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ESTÁGIO SUPERVISIONADO – PRÉ-PROJETO DE INTERVENÇÃO AULA 4 Profª Aline Aparecida da Cunha de Brito 2 CONVERSA INICIAL Nesta etapa abordaremos especificamente os espaços sócio- ocupacionais de atuação dos assistentes sociais. Entendemos que não seria possível abordar todos os espaços existentes, mas iremos introduzir algumas possibilidades de atuação para a categoria. É de suma importância que o aluno em processo de estágio possa identificar qual o seu campo de estágio, conseguindo refletir sobre as expressões da questão social e as políticas públicas daquele espaço frente às demandas institucionais. TEMA 1 – ESPAÇOS SÓCIO-OCUPACIONAIS Começamos este tópico reafirmando que o assistente social é um trabalhador assalariado inserido na divisão sociotécnica do trabalho. Para tanto, conta com múltiplos espaços de atuação profissional, podendo atuar em esferas públicas, instituições privadas, movimentos sociais, assessorias e consultorias, entre outros espaços oportunos no mercado de trabalho. O profissional de serviço social insere-se em instituições que atuam com determinada política pública, levando-o a atuar de forma coletiva ou individual. Geralmente, atua com outros profissionais que colaboram entre si, um trabalho combinado e cooperativo que assume perfis diferenciados nos vários espaços ocupacionais (Iamamoto, 2007). O assistente social, atuando na intermediação entre as demandas dos usuários e o acesso às políticas públicas, coloca-se como mediador entre a esfera pública e os interesses da classe trabalhadora (Iamamoto, 2007). No Brasil, o serviço social tem fundamental importância nos campos da esfera pública e privada no que tange à seguridade social. Esse trabalho versa sobre o processo de elaboração de políticas públicas, a avaliação e o monitoramento dos diferentes níveis da federação. Outro campo de atuação recorrente desses profissionais refere-se aos conselhos de políticas públicas, especialmente os conselhos da criança e do adolescente, os conselhos de assistência social e os conselhos de saúde nos níveis municipais, estaduais e federal (Iamamoto, 2007). Nos variados espaços sócio-ocupacionais, o assistente social tem seu compromisso ético pautado no projeto ético-político da categoria, que tem 3 vínculos com a classe trabalhadora em busca de uma nova ordem societária. Seu trabalho tem capacidade de criar um acervo de dados sobre a população atendida, identificando múltiplas expressões da questão social que os usuários dos serviços vivenciam em seu cotidiano (Iamamoto, 2007). O compromisso com a construção, a implementação e a execução das variadas políticas públicas vem de um processo histórico dos movimentos da categoria. Atualmente o assistente social está permeado de relações entre a população e o espaço sócio-ocupacional. Nos termos de Netto (1992), os assistentes sociais são “executores terminais de políticas sociais”. Discordando de Netto (1992), Iamamoto (2007) entende que, além de viabilizar e mediar o acesso às políticas públicas, os assistentes sociais têm atribuições e competências para planejar, organizar e sistematizar políticas públicas por meio da gestão. Bem, entendemos então que os espaços sócio-ocupacionais são variados, mesmo a categoria sendo mais fomentada em determinado espaço. À medida que as políticas públicas vão sendo implementadas pelas instituições públicas ou privadas, os campos de atuação vão se renovando. Essa renovação sempre estará vinculada com as competências e atribuições dos assistentes sociais, ligadas principalmente com a orientação e a representação em conselhos de políticas públicas sociais e de direitos, na organização e mobilização popular, avaliação de planos, programas e projetos, planejamento, elaboração de projetos interventivos, atendimento a demandas sociais, trabalho em equipe etc. Nos tópicos a seguir, iremos abordar alguns espaços sócio-ocupacionais existentes para entendermos a variedade do exercício profissional do assistente social, logo, as múltiplas oportunidades de campo de estágio para o acadêmico. TEMA 2 – ESFERA PÚBLICA A atuação dos assistentes sociais na esfera pública possui um marco importante nos anos 1990, que marcou significativamente a ordem social no Brasil, segundo Raichelis (2009, p. 6), “palco de um complexo processo de regressões no âmbito do Estado e da universalização dos direitos, desencadeando novos elementos que se contrapõem ao processo de democratização política, econômica e social em nosso país” 4 É nesse contexto que o Brasil passa por diversos movimentos de transformações, impactando o mercado de trabalho e