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1 Curso de Especialização em Geoprocessamento, Levantamento e Interpretação de Solos APOSTILA Introdução à Ciência do Solo @os autores 2 Introdução à Ciência do Solo Fábio Soares de Oliveira Lúcia Helena Cunha dos Anjos José João Lelis Leal de Souza i Apresentação Prezado(a) estudante, Seja bem-vinda e bem-vindo à disciplina Metodologia Científica e Introdução à Ciência do Solo, que foi dividida em duas partes. Na primeira parte, a disciplina aborda os principais procedimentos e aspectos da pesquisa científica, como os tipos e a normalização de trabalhos acadêmicos. Na segunda parte, a disciplina trata especificamente da Ciência do Solo, e apresenta como essa é organizada, seu histórico e a definição do seu principal objeto de estudo: o solo. Para a primeira parte da disciplina foram utilizados materiais públicos sobre o tema de metodologia científica, disponibilizados pelos docentes. O material no texto a seguir apresenta os conteúdos relacionados à introdução à Ciência do Solo. Para o melhor aproveitamento dos estudos, esse material foi organizado em três unidades, que são: Unidade 1: A Ciência do Solo Unidade 2: A Pedologia Unidade 3: O Solo Cada unidade apresenta um conteúdo específico, que se associa à unidade seguinte. No conjunto, elas trazem os conhecimentos necessários para que você compreenda o que é a Ciência do Solo, o que é a Pedologia, como elas se relacionam, o que é o solo e quais suas principais funções. ii Assista ao vídeo de apresentação da disciplina “Metodologia Científica e Introdução à Ciência do Solo”, disponível no Ambiente Virtual de Aprendizagem. Nele você conhecerá os docentes e encontrará as informações gerais sobre o curso. A leitura do material deve contemplar as informações que foram dispostas nos textos, nos quadros, gráficos e imagens. É muito importante que você observe todos os materiais, pois eles foram organizados para sintetizar e/ou ampliar os conteúdos aqui abordados. Além disso, foram indicados ao longo do material ícones que lhe ajudarão a ampliar seus conhecimentos sobre os temas discutidos. Eles incluem informações complementares, recomendações de leituras extras, sugestões de vídeos e materiais audiovisuais. O significado de cada link é apresentado a seguir. No mais, desejamos bons estudos a todos e todas!! iii Sumário Unidade 1 .................................................................................................. 1 A Ciência do Solo ....................................................................................... 1 1.1 O que é a Ciência do Solo ................................................................................. 2 1.2 As áreas da Ciência do Solo ............................................................................. 3 1.3 A Sociedade Brasileira de Ciência do Solo (SBCS) ...................................... 7 1.3.1 Breve histórico da SBCS ............................................................................. 8 1.3.2 Missão e objetivos da SBCS .................................................................... 11 1.3.3 Estrutura cientifica da SBCS .................................................................... 12 Unidade 2 ................................................................................................ 15 A Pedologia ............................................................................................... 15 2.1 O que é Pedologia ............................................................................................. 16 2.2 Breve histórico da Pedologia no mundo ........................................................ 18 2.3 Breve histórico da Pedologia no Brasil .......................................................... 26 Unidade 3 ................................................................................................ 32 O solo .......................................................................................................... 32 3.1 O que é solo ....................................................................................................... 33 3.2 As funções do solo ............................................................................................ 37 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................. 40 SOBRE OS AUTORES ............................................................................................. 42 1 Unidade 1 A Ciência do Solo Caro(a) estudante, Para começarmos a entender o solo, vamos primeiro apresentar como se organiza a ciência que o estuda. Nessa unidade apresentaremos a Ciência do Solo como um ramo do conhecimento em que o principal objetivo é estudar o solo em suas mais diversas manifestações, tendo como orientação os métodos científicos já discutidos na primeira parte da disciplina. Para isso, destacaremos quais seriam as áreas que compõem a Ciência do Solo, e como, no Brasil, ela se estrutura cientificamente na Sociedade Brasileira de Ciência do Solo. Conteúdo Programático 1.1 O que é Ciência do Solo 1.2 As áreas da Ciência do Solo 1.3 A Sociedade Brasileira de Ciência do Solo Objetivos Esperamos que você, ao final dessa unidade, seja capaz de: Compreender a ciência do solo como um campo da ciência que tem o solo como objeto de estudo; Reconhecer as áreas que compõem a Ciência do Solo; Reconhecer como se organiza a Sociedade Brasileira de Ciência do Solo. 2 1.1 O que é a Ciência do Solo A Ciência do Solo pode ser definida, em sentido mais amplo, como uma ciência que tem o solo como objeto de estudo. Nessa perspectiva, interessa o estudo do solo a partir do uso de métodos científicos, que podem até variar ao longo do tempo e entre as diferentes áreas do planeta, mas que possuem em comum o interesse por compreender o solo em suas mais diversas manifestações. Isso quer dizer a Ciência do Solo busca a compreensão de múltiplos aspectos relacionados ao solo, incorporando a complexidade intrínseca a ele, mas também os interesses dos(as) cientistas que o estudam. Um exercício interessante seria pensar em questões feitas pelos(as) cientistas do solo. Essas questões ilustram esses múltiplos interesses e nos fazem ter a dimensão da grandiosidade da Ciência do Solo. Algumas delas seriam: Como o solo pode ser definido? Como o solo se forma? Como o solo evolui? Quais sãos os atributos ou propriedades (morfológicas, físicas, químicas, mineralógicas, por exemplo) que caracterizam um solo? Como podemos analisar o solo em laboratório? Como um solo pode ser utilizado para diversos fins (agricultura, produção de fibras e materiais para biocombustíveis, matéria-prima na indústria, construção civil etc.)