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HISTÓRIA MODERNA AULA 6 Profª Lorena Zomer 2 CONVERSA INICIAL A palavra cidadania é conhecida pela nossa sociedade, pois ela faz parte de nossa constituição e, portanto, dos nossos direitos e deveres como pessoas que vivem na nação brasileira. Temas como o direito à liberdade de pensamento, o direito à liberdade de expressão e associação, o estado laico e representantivo são recorrentes nas discussões políticas e sociais de nosso contexto, cujo objetivo maior é dar dignidade aos brasileiros. E estes estão relacionados também à Revolução Francesa (e à Tomada da Bastilha em 14 de julho de 1789), embora este seja um acontecimento de outro local. O que tem em comum com a realidade brasileira é o marco temporal que representa, visto que a ideia de revolução política e social cristalizou outras perspectivas de organização para o mundo ocidental ao longo dos últimos dois séculos. A pintura abaixo é de Eugène Delacroix e representa esse processo: Figura 1 – Delacroix, E. A Liberdade guiando o povo, 1830. Museu do Louvre. Crédito: CC-PD É possível observar inúmeros cadáveres abaixo da liberdade, esta como uma alegoria de uma deusa. Considerem ainda que para que ela fosse conquistada as mortes foram necessárias. O mastro com a bandeira na mão está com a liberdade, uma república (mais tarde) que se ergueria em nome da igualdade de todos. 3 Apesar de a liberdade parecer um aspecto natural para o cotidiano das sociedades do século XXI, ela é o principal elemento na tela e de reivindicação desse processo político e era também desconhecida pelas massas. Isso porque, até aquele período, as desigualdades sociais baseadas na ideia de classe, de nascimento, entre outras, eram naturalizadas, ou seja, não havia um princípio regulador dentro das leis dos Estados que proporcionasse igualdade entre as pessoas. É nesse sentido que a Revolução Francesa, um acontecimento europeu, é importante para o mundo, embora mais para o Ocidente. Sobre o que significa a Revolução, ela: é reconhecida como o nascimento da democracia moderna, pois enquanto a sociedade do Antigo Regime se fundamentava na desigualdade entre os homens, surgiu pela primeira vez na História uma revolução que tinha como bandeira a igualdade, a soberania do povo, a liberdade, a ideia de Direitos do Homem. Segundo François Furet e Mona Ozouf, essa ruptura já exprime a natureza ao mesmo tempo política e filosófica do movimento. E não é por acaso que a Revolução Francesa é considerada o marco da transição da Idade Moderna para a Idade Contemporânea. (Silva; Silva, 2009, p. 366) Assim, tanto a Revolução Francesa, quanto a independência dos Estados Unidos, em 1776, foram tentativas – bem-sucedidas de maneira geral, de implantar princípios políticos ligados a um pensamento mais liberal para o período, bem como, influenciados pelo Iluminismo. Não obstante, frisamos o que entendemos como revolução, já que esse acontecimento transformou todo um contexto. Para Hannah Arendt: O conceito moderno de revolução, inextricavelmente ligado à noção de que o curso da História começa subitamente de um novo rumo, de que uma História inteiramente nova, uma história nunca antes conhecida ou narrada está para se desenrolar, era desconhecido antes das duas grandes revoluções no final do século XVIII. (Arendt, 1988, p. 23-24) Além disso, é preciso salientar que esses aspectos, mesmo que já adquiridos, são constantemente ameaçados e negociados devido a processos reacionários e autoritários que ocorrem em todo o mundo, especialmente como consequência dos interesses econômicos e por disputas por zonas de influência. Portanto, resumimos esse tema ligado à Revolução Francesa do seguinte modo: luta pelo direito à liberdade de pensamento, de expressão e de associação. Para entendermos isso, é preciso considerar os antecedentes políticos, econômicos e sociais da Revolução Francesa que durou 10 anos (1789 – 1799), assim como, as fases da revolução e, a fim de desconstruir uma 4 perspectiva homogeneizante trazemos também a participação decisiva das mulheres. TEMA 1 – REVOLUÇÃO FRANCESA: CONTEXTO POLÍTICO O último dos reis da Dinastia dos Bourbons na França foi Luís XVI, um governo conturbado por conflitos internos e problemas econômicos, os quais foram agravados pela participação francesa na Independência dos Estados Unidos. Isso porque o país, devido a conflitos com a Inglaterra, apoiou a independência da colônia norte-americana, sem ter um retorno financeiro para o seu