, acabaram – juntamente 
com o declínio comercial e financeiro – comprometendo de forma irreversível a 
capacidade de sobrevivência do Império.
AUTOATIVIDADE
A partir do que foi exposto no texto anterior, procure responder à seguinte 
questão: 
Por que os grandes proprietários rurais representaram uma ameaça ao poder 
do Basileus e, consequentemente, do Império Bizantino? 
Prezado(a) acadêmico(a), para que possamos entender melhor o declínio 
de Bizâncio, devemos retornar até o período em que Heráclio governou o ImpérioBizantino, entre 610 e 641.
Foi durante o século VII que aquele imperador criou o regime denominado 
themas, que consistiu na divisão do território controlado pelos bizantinos. Os themas 
eram províncias controladas por um estratego, um chefe que reunia os poderes 
militar e civil e devia obediência ao imperador. As tropas por ele comandadas 
eram formadas por soldados-camponeses, soldados que se tornaram pequenos 
proprietários rurais. Este sistema teve um grande sucesso militar, pois cada soldado 
lutava pela proteção de sua família e pela manutenção de suas próprias terras.
 Até o século IX, havia sete de themas, número que passou a 25 e, no século 
X, saltou para 31. Este sistema político foi criado a fim de proteger as terras do 
império dos ataques estrangeiros e, ao mesmo tempo, criar obstáculos para o 
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
130
surgimento de grandes extensões de terra. Com isso, Heráclio buscou assegurar 
as defesas imperiais dos agentes externos e impedir a formação de latifundiários 
que pudessem ameaçar a soberania do Basileus. Assim, o poder ficou centralizado 
em Constantinopla, diferente da sociedade feudal do Ocidente, que permaneceu 
fragmentada por diferentes reinos. 
Segundo Perry Anderson (2004, p. 261):
A concentração de terras em mãos de oligarquias locais recebeu violenta 
resistência do Estado, porque ameaçava destruir suas reservas de 
abastecimento e o recolhimento de impostos, subtraindo a população 
agrária ao domínio da administração pública.
Podemos considerar, observando a atitude do Imperador Heráclio, o quanto a 
oligarquia (grupo de grandes proprietários de terra) ameaçava o sistema imperial bizantino, 
pois ela poderia desviar os recursos econômicos que o Estado arrecadava. 
Esperamos, caro(a) acadêmico(a), que estas informações possam complementar a resposta da 
questão que foi levantada anteriormente. 
FIGURA 30 - CRUZADOS SAQUEIAM OS TESOUROS DE CONSTANTINOPLA NA 4ª 
CRUZADA (1204). FOI UM DURO GOLPE, DO QUAL A CIDADE NÃO 
CONSEGUIU SE RECUPERAR PLENAMENTE 
FONTE: Disponível em: <http://western-civilisation.com/Images/uploaded/1204_
crusade%20and%20sack1.jpg>. Acesso em: 14 out. 2012.
 A partir do que foi exposto, podemos deduzir o que aconteceu no século XII 
para resultar no colapso do Império do Oriente. Se você pensou que o imperador 
começou a perder o poder e o prestígio a partir do momento em que a aristocracia, 
grupo formado por militares de alta patente, passou a dominar grandes extensões 
de terra, acertou. A combinação de latifúndio e privilégios políticos aos militares 
UNI
TÓPICO 2 | RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
131
fez ruir por dentro a estrutura do grande Império Bizantino, que tinha se reerguido, 
nos séculos X e XI, sob a dinastia dos Macedônicos.
Os campesinos endividados acabaram vendendo ou alienando suas terras 
para ficar sob a proteção dos chefes militares senhores dos castelos. Portanto, o 
fortalecimento desses senhores resultou no enfraquecimento do Império e no 
consequente estabelecimento de uma espécie de “feudalismo” nos domínios 
bizantinos.
Este é um bom momento para refletirmos sobre a definição de Império: “Unidade 
política que abarca vasto território ou numerosos territórios ou povos, sob uma única 
autoridade soberana”. (HOUAISS, 2001, p. 1580) (grifo nosso). 
A descentralização política, em função do fortalecimento da aristocracia, 
foi seguida pelo domínio ocidental (italiano) sobre a cidade-capital do Oriente, 
Constantinopla. Portanto, durante o Baixo Império (1261-1453), Bizâncio não pôde 
se sobrepor ao poder dos latifundiários e comerciantes de Gênova e Veneza. A 
divisão do Império de Constantino foi determinante para o triunfo militar dos 
árabes no Estreito de Bósforo.
AUTOATIVIDADE
Agora, sugerimos que você elabore uma pesquisa. Procure identificar 
em que momento da história ocidental o conflito em torno do uso litúrgico das 
imagens reapareceu. A seguir, elabore um texto relacionando a “Querela das 
Imagens” em Bizâncio e as disputas do uso das imagens nesse outro período 
histórico (aquele que você identificou). O texto deve ter no mínimo uma lauda 
(uma página).
Agora, sugerimos que você elabore uma pesquisa. Procure identificar em 
que momento da história ocidental o conflito em torno do uso litúrgico das imagens 
reapareceu. A seguir, elabore um texto relacionando a “Querela das Imagens” em 
Bizâncio e as disputas do uso das imagens nesse outro período histórico (aquele 
que você identificou). O texto deve ter no mínimo uma lauda (uma página).
NOTA
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
132
LEITURA COMPLEMENTAR
HISTÓRIA DO IMPÉRIO BIZANTINO
Mário Curtis Giordani
Se Bizâncio devia sua força e segurança à eficiência dos seus serviços públicos, 
era o comércio que lhe permitia pagá-los. Sua história é fundamentalmente a história 
de sua política financeira e a do comércio da Idade Média.
Poucas cidades gozavam de uma localização comercial tão privilegiada 
quanto Constantinopla, situada que estava à margem do canal marítimo entre o 
Norte e o Sul e a ponte peninsular entre o Leste e o Oeste. E poucas raças foram tão 
aptas para o comércio quanto os gregos e armênios, que constituíam seus cidadãos. 
Não é surpresa o fato de ter sido Constantinopla, durante séculos, sinônimo de 
riqueza, uma cidade cujo tesouro “não tinha fim nem medida”. Mas esse tesouro 
não fora adquirido por acidente. Os desvelos e as circunstâncias é que enriqueceram 
a cidade.
Até Colombo e Vasco da Gama abrirem uma nova era, o principal comércio do 
mundo realizava-se do Extremo Oriente para o Mediterrâneo. A esfera mediterrânea 
podia abastecer-se de alimentos e suprir as próprias necessidades. Mas, sempre que 
se tornava próspera, punha-se a desejar os artigos de luxo que só o Oriente podia 
fornecer. 
Nos primeiros séculos da era cristã, o comércio oriental era muito florescente. 
Roma importava largamente especiarias, ervas e madeira de sândalo das Índias e, 
acima de tudo, seda bruta da China. Tudo isso custava bom preço e as exportações 
de vidro, esmalte e artigos manufaturados do Mediterrâneo não eram suficientes 
para pagá-lo. Uma soma enorme de ouro ia anualmente para o Leste e essa drenagem 
conduziu à depressão que gradualmente envolveu o mundo romano. Mas a procura 
da seda continuava e a busca de uma rota menos dispendiosa para importá-la passou 
a constituir a preocupação das autoridades.
Várias rotas eram utilizadas pelo comércio oriental. Podiam seguir através 
do Turquestão até o Cáspio e daí, quer pelo norte até o Volga e o Mar Negro, no 
Quersoneso, quer pelo sul, através da Pérsia Setentrional até Nisibin, na fronteira 
imperial, ou através da Armênia, para Trebizonda. Podiam atravessar a Índia e o 
Afeganistão e o centro da Pérsia, até Nisbin ou a Síria; ou podiam seguir por mar 
até o Golfo Pérsico e então atravessar para a Síria; ou ainda, fazer todo o trajeto 
marítimo, Mar Vermelho acima até o Egito.
 Apenas duas rotas evitavam a Pérsia, a do extremo norte, que dependia 
da rara estabilidade dos povos das Estepes, ou a do extremo sul, a rota marítima, 
que exigia uma frota mercante a leste de Suez. A Pérsia constituía uma ameaça ao 
comércio. Levantava altas barreiras tarifárias e, em tempo de guerra, cortava todo 
TÓPICO 2 | RELIGIÃO E OPULÊNCIA NO IMPÉRIO ROMANO ORIENTAL
133
o abastecimento. Na realidade, restrições forçadas periódicas não eram más para 
o equilíbrio comercial do Império, mas provocavam o desemprego nas fábricas de 
seda. 
A diplomacia imperial, durante todo o século V e especialmente o VI, 
procurou salvaguardar as duas rotas livres, negociando com os reinos dos hunos 
e turcos, nas Estepes, ou com os abissínios, cujo reino de Axum comandava o Mar 
Vermelho.
O século VI foi uma grande era do comércio oriental. O império, sob Anastásio 
e nos primeiros anos da casa de Justino, encontrava-se num estado de renovada 
prosperidade e o caminho para o Leste atravessava povos ordeiros. A sedaainda 
viajava principalmente por terra, através da Pérsia, para os postos alfandegários 
de Nisbin e Dara. Daí partia para as fábricas de Constantinopla ou de Tiro e Bérito. 
Mas alguns viajavam com todas as especiarias das Índias pela rota marítima. Um 
marítimo aposentado, Cosme, apelidado Indicopleustes, o Marinheiro das Índias, 
escreveu um livro para provar, com base na sua larga experiência, que a Terra era 
plana; e nele descreve o comércio com a Índia.
O centro distribuidor, ou empório, do Oriente, era o Ceilão. Ali, as 
mercadorias orientais – seda da China, seda, aloés, cravo e sândalo da Indochina, 
pimenta de Malabar, cobre da Caliana (perto de Bombaim) e almíscar e rícino de 
Sindu – eram reunidas, as joias de Ceilão. A seda era em geral adquirida pelos 
mercadores persas, que a levavam Golfo Pérsico acima. 
As outras mercadorias eram transportadas principalmente por embarcações 
abissínias para Adulis, no Mar Vermelho, a capital do Axum, e daí, mais exclusivamente 
por navios imperiais, até o ponto alfandegário de Jotabe, na extremidade da península 
do Sinai e daí para Clisma, perto de Suez, onde residia um funcionário imperial, o 
Logóteta, que visitava anualmente a Índia. 
Os navios imperiais não iam com frequência ao Ceilão, embora ali houvesse 
colônias cristãs nestorianas, e em Caliana, Malabar e Socotra muitos habitantes 
falassem o grego. Mas a moeda preferida pelos mercadores orientais de todas as 
raças era a imperial, o que constituía grande vantagem para o comércio imperial. 
Os abissínios também mantinham relações comerciais com a África Central, 
muitas vezes acompanhados por mercadores imperiais. Cada dois anos, velejavam 
para o sul, depois marchavam a pé para o interior e, em troca de diversos artigos 
manufaturados, voltavam carregados de lingotes de ouro. O próprio Cosme, numa 
viagem para o sul, viu uma vez albatrozes. Através do mundo mediterrâneo, as 
mercadorias orientais eram distribuídas por mercadores sírios, que possuíam estações 
em cada porto e agiam incidentalmente como portadores de notícias. Um mercador 
sírio contou a São Simeão, o Estilita, a história de Santa Genoveva.
Durante o reinado de Justiniano, a situação começou a se alterar. As guerras 
persas interferiam no abastecimento da seda e a tentativa de manter baixo o preço 
desse produto serviu apenas para arruinar os fabricantes particulares, cujas fábricas 
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
134
então compraram, tornando assim a seda, quase incidentalmente, um monopólio 
imperial. 
Justino II, encontrando o império ainda esfomeado por seda, devido às 
guerras pérsicas, tentou abrir, de maneira adequada, o caminho através das Estepes, 
mas a tarefa foi superior à diplomacia imperial. Nesse ínterim, porém, dois monges 
nestorianos tinham chegado a Constantinopla com o segredo do bicho-da-seda e 
alguns ovos em seus bordões ocos. Passou-se algum tempo antes que a criação do 
bicho-da-seda se espalhasse pelo império. Mas, daí por diante, a importação do 
Oriente começou a declinar.
FONTE: GIORDANI, Mário Curtis. História do Império Bizantino. Petrópolis: Vozes, 1968, p. 128-
130.
135
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico você viu que:
 O Império Bizantino foi palco de inúmeras controvérsias religiosas. As mais 
importantes foram: o Nestorianismo, a Iconoclastia e o Grande Cisma (1054).
 A Iconoclastia era a destruição das imagens dos santos, consideradas blasfemas 
por alguns grupos religiosos. Apesar do fundo religioso, o movimento teve 
justificativas políticas e sociais.
 O Grande Cisma separou a igreja cristã em ocidental (Católica) e oriental 
(Ortodoxa) e aprofundou definitivamente a divisão entre Ocidente e Oriente.
 A dinastia Macedônica (867-1059) foi uma das eras de mais prosperidade da 
história do Império Romano do Oriente.
 Durante a dinastia Macedônica, os contatos com a Rússia se intensificaram e a 
região foi cristianizada.
 O declínio de Constantinopla e do Império Romano do Oriente aconteceu 
motivado, entre outros fatores, pela concorrência com as cidades italianas, 
especialmente após o saque da cidade na 4ª Cruzada (1204).
136
AUTOATIVIDADE
1 Por que as controvérsias religiosas bizantinas constituíam uma ameaça tão 
séria à autoridade do Basileus?
2 Quais eram as motivações políticas do movimento iconoclasta?
Assista ao vídeo de
resolução da questão 1
137
TÓPICO 3
A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE 
OURO” DO ISLAMISMO
UNIDADE 2
1 INTRODUÇÃO
O surgimento do Islã foi uma poderosa força social, política e religiosa, que 
transformou radicalmente a região atualmente conhecida como Oriente Médio 
e, a longo prazo, o mundo todo. Logo após a morte de Maomé, em 632 d.C. (10 
AH pela contagem islâmica), seus seguidores expandiram as fronteiras do mundo 
muçulmano com uma rapidez espantosa. Cem anos após a morte do profeta, 
territórios sob o domínio do Islã iam do Oceano Atlântico (Marrocos e Portugal) 
até a Índia, e nos séculos seguintes esses limites se expandiriam ainda mais.
Juntamente com a expansão militar, a nova fé foi sendo incorporada às 
sociedades que conquistava e influenciada por elas, o que possibilitou uma riqueza 
e uma diversidade cultural impressionante para o mundo muçulmano. Essa imensa 
variedade, aliada à facilidade de comunicação e de comércio entre as regiões, gerou 
uma enorme prosperidade econômica e cultural, que ficou conhecida como a “Era 
de Ouro Islâmica”. Neste tópico, observaremos esse período em detalhes.
2 O AVANÇO MUÇULMANO
Impulsionados pela palavra de Deus revelada pelo profeta, e pela jihad, 
que pregava a propagação da fé, os muçulmanos deram início imediatamente a 
uma estratégia de conquista dos territórios vizinhos à Península Arábica.
 A expansão militar muçulmana iniciou-se ainda durante a vida de Maomé. 
O avanço da religião foi impressionante. A partir da Hégira, em 622 d.C., o Islã 
começou a conquistar territórios (o primeiro alvo foi Meca) e a arregimentar 
fiéis em outras regiões ainda não sob seu domínio direto. Dez anos depois, o 
Islã controlava praticamente toda a vasta Península Arábica, desde os limites da 
Palestina até a Arábia Feliz (Yêmen).
E não parou por aí: da morte de Maomé, em 632, até cerca de 750, os 
domínios do Islã passaram do deserto da Arábia a todo o território entre o Oceano 
Atlântico, no Marrocos, ao vale do rio Indo, no atual Paquistão.