? Como o solo interage com o ciclo hidrológico? Como o solo interage com o ciclo de diversos elementos químicos, como carbono, fosforo, nitrogênio, entre tantos outros? Como o solo se relaciona com a vegetação? Como o solo pode ser manejado? Como o solo funciona enquanto habitat de diversos organismos? Como o solo pode ser classificado? Como o solo se distribui no espaço? Quais os recursos minerais, genéticos, culturais etc. existentes no solo? 3 Como solo participa da evolução da paisagem, no passado (Paleossolos, por exemplo) e no presente (Tecnossolos, solos antrópicos, por exemplo)? Como os processos que ocorrem no solo afetam as mudanças climáticas globais? Essas são apenas algumas das questões que tornam a Ciência do Solo um ramo do conhecimento cheio de oportunidades de investigações sobre o seu objeto, bem como refletem o caráter multidisciplinar da Ciência do Solo. É por isso, como destacou Espindola(1992, 2007), que ela acaba se ramificando e diversas especializações surgem a partir disso, pois o estudo dos solos pode incluir pesquisas relacionadas a vários aspectos, com muitas interações com outras ciências. Dentro desse cenário, tornar-se um ou uma cientista do solo não ocorre por um caminho único e nem resulta em profissionais que se dedicam ao mesmo tema ou problema. Pensando na formação inicial em nível de graduação, diversas podem ser as áreas do conhecimento que, lidando com o solo, oferecem essa oportunidade. Citamos como exemplos cientistas do solo que tem sua graduação em Agronomia, Engenharia Florestal, Geografia, Geologia, Química, Biologia, Engenharia Ambiental, Educação, Arquitetura etc. Posteriormente, em nível de pós-graduação, tais profissionais se envolvem com programas específicos das ciências do solo, e aí sim passam a se dedicar a responder perguntas como as que foram citadas. 1.2 As áreas da Ciência do Solo Como resultado das muitas abordagens do solo, a Ciência do Solo pode ser dividida em diferentes áreas. Essa organização não é unânime e, certamente, podemos encontrar divergências entre os autores. Contudo, seja qual for a divisão adotada, elas nos dão a noção de como a Ciência do Solo é ampla. Aqui vamos apresentar a Ciência do Solo organizada em áreas que contemplam os temas de pesquisa mais comuns sobre o solo. Essas áreas podem ser visualizadas na Figura 1. 4 Figura 1 – Algumas áreas da Ciência do Solo (Fonte: elaborada pelos autores) 1) A Pedologia aborda a identificação, gênese, classificação e levantamento de solos. Algumas vezes é utilizada como sinônimo de Ciência do Solo. Interessa-se por compreender como os solos são caracterizados, como se formam, como variam no tempo e no espaço, e como podemos, a partir da sua classificação, compreender sua distribuição e a relação solo- paisagem-ecossistemas, bem como avaliar potencialidades e limitações ao seu uso para diversos fins. 2) A Fertilidade do Solo e a Nutrição Mineral de Plantas aborda questões relacionadas ao reservatório de nutrientes minerais e orgânicos no solo, aplicadas, principalmente, ao seu uso agrícola. Algumas vezes é abordada como Edafologia, pois tem como foco a relação solo-planta e os horizontes de constituição organo-mineral que estão na superfície e nos quais se desenvolvem as raízes da maior parte das lavouras. Envolve desde a avaliação da fertilidade do solo, o estudo de fertilizantes, os processos e reações pelas quais as plantas absorvem os nutrientes, até o desenvolvimento dos métodos de análise em laboratório e recomendações para o aumento da fertilidade visando a produção agrícola. 3) A Mineralogia do Solo interessa-se pela gênese, evolução, transformação e interações dos componentes da fração mineral dos 5 solos. Tem forte relação com a cristalografia e química mineral, com especial interesse pelos minerais que ocorrem na fração argila, com ênfase para os que predominam em solos de regiões tropicais. Envolve a aplicação de métodos laboratoriais diversos, como difração de raios-x, análises microscópicas e espectroscópicas, visando caracterizar e quantificar esses minerais. 4) A Física do Solo aborda os constituintes e processos físicos do solo, em especial aqueles ligados aos fenômenos de transferência de massa e energia. Trata dos componentes sólidos, líquidos e gasosos do solo, envolvendo sua caracterização e dinâmica, como, por exemplo, de propriedades da fração sólida, como a granulometria, densidade, coesão etc., comportamento da água no solo e, da mesma maneira, dos gases (atmosfera do solo). 5) A Química do Solo aborda os constituintes e processos associados à dinâmica geoquímica dos solos. Envolve o estudo aprofundado da composição química na interação de superfície da fase sólida com a solução do solo, envolvendo o estudo de equilíbrios químicos, adsorções e dessorções químicas, e casos específicos de solos salinos, cálcicos, sulfatados, drenagem ácida etc. 6) A Biologia do Solo envolve o estudo dos organismos que tem no solo seu principal habitat e, da mesma maneira, do papel dos processos biológicos no funcionamento do solo. É uma área de abordagem ampla, com interesse em compreender, por exemplo, o papel dos organismos nos atributos do solo, mas também de entender a ecologia dos microrganismos e da fauna do solo e sua biodiversidade. Também possui interesse pelo estudo da qualidade do solo através de indicadores biológicos. 7) A Pedometria é uma área que busca a análise espacial dos solos, incluindo seu mapeamento digital, mas também o uso de variáveis ambientais diversas, aplicáveis a estudos que vão desde a predição de atributos até a discriminação de classes de solos no espaço. A área faz uso corrente de ferramentas estatísticas e geoestatisticas, sistemas de 6 informações geográficas, sensores orbitais e técnicas de modelagem para o estudo dos solos. 8) O Manejo e Conservação do Solo e da Água é uma área cuja preocupação central é o estudo das técnicas de manejo do solo e da água nele contida, visando aumento de produtividade aliada com a manutenção da sua conservação, ou seja, com sustentabilidade. Assim, envolve o desenvolvimento e a aplicação de técnicas de cultivo, de práticas conservacionistas e do planejamento do uso do solo, com forte aplicação na agricultura e pecuária e na proteção de ecossistemas e mananciais hídricos. 