investimento. No absolutismo francês, a corte, composta pela nobreza, também tinha gastos exorbitantes, com base em uma sociedade estamental, em que as diferenças de classe eram justificadas e naturalizadas. Os nobres formavam o Segundo Estado e eram por voltar de 350 a 400 mil membros, não pagavam impostos e ainda usufruíam de tributos feudais no século XIX. Junto a esse grupo estava o clero (formando o primeiro estado), também com privilégios, entre eles, a posses de terras, o recebimento de rendas e o pagamento de impostos inexistente. Além disso, o clero, que era formado por um grupo de cerca de 130 mil membros, mantinha a posse da maior parte das terras francesas e cobrava o dízimo. Assim, o pagamento de impostos era algo específico do Terceiro Estado, que era composto pela alta e média burguesia, camponeses e proletários. Cerca de 20 milhões compunham esse grupo, ou seja, 80% da população francesa era responsável por todos os gastos da França e eram alijados de direitos sociais e políticos. Com essas considerações, percebemos que os camponeses, os proletários e a burguesia estavam insatisfeitos com a política francesa. Uma das formas de se entender como a falta de liberdade afetava o povo francês era a presença das lojas maçônicas, porque estas eram as únicas que aceitavam igualmente a todos (em relação à burguesia especialmente). Com base também nessas experiências, segundo Hobsbawm, os ânimos foram alterados e diversos princípios foram construídos na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, posteriormente, como: Este documento é um manifesto contra a sociedade hierárquica de privilégios nobres, mas não um manifesto a favor de uma sociedade 5 democrática e igualitária: “os homens nascem e vivem iguais perante as leis”, mas ela [a Constituição] também prevê a existência de distinções sociais. (Hobsbawm, 2009, p. 106) São essas distinções sociais que incentivaram a vários desses grupos a exigirem mais representação política. A tomada da Bastilha é o que representa esse momento, em que grupos diferentes tomaram uma instituição que simbolizava o poder absolutista do período, demonstrando que o poder também estava com ele. Figura 2 – Tomada da Bastilha, 1789 Créditos: Jean-Pierre Houël. Os dias da Tomada da Bastilha são também conhecidos como a fase do Grande Medo, na qual os direitos começaram a mudaram. Nesse período, foi votada a Assembleia Nacional Constituinte, que iniciou o que seria promulgada no ano de 1791: a Constituição Francesa. Esta incluía a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadã, documentos próprios do Clero com novas funções e menos direitos, a abolição de qualquer prática feudal, desde os direitos e deveres, bem como a distribuição de terras. 6 Figura 3 – Símbolo da Assembleia Nacional (França) É perceptível que o entendimento das diferenças sociais e políticas deixa de ser naturalizado para ser compreendido como algo classista ou mesmo cultural. Entretanto, essa mesma declaração traz desigualdades após à Revolução Francesa quando frisou o direito à propriedade privada, sem questionar o acesso e as condições que os cidadãos, especialmente os camponeses e operários têm a esse direito. A historiadora francesa Lynn Hunt faz essas observações ao analisar fontes dos conselhos municipaisdo período: As autoridades revolucionárias eram os proprietários dos meios de produção; eram comerciantes com capital, profissionais liberais qualificados, artesãos com oficinas próprias ou, mais raramente, camponeses com terras. Não foram encontrados homens sem qualificação ocupacional, trabalhadores diaristas e camponeses sem terra em posições de liderança e nem sequer sua representatividade foi expressiva entre as bases militantes. (Hunt, 2007, p. 207) As ideias de Hunt confirmam que a falta de participação política se tornou um dos principais motivos para que a burguesia promovesse – junto a outros grupos – a Revolução Francesa. Os ideais de Liberdade, de Igualdade e Fraternidade eram o objetivo, para que assim especialmente a burguesia pudesse votar e decretar novas leis. Camponeses, proletários embora estivessem junto tiveram menos poderes após o fim da Revolução, isto é, a ideia de Fraternidade não foi a mais exigida e aplicada após a tomada de poder. TEMA 2 – REVOLUÇÃO FRANCESA: CONTEXTO ECONÔMICO As motivações políticas não eram as únicas que deixavam insatisfeitos os camponeses, proletários e os burgueses. Desde o início da década de 1780, havia uma forte inflação, carestia e diminuição da renda do povo de modo geral. 