 Nos séculos seguintes, a expansão seria ainda maior, mas o rápido avanço 
sobre um território tão extenso (muito superior ao território do Império Bizantino, 
e consideravelmente superior aos impérios anteriores já surgidos naquela parte 
138
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
do mundo) faz do primeiro século do Islamismo um período de extraordinário 
sucesso militar.
Maomé erguera as bases do Império Arábico ao assumir os poderes de líder 
religioso e de legislador (poder teocrático). Após sua morte, esse papel passou a 
ser desempenhado pelos califas. O califa, sucessor do profeta, exercia um poder 
político supremo e tinha ingerência sobre os assuntos religiosos.
Após a morte de Maomé, em 632, três grupos disputaram a liderança da 
ummah (comunidade islâmica):
● o primeiro era constituído por seus seguidores iniciais (unidos por endogamia), 
que haviam participado da Hégira; 
● o segundo, por homens importantes de Medina; e
● o terceiro, por membros das principais famílias de Meca. Nesta disputa, como 
já vimos, venceu Abu Bakr, integrante do primeiro grupo e um dos genros de 
Maomé.
A expansão do mundo muçulmano criou uma civilização própria, híbrida, 
que se formou da mescla de elementos árabes, persas, gregos, romanos e africanos. 
Basta analisarmos o mapa que segue para termos uma ideia da expansão 
dos árabes sob o Islamismo.
 FIGURA 31 – MAPA: A EXPANSÃO MUÇULMANA ENTRE 622 E 750 D.C.
FONTE: Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/7/72/Map_of_
expansion_of_Caliphate.svg>. Acesso em: 15 fev. 2012.
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO139
No tom mais escuro (Península Arábica), a expansão sob Maomé (622-632); em 
tom escuro (da Líbia ao Afeganistão), as conquistas do Califado Rashidun (ou ortodoxo, 632-
661); em tom intermediário (de Portugal ao Paquistão), as conquistas do Califado Umayyad 
(ou omíada, 661-750). Outras regiões (algumas das que estão em tom mais claro) se tornariam 
muçulmanas depois de 750: sul da Itália, Bálcãs, África ao sul do Saara, Turquia e Ásia Central 
(no extremo leste do mapa).
A expansão do Império Islâmico ultrapassou, a partir do século VII, as fronteiras do 
Império Bizantino. Os muçulmanos migraram para oeste, Maghreb (norte da África), criando 
o mundo árabe do Ocidente, e para o leste, Machrek, fundando o mundo árabe do Oriente.
2.1 O CALIFADO RASHIDUN
Como já vimos, após a morte de Maomé a sucessão ao poder foi objeto de 
disputas, que chegaram inclusive a dividir os fiéis entre xiitas e sunitas. Parte da 
dificuldade de se escolher o sucessor de Maomé vinha do fato de ele não ter tido 
filhos homens para sucedê-lo, nem ter deixado regras claras de sucessão.
A tradição árabe previa que o líder fosse escolhido por consenso entre os 
comandados e todos os primeiros califas (sucessores) foram escolhidos dessa forma. 
Mesmo após a escolha de Abu Bakr, seu genro, que tinha justificações militares e 
também familiares, o título de califa continuou a ser eletivo não hereditário.
 Por esse motivo, os primeiros califas, embora não sejam diretamente 
aparentados, são reunidos conjuntamente em um califado, que ficou conhecido 
como Rashidun – os “califas bem guiados”. Foram quatro: Abu Bakr, Omar ibn al-
Khattab, Othman ibn Affan e Ali ibn Abi Talib – ou, para facilitar, Abu Bakr, Omar, 
Omã (ou Osman) e Ali. Sob eles, o Islã avançou até a Líbia (na atual fronteira com 
a Tunísia) e a Bactriana (Afeganistão). Algumas tradições islâmicas reconhecem 
apenas os dois primeiros como bem guiados, outras incluem o quinto califa, 
Mu'awiya – que daria origem ao califado omíada.
O período dos califas Rashidun foi de organização política, social, militar 
e religiosa do Islã. Além da expansão das fronteiras e da organização político-
administrativa dos novos territórios, os califas tinham diante de si um problema 
ainda maior e mais importante: organizar e sistematizar a própria religião. 
NOTA
UNI
140
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
Como vimos no tópico anterior, Maomé não escreveu o Alcorão; apenas 
recitou-o para seus discípulos, que o memorizaram. Temendo que o conteúdo do 
livro se perdesse, Abu Bakr ordenou a transcrição do livro pouco tempo após a 
morte de Maomé, e o conteúdo final foi posteriormente compilado sob o califa 
Omã.
Os califas Rashidun deram início também à expansão islâmica, conquistando 
inicialmente a Arábia e, logo em seguida, as regiões do Império Sassânida, a 
começar pela rica região da Mesopotâmia, renomeada Iraque. 
Com uma estrutura militar bem organizada, os muçulmanos souberam 
aproveitar-se do desgaste militar, social e político dos impérios Bizantino e 
Sassânida, causado pela longa guerra que travavam entre si. Por conta das 
sucessivas vitórias contra os bizantinos e da relativa facilidade de conquista da 
vastidão do norte africano, os muçulmanos conseguiram expandir seus domínios 
com uma rapidez e uma facilidade impressionantes.
Os conflitos entre os árabes chegaram a um ponto crítico em 656, quando 
uma guerra civil levou ao poder Ali para um breve califado, do qual saiu, como 
seu antecessor, assassinado. Isso levou a uma guerra civil (Fitna) que deixou aberto 
o caminho para o surgimento do novo califado Omíada (Ummayad).
2.2 O CALIFADO OMÍADA
O quinto califa, Mu‘awiya (661-680), deu origem a uma nova forma de 
governo. Os omíadas continuaram a expandir o Islã, e consolidaram seus domínios. 
A sucessão passou a ser praticamente hereditária, e a capital do califado mudou de 
Medina para Damasco – cidade maior e mais bem situada, em um entroncamento 
muito antigo de rotas e no novo centro de gravidade do mundo islâmico: Egito, 
Levante, Mesopotâmia e Pérsia. 
Naquela época, a Síria era a região mais importante do Império Islâmico, 
por estar localizada numa área mais próxima do lado oriental do Mediterrâneo 
(o Levante). Além de consolidar suas conquistas nessas regiões, os omíadas 
expandiram seus domínios para o Magrebe (região ocidental da costa mediterrânea 
africana) e a Península Ibérica, que foi quase inteiramente conquistada. O avanço 
árabe só foi barrado pelos soldados francos em Poitiers, em 732. Foi um período 
de intensa reorganização do mundo muçulmano e de aculturação das populações 
conquistadas. 
A partir da década de 690, o mundo islâmico começou a passar por 
profundas transformações. A forma de administração de um império tão vasto 
também precisou passar por grandes modificações; para isso, foram muito úteis as 
seculares técnicas bizantinas e persas de burocracia. 
Inicialmente, desprovidos de funcionários muçulmanos em quantidade 
suficiente, os califas omíadas utilizaram funcionários estrangeiros, e inicialmente 
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
141
os documentos eram redigidos em grego ou persa. Com o tempo, a administração 
da burocracia passou a ser toda em árabe. 
Como veremos mais adiante, os não muçulmanos tinham um papel social 
relativamente destacado – inferior, porém, ao dos muçulmanos, especialmente 
os árabes. As moedas passaram a ser cunhadas sem a figura humana, como 
determinava o Alcorão. 
A população local adotava aos poucos a religião, a língua e os costumes 
árabes, e os próprios árabes começaram a migrar para as novas regiões. O mundo 
islâmico deixava de ser apenas um território e passava a desenvolver alguma 
identidade cultural.
Sob a dinastia omíada, o Islã expandiu-se em três frentes: Norte, em direção 
a Constantinopla e à Ásia Menor; Oeste, pelo norte da África (Ifriqia e Magrebe) e 
Península Ibérica (Al-Andalus); Leste, pela Ásia Central e Índia.
 Podemos dizer que foi sob o governo omíada que a sociedade muçulmana 
ganhou contornos verdadeiramente multiculturais, alastrando-se pela Espanha, 
Ásia Central e norte da África e vindo a mesclar-se com outras civilizações.
Os omíadas talvez pareçam ter se assemelhado aos reis bárbaros do 
Império Romano do Ocidente, colonos nervosos num mundo estranho, 
cuja vida prosseguiu como antes, agora sob a proteção de seu poder. 
Mas há uma diferença. Os governantes do Ocidente tinham trazido 
pouco de seu que pudesse fazer frente à força da civilização latina cristã 
à qual eram atraídos. O grupo governante árabe trouxe uma coisa que 
ia reter em meio à alta cultura do Oriente Próximo, e que, modificada 
e desenvolvida por essa cultura, iria proporcionar um idioma por meio 
do qual pôde expressar-se daí em diante: a crença numa revelação 
enviada por Deus, em língua árabe, ao Profeta Maomé. (HOURANI, 
2006, p. 50-51). 
O califado omíada enfrentou grandes dificuldades para manter seu 
poder, principalmente em relação às suas políticas de arrecadação de impostos 
(entendidas como injustas e contrárias ao Alcorão). Pela lei islâmica, os povos de 
outras religiões sob o domínio muçulmano, embora sejam tolerados e, em certos 
casos, autorizados a manter suas crenças, devem pagar um imposto especial, do 
qual os muçulmanos estão isentos: a jizya. 
Como você pode imaginar, esse imposto encorajava a conversão de muitas 
pessoas, mas era malvisto pelas populações árabes, que temiam justamente, por 
isso, perder seus privilégios e sua proeminência política. 
Em um império que conquistava novos territórios em grande velocidade, 
isso logo se tornou um problema sério. A tensão levou a uma série de revoltas: a 
segunda Fitna (680-692), a revolta berbere (povo islamizado do norte da África) 
de 740-743, a terceira Fitna (744-747) e, finalmente, a revolução abássida (750), que 
colocou no poder a dinastia de mesmo nome.
142
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
A sociedade muçulmana das primeiras décadasestava organizada 
hierarquicamente: a classe mais alta era a dos árabes, seguidos dos não árabes muçulmanos, 
depois dos não muçulmanos. Como é de se imaginar, essa estrutura ficava cada vez mais 
difícil de se sustentar em uma sociedade em que a terceira dessas classes e, depois, a segunda, 
tornavam-se cada dia mais numerosas.
2.3 O CALIFADO ABÁSSIDA
O domínio dos califas abássidas marcou o período de maior florescimento 
econômico, político e social dos muçulmanos, que ficou conhecido como “A Era 
de Ouro islâmica”. Embora tenham dominado por um período bastante longo 
(750-1258), os abássidas não tiveram, como seus antecessores, o controle de todo 
o mundo islâmico durante seus domínios. O período abássida marcou a época em 
que a unidade política deu lugar a diversos califados e sultanatos.
Uma das primeiras medidas dos abássidas foi transferir novamente a 
capital, de Damasco para Bagdá. A mudança trazia, como era de se imaginar, 
um sentido simbólico muito forte. Bagdá fica situada às margens dos rios Tigre 
e Eufrates, próxima à cidade bizantina e sassânida de Selêucia-Ctesifonte e não 
muito longe do local onde se situava a antiga Babilônia. 
 Portanto, era uma região de ocupação muito antiga e muito diversificada, 
entroncamento de rotas comerciais para o Levante, o Oriente e o Norte. A cidade 
representava com perfeição a dominação muçulmana sobre o mundo conhecido; o 
papel político e simbólico de Bagdá para os muçulmanos guarda semelhanças com 
o de Roma para os cristãos da época.
Em função dessa condição de entroncamento comercial de Bagdá, a cidade 
tornou-se um centro inigualável de cultura e riqueza, mas também de luxo e 
requinte. Uma das acusações mais frequentes aos abássidas era o abandono do 
modo de vida dos beduínos em favor de uma vida cortesã. Vêm dessa época as 
imagens, tão presentes no imaginário ocidental, das cortes dos xeques e sultões, 
rodeados de odaliscas e pajens eunucos em seus haréns. As odaliscas e os 
eunucos eram geralmente escravos, adquiridos das terras distantes com quem os 
muçulmanos passavam a ter contato - muitas vezes, até mesmo da África ao sul 
do Saara.
Essa não era, como já vimos, a única interferência estrangeira na corte. 
Muitos administradores, especialmente nos primeiros tempos, eram bizantinos 
ou persas e a influência desses últimos cresceu, compreensivamente, pela maior 
proximidade da capital com os antigos domínios sassânidas. 
NOTA
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
143
Por outro lado, os abássidas tiveram que gerenciar províncias distantes, 
que, muitas vezes, sob dinastias e poderes locais, insubordinavam-se contra o califa. 
Durante o governo abássida, o império se expandiu, mas encontrou dificuldades 
para se manter unido. Sendo assim, o grande desafio dos califas abássidas era a 
unificação e a islamização dos povos conquistados; embora tenham falhado no 
primeiro objetivo, conseguiram êxito no segundo (e mais importante).
2.4 A PAX ISLAMICA E A QUEBRA DA UNIDADE
O Islã, sob a dinastia dos abássidas, passou por um momento de relativa 
paz. As fronteiras do império foram definidas e o comércio prosperou. As cidades 
se desenvolveram e se transformaram em verdadeiras metrópoles. Entre elas: 
Bagdá, Cairo, Damasco e Córdoba. 
Segundo Fernand Braudel (1989), o Islã, no auge do império (entre os 
séculos VIII e XII), foi “a civilização mais brilhante de todo mundo velho”. Lá 
se desenvolveram, de modo espetacular, a arquitetura, a literatura, as ciências e a 
filosofia.
Prezado(a) acadêmico(a), você provavelmente já percebeu que esse conceito de 
Pax, assim como o conceito de “Era de Ouro”, são ficções criadas pelos historiadores. Então, 
não se deixe iludir pelo caráter fantasioso dos termos. Havia conflitos durante a Pax Islamica, 
como em qualquer outra, e esse não era um período de paz, fartura e felicidade para todos. O 
termo é uma simplificação adotada para finalidades didáticas.
Contudo, a unidade do Império do Islã foi ameaçada pelas dinastias 
provincianas, que, com o passar do tempo, fortaleceram-se e ficaram independentes 
do califado de Bagdá. Foi o que aconteceu, por exemplo, no Egito, com a dinastia 
dos fatímidas. Os fatímidas eram adeptos das ideias religiosas xiitas.
Nesse sentido, ao mesmo tempo em que se assentava a civilização árabe 
sob a dinastia dos abássidas, a unidade política imperial foi sendo rompida. Dentre 
as disputas travadas no interior do Islã, não podemos deixar de mencionar as 
querelas entre xiitas e sunitas, que, invariavelmente, ganharam contornos políticos 
separatistas. 
NOTA
144
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
Dentre as poderosas dinastias do Islã no século XI, destacaram-se a dos 
Almodávidas, na Península Ibérica, e a dos fatímidas, no Egito.
3 MAIS POVOS SE UNEM AO ISLÃ
3.1 A CONQUISTA DO MAGREBE E DE AL- ANDALUS
Mais importante para a história do mundo muçulmano como um todo foi 
o caminho separado, tomado pela Espanha, ou Andalus, para dar-lhe seu nome 
árabe. (HOURANI, 2006).
A ascensão dos abássidas está intimamente vinculada à quebra da unidade 
política do império árabe. É que na Península Ibérica instala-se um novo estado que 
não reconheceria a autoridade dos califas de Bagdá e cujos descendentes viriam a 
adotar também o título de califas. Este foi o primeiro passo para a desagregação 
do império árabe ocorrida ainda durante o período de expansão e conquista – 
desagregação que finalizaria séculos mais tarde com uma multiplicidade de 
dinastias e de capitais até o século XVI. (GIORDANI, 1985).