redefinindo os sistemas de proteção social e da política pública no país. Nessa conjuntura emergem novas expressões da questão social, logo, novas estratégias de enfrentamento às vulnerabilidades da época. Com a complexidade desse movimento, no que concerne às políticas públicas houve um desmonte e um desmanche que atingiu a esfera estatal, porém o Estado permanece sendo a forma mais efetiva de operar a universalização dos direitos (Raichelis, 2009). É nesse desmonte (1990) que a categoria profissional ocupa espaços mais efetivos na esfera pública. Como mediadores dos conflitos entre o Estado e a classe trabalhadora, os assistentes sociais predominantemente vinculam-se aos conselhos de políticas sociais e de defesa de direitos nas esferas municipais, estaduais e federal. Também vinculam-se ao planejamento, à organização e à operacionalização de programas, projetos e serviços em diferentes políticas públicas como, por exemplo, a política de assistência social, a política de educação, a política de saúde etc. Comparece também, nas relações governamentais, ainda que conflitante, a exigência de profissionais com capacitações complementares da formação profissional, pois a velocidade em que os conselhos foram criados ainda não demonstrava um sinal efetivo da democratização essencial para apaziguar os conflitos da década. A categoria passa, então, a ser requisitada para atuar na formulação, no monitoramento e na avaliação dessas políticas. Também são requisitados para a gestão de programas e projetos sociais. É nessa década (1990) que a categoria avança significativamente em seus espaços sócio-ocupacionais, e o estágio acompanha esse avanço. À medida que os novos espaços vão sendo conquistados, os campos de estágio também ganham nova roupagem no processo de ensino e aprendizagem. É importante reforçar que o conjunto CFESS/CRESS, comprometido com a qualidade da formação profissional, também se integra nessas mudanças, visto que, conforme os espaços sócio-ocupacionais vão surgindo, a capacitação e a formação profissional também avançam, executando debates críticos sobre as competências e atribuições profissionais nos novos campos de atuação. Para atender adequadamente às novas demandas do setor público, a categoria 5 movimentou-se para a capacitação desses profissionais voltados a uma análise e técnica permeadas de criticidade social. Os novos espaços sócio-ocupacionais no setor público vinculavam-se a atividades de funcionamento e implementação de políticas públicas e conselhos de direito, dando abertura para programas de capacitação de conselheiros, elaboração de planos municipais, monitoramento e avaliação de programas e projetos sociais, coordenações de programas, planejamento estratégico, entre outras demandas da esfera pública. A esfera pública sempre foi o maior ensejo na introdução dos assistentes sociais no mercado de trabalho. Com a implementação do Sistema Único de Assistência Social (2004) e da Política Nacional de Assistência Social, a Política de Assistência Social lidera a absorção desses profissionais, seguida da Política de Saúde, que ainda é um espaço privilegiado para osprofissionais desde a Constituição Federal de 1988, ampliando o mercado de trabalho para a categoria (Iamamoto, 2007). Na contemporaneidade, vemos os assistentes sociais inseridos nos setores de gestão, nos conselhos de direitos e, principalmente, nos equipamentos de operacionalização de políticas públicas. Temos, por exemplo, na Política de Assistência Social, equipamentos como os centros de referência da assistência social, os centros-dia, os centros POP, as instituições de acolhimento de crianças e adolescentes e as instituições de longa permanência para pessoas idosas. Já na Política de Saúde, podemos pensar em equipamentos como as unidades básicas de saúde, as comunidades terapêuticas, os centros de atendimentos psicossocial etc. Nos espaços sociojurídicos, os assistentes sociais podem atuar nos Tribunais de Justiça, no Ministério Público, na Defensoria Pública, em penitenciárias etc. TEMA 3 – INICIATIVA PRIVADA A atuação dos assistentes sociais na iniciativa privada é cada vez mais relevante no contexto da responsabilidade social empresarial. Esses profissionais desempenham um papel fundamental na promoção de ações que visam o bem-estar da comunidade e a promoção da justiça social dentro das empresas. Iamamoto (1999, p. 83) afirma que em 1980 o serviço social já era institucionalizado, considerado uma “especialização do trabalho coletivo, dentro da divisão sociotécnica do trabalho, partícipe do processo de produção e 6 reprodução das relações sociais”. Essa visão serve de referência