Buscar

Alma Brasileira

Prévia do material em texto

assis
CINTRA
WU BRASILEIRA
° OBRA °
ADOTADA
o’ EM o
TODOS OS
ESTADOS
DO BRASIL
£D1TORA PR0PR1ETAH1A
A COMPANHIA K
/MELHORAMENTOS»
DE SAO PAULO
S. PAULO-CAIEIRAS-RIO
ASSIS CINTRA
ALMA BRASILEIRA
OBRA ADOTADA
OS ESTADOS DO BHASIL
EDIÇÕES
EM TODOS
Editora-Proprietária: COMP. MELHORAMENTOS DE SÃO PAULO
(Weisztlog Irmãos incorporada)
SÃO PAULO - CAIEIRAS - RIO DE JANEIRO
A professora
<3 ora 5üveira EMelo
é á menina
ÇMaria ÇTeresa de Sarros Gamai go •SiZfia,
dedico este lipro de leitura escolar,
destinado à educação cíuica.
São (Paulo, 1938
R Q.
PRIMEIRA PARTE
AS FESTAS NACIONAIS
Feriados Nacionais
«Decreto-lei n.° 486 — de 10 de junho de 1938 —
Declara os feriados nacionais — 0 Presidente da Repú­
blica, usando da atribuição que lhe confere o art. 180
da Constituição, decreta:
Art. l.° — São feriados nacionais os seguintes dias:
l.o de janeiro — dedicado à comemoração da fra­
ternidade universal;
21 de abril — dedicado à memória dos precursores
da Independência do Brasil, simbolizados no Tiradentes;
1 de maio — dedicado à exaltação dò dever e dig­
nidade do trabalho;
7 de setembro — dedicado à comemoração da In­
dependência e considerado o dia da festa nacional
brasileira;
2 de novembro — dedicado à comemoração dos
mortos;
15 de novembro — dedicado à comemoração do ad­
vento da República;
25 de dezembro — dedicado à comemoração da
unidade espiritual dos povos cçistãos.
Art. 2.° — Revogam-se as disposições em contrá­
rio. — Rio de Janeiro, em 10 de junho de 1938, 117.° da
Independência e 50.° da República. — GETÚLIO VAR­
GAS — Francisco Campos.»
Pax-Concórdia — Quadro do Pedro Américo
l.o DE JANEIRO
(Comemoração da Fraternidade Universal)
Os homens viviam errantes nas florestas; depois se
ajuntaram nos campos para criar o gado e plantar os ve­
getais alimentícios; depois as diversas famílias se reu­
niram e fundaram as cidades; depois as cidades fizeram
alianças e formaram os países; depois melhoraram a
agricultura, o comércio c a indústria e fizeram a civi­
lização.
Hoje são muitos os países civilizados; mas nem por
o serem, dêles desapareceram os maus sentimentos do
homem-selvagem, que vivia nas cavernas das matas vir­
»»♦ 9
gens: ainda há o ódio, o egoísmo, a inveja. Dêstes/de­
feitos humanos nasce a grande calamidade que se chanià
Guerra.
A Guerra é inimiga do Progresso e da Fraternida­
de dos homens. A Paz é a mãe de todas as felicida­
des. Mas se é assim, por que ainda existe a Guerra!
E’ porque o mundo não é somente formado de gente
boa. Há homens, até, que vestem casaca, usam' luvas,
pisam mármores com sapatos de verniz, têm cartola e
residem em palácios suntuosos, mas... possuem os mes­
mos sentimentos maus, a mesma alma perversa e cruel
do homem das florestas, que lutava corpo a corpo com
as féras e com os semelhantes. Quem são êsses tigres
de casaca? São os poderosos e potentados, que provocam
a Guerra, com todas as suas consequências: sangue,
luto, lágrimas, ruínas, fome e peste.
As tentativas dos homens bons, em favor da paz!
universal, não têm sido felizes. Ainda neste século hou­
ve em Haia um Congresso da Paz, com representan­
tes de todos os povos civilizados. Porém alguns anos
depois o espírito mau da humanidade provocou a guer­
ra mundial de 1914, causando milhões de mortes.
0 dia l.° de Janeiro, chamado pelo povo — Dia de
Ano Bom — em que toda a gente troca cumprimentos
de boas-festas, comemora em todo o mundo civilizado
o nobre sentimento de fraternidade universal, do amor
do próximo, enfim o desejo santo das almas boas: Paz.
E o feriado de l.° de Janeiro é o dia festivo con­
sagrado aos sentimentos pacíficos, isto é, à fraternidade.
universal.
0 Alferes Xavior — o Tiradentes
21 DE ABRIL
(Comemoração dos precursores da Independência
do Brasil, resumidos em Tiradentes')
Em 1789 governava a Capitania de Minas um fidal­
go português de poucos amigos. De fisionomia triste,
era rude e insociável; vivia encerrado no seu palácio.
Tal fidalgo era d. Luiz Furtado de Mendonça, visconde
de Barbacena. Certa noite, alguém o procurou: era um
oficial português que ia denunciar uma conspiração de
brasileiros. Êsse traidor chamava-se Joaquim Silvério
dos Reis. Imediatamente começaram as prisões. As pes­
soas mais inteligentes e mais ricas da Capitania foram
presas e submetidas a um interrogatório terrível. Os prin­
cipais conspiradores eram o coronel Inácio José de^1- 1
varenga Peixoto; os tenentes-coronéis Francisco de Paula |
Andrada e Domingos de Abreu Vieira; os drs. Clqudio J
Manuel da Costa e Tomaz Antônio Gonzaga; oá pa. I
dres Carlos Corrêa de Toledo e José da Silva Oliveira
Rolim. 0 mais pobre de todos chamava-se Joaquim
José da Silva Xavier, alteres de cavalaria, conhecidoB
pela alcunha de Tiradentes, por ser perito na arte den- |
tária. 0 chefe, em cuja casa todos se reuniam frequen- I
temente, era o dr. Cláudio. Êste, que fôra secretário de .
d. Luiz da Cunha Menezes, antecessor de Barbacena, no
Govêrno de Minas, gozava de grande prestígio no Brasil -a
e mesmo em Lisboa. Era o advogado mais importante J
de nossa Pátria. Prenderam-no e depois o encontraram
morto na cadeia. Os padres foram enviados para Lisboa 'J
e os paisanos e militares remetidos para a África, 'em
degrêdo, com exceção de um: — Tiradentes.
0 Governador de Minas exigia, como exemplo, para |
que ninguém no Brasil nunca mais pensasse em Li- I
herdade e República, que houvesse uma pena de morte. |
Com isso concordou o vice-rei d. Luiz de Vasconcelos, ja
E assim, a rainha de Portugal, d. Maria I, mandou para
a fôrca o pobre Tiradentes. Era êste o mais ardoroso ■
propagandista da República. A execução da sentença J
do morte realizou-se no dia 21 de Abril de 1792. 0 I
confessor do mártir da liberdade conta que êssè dia I
foi «m dia claro e bonito, de muito sol e de muita I
/esta....».
0 Govêrno da República querendo prestar'uma justa | 
12 «««
homenagem aos que se sacrificaram pela independência
da pátria, escolheu a figura de Tiradentes para os repre­
sentar. E assim declarou dia de festa nacional o 21 de
Abril, aniversário do enforcamento do grande patriota
que morreu pela liberdade de sua Terra.
Martírio de Tiradentes, que foi enforcado e ora seguida esquartejado,
em 21 de Abril de 1792, mo campo do São Domingos, Rio de Janeiro.
***** 13 *****
1.0 DE MAIO
(Dedicado à exaltação do dever e dignidade do trabalho)
Foi em l.° de Maio de 1887 que, num dos maiores
comícios realizados no mundo, os operários de Chicago,
com as comissões representativas de trabalhadores de
todos os Estados da União Americana, entusiasmados
pelos discursos dos liders trabalhistas Parsons, Spres e
Schwab, resolveram pleitear regalias, que pretendiam ser
um direito da classe à qual pertenciam.
Obtiveram do Govêrno a famosa «lei do trabalho»,
resumida nos seguintes itens:
l.°) oito horas de trabalho diário, nas segundas,
terças, quartas, quintas e sextas; quatro horas aos sá­
bados; descanso aos domingos;
2.°) assistência do patrão ao operário, no caso de
desastre e doença;
3.°) pagamento semanal dos salários;
4.°) proibição do trabalho aos menores de 16 anos;
5.°) abôno de uma quinzena de salário ao trabalha­
dor despedido;
6.°) direito de queixa dos trabalhadores contra arbi­
trariedades dos chefes de serviço;
7.°) organização das sociedades de classes.
Fprmidável foi a luta que se travou na Câmara dos
representantes federais quando o deputado Jonas Hen-
derson apresentou e defendeu a lei do trabalho.
— « Senhores, disse êle nessa memorável sessão dos
deputados americanos, já se foi o tempo em que o tra­
balhador era uma simples máquina. 0 operário moderno,
côncio das suas obrigações, está também inteirado dos
seus direitos: e êstes êle os requereu ao govêrno e ao
governo cumpre a obrigação de concedê-los. Urge aten­
der aos homens do trabalho, porque são êles as vigas
mestras da Nação.»
E foi relembrando essa data, consagrada à confrater­
nização dos trabalhadores na conquista dos seus di­
reitos, que o Brasil, como já o tinham feito todas as na­
ções civilizadas,decretou feriado o dia l.° de Maio.
Êsse é o dia comemorativo da confraternidade uni­
versal das classes operárias.
Desde quando celebram os operários o l.° de Maio?
Foi a 14 de Julho de 1889, no «Congresso dos De­
legados do Socialismo Internacional» reunido em Paris,
15
no «Salão Petrellem», que Raymond Lavique, secreta- J
rio da Federação dos Sindicatos, propôs que em data I
fixa e em todos os países e em todas as cidades/ do ‘||
mundo se realizasse uma manifestação internacional no I
sentido de «levar os poderes públicos a reduzirem a 8 •
horas o dia do trabalho, (medida já adotada por Tei do ,
Congresso Norte-Americano) e a aplicar as resoluções
do Congresso Trabalhista de Paris». Essa medida já
havia sido lembrada em Chicago (Estados Unidos), pe­
los sindicatos norte-americanos, em 1883. | ,3
Foram êles que, pela primeira vez, propuseram
o 1.» de Maio como data de manifestação proletária,
porque nos Estados Unidos essa é a data da renovação H
dos alugueis e dos contratos e foi nessa mesma data
que se reuniu o grande comício operário de Chicago, com
a representação de todos os Estados da República Ame- i
ricana.
Em Paris efetuou-se 'a primeira dessas manifesta- ' .]
ções a 1.» de Maio de 1890. E no ano seguinte o « Con-
gresso Trabalhista de Bruxelas », com representantes de
Iodos os países, deu-lhe caráter internacional.
Tratava-se antes do mais nada, de fazer notar a I
lei de oito horas. Somente ao cabo de trinta anos se
B ■ chegou a essa reivindicação operária, aceita e proclá-, I
mada na legislação de todos os países do mundo.
7 DE. SETEMBRO
(Comemoração da Independência do Brasil)
Depois de sua descoberta, o Brasil foi considerado
colônia de Portugal. Suas terras foram dadas a fidal­
gos, com direitos de capitães. Chamaram-se capitanias.
Em 1549, o rei de Portugal submeteu todas as capitanias
a um só governo, sob a direção de um homem de sua
confiança, o qual recebia o título de governador geral.