9) Solos Florestais é uma área de interface com a ciência florestal que aborda a aplicação dos conhecimentos sobre solos para a prática da silvicultura. Tem como aplicação central o estudo dos processos pedológicos e biológicos em florestas naturais e plantadas, com técnicas de manejo especificas para esses sistemas. Destacam-se temas como ciclagem de nutrientes e dinâmica do carbono em florestas. 10) A Matéria Orgânica do Solo é uma área aplicada ao estudo de um constituinte específico. Envolve temas como a ciclagem do carbono no solo, a composição e dinâmica da matéria orgânica do solo, funcionamento físico e químico da matéria orgânica, interações com a biota, manejo da matéria orgânica, entre outros. Dentre os temas atuais de maior relevância nessa área está o sequestro de carbono e a maneira como as práticas humanas têm afetado esse processo, com implicações nas mudanças climáticas globais e na emissão de gases de efeito estufa. 11) A Educação em Solos é uma área que se dedica aos estudos sobre a abordagem do solo em distintos contextos educacionais, desde a educação formal, em níveis de ensino básico e superior, até a educação não formal, voltada ao público em geral. Aborda a popularização da Ciência do Solo e a promoção de estudos que visem desenvolver práticas de conscientização da importância do solo para a vida no planeta. Se debruça sobre desenvolver e aperfeiçoar materiais didáticos e paradidáticos. 7 12) Por fim, temos a Etnopedologia, uma área onde são abordados os conhecimentos de solos a partir de distintas comunidades tradicionais e seus saberes. É uma área que busca compreender como outros grupos, que não os(as) cientistas do solo, entendem a formação e caracterização do solo, e como o classificam e o utilizam. São abordados os sistemas conceituais dessas comunidades e sempre que possível realizado o diálogo entre tais conhecimentos e aqueles produzidos dentro da academia. O Brasil possui 12 programas de pós-graduação diretamente relacionados à Ciência do Solo, que oferecem cursos de mestrado e doutorado stricto sensu. Esses programas estão dispostos nas regiões sul (4) sudeste (5) e nordeste (3) do Brasil. Por sua vez, todas as regiões geográficas são contempladas quando considerados que existem ao menos 39 programas de pós-graduação que abordam a temática ‘Ciência do Solo’– geralmente concentradosem cursos de pós-graduação em Agronomia. Na Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), que é o órgão governamental responsável pela avaliação e suporte à Pós-Graduação no Brasil, esses programas estão concentrados na área de Ciências Agrárias I, subárea Ciência do Solo. Esse curso é o primeiro ofertado como especialização lato sensu, sob o tema “solo” e na modalidade de Educação a Distância (EaD) no país e por universidades públicas. [Fim de “Você sabia?”] 1.3 A Sociedade Brasileira de Ciência do Solo (SBCS) Uma maneira prática de compreendermos como a Ciência do Solo se organiza no Brasil é analisar como está estruturada a Sociedade Brasileira de Ciência do Solo, também conhecida por sua sigla, SBCS. Essa Sociedade é um órgão que congrega profissionais e instituições de todo o Brasil dedicados ao estudo científico do solo e, desde o seu início, tem como objetivo melhorar a comunicação e divulgação científica da ciência do solo. A seguir apresentaremos brevemente um pouco do seu histórico, princípios e missão e posteriormente a estrutura cientifica da SBCS. 8 1.3.1 Breve histórico da SBCS ‘A SBCS foi criada em outubro de 1947 com a Assembleia de aprovação e a primeira Reunião Brasileira de Ciência do Solo, realizadas no salão de conferências do Instituto de Química Agrícola do Rio de Janeiro, no bairro do Jardim Botânico, cidade do Rio de Janeiro, prédio onde hoje é a sede da Embrapa Solos. Sua criação foi motivada pelos pesquisadores Álvaro Barcelos Fagundes, que foi o seu primeiro presidente, Alcides Franco e Raul Edgard Kalckmann, por meio de proposta apresentada pela recém-criada Comissão de Solos do Centro Nacional de Ensino e Pesquisas Agronômicas (CNEPA), e pelos demais membros fundadores (total de 31 sócios). A SBCS foi a primeira sociedade nacional de ciência do solo fundada na América Latina. A Sociedade Latino-Americana de Ciências do Solo (SLCS) foi criada em 1954. Ao longo de sua existência, a SBCS foi responsável pela organização dos eventos sobre solos no Brasil, em especial o Congresso Brasileiro de Ciência do Solo (CBCS), com 38 edições até este ano de 2023. Desde o início, a Sociedade se vinculou à extinta Comissão de Solos, pertencente ao CNEPA, participando do principal objetivo dessa Comissão, que era o de realizar levantamentos de solos no país e elaborar a Carta de Solos do Brasil. A SBCS, através de seus sócios, tem atuado diretamente em todas as ações que envolvam a pesquisa e a divulgação em ciência do solo no Brasil, contribuindo para diversas políticas públicas neste tema. Seus membros e comissões têm participação ativa na criação e aperfeiçoamento do Sistema Brasileiro de Classificação de Solos (SiBCS), coordenado pela Embrapa Solos e com a sua primeira edição em 1999. Nos primeiros 30 anos da SBCS, em que a Sociedade esteve sediada na cidade do Rio de Janeiro, foram organizadas 15 edições do Congresso Brasileiro de Ciência do Solo, nas cidades Rio de Janeiro, Campinas, Recife, Belo Horizonte, Pelotas, Ilhéus, Piracicaba, Belém, Fortaleza, Piracicaba, Brasília, Curitiba, Vitória, Santa Maria e Campinas. Após 1975 um novo Estatuto foi criado, e a SBCS teve sua sede alterada para Campinas, no Instituto Agronômico de Campinas (IAC). Esse estatuto veio acompanhado pelo primeiro regimento e pela normatização das funções da secretaria executiva. Dentre os destaques desse período em que a gestão da SBCS em Campinas está a criação do 9 Boletim Informativo, em 1975, e da Revista Brasileira de Ciência do Solo, 1977, até hoje um dos principais veículos de divulgação da pesquisa na Ciências do Solo do Brasil. Entre 1975 e 1994 foram realizadas 11 edições do Congresso Brasileiro de Ciência do Solo, nas cidades São Luiz, Manaus, Salvador, Curitiba, Belém, Campinas, Recife, Porto Alegre, Goiânia e Viçosa. Conheça a Revista Brasileira de Ciência do Solo (RBCS): Acesse: https://www.rbcsjournal.org/ [Fim de “Multimídia”] A partir de 1997 a sede da SBCS é transferida para a cidade de Viçosa, onde permanece até a atualidade. Com essa transferência, foram investidos esforços para a melhoria dos sistemas de comunicação, bem como uma segunda versão do Regimento foi lançada em 2012 e do Estatuto em 2013, que foram ambos revisados em 2021. As reformulações incluíram uma internacionalização da SBCS, que ficou mais próxima da União