à abordagem dos processos e relações de trabalho da profissão. De modo processual, as corporações empresariais passam a entender as dicotomias sociais e como respostas a essas dicotomias passam a incluir em seus valores a responsabilidade social corporativa, articulada à ideia de um compromisso ético-político com o desenvolvimento sustentável. Ao mesmo tempo, discutem sobre a insuficiência do Estado, que está atrelado aos interesses de muitos grupos, grupos esses dominantes e que, por vezes, conflitam quanto à solução dos problemas sociais do país e defendem a substituição dos sistemas de proteção social por ações focalizadas na pobreza. É nesse contexto que os assistentes sociais se inserem, atuando nas empresas de iniciativa privada. Faleiros (2005) reflete que a atuação dos assistentes sociais na iniciativa privada remete a uma ótica de luta de classes vinculada à relação de poder. O autor entende que instituição privada remete a uma agência que presta serviços e que essas instituições também são estruturantes nas relações sociais, assim como a família, a religião, a educação e o exército. Nas instituições/iniciativas privadas, os objetivos profissionais são definidos pela própria instituição e, nessa ótica, variam de instituição para instituição. Jean Robert Weisshaupt realizou uma pesquisa no Nordeste em 2013 sobre o serviço social e as instituições privadas. Os resultados apontam para uma atuação profissional institucional com tamanha pressão entre o projeto ético-político da categoria e a missão institucional que, por vezes, são dicotômicos. Os conflitos nas instituições podem ocorrer entre os profissionais e os auxiliares, entre profissionais, entre a instituição e os profissionais, entre os usuários e a instituição, entre outras formas (Silva citado por Faleiros, 2005). A resolução de conflitos nas instituições requer abordagens e estratégias adequadas para promover um ambiente de trabalho harmonioso e produtivo. Os assistentes sociais desempenham um papel fundamental nesse processo, atuando como mediadores e facilitadores na busca por soluções e equilíbrio entre as partes envolvidas. Há uma relação de forças que fomentam esses conflitos, que remete diretamente aos interesses da ação profissional e, mesmo diante dos tensionamentos, o assistente social atua no meio dessas tensões num processo 7 de mediação dos diálogos, dando respostas às necessidades dos usuários e do próprio profissional. Entendemos que os conflitos podem ocorrer em qualquer espaço sócio- ocupacional, mas especialmente nas iniciativas privadas, pois essas instituições têm seus movimentos dialéticos que podem contradizer as competências e atribuições do assistente social. A atuação dos assistentes sociais em defesa dos direitos dos usuários dos serviços nas iniciativas privadas requer uma postura ética, compromisso com os princípios do Código de Ética Profissional do Serviço Social e capacidade de articular-se de forma estratégica, sempre lembrando que essa articulação é voltada aos interesses da classe trabalhadora. Nas instituições privadas, os assistentes sociais podem atuar em setores empresariais, no setor de recursos humanos, em instituições de capacitação, em instituições com responsabilidade social, entre outras possibilidades. É comum os estudantes encontrarem campos de estágio na iniciativa privada e se questionarem sobre o exercício profissional. Essa reflexão é importante mediante a análise de conjuntura, entendendo-se a relação de poderes presente e a dicotomia entre os objetivos institucionais e o projeto ético- político da categoria. É importante compreender a relação de poderes e a dicotomia entre os objetivos institucionais e o projeto ético-político da categoria, a fim de construir estratégias de atuação coerentes e que respeitem os princípios e diretrizes do serviço social. Aqui entendemos um pouco a relação do exercício profissional em empresas privadas. Esse tema é importante para que o aluno identifique que as iniciativas privadas também são campo de estágios para o acadêmico dotado de frentes de atuação intrínseca às habilidades e competências do assistente social. TEMA 4 – ORGANIZAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL E O TERCEIRO SETOR Como vimos anteriormente, o ano de 1990 foi um ano de grandes mudanças sociais, criando também um protagonismo para a sociedade civil no que tange às organizações sociais voltadas ao fortalecimento de políticas públicas, à defesa de direitos e ao combate às múltiplas vulnerabilidades sociais. Wieczynsk (2007) reflete que o terceiro setor é um espaço sócio- ocupacional que exige do profissional competência