0 Brasil continuou sendo colônia, porém com o nome de
Governo Geral. No ano de 1714, como se descobrissem
grandes riquezas naturais na colônia, o rei de Portugal
elevou-a a categoria de vice-reino (*). Èm 29 de Agosto
do 1807 á família real fugiu de Lisboa, para não ficar
prisioneira dos soldados de Napoleão, que haviam con-
(1) O decreto que elevou o Brasil a vice-reinndo foi referendado cm 17G3.
17 *****
quistado Portugal. Em 24 de Janeiro de 1808 chegaram
os fugitivos às terras brasileiras, assim se transferindo '
a Côrte para o Rio de Janeiro, então capital do vice-
reino do Brasil. Em 1815 d. João VI elevou o Brasil a
reino, dando-lhe todas as regalias de que gozava a Me­
trópole. criando o «Reino Unido do Brasil e Portugal».
Isso se fez pelo decreto de 16 de Dezembro de 1815.
Foi um ato político que muito nos beneficiou, apres­
sando a nossa independência.
Tendo morrido a rainha Maria I, em Março de 1816,
d. João passou de príncipe regente a rei, porém só no
dia 6 de Fevereiro de 1818 é que se fez a sua acla- ■
inação, com todas as solenidades. Esteve no Brasil
desde 1808 até 1821. Partiu do Rio de Janeiro na ma­
drugada de 26 de Abril de 1821 e desembarcou em
Lisboa na manhã de 3 de Julho do mesmo ano. Con­
tudo, deixou no Rio de Janeiro d. Pedro, seu filho
mais velho, como príncipe regente de nossa Pátria. As
cortes de Lisboa quiseram tirai’ do Brasil as suas rega­
lias de Reino, isto é, tentaram fazer de nossa Terra uma
simples Colônia, como era dantes. E chamaram d. Pedro.
Êste recebeu pedidos do Rio, São Paulo e Minas para fi­
car. E ficou, desobedecendo às Cortes de Lisboa. No dia
7 de Setembro de 1822, às 4 e meia da tarde, o príncipe
viajava em direção a São Paulo, quando, na colina do
Ipiranga, recebeu cartas de grande importância, vindas
de Lisboa para o Rio, e do Rio mandadas para São Paulo
poi José Bonifácio de Andrada e Silva, eminente brasi­
leiro que, no cargo de ministro do príncipe regente, teve
»»» 18 «««
papel de destaque nos acontecimentos que prepararam
a indep' dência nacional. Tão atrevidas eram essas car­
tas que rdro, lendo-as, empa-
lideceu de raiva. Reunindo a sua
Guarda de Honra, contou a todos
que 0 cercavam que Portugal que­
ria escravizar 0 Brasil, mas que
tal não conseguiría porque os bra­
sileiros saberíam defender a sua
liberdade. E desembainbando a es­
pada, levantoü-a para 0 ar, bra­
dando com grande entusiasmo:
- - «Independência ou morte! »
— «Independência ou morte!», responderam todos,
de espada em punho. E assim foi proclamada a Indepen­
dência do Brasil, às 4 e meia da tarde, na colina do
Ipiranga, próxima dá cidade de São Paulo.
No dia 12 de Outubro dêsse mesmo ano, no Rio
de Janeiro, com impressionante solenidade, foi d. Pe­
dro proclamado Imperador do Brasil. E aí está expli­
cado o motivo porque comemoramos o 7 de Setembro.
2 DE NOVEMBRO
{Comemoração dos mortos}
A homenagem dos vivos aos mortos não é uma coisa
nova no mundo. Pelo contrário, é muito antiga. Na Chi­
na, era o principal motivo da religião popular, há mais
•de mil anos. Mesmo na Europa, na Galia, os Druidas
(sacerdotes gauleses), incluíam nas suas datas de festas
religiosas o dia 2 de Novembro, consagrado aos mortos.
Daí passou para os civilizados a misteriosa solenidade
da morte. Foi, mais ou menos, no ano 1.000 de nosSa
»»+ 20 «+«
era que o bispo Odilon (Q introduziu no Cristianismo
a comemoração dos mortos no diá 2 de Novembro.
E desde êsse tempo até hoje o mundo cristão dedica
tal dia para se prestar a nossa homenagem aos que já se
foram para sempre. De todas as comemorações é esta
a mais tocante, a que mais nos impressiona!
Dia de Finados! Na fraternidade da morte todos os
homens, ricos e pobres, poderosos e humildes, vão, ves-.
tidos de luto, levando na alma a dôr de uma grande sau­
dade, depositar flores sobre os túmulos dos mortos que­
ridos. Os cemitérios enchem-se de visitantes, irmana­
dos num mesmo sentimento — a homenagem aos mor­
tos. E quantas esperanças e desenganos, e quantas fe­
licidades e desditas não se encarceraram alí, dentro da­
quelas brancas casinhas dos mortos, daqueles frios e
húmidos sepulcros!
A humanidade que vive precisa ser grata à huma­
nidade que viveu. A quem devemos os benefícios de
nossa vida e de nossa civilização? Aos que já se foram...
Quantos heróis não passaram nos campos de batalha
completamente ignorados? Pois bem. No Dia de Finados,
não comemoramos somente as pessoas queridas que se
foram: comemoramos todos os mortos. E’ a homenagem
que a Vida tributa à Morte...
21 *****
A Proclamação da República
Quadro 'de Henrique Bemardeli
15 DE NOVEMBRO
(Comemoração do advento dã República)
A República era uma aspiração antiga em nossa Pá­
tria. Em 1711, foi tentada em Pernambuco por Bernardo
Vieira de Melo e outros. Em 1720, em Minas, por ela se
bateu Filipe dos Santos; depois, ainda em Minas, em
1789, Tiradehtes a desejou. Em 1817, foi ela proclamada
em Pernambuco, tendo a duração de alguns meses ape­
nas. E nesta mesma terra, em 1824, nova tentativa foi
ww 22
feita sob o nome de Confederação do Equador, composta
de vários Estados do Norte, sob a presidência de Fran­
cisco Pais Barreto. Em 1835 é no
que se proclama a República de
Piratiní, tendo como presidente o
coronel Bento Gonçalves da Silva.
Depois de 10 anos de lutas, em
18-15, os. republicanos depuseram
as armas, vencidos. Todas essas
tentativas foram sufocadas até o
ano de 1889. Nesse ano o exér­
cito estava desgostoso com o gb-
vêmo imperial, porque o perse­
guia. Os fazendeiros andavam
aborrecidos com a Monarquia, porque tiveram muito
prejuizo com a lei de 13 de Maio de 1888, que deu li­
berdade aos escravos (*). Já em 1870 começara a pro­
paganda. Em 73 houve a Convenção Republicana de Itú,
presidida pelo grande paulista João Tibiriçá. Os notáveis
brasileiros Benjamin Constant, Assis Brasil, Quintino
Bocaiuva, Saldanha Marinho, Silva Jardim e muitos
outros, fizeram a mais intensa propaganda do regime
republicano. No dia 13 de Novembro de 1889, a conspi­
ração de militares e civis chegou ao fim. Reunidos em
casa do Marechal Deodoro da Fonseca,os republicanos
Benjamin Constant, Rui Barbosa, Quintino Bocaiuva,
coronel Solon e outros, aí combinaram que no dia 15
Rio Grande do Sul
Bento Gonçalves
(1) Calcula-se em 500.000 contos o prejuízo çlos fazendeiros do Brasil,
nado pela, liberdade dos ^escravos.
28 *****
Benjamin Constant
sc proclamaria a República. E na verdade se procla-'
mou. O imperador, D. Pedro II, estava veraneando em
Petrópolis. As tropas revoltadas sairani à rua. As que
receberam ordem de combater os revolucionários, ade­
riram. 0 Ministério, presidido pelo visconde de Ouro
Preto, foi preso. E no dia seguinte a família imperial
seguia para a Europa.
O Brasil começou,, então, uma vida nova de país
democrático, republicano, verdadeiramente livre.
24 «w
25 DE DEZEMBRO
(Natal, comemoração da unidade espiritual dos
povos cristãos')
Em quasi lodo o mundo civilizado se comemora,
no dia 25 de Dezembro, o nascimento de Cristo. Cha­
ma-se tal dia — 0 dia de Natal. Nessa data todas as
famílias fazem festas. Os filhos distantes viajam, para
nesse dia matarem as saudades dos pais queridos. A
criançada ri satisfeita diante, da bela Ãrvore de Natal
que, enfeitada com brinquedos e doces, é colocada no
centro da sala. Em toda a parte reina a alegria.
E por que os cristãos festejam b dia 25 de De­
zembro? Porque foi negse dia, há quasi dois mil anos, 
25 *****
cjue nasceu na modesta povoação de Belém, na Judeia,
tendo por berço uma humilde mangedoira coberta de
palhas, o homem mais puro e santo que teve a Terra.
Chamava-se Jesús Cristo. Os cristãos chamavam-lhe ffo-
mem-Deus. Sua mãe era Maria, de Nazaré, esposa de
José, o descendente de reis de Israel, porém de profissão
humilde — carpinteiro. Ainda menino, discutia Jesús
còm os sábios. Depois de moço saiu pelas terras, acom-.
panhado de doze amigos, que eram os Apóstolos, a pre­
gar que todos os homens do mundo são iguais, que nin­
guém deve fazer o mal, que se deve amar o próximo
como a nós mesmos, e outros belos ensinamentos. Era
uma religião nova. Isso não convinha ao grande sacer­
dote dos judeus — Caifás. E perseguiu Jesús Cristo.
Os judeus pregaram numa cruz êsse apóstolo da Bon­
dade. Foi injuriado, crucificado, mas a sua religião ficou
e venceu. Já* tem a idade de dezenove séculos. E’ a re­
ligião dos brasileiros. De tal grandesa moral era êsse
homem, que quasi todo o mundo civilizado o adora como
Deus. Êle fundou a religião da Bondade, que é o cris­
tianismo, e seu nascimento serviu de princípio para
uma era a era cristã'. E assim contamos o tempo
pelo nascimento de Cristo: ano de 1938, quer dizer
1938 anos depois do nascimento de Cristo.
SEGUNDA PARTE
OS CHEFES DE ESTADO
D. João VI
LAVRE 0 DECRETO, MARQUÊS...
No ano de 1815, surgiu no Brasil mna gravíssima
questão política. Havia no Rio dois partidos, trabalhan­
do para fins opostos. De um lado, um ministro, o Mar­
quês de Aguiar, orientado por Gonçalves Ledo e pelo
conde da Barca, com o apôio dos brasileiros; de ou­
tro, d. Carlota Joaquina, mulher de d. João VI, movida
pelo seu ódio imenso ao Brasil e aos brasileiros, e
apoiada por vários fidalgos portugueses. 0 Marquês de
Aguiar queria o Brasil elevado a reino, com todas as re­
galias de Rortugal, constituindo o Rio de Janeiro a séde
ou capital do Reino Unido. A isso se opunham termi-
nantemente d. Carlota Joaquina e seus partidários. Tão
2 Assis Ointra Alma Brasileira
0 Rio de Janeiro quando o Brasil foi elevaxlo a lleiuo — 1821
grave era a situação que o príncipe consultou o Conse­
lho de Estado. Imperturbável e sereno, o conselheirol
Tomaz Antônio disse ao rei: — «Senhor, a situação, é'
esta, sem a menor dúvida: ou Vossa Majestade procla­
ma a independência do Brasil, elevando-o a reino, é
neste caso contraria os portugueses; ou Vossa Majestade!
conserva o Brasil na posição subalterna de colonia,
e nesse caso terá o descontentamento dos brasileiros. E'.
claro que Vossa Majestade terá mais amor ao berço de
seus avós; mas é justo que ame este povo que o recébew \
entre /estas e alegrias em 1808, quando Vossa Majes­
tade foi coagido a deixar a pátria que o viu nascer. Dá
condência e do coração de Vossa Majestade está de­
pendendo a formação de um grande Império na América,
cuja coroa seria sua... 0 Império do Brasil união ao reino 
de Portugal faria de ambos uma grande potência, que,
como sabe, seria reconhecida pelo Congresso de Viena.»