7 Esses acontecimentos se deram especialmente por problemas ou intempéries climáticas, com ênfase a períodos de seca, porém de inundações também. As más colheitas intensificaram a disputa pelos alimentos e, consequentemente, a inflação, além de enfraquecer os pequenos comerciantes e o comércio interno da França. Junto a isso estavam os gastos de duas guerras com alimentação, armas, soldados, além de questões diplomáticas. A primeira guerra era a travada com a Inglaterra (Guerra dos Sete Anos) e, a segunda, a da independência dos Estados Unidos. Apesar dos rendimentos baixos, a monarquia não exigiu ou baixou os impostos pagos pelo Terceiro Estado. Os gastos com nobres – e seus privilégios – se mantiveram – gerando um déficit de cerca de 100 milhões de libras. Além disso, é preciso considerar que a França, embora fosse apontada mais como um país camponês e com resquícios feudais, vivia em meados do século XVIII acontecimentos envolvendo trabalhadores urbanos. Robert Darnton, historiador francês, narra sobre a vida do operário Nicolas Contat e o seu estágio em uma gráfica na rua Saint-Séverin em Paris (1750): A vida de aprendiz era dura, ele explicou. Havia dois aprendizes [...] dormiam num quarto sujo e gelado, levantavam-se antes do amanhecer, saíam para executar tarefas o dia inteiro, tentando furtar- se dos insultos dos oficiais (assalariados) e os maus-tratos do patrão (mestre) e nada recebiam para comer [...] pior ainda, o cozinheiro vendia, secretamente, as sobras, e dava aos rapazes comida de gato – velhos pedaços de carne podre que não conseguiam tragar, e, então, passavam para os gatos, que os recusavam. (Darnton, 2006, p. 103- 104) O que é possível afirmar é que naquele contexto, mesmo que de forma pequena e nem sempre organizada, havia operários que questionavam as condições sociais e de trabalho. Quando Nicolas Contat percebe que animais poderiam ser mais bem tratados que os próprios seres humanos, entende parte de sua desigualdade e a questiona e mostra sua ira, ao matar o bichano. Falta de condições ideais de trabalho, de alimento, somadas às insatisfações pelas condições econômicas da França, darão a esse grupo voz e resistência durante o processo revolucionário, mesmo que subestimados pela burguesia. Desse modo, a Revolução Francesa não abalou apenas a estrutura do Antigo Regime, mas ofereceu outras perspectivas para o futuro. É uma revolução social de massa que gerou uma transformação econômica-social, além de 8 práticas políticas como o liberalismo e a democracia (no decorrer do século XIX (Silva; Silva, 2006, p. 367). Apesar das condições inviáveis destinadas à maior parte da população, o rei convocou os Estados Gerais para efetivar uma solução, que foi justamente o aumento de impostos. Figura 4 – Salle des Menus Plaisirs in Versailles. Bibliothèque nationale de France Fonte: CC-PD. É importante ressaltar que as cadeiras ocupadas por nobres e o clero somavam menos que as ocupadas pelo Terceiro Estado, porém, a contagem era feita por categoria de Estado e, normalmente, Primeiro e Segundo Estado votavam nas mesmas posições. Essa reunião ocorreu em maio de 1789, porém, a burguesia (maioria no Terceiro Estado) exigiu a votação por membros e não por categoria. Naquele período, o Terceiro Estado convocou os demais a votarem com eles e da forma proposta. Com a recusa e a ausência de muitos, o Terceiro Estado nomeou a Assembleia de Nacional e Constituinte, isto é, um instrumento que questionava o próprio Absolutismo. Após desentendimentos entre membros dos dois primeiros estados com o Terceiro, a Assembleia ou a reunião convocada foi cancelada, sendo proibida qualquer reunião dentro daquele espaço. Deste modo, membros desejosos de votar em novas medidas econômicas, com a representação política de uma forma mais igualitária, se reuniram em um local conhecido como de “jogo da Péla”, em 30 de junho de 1789. 