A história da Espanha muçulmana é, por sua vez, um capítulo à parte 
na própria história do Império Islâmico. Nesse sentido, o estudo do Islã em al-
Andalus (nome árabe para se referir à Espanha), ajuda-nos a entender tanto as 
disputas internas do império, entre os governos de Bagdá e das províncias, quanto 
os conflitos externos, de fronteira, entre muçulmanos e povos germânicos.
Os muçulmanos criaram governos seculares na Península Ibérica, estados 
que perduraram por oito séculos. O Islã esteve presente no território espanhol 
entre o século VIII e o XV. Para ter o domínio da península, os árabes se uniram aos 
soldados berberes, do norte da África, e com as forças militares da Síria.
 O primeiro governo islâmico espanhol surgiu em 710, com membros da 
família omíada, que lá se refugiaram. Os omíadas governaram por quase 300 anos, 
mas foi no século X que Abd al-Rahman III (912-961) fundou o califado, com capital 
em Córdoba, cidade abastecida pelo rio Guadalquivir. O governo de Rahman 
significou o apogeu do domínio muçulmano na Espanha, e a independência 
política em relação a Bagdá.
Segundo Giordani:
Abd al-Rahman embelezou a cidade de Córdoba, cujo esplendor os 
cronistas não se cansam de elogiar e descrever. Alguns calculam sua 
UNI
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
145
população em cerca de quinhentos mil habitantes. O número de suas 
mesquitas teria atingido, segundo uns, a casa dos três mil. Havia 
centenas de banhos públicos e setenta bibliotecas. (GIORDANI, 1985, 
p. 109).
Você se lembra de que os abássidas tomaram o poder no século VIII? Pois é, este 
fato fez com que a antiga dinastia, omíada, se retirasse de cena. E foi na longínqua província de 
Andalus que a família omíada encontrou refúgio e proteção.
A Espanha muçulmana foi um mundo de fronteiras entre a África islâmica 
e o Ocidente cristão. O domínio do Estreito de Gibraltar, entre o Mar Mediterrâneo 
e o Oceano Atlântico, proporcionou aos omíadas o monopólio comercial com a 
África através de Ceuta, no Marrocos. Incentivada pelo comércio, a mistura cultural 
entre árabes, espanhóis e africanos foi significativa. Esta mistura, por sua vez, só 
foi possível graças à tolerância dos muçulmanos em relação a outras religiões e 
culturas.
Segundo Albert Hourani, com o tempo:
Parte da população nativa converteu-se ao Islã, e no fim do século X 
é possível que a maioria do povo de Andalus fosse muçulmana. Masao lado deles viviam aqueles que não se converteram, cristãos e uma 
considerável população judia de artesãos e comerciantes. Os diferentes 
grupos mantiveram-se juntos graças à tolerância dos omíadas para 
com judeus e cristãos, e também à disseminação da língua árabe, que 
se tornara a da maioria, tanto para judeus e cristãos quanto para os 
muçulmanos, no século XI. A tolerância, uma língua comum e uma 
longa tradição de governo separado ajudaram a criar uma consciência e 
sociedade andaluzas distintas. (HOURANI, 2006, p. 70-71).
Como resultado desta sociedade híbrida (composta de diferentes elementos 
culturais), surgiram os “moçárabes”, que eram cristãos arabizadoso, ou seja, 
pessoas que adotaram o cristianismo como religião, mas por conviver em um 
mundo governado por muçulmanos, acabaram incorporando elementos da língua 
e dos costumes dos árabes, primeiros adeptos do Islã.
Contudo, os conflitos entre berberes e árabes foram constantes. Como 
ilustração destes conflitos, podemos destacar a formação do Império dos 
Almorávidas. Foi no século XI quando os almorávidas (al-murabitun), originários 
de Marrocos, tomaram o poder e passaram a dominar as regiões do Magreb e de 
Andalus. Assim, sob o domínio marroquino, a arte da Espanha foi levada para a 
África e se estreitaram os laços entre as civilizações andaluzas e berberes. 
Para finalizar, prezado(a) acadêmico(a), podemos concluir que as lutas 
políticas, que se revestiam de caráter religioso na Espanha muçulmana, chegaram 
a seu auge no século XV, com a expulsão dos muçulmanos da Europa. Em 1492, 
UNI
146
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
caía a última cidade sob jurisdição do Islã, Granada. Porém, a cultura islâmica 
permaneceria por mais tempo naquelas paragens europeias. O fim do domínio 
político muçulmano na Espanha representa, para nós, “fazedores de história”, um 
dos principais marcos do início da Idade Moderna.
Uma característica interessante do califado omíada de Al-Andalus foi 
sua integração com as regiões não apenas do Magrebe como da própria África 
ocidental ao sul do deserto do Saara. A proximidade da região e as intensas trocas 
comerciais levaram não apenas à islamização das casas reais da região do Sahel (ao 
sul do deserto), como a constantes interações culturais entre as regiões. 
Os mouros - povos muçulmanos que viviam no norte da África - costumam 
ser retratados como negros, como no caso de Otelo, “o mouro de Veneza” da peça 
de William Shakespeare, e essa descrição pode ser mais próxima da realidade do 
que acreditamos. 
O historiador tunisiano Mohamed Talbi descreve a cultura do Magrebe da 
seguinte forma:
A Espanha conquistou duplamente seus rudes conquistadores berberes 
– Almorávidas ou Almóadas – e, oferecendo‑lhes os tesouros seculares de suas 
tradições artísticas e culturais, fê‑los construtores de uma civilização. Também 
a civilização do Ocidente muçulmano foi, a partir do século XII, mais do que no 
passado, uma civilização ibero‑magrebina.
Em proporções difíceis de precisar, os negros originários de regiões 
situadas ao sul do Saara colaboraram para a formação dessa civilização. Havia 
grande número deles no Marrocos e em todo o Magreb. A mestiçagem, contra a 
qual não existia preconceito, era frequente e teve naturalmente alguma influência 
biocultural, difícil, no entanto, de se indicar com exatidão. 
Também havia negros na Espanha, principalmente em Sevilha e 
Granada. Como escravos por um tempo, ou homens livres, tiveram participação 
considerável no exército e na vida econômica, introduzindo alguns costumes de 
seus países de origem.
 Alguns deles, como João Latino, professor universitário na Espanha, 
atingiram o nível mais elevado da vida intelectual e deram à civilização 
ibero‑magrebina um sentido mais amplamente africano. (TALBI, 2010, p. 65-66).
3.2 OS TURCOS E OS MONGÓIS
Os povos turcos e mongóis são originários das estepes da Ásia Central, e 
eram constituídos originalmente de tribos nômades. Turcos e mongóis partilham, 
além de uma origem próxima, outra característica curiosa. Inicialmente ferrenhos 
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
147
adversários do Islã, terminaram por ser convertidos e transformaram-se, cada um 
a seu tempo, em poderosas forças militares e inovadoras da religião.
Por volta do ano 650, os turcos dominavam várias regiões próximas ao 
Curasão, na fronteira oriental do Império Sassânida. Com a invasão do império 
pelos árabes, os turcos passaram a combater os muçulmanos.
 A luta estendeu-se por quatro séculos, até o momento em que a dinastia 
turca dos seljúcidas converteu-se e tornou-se uma das mais ferrenhas defensoras da 
jihad. A hostilidade dos turcos seljúcidas contra os não muçulmanos, especialmente 
os peregrinos cristãos da Palestina, é considerada um dos estopins das cruzadas.
O impacto dos turcos e dos mongóis ficará mais claro na Unidade 3, quando 
estudarmos as Cruzadas e as Invasões Mongólicas.
3.3 A AMPLITUDE DOS DOMÍNIOS MUÇULMANOS: DA 
ÁFRICA À CHINA
As conquistas muçulmanas foram expressivas nos dois primeiros séculos, 
mas não cessaram após esse período. Ao longo dos séculos, os muçulmanos 
gradualmente incorporaram novas regiões aos seus domínios, a ponto de chegarem 
à África ao sul do Saara, ao Himalaia e à Indonésia.
Na África, o reino de Gana, às margens do rio Níger, recebia influência 
indireta do Islã, e mercadores muçulmanos atravessavam o deserto em 
caravanas cameleiras para adquirir a noz de cola (fruto refrescante) e escravos. 
Seu sucessor no domínio político do Sahel, o Império do Mali, era ainda mais 
fortemente influenciado pelo Islamismo. Seus reis, chamados Mansa, eram 
muçulmanos, ainda que a população mantivesse as crenças tradicionais.
No subcontinente indiano, a presença islâmica data da época da expansão 
sobre a Pérsia. Posteriormente, os imperadores mongóis (muçulmanos de 
origem mongólica) espalharam ainda mais o Islã pela região, que hoje conta com 
uma expressiva maioria ao longo dos grandes rios Indo (Paquistão) e Ganges 
(Bangladesh).
 Na China, o Islã também chegou muito cedo, levado pelos comerciantes 
e pelo contato com expedições militares; a influência dos mongóis sobre a China 
levaria a fé a uma quantidade expressiva de pessoas.
ESTUDOS FU
TUROS
148
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
A expansão da fé muçulmana chegou até a Indonésia, que hoje é o país 
com a maior população muçulmana em todo o mundo. A religião chegou pelos 
comerciantes e espalhou-se progressivamente a partir do século XIII. Por volta 
de 1550, quando os europeus chegaram à região e estabeleceram entrepostos 
comerciais lucrativos, o Islã já dominava a região nas proporções de hoje.
4 A CULTURA MUÇULMANA
Toda essa diversidade étnica, aliada às características próprias da religião, 
permitiu que as regiões muçulmanas produzissem uma riqueza cultural de valor 
inestimável. 
Veremos a seguir algumas de suas características principais.
4.1 AS ARTES
A percepção artística dos povos islâmicos está fortemente condicionada 
aos preceitos religiosos. Um dos mais importantes, nesse contexto, é a proibição 
da reprodução da figura humana, decretada no Alcorão. Com isso, algumas artes 
que se desenvolveram fortemente na Europa, como a pintura e a escultura, são 
muito menos expressivas entre os países muçulmanos. Por outro lado, algumas 
artes encontraram uma expressividade que não tem paralelo no Ocidente.
SUGESTÃO DE LEITURA!
Prezado(a) acadêmico(a), se você tiver interesse em saber mais sobre a arte islâmica, ou se 
desejar encontrar imagens para ilustrar as aulas que ministrará sobre o assunto, sugerimos 
buscar com cuidado pela internet. É um repositório de informações riquíssimo. No entanto, 
é sempre bom verificar as informações antes de selecionar as imagens, especialmente para 
saber se elas são acuradas e não violam direitos autorais.
Uma boa fonte de informação sobre a arte islâmica é a recente obra de: 
● MANDEL, Gabriele. Como reconhecer a arte islâmica.Lisboa: Edições 70, 2010.
4.1.1 Os arabescos
Em parte para compensar a proibição de representar a figura humana, os 
povos muçulmanos desenvolveram uma técnica de entrelaçar símbolos, imagens e 
letras do flexível alfabeto árabe em figuras denominadas arabescos. Os arabescos 
podem ser pintados, gravados ou esculpidos, e são um elemento central da estética 
islâmica desde o início da religião.
UNI
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
149
4.1 AS ARTES
4.1.1 Os arabescos
FIGURA 32 - DETALHE DOS ARABESCOS DE UM ARCO NO PALÁCIO DA 
ALHAMBRA, EM GRANADA (ESPANHA). AUTOR: YVES REMEDIOS
FONTE: Licença: Creative Commons Attribution 2.0 Generic Disponível em: 
<http://en.wikipedia.org/wiki/File:Atauriques.jpg#filelinks>. Acesso 
em: 15 fev. 2013. 
FIGURA 33 - ARABESCOS NO PÓRTICO DO FORTE AGRA, CONSTRUÍDO 
DURANTE O IMPÉRIO MUGHAL NA ÍNDIA. AUTOR: HANS A. 
ROSBACH
FONTE: Licença: Creative Commons Attribution-Share Alike 3.0 Unported. 
Disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/File:RedFortAgra-
Musamman-Burj-20080211-2.jpg>. Acesso em: 15 fev. 2013.
4.1.2 A caligrafia
Tirando proveito da beleza e flexibilidade do alfabeto árabe, os calígrafos 
refinaram a sua arte ao extremo. A caligrafia está presente em praticamente todos 
os lugares e situações. Os textos, muitas vezes, são dispostos de formas elegantes e 
engenhosas, formando figuras, arabescos ou belas imagens abstratas.
150
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
FIGURA 34 - A FÓRMULA RELIGIOSA “BISMILLAH” (“EM NOME DE DEUS”), ESCRITA EM 
DIFERENTES FORMATOS
FONTE: Disponível em: <bit.ly/11sg2TZ>. Acesso em: 15 fev. 2013.
Sugestão de site. Para ver centenas de versões como essas, acesse: <bit.
ly/11sg2TZ>.
4.1.3 A arquitetura
A arquitetura islâmica é bastante diversificada, refletindo as inúmeras 
culturas que fazem parte do mundo muçulmano. Embora grande parte dos 
monumentos arquitetônicos tenha finalidade religiosa (mesquitas e minaretes), 
as construções civis (palácios e edifícios em geral) também produziram obras de 
inestimável valor cultural.
 Dada a facilidade com que os muçulmanos incorporavam as influências 
locais, muitas construções têm notável influência bizantina, persa, indiana ou 
berbere, conforme a região ou a época em que foram edificadas.
FIGURA 35 - DOMO DA MESQUITA DE KAIROUAN (TUNÍSIA, 670) 
FONTE: Disponível em: <http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Kairouan_
Mosque_Cupola.jpg>. Acesso em: 15 fev. 2012.
UNI
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
151
4.1.3 A arquitetura
FIGURA 36 - INTERIOR DA MESQUITA DO SHAH (1629), EM ISFAHAN (IRÃ
FONTE: Disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/Imam_Mosque_
Isfahan>. Acesso em: 15 fev. 2013.
FIGURA 37 - O TAJ MAHAL, EM AGRA (ÍNDIA)
FONTE: Disponível em: <http://hr. wikipedia.org/wiki 
Datoteka:TajMahalbyAmalMongia.jpg>. Acesso em: 15 fev. 2013.
4.1.4 Literatura
Uma das mais conhecidas (no Ocidente) obras literárias da cultura islâmica 
é a famosa “As mil e uma noites”. A obra, escrita em árabe, é uma compilação 
de histórias populares de várias regiões do mundo islâmico, especialmente do 
Irã, Arábia e Índia. A obra, embora tenha fornecido uma grande quantidade de 
elementos para o imaginário ocidental sobre o Islã, não é uma das mais populares 
na região; curiosamente, é mais popular em outras regiões do mundo.
152
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
4.1.5 Outras artes
Outros belos exemplares da arte islâmica incluem a dança, a música, a 
cerâmica, a tapeçaria, a marchetaria (revestimento de superfícies com lascas de 
madeira), o entalhe em metais, marfim e outras substâncias. É importante observar 
que, assim como as demais artes, essas sofrem uma grande influência da região 
do mundo islâmico em que são cultivadas. O mundo muçulmano é muito vasto e 
diversificado, e isso se reflete claramente nas artes.
4.2 A FILOSOFIA E AS CIÊNCIAS
4.2.1 A Educação
O Alcorão e os Hadiths estão repletos de referências positivas à educação: 
“busque a educação do berço até o túmulo”; “a tinta do estudioso é mais sagrada 
do que o sangue do guerreiro”- estes são apenas dois exemplos da atitude islâmica 
em relação à educação. Os califas, seguindo o que ditava o profeta, foram grandes 
incentivadores da cultura e da instrução pública.
 Em todas as grandes cidades, cópias dos livros islâmicos e de tratados 
científicos ou filosóficos antigos foram preservadas, traduzidas e recopiadas 
com frequência. O ambiente nas cidades e nas madrassas (escolas religiosas) era 
propício ao desenvolvimento da educação – e, com ela, da filosofia e das ciências.