D. João levantou-se. Déu algumas passadas pela
sala, nervoso e perturbado. Depois, parou diante do seu
ministro, e disse-lhe:
— «-Marquês de Aguiar, lavre o decreto elevando o
Brasil a Reino.»
D. Carlola Joaquina, que observava a reunião, de
um compartimento vizinho, irrompeu na sala de despa­
chos como um ciclone:
— «Não faça isso, Senhor! 0 Brasil não é digno
dessa mercê».
D. João, olhando de frente sua mulher, talvez pela
primeira vez em sua vida, respondeu-lhe com energia:
— «O Brasil já é digno, Senhora, de todas as mer­
cês. » ... . '
Depois, virando-se para o Ministro:
— « Lavre o decreto, Marquês.»
E o decreto foi lavrado e publicado com a data de
16 de Dezembro de 1815.
***** 81 *****
D. Pedro
QUE SEJAM FELIZES...
0 povo do Brasil, em princípios de 1831, já se não
conformava mais em ser governado por um príncipe es­
trangeiro. 0 espírito público, agitado e audaz, já sabia
querer e exigir do Imperador o que julgava ser seu
direito. D. Pedro, diante das contínuas agitações popu­
lares, com as quais as tropas pareciam solidárias, pensou
em salvar o trono para seu filho, ainda criança. De­
mais, na Europa aconteciam coisas muito desagradá­
veis ao Imperador do Brasil. Sua filha, d. Maria II,
era a rainha de Portugal. D. Miguel, irmão de d. Pedro,
tentou tirar-lhe o trono, proclamando-se rei' absoluto.
Um amigo escreveu ao Imperador expondo a situação e
dizendo-lhe:
— «Sua vinda a Portugal é absolutamente necessá­
ria para a restauração de D. Maria no poder. Cercado de
repúblicas irrequietas e por elas instigado, é bem pos­
sível que o Brasil tente um movimento sério e eficaz
contra Vossa Majestade. A nomeação dwm ministério de
absoluta confiança, ou mesmo a abdicação em favor de
seu filho, são as únicas providências que se impõem no
momento.»
D. Pedro, que sempre foi um homem alegre, mudou
completamente. Andava preocupado e triste. 0 barão
de Santo Ângelo, referindo-se a êste fato, diz que em
Fevereiro de 1831 o Imperador, encontrando-se em via­
gem com o seu amigo conselheiro Manuel Antônio Gal-
vão, que ia para Minas, contou-lhe confidencialmente
que, logo que voltasse para o Rio, iria abdicar o trono
em favor de seu filho. Voltou, e em 5 de Abril nomeou
um ministério composto de vários marqueses, de sua ab­
soluta confiança. 0 povo não queria êsse Ministério de
áulicos ou palacianos, e mandou uma comissão de
juizes de paz ao Paço de São Cristóvão para exigir a
reintegração do Ministério demitido. D. Pedro não aten­
deu. Então o povo se reuniu, em 7 de Abril, no Cam­
po de SanfAna. As tropas aderiram e o seu coman­
dante, em nome do povo e tropas, exigiu do príncipe
uma resolução. D. Pedro abdicou, nomeando José Bo­
nifácio tutor de seu filho. Entregando a carta abdica-
tória ao Major Frias, disse-lhe:
— «Retiro-me para a Europa e d,eixo u-m país que
tanto amei e ainda amo: aqui está a minha abdicação;
desejo que os brasileiros sejam felizes.»
E partiu para Portugal, deixando o Brasil entregue
aos brasileiros. 0 dia 7 de Abril de 1831 é o comple­
mento de nossa independência, é o último degrau de
nossa emancipação, pois o Brasil passava a ser gover­
nado por. brasileiros.
33 *****
Marquês de Caravelas
FIZ 0 QUE DEVIA...
Proclamada a.abdicação de Pedro I e anunciada
a sua partida para Portugal, o povo todo exultou de ale-
gria. Afinal, o Brasil era dos brasileiros. Os republica­
nos ativaram, então, sua propaganda. Mas os monar- •
quistas não dormiam. Prevendo novas agitações, o Mar-, |
quês de Caravelas, no próprio dia 7 de Abril, reuniu no
Senado 62 representantes da nação (26 senadores e. 36
deputados). Expôs com clareza tudo o que havia e o
que podia haver. Era misterque se fizesse imediata- |
mente um govêrno, uma Regência Provisória, que di­
rigisse o Brasil em nome da criança imperial, D. Pe­
dro II. Deveria ser composta .de três membros. Feita a I
eleição, saíram eleitos o Marquês de Caravelas,'o ge­
neral Francisco de' Lima e Silva e Nicolau de Campos
Vergueiro. Esta Regência, no dia 8 de Abril, chamou o ,|
Ministério que D. Pedro demitira, de cujo ato resul­
tará a sua abdicação. 0 novo govêrno, nesse mesmo dia
8, publicou um Manifesto ao Povo, aconselhando os bra­
sileiros a se unirem e procederem com prudência e or­
dem. Mas, por toda a parte, nasciam dissenções e desor­
dens. Os portugueses do Brasil-não se conformavam com
a partida de D. Pedro. Daí, conflitos entre portugue­
ses e brasileiros. As províncias do Pará, Maranhão,
Baía, Ceará, Pernambuco e Minas Gerais, agitavam-
se. Os republicanos, em proclamações audaciosas, ati­
ravam o ódio popular contra o Marquês de Caravelas,
principal figura da Regência. Reconhecendo isso, o
grande patriota, para ver se cessavam as agitações,
reuniu os representantes do povo e com. êles combinou
a eleição de um outro govêrno, a que se deu ohiome de
Regência Trina, com caráter efetivo, e não provisó­
rio como a antecedente. Essa foi eleita em 17 de Junho
de 1831, sendo composta do general Francisco de Lima
e Silva, José da Costa Carvalho e João Bráulio Moniz.
No dia da posse da nova Regência, o general Lima
e Silva, depois de agradecer as felicitações do Marquês
de Caravelas, disse-lhe:
— «E é pena, marquês, que um homem de sua
têmpera abandone o govêrno, e deixe a política.»
— « General, não se é político, nem se governa con­
tra a vontade do povo. Fiz o que devia», respondeu o
Marquês.
E abandonou a política, deixou o govêrno, confor­
mando-se com a vontade do povo.
35 *****
Francisco de Lima o Silva
CADA PATRIOTA E’ UM SOLDADO DA LEI...
Quando, em 17 de Junho de 1831, a Regência Trina
tomou conta do Brasil, o país inteiro se convulsionava
em grandes movimentos civis e militares. Mas, na frente
do govêrno estava um general capaz de restabelecer a
ordem. Contrariando a vontade de seus dois compa­
nheiros (José da Costa Carvalho e João Bráulio Mo-
niz), que verdadeiramente não eram homens talhados
para o momento,, o general Lima e Silva chamou para
ministro da Justiça o padre Diogo Antônio Feijó e dem
lhe todo o apôio de que carecia para restabelecer a or­
dem. Quatro partidos políticos guerreavam-se encarni-
çadamente: o republicano, o moderado, o liberal intran­
sigente e o restaurador, apelidado o caramurú. As tro­
pas do Rio, agitadas pelos políticos, estavam positiva­
mente indisciplinadas. Só havia um remédio: sua dis­
36 «««
solução. Isso bem compreendeu a Regência. 0 primeiro
batalhão que se rebelou foi vencido e dissolvido. As­
sim se procedeu com os demais, exceção feita a um,
que até então se mantivera com a Lei: o batalhão <Za
artilharia de Marinha, aquartelado na ilha das Cobras.
Afinal, também êste se insurgiu. 0 padre Feijó procurou
imediatamente o chefe da Regência, general ' Lima c
Silva, e expôs o caso:
— «General, a Artilharia da Marinha está revol­
tada. Ura o último batalhão que tínhamos... Estamos
sem soldados.»
Imperturbável, o general Lima e Silva respondeu
ao ministro:
— « Organize em batalhões a Guarda Nacional. Re­
prima a revolta e dissolva ò Batalhão de Marinha. Cada
patriota é um soldado da Lei».
Criada a Guarda Nacional e organizada com. uma
rapidez incrível, a Lei foi respeitada. E assim termina­
ram no Rio de Janeiro os levantes militares, aí se res­
tabelecendo a ordem e o sossêgo.
37 *****
SOU FILHO DE UMA PROVÍNCIA...
A segundo Regência, graças à energia do general
Lima e Silva e do Ministro da Justiça, padre Feijó, im­
pôs o respeito à Lei. Estava de cima o partido moderado:
Em 24 de Setembro de 1834, morreu o ex-imperador, e
com a sua morte desapareceu o partido caramurú (ou
dos restauradores), que pretendia a volta de Pedro I
ao trono do Brasil. Os políticos dêsle partido, assim
desarticulado, aderiram, na maior parte, aos moderados,
dando-lhes maior vigor. Em 1834, foi proclamado o' Ato
Adicional, que era uma reforma da Constituição. De
acordo com essa reforma constitucional, deveria reali­
zar-se em 7 de Abril de 1835 uma eleição para o cargo
de Regente do Império, pois então a Regência cabería
a uma pessoa somente e não a três. E foi eleito o pa­
dre Diogo Antônio Feijó.
w» 38 «+«
Mas onde estava o grande paulista padre Feijó? Re­
tirado da política ativa, recolhido à sua modesta casi­
nha de São Paulo. Desde o dia 26 de Julho de 1832, dei­
xara do ser Ministro da Justiça. Dizia êle que o Brasil
jamais consentiría que quem quer que fosse dirigisse os
seus destinos, sem a isso ser chamado pelas leis, expres­
são de sua vontade. Ora, o Senado era uma autoridade
legislativa. De acordo com o seu princípio político êle
não podia ser ministro, desde que estivesse em antago­
nismo com qualquer dos ramos legislativos — Câmara
ou Senado. Êsse antagonismo, afinal, surgiu. No Senado
caíra o projeto da destituição do tutor do imperador
(somente pela maioria de um voto), a-pesar-de aprovado
pela Câmara. Feijó, porém, já tinha anunciado que o
projeto passaria. E diante dessa hostilidade do Senado,
pediu demissão do cargo de Ministro da Justiça. Insta­
do para reconsiderar o seu ato, recusou-se terminante-
mente. E disse:
— «.Sou filho de uma. província onde se faz timbre
de cumprir o que se promete.»
E no primeiro domingo de Agosto de 1832, um mo­
desto viajante, levando sua bagagem (duas canastras
sobre um burro), acompanhava um tropeiro paulista,
cavalgando em direção de São Paulo. Era o padre Fei­
jó, que cumpria sua palavra, abandonando a Côrte e o
Ministério, para pouco tempo depois voltar eleito para o
cargo de Regente do Império.
89
POIS ENTÃO GOVERNE...
Eleito Regente do Império, em 7 de Abril de 1835,
tendo tomado posse no dia 12 de Outubro, Feijó go­
vernou o Brasil até o dia 19 de Setembro de 1837.