técnica, teórica e política como pressuposto da atuação. As organizações da sociedade civil são 8 instituições que atuam no que chamamos de terceiro setor. São instituições com ou sem fins lucrativos, mas que, no geral, atuam na execução de serviços por meio de políticas públicas de fomento ou enfrentamento de alguma demanda social. Gentilli (1998) considera que a atuação dos assistentes sociais no terceiro setor é vasta, exemplificando campos de atuação como o trabalho de proteção à criança e ao adolescente, a educação social, a assistência social, a educação de pessoas com deficiência, a participação popular etc. Segundo Paz (1999), o assistente social, ao se inserir em um espaço sócio-ocupacional organizado pela sociedade civil, deverá refletir sobre a natureza social da OSC, bem como sobre as relações existentes nesse espaço e os objetivos articulados com o projeto ético-político da categoria. A autora ainda defende que o trabalho do assistente social nas OSCs é intrinsecamente social, na perspectiva de fortalecimento desse espaço na conquista de direitos, cidadania e democracia. Costa (2007), por outro lado, defende que as OSCs são instituições que trabalham com as demandas em que o Estado não atua, gerando, assim, uma irresponsabilização do Estado sobre as políticas públicas e sociais. Por isso, a autora acredita que o assistente social inserido nas OSCs do terceiro setor deve possuir um arcabouço teórico e metodológico para identificar as diversas manifestações institucionais, atuando de forma ímpar nessa relação. É importante que o profissional que atua em OSCs consiga identificar as intenções sociais da organização, refletindosobre qual espaço essa instituição está ocupando e qual o papel do Estado nesse lugar de proteção aos direitos sociais difusos e coletivos. É nesse sentido que a autora reforça que esse profissional deve apropriar-se de discernimento em relação ao papel e à função do Estado, do mercado e do terceiro setor no contexto da formulação e execução das políticas sociais. Cabe ao Estado prover políticas públicas e sociais, fortalecendo as vulnerabilidades sociais em busca de uma sociedade mais igualitária. Quando o Estado deixar de operacionalizar essas políticas públicas, o mercado e o terceiro setor atuam nessas vulnerabilidades, exercendo a função do Estado na proteção dos direitos sociais. No entanto, é importante destacar que essa atuação do mercado e do terceiro setor não deve ser encarada como uma substituição do papel do Estado, mas sim como uma resposta emergencial e complementar. A 9 precarização das políticas públicas e sociais ainda demanda ações efetivas por parte do Estado, visando garantir o acesso universal e integral aos direitos sociais. No interior das instituições do terceiro setor, o exercício profissional deve ser direcionado ao atendimento integral e de qualidade social, trabalhando no enfoque da garantia do direito de inclusão ao atendimento de forma equilibrada e cuidadosa, crítica e construtiva, discernindo claramente a contribuição que o assistente social pode trazer para um trabalho de qualidade social no âmbito do terceiro setor (Costa, 2007). Outro ponto importante é que as instituições do terceiro setor podem ou não ter a base filantrópica e de responsabilidade social. Isso significa que determinadas empresas atuam por meio da filantropia, com cunho religioso ou não. Independentemente das bases institucionais, o assistente social pode intervir no terceiro setor, visando uma prática de ações sociais voltada para a garantia de direitos, o acesso à democracia, a construção da cidadania e não para a filantropia. Um exemplo de atuação nesse sentido seria a promoção da participação e do controle social dentro das instituições do terceiro setor. Os assistentes sociais podem trabalhar para fortalecer a capacidade dos usuários dos serviços e das comunidades atendidas de exercer sua autonomia e influenciar nas decisões e políticas das organizações. Isso contribui para a construção de espaços mais democráticos e para o empoderamento das pessoas atendidas. TEMA 5 – MOVIMENTOS SOCIAIS, ASSESSORIAS E CONSULTORIAS 5.1 Movimentos sociais A Lei n. 8.662/1993, que regulamenta a profissão, reforça a relação da categoria com os movimentos sociais, indicando que essa relação é competência profissional: “prestar assessoria e apoio aos movimentos sociais em matéria relacionada às políticas sociais, no exercício e na defesa dos direitos civis, políticos e sociais da coletividade” (Brasil, 1993). Historicamente o serviço social se relaciona com os movimentos sociais. No final dos anos 1970 e início de 1980 a categoria se reorganiza com