Internacional de Ciência do Solo (IUSS) e da Sociedade Latino-americana de Ciência do Solo (SLCS). Dentre as principais mudanças, houve a organização da Sociedade em núcleos regionais, sendo que na atualidade, além dos eventos nacionais, são realizados, com apoio da SBCS os encontros e simpósios regionais de solos. Entre os eventos nacionais da SBCS estão a Reunião Brasileira de Manejo e Conservação do Solo e da Água (RBMCSA); o Simpósio Brasileiro de Educação de Solo (SBES); a Reunião Brasileira de Classificação e Correlação de Solo (RCC); e a Reunião Brasileira de Fertilidade do Solo e Nutrição de Plantas, Reunião Brasileira sobre Micorrizas, Simpósio Brasileiro de Microbiologia do Solo e Reunião Brasileira de Biologia do Solo (Fertbio). Estes eventos científicos são organizados por seus sócios e instituições parceiras. Houve também a expansão das publicações organizadas pela Sociedade, com diversos livros textos lançados, que são obras de referência da ciência do solo no Brasil, e um selo específico, o Tópicos em Ciências do Solo. 10 Na atualidade, os sócios da SBCS se distribuem em diferentes áreas de formação e de todas as regiões do Brasil. A SBCS está organizada em nove Núcleos Regionais ou Estaduais, sendo eles: Amazônia Ocidental, Amazônia Oriental, Nordeste, Noroeste, Centro-Oeste, Leste, São Paulo, Paraná e Sul. Possui diversos títulos publicados na forma de livros, manuais e guias, bem como o Boletim Informativo (até 2019) e a NewsLetter (a partir de março de 2020), estes últimos trazendo textos técnicos sobres temas em ciência do solo e as principais notícias para a comunidade de Ciência do Solo. Ainda, a RBCS, com fator de impacto JCR de 1,566 e classificada como Qualis A3, na área de Ciências Agrárias da CAPES, possui abrangência internacional. A RBCS é o único periódico científico no país dedicado exclusivamente à Ciência do Solo, com uma história que se inicia em 1977. É nesse contexto que a SBCS se consolida na atualidade como uma das mais importantes sociedades cientificas do Brasil. Para saber mais sobre a história da SBCS, consulte os livros: “Sociedade Brasileira de Ciência do Solo: um olhar sobre sua história”, disponível em chrome- extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://www.sbcs.org.br/wp- content/uploads/2015/07/Sociedade-Brasileira-de-Ci%C3%AAncia-do-Solo-UM-OLHAR-SOBRE- SUA-HIST%C3%93RIA.pdf “Os fundadores da Sociedade Brasileira de Ciência do Solo: uma síntese biográfica. Barbosa, Julierme. 2023. SBCS, Viçosa, UFV. Disponível em: https://www.sbcs.org.br/ ou através do link: https://www.sbcs.org.br/wp- content/uploads/2020/12/livrofundadores_23_02_2023_12_00_39_id_40445.pdf Para acessar os Boletins e as Newsletters da SBCS consulte os links: https://www.sbcs.org.br/?post_type=boletim e https://www.sbcs.org.br/?post_type=newsletter [Fim de “Saiba mais”] 11 1.3.2 Missão e objetivos da SBCS A missão da SBCS é desenvolver a Ciência do Solo no Brasil contribuindo, através de atividades de pesquisa, extensão e ensino, para o desenvolvimento do país e da sociedade brasileira. Com base nisso, os objetivos da SBCS são: Promover e incrementar a aproximação e o intercâmbio intelectual daqueles que atuam na pesquisa, no ensino, na divulgação ou em atividades técnicas para o conhecimento e melhor utilização do solo e da água no Brasil. Difundir o conhecimento dos métodos científicos e das técnicas racionais de exploração, tratamento e conservaçãodo solo e da água. Tratar da adequação e uniformização da nomenclatura e representação do solo, bem como dos métodos de análise e seus controles de qualidade. Colaborar e zelar para o aperfeiçoamento do Sistema Brasileiro de Classificação de Solos e para a implementação de ações de Levantamentos de Solos no Brasil. Estimular a formação de Bibliotecas Especializadas, Museus e Centros de Referência de Solos. Assista aos vídeos no link do YouTube da SBCS (https://www.youtube.com/@sbcssolos3656/featured). São 28 vídeos incluindo lives em que os especialistas discutem temas contemporâneos importantes e mostram um pouco da história da SBCS e de atividades em seus núcleos. Siga também a SBCS em suas mídias sociais: https://www.instagram.com/sbcs.solos/?hl=pt-br https://www.facebook.com/sbcs.solos https://twitter.com/sbcs_br [Fim de “Multimídia”] 12 1.3.3 Estrutura cientifica da SBCS A estrutura cientifica da SBCS é organizada em Divisões Temáticas que, por sua vez, são separadas em Comissões. Cada divisão possui uma direção e uma vice direção, e cada comissão uma coordenadoria e uma subcoordenadoria. Os temas das divisões refletem as principais áreas de atuação da Ciência do Solo, e as comissões fazem analogia às áreas que a compõem, como abordado no item 1.2. Assim, podemos reconhecer a estrutura da Ciência do Solo tendo como base a SBCS. A Figura 2 apresenta a estrutura científica da SBCS. A análise da diversidade de comissões nos dá a visão do amplo campo de atuação da Ciência do Solo. Conforme já apresentado, esse fato não só reflete como essa ciência tem muito a contribuir, mas também a complexidade do solo enquanto objeto de estudo. Como um componente físico da paisagem, o solo é abordado por diferentes áreas do conhecimento, e suas aplicações nessas áreas são múltiplas, indo desde os conhecimentos diretamente ligados a agricultura, de interesse direto para a economia do país, àqueles de ordem ambiental, social e cultural. A Ciência do Solo busca enfrentar esse desafio e, por isso, reveste-se de um caráter multidisciplinar com diversos olhares voltados ao um objetivo comum: entender o solo. 13 Figura 2 – Estrutura científica da SBCS – Sociedade Brasileira de Ciência do Solo, organizada em divisões temáticas e suas comissões. (Fonte: Elaborada pelos autores) 14 Nesta unidade você conheceu um pouco sobre a Ciência do Solo, sua conceituação, áreas e como ela se estrutura cientificamente na Sociedade Brasileira de Ciência do Solo (SBCS). Vimos que: A Ciência do Solo pode ser definida como uma ciência que tem o solo como objeto de estudo, e realiza seu estudo a partir de métodos científicos; O solo é um componente que interessa a diversas áreas profissionais e sua abordagem envolve muitos aspectos. Por isso a Ciência do Solo se torna uma área do conhecimento ampla, possível de ser subdividia em diversas subáreas. Aqui apresentamos essa divisão de forma resumida: o Pedologia: aborda a identificação, gênese, classificação e levantamento de solos e sua interpretação para diversos fins. o Fertilidade do Solo e a Nutrição Mineral de Plantas: aborda questões