9 Este constitui-se como um acontecimento marcante para que a Revolução se tornasse mais concreta. O espaço estava fora da Assembleia Nacional, no entanto, deputados representantes da burguesia e uma parcela do clero decretaram que não mais aceitariam os Três Estados e atuariam juntos por uma nova Constituição. TEMA 3 – FASES DA REVOLUÇÃO FRANCESA Os Três Estados, portanto, reuniam grupos diversos. No entanto, não eram diferentes apenas entre os três, mas dentro dos grupos havia diversidade. No Terceiro Estado, havia entre seus membros desde mendigos e prostitutas até banqueiros e grandes empresários, embora o número de burgueses fosse maior. Apesar de terem pontos comuns, diferenças estabeleceram três grandes grupos dentro do Terceiro Estado, sendo eles: Girondinos, Jacobinos (este com a influência de Moderados e Exaltados) e Pântanos. É importante considerar que todos os grupos dentro do Terceiro Estado tiveram destaque dentro de algum momento revolucionário francês. No caso dos Girondinos, eles conduziram o período da Monarquia Constitucional ou da Assembleia (1789 – 1792). Esta ficou caracterizada como o tempo em que ocorreu: a Tomada da Bastilha, o fim dos privilégios feudais, a formação da Assembleia Nacional Constituinte e, em especial, a aprovação de declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. No trecho abaixo, é possível perceber o quanto se inovou com tal documento: Art. 6º. A lei é a expressão da vontade geral. Todos os cidadãos têm o direito de concorrer, pessoalmente ou através de mandatários, para a sua formação. Ela deve ser a mesma para todos, seja para proteger, seja para punir. Todos os cidadãos são iguais a seus olhos e igual- mente admissíveis a todas as dignidades, lugares e empregos públicos, segundo a sua capacidade e sem outra distinção que não seja a das suas virtudes e dos seus talentos. Art. 7o. Ninguém pode ser acusado, preso ou detido senão nos casos determinados pela lei e de acordo com as formas por esta prescritas. Os que solicitam, expedem, executam ou mandam executar ordens arbitrárias devem ser punidos; mas qualquer cidadão convocado ou detido em virtude da lei deve obedecer imediatamente, caso contrário torna-se culpado de resistência. (https://www.parismuseescollections.paris.fr) https://www.parismuseescollections.paris.fr/ 10 Figura 5 - Jean-Jacques-François Le Barbier (1738–1826). Déclaration des droits de l'homme et du citoyen. Musée Carnavalet. Paris. França Fonte: CC-PD. Percebemos que a ideia de humanidade e de igualdade parecem ser mais próximas a todos, bem como uma perspectiva de justiça para todos. Os Direitos Humanos eram entendidos como naturais (a partir donascimento), iguais (para todos) e universais (aplicável em qualquer situação). Nessa fase, é possível dizer que há um rompimento com uma prática autoritária, que era o caso do absolutismo. No entanto, direito como à propriedade, à segurança embora importantes para todos, permaneceram destinados a poucos. Para acalmar a população e como resposta aos anseios revolucionários, foi aprovada uma nova Constituição que trazia o voto universal, além de conquistas sociais. É desse contexto os primeiros debates da Assembleia Legislativa, a qual além de ter as suas diferenças internas entre os políticos, precisava ainda enfrentar a recusa da aristocracia e de Luís XVI em aceitar as novas leis e acordos políticos. Junto a isso, a França também se encontrava em guerra com a Inglaterra, período em que Bonaparte começou a ter destaque como general. Não obstante, as fugas constantes de clérigos, nobres e girondinos permitiram que eles também se organizassem e pensassem em uma contrarrevolução. Isso ocorreu após o confisco e nacionalização de todos os bens da Igreja, bem como pela pressão para que esta rompesse com o papado 11 e se tornassem funcionários públicos (Constituição Civil do Clero), fazendo com que padres aderissem à contrarrevolução. Isso gerou um período conturbado que, como tal, presenciou a falta de produção de alimentos e, por isso, de uma forte inflação; revoltas camponesas e no espaço urbano. Aliás, os camponeses também se recusavam em pagar pela extinção das leis feudais. A pequena e média burguesia também viu alguns direitos votados e aprovados, porém não eram efetivados no cotidiano. Além disso, leis relacionadas a direitos trabalhistas e até sobre a existência de sindicatos não eram consideradas, o que minava os direitos de um público significativo, porém com pouca representação legislativa. A insegurança e a pouca presença na prática de igualdade para todos fez com que os jacobinos tivessem mais espaço no campo político, com promessas de alcançar as propostas da Revolução Francesa: a de Liberdade, a de Igualdade e a de Fraternidade. Esse período ficou conhecido como o de Convenção Nacional ou do “Terror”, no qual os Exaltados coordenaram inúmeras execuções, isso depois da prisão e morte de Luís XVI e Maria Antonieta. que foram presos em 1792 e 1793, respectivamente. Foram muitos os motivos que levaram os girondinos a perder o poder. Uma das influências desse processo foi de Jean Paul Marat, médico, escritor, jornalista e político. Marat fazia inúmeras críticas aos girondinos especialmente por meio de seu jornal, fundamental para que a opinião pública já marcada pelas crises e instabilidade política também se colocasse contra a monarquia. Em seus jornais, incentivou a crítica aos grupos dominantes, como também dava voz aos movimentos populares. É importante ressaltar que é principalmente pela presença popular que esse período ficou conhecido como o mais radical. O governo era conduzido pelo que chamavam de Comitê de Salvação Pública, o Comitê de Segurança Geral e o Tribunal Revolucionário, que reunia nomes como o de Robespierre, de Marat e de Danton. No entanto, apesar das conquistas sociais importantes, a tática de racionar comida devido à própria crise e a não aceitação de qualquer crítica fizeram com que esse grupo fosse amplamente questionado. Um dos jornais em que mais se disputava sobre o entendimento das ações daquele contexto era 12 também de Marat, O Amigo do Povo. Uma cópia abaixo é dele com o sangue do próprio Marat, assassinado no ano de 1793: Figura 6 – O amigo do Povo Fonte: CC-PD. No fim de 1792, Marat foi eleito na Convenção Nacional, ao tempo em que também publicava sobre temas republicanos em seu Journal Le République Fraçaise. Marat chegou a ser processado quando defender que Luis XVI deveria ser morto apenas se recusasse a aceitar a constituição e, por isso, tem grande apoio popular. E foi em 1793 que ele, como uma figura importante da resistência, foi assassinado por Charlotte Corday, provavelmente por influências dos girondinos, a quem ajudou a derrubar do governo: Figura 7 – Cruikshank, Isaac (–1811). A Second Jean d'Arc, Or, The Assassination Of Marat By Charlotte Cordé Of Caen In Normandy On Sunday. 1793. Lewis Walpole Library, Farmington, Connecticut-EUA Fonte: CC-PD. https://en.wikipedia.org/wiki/en:Isaac_Cruikshank http://images.library.yale.edu/walpoleweb/oneitem.asp?imageId=lwlpr07789 13 TEMA 4 – REVOLUÇÃO FRANCESA: DO “TERROR” AO DIRETÓRIO O “período do terror” é considerado o mais tenso do processo revolucionário francês. Isso porque um grupo mais radical, chamado de jacobinos, estavam à frente no poder durante a Convenção Nacional. É desse período também transformações significativas que dão sentido ao caráter revolucionário do processo, tais como: fortalecimento do Estado Laico como expressão principal do governo republicano, sufrágio universal aprovado, entre outros. Nesse tempo, o general Napoleão Bonaparte comandava incursões internacionais contra inimigos dos franceses, mesmo com inovações significantes, o grupo dos jacobinos mostrou-se contrário a qualquer reação negativa às suas ações ou decisões, o que fez com que centenas de opositores fossem mortos ou condenados à prisão. Assim, grupos se reuniram, em especial o que era chamado de pântano ou planície tomou o poder, em julho de 1794, ou 9º Termidor. Essa fase ficou conhecida como Reação Termidoriana e terminou com a morte de Robespierre e o fim da Convenção. O governo que se deu foi um composto por cinco diretores da alta burguesia, o Diretório, que outorgou uma nova constituição cancelou diversas medidas sociais que haviam sido conquistadas, como o voto que voltou a ser por renda. Essa fase finalizou cinco anos depois com Napoleão Bonaparte, com o golpe de 18 de Brumário. Bonaparte havia conquistado o apoio de parte da burguesia e do povo com suas expedições. Em 1799, novamente, o processo revolucionário passa por um golpe de Estado, a partir do qual é criado o Consulado. O Diretório permaneceu como forma de governo por cinco anos, cujo poder central estava nas mãos da Alta Burguesia, embora o legislativo permanecesse com duas câmaras diversificadas. Diversos golpes ocorreram, tanto da direta (monarquistas), quanto da esquerda (jacobinos), entre eles o movimento da Conjuração dos Iguais. Ele foi liderado por François Noël Babeuf, que tinha como pauta principal o que ressaltamos nesse texto: era preciso mais que ter direitos, era preciso colocá-los em prática de forma universal. O movimento não chegou a acontecer porque foi denunciado antes. Mas seus ideais foram importantes para os levantes operários no século XIX. 14 TEMA 5 – PARTICIPAÇÃO DAS MULHERESAS E A REVOLUÇÃO Foram muitas as participações das mulheres naquele processo, mesmo sendo aquela sociedade bastante patriarcal e excludente. De classes sociais diversas e atuando em frentes diferentes, mulheres aristocratas, de todos os segmentos burgueses e de família proletárias e de