 A literatura muçulmana durante a Idade Média, geralmente, não estava 
desvinculada das ciências; diversos autores eram, simultaneamente, poetas, 
filósofos e/ou cientistas. Exemplos incluem Avicena, Omar Khayyam, Al-Farabi, 
Abubácer, Averróis, Ibn Khaldun e muitos outros. O mundo islâmico medieval 
foi pródigo em autores que são considerados polímatas, ou seja, que se dedicam 
a diversos assuntos; muitos deles influenciaram diretamente os pensadores do 
Renascimento europeu.
4.2.2 A Filosofia
A Filosofia e as ciências foram áreas de conhecimento que atingiram um 
alto grau de desenvolvimento e sofisticação no mundo islâmico medieval. A 
expansão muçulmana atingiu, em poucas décadas, algumas regiões do mundo 
em que essas áreas de conhecimento eram muito refinadas: o mundo helênico, a 
Pérsia, a Palestina, o Egito (já sob influência greco-romana) e a Índia.
 As relações comerciais colocavam os árabes, ainda, em estreito contato com 
a Europa, a China e a África ao sul do Saara. As obras científicas e filosóficas dessas 
regiões foram traduzidas para o árabe e difundidas por escolas espalhadas por todo 
o mundo muçulmano, onde foram objeto de acurados estudos e comentários. Essa 
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
153
4.1.5 Outras artes
4.2 A FILOSOFIA E AS CIÊNCIAS
4.2.1 A Educação
4.2.2 A Filosofia
4.2.3 As ciências
preservação, difusão e interpretação propiciaram um extraordinário florescimento 
cultural no mundo islâmico e forneceram elementos para o Renascimento europeu 
posterior.
A separação entre ciência e filosofia, e entre os diversos campos da ciência, 
tal como a entendemos atualmente, não era bem definida entre os estudiosos do 
Islamismo medieval. As ciências eram entendidas de uma forma abrangente e 
os diversos campos em que as dividimos, hoje, eram vistos como temas a serem 
pesquisados. Isso levou ao surgimento de uma grande quantidade de polímatas 
entre os estudiosos muçulmanos, como mencionamos há pouco.
Dentre os campos da ciência mais estudados no mundo islâmico medieval, 
destacam-se: a Matemática, a Astronomia, a Medicina, a Física, a Alquimia, a 
Geografia, a História e a Psicologia.
Toda a base da Matemática Moderna foi desenvolvida pelos muçulmanos: 
os algarismos como os conhecemos (o termo vem do nome do matemático Al-
Khwārizmī); a Álgebra (do árabe al-jebr, “reunião das partes separadas”); também 
foram eles responsáveis pela difusão de outros elementos fundamentais da 
matemática, como os próprios algarismos que utilizamos, originados da Índia (e 
por isso chamados indo-arábicos), e obras como a do matemático indiano Bhaskara 
(1114-1185), que descobriu a fórmula para a solução de equações de segundo grau 
que leva seu nome.
Também em Astronomia, Física e Química (Alquimia), os muçulmanos 
fizeram grandes progressos. As técnicas de navegação em alto-mar, tão louvadas 
nos livros escolares como conquistas portuguesas, há séculos já eram conhecidas 
dos árabes – que dominavam amplamente o comércio marítimo desde a costa da 
África (Zanzibar) até o Extremo Oriente (Indonésia). 
Os instrumentos que possibilitavam essa navegação, como a bússola, 
haviam sido criados originalmente para ajudar o peregrino a localizar, no deserto, 
a direção de Meca. Práticas que, hoje, não têm status científico entre nós eram 
muito cultivadas e valorizadas pelos muçulmanos: alquimia eastrologia são dois 
exemplos.
Os conhecimentos de Geografia, História, Medicina e Psicologia dos 
muçulmanos não eram menos impressionantes. Em uma região pacificada e 
relativamente unificada pela religião, percorrida diariamente por comerciantes 
e peregrinos, não surpreende que muitos viajantes tenham deixado relatos de 
viagem detalhados. 
Dois, especialmente – Ibn Khaldun e Ibn Battuta – nos permitem vislumbres 
bastante completos do mundo islâmico. A importância dada ao Alcorão para a 
154
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
higiene pessoal favoreceu, ainda, a difusão dos conhecimentos de medicina que, 
como os de psicologia, reuniam o que de mais avançado havia se criado no mundo 
antigo.
Prezado(a) acadêmico(a), você percebeu a quantidade de vezes a que fazemos 
referências ao Alcorão quando falamos da cultura e da sociedade islâmica? Isso pode parecer 
exagerado, mas é proposital, e inevitável. A sociedade islâmica está tão atrelada ao que diz o 
Alcorão e o livro tem uma importância tão fundamental na vida do fiel, que é impossível não 
mencioná-lo como base para a sociedade. Lembre-se: o significado de Islam é submissão (a 
Deus). Como você pode perceber, os fiéis levam isso extremamente a sério.
4.3 AS MULHERES E O ISLAMISMO
O texto a seguir, retirado do livro “Uma história dos povos árabes”, de 
Albert Hourani (2006, p. 166-169), nos apresenta a condição da mulher no mundo 
árabe. Veremos que, apesar das diferenças de poder entre marido e esposa, a 
mulher tinha seus direitos assegurados pela sharia, o sistema legal muçulmano 
extraído do Alcorão e dos Hadiths.
Até onde vai nossa informação, as mulheres desempenhavam um papel 
limitado na vida econômica da cidade. Eram empregadas domésticas, algumas 
podem ter ajudado aos maridos em seus negócios e ofícios e havia mulheres 
artistas de palco, dançarinas e cantoras. Em geral, porém, não participavam 
das atividades centrais das grandes cidades, da produção de bens de valor em 
larga escala para exportação. As francamente ativas eram mulheres de famílias 
pobres. Na medida em que uma família era rica, poderosa e respeitada, isolava 
as mulheres numa parte especial da casa, o harém, e atrás de um véu quando 
elas se aventuravam a sair de casa para as ruas e lugares públicos. [...].
A reclusão do harém não significava que a mulher era totalmente excluída 
da vida. Dentro dos aposentos femininos das grandes famílias, em visitas umas 
às outras, nas casas de banho públicas, que eram reservadas às mulheres em 
momentos especiais e nas celebrações de casamentos ou nascimentos de filhos, 
as mulheres encontravam-se e mantinham uma cultura própria. 
Algumas delas tomavam parte ativa na administração de suas 
propriedades, através de intermediários, e há casos registrados de mulheres 
que recorreram ao tribunal do cádi para reivindicar seus direitos. Como no 
campo, quando uma mulher envelhecia, e se houvesse tido filhos homens, podia 
adquirir grande poder na família.
IMPORTANT
E
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
155
Apesar disso, a ordem social baseava-se no poder superior e nos direitos 
dos homens. O véu e o harém eram sinais visíveis disso. Uma opinião das 
relações entre homens e mulheres profundamente enraizada na cultura do 
Oriente Médio, que existia muitos anos antes do advento do Islã e preservada 
no campo por costume imemorial, foi fortalecida, mas também modificada na 
cidade pelo desenvolvimento da charia (lei islâmica).
O Corão afirmava em termos claros a igualdade essencial de homens 
e mulheres: “O justo, homem ou mulher, sendo um dos crentes, entrará no 
Jardim”. Também ordenava justiça e bondade no trato entre muçulmanos. Parece 
provável que suas cláusulas em relação ao casamento e à herança dessem às 
mulheres uma posição melhor que a que tinham na Arábia pré-islâmica (embora 
não necessariamente nas terras conquistadas pelos muçulmanos). O sistema de 
lei e moralidade social ideal, a charia, dava expressão formal aos direitos das 
mulheres, mas também estabelecia seus limites.
Segundo a charia, toda mulher devia ter um guardião homem – o pai, 
irmão ou algum membro da família. O casamento da mulher era um contrato 
social entre o noivo e o guardião dela. O pai, como guardião, podia dar a filha 
em casamento sem o consentimento dela, se ela não tivesse ainda alcançado a 
idade da puberdade. Se tivesse, seu consentimento era necessário, mas, se não 
tivesse sido casada anteriormente, o consentimento podia ser dado pelo silêncio. 
O contrato de casamento previa um dote (mahr) dado pelo noivo à noiva; isso era 
propriedade dela, e qualquer coisa que tivesse ou herdasse também continuava 
sendo sua propriedade. A esposa devia ao marido obediência, mas em troca 
tinha direito a roupas adequadas, casa e manutenção e a intercurso sexual com 
ele. Embora os autores legais aceitassem que a contracepção era permissível em 
certas circunstâncias, o marido não devia praticá-la sem o consentimento da 
esposa.
Havia, porém, várias maneiras em que as relações entre marido e mulher 
não eram de igual para igual. Embora a esposa só pudesse divorciar-se do 
marido por um bom motivo (impotência, loucura, negação dos direitos dela), 
e só recorrendo ao cádi, ou então por consentimento mútuo, o marido podia 
repudiar a esposa sem dar qualquer motivo, e por uma simples fórmula verbal 
na presença de testemunhas. [...]. 
O contrato de casamento podia oferecer alguma proteção contra isso, se 
estipulasse que parte do dote, a chamada parte “adiada” (mu'ajjal), seria paga 
pelo marido só e quando ele repudiasse a esposa. A esposa podia esperar o 
apoio e a defesa de seus parentes homens; se repudiada, podia voltar com seus 
bens para a casa da família paterna. Teria a custódia dos filhos do casamento e 
o dever de criá-los, até atingirem uma certa idade, definida diferentemente nos 
vários códigos legais; após isso, o pai ou a família dele ficariam com a custódia.
156
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
A charia, baseando-se no Corão e no exemplo do Profeta, permitia ao 
homem ter mais de uma esposa, até um limite de quatro, contanto que pudesse 
tratá-las todas com justiça e não negligenciasse seu dever conjugal com nenhuma 
delas. Também podia ter concubinas escravas em qualquer número, sem que elas 
tivessem qualquer direito sobre ele. O contrato de casamento podia, no entanto, 
estipular que ele não tomaria nem outras esposas nem concubinas.
GLOSSÁRIO!
cádi: s. m. Magistrado muçulmano, com funções civis e religiosas. 
FONTE: Disponível em: <www.priberam.pt/dlpo/Default.aspx?pal=cádi>. Acesso em: 
23 mar. 2013 haria, chariá, xaria ou xariá (em árabe ةعيرش; transl.: sharīʿah, "legis-
lação"), também grafada sharia, shariah, shari'a ou syariah: é o nome que se dá ao 
código de leis do Islamismo. Em várias sociedades islâmicas, ao contrário da maioria 
das sociedades ocidentais dos nossos tempos, não há separação entre a religião e 
o direito, todas as leis sendo religiosas e baseadas ou nas escrituras sagradas ou nas 
opiniões de líderes religiosos. 
FONTE: Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Dicion%C3%A1rio_Aur%C3%A-
9lio>. Acesso em: 23 mar. 2013.
4.4 O ISLÃ E OS “INFIÉIS”
Contrariamente ao que crê o senso comum ocidental a respeito do 
Islamismo, e diferentemente também ao que foi estabelecido em alguns países 
islâmicos atualmente, os que não seguem o Islamismo gozaram, durante a maior 
parte da história do Islã, de um tratamento bastante generoso. 
Os muçulmanos dividem os infiéis em dois grupos: os dhimmis ou “povos 
do Livro” - judeus, cristãos e zoroastrianos – e os pagãos, politeístas. Os dhimmis 
eram aceitos nas regiões sob o domínio islâmico e tinham seus direitos assegurados 
de forma praticamente total: tinham direito a manter suas crenças e seus templos, 
receber julgamento, segundo suas leis (exceto no que ela conflitasse com o Alcorão) 
e, às vezes, eram designados mesmo para os cargos do funcionalismo. Não eram 
obrigados a se converterem,mas se desejassem manter sua fé, deveriam pagar um 
imposto especial, chamado jizya, do qual os muçulmanos são isentos.
Em diversos momentos da história islâmica, os governantes dedicaram 
especial atenção a dar um bom tratamento aos dhimmis, e algumas regiões se 
tornaram exemplos de tolerância religiosa em níveis raramente vistos. 
A Espanha muçulmana (Al-Andalus) é um dos exemplos mais citados 
pelos historiadores: cristãos, muçulmanos e judeus (como o filósofo Maimônedes) 
UNI
TÓPICO 3 | A EXPANSÃO MUÇULMANA E A “ERA DE OURO” DO ISLAMISMO
157
conviviam ali de forma bastante harmoniosa, sobretudo se comparada à perseguição 
contra os demais, promovida séculos depois pelos reis católicos Fernando de 
Aragão e Isabel de Castela.
Prezado(a) acadêmico(a), a partir do que você pôde vislumbrar sobre a cultura 
islâmica, é possível imaginar como seriam suas cidades? Que tipos de atividades se desenvolviam, 
que tipo de pessoas as habitavam, que importância se dava, nelas, à educação, saneamento e 
segurança? A comparação com a sociedade feudal não fica sem nenhum sentido? Em primeiro 
lugar, na Idade Média europeia mal havia cidades, nessa época; quanto mais cidades limpas, 
organizadas e com bibliotecas e universidades, como as islâmicas. Até mesmo a comparação 
com épocas posteriores torna-se vantajosa aos muçulmanos. A tolerância religiosa que 
havia nessa época destoava muito da perseguição a judeus e muçulmanos na Espanha da 
Reconquista (Idade Moderna).
O mundo muçulmano dos primeiros séculos sofreu uma influência muito 
grande da cultura persa, cuja tradição literária já remontava a mais de mil anos. 
O poeta Omar Khayámm (1048-1131) foi um dos mais destacados poetas de sua 
época e soube tirar proveito como poucos da sonoridade da língua persa. Alguns 
de seus mais belos poemas foram reunidos por Edward Fitzgerald em 1859 em 
uma coletânea que ele denominou Rubaiyát. 
Transcrevemos aqui alguns dos versos dessa obra:
LEITURA COMPLEMENTAR
5
Busca a felicidade agora, não sabes de amanhã.
Apanha um grande copo cheio de vinho,
senta-te ao luar, e pensa:
Talvez amanhã a lua me procure em vão.
10
Hoje os meus anos reflorescem.
Quero o vinho que me dá calor.
Dizes que é amargo? Vinho!
Que seja amargo, como a vida.
11
É inútil a tua aflição;
nada podes sobre o teu destino.
Se és prudente, toma o que tens à mão.
Amanhã... que sabes do amanhã?
IMPORTANT
E
158
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
12
Além da Terra, pelo Infinito,
procurei, em vão, o Céu e o Inferno.
Depois uma voz me disse:
Céu e Inferno estão em ti.
13
Não vamos falar agora, dá-me vinho. Nesta noite
a tua boca é a mais linda rosa, e me basta.
Dá-me vinho, e que seja vermelho como os teus lábios;
o meu remorso será leve como os teus cabelos.
FONTE: KHAYYAM, Omar. Os Rubayat. Versão em português de Alfredo Braga. 2003. Versão para 
eBook: eBooksBrasil. Disponível em: <http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/rubayat.html>. 
Acesso em: 15 fev. 2013.
159
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você viu que:
 Logo após a morte de Maomé, o Estado muçulmano começou a expandir-se e 
atingiu, em menos de cem anos, enormes proporções.
 Os primeiros califas (sucessores de Maomé) foram eleitos e ficaram conhecidos 
como califas bem guiados (Rashidun).
 Após os califas bem guiados, assumiu o poder o califado omíada.
 Após uma revolta que depôs os omíadas, sucedeu-lhes o califado abássida. 