No Rio Grande do Sul, pouco antes da posse do
novo Regente, irrompera uma revolução republicana.
Sobrevieram agitações em várias províncias. Na Impren­
sa e no Parlamento, a luta era formidável. Contra a
Regência se coligavam as maiores forças políticas do
Brasil. No sul, era a tremenda Guerra dos Farrapos
que nunca mais acabava (durou 10 anos). Na Côrte,
terríveis oposicionistas, políticos poderosos, tais como
Bernardo Pereira de Vasconcelos, Joaquim José Rodri­
gues Torres (depois Visconde de Itaboraí), Pedro de
Araújo Lima (mais tarde Marquês de Olinda), Honório
Hermeto Carneiro Leão (Marquês de Paraná), Miguel
ww 40 «w
Calmou (Marquês de Abrantes), não davam tréguas nem
sossêgo ao Regente. Reconhecendo não poder cuidar pro­
veitosamente dos interêsses nacionais com tamanha opo­
sição, o padre Feijó resolveu passar o govêrno ao
mais nobre e valoroso dos seus inimigos: o dr. Pedro de
Araújo Lima. Assumindo a direção do Brasil, no dia 19
de Setembro de 1837, por um ato de Feijó, e eleito Re­
gente em 22 de Abril de 1838, o dr. Araújo Lima elevou
ao poder o partido conservador. Encontrando em o novo
Regente um adversário poderoso, os liberais em pouco
tempo sé arregimentaram e contra êle moveram cruenta
guerra. Mas o dr. Araújo Lima era invencível. Então,
como último recurso, os chefes liberais procuraram o
imperador, criança de 14 anos, e o convenceram de
que, para a salvação da Pátria, devia tomar as rédeas
do govêrno. Ao mesmo tempo apresentavam na Câma­
ra e no Senado um projeto declarando D. Pedro maior
de idade e pronto para governar o país. A Câmara
aprovou a maioridade, porém o Senado a desaprovou
(maioria de 2 votos apenas). 0 Regente procurou ime­
diatamente o jovem imperador e consultou-o se queria,
em verdade, dirigir o Império, e quando.
— «Quero já», respondeu o menino imperial.
— «Pois então governe», disse o Regente.
E em 23 de Julho de 1840, apenas com 14 anos
de idade, d. Pedro II, como imperador, começou o seu
reinado no Brasil.
***** 41 *****
D. Pedro II
QUE DEUS 0 PROTEJA...
'Subindo ao poder ém 23 de Julho de1840, apenas
com 14 anos, D. Pedro II governou o Brasil até 15 de
Novembro de 1889. Em quasi meio século de govêmo
o 2.° imperador sempre procedeu com bondade e jus­
tiça. E, justamente por isso, o povo brasileiro supor­
tou um reinado tão longo.
Em 1873 D. Vital, bispo de Olinda e D. Antônio
de Macedo Costa, bispo do Pará, desobedeceram certas
leis do Governo. D. Pedro, a-pesar-de católico, mandou
processá-los. Presos e submettidos a julgamento, fo­
ram condenados a trabalhos forçados. Porém, pouco
tempo depois dizia o Imperador:
— «Como chefe de Estado, cumprí meu dever, res­
4 2 ***♦*
peitando a lei e fazendo-a respeitar; como imperador
tenho o direito da clemência, e como católico devo per­
doar aos bispos.»
E perdoou.
Anos após, d. Pedro resolveu nomear Benjamin
Constant professor da Escola Militar do Rio. 0 Ministro
da Guerra observou ao Imperador que Benjamin era re­
publicano e certamente faria propaganda de suas idéias
entre a mocidade militar. Respondeu-lhe d. Pedro:
— « Meu amigo, cada um tem a idéia que qzter. Não
devemos fazer uma injustiça a uni homem porque não
pensa como nós. Êle fez o melhor concurso. Eu o no­
mearei. »
E nomeou.
Proclamada a República, foi exilado do Brasil, mas
nunca se esqueceu de sua pátria querida. Saudoso de sua
terra fez o seguinte soneto, a ela dedicado:
Terra do Brasil
Espavorida agita-se a criança,
De noturnos fantasmas com receio,
Mas se abrigo lhe dá materno seio,
Fecha os doridos olhos e descansa.
Perdida é para mim toda a esperança
De volver ao Brasil: de lá me veio
Um pugilo de terra; e nesta, creio,
Brando será meu sono e sem tardança.
»» '18 «+«
Qual o infante a dormir em peito amigo,
Tristes sombras varrendo na memória,
0’ doce pátria, sonharei contigo!
E entre visões de paz, de luz, de glória, ■
Sereno aguardarei no meu jazigo,
• A justiça de Deus na voz da História.
Em 1892,' num aposento de hotel, morreu, em Pa­
ris, Pedro II. Acompanhava-o sempre um pequeno tra­
vesseiro com terra do Brasil. Dizia êle que queria ex­
pirar junto daquela terra de sua pátria amada. Sen­
tindo que ia morrer, disse aos parentes, aconchegando ?
ao peito aquele punhado de terra brasileira:
— «Nunca me esquecí do Brasil. Morro pensando
nele: que Deus o proteja...»
Todos os brasileiros, que amam verdadeiramented
a sua pátria, devem venerar a memória dêsse grande fi­
lho do Brasil que, durante muitos anos, dirigiu os des­
tinos de seus patrícios, norteado pelo mais elevado.
espírito de jtystiça e bondade.
EVITO-A, COMO PATRIOTA...
Injustiças praticadas pelo govêmo e perseguições
a militares distintos irritaram o Marechal Deodoro da
Fonseca contra os ministros. Temendo o seu grande pres­
tígio nas classes armadas, o barão de Cotegipe, presi­
dente do Conselho de Ministros, escreveu-lhe, tentan­
do suborná-lo com o título de visconde, com a cadeira
de senador e dinheiro. Deodoro, porém, altivamente re­
peliu o insulto de tais oferecimentos, respondendo:
— «A minha resposta é que as cadeiras do Sena­
do devem ser oferecidas aos políticos e aos que se jul­
garem aptoá para serem legisladores; e que, quanto aos
títulos nobiliárquicos, eu me contentarei com a fidalguia
de sentimentos. Quero ser simples soldado e, portanto,
recuso uma e outra coisa, preferindo, antes de tudo, fi­
car ao lado dos meus irmãos de armas.»
45
Aceitou unicamente o dinheiro correspondente ao
seu sôldo, dizendo ao tesoureiro que lhe queria pagar, I
por ordem do governo, uma quantia exagerada:
— «Minha família sou eu e minha mulher. Basta-
nos o meu soldo.»
Ao imperador escreveu:
— «Atendei, Senhor! 0 que os militares pedem
é tão pouco: o reparo de uma injustiça que os afronta-
e vilipendia... — 'Vosso Ministério vos atraiçoa, pelo
menos nesta causa. A causa é muito séria, Senhor! Tem
exasperado o Exército e o provoca à reação... — Mas,
Senhor, a ser negada justiça, terei vergonha da farda
que visto, eu que me orgulho de pertencer ao Exército,
e nesse caso será uma verdadeira graça minha exonera­
ção do serviço.»
Tudo foi e.m vão. 0 Ministério não ouviu a voz do
Exército. E Deodoro proclamou a República, em 15 de
Novembro de 1889. Foi chefe do Govêrno Provisório até
o dia 24 de Fevereiro de 1891. Nesta data foi eleito
presidente da República. Encontrando oposição no Con­
gresso, e mal aconselhado, dissolveu-o no dia 3 de No­
vembro de 1891, recebendo adesões de todos os Esta­
dos, com exceção do Pará. Mas, em 23 do mesmo mês,
a Esquadra, sob a chefia de Custódio de Melo, intimou-o
a resignar o mandato de presidente. Poderia resistir e
debelar a revolta, como fez mais tarde Floriano, porém
querendo evitar a calamidade de uma guerra civil en­
tregou o poder ao vice-presidente. E na ocasião ein que
assinava o manifesto à nação, um ministro lhe disse:
»»» 46 «+«
— « Marechal, com as tropas e as fortalezas do Rio
e o apoio dos governadores, em pouco tempo a revolta
será esmagada. Por que não resiste?»
— « Porque acima de minha vaidade e da presidên­
cia, coloco os interesses sagrados do meu pais. Agora,
a guerra civil pode ser a morte da República ou o des­
membramento da Pátria. Evito-a como patriota.»
E evitou-a.
Nessa questão militar, que determinou a proclama­
ção da República, o glorioso exército brasileiro repeliu
a afronta do Ministério que tentava esmagá-lo. D. Pe­
dro, velho e doente, não se achava ao par dos aconteci­
mentos, pois os ministros não lhe diziam exatamente o
que havia. 0 exército não odiava o Imperador, que era
a incarnação viva da Pátria Brasileira. Porém, não po­
dia suportar, como de fato não suportou, a afronta
de Ministros violentos e autoritários.
Marechal Floriano Peixoto
« À BALA... »
0 que a Esquadra fez a Deodoro em 23 de Novem­
bro de 1891, fez a Floriano Peixoto em 6 de Setembro.
de 1893. Porém, Floriano resistiu. E venceu, chegan­
do ao fim de seu govêmo em 15 de Novembro de 1894.
Logo no princípio da revolta, certa nação estran­
geira, muito poderosa, parecia ser simpática aos revol­
tosos. Na Baia de Guanabara, estavam dois navios'
dêsse país. Um dia, o comandante de um dêsses navios,
acompanhado do respectivo Ministro, procurou o Ma­
rechal no palácio do Itamaratí. Disse-lhe que não confia­
va nas providências do Govêmo, que os seus patrícios
precisavam ser garantidos em sua vida e em sua pro­
priedade e que por isso a marinhagem estrangeira ia
desembarcar. Mas antes de dar as necessárias providên­
cias, desejaria saber como o Govêmo recebería os. mari­
***» 48 w«
nheiros de sua nação. Floriano levantou-se como se fosse
movido por um choque elétrico. Aquela pergunta era
um insulto à pátria, ao brio e à honra dos brasileiros.
— « Sr. Marechal, como receberá o desembarque dos
nossos marinheiros ? »
0 Marechal, olhando, indignado, o atrevido estran­
geiro, deu dois passos para a frente, e respondeu seca­
mente :
— «Ã bala...»
Os estrangeiros cumprimentaram o Marechal e saí­
ram. Mal tinham saído, Floriano chamou um dos seus
oficiais ajudantes e por êle mandou uma ordem escrita
ao comandante das tropas que defendiam os pontos de
desembarque: «varrer com metralha a marinhagem es­
trangeira que desembarcar». Depois, êle próprio foi dar
providências, distribuindo tropas pelo litoral e inspecio-'
nando as obras de defesa da cidade. Esperou os aconte­
cimentos.
Os estrangeiros não desembarcaram...
49
FOI UM DEVER, SIMPLESMENTE
Em 15 de Novembro de 1894 Prudente de Morais ;
subiu ao poder, governando a República até 15 de No­
vembro de 1898. Porém, teve que lutar muito. A Guer- .
ra de Canudos explodira- nos sertões da Baía. O Exér­
cito lutou e venceu. Voltaria no dia 5 de Novembro.j
O presidente resolveu ir recebê-lo no Arsenal de Guerra.
Era público e notório que havia uma grande conspira­
ção o que se pretendia matar o dr. Prudente de Morais.
Seus amigos, seus parentes e os próprios ministros acha­
vam que êle não deveria ir, porque graves acontecimen­
tos eram esperados no desembarque das tropas. Mas a
todos os conselhos respondia Prudente de Morais:
— «Eu vou. Chegam os soldados de Canudos, que
arriscarama sua vida na defesa da legalidade. O presi­
50 *****
dente da República deve ser o primeiro a dar-lhes a
boa-vinda. Eu sou o presidente.»