relacionadas ao reservatório de nutrientes minerais e orgânicos no solo. o Mineralogia do Solo: aborda a composição mineral da fase sólida do solo. o Física do Solo: aborda os constituintes e processos físicos do solo. o Química do Solo: aborda os constituintes e processos associados à dinâmica geoquímica dos solos. o Biologia do Solo: aborda os organismos que tem no solo seu principal habitat e o papel dos processos biológicos no funcionamento do solo. o Pedometria: aborda a análise espacial dos solos, incluindo ferramentas computacionais e modelagens. o Manejo e Conservação do Solo e da Água: aborda as técnicas de manejo do solo e da água e as práticas conservacionistas. o Solos Florestais: aborda o estudo de solos voltado para a prática da silvicultura. o Matéria Orgânica: aborda a composição e dinâmica dos constituintes orgânicos do solo, com ênfase no carbono. o Educação em Solos: aborda a produção do conhecimento sobre o solo em distintos contextos educacionais. o Etnopedologia: aborda os conhecimentos de solos a partir de distintas comunidades tradicionais e seus saberes. A Sociedade Brasileira de Ciência do Solo (SBCS) congrega profissionais de todo o Brasil dedicados ao estudo científico do solo. Foi criada em 1947, e tem como missão desenvolver a Ciência do Solo no Brasil, contribuindo, através de atividades de pesquisa, extensão e ensino, para o desenvolvimento do país e da sociedade brasileira. É responsável pela organização de eventos e publicações cientificas. Dentre eles destacamos o Congresso Brasileiro de Ciência do Solo e a Revista Brasileira de Ciência do Solo. A SBCS é organizada em núcleos regionais e estaduais que se integram à sua secretaria executiva. Na atualidade sua organização científica é composta por quatro divisões temáticas com suas respectivas comissões. As divisões são: o 1 – Solo no tempo e no espaço o 2 – Processos e propriedades do solo o 3 – Uso e manejo do solo o 4 – Solos, meio ambiente e sociedade [Fim de “ Em síntese”] 15 Unidade 2 A Pedologia Caro(a) estudante, Nessa unidade discutiremos a Pedologia como uma das áreas da Ciência do Solo com o foco nos estudos de gênese, classificação e levantamento de solos. Para isso, apresentaremos um breve histórico de como a Pedologia se estruturou enquanto área do conhecimento científico no mundo e no Brasil. Conteúdo Programático 2.1 O que é Pedologia 2.2 Breve histórico da Pedologia no mundo 2.3 Breve histórico da Pedologia no Brasil Objetivos Esperamos que você, ao final dessa unidade, seja capaz de: Compreender o que é a Pedologia; Conhecer um pouco da história da Pedologia no mundo e no Brasil; Reconhecer a importância da Pedologia enquanto área do conhecimento dentro da Ciência do Solo. 16 2.1 O que é Pedologia Etimologicamente, a palavra Pedologia tem origem grega e vem da junção de pedon, que quer dizer solo, e logos, ou estudo. Assim, Pedologia pode ser simplificadamente definida como estudo do solo. O uso pioneiro da palavra é atribuído a Friedrich Albert Fallou (1794-1877), que embora tenha sido advogado de formação, interessava-se por estudos da natureza, publicando diversos trabalhos sobre o tema (Fallou 1855, 1857, 1862, 1875 etc), sendo mais conhecida a obra em que defende a necessidade de criação de uma ciência especifica para tratar dos solos, intitulada Pedologie oder allgemeine und besondere Bodenkunde, ou Pedologia ou Ciência do Solo geral e especial (Fallou, 1962). Conforme destaca Ker et al. (2012), podemos pensar na Pedologia como um ramo científico da Ciência do Solo que aborda os estudos relacionados à identificação, formação, classificação e mapeamento dos solos. Essa também pode ser entendida como a posição adotada pela maior parte das pedólogas e pedólogos brasileiros, que através da sua instituição representativa, a SBCS, tem a Pedologia inserida na Divisão 1, intitulada Solo no espaço e no tempo, principalmente nas Comissões 1.1 e 1.2, respectivamente Gênese e morfologia do solo e Levantamento e classificação do solo. Assim, podemos pensar que os interesses da Pedologia caminham no sentido de compreender o que é o solo e como ele se forma, elucidando o papel de fatores ambientais e processos físicos, químicos e biológicos envolvidos, como o solo interage com outros elementos na paisagem, como ele se organiza morfologicamente, como pode ser classificado e como se distribui no espaço e no tempo. Tais conhecimentos são de grande utilidade para toda a Ciência do Solo, pois envolvem aplicações em diversos campos de atuação, incluindo a agricultura, a pecuária, a preservação ambiental, oplanejamento de uso dos espaços urbanos e rurais, a construção civil, a indústria da mineração, a produção de medicamentos, a aplicação cultural por populações tradicionais, a compreensão da evolução da paisagem, e diversas outras. Por esse motivo a Pedologia interessa a diversas outras ciências, como Agronomia, Geografia, Geologia, Engenharia, Arqueologia e Antropologia, Biologia, Ecologia, Medicina etc. 17 Dada a amplitude dos temas abordados pela Pedologia, é de se esperar que para produzir conhecimentos sobre o solo ela enfrente o desafio de se relacionar com diversas outras áreas do conhecimento (Figura 3), bem como incorporar conceitos, técnicas e instrumentos diversos. A Pedologia é uma ciência dinâmica, como o solo, e tem se transformado constantemente. Assim, considerando que o solo é um componente multifatorial, tema que será discutido em outra disciplina deste curso, produzir conhecimentos sobre ele é trabalhar com uma ciência multidisciplinar por essência. Figura 3 – Relação dialógica entre a Pedologia e outras áreas do conhecimento, evidenciando que essas áreas produzem conhecimentos importantes para a Pedologia e vice-versa. (Fonte: Elaborada pelos autores) Da mesma maneira, o conhecimento gerado pela Pedologia tem sido chamado para contribuir com a resolução de diversos problemas socioambientais em que o solo se faz presente, ampliando ainda mais os desafios e a abrangência dessa ciência. Conforme destacou Oliveira et al. (2022), ao lidar com os problemas da sociedade tão diversos, e ao se comportar como uma ciência multidisciplinar, a Pedologia permite que cientistas de outras áreas do conhecimento se identifiquem com ela, tornando-se também pedólogos e pedólogas, e ao mesmo tempo, num movimento retroalimentador, ela contribua 18 para o crescimento dessas outras áreas (Figura 3). Tais constatações nos levam a perceber que a Pedologia é mais atual e necessária que nunca. Assista ao vídeo O que é pedologia - IBGE