Embora tenha sido um longo califado (mais de 500 anos), o mundo muçulmano 
não teve mais, sob os abássidas, a unidade política de antes.
 O período do califado abássida ficou conhecido como a Era de Ouro islâmica.
 Os centros culturais do mundo islâmico sob os abássidas eram Bagdá (Iraque), 
Cairo (Egito), Damasco (Síria) e Córdoba (Al-Andalus – Espanha).
 Nas grandes cidades, o conhecimento antigo foi preservado, sob a forma de 
traduções das obras antigas e comentários originais feitos a elas por filósofos e 
cientistas muçulmanos.
	Nos domínios islâmicos, as artes, a ciência e a filosofia alcançaram patamares 
elevadíssimos, adaptadas às condições e características locais, e chegavam a um 
nível de sofisticação que não tinha paralelo no continente europeu da época.
160
1 Qual a relação que se pode estabelecer entre religião e Estado para entender 
a expansão do Islã?
2 Selecione algum filósofo ou cientista do mundo muçulmano no período em 
questão e escreva uma biografia e uma breve descrição de seu pensamento 
ou descobertas.
3 De acordo com o texto “As mulheres na cidade”, quais os direitos e deveres 
da mulher muçulmana, segundo a charia?
AUTOATIVIDADE
Assista ao vídeo de
resolução da questão 1
161
TÓPICO 4
O FEUDALISMO
UNIDADE 2
1 INTRODUÇÃO
Prezado(a) acadêmico(a), estudaremos agora o que costuma ser entendido 
como o “carro-chefe” dos estudos sobre Idade Média: o feudalismo. Mas vamos 
fazer isso de uma forma como você provavelmente nunca viu antes. 
Normalmente, as pessoas estão tão habituadas a pensar as duas coisas 
juntas que chegam a chamar a Idade Média de “era feudal”. Mas como você 
poderá perceber, os autores deste Caderno de Estudos consideram não apenas um 
reducionismo exagerado tomar esse aspecto importante, mas limitado da Idade 
Média e transformá-lo no foco central dos estudos, como também consideram um 
erro tomar esse conceito sem criticar sua validade.
Nossa forma simbólica de “recolher o feudalismo ao seu devido lugar” 
foi inseri-lo no final do contexto do “mundo das sociedades fragmentadas”, por 
ter sido esta a estrutura social que demorou mais para se consolidar. Realmente, 
a “sociedade feudal”, se é que tal coisa efetivamente existiu, tomou forma por 
volta do ano 1000, embora suas características já fossem prenunciadas havia pelo 
menos duzentos anos. Mesmo assim, isso é muito depois da formação do Império 
Bizantino e do mundo muçulmano. Além do mais, o próprio período de “auge” 
do feudalismo já corresponde, como veremos, ao momento em que ele começa, 
lentamente, a desfazer-se, pois as forças sociais que levariam à sua superação já 
estavam agindo silenciosamente.
Neste tópico, apresentaremos, ao mesmo tempo, uma descrição das 
origens, características e razões para o final do feudalismo e as críticas que se fazem 
atualmente a essa categoria. Consideramos importante que o futuro professor de 
História tenha acesso a todas as linhas de pensamento possíveis.
2 SOBRE O CONCEITO DE FEUDALISMO
Como você já percebeu, uma das tarefas fundamentais do historiador é 
questionar os conceitos, especialmente os conceitos que os próprios historiadores 
criaram. Não significa abandonar todos os conceitos, pura e simplesmente. 
Significa, isso sim, questionar-se para saber o que o conceito significa, quando foi 
criado, por que, por quem, e, se ainda tem validade para nós atualmente – e, se for 
o caso, quais alterações na sua formulação são necessárias. Já fizemos isso com o 
conceito de Idade Média; agora é a vez de criticarmos o conceito de feudalismo.
162
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
2.1 AS ORIGENS DO CONCEITO DE FEUDALISMO
O termo “feudalismo” não parece ter sido utilizado durante a Idade Média: o 
Libri feodorum, o mais importante documento sobre o feudalismo, menciona apenas 
“feudal” e “feudo”, mas não transforma esses termos em uma categoria política. 
“Feudalismo” como conceito é, portanto, da lavra de historiadores posteriores, 
principalmente Jacques Cujas e François Hotman, em meados do século XVI, e, 
como já dissemos, tem sido repetido acriticamente (ou quase) por séculos a fio.
O grande foco de interesse, na época de Cujas e Hotman, era o direito feudal 
e uma definição de feudo que pudesse ser aplicada, com algumas variações, a 
toda a Europa. Outro tema de interesse na época era a determinação da origem do 
sistema feudal: romana, germânica ou híbrida - uma discussão que tem implicações 
importantes no estudo do Direito Civil e do Direito Romano.
FIGURA 38 - A PERSPECTIVA POPULAR SOBRE O FEUDALISMO REDUZ ESSE FENÔMENO AO 
TRABALHO RURALE À RELIGIOSIDADE
 FONTE: Disponível em: <http://bit.ly/14NMiCH>. Acesso em: 14 out. 2012.
Do século XVIII ao XIX, o conceito foi amplamente utilizado para explicar a 
Idade Média, pois era simples o bastante para permitir ao historiador compreendê-
la sob os pontos de vista econômico, jurídico e social. 
Foi apenas com Karl Marx que uma perspectiva totalmente nova sobre o 
feudalismo foi elaborada, embora Marx tenha sido influenciado pela obra de outros 
economistas clássicos de sua época e não questionasse a validade do conceito.
Marx entendia o feudalismo como um sistema de organização social 
baseado em um modo de produção específico, em que a descentralização do 
Estado e a ruralização da economia eram ao mesmo tempo causa e consequência 
da baixa circulação de mercadorias e de dinheiro. 
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
163
2.1 AS ORIGENS DO CONCEITO DE FEUDALISMO O feudalismo, porém, carregaria em sua estrutura, como todos os 
demais modos de produção, as sementes de sua própria derrocada: crescimento 
populacional e a demanda por mercadorias que surgiu a partir do século XII 
geraram uma pressão dos comerciantes por liberdade de trânsito e de comércio 
que levaria ao fortalecimento da classe burguesa e enfraqueceria os senhores até 
destruir o sistema feudal.
Mesmo assim, Marx não questionou a validade do conceito de feudalismo 
do ponto de vista jurídico ou social; ao contrário, sua perspectiva teórica entendia 
que as características jurídicas, políticas, sociais, religiosas etc. do feudalismo (como 
de qualquer outro meio de produção) ficavam subordinadas aos seus pressupostos 
econômicos, e por eles eram justificadas. Ou seja, Marx consolidou a validade do 
conceito de feudalismo como categoria histórico-social.
2.2 CRÍTICAS AO CONCEITO DE FEUDALISMO
O termo foi utilizado sem maior critério até 1974, quando a historiadora 
britânica Elizabeth A.R. Brown demonstrou que o conceito não descrevia 
adequadamente a estrutura política, jurídica, econômica e social da Idade Média. 
Desde então, a crítica se difundiu aos poucos entre os medievalistas, mas ainda 
prevalece a visão tradicional nos livros de História. Vinte anos depois, Susan 
Reynolds propôs que o termo fosse simplesmente abandonado, uma vez que todas 
as características que ele descrevia estavam sujeitas a uma reinterpretação radical.
O que você pensa disso? Será que os “problemas epistemológicos” do termo 
“feudalismo” devem fazer os estudiosos abandonarem completamente o seu uso? Ou será 
possível utilizá-lo com reservas, para descrever um modo de produção, ou de organização social, 
ou de outra maneira, ressalvando, porém, que ele é uma aproximação e uma generalização 
que não podem ser levadas a extremos?
O conceito de feudalismo foi muito centrado nas relações de poder entre 
suseranos e vassalos e entre senhores e servos feudais. Grande parte da descrição 
do “sistema feudal” baseia-se em definições econômicas e jurídicas, e isso traz pelo 
menos três grandes limitações.
 
● de um lado, são perspectivas que se restringem a poucos aspectos da sociedade; 
● de outro, é impossível abarcar mesmo nesses dois aspectos toda a Europa; e,
● por fim, definições precisas tendem a desconsiderar as transformações ao longo 
do tempo. Ou seja, o conceito de feudalismo é, pelo menos, muito limitado, 
e qualquer descrição que se faça desse sistema será parcial do ponto de vista 
metodológico, espacial e temporal.
UNI
164
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
2.3 OS FEUDALISMOS: LOMBARDIA, GRÃ-BRETANHA E 
OUTROS LUGARES
O conceito de feudalismo que temos em mente corresponde, no máximo, 
a um período curto da Idade Média, e com um alcance conceitual e geográfico 
bastante limitado. Em outras palavras, muito do que se apresenta aos estudantes 
de História como sendo “feudalismo”, mesmo hoje em dia, é uma simplificação da 
forma de organização social, política, econômica e jurídica que existia na Lombardia 
(região do sul da França e norte da Itália), por volta do século XII. Ou para ser 
ainda mais preciso: “feudalismo” refere-se ao que chegou até nós sobre a forma 
como aquela sociedade se organizava, especialmente a partir de uma fonte em 
especial: os Libri feodorum, compilação de documentos e regulamentações daquela 
sociedade, obra que passou a ser tomada, generalizadamente, como representativa 
de um sistema feudal homogêneo e universal.
Outra vertente bem conhecida do feudalismo é britânica e a razão para isso 
é, igualmente, a disponibilidade de fontes: compilações de documentos análogas 
aos Libri feodorum existem na Grã-Bretanha. Porém, naquele país, as circunstâncias 
são bastante diferentes: a partir do século XIII, a Common Law começou a tomar 
forma, e isso certamente influenciou as características do feudalismo britânico.
 A Common Law como sistema jurídico formou-se em um contexto de 
oposição direta entre os barões e o rei, no qual os primeiros conseguiram colocar 
no papel garantias de autonomia que nunca foram previstas em outras regiões. 
Isso não significa que eles tivessem soberania absoluta; significa apenas que sua 
maior autonomia permitia-lhes solucionar os conflitos a partir das noções de 
direito locais. Alguns preexistentes, outros criados por eles próprios, mas sujeitos 
ao crivo da população – o que os obrigava a conformar-se, em parte, à sociedade 
local.
Precisamos levar em conta que fontes jurídicas não necessariamente descrevem 
a sociedade tal como ela é, mas talvez tentem, recorrendo à autoridade do texto escrito, 
transformá-la ou conformá-la a determinados objetivos. Por exemplo: qualquer um que leia os 
primeiros artigos da Constituição Brasileira de 1988 sabe que ali está descrita uma sociedade 
que se deseja construir, não a que temos na realidade. Seria um equívoco muito grande 
descrever o Brasil do final século XX acreditando que aquelas intenções são o Brasil real.
IMPORTANT
E
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
165
3 OS MODELOS DE FEUDALISMO
O que é feudalismo? É a característica central da Idade Média? O crítico social 
estadunidense H.L. Mencken dizia, com ironia, que: “há sempre uma solução bem 
conhecida para cada problema – elegante, plausível, e errada”. Como veremos, a frase 
aplica-se como uma luva ao conceito de feudalismo. Ou, mais ainda, à tentativa de 
explicar a Idade Média ocidental a partir desse conceito. 
Mesmo assim, precisamos compreender com clareza o que entendemos 
por feudalismo, se desejamos criticar a validade desse conceito. É o que vamos 
fazer nesta seção.
3.1 O MODELO CLÁSSICO DE FEUDALISMO
 Já vimos que o termo feudalismo não existia durante a Idade Média: foi 
criado no século XIX para descrever as relações de poder e lealdade existentes 
entre os nobres: doador e donatário – dos feudos (esse termo já existia). 
O historiador francês Marc Bloch (1982), em “A sociedade feudal”, estendeu 
o conceito para abarcar todas as relações de poder dentro daquela sociedade, o que 
implicava reconhecer que entre suseranos e seus servos as relações também seguiam 
essa lógica. Em outras palavras, a relação de servidão seria, também, regida por 
pressupostos feudais de lealdade mútua.
3.1.1 A homenagem
A definição clássica de feudalismo, em linhas gerais, implica uma relação de 
obrigações militares e legais mútuas entre duas pessoas. Em termos simples, existia 
um senhor (chamado suserano) que delegava a outra pessoa (o vassalo) uma porção 
de terra de seus domínios em troca de algum tipo de benefício: obrigações militares, 
trabalho, serviços etc. Portanto, era uma relação que beneficiava mutuamente os 
dois contratantes, e obrigava-os a respeitar determinadas obrigações. O suserano 
era de origem nobre, o vassalo não necessariamente.
Mas, é claro que um sistema tão frouxamente descrito sofria tremendas 
variações de uma região para outra, e é questionável mesmo se ele tenha, em algum 
lugar, chegado perto do que entendemos como “feudalismo típico”. 
Em alguns lugares, a diferença para o feudalismo lombardo ou britânico 
era tão marcante que nemdeveria ser usado o mesmo termo para descrever suas 
estruturas sociais. É o caso da Península Ibérica, onde os reis tinham uma grande 
importância, por centralizarem o poder e concederem, como desejassem, domínios 
aos cavaleiros. Isso contraria frontalmente a ideia de descentralização política do 
mundo feudal – uma ideia, aliás, que, como já vimos, era provavelmente mais 
equivocada do que parece.
166
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
FIGURA 39 - VASSALO PRESTA HOMENAGEM A SEU SUSERANO E, EM TROCA DE 
SUA LEALDADE E DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS, PODE RECEBER 
FAVORES COMO TERRAS
FONTE: Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/e/e5/
Hommage_au_Moyen_Age_-_miniature.jpg>. Acesso em: 12 out. 2012.
A imagem está nos Archives Départamentales de Perpignan (França)
Tornar alguém um vassalo (homenagem) e delegar-lhe terras eram dois 
processos distintos, e precisavam acontecer nessa ordem. A lealdade que ambos 
deviam um ao outro tinha efeitos legais, e o vassalo poderia perder as terras que 
recebera, caso se insurgisse contra o suserano ou se recusasse a auxiliá-lo em caso 
de necessidade ou de obrigação.
3.1.2 O feudo
O feudo, como é tradicionalmente entendido, seria uma estrutura agrária 
autossuficiente, sob posse de um nobre (senhor). O terreno costumava ser dividido 
entre manso senhorial (terras de usufruto do senhor), manso servil (terras de 
usufruto do servo) e terras comunais (o terreno do castelo, da vila, mais os bosques, 
lagos, pântanos etc., que eram improdutivos ou de uso comum). 
Os servos que ali trabalhavam diferenciavam-se dos escravos da 
Antiguidade por estarem presos à terra, em vez de serem considerados propriedade 
do senhor. Caso outro senhor conquistasse as terras em que o servo vivia, sua 
lealdade passaria ao novo senhor, pois era a ele que o servo passaria a dever sua 
proteção.
UNI
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
167
3.1.3 As obrigações servis
Em troca da proteção oferecida, o servo devia obrigações em forma de 
trabalho. Havia dezenas de obrigações, e as mais comuns incluíam:
● Corveia: trabalho compulsório do servo nas terras do senhor durante um certo 
número de dias da semana.
● Banalidades: taxas devidas pelo servo pelo uso de algum tipo de facilidade do 
feudo – o moinho, o lagar, o forno etc., geralmente pagas com o produto final.
● Talha: valor pago pelo servo para o custeio das defesas do feudo. A talha era 
paga com uma porcentagem da produção do manso servil.
● Mão morta: taxa paga pela família de um servo falecido, para reafirmar a 
proteção.
● Dízimo: dez por cento da produção do manso servil, em tributo à Igreja.