E foi.
Lá, repentinamente, surge um soldado, Marcelino
Bispo, que alveja Prudente de Morais com uma grande
garrucha. Tendo a arma negado fogo, saca da blusa um
punhal. 0 presidente ordena: .
— « Prendam este homem.»
0 ministro da Guerra, general Bitencourt, e o chefe
da casa militar, coronel Luiz Mendes de Morais, avan­
çam corajosamente. Subjugam o soldado. Mas os defen­
sores do presidente saem do local com o ventre rasgado
pelo punhal assassino. Pouco depois morre o ministro.
Prepara-se o entêrro. Espalha-se o boato de uma revo­
lução. Os amigos políticos e pessoais e os parentes pe­
dem ao presidente que não acompanhe o entêrro. Seria
certo um novo atentado. Prudente de Morais, destemi­
do e sereno, respondeu:
— «Eri sou o presidente. E mais do que o presi­
dente, etc sou o amigo. Se me matarem, morrerei no.
pôsto de honra, cumprindo um dever. Eu vou.»
E foi. A pé, de chapéu na mão, no meio do povo, o
presidente acompanhou o entêrro. E a um amigo que lhe
gabava a coragem, respondeu:
— « Foi um dever, simplesmente.»
E, em verdade, tinha sido.
51 «««
E SERÁ RESPEITADA...
Campos Sales sucedeu a Prudente de Morais no
govêmo da República. No dia 15 de Novembro de 1898
tomou posse e governou até 15 de Novembro de 1902.
Com as guerras civis dos governos anteriores, o
tesouro estava exhausto. O único recurso que havia
para salvar o país da ruína era aumentar os impostos.
O povo tem sempre horror ao imposto. Consultado o mi­
nistro da fazenda, dr. Joaquim Murtinho, êste não achou,
outra solução senão a de multiplicar as rendas públi­
cas, aumentando os impostos. Então, arrostando as iras
populares, o presidente recorreu ao único meio que na
ocasião havia. O povo agitou-se. O comércio indignou-se.
Em todo o país se maldizia o presidente Campos
Sales. O descontentamento popular foi de tal monta, que
uma comissão resolveu procurar o presidente para pro­
»•» 52
testar contra os impostos. Recebidos delicadamente no
Palácio, Campos Sales explicou-lhes a situação me­
lindrosa do pais. O Tesouro não tinha dinheiro. O
Brasil tinha compromissos importantíssimos. Precisava
pagar os juros das dívidas estrangeiras. Era preciso que
o povo, o comércio e a indústria ■ compreendessem
bem a importância do caso. Para a salvação da Pátria,
todos os sacrifícios deveríam ser feitos.
Entretanto, a comissão não se conformava e in­
sistia. E um de seus componentes disse:
— «Por mais que Vossa Excelência argumente, nós
não .nos convenceremos e não concordamos com os im­
postos, e contra êles protestamos e protestaremos.»
Campos Sales, então, perdeu a calma. Ergueu-se, in­
dignado pela falta de patriotismo daquela gente. E res­
pondeu com energia:
— « Concordem ou não concordem, protestem ou não
protestem, os impostos estão decretados. Não posso obri­
gar ninguém a ser patriota, mas obrigarei todos a
respeitarem a lei. E será respeitada...»
53
Conselheiro Rodrigues Alves
AQUI E’ O MEU LUGAR
. Campos Sales passou o govêmo da República a Ro­
drigues Alves, em 15 de Novembro de 1902. Este dirigiu
o país até 15 de Novembro de 1906. Encontrando o
Tesouro folgado, resolveu acabar com a febre amarela
no Rio e remodelar a capital do Brasil. Com êsse fim,
chamou para seus colaboradores dois homens de grande
valor: o engenheiro Francisco Pereira Passos e o mé­
dico Osvaldo Cruz. Ao engenheiro entregou a Prefei­
tura; ao médico, a Higiene.
Do trabalho desses dois homens notáveis, o Brasil
inteiro tem conhecimento. Venera-os como glórias nacio­
nais. O Rio era uma cidade feia, de ruas imundas e
estreitas. O prefeito mandou fazer lindas avenidas, ad­
miráveis parques e jardins. Por exemplo, a Avenida Ri°
54 «««
Branco e a Avenida Beira-Mar, que constituem ainda
hoje duas maravilhas da capital de nossa pátria. 0
Rio era uma cidade temida pelos estrangeiros e pelos
próprios brasileiros. Aí, a febre amarela, permanente­
mente, matava centenas e milhares de criaturas. Os que
iam ao Rio quasi precisavam fazer o testamento. Era
difícil escapar-se dessa calamidade. Osvaldo Cruz to­
mou medidas enérgicas e-acabou com a febre amarela.
Osvaldo Cruz Pereira Passos
0 engenheiro Passos derrubou pardieiros e fez palácios.
Mas, para conseguirem o que conseguiram, o Prefeito e
o Diretor da Higiene, com o apôio do Govêrno, tiveram
de tomar medidas enérgicas. O povo gritou. Uma parte
do exército estava descontente. E, em 14 de Novembro de
1904, explodiu uma revolução do povoe de parte das tro­
pas. O general Travassos assumiu o comando dos re­
voltosos, que marcharam para o, Catete, palácio do pre­
sidente. Os batalhões mandados pelo govêrno dispersa­
55 «+«
ram-se, covardemente, ao primeiro encontro. 0 general
Piragibe, sem boné, apareceu no Palácio, relatando o
acontecido. Um ministro, então, aconselhou o presidente:
— «Possa Excelência devia recolher-se a. um vaso
de guerra. Os revoltosos não deverão tardar.» B
— «Aqui é o meu lugar», respondeu Rodrigues
Alves.
E ficou. Ficou, e venceu a revolução.
Bio do Janeiro Praia do Botafogo, vendo-se um trecho da Avenida
Beira-Mar
56
DEUS, PÁTRIA E FAMÍLIA
Sucedeu a Rodrigues Alves o grande mineiro Afon­
so Pena. Èste notável patriota tinha um passado po­
lítico brilhantíssimo. Galgara todos os degraus da polí­
tica. Só lhe faltava, para terminar sua carreira, a pre­
sidência da República. Esta êle a obteve em 15 de
Novembro de 1906.
Rondoso, inteligente, de uma correção admirável
em todos os seus atos, Afonso Pena era o modêlo dos
chefes de família e dos chefes de Estado. Sua altivez,
seu caráter, sua honestidade, Seu espírito de justiça
eram predicados que não agradavam muito a certos po­
líticos de profissão. Davi Campista, ministro da Fq-
zenda, era um guardião severo e incorruptível do Te­
souro. A Caixa de Conversão regorgitava de ouro. O
comércio, a indústria e a agricultura, fontes da riqueza
57 <+***
Lá chegando, entregou o pequeno ao gerente do
Hospital e ordenou-lhe que chamasse com urgência uni
operador para cuidar da criança. Não poupassem des­
pesas. E mandassem ao Palácio, diariamente, notícias
do doente. Todas as despesas por sua conta.
Depois de curado, o menino foi com a mãe ao
Catete.
Nilo recebeu a lavadeira e o garoto:
— Êste menino está na escola, senhora?
— Não, sr. presidente.
— E por que? E’ um garoto inteligente. Deve ir para
a escola.
— Sr. Presidente, o meu filho é quem carrega a
roupa que lavo, entregando-a aos fregueses. Não o pus
na escola por êsse motivo.
— Pois seu filho fica por minha conta. 0 menino
é vivo e aproveitável.
Assim, o presidente pôs no colégio Pedro II o ga-
rôto que muito prometia.
Quando deixou a presidência da República, Nilo
Peçanha continuou a custear a educação do filho da
lavadeira.
Terminados os preparatórios, já moço, o protegido
de Nilo Peçanha procurou-o, pedindo-lhe que indicasse
uma Escola Superior: .Direito, Medicina, Engenharia...
Nilo respondeu:
Você escolha a carreira que quiser Não me
deve nada. Quis aproveitar a sua inteligência em favor
da Pátria. Se me é grato, seja sempre patriota.
»*»♦ 60 «w
PARE, MEU AMIGO, PARE Aí...
Para suceder a Nilo Peçanha na presidência da Re­
pública foi eleito‘o Marechal Hermes da Fonseca.
0 Marechal, que chegara à culminância da carreira
militar e da carreira civil, era um homem boníssimo.
Certa vez, após a formidável campanha civilista,
chefiada pelo genial Rui Barbosa, e desencadeada con­
tra a candidatura de Hermes, um deputado, em palestra
com o Marechal Presidente, pensando agradar o Chefe
da Nação, atirou sôbre Rui uma referência caluniosa.
Hermes atalhou-o imediatamente:
— Pare, meu amigo, pare aí. Rui é meu adversário.
Foi cruel na sua campanha contra mim. Mas êle é um
grande brasileiro, um exemplar cidadão. Embora seja
meu adversário, admiro-o e respeito-o. Não quero ouvir
nada contra êsse homem, que é uma glória do Brasil.
Ao ter conhecimento dessa atitude, reveladora de
grandeza moral, Rui Barbosareatou a sua amizade com
o Marechal Hermes.
61 ♦«**
3 Assis Cintra — Alma Bralileira.
Delfim 'Moreira
OLHE, NÃO SE ESQUEÇA...
Para suceder a Venceslau Braz, foi eleito Rodrigues
Alves que faleceu poucos meses após a eleição.
Delfim Moreira, vice-presidente, tomou conta do go­
verno da República.
No pequeno período em que foi presidente, certa
vez, um cidadão, milionário e conhecido homem de ne­
gócios, procurou-o em Palácio.
— Sr. Presidente, vim pedir-lhe licença para ofe­
recer à sua cidade de Santa Rita de Sapucaí, que tanto
V. Excia. estima, dois donativos.
— Muito obrigado, em meu nome e em nome da
cidade que tanto quero. E que donativos são?
Um monumento em bronze, com a efígie do
grande mineiro Delfim Moreira, e um excelente prédio
para a Santa Casa de Santa Rita.
»»» 62
— Eu e mitiha- terra dispensamos a estátua. Quanto
ao hospital, como o sr., que é muitas vezes milioná­
rio e quer beneficiar os pobrezinhos de Santa Rita, eu
e minha terra aceitamos a sua oferta. Muito obrigado.
Depois de meia hora de palestra, o milionário ne-
gocista disse ao presidente:
— Um dos seus ministros .trará para seu estudo
um contrato de obras públicas que pretendo assinar
com o govêrno.
— E que lhe disse o Ministro sôbre a sua proposta?
— Èle não quer concordar comigo. Mas eu espero
que V. Excia. concorde, pois o negócio é perfeitamente
razoável.
— Meu amigo, disse Delfim, eu não vi ainda êsse
negócio. Mas de ante-mão lhe declaro que concordo com
a negativa de meu Ministro, que é um homem honrado e
inteligente e zela muito pelo interêsse público.
— Então V. Excia. não me dá o seu apôio?
— Para êsse contrato com o govêrno, impugnado
pelo Ministro, não. Para fazer uma Santa Casa em minha
terra, conte comigo. Se o Sr. contribuir com duzentos
contos, darei vinte contos... embora seja pobre.
E quando o milionário negocista ia saindo, Delfim
ainda lhe disse sorrindo:
— Olhe lá, amigo, não se esqueça da Santa Casa dex
minha terra.
O milionário negocista nunca mais procurõu o pre­
sidente e nem falou mais em Santa Casa.
»» 63
TERCEIRA PARTE
SÍMBOLOS DA NACIONALIDADE O
(1) Esta parto i formada do excertos das monografias escritas sflbrc
Caxias, Rui, Bilao o Rio Branco, respeotivamoute por Sílvio Romero, Medeiros
o Albuquerque, Mário de Alencar e Lauro Müler, e de um capítulo sôbre
a Baudeira Nacional.
DUQUE DE CAXIAS
(Estado do Rio, 1803-1880}
Alves de Lima nasceu na Vila da Estrela, na pro­
víncia do Rio de Janeiro, em 1803. Fez bem aproveitados
estudos na antiga Academia Militar, concluindo-os em
1819 'no posto de alferes.
Em 1822 era tenente-ajudanle do Batalhão do impe­
rador, e foi fazer a campanha da independência da Baía,
que se estendeu até 2 de Julho de 1823.
O moço militar, ao lado de Labatut, deu grandes
provas de valor. Já se vê que os seus trabalhos pela, pá­
tria começam desde os bons tempos da mocidade na
época da nossa emancipação.
67 *****
Em 1825 partiu para a província Cisplalina a com­
bater a insurreição dirigida por d. Juan Lavalleja e por
Oribe, dois caudilhos indisciplinados e turbulentos. Ai
portou-se galhardamente.
Em 1831, por ocasião da revolução de 7 de Abril,
conservou-se fiel à causa do soberano até que êste o
dispensou de quaisquer sacrifícios, ordenando-lhe que
se fosse unir a seus camaradas revoltados.
Alves de Lüna, que servia antes de tudo à nação,
cumpriu as ordens do primeiro imperador. Durante o
período regencial êle prestou importantíssimos serviços
que andam aí desconhecidos pela ingratidão da indisci­
plina partidária. Foi êle o principal garantidor da ordem,
criando o chamado batalhão de oficiais soldados para
policiamento da capital, quando Diogo Feijó, com cora­
gem digna de ser imitada, dissolveu diversos corpos do
nosso exército em 1832.
Foi Alves de Lima que bateu os revoltosos do Rio
de Janeiro aos 3 e aos 17 de Abril daquele ano. I
Em 1837 foi combater os revoltados do Rio Grande,
cuja final derrota se lhe tinha de dever mais tarde. Em
1838 partiu para o Maranhão, encarregado de missão
igual.
Combatida admiravelmente a revolução desta úítima
província, Alves de Lima teve de prestar ainda maiores
serviços em 1842 em São Paulo e logo após em Minas. I
Restabelecida a paz por todo o país, restava apenas
a revolta dos valentes republicanos do Rio Grande do
Sul.
»*»* 68 «««
0 então já barão de Caxias partiu em 1843 para
alí o em 1846 a paz remava naquelas paragens.
Estava restabelecida a ordem no interior, e cum­
prida a primeira parte do programa, do reinado do se­
gundo imperador. '.
Mais tarde se realizaria a segunda parte: a guerra
ao despotismo caudilheiro das repúblicas do Prata e do
Paraguai. - iui
Em 1851 Caxias transportou-se para o Estado Orien­
tal e derrotou alí o famigerado Oribe, e logo no ano se­
guinte na República Argentina destroçava também .o
ainda mais famigerado tirano Rosas.
A musa da história deve-se vestir de galas sempre
que memorar tão grandiosos feitos, que ultimaram a li­
bertação definitiva da América do Sul, e permitiram o
progresso das duas nacionalidades, que se deveríam sem­
pre lembrar acom jubilosa gratidão do incalculável ser­
viço que nós os brasileiros lhes prestámos.
Não era, porém, tudo; Caxias tinha outra missão
ainda a cumprir.
Em 1867 apresentou-se êle no Paraguai a coman­
dar nossas forças em guerra aberta contra o govêrno do
despótico ditador Solano Lopez.
A campanha durava desde 1865; o exército, sob as
ordens de Mitre, estava desmoralizado.
Caxias obroir tão atiladamente, que pouco depois o
general argentino, que, pelo nefasto e desolante tratado
da tríplice aliança, tinha o direito de comandar ’ nossas
forças, dez vezes superiores às de sua nação, retirou-se, 
69 *****
deixando toda a liberdade de ação ao grande tático bra-,
sileiro.
A campanha mudou logo de aspecto; a disciplina
reapareceu forte em nossas forças, c a vitória começou-
a seguir-nos passo a passo, como se fôra fiel aliada
nossa.
A história dessa guerra, a todos os respeitos gran­
demente memorável, ainda está por fazer. O nome de
Caxias há de sair de suas páginas etemamente aureo-
lado. ■
O velho general esteve na altura de seu ilustre re­
nome.
Os feitos bélicos multiplicaram-se como por encanto .
sob suas vistas. Tuiu-cué, Paré-cué, Curupaití pela se­
gunda vez, Pilar, Rojas, Palmares, Potreiro Ovelha, Taií(
Tuiutí, Humaitá, Estabelecimiento, Sauces, Chaco, Novo
Estabelecimiento, Timbó, Tebiguarí, Vila I^anca, Suruí-
hi, Piquirici, Itororó, Itapané, Avaí, Lomas Valentinas,
Angustura e Assunção foram o teatro de belos feitos de
nossos bravos soldados, sob a direção do mais ilustre
de seus chefes.
»»«♦ 70 <««
Rio Branco
BARÃO DO RIO BRANCO
(Cidade do Rio, 1845-1912)
Para a paz e para a liberdade, que não existem
sem justiça, devem nortear-se os destinos nacionais;
mas no roteiro de todas as travessias há riscos e perigos
que só a prudência previdente, com o auxílio da cora­
gem, sabe evitar ou vencer.
listas e outras novas qualidades existiam vigorosas
na alma de Rio Branco.
No interior elevou-nos na admiração de todas as >
nossas grandezas que lhe era prazer favorito recordar;
na solicitude da sua acolhida a quantas iniciativas acre­
ditava alevantadas; na cortezia fidalga do seu dizer e 
71
das suas ações; na sua alma de Mecenas, acolhedora de
talentos e admiradora de todas as artes que, mormente
pela visão e pela audição, nobilitam o homem e digni-
ficam a espécie.
Foi bom para os que careciam de proteção; foi ge­
neroso para os que necessitavam de assistência. I
No exterior o seu nome ficou indelével na memória
dos governos com que lidámos, como a encarnação de
uma política brasileira e humana, defensora dos direitos
é dos brios nacionais, obediente aos princípios que no-
bilitam as relações entre as potências.
Entre os povos do continente a sua memória alcan­
çou culto e estima de uns, admiração e respeito de todos.
Longos anos de ação intensa no govêmo, absorvidos
no estudo e solução de problemas, tantas vezes graves
o melindrosos, deixaram naturalmente margem a re­
parose divergências.
Nenhum dêles, ainda que justo, diminuiría um de­
grau sequer à sua estátua.
A história não terá que sentenciar sôbre os seus
méritos, porque a glória de Rio Branco passou triunfal­
mente em julgado nos aplausos de um povo inteiro, en­
quanto vivo o tivemos, e na tristeza e angústia de todos
os lares brasileiros no dia lutuoso em que de nós se foi.
Rui Barbosa chamou-o de «o deus Términus (x). da
nacionalidade»..
(1) Deus Términus, isto 6, a divindade das fronteiras.
»*»» 72 ♦««
Rui Barbosa
RUI BARBOSA
(Baía, 1849-1923)
Rui Barbosa foi o mais prodigioso talento verbal do
nosso meio contemporâneo. Ninguém como êle para
achar imediatamente a fórmula exata de expressão para
qualquer idéia.
Isso não é, como a alguns se pode afigurar, uma
tarefa secundária. Muitas verdades não se difundem, por
falta de alguém que as saiba trazer à plena luz e impô-
las. à convicção dos homens. Rui o fazia sempre de um
modo superior. O que êle exprimia — exprimia de for­
ma tal que convencia e persuadia mesmo os mais re­
beldes.
73
Êsse poder enorme êle o pôs ao serviço das mais
belas e das mais nobres idéias. Foi uma fôrça viva de:-
nossa civilização. Sempre que nos debatíamos nas tre­
vas, podíamos procurar confiantemente aquele alto farol.
De mais, êsse homem prodigioso foi um trabalhador
formidável, um trabalhador incansável. Êle era o labo­
rioso metódico, que se levantava todos os dias às 4 horas
da madrugada e sem um desfalecimento trabalhava três
horas seguidas. E isso era, por assim dizer, a dose mí­
nima de trabalho quotidiano, por que, depois, pelo dia
adiante, êle voltava ao serviço com uma infatigável.
constância.
Êsse exemplo é admirável.
Os que só conheceram Rui Barbosa na tribuna ou
pelos seus escritos, podem, muitas vezes, tê-lo achado
agressivo e intransigente, com o orgulho de quem não
admite contestações. ,
Na realidade, porém, tratado de perto, Rui era o
mais dócil e brando dos homens. Ouvia de qualquer pes­
soa qualquer objeção e atendia-a sem o menor enfado.
Era bom e meigo. Era de” uma simplicidade encantadora.
E isso tinha tanto de meritório quanto êle vivia no
meio da adoração fanática dos seus e de alguns ínti­
mos, adoração que faria perder a cabeça a outro menos
cheio de mérito do que êle.
Patriota ardente, cidadão exemplar, paladino da
liberdade, advogado genial, trabalhador incansável, êle
é um símbolo da nossa nacionalidade. Foi um mestre de
civismo.
Olavo Bilac
OLAVO BILAC
(Cidade do Rio, 1863-1918)
Inspetor escolar, secretário da Prefeitura, secretário
do Congresso Internacional, Bilac foi modelar em dili­
gência, exatidão e método de trabalho. Trabalho adminis­
trativo, incumbência que tomasse a seu cargo, particular
ou pública, era desempenhada com a nitidez pontilhosa
com que êle compunha os seus versos. O artista des­
dobrou-se também num paciente construtor de dicionário,
e o orador acadêmico surgiu um dia construtor de civis­
mo. Foi a surpresa que mais irritou os que não podiam
ou não queriam entender a irisação de um espírito lumi­
noso. Não lhe levariam a mal que êle se desvanecesse 
75
em malícias, em malignidades, em diatribes, ou em coisa
nenhuma; enfadaram-se, porém, injuriaram-no porque a
sua poesia, que até alí enlevava os leitores de poesia,
derivara, numa guinada improvisa de entusiasmo, para
uma eloquência que tocava e comovia a gente do povo, '
Os seus discursos eram como ruflar de asas no espaço !
azul; e cá de baixo não queriam que ouvissem, e acompa­
nhassem com os olhos palpitantes os sons alados do seu
surto. Acendeu-se a raiva dos que não podiam voar tão
alto e tão.à vista de todos; mas a glória do cantor elo­
quente foi subindo sôbre a grita dos raivosos. O poeta,
no entanto, não se deixou perturbar de novo renome:
feita a sua obra, não se aproveitou do que ela lhe daria
ao menor aceno de seu desejo. Olavo Bilac foi em vida
uma Ave contente de ouvir cantar as outras aves que
iam surgindo, a-pesar-de que a sua voz se velava em
melancolia por pressentir na tarde o seu ocaso verda­
deiro. E assim acabou.
Viveu cantando como os pássaros canoros das flo­
restas tropicais e pôs as suas melodias encantadoras ao
serviço da pátria, apontando à mocidade o pavilhão, do
Brasil, que tremulava nos quartéis.