seus fundamentos ético-políticos que embasam o exercício profissional, contestando 10 o conservadorismo, guinando a categoria para um novo projeto profissional vinculado às matrizes marxistas. Mediante esse novo embasamento, o serviço social se reconhece como agente fomentador dos movimentos sociais da época, incentivando as mobilizações e a participação social pela população usuária, reconhecendo a necessidade de construir lutas coletivas para avançarmos rumo a um novo projeto societário. Nessa época o projeto ético-político estava engajado politicamente com movimentos democráticos num contexto pós-ditadura militar que resultou no rompimento brusco com a ordem vigente na categoria profissional, mudando os rumos do exercício profissional. É importante lembrarmos da intenção de ruptura com as bases conservadoras da época (1960-1980) levando ao movimento de reconceituação do serviço social, que buscava repensar e reformular as teorias e práticas sociais, políticas e econômicas predominantes na época, principalmente no campo do marxismo (Netto, 2006). O projeto ético-político profissional passa a se materializar no Código de Ética de 1993, na Lei n. 8.662/1993 de regulamentação da profissão e nas Diretrizes Curriculares de 1996. Tem a intenção de uma nova sociabilidade, de apoio a classe trabalhadora, da proteção aos direitos humanos e sociais e está em movimento diante das contradições da sociedade capitalista (Netto, 2006). Entendendo-se o projeto profissional nesse novo formato, constitui-se então um projeto coletivo de classe, na busca por uma sociedade igualitária, sem dominação nem exploração de nenhum ser humano sobre o outro (Netto, 2006). Assim, a atuação do assistente social nos movimentos sociais pauta-se no exercício político organizativo, com a mobilização social e com a organização dos militantes e apoiadores na criação de mecanismos de resistência e de luta (Cardoso; Lopes, 2009). Uma das principais contribuições do serviço social para os movimentos sociais é a possibilidade que os/as assistentes sociais têm de “contribuir para a formação política dos sujeitos sociais integrantes dos movimentos sociais urbanos e para o processo de formação da consciência, a partir da apreensão das contradições capital x trabalho e suas consequências para a classe trabalhadora” (Iasi, 2001 citado por Farage, 2014, p. 77). O assistente social, essencialmente, contribui com os movimentos sociais na formação dos agentes desses movimentos por meio de uma formação política 11 crítica para seus integrantes instigando, nesse processo, a consciência de classe. O profissional, em seu exercício, pode sistematizar atividades educativas formadoras de aparatos teórico-metodológicos para explicar a realidade por meio da utilização do método dialético-crítico e de suas categorias de análise (Closs, 2015). Outra perspectiva da atuação nos movimentos sociais refere-se ao trabalho profissional realizado nas instituições de organização autônoma como o movimento sindical. “Aqui compreendemos os movimentos sociais na condição de espaço sócio-ocupacional e a atuação profissional enquanto circunscrita a relações de assalariamento e a um processo de trabalho específico” (Conselho federal de serviço social, 2018, p. 2). Também entendemos que o assistente social é um profissional inserido na divisão sociotécnica do mercado de trabalho, por isso essa relação pode se estremecer em algumas perspectivas. “Neste caso, compreendemos esta atuação como transversal aos diversos espaços sócio-ocupacionais [...] podendo incidir diretamente no auxílio à organização da população usuária por meio do impulso ao seu viés coletivo e organizativo” (Conselho federal de serviço social, 2018, p. 4). Esses espaços referem-se a movimentos sociais da saúde, educação, moradia e planejamento urbano, assistência social, movimentos com pautas raciais, pautas LBGTQIPN+, movimentos de proteção ambiental, movimentos feministas, movimentos de comunidades tradicionais, quilombolas e indígenas etc. É importante entender os movimentos sociais como campo de atuação do assistente social, partindo do pressuposto que essa atuação é competência da categoria, assim o acadêmico reconhece nos movimentos sociais também um campo de estágio. 