3.2 A PERSPECTIVA MARXISTA
A visão tradicional sobre o feudalismo, fundado, como vimos, na lealdade 
entre iguais ou entre protetores e protegidos, foi contrabalançada pelos estudos de 
orientação marxista, que se preocuparam em denunciar as precaríssimas condições 
de vida a que estavam submetidos os servos feudais, causadas pela enorme carga 
de obrigações a que estavam sujeitos em troca da proteção senhorial. 
Leo Huberman descreveu da seguinte forma a situação dos servos 
medievais:
O camponês vivia numa choça do tipo mais miserável. Trabalhando 
longa e arduamente em suas faixas de terra espalhadas (todas juntas tinham, 
em média, uma extensão de 6 a 12 hectares, na Inglaterra, e 15 a 20, na França), 
conseguia arrancar do solo apenas o suficiente para uma vida miserável. 
Teria vivido melhor, não fora o fato de que, dois ou três dias por semana, 
tinha que trabalhar a terra do senhor, sem pagamento. Tampouco era esse o 
único trabalho a que estava obrigado. Quando havia pressa, como em época de 
colheita, tinha primeiro que segar o grão nas terras do senhor. 
Esses "dias de dádiva" não faziam parte do trabalho normal. Mas isso 
ainda não era tudo. Jamais houve dúvida quanto à terra mais importante. A 
propriedade do senhor tinha que ser arada primeiro, semeada primeiro e 
ceifada primeiro. Uma tempestade ameaçava fazer perder a colheita? Então, era 
a plantação do senhor a primeira que deveria ser salva. 
168
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
Chegava o tempo da colheita, quando a ceifa tinha que ser rapidamente 
concluída? Então, o camponês deveria deixar seus campos e segar o campo do 
senhor. Havia qualquer produto posto de lado para ser vendido no pequeno 
mercado local? Então, deveriam ser o grão e vinho do senhor os que o camponês 
conduzia ao mercado e vendia - primeiro. 
Uma estrada ou uma ponte necessitavam reparos? Então, o camponês 
deveria deixar seu trabalho e atender à nova tarefa. O camponês desejava que 
seu trigo fosse moído ou suas uvas esmagadas na prensa de lagar? Poderia fazê-
lo - mas tratava-se do moinho ou prensa do senhor e exigia-se pagamento para 
sua utilização. 
Eram quase ilimitadas as imposições do senhor feudal ao camponês. De 
acordo com um observador do século XII, o camponês "nunca bebe o produto 
de suas vinhas, nem prova uma migalha do bom alimento; muito feliz será se 
puder ter seu pão preto e um pouco de sua manteiga e queijo...” (HUBERMAN, 
1986, p. 5-6).
A perspectiva marxista não questionou o conceito clássico de feudalismo, 
mas passou a observá-lo como um modo de produção, ou seja, um conjunto 
de estruturas materiais (base) e ideológicas (superestrutura) que permitiam a 
produção econômica de uma forma em particular.
 
A teoria marxista estabelece que cada modo de produção contém em si 
próprio os elementos que viriam a causar sua derrocada. No caso do modo de 
produção feudal, esses elementos seriam a baixa circulação de dinheiro, compatível 
apenas com sociedades pequenas e fechadas - ou, como no caso feudal, milhares de 
sociedades fragmentadas, todas independentes entre si. Isso seria possível apenas 
em contextos conturbados, em que a população não é elevada. As transformações 
sociais e o crescimento populacional dos séculos XII-XIV gerariam uma crise no 
sistema, por não ser mais possível manter-se a estrutura política. 
A luta de classes (conceito central do marxismo) entre senhores feudais 
e burgueses levaria, com a vitória desses últimos, à substituição do modo de 
produção feudal pelo capitalista.
Prezado(a) acadêmico(a), veremos a crise do feudalismo em mais detalhes na 
próxima unidade.
ESTUDOS FU
TUROS
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
169
4 AS ORIGENS DO FEUDALISMO
Existe uma grande polêmica entre os historiadores sobre quais fatores 
seriam responsáveis pelo aparecimento do feudalismo na Europa. Quase todos 
concordam, porém, que um dos principais destes fatores seria o fato de que entre 
os germanos invasores o Estado era entendido como propriedade privada do 
governante e não uma República, como entre os romanos. 
Enquanto no sistema republicano a lei comum está acima de todos - 
inclusive os governantes - e o poder emana da soberania popular que delega poder 
aos magistrados eleitos para um mandato temporário, sempre renovado pelo voto, 
nos reinos estabelecidos pelos germanos - conhecidos como reinos bárbaros - o 
poder emana do rei e só por seu intermédio pode ser exercido. 
Como o rei considera o Estado sua propriedade, a tendência, em longo 
prazo, é a fragmentação política, pois, com sua morte, o Estado é dividido entre 
seus filhos. Por mais que um rei amplie o território do Estado, com sua morte, a 
partilha é inevitável, se houver mais de um herdeiro.
4.1 A FRAGMENTAÇÃO DO IMPÉRIO CAROLÍNGIO
Foi o que aconteceu com o Império Carolíngio. Um imenso território que 
reunia as atuais França, Bélgica, Holanda, Alemanha, Áustria e Itália foi dividido 
– com a morte de Carlos Magno – entre os três herdeiros no Tratado de Verdun. 
Embora a tendência fragmentária tenha sido anulada pela adoção da primogenitura 
no século XI, o Estado continuou sendo propriedade do governante, na Europa 
continental, até a Revolução Francesa.
4.2 OUTROS FATORES
Evidentemente, outros fatores contribuíram para a fragmentação total do 
Estado a partir da implosão do Império Carolíngio no século IX. Numa análise 
bastantepertinente, Hilário Franco Jr. (2004, p. 55-56) apontou ainda mais quatro 
fatores para este profundo processo de fragmentação:
Em primeiro lugar, o fato de o Império [Carolíngio] não ter unidade 
orgânica, assentando-se sobre dois princípios contraditórios: o universalismo 
das tradições romanas e cristãs e o particularismo tribal germânico. A 
diversidade étnica era insuficientemente soldada pela autoridade real, muito 
sujeita a flutuações conforme a personalidade do soberano. Mais eficaz era a 
unidade espiritual, com o Império num certo sentido sendo tão somente “a 
expressão política de uma unidade religiosa”. No entanto, isso não bastou para 
garantir seu sucesso, pois levantou a questão que se estenderia por séculos: a 
Igreja deveria tutelar o Império ou vice-versa.
170
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
Um segundo fator foi a difusão da vassalagem, por meio da qual 
Carlos Magno pretendeu unir a si todos os súditos importantes, num vínculo 
que manteria o predomínio imperial. A relação vassálica implicava, porém, a 
entrega por parte do soberano de terras e privilégios políticos que na verdade 
o enfraqueciam. Naquela economia essencialmente agrária, ao ceder terras 
para os nobres, o imperador precisava conquistar novas terras, mas para tanto 
dependia do serviço militar daqueles mesmos elementos. Surgia um círculo 
vicioso difícil de ser rompido. Ora, ao estabelecer novos laços de vassalagem 
para poder manter os já estabelecidos, debilitava-se o princípio monárquico, e o 
poder do soberano colocava-as noutras bases, contratuais.
Em terceiro lugar, revelou-se problemática a fusão entre o poder temporal 
e o poder espiritual na pessoa do Imperador. No seu papel militar, pela tradição 
germânica, ele deveria ser um chefe guerreiro e obtentor de pilhagens, e no seu 
papel religioso, pela tradição cristã, ele deveria ser o mantenedor da paz e da 
justiça. Frágil equilíbrio. Com Carlos Magno, rendeu-se mais para a primeira 
função; com seu filho Luís, o Pio, para a segunda. Esse Imperador fez, com sua 
opção, com que a expansão cristã fosse realizada por intermédio de missões 
religiosas e não mais de conquistas militares. O soberano ficou assim privado 
dos proventos de pilhagem, de forma que precisava remunerar os vassalos com 
suas próprias terras, esgotando a fortuna fundiária carolíngia, base inicial de seu 
poder. 
Por fim, as novas invasões dos séculos IX e X contribuíram para mostrar 
a debilidade do sistema imperial. A rapidez dos vikings, que, descendo da 
Escandinávia penetravam pelos rios com seus barcos leves e ágeis, não permitia a 
defesa por parte daquele exército difícil de ser convocado e pesado nas manobras 
militares. A cavalaria dos magiares, sem as pesadas couraças ocidentais e 
aproveitando as planícies da Europa central, de onde saíam, causava pânico, e 
antes de qualquer contra-ataque retirava-se rapidamente para suas bases. 
Os muçulmanos e eslavos, ainda que menos perigosos, também 
contribuíam para aumentar o sentimento generalizado de insegurança. Ficava 
patente a impotência dos soberanos, e cada região organizava sua própria 
defesa, em torno da nobreza local. Era a região, portanto, que passava a definir 
seu próprio destino. A Europa cobria-se de castelos. O poder se fragmentava.
A Importância deste processo de fragmentação foi assim sintetizada nas 
palavras de Roberto Lopez (apud FRANCO Júnior, 2004, p. 60):
Foi, sobretudo, devido à sua desorganização e à sua pobreza de raiz que 
a Europa invertebrada do século X pôde resistir melhor às invasões do 
que o Império Romano do século V. Em parte nenhuma havia centros 
vitais, artérias principais ou núcleos econômicos cuja perda pudesse 
levar ao desmoronamento de toda uma província. Para destruir uma 
a uma tantas células minúsculas, fora preciso um plano de ação e uma 
continuidade de desígnio que os agressores não possuíam.
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
171
Assim, na visão de Hilário Franco Jr. (2004, p. 62), “o feudalismo, do ponto 
de vista político, representava uma pulverização do poder que respondia melhor 
às necessidades de uma sociedade saída do fracasso de uma tentativa unitária 
(Império Carolíngio) e pressionada por inimigos externos (vikings e magiares)”.
4.3 EM RESUMO
Em resumo, as explicações mais tradicionais atribuem sua origem a, pelo 
menos, três causas:
1. Durante a crise do Império Romano, o modelo de distribuição de terras aos 
colonos favorecia a concentração de terras nas mãos de poucos e forçava os 
despossuídos a buscarem a proteção deles para garantir sua segurança.
2. Os povos germânicos invasores recebiam terras dentro do Império Romano 
e dividiam-nas entre os descendentes quando da morte do chefe. Isso teria 
favorecido a desagregação dos territórios. Isso teria sido ligeiramente revertido 
nos reinados de Carlos Magno e de seus netos, mas, após suas mortes, o reino 
franco começou lentamente a se desagregar, também pelo costume de dividir as 
terras.
3. Novas invasões nos séculos VIII a X, especialmente dos normandos (vikings), 
aterrorizaram novamente os europeus, como havia acontecido no final do 
Império Romano, tanto pelo rastro de destruição que deixavam como pela 
necessidade de buscar proteção contra eles. Qualquer possível movimento de 
retorno às cidades teria sido revertido nesse momento, enquanto durassem as 
ameaças.
5 FUGINDO AO ESQUEMA
O modelo clássico de feudalismo usado para se pensar a Idade Média, 
juntamente com os complementos trazidos pela perspectiva marxista, ainda é o 
mais comum nos manuais escolares, especialmente no Brasil. Isso é lamentável, 
porque essa perspectiva tem sido contestada há muitas décadas na Europa, pelo 
menos desde Marc Bloch. 
A contribuição dos historiadores da Escola dos Annales tem sido muito 
importante na criação de uma perspectiva inovadora sobre a Idade Média, um dos 
temas mais caros à historiografia francesa do século XX. Mas, se de um lado, esse 
“revisionismo histórico” tem progredido bastante nas últimas décadas, a ponto 
de se chegar, como já observamos, a questionar a própria validade do conceito 
de feudalismo, essas “novas” interpretações ainda precisam ser incorporadas 
pelos nossos sistemas de ensino. Infelizmente, não há motivos para crer que no 
centésimo aniversário do livro de Bloch a perspectiva sobre o feudalismo que ele 
desmonta seja já, em nossas escolas, coisa do passado.
172
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
SUGESTÃO DE LEITURA
A literatura sobre a Idade Média é vastíssima. Citamos aqui algumas das obras mais clássicas 
sobre o tema:
● ANDERSON, Perry. Passagens da Antiguidade ao Feudalismo. São Paulo: Brasiliense, 1985.
● DUBY, Georges. A Europa na Idade Média. São Paulo: Martins Fontes, 1988.
● LE GOFF, Jacques. Para um novo conceito de Idade Média: tempo, trabalho e cultura no 
Ocidente. São Paulo: Estampa, 1993.
● PERNOUD, Régine. O Mito da Idade Média. Lisboa: Europa-América, 1990. 
● WOLFF, Philippe. Outono da Idade Média ou Primavera dos Tempos Modernos? São Paulo: 
Martins Fontes, 1988. 
Todos os autores relacionados são medievalistas, ou seja, fizeram suas carreiras acadêmicas 
estudando a Idade Média. Portanto, praticamente todas as suas obras são relacionadas ao tema, 
e são excepcionais fontes de consulta.
5.1 REVENDO CONCEITOS
A região que viu surgir o feudalismo era herdeira dos reinos germânicos 
que pulverizaram a autoridade do Estado após a queda do Império Romano do 
Ocidente. Não era uma sociedade de fartura, embora não fosse necessariamente 
inferior, em termos econômicos e sociais, à do final da Antiguidade. 
A produção agrícola era ineficiente; as rudimentares técnicas de cultivo 
do campo disponíveis na época não permitiam uma produção em escala 
grande o suficiente. Uma das técnicas modernas mais eficientes para garantir a 
manutenção da fertilidade do solo – a rotação de culturas – limitava-se, na época, 
a deixar-se parte do terreno em abandono por um ano, e não havia uma rotação 
sistemática. Os campos eram deixados livres(em pousio) aleatoriamente, o que 
favorecia muito mais o crescimento das ervas daninhas do que dos alimentos.
5.2 AS COMUNICAÇÕES
“As comunicações também eram precárias: as estradas romanas – que 
não eram tão bem construídas como se costuma imaginar” (BLOCH, 1982, p. 
61) careciam de manutenção há séculos e estavam interrompidas por trechos 
destruídos, pontes que se desfizeram e bandos de salteadores em todos os lugares. 
Eram rotas lentas – até a criação do trem, no século XIX, o transporte 
aquático era várias vezes mais rápido – e inseguras, mas mantinham-se abertas 
UNI
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
173
5.1 REVENDO CONCEITOS
5.2 AS COMUNICAÇÕES
e eram constantemente usadas. Reis, príncipes e outros líderes políticos eram 
forçados a utilizá-las para visitar seus domínios: comerciantes precisavam delas 
para transportar suas mercadorias antes que estragassem, cavaleiros passavam por 
elas em busca de um senhor para honrar, um feudo vago para comandar ou atos 
de bravura que pudessem ser executados para elevar sua reputação. Peregrinos 
visitavam os lugares sagrados, correndo sérios riscos de serem mortos no caminho, 
e miseráveis fugiam da fome, das guerras ou das doenças migrando de uma região 
a outra.
AUTOATIVIDADE
Prezado(a) acadêmico(a), você não acha que fica bem mais fácil perceber, 
a partir dessa “visualização de dentro” da sociedade do início da Idade Média, 
as razões pelas quais o Estado era descentralizado e o comércio era fraco na 
Europa? A que você pode atribuir a diferença entre essa situação e os períodos 
posteriores (Idade Moderna) e, principalmente, anteriores (Idade Antiga)? 
5.3 A ECONOMIA
É equivocado dizer que “não existia dinheiro na Europa feudal”; havia uma 
relativa quantidade, que era importante para manter o comércio irregular que existia 
por toda a parte. A ideia da autossuficiência dos feudos é ilusória; não era possível 
produzir, em todos os lugares, os cereais, vinho, laticínios e outros produtos em 
quantidade e qualidade suficiente para alimentar a todos. 