Foi um grande propagandista do serviço militar. |
76
BANDEIRA DO BRASIL
(19 de Novembro)
Cada povo do mundo tem um símbolo para repre­
sentar a sua Pátria: é a Bandeira.
Na Bandeira estão -reunidos todos os grandes senti­
mentos nacionais. Ela é a figura viva, material, visível,
resumida, de um dos mais nobres predicados humanos:
o amor da Pátria.
A Igreja tem santos, e festeja-os em certos dias
do ano. Em Janeiro, por exemplo, é São Sebastião
que a Igreja comemora; em Junho, o queridíssimo
São João; em 31 Dezembro, o popular São Silvestre.
0 Catolicismo quis escolher um dia do ano que fosse
um conjunto de comemorações religiosas, abrangendo to-
77 «*>
DESCOBERTA DA AMÉRICA
(12 de Outubro de 1492)
O Govêrno do Brasil decretou o dia 12 de Outubro
como dia de festa nacional. Porque? Porque foi nesse
dia que se descobriu a América. Como foi? Eis a his­
tória:
Havia em Portugal um fidalgo que era grande conhe­
cedor dos mares: Bartolomeu Perestrelo, donatário da
ilha de Pôrto Santo. Em 1470 apareceu em Lisboa um 
81 *****
moço genovês. Como Perestrclo era de origem geno-
vesa, acolheu muito bem o patrício de seus antepassW
dos. Tal moço era Cristóvão Colombo. Afeiçoando-séq
à jovem Filipa Moniz Perestrelo, filha do fidalgo na­
vegador, com ela se casou Colombo. Aperfeiçoou com
o sogro seus conhecimentos marítimos e com a leitura
de vários livros de cosmografia e geografia, entre os
quais as «Viagens», de Marco Polo, imaginou um gran­
de plano: descobrir o Oriente, navegando pelo Ocidente.
Organizado um roteiro, recorreu à sua cidade, Gênova,
pedindo os recursos para a viagem. Riram-se. dêle.
Andou, então, de côrte em côrte. Os reis de Portugal,
Espanha, França e Inglaterra não lhe deram importân-,
cia. E todos caçoavam de Colombo, apelidando-o —5
negociante de mundos. Um dia, encontrou o franciscanò.
frei João Peres, que o compreende
da rainha, exercendo sôbre ela .
grande influência moral, conseguiu
a sua 'proteção para o genovês.
Mas, como o proteger contra a
vontade do rei, do arcebispo de
Toledo e de toda a côrte? A rai­
nha encontrou um meio/empe­
nhou suas jóias a um banqueiro
de Utrecht e forneceu a Colombo
navios, dinheiro e uma centena de
•homens práticos do mar. Assim, 
no dia 3 de Agosto de 1492, Cristóvão Colombo, coman­
dando três caravelas {Santa Maria, Nina e Pinta), saiu 
Colombo.
i. Antigo confessor
w* 82 «+«
do porto espanhol de Paios com o fim de descobrir uma
nova terra. E navegou para o ocidente. E os dias se pas­
savam entre as águas e o céu. No fim de pouco mais de
dois meses, os marinheiros revoltaram-se. O capitão pro­
metera-lhes uma terra nova e só viam águas e mais
águas. Não continuariam. Queriam voltar para Espanha.
Serenamente, sabendo que a terra surgiría em breve,
Colombo os conteve, pedindo-lhes mais um dia de prazo.
Alvoreceu o dia seguinte, 12 de Outubro de 1492. Já
a marinhagem se preparava para nova revolta, quando
um grito ecoou: Terra!
— «Terra! Terra!», bradaram todos, loucos de ale­
gria.
Ao longe, no horizonte, se destacava a linha escura
e sinuosa de uma terra e as manchas azuladas de algu­
mas montanhas'. Estava descoberta a América.
Colombo desembarcou numa ilha, a que chamou
São Salvador (arquipélago das Lucaias). Guanahani, era
o nome indígena. Fez ã cerimônia da posse em nome da
Espanha. Adiantou-se mais, descobriu ainda duas ilhas
— Cuba e Haiti — chamando-lhes Hispaniolas, E
levando consigo selvagens, animais e coisas da nova
terra, voltou à Espanha. Aí chegou em Março de 1493,
desembarcando como um triunfador, aclamado pelo povo
e saudado pelo rei, pela rainha e pelos fidalgos.
w» 83 *****
Descobrimento do Brasil — Quadro de Oscar Pereira da Silva
O DESCOBRIMENTO DO BRASIL
(22 de Abril de 1500)
Em 9 de Março de 1500, depois de uma cerimônia
soleníssima,embarcou em Lisboa o nobre português
Pedro Álvares Cabral, assumindo o comando de uma
esquadra de 13 naus. Estas navegaram para o sul até
o Cabo Verde. Na ilha de S. Nicolau, arquipélago de
Cabo Verde, a esquadra esperou, debalde, durante dois
dias, uma das naus que se transviara. No dia 25 de Mar­
ço Cabral resolveu dirigir-se, não mais para o sul, e sim
para o ocidente, rumo da América. Assim fez por alguns
dias, depois mudou novamente de direção, seguindo pa­
ra o sudoeste. No dia 21 de Abril um marinheiro deu o
alarma de terra; junto às naus se encontravam ráí-
ww 84 «««
ru-zes c folhagens, e por cima das naus aves marinhas ru-
fkavain as asas. No dia 22, ao longe, no ocidente, se divi-
sou o contorno seguro de uma ter­
ra, e dominando-a, uma elevação
azulada. Era um monte. Batiza­
ram-no logo com o nome de Mon­
te Pascoal, por ser èsse dia a quar­
ta-feira da Páscoa. Estava desco­
berto o Brasil. Aproximando-se
da costa, a esquadra não achou
logo um abrigo, o que a fez na­
vegar um pouco mais para o
sul, onde encontrou uma belíssima
enseada. Batizou-a por isso com
Segn/ro. No dia 26, capitão e marinheiros assistiram,
num ilhéu, à primeira missa que se disse em terri­
Pedro Álvares Cabral
o nome de Porto
tório brasileiro. Rezou-a o capelão de bordo frei Hen­
rique de Coimbra. No dia l.° de Maio o capitão mandou
colocar as armas de Portugal numa grande cruz de ma­
deira e fê-la levantar, tomando assim posse da terra em
nome de Portugal. Em seguida ouviu a segunda missa
(Jue se rezou no Brasil. Depois dessa solenidade a ma-
rinhagem se recolheu a bordo, preparando-se para pros­
seguir a viagem no dia seguinte, enquanto o capitão-mór
da esquadra e o escrivão Pedro Vaz Caminha, escre­
viam ao rei, dando notícias da descoberta. No dia 2 se,-
guiu a esquadra em direção da Ásia.
Terra de Vera-Cruz foi o primitivo nome da nossa
Pátria; depois ferra de Santa Cruz, e, finalmente, o 
85
nome aluai de Brasil, por haver nela abundância dum
pau vermelho, chamado pau-brasil. Mas, se foi em 22
de Abril que se fez a descoberta, por que a comemo­
ramos em 3 de Maio? Por uma determinação da primeifâ
Assembléia do Império, observada tradicionahnente, há
mais de um século... 0 dia 3 de Maio é aquele em que a
Igreja Católica comemora o descobrimento da cruz em que
padeceu Jesús, descobrimento êsse feito por Santa Hele­
na. E foi Santa Cruz o primitivo nome de nossa Pátria.
Essa comemoração não representa, portanto, o dia
exato da descoberta do Brasil, mas o dia da Cruz, sím­
bolo sacrosanto, que, pintado nas bandeiras d’el-rei d.
Manuel I, era o sinal de posse nas terras conquistadas.
— 86
FUNDAÇÃO DA CIDADE DO SALVADOR (BAÍA)
{1549}
Em 1549, Tomé de Sousa foi. nomeado governador I
geral do Brasil, com a incumbência de fundar uma cida­
de no norte, que servisse de capital da então Colônia. E. ;
fundou a Baia.
Sôbre a encosta se abriam obliquamenle duas ladei­
ras, hoje denominadas do Pau da Bandeira e da Miseri­
córdia, que conduziam dêste à praia até às portas' da
cidade, de uma e outra parte dela. A mesma cidade
coroava a chapada de norte a sul, desde o local, que foi
dado para colégio dos Padres da Companhia, até o em
que, sob a invocação de N. Senhora da Ajuda, se edi-
ficou a primeira capela matriz. E -aí, roçado o mato,
Tomé de Sousa, como prudente capitão que era, se foi
aproveitando dêle para fazer tuna forte tranqueira, com
a qual desde logo ficassem os colonos ao abrigo das in-
constâncias do gentio. — Terraplenado um tanto o lo­
cal, traçou as ruas e praças, fez a distribuição de di­
ferentes solares, marcando ò dos paços do concelho, da
casa do govêmo, e da das contas. Para a primeira vi-
venda dos colonos, construiram-se provisoriamente, com
a ajuda de muitos índios, alguns como lujupares cobertos
Fundação da Capitania de São Vicente — Quadro de B. Calixto
FUNDAÇÃO DA CIDADE DE SÃO VICENTE.
A MAIS ANTIGA DO BRASIL
{22 de Janeiro de 1532')
Em 1532 o rei de Portugal, D. João II, enviou ao
Brasil unia pequena esquadra, sob o comando de Mar-»
tim Afonso de Sousa. E foi êsse capitão português que
fundou a 1.® cidade no território brasileiro: São Vicente.
Na tarde de 22 de Janeiro de 1532 as naus entra­
ram num canal e pouco depois a gente de bordo de­
sembarcava íiunia praia, chamada de São Vicente.
João Ramalho não estava nesse local, porém An­
tônio Rodrigues, companheiro de Ramalho, pois am­
bos habitavam, como degredados ou náufragos, o ter­
ritório vicentino, apresentou-se ao capitão-mór Martim
Afonso, dando-lhe informações de tudo, oferecendo-s'e
para auxiliá-lo. ' • -/..'í'
Em poucos dias construiram-se as primeiras casas,
uma capela e um fortim. E essa foi a primeira cidade
do São Paulo e do Brasil.
w» 87
Ohegada de Totaé de Sousa | Baía
»»» 89 «««
de palmas. Depois tratou Tomé de Sousa de dar mais
solidez à cêrca, substituindo-a por uma forte muralha de
taipa, com duas torres para o lado do mar e quatro pe­
la banda da terra, de que já não restavam vestígios al­
guns manifestos nesse mesmo século, segundo Gabriel
Soares.
A êste arraial, ainda apenas em princípio, deu o
primeiro governador geral do Brasil o religioso nome de
«Cidade do Salvador», e assim se lhe chama em todos
os documentos contemporâneos, e não cidade de S. Sal­
vador, como hoje dizem, talvez porque êsse nome foi o
■preferido na bula da criação do bispado. — Ao mesmo
tempo deu à futura cidade por armas, em um campo
azul, uma pombinha, tendo no bico run ramo de oliveira
com a divisa: «Sie illa ad Arcam reversa est.» — E em
verdade a cidade do Salvador era efetivamente o símbolo
da paz com que o Senhor acudia ao Brasil. Ao luga­
rejo primitivo junto à barra ficou por muito tempo
chamando Vila Velha, sendo que com tão poucos anos
precedera a nascença à da sua orgulhosa vizinha. Esfa,
dentro de alguns meses, já contava cem casas regulares,
todas no alto; pois que as da praia tão expostas, a-pesaf
da muralha, a ser soterradas por algum desmoronamento,
já se construiram muito depois, em virtude das exigên­
cias do comércio, que se ocupa mais do presente que dh
futuro. 0 terreno da cidade foi fixado, na conformidade
do próprio regulamento dado a Tomé de Sousa, a dis­
tância de seis léguas para cada banda, excetuando-se
as terras já doadas.