Explica, disponível no Youtube, na página https://www.youtube.com/watch?v=fjfI6YOifBc Assista ao vídeo: Live - Pedologia e ambiente: conhecimento de solos e suas aplicações, na página https://www.youtube.com/watch?v=BwnHfZCKm20 [Fim de “Multimídia”] 2.2 Breve histórico da Pedologia no mundo O solo tem sido objeto de interesse do conhecimento humano desde que as populações do passado deixaram de ser nômades e passaram a lidar com ele mais diretamente, seja através de observações do comportamento das plantas, da prática da horticultura, do seu uso como matéria-prima para a fabricação de cerâmica ou extração de pigmentos minerais utilizados nas pinturas rupestres (Figura 4). Fato é que desde os menores grupos humanos da pré-história às grandes civilizações orientais e ocidentais, o conhecimento sobre o solo era produzido, e quase sempre mediado pelas experimentações motivadas pelas necessidades de sobrevivência. Essa interação era tão grande que algumas populações chegaram a “construir” solos a partir de intervenções diretas, como é o caso das Terras Pretas Arqueológicas e os Solos de Sambaqui no Brasil. As Terras Pretas foram inicialmente reconhecidas na região amazônica, sendo também identificadas como Terras Pretas Amazônicas ou Terra Preta do Índio (Figura 4), onde se concentram, mas não são exclusivas desses ambientes, ocorrendo também em diversos outros biomas brasileiros e em outros países da América do Sul e no mundo. Da mesma maneira, os Solos de Sambaqui estão distribuídos ao longo do litoral brasileiro e no interior do continente sul americano na margem de diversos rios. 19 Figura 4 – Exemplo de diversas interações entre grupos humanos do passado e os solos, destacando: a) diferentes cores de pinturas rupestres na parte superior de um dos painéis da Lapa do Desenho, Parque Nacional Cavernas do Peruaçu, Januária/Itacarambi, MG, que revelam pigmentos contendo componentes minerais retirados do solo; b) fragmentos de cerâmica arqueológica sendo escavados em sítio localizado na região dos Currais de Pedra, Lagoa dos Patos, MG, onde sua produção envolveu o uso de argilas retiradas do solo; c) Terra Preta Arqueológica na região de Soure, Ilha de Marajó, Amazônia e d) Solo de Sambaqui da região de Quatipuru, Pará; ambos produzidos por populações pré-coloniais. Fonte: imagens a e b: os autores; imagens c e d: Renata Jordan. Espindola (2018) nos fornece diversos exemplos sobre a produção de conhecimentos sobre o solo, antes mesmo da institucionalização da Pedologia como área do conhecimento científico. Esses exemplos são sintetizados no Quadro 1 e a diversidade de exemplos apresentada nos alerta para o fato de que não podemos confundir o surgimento da Pedologia, enquanto área do conhecimento científico, com o início da produção de conhecimentos sobre o solo. Entender o solo sempre foi uma inquietação humana, e gerar conhecimento sobre ele é um fato mais antigo que a Pedologia em si. Nesse caso, o surgimento da Pedologia deve ser entendido como o início da institucionalização do estudo dos solos, ou seja, “a cristalização de uma ciência autônoma” nos dizeres de Espindola (2014, 2018), representada pela formação de profissionais específicos treinados em instituições acadêmicas, e que desenvolvem pesquisas a partir de métodos científicos. Esse movimento, tido como início da Pedologia, ocorre no final do século XIX. 20 Quadro 1 – Síntese de exemplos apresentados por Espindola (2018) que representam conhecimentos gerados por estudos sobre os solos antes da institucionalização da Pedologia como ciência. Quem e quando? O que? Fonte bibliográfica Livro chinês de Yugong, 2.500 ac Solos eram diferenciados pelas cores, texturas e hidrologia. Gong, 1989 Conde de Buffon, Séc. XVI Descreveu um solo ferruginoso rico em minerais secundários e grânulos esféricos de óxidos de ferro e manganês. Feller et al., 2003 Lomonosov, em 1763 Abordou o conceito de solo como um corpo geobiológico formado num longo espaço de tempo, com distintas camadas geradas por fatores climáticos e organismos. Hartemink, 2010 Lineu (1707-1778) Aventou coberturas vegetais distintas nas diferentes terras, sendo considerado um importante divulgador do papel do solo na natureza. Yarilov, 1910 Humboldt, 1789 Atribuiu a possibilidade de se descobrir determinado tipo de solo a partir da caracterização de plantas e rochas associadas. Wilde, 1963 Darwin, 1838 Mostrou a atuação de minhocas no solo de uma escavação romana na produção do mould, reproduzido num corte vertical com camadas denominadas A-B-C-D. Johnson, 1990 Gasparin, 1840 Considerou o solo uma camada diferenciada da superfície da Terra, cuja natureza petrográfica revelava o “solo ativo” (zona de grande atividade de raízes) e o “solo inerte”. - Hassenfratz (1755-1827) Defendia que o carbono das plantas provinha inteiramente de uma fração solúvel do solo (húmus). Feller et al., 2001 De Saussure, 1804 Provou que a porção essencial do carbono provinha do ar atmosférico, mas que uma porção reduzida poderia provir do húmus. Feller et al., 2001 Thaër, 1811 Sintetizou a “teoria do húmus”, valorizando a gestão orgânica (ganhos e perdas) na fertilidade do solo. Feller et al., 2001 Liebig, 1840 Desmontou o conceito de que a nutrição de plantas se dá via “solução do solo”, com o transporte de carbono, oxigênio e hidrogênio pelo ar e pela água, o que passou a ser concebido como “teoria mineral, ou mineralista”. Feller et al., 2001 Hitchcock, 1838 Assinalou a influência das rochas na natureza dos solos, registrando solos arenosos, barrentos, argilosos calcários, terciários e aluviais. Feller et al., 2001 Hilgard, 1860 Relacionou substratos a produções agrícolas, e destacou solo e subsolo nos mapeamentos. Feller et al., 2001 De Beletskii, 1895 Escreveuo livro em russo sobre a “Origem dos solos, composição e propriedades: tipos de solos, classificação, potencialidades e mapeamento”. Dobrovol’skii & Rozhkov, 2009 Fallou, 1853 Cogitou uma ciência autônoma específica para tratar dos solos. - 21 Conforme já destacamos no item anterior, é atribuído a Fallou (1955) o uso pioneiro do termo Pedologia (Pedologie), bem como da defesa pela necessidade de criação de uma ciência voltada ao estudo dos solos. Contudo, internacionalmente, são os trabalhos desenvolvidos pelo russo Vasili Dokuchaev, em especial seus pioneiros estudos de caracterização do Chernozem, a “terra negra” (DOKUCHAEV, 1883) que dão início ao corpo teórico e metodológico que garantem à Pedologia a configuração de ciência. Mas, o que teria feito Dokuchaev para ser reconhecido como