camponeses. Ressaltamos os limites da sociedade do período, porque os lugares dessas mulheres eram em casa, nas indústrias, no campo e nas ruas, entretanto, apenas para trabalhar. A rua, como um espaço em que suas vozes seriam ouvidas, não era algo pensável nas décadas anteriores. Além de Maria Antonieta, odiada pelo povo por suas decisões absolutistas e autoritárias havia outras, as quais lutaram pela burguesia ou os mais marginalizados. Entre elas, estavam Charlotte Corday, a qual assassinou o deputado radical Jean Paul Marat, assim como Théroige de Méricourt, atriz e cantora de origem pequeno-burguesa, que incentivou as mulheres a caminharem até Versalhes, em outubro de 1789. Figura 8 – Marcha das mulheres a Versalhes. Autor desconhecido. Gravura. Século XVIII. Paris: Biblioteca Nacional da França Fonte:CC-PD. Estas, entre outras, exigiram o fim do absolutismo e, em especial, que todos tivessem acesso ao mínimo de igualdade social. Importante lembrar que a 15 nossa historiografia foi uma profissão de homens e sobre homens por longos séculos, o que silenciou inúmeras mulheres. Não menos importante e que também questionava a invisibilidade de mulheres foi Olympe de Gouges. Esta contestou a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, pois, segundo ela, o documento ignorava as mulheres como cidadãs. Gouges escreveu e discursou no ano de 1791, logo após à promulgação do documento. Além disso, a feminista também exigia que as mulheres tivessem o direito de votar e de serem votadas. Embora Gouges tenha acabado guilhotinada, ela (como outras) incentivou para que muitas buscassem a conquista de direitos sociais, políticos e culturais. NA PRÁTICA Ao longo da aula, podemos perceber como a iconografia revela muito de um período. O destaque ocupado pelos elementos que compõe uma pintura/aquarela etc., bem como devemos ver como um discurso sobre algo. Se uma pintura é feita durante ou depois do acontecimento, qual é o sentido que ela defender? Em uma disputa de memória sobre aquele acontecimento, qual é a perspectiva reafirmada. O trabalho do historiador e da historiadora não é decretar a mais ou menos verdadeira, mas entender o jogo de disputa que ocorra entre as relações de poder variadas de uma sociedade. Assim, para saber mais a respeito de como o movimento foi representado em obras do período, acesse o acervo do Museu Carnavalet, de Paris: <http://www.carnavalet.paris.fr/>. Acesso em: 21 set. 2021. FINALIZANDO Vimos, nesta aula, como a maior parte da população francesa de meados até o fim do século XVIII buscou se organizar para mudar a realidade social em que se encontravam. Mais que isso, desejavam transformações políticas que não eram conhecidas na França até aquele período, ou seja, a ideia de igualdade em todos os segmentos, embora de uma maneira que não atingia a todos, como as mulheres, as crianças, negros e idosos. Para isso, precisaram experimentar o direito de ter a voz ouvida, fosse por meio de manifestações sangrentas ou mesmo pelos jornais populares. Ideais relacionadas à República, aos Direitos Humanos, à Constituição ou mesmo à 16 Assembleia Legislativa precisaram ser debatidas, construídas e também foram contestadas. Para entender esse contexto complexo que forma de fato um processo revolucionário, buscamos compreender parte dos antecedentes políticos, econômicos e sociais da Revolução (1789 – 1799), suas fases e a participação da burguesia, de camponeses e de mulheres. 17 REFERÊNCIAS ARENDT, H. Da revolução. São Paulo: Ática, 1988. COMPARATO, F. K. A afirmação histórica dos direitos humanos. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. DARNTON, R. O grande massacre de gatos: e outros episódios da História cultural francesa. São Paulo: Graal, 2006. HOBSBAWM, E. J. A era das revoluções: 1789-1848. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2009. HUNT, L. A invenção dos direitos humanos: uma História. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. MICHELET, J. História da Revolução Francesa: da queda da Bastilha à festa da federação. São Paulo: Companhia das Letras, 1989. _____. Historie de France au seizième siècle. Renaissance. Paris: Chamerot, 1855. SILVA, K. V.; SILVA, M. H. Dicionário de conceitos históricos. São Paulo: Contexto, 2009. Figura 7 – Cruikshank, Isaac (–1811). A Second Jean d'Arc, Or, The Assassination Of Marat By Charlotte Cordé Of Caen In Normandy On Sunday. 1793. Lewis Walpole Library, Farmington, Connecticut-EUA
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