90 «+«
Fundação de São Paulo — Quadro de Oscar P. dá Silva
FUNDAÇÃO DA CIDADE DE SÃO PAULO
{25 de Janeiro de 1554)
O governador geral do Brasil,
Tomé de Sousa,, veiu à capitania
de São Vicente em princípios de
1553. Recebido com grandes fes­
tas pela população de São Vicente
e de Santos, tomou diversas pro­
vidências sôbre a defesa dos co­
lonos, o povoamento do litoral e a
escravidão dos índios. Subiu ao
planalto de São Paulo, determinou Anchieta
que a povoação de Borda do Cam­
po, fundada por João Ramalho, passasse a vila, logo
que concluísse certas obras de defesa, o que aconteceu
w» 91
Manuel âa Nóbrega
em 8 de Abril de 1553, com o nome de Vila de Santo
André da Borda dó Campo. Junta­
mente com o governador geral viera
a São Vicente o padre Manuel da
Nóbrega, então vice-provincial da
Companhia de Jesús no Brasil, acom­
panhado do padre Francisco Pires e
de alguns noviços. Nóbrega teve a
idéia de se embrenhar pelo sertão
com seus companheiros, mas com
isso não concordou Tomé de Sousa.
Vindo aos campos de serra-acima da capitania de São
Vicente, encontrou um belo
sítio para dêle se fazer um
centro de catequese. Queren­
do isolar os índios converti­
dos e os noviços catequistas,
não se instalou na vila de
Santo André, e fez uma casa
num lugar que se chamava
Piratininga, distante da vila,
mais pu menos, uma légua.
Ajudaram-no dois chefes ín­
dios, saindo da povoação de
João Ramalho: Caiubí e Ti-
biriçá (sogro de João Rama­
lho). A notícia espalhon-se
pela capitania, e os índios,
perseguidos pelos colonos, João Ramalho
Parte de um quadro de Parreiras
92
que os procuravam escravizar, afluiam a Piratininga
Mandou Nóbrega o padre Leonardo Nunes buscar mais
missionários na Baía e êste os
trouxe em Dezembro de 1553; Pi­
ratininga aumentava cada vez
mais.Depois enviou a Roma o
mesmo padre Leonardo Nunes
com o fim de obter do Geral
da Ordem a licença necessária
para a fundação de um colégio em
Piratininga. Nunes não pôde dar
cumprimento’ à incumbência, por­
que naufragou logo ná saída de 
Santos e morreu com outros companheiros. Então Nó­
brega nomeou provincial de Piratininga o. padre Manuel
de Paiva, incumbindo-o de fundar um colégio. Os treze
religiosos (e entre êles Anchieta) que,compunham a mis­
são piratininguense escolheram o alto de uma colina, de
onde se descortinava toda a redondeza, e aí construiram
uma capela e o colégio, inaugurando-os no dia 25 de
Janeiro de 1554, sob a invocação do santo do dia, São
Paulo, apóstolo dos gentios.
Piratininga ficava um pouco longe e seus habitantes,
abandonando-a, passaram-se para a colina do colégio de
São Paulo. Depois os habitantes de Santo André fizeram
o mesmo. Nas proximidades da Igreja dos Jesuítas foram
aumentando as casas.
E assim se formou uma nova povoação, com o sacri-
Assis Cintra — Alma Brasileira.
ficio das primitivas povoações de Piralininga e Sanlo
André da. Borda do Campo, que desapareceram. Em pou­
co tempo a nova povoação fundada pelos padres Manuel
de Paiva e José de Anchieta, foi elevada à categoria dé
vila, com o nome que tivera o colégio — São Paulo.
O Oolégio de Suo Paulo, construído pelos jesuítas*
FUNDAÇÃO DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO
(I.° de Março de 15Ç5')
Data de 1564 a primeira tentativa formal de povoa­
mento do Rio de Janeiro. Para tal fim foi expedida do
Tejo, pela regência de d. Catarina d’Áustria, uma esqua­
drilha sob o comando do capitão-mor Estácio de Sá,
sobrinho do governador geral do Brasil, com dois ga­
leões, bem providos de gente e apetrechos de guerra,
devendo receber na Baía ulteriores instruções de seu tio,
Men de Sá.
Chegando ao Rio de Janeiro, fundearam os navios
de Estácio de Sá nas proximidades da entrada da baía, 
95 *****
de onde fez o reconhecimento das posições do inimigo.
Auxiliado fortemente na organização de seus ele­
mentos pelos jesuítas, padres Manuel da Nóbrega e José
de Anchieta, assim como pelo ouvidor geral Braz Fra­
goso, conseguiu Estácio de Sá, com muita dificuldade e
longa demora em São Vicente, reunir uma leva de perto
de 200 homens de combate.
A 28 de Fevereiro, surgiu enfim a nau capitania,
com mais três navios trazendo provisões de bôca, e, reu­
nidos todos, entraram a l.° de Março, na preamar, pelo
pôrto do Rio de Janeiro, fundeando em terra chã no
istmo da península e várzea do morro Cara de Cão, onde
fica atualmente a fortaleza de São João.
No mesmo dia da chegada, Estácio de Sá pernoi­
tou em terra com os seus; junto ao pico a que se deu o
nome de Pão de Açúcar, e apressou-se em lançar os
fundamentos da cidade de São Sebastião.
Para êsse fim, mandou roçar a terra e cortar ma­
deira e fez construir uma forte cêrca ou tranqueira em
tôrno do arraial, para defendê-lo contra as surpresas do
inimigo. E, só havendo no local uma lagoa infeta, man­
dou o capitão-mor abrir na praia uma cisterna, que em
pouco se encheu de água abundante das chuvas.
Em poucos dias cresceu o arraial, com a constru­
ção de ranchos ou tujupares de taipa de sebe, à maneira
das malocas selvagens, e fizeram-se algumas roças de
milho, inhame e mandioca.
Cada homem da tripulação, desde Estácio de Sá,
em pessoa, ao último grumete, todos, sem exceção, in­
w» 96 +««
clusive os padres José de Anchieta e Gonçalo de Oli­
veira, trabalharam com entusiasmo nas construções, le-
nhando, cavando foêsos, carregando aos ombros pe-
drouços e tóros de madeira, batendo a estacaria, levan­
tando casas de pau a pique, com paredes rústicas, co­
bertas de folhas de coqueiro.
Conquistou-se, do lado do norte, parte do ‘ golfo •
próximo, à qual se deu o nome de Francisco Velho
(hoje praia do Botafogo), por ser o do colono que pri­
meiro a desbravou.
Ao novo núcleo de povoação foi dada desde logo
a categoria de cidade, denominada de São Sebastião,
em homenagem ao santo mártir e seu padroeiro, como
em memória ao rei de Portugal. A cidade teve, pois, o
seu primeiro fundamento em l.° de Março de 1565 e não
a 20 de Janeiro de 1567, data, esta última, da decisiva
vitória de Men de Sá contra os Tamóios e os franceses.
A carta de Anchieta, datada de 9 de Julho de 1565,
esclarece completamente êsse ponto: — «Logo no dia
seguinte que foi o último de Fevereiro ou o primeiro de
Março, começaram a roçar em terra».
Assim, a cidade do Rio de Janeiro foi fundada em
l.o de Março de 1565, e não em 20 de janeiro de 1507,
data que é comumente repetida, e até aceita como verí­
dica nas comemorações cívicas.
97
OS BANDEIRANTES
Das primeiras cidades fundadas no Brasil resulta­
ram a expansão territorial da nossa Pátria. Foram os
famosos «bandeirantes», partidos de São Paulo e da
Baía, os heróis do Brásil colonial que aumentaram o
território nacional, para o lado da cordilheira dos Andes.
Sem êles, o Brasil seria hoje um terço do que é.
Entre os primeiros bandeirantes destaca-se Braz
Cubas, fundador de Santos, hoje o segundo pôrto do
Brasil, sendo o Rio de Janeiro o primeiro.
Muitos foram os bandeirantes notáveis. Vejamos o
que fez um dos primeiros dêsses bravos conquistadores
de sertão, que foi Braz Cubas:
***** 98 *****
Logo que visitara em 1560 a capitania de S. Vi­
cente, determinou Men de Sá que se tratasse de abrir,
de Piratininga para o interior, um caminho que, sendo
possível, fosse coincidir com o que, da Baía, já se pro-
- curava levar no mesmo rumo.
Para isso formou-se tuna expedição regular, mu­
nida principalmente de aparelhos e instrumentos com
que se explorasse o sertão à procura de ouro.
Tendo-se-lhe reunido como auxiliar ura engenheiro
(Luiz Martins), partiu Braz Cubas, com muitos portu­
gueses e grande número de índios, no mês de Junho,
tomando rumo norte, a alcançar as cabeceiras do S.
Francisco.
Procurou o rio Paraíba; e desceu por êste até o
caminho por onde os índios costumavam ir da Guana­
bara para o interior. '
Seguiu por êsse caminho, atravessando a Manti­
queira, até o rio que se chamou, depois, das Velhas,
e por êste abaixo, foi sair rto S. Francisco.
Desceu êste durante alguns dias; mas apavorado
da enchente, que começou a impedir-lhe a viagem, re­
solveu voltar.
Desta excursão sempre se colheu algum proveito,
tendo-se até remetido para a côrte amostras de ouro.
E mais feliz foi ainda Luiz Martins, que tomou a
entrar no sertão, e descobriu minas «no caso de serem
lavradas». E agora em vários pontos... «a umas trinta
léguas de Santos»... ‘ &
Outro bandeirante notável foi Fernão Dias, cuja his­
tória está nestes versos:
»»» 99
A «BANDEIRA» DE FERNAO DIAS C)
Para o norte inclinando a lombada brumosa,
Entre os nateiros jaz a serra misteriosa;
A azul Vupabussú beija-lhe as verdes faldas,
E águas crêspas, galgando abismos e barrancos
Atualhados de prata, humedecem-lhe os flancos
Em cujos socavões dormem as esmeraldas.
Verde sonho!... é a jornada ao pais da Loucura!
Quantas bandeiras já, pola mesma aventura
Levadas, em tropel, na ânsia de enriquecer!
Em cada tremedal, em cada escarpa, em cada
Brenha rude, o luar beija à noite uma ossada,
Que vêm, a uivar de fome, as onças remexer...
Que importa o desamparo em meio do deserto,
E essa vida sem lar, e êsse vaguear incerto
De terror em terror, lutando braço a braço
Com a inclemência do céu e a dureza da sorte?
Serra bruta! dar-lhe-ás, antes de dar-lhe a morte,
As pedras de" Cortez que escondes no regaço!
E sete anos, de fio em fio destramando
O mistério, de passo em passo penetrando
0 verde arcano, foi o bandeirante audaz...
— Marcha horrenda! derrota implacável e calma,
Sem uma hora de amor, estrangulando na alma
Toda a recordação do que ficava atrás!
(1) Poesia de Olavo Bilac.
100
A cada volta, a Morte, aíiando o olhar faminto,
Incansável no ardil, rondando o labirinto
Em que às tontas errava a bandeira nas matas,
Cercando-a com o crescer dos rios iracundos,
Espiando-a no pendor dos boqueirões profundos,
Onde vinham ruir com fragor as cascatas,
Aqui, tapando o espaço, entrelaçando

Continue navegando