o “pai” da Pedologia? Os trabalhos desenvolvidos por Dokuchaev e sua equipe ao longo dos últimos 20 anos do século XIX não só elucidaram aspectos importantes dos solos utilizados para a produção agrícola na Rússia, mas também resultaram em um arcabouço conceitual que permitiu um redirecionamento do estudo de solos em todo o mundo. DOKUCHAEV (1879) apresenta ao mundo o conceito de perfil de solo, dando a esse uma concepção genética e não apenas morfológica. Segundo ele, o perfil de solo seria formado por camadas, que chamou de horizontes, cuja origem está ligada ao intemperismo de uma rocha e associado a uma posição topográfica do relevo específica. Além disso, postulou que isso seria controlado pela ação do clima e organismos, conforme o que chamou de zonas bioclimáticas. Os grandes avanços dessas constatações podem ser assim destacados: Os solos são formados pela interação entre diversos fatores ambientais. O perfil de solo é uma categoria de análise que expressa a maneira como o solo se formou e, por isso, o estudo dos horizontes pode revelar o papel dos fatores e processos. Estudar o perfil de solo demanda que a Pedologia seja realizada em parte no campo, ou seja, no ambiente de ocorrência do solo, com posterior complementação de análises de laboratório. A variação dos tipos de solos no espaço pode ser explicada pela variação dos seus fatores de formação e, por isso, podem ser estabelecidos modelos de distribuição do solo na paisagem. 22 Além dos trabalhos que levam aos novos conceitos e modelos de origem sobre solos e procedimentos para seu estudo, os trabalhos de Dokuchaev resultaram em esforços para criar ou aprimorar sistemas de classificação dos solos. Com base na Lei da Zonalidade Bioclimática, foi proposto um sistema de classificação de solos em zonais, azonais e intrazonais (SIBIRTSEV 1895; Resende et al., 2012). Isso levou a uma efervescência da Escola de Pedologia Russa, onde muitos outros trabalhos foram desenvolvidos. Espindola (2018) destaca os seguintes: gênese e classificação dos solos (Glinka, 1916; Polynov, 1923; Neustruev, 1927; Afanasiev, 1927; Zakharov, 1927; Prasolov, 1937; Rode, 1947); ações do clima e outros fatores do meio (Gerasimov, 1933; Gerasimov e Glazovskaya, 1960); matéria orgânica (Tyurin, 1937; Kononova e Aleksandrova,1958). De acordo com Dokutchaev (1879) os solos poderiam ser classificados em três classes principais: Classe A = solos normais (zonais) que respondem completamente às condições físico-geográficas e geobiológicas da região ou da zona onde se acha o solo. Classe B = solos transitórios (azonais) não respondendo totalmente ao conjunto normal das condições físico-geográfica e geobiológicas da região onde se encontram. Classe C = solos anormais (azonais) relacionados mais de perto com as formações geológicas subjacentes: solos pantanosos, solos aluviais, solos eólicos tanto de loess como de dunas. Esses conceitos, embora ainda encontrados em muitos livros didáticos, não são largamente aplicados aos solos mais intemperizados nos ambientes tropicais. Esse é o caso do território brasileiro, em que a formação dos solos é um resultado de processos que se iniciaram muito antes da própria separação do continente da América do Sul da África, no antigo Gondwana; portanto, envolvendo diversos paleoclimas. A tradução dos trabalhos russos para outros idiomas, em especial o inglês, bem como as valiosas conferências internacionais onde tais resultados eram apresentados, levaram a disseminação de conceitos e procedimentos para 23 outros países. Com base nisso, a Pedologia começa a se desenvolver ao longo da primeira metade do século XX com a ampliação dos levantamentos de solos em distintas partes do planeta e, da mesma maneira, dos conhecimentos sobre a atuação dos fatores em ambientes distintos daqueles existentes no território russo, como, por exemplo, as áreas subtropicais do hemisfério norte e tropicais da Ásia. Esses trabalhos culminam na sistematização do modelo multifatorial de Dokuchaev por Hans Jenny, em 1941, que tratou o solo através da expressão: S (solos) = f (material de origem, clima, relevo, organismos, tempo). Essa expressão, que tem suas origens nos trabalhos de Dokuchaev e de sua escola, será mais amplamente conhecido na disciplina que aborda a Pedogênese: fatores e processos de formação do solo. Como a atuação dos fatores conduzem a processos físicos, químicos e biológicos que levam à formação do solo, um movimento tomado pela Pedologia, sobretudo nos países de língua inglesa, foi desenvolver estudos que aprimorassem a compreensão dos processos pedogenéticos. Esses investimentos têm nomes reconhecidos, como Joffe (1936) com seu livro Pedology, posteriormente revisitado por Simonson (1959) que deu à teoria dos processos gerais de formação do solo um reconhecimento mundial. Não demorou muito para que os processos gerais fossem detalhados em processos específicos, resultando no aprimoramento de muitos sistemas classificatórios através do reconhecimento de horizontes diagnósticos, como ocorreu nos Estados Unidos com a publicação – Soil Taxonomy: A Basic system of soil classification for making and interpreting soil surveys, desenvolvido pela Equipe de Levantamento de Solos (Taxonomia do Solo: um sistema básico de classificação do solo para fazer e interpretar levantamentos de solo, título traduzido pelos autores; Estados Unidos, Soil Survey Staff, NRCS, 1975, 1999). O mesmo ocorreu com o mapa de solos do mundo, publicado em 1969, em vários volumes, pela FAO e a Sociedade Internacional de Ciência do Solo, que deu origem ao sistema internacional World reference base for soil resources (WRB, IUSS Working Group, 4ed. 2022). Esses fatos marcam o fortalecimento de uma Escola Anglo-Saxônica de Pedologia, que teria forte influência sobre a formação de cientistas do solo em todo o mundo, inclusive no Brasil, e no 24 Sistema de Classificação de Solos Brasileiro – SiBCS (Santos et al., 2018), que será tratado em outra parte do curso. Concomitante, o avanço das pesquisas pedológicas em regiões tropicais foi responsável por outros posicionamentos diante da maneira como a gênese do solo era compreendida. Paralelo ao desenvolvimento da Escola Anglo- Saxônica, a Escola Francesa teve seus investimentos centrados em compreender a evolução do solo a partir de um modelo biogeodinâmico (Bocquier, 1973). Sobretudo nos primeiros 20 anos da segunda metade do século XX, foram realizadas pesquisas em diversas áreas tropicais onde a complexidade genética dos solos levou à criação de modelos e