5.2 Assessoria e consultoria Segundo Bravo e Mattos (2010), assessoria e consultoria podem ser definidas como uma ação desenvolvida por um profissional com conhecimentos na área, estudioso, permanentemente atualizado e que toma a realidade como objeto de estudo, com a intenção de alterá-la. A dimensão pedagógica do assistente social nas assessorias e consultorias é ampla e essencial. Nesse contexto, o assistente social assume um papel de especialista em diversas matérias de conhecimento, promovendo 12 processos de aprendizagem e transformaçãosocial tanto para as organizações ou instituições em que atua quanto para os indivíduos atendidos por essas instituições. As consultorias e assessorias especializadas em serviço social ou em determinada política pública também são consideradas como trabalho autônomo para o assistente social, visto que ele é um profissional liberal, sendo essa, num contexto neoliberal, mais uma oportunidade no mercado de trabalho. Matos (2006) e Vasconcelos (2010) entendem que existe diferença nos processos de assessoria e consultoria. A consultoria está relacionada com o ato de fornecer conselhos, opinar tecnicamente sobre algo, fornecer pareceres sobre seu tema de conhecimento. Consiste, ainda, numa prestação de serviço pontual sobre determinada dúvida. Matos (2006) esclarece também o aspecto que se refere à vinculação teórico-metodológica, pois as consultorias podem ter objetivos variados e até mesmo contraditórios. Essa reflexão é importante para que não seja feita uma análise parcial dessa forma de intervenção profissional. A assessoria está relacionada a um auxílio ou uma ajuda a outros profissionais ou instituições; carece de um acompanhamento processual, o que torna seu desenvolvimento mais complexo e que tende a ser mais demorado. “O/A assessor/a não intervém ou substitui o protagonismo do sujeito assessorado, deve sim propor caminhos e estratégias ao coletivo e este tem autonomia em suas escolhas” (Conselho federal de serviço social, 2008, p. 3). Dessa forma: Dentre as principais atividades desenvolvidas pelos/as assistentes sociais estão a formação política, por meio de cursos, oficinas e seminários; ações de assessoria e acompanhamento técnico para a elaboração de projetos de assentamento e moradias urbanas; formação/capacitação de lideranças para intervir nos conselhos de direitos e políticas públicas. (Conselho federal de serviço social, 2008, p. 3) Freire (2006) defende que as assessorias e consultorias criaram suas raízes nos anos 1980 e 1990 por empresas de grande porte, com objetivo, segundo a autora, neoconservador, mas com possibilidades de adotar outros rumos devido ao caráter contraditório. Ela aponta que essas perspectivas neoconservadoras perpetuam até a contemporaneidade, por isso a importância de o profissional reconhecer as contradições presentes nesses espaços nos quais os assistentes sociais exercem sua profissão, podendo identificar a 13 viabilidade para a realização de outros objetivos mais condizentes com o projeto ético-político da profissão. Vasconcelos (2010, p. 16) entende que: Nos processos de consultoria, um assistente social ou uma equipe geralmente procura um expert para que dê o parecer sobre caminhos que a equipe escolheu e/ou encaminhamentos que está realizando por exemplo: indicar bibliografia sobre temas específicos; dar o parecer sobre projetos de pesquisa e/ou avaliar encaminhamento de levantamentos e pesquisas em andamento; indicar ou realizar cursos sobre temas específicos da área de atuação profissional etc. Entendemos que as empresas/instituições de assessoria e consultoria são espaços sócio-ocupacionais de atuação para os assistentes sociais e relacionamos esses espaços também como campos de estágio para os acadêmicos. NA PRÁTICA Convidamos você a pensar na seguinte questão: em qual espaço sócio- ocupacional você está inserido? Em seguida, questione-se: quais políticas públicas e quais direitos os usuários podem acessar por meio desse espaço sócio-ocupacional? Agora você tem arcabouço para identificar o seu campo de estágio e refletir sobre o espaço em que está inserido. Essa reflexão irá auxiliá-lo na construção de seu diário de campo e de seu pré-projeto de intervenção. FINALIZANDO É importante entendermos os possíveis espaços sócio-ocupacionais de atuação do assistente social na dinâmica do projeto ético-político e do mercado de trabalho. Somente com o reconhecimento do campo de estágio é que o aluno terá a capacidade de identificar as relações de poder, as políticas públicas, as expressões da questão social e as demandas dos usuários. Com o reconhecimento do espaço sócio-ocupacional o aluno apropria-se do campo de estágio, identificando as competências e atribuições do profissional no exercício de sua atividade. Entender o espaço sócio-ocupacional, logo, o campo de estágio, é o que fornece ao aluno o direcionamento em seu processo de estágio obrigatório supervisionado. 14 REFERÊNCIAS BRASIL. Lei n. 8.662, de 7 de junho de 1993. 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