Sal e ferro precisavam ser trazidos de fora na maior parte das regiões. Tudo 
isso requeria dinheiro ou trocas em espécie quando possível – o que não era tão 
frequente quanto se acredita.
 
Mas é justamente essa irregularidade o que impedia a formação de um 
mercado dinâmico e com trocas significativas, como o que temos hoje; não havia 
motivação e, consequentemente, não se desenvolviam as condições técnicas - para 
produção em grande escala de produtos que pudessem ser vendidos. 
Por esse motivo, mesmo os mais ricos não tinham recursos suficientes para 
conseguir planejar seus negócios e garantir sua segurança por longo tempo, e 
viviam pouco melhor do que os camponeses. Boa parte do ouro que existia escoava 
lentamente para os domínios bizantinos e muçulmanos, levados por comerciantes 
que traziam aos senhores alguns poucos luxos ou produtos necessários. 
174
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
REFLETINDO...
- Quer dizer, então, que tudo o que estudamos sobre Idade Média está errado? Que essa não 
era uma época em que o comércio desapareceu, em que senhores ricos e poderosos só se 
preocupavam em fazer guerra e explorar seus servos, em que as pessoas nunca na vida saíam de 
seu pequeno feudo autossuficiente?
- Sim e não. Digamos que essa visão é exagerada e esquemática. Havia comércio, transportes, 
comunicações, desenvolvimento técnico, poder real etc.; mas em escala dramaticamente menor 
do que temos hoje. Essa diferença de escala é fundamental: ao contrário do dinamismo econômico 
da Idade Moderna, a economia medieval era estagnada e irregular – o que é diferente de dizer que 
não existia nada.
5.4 A NATUREZA E O TEMPO MEDIEVAIS
As populações medievais tinham um contato mais direto com a natureza, 
em comparação a seus herdeiros modernos. Animais selvagens rondavam os 
feudos e, muitas vezes, circulavam em meio a eles. Eram, inclusive, fonte de 
alimento com frequência. Os abrigos e construções precárias tornavam as pessoas 
muito mais vulneráveis em caso de intempéries: sofria-se muito mais com a chuva, 
o calor e a neve. As noites, é claro, dependiam da fraca luminosidade da Lua; era 
certamente mais perigoso do que hoje enfrentar o ambiente em qualquer situação. 
Em vista da elevada mortalidade infantil, das frequentes doenças, da 
limitada noção de higiene e das duras condições de vida em geral, 40 ou 50 anos 
era já uma idade avançada – e os raros afortunados que chegavam até lá certamente 
pareciam, inclusive fisicamente, respeitáveis anciãos.
Não que, na maioria dos casos, as pessoas fossem capazes de comemorar 
os próprios aniversários. O ritmo lento da Idade Média levava a uma imprecisão 
na contagem do tempo. Mesmo diante da necessidade de manter alguns registros, 
como a duração dos reinados, muitas vezes não era possível chegar-se a valores 
muito exatos. 
O fato é que os equipamentos de medição precisa do tempo eram caros e, 
para uma sociedade que não se pautava pela produtividade industrial (mas pelos 
ciclos das estações), desnecessários em praticamente qualquer situação.
6 O AUGE DO FEUDALISMO
Apesar dos esforços de reis e papas para constituir domínios políticos, 
como o Império Carolíngio e o Sacro Império Romano-Germânico, a tendência era 
muito mais à desagregação política do que à unidade territorial. Os chefes locais, 
sustentados pela lealdade de seus vassalos, sentiam-se fortes o suficiente para recusar 
a autoridade real, e mantinham seus próprios domínios da forma como podiam. 
UNI
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
175
5.4 A NATUREZA E O TEMPO MEDIEVAIS
6 O AUGE DO FEUDALISMO
O comércio, embora existente em pequena escala, não era expressivo a 
ponto de se constituir em uma das atividades econômicas mais relevantes. Os 
servos não podiam esperar de seus senhores uma segurança muito efetiva contra 
os ataques de bárbaros e outros senhores, ainda que os laços feudais obrigassem 
os senhores a tal. 
Se levarmos em consideração, ainda, as precaríssimas condições de vida de 
todos, servos em especial, podemos concluir que a vida no início da Idade Média 
era muito difícil.
Tudo isso começou a mudar por volta do ano 1000, ainda que lentamente 
e de forma desigual. A Europa ocidental do início do II Milênio era, certamente, 
uma sociedade em transformação. Após séculos de desordem política e econômica 
– causada, como já vimos, pela crise do escravismo e da produção agrícola no 
período pós-romano e pela interminável sucessão de invasões de povos nômades 
(“bárbaros”) –, a sociedade recuperava agora sua estabilidade e retomava o 
crescimento demográfico e econômico. Por volta do ano 1000, a Europa lentamente 
despertava suas forças vitais, após séculos de insegurança social, precariedade 
técnica e dogmatismo intelectual.
FIGURA 40 – CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO DA EUROPA OCIDENTAL, 1000-1500.
FONTE: Adaptado de Franco Jr., Hilário (2004, p. 56)
O primeiro passo neste processo de reintegração político-econômica 
e sociocultural foi a recuperação demográfica do continente após a migração 
dos povos “bárbaros”. O fim das invasões dos vikings e de outros povos e sua 
incorporação ao próprio mundo feudal trouxe de volta segurança, mesmo que 
apenas contra invasores externos: internamente, o mundo feudal continuava 
assolado por conflitos intermináveis entre os senhores. Aos poucos, essa 
recuperação trouxe consequências sociais e econômicas profundas para toda a 
sociedade europeia ocidental, como veremos neste tópico.
176
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
6.1 O FIM DAS INVASÕES BÁRBARAS
O que se chama, geralmente, de “invasões bárbaras” foi um longo processo 
de migração dos povos germânicos e eslavos em direção ao Oeste, que se iniciou no 
século III (ou talvez ainda antes) e só terminou no século IX-X, com a sedentarização 
e cristianização dos últimos desses grupos “invasores”: os vikings e os magiares 
(húngaros).
Com o fim das invasões, as tensões do sistema feudal se estabilizaram. A 
guerra mudou de característica:já não envolvia grandes grupos de combatentes 
anônimos, mas sim pequenos grupos de guerreiros de elite. 
Prevaleciam as ações individuais dos guerreiros, e não uma ação coletiva 
coordenada. Apesar dos laços de vassalagem e de parentesco, uma luta entre dois 
grupos de nobres feudais envolvia, geralmente, poucas dezenas de guerreiros, 
raramente algumas centenas, pois como lembra Hilário Franco Júnior (2004, p. 
18.), “o objetivo deste tipo de confronto não era a aniquilação do adversário, mas 
sim a sua captura para cobrança de um resgate cujo rendimento era proporcional 
à importância do prisioneiro”.
Este processo de estabilização e pacificação funcionou também como 
diluidor e amenizador do deslocamento de bactérias, contribuindo assim para um 
considerável recuo das epidemias e pestes. Estes fatores combinados contribuíram 
para um paulatino, mas constante, aumento da população da Europa Ocidental a 
partir do século X.
As inovações agrícolas fizeram a população da Europa, que havia 
diminuído nos séculos de calamidade, voltar a crescer; isso gerou uma pressão 
populacional e social muito grande nos feudos. Já não era mais possível, em alguns 
casos, distribuir partes do feudo a cada filho; o mais velho passou a herdar sozinho 
a propriedade.
6.2 A PRIMOGENITURA
A pressão exercida por este aumento de população sobre a estrutura 
fundiária, já excessivamente fragmentada, levou alguns clãs senhoriais a adotar 
uma medida extrema para evitar uma descendênciamiserável: a escolha de 
apenas um dos filhos varões para herdar a propriedade. Adotada por todos os 
clãs em situação de análoga perda de prestígio, esta prática paulatinamente se 
generalizou, transformando-se por força do costume, na Lei Consuetudinária da 
primogenitura. A partir de então, os filhos não herdeiros dos diversos clãs que 
adotaram a primogenitura vieram a constituir-se num excesso social de população 
não absorvida por aquela estrutura fundiária.
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
177
6.1 O FIM DAS INVASÕES BÁRBARAS
Direito de primogenitura significa que: apenas o primeiro filho herdaria a 
propriedade como um todo e seus irmãos não teriam direito a nada ou estariam submetidos 
ao mais velho. Essa prática contrariava a tradição germânica que, como você talvez se 
lembre, dividia os territórios entre todos os filhos. Foi, como você pode imaginar, uma medida 
desesperada que os senhores feudais tomaram para evitar que suas propriedades, já pequenas 
depois de séculos de fragmentação, se tornassem diminutas demais para sustentar até mesmo 
uma família senhorial e seus servos. 
Com isso, surgiu uma enorme quantidade de nobres sem terra (ou seja, 
sem vassalos e, logo, sem poder nem meios de sustento), que tentavam encontrar 
alguma forma de se inserirem na sociedade, como: religiosos, vassalos de algum 
senhor mais poderoso ou pretendentes a ocupar algum feudo sem senhor. Isso 
gerou uma transformação radical na sociedade, pois colocou os nobres em posições 
sociais muito distintas. É por causa disso que surgiram os códigos de cavalaria, de 
comportamento (etiqueta), de amor cortês etc.
Estes nobres sem terra – filhos “segundogênitos” dos clãs mais empobrecidos 
– deviam permanecer celibatários, uma vez que, sem terras e sem vassalos, não 
podiam legar aos filhos uma descendência digna. Esta situação devia lhes parecer 
desonrosa, pois, como nobres herdeiros de uma longa genealogia, não podiam 
legar o nome da família aos filhos. A condição que lhes faltava era a terra. 
A mesma pressão foi exercida sobre a população servil dos camponeses, 
que se viam sem condições de manter o crescente número de filhos com a pequena 
porção de terras que possuíam dentro dos velhos feudos. E como, entre os servos, 
a primogenitura não era adotada, a miséria e a fome eram uma ameaça sempre 
presente a empurrá-los em busca de novas oportunidades. Em vista disso, estes 
homens vão se constituir num exército de reserva, ávidos por conquistar para si 
novas glebas de terra onde pudessem dar continuidade às tradições familiares.
Caro(a) acadêmico(a), mais adiante você verá como estes nobres sem terra serão 
importantes para o processo conhecido como CRUZADAS. Você também verá como eles, 
constituindo-se em cavaleiros, serão imprescindíveis para a formação das CORTES MEDIEVAIS, 
após o término do período cruzadista.
NOTA
ESTUDOS FU
TUROS
178
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
6.3 A PRESSÃO ECONÔMICA
O aumento populacional gerava, também, uma maior oferta de produtos 
agrícolas e também uma maior demanda por produtos vindos de fora. Você se 
lembra de que dissemos que eram raros os feudos em que se podia obter sal e 
ferro? Embora a grande maioria dos equipamentos agrícolas fosse mais rudimentar 
(os arados eram de madeira) e a comida não costumasse ser temperada, todos 
poderiam precisar, em maior ou menor medida, dessas substâncias. Isso abria 
a possibilidade do ressurgimento do comércio de larga escala, que exigia rotas 
seguras e alguma centralização política para prosperar. Por isso, os comerciantes 
financiavam os senhores mais poderosos e, em troca, recebiam as condições que 
desejavam para realizarem suas atividades.
6.4 A EXPANSÃO INTERNA DA SOCIEDADE
Este aumento da população provocou, entre outros fatores, um acentuado 
movimento migratório para o desbravamento de novas áreas de cultivo em terras 
antes improdutivas, florestas e pântanos. Já se observou que - por questão de 
logística - desde a antiguidade, fazendas, vilas e cidades fundadas por romanos 
margeavam rios, lagos ou mares. Esta tendência manteve-se na Idade Média. 
Contudo, com a interiorização verificada na sociedade medieval a partir do século 
X, uma pressão cada vez mais acentuada passou a ser exercida sobre a necessidade 
de transporte terrestre e outras formas de força motriz.
Por volta do século XI, já havia sido introduzido um sistema de atrelagem 
que permitiu um melhor aproveitamento da tração animal, aumentando o 
rendimento do trabalho. Tal inovação, que compreendia novos sistemas de arreios 
e a atrelagem de vários animais em linha, tornou possível também a utilização do 
cavalo, mais veloz que o boi, como animal de tração, para o transporte e atividades 
agrícolas.
Foi neste momento que surgiram a ferradura, a carroça, o arado com rodas, 
as estradas de cascalho e, finalmente, os moinhos (d’água e de vento) assumem a 
importância que não tinham na Antiguidade. Além disso, ao Ocidente medieval 
deve-se ainda a difusão e o aperfeiçoamento de uma série de mecanismos, tais 
como o parafuso, a roda, a catraca, a engrenagem e a polia. Por outro lado, a 
construção de igrejas e castelos levou ao desenvolvimento de roldanas e guindastes 
rudimentares.
Estes melhoramentos técnicos foram acompanhados de uma verdadeira 
revolução na agricultura: a introdução do sistema trienal de rotação de culturas. 
Esse sistema consistia, essencialmente, em dividir o terreno em três ou mais partes 
e cultivar cada parte com um produto diferente, deixando-se sempre uma das 
áreas em repouso.
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
179
No ano seguinte, as culturas seriam alternadas. A parte que ficara em 
repouso seria novamente cultivada e uma área que havia sido cultivada por alguns 
anos seria agora deixada “em pousio”. Tal sistema permitia ultrapassar o rápido 
esgotamento do solo, com considerável aumento da produtividade, pois, “ao se 
dividir a área cultivável em três partes, não só se ampliava a extensão efetivamente 
produtiva (66% contra 50% do sistema bienal), como ainda se tinha a segurança de 
duas colheitas anuais”. (FRANCO JÚNIOR, 2004, p. 34). 
Recomendações de filmes
Caro(a) acadêmico(a)! Sobre os assuntos tratados neste tópico, existem alguns bons filmes 
onde você poderá encontrar, além de diversão, conhecimento.
● EL CID, de 1961, dirigido por Anthonny Mann, com Charlton Heston e Sophia Loren.
● O Incrível Exército de Brancaleone, de 1966, dirigido por Mário Monicelli, com Vittorio 
Gassman.
● Cruzada, de 2004, dirigido por Ridley Scott com OrlandoBloom, Jeremy Irons e Liam Neeson.
Em uma série de diálogos com o historiador Jean-Maurice de Montrémy, 
Jacques Le Goff descreveu, em linguagem informal, diversos aspectos de sua 
concepção sobre Idade Média. Transcrevemos, aqui, o trecho em que ele fala sobre 
o feudalismo e a “feudalidade”.
DICAS
180
UNIDADE 2 | O MUNDO DAS SOCIEDADES TEOCRÁTICAS
LEITURA COMPLEMENTAR
EM BUSCA DA IDADE MÉDIA
 
Jacques Le Goff
Entre as “redes que se vão constituindo”, o senhor citou a das senhorias. Raramente 
o senhor emprega a palavra feudal, entretanto tão comum.
Como você já viu, muitas palavras de que nos utilizamos para qualificar 
a Idade Média são de criação recente. Religião, no sentido em que a entendemos, 
aparece no século XIV, Feudalidade aparece no século XVII e Cruzada no século XVIII... 
Isso não me impede de usar essas palavras e de introduzir outras nesse contexto, 
também elas “anacrônicas”, como intelectuais, Senhoria, mais perto das concepções 
e da linguagem da época.
A Idade Média – Georges Duby o lembrou de modo magnífico – repousa 
sobre a terra. A Idade Média é rural. É sobre essa ruralidade que se articula o 
conjunto das outras redes.
No início, existia um conjunto de domínios romanos: as villae (vejam-se 
todos os nomes em ville da toponímia francesa). Por volta do ano mil, essas villae 
se estruturam de modo diferente. Fica clara a existência de duas entidades. Muitas 
casas de agricultores ou de artesãos ligados aos consertos e aos fornecimentos 
constituem, por um lado, uma cidade. Por outro lado, um lugar forte se especializa 
na proteção e nas pequenas formas de arbitragem: a senhoria.
A aldeia no século XI tem um centro: a igreja. Anexo a ela, o cemitério, uma 
vez que os mortos devem ficar o mais perto possível do ou dos santos padroeiros. 
Na aldeia, nem todos os habitantes são agricultores. Os artesãos nela representam 
uma força social importante. São os “galos da aldeia” ou, se preferir, os notáveis 
entre as pessoas menores, que deixaram sua marca nos nomes de família. Assim 
é em relação aos moleiros: Meunier, Müller, Miller... Ou quanto aos ferreiros: Le 
Faivre, Lefèvre, Faber, Smith, Schmidt, etc., ou Le Goff, no dialeto bretão!
Durante o século XI também se desenvolve um fenômeno a que Pierre 
Toubert denominou incastellamento (o encastelamento, se assim podemos dizer), 
tendo como referência a Itália, e que Robert Frossier descreve como o enclausuramento. 
A falência do modelo imperial, a ausência de poderes centralizadores fortes (as 
monarquias ainda são uma incerteza) favorecem o recurso aos superiores, sejam 
os que residem na cidade, como na Itália, sejam os que vivem no campo, como na 
França ou na Inglaterra. 
TÓPICO 4 | O FEUDALISMO
181
É em volta deles que se reúnem, em caso de necessidade, homens, animais, 
colheitas e instrumentos de trabalho. As cidades se fortificam. Os campos assistem 
ao aparecimento de pequenos outeiros naturais ou artificiais fortificados, depois 
torreões ou castelos fortes. Assim se firma a senhoria que exprime bem a função 
exercida: dominação, autoridade.
O senhor inferior, em contrapartida a serviços prestados a um superior, 
recebe um benefício, um feudo. Essa palavra, de origem germânica, designa a doação 
ou a contradoação que as partes trocam no termo de um conflito. Estão implícitos, 
portanto, pontos de troca. Sendo própria dos senhores a tendência, como entre os 
modernos chefes de empresa, de transmitir o feudo a seus filhos, o feudo se torna, 
progressivamente, sinônimo de domínio territorial ou de cobrança hereditária de 
foros. Os feudos se transformam em objeto de absorção ou partilha entre os senhores, 
o que supõe conflitos, eventualmente conflitos armados. Desenvolve-se a seguir 
em torno desses lugares sociais uma perfeita ideologia, até uma mística cavaleirosa 
entre os senhores e seus súditos, ou entre os senhores e os outros senhores vassalos.
Observemos apenas que o sistema de feudos, a feudalidade, não é, como se tem 
dito frequentemente, um fermento de destruição do poder. A feudalidade surge, ao 
contrário, para responder aos poderes vacantes. Forma a unidade de base de uma 
profunda reorganização dos sistemas de autoridade, o quadro indispensável ao 
aparecimento dos Estados. A feudalidade conhece seu grande período do século X 
ao século XIII. Ao contrário da senhoria – que a precede e que persiste depois dela –, 
a feudalidade, em sentido estrito, não se identifica com o conjunto da Idade Média.
FONTE: LE GOFF, Jacques. Em busca da Idade Média. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011, 
p. 156-159.
182
RESUMO DO TÓPICO 4
Neste tópico você viu que:
 O conceito de “feudalismo”, como sistema político, econômico e social, não 
existia na Idade Média; foi construído pelos historiadores, especialmente a 
partir do século XVI.
 A interpretação clássica sobre o feudalismo foi mantida, com poucas 
modificações, até o século XX.
 O marxismo ampliou a perspectiva sobre o feudalismo, ao percebê-lo como um 
modo de produção específico, mas não questionou o conceito em si.
 Na década de 1970 surgiram críticas ao conceito, considerado então inadequado, 
para descrever a estrutura política, jurídica, social e econômica da Idade Média.
 Na descrição do modelo clássico de feudalismo, os elementos mais importantes 
são a homenagem, a vassalagem, a servidão, as obrigações servis e a economia 
natural.
 O feudalismo teria surgido a partir de elementos romanos e germânicos, e se 
consolidado após o esfacelamento do Império Carolíngio.
 Ao estudarmos a Idade Média e o feudalismo, em particular, precisamos ter em 
mente que o conceito é uma simplificação, e que ele não dá conta de descrever 
adequadamente, por si só, o que foi esse período.
 Depois do longo processo de invasões bárbaras (do século III ao século IX), as 
tensões do sistema feudal se estabilizaram.
 Os níveis de violência diminuíram, a pacificação contribuiu para a diminuição da 
circulação de doenças e epidemias e a população começou a crescer rapidamente 
a partir do ano 1000.
 O aumento da população exerceu pressão sobre a estrutura fundiária e a 
excessiva fragmentação das propriedades fez com que os clãs mais empobrecidos 
adotassem o costume da primogenitura.
 A paulatina adoção da primogenitura lançou no desamparo os filhos 
“segundogênitos” de muitos clãs que, junto com o excesso de população servil, 
promoveram uma expansão interna da sociedade, em direção ao interior da 
Europa.
183
	Este processo de expansão criou novas necessidades que revolucionaram os 
métodos de trabalho e aumentaram a produtividade da economia medieval, 
sustentando, assim, o crescimento demográfico.
184
Prezado(a) acadêmico(a)! Após você ter lido todo esse tópico, 
elaboramos algumas questões que servirão como uma espécie de roteiro para 
que você possa rever as principais ideias sobre o feudalismo e a expansão 
demográfica na Europa. 
1 Explique o papel dos francos na formação do feudalismo.
2 Quais as causas da recuperação demográfica da Europa Ocidental a partir 
do século X?
3 Por que a primogenitura, como critério de sucessão, passou a ser adotada 
na Europa medieval?
4 O que foi a expansão interna da sociedade, e quais as suas consequências?
AUTOATIVIDADE
Assista ao vídeo de
resolução da questão 3
185
UNIDADE 3
A ERA DAS GRANDES 
TRANSFORMAÇÕES
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
A partir desta unidade você será capaz de:
• caracterizar o século XI como o início de um processo de profundas trans-
formações na sociedade europeia, dos pontos de vista cultural, político e 
religioso;
• reconhecer a importância de eventos externos à Europa, como as invasões 
mongólicas, na transformação da sociedade europeia do final da Idade 
Média;
• identificar, na dinâmica do processo de feudalização e de seu refluxo, os 
fatores que levaram à expansão interna e externa da sociedade europeia a 
partir do séculoXI;
• compreender como ocorreu o renascimento comercial e urbano do final 
da Idade Média e sua importância como elemento transformador das rela-
ções sociais e econômicas;
• entender o renascimento cultural do século XII e os fatores que propicia-
ram seu surgimento e identificar a importância desse movimento para os 
períodos seguintes;
• perceber, nos conflitos entre as cortes medievais e os senhores feudais, 
entre o papado e o Sacro Império, e entre os estados nacionais e o poder 
da Igreja, os elementos de disputa política em curso na Europa do final da 
Idade Média.
Esta unidade está dividida em cinco tópicos. No decorrer e no final de cada 
um deles você encontrará atividades que contribuirão para sua reflexão e 
análise dos conteúdos adquiridos.
TÓPICO 1 – AS TRANSFORMAÇÕES DO SÉCULO XI E AS CRUZADAS
TÓPICO 2 – AS CONQUISTAS MONGÓLICAS
TÓPICO 3 – A IGREJA E A CULTURA NA BAIXA IDADE MÉDIA
TÓPICO 4 – O RENASCIMENTO COMERCIAL E URBANO
TÓPICO 5 – AS CORTES MEDIEVAIS
Assista ao vídeo 
desta unidade.
186
187
TÓPICO 1
AS TRANSFORMAÇÕES DO SÉCULO XI E AS 
CRUZADAS
UNIDADE 3
1 INTRODUÇÃO
Como vimos, quando terminaram as invasões, a Europa foi envolvida por 
um período de relativa tranquilidade militar, e a pouca mobilidade serviu como 
inibidor da propagação de epidemias. Nestas circunstâncias, houve um grande 
aumento populacional no continente. Como a estrutura do sistema feudal não 
incorporava essa nova população, houve uma expansão interna da sociedade em 
direção a áreas antes improdutivas, como pântanos e florestas.
Mas a pressão populacional e social ameaçava tornar-se insuportável. 
Ao mesmo tempo, um misto de controvérsias religiosas, “demagogia” política, 
oportunismo comercial e fervor religioso da população concorreram para dar 
origem a um dos movimentos mais intrigantes da história: as Cruzadas.
2 AS ORIGENS HISTÓRICAS DAS CRUZADAS
2.1 O SÉCULO XI, PERÍODO DE CONQUISTAS
O período correspondente ao século XI foi de grande movimento 
expansionista, na Europa e na Ásia. Conquistas territoriais no ocidente e novas 
migrações de povos no oriente modificaram mais uma vez o panorama político 
mundial e opuseram diversas vezes cristãos e muçulmanos. Enquanto a sociedade 
medieval se interiorizava, outros processos paralelos faziam com que aquele 
excesso social de população se movesse em direção à conquista de terras além das 
fronteiras da Cristandade Latina. Embora as terras ocupadas pelo Islã na Europa 
fossem o alvo principal, este processo expansionista também atingiu a Inglaterra e 
as terras ocupadas por eslavos ortodoxos, a leste do Elba.
2.1.1 Os turcos seljúcidas
O primeiro dos grandes movimentos de conquista ocorreu na região da 
Anatólia (atual Turquia asiática), aonde os turcos chegaram após atravessarem 
o Irã. Em 1040, os turcos seljúcidas se estabelecem na Pérsia como mercenários 
a serviço do Califado Abássida de Bagdá. Assimilaram a religião muçulmana e 
conquistaram a hegemonia política quando, em 1058, reduziram as atribuições do 
Califa à liderança religiosa enquanto que o governo efetivo passou para as mãos 
do Sultão – título do monarca turco.
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
188
FIGURA 41 - MAPA MOSTRANDO A EXTENSÃO DOS DOMÍNIOS DO CALIFADO FATÍMIDA (MAIS 
ESCURO), DOS TURCOS SELJÚCIDAS (TOM INTERMEDIÁRIO) E DO IMPÉRIO 
BIZANTINO (MAIS CLARO) EM 1100 
FONTE: Disponível em: <http://www.ucalgary.ca/HIST/tutor/imageislam/seljuk1100.gif> Acesso 
em: 22 de out. 2012.
Com o fervor de povos recém-convertidos, os turcos lançaram uma ofensiva 
contra o Império Bizantino e, em 1071, conseguiram conquistar a Ásia Menor. A 
seguir, atacaram o Califado Fatímida do Cairo e se apoderaram dos Emirados 
da Síria e Alepo. Capturaram Jerusalém em 1078. Se os antigos Califas e Emires 
árabes mantinham a antiga tradição muçulmana de tolerância aos povos do Livro 
– Judeus e Cristãos – os neófilos turcos mostraram-se mais intransigentes na defesa 
da fé, proibiram as peregrinações cristãs em seu território recém-conquistado.
2.1.2 Os primeiros tempos da reconquista ibérica
Na Península Ibérica, desde o início da ocupação árabe, a resistência cristã 
buscava retomar o controle da região. As campanhas vitoriosas eram seguidas de 
um processo de colonização por cristãos, estendendo aos poucos os reinos ibéricos 
para o Sul. O Califado de Córdoba, sob a dinastia omíada, caiu com a morte do 
califa Al-Mansur em 1002, e deu lugar a dezenas de pequenos reinos (Taifas), cuja 
desunião facilitava o avanço cristão sobre Al-Andalus. Os cavaleiros cristãos, sob o 
comando de Alfonso VI, reconquistaram Toledo em 1085.
TÓPICO 1 | AS TRANSFORMAÇÕES DO SÉCULO XI E AS CRUZADAS
189
 FIGURA 42 – A RECONQUISTA DA PENÍNSULA IBÉRICA
FONTE: Disponível em: <https://historia-no-vestibular.wikispaces.com/1.2+-+Forma%C3%A7%C3
%A3o+dos+Estados+Nacionais>. Acesso em: 14 mar. 2013.
Para barrar o avanço cristão e unificar as taifas, a dinastia berbere dos 
Almorávidas, estabelecida no Marrocos, invadiu a região e ocupou o sul da 
península. Seus exércitos foram vitoriosos até 1094, quando os cristãos, sob o 
comando de El Cid, conquistaram Valência. No ano seguinte, o conde Henrique de 
Borgonha toma posse do condado de Portucale, na costa do Mar Oceano (Oceano 
Atlântico), e seus domínios darão origem a Portugal.
2.1.3 As conquistas normandas
Os normandos (palavra de origem escandinava que significa “homens do 
norte”) surgiram a partir das invasões dos temíveis vikings às regiões da França, 
onde se sedentarizaram e estabeleceram o ducado da Normandia (912). De lá, 
UNIDADE 3 | A ERA DAS GRANDES TRANSFORMAÇÕES
190
os normandos espalharam-se por diversas regiões da Europa com um ímpeto 
avassalador. Em 1066, o duque William II (Guilherme, o Conquistador) derrotou o 
rei anglo-saxão Harold e foi coroado rei da Inglaterra; iniciou-se assim a influência 
normanda da Grã-Bretanha. Na Itália, os normandos auxiliaram a reconquista das 
regiões da Sicília e do sul da península Itálica, então sob o comando muçulmano – 
Palermo finalmente caiu em 1072.
Repare você, caro(a) acadêmico(a), que todos estes eventos são anteriores à data 
oficial que tradicionalmente marca o início das Cruzadas no Concílio de Clermont-Ferrand em 
1095. Na Europa, apenas o avanço a Leste dos cavaleiros teutônicos sobre os eslavos ortodoxos 
das planícies polonesas e das margens do Báltico pode ser considerado posterior, uma vez que 
apenas em 1193, a cruzada do Báltico foi legitimada pelo Papa Celestino III.
2.2 A CRISE NA IGREJA NO SÉCULO XI
Em fins do século XI, a Igreja Católica tinha atravessado um difícil momento. 
O Grande cisma de 1054 havia separado definitivamente o Culto Católico Latino 
do Ortodoxo Grego. Reagindo a esta tendência desagregadora, o Papa Gregório 
VII (1020-1085) procurou diminuir a autonomia dos bispos, centralizando em 
Roma todas as questões importantes da Igreja. Propôs a reforma do calendário, 
atacou a simonia (compra de cargos eclesiásticos) e o nicolaísmo (concubinato ou 
casamento dos padres). Na sua luta por reformar a cristandade latina e consolidar 
a supremacia papal sobre os poderes temporais, envolveu-se na questão das 
investiduras com Henrique IV – Imperador do Sacro Império. Embora tenha 
vencido moralmente Henrique IV, atraiu muitos inimigos na aristocracia romana 
e teve de fugir de Roma, morrendo no exílio em 1085. O trono papal permaneceu 
vago por quase três anos.
Analisaremos melhor a crise e as reformas da Igreja do século XI no Tópico 3 desta 
unidade.
NOTA
ESTUDOS FU
TUROS
TÓPICO 1 | AS TRANSFORMAÇÕES DO SÉCULO XI E AS CRUZADAS
191
2.2 A CRISE NA IGREJA NO SÉCULO XI
2.3 A ECONOMIA EUROPEIA NO SÉCULO XI
O período por volta do ano 1000, como já vimos, marcou uma transformação 
econômica e social em boa parte da Europa ocidental. O fim das invasões e 
o desenvolvimento de tecnologias agrícolas mais eficientes permitiram uma 
melhoria da produtividade e um consequente aumento populacional. Os europeus 
do século XI desfrutavam,

Mais conteúdos dessa disciplina