procedimentos distintos. Destaca-se a abordagem do solo com um continuum, que tem raízes nos trabalhos de Milne (1934) sobre a Catena, mas que avançam em direção ao conceito de Topossequência, conforme abordado por Boulet et al. (1982), que inclusive propôs o método de Análise Estrutural da Cobertura Pedológica. Embora o perfil de solo seja uma categoria de análise considerada nessa escola, o foco está na distribuiçãolateral dos horizontes, revelando sistemas de transformação de um solo em outro a partir da evolução da cobertura pedológica. Para sistematizar o histórico da Pedologia considerando essa multiplicidade de abordagens, Bocquier (1984) propôs três fases entre a institucionalização da Pedologia na Rússia e o início da década de 1980, quando o texto foi escrito. São elas: Fase 1 – Heranças de Dokuchaev, final do século XIX até 1945 Fase 2 – Renovação da Pedologia, 1945 até 1970 Fase 3 – Renascença da Pedologia, após 1970 O Quadro 2 sintetiza os principais aspectos de cada uma dessas fases. É preciso considerar que uma fase não substitui necessariamente a outra. Ao contrário, trata-se de uma leitura do predomínio de determinados tipos de abordagens sobre o solo, que podem coexistir entre si. 25 Quadro 2 – Síntese da proposta elaborada por Bocquier (1984) de compartimentação da história da Pedologia em três fases. (Fonte: Adaptado de Espindola, 2008). HERANÇA RENOVAÇÃO RENASCENÇA Categoria utilizada para o estudo do solo Perfil Horizonte Continuum (cobertura pedológica) Como o solo se comporta no espaço Como um objeto descontinuo Como um objeto descontínuo, mas que tem variações contínuas Como um objeto continuo com variações estruturas espaço- temporais Métodos de análise Análises globais, indiretas, com reconstituições Análise experimentais Correlações estatísticas Análise direta da constituição Análise sistêmica do funcionamento Modelização-simulação Caracterização analítica Global, por tipos de solos Global, por processos Mecanismos e seu determinismo E ta p as Pesquisa das Relações funcionais externas Relações causais internas com os Fatores de formação Processos pedogenéticos Mecanismos enfoque Funcional-fatorial Sistêmico tipo Zonal-atualista Histórico Determinista ‘ Com base nas informações do Quadro 2, as três fases podem ser assim compreendidas: Na Fase Herança temos o foco no estudo dos solos a partir dos seus fatores de formação, ou seja, estudamos suas propriedades para compreender como eles se relacionam aos ambientes em que ocorrem. Os solos são classificados por suas zonas de ocorrência. Ex.: solos polares, solos de regiões temperadas, solos de regiões tropicais etc. 26 Na Fase Renovação, estudamos as propriedades atuais dos solos para compreender os processos pedogenéticos atuantes, e a partir deles entender a relação processos-fatores. A partir desses processos, determinamos morfologias típicas que são utilizadas para classificar esses solos. Ex: a ocorrência do processo de latossolização leva à formação de horizontes B do tipo latossólicos que nos permitem classificar o solo como Latossolo. Na Fase Renascença, estudamos a variação espaço temporal dos horizontes, para compreender o comportamento do solo como um continuum, e a partir disso entender como as transformações verticais e laterais ocorrem, elucidando os mecanismos que levam a elas. Nesse caso o reconhecimento das sequências pedológicas e dos sistemas de transformação laterais. 2.3 Breve histórico da Pedologia no Brasil Um relato histórico sobre a Ciência do Solo no Brasil é apresentado na publicação recente – The Soils of Brazil (Solos do Brasil), no capítulo 1, de título – Uma breve história da ciência do solo brasileira (A brief history of Brazilian soil science), do qual foram aqui reproduzidos alguns trechos mais diretamente relacionados à história da Pedologia no Brasil. Para leitura complementar vejam Schaefer et al. (2023) e, no capítulo citado, são também destacados alguns documentos tais como: Moniz (1982); Espindola (1992, 2008); Schaefer et al. (1997); Camargo et al. (2010); Bezerra et al. (2015); Barbosa et al. (2020). Segundo os autores (SCHAEFER et al., 2023) a agronomia no Brasil remonta ao início do século XIX como uma subdisciplina da botânica, intimamente associada à química, e posteriormente estabelecida como um novo ramo da ciência. Em meados do século XIX, a química agrícola surgiu a partir desta associação, levando ao estabelecimento da Ciência do Solo. No Brasil, como em diversos países, o tema da Pedologia foi desenvolvido inicialmente nas áreas de conhecimento em Geologia Agrícola, Agrologia, Agrogeologia, Agroecologia, Química Agrícola ou Agricultura Geral (ESPINDOLA, 2010). A pedologia consolidou-se como conhecimento aplicado e científico no Brasil em 27 meados do século XX, quando foi criada a SBCS, através da reunião dos cientistas que trabalhavam neste campo da ciência do solo. Neste item será destacada a história da classificação de solos no Brasil, uma vez que o seu desenvolvimento esteve sempre vinculado ao da Pedologia, com o incentivo as pesquisas buscando maior conhecimentos dos solos tropicais e a execução de levantamentos de solos no Brasil. Assim, a classificação do solo, baseada em conceitos essencialmente pedológicos, iniciou em 1947, com a criação da Comissão de Solos, do Centro Nacional de Ensino e Pesquisas Agronômicas (CNEPA) do Ministério da Agricultura, precursora do atual Centro Nacional de Pesquisa de Solos (CNPS), a Embrapa Solos, a qual tinha por missão fazer o inventário nacional dos solos brasileiros. Em função de prioridades do programa de levantamentos de solos, os trabalhos realizados pela Comissão tiveram, necessariamente, as seguintes características: foram efetuados em escalas pequenas, as unidades mapeadas representavam grandes áreas (Estado) e o nível dos levantamentos foi o exploratório- reconhecimento ou o de reconhecimento. O referencial escolhido para a classificação dos solos brasileiros baseou- se nas publicações de Baldwin et al. (1938) e Thorp & Smith (1949) e outros trabalhos que os sucederam. Tal referencial contudo, mostrou-se inadequado, já no primeiro levantamento efetuado no Estado do Rio de Janeiro (Brasil, 1958), e, em especial, no que lhe sucedeu, São Paulo (Brasil, 1960). Vários dos solos encontrados não se ajustavam ao conceito central de algumas das classes ou, simplesmente, não encontravam qualquer correspondência entre os solos relacionados. O aumento dos levantamentos de solos em vários estados e regiões do Brasil, principalmente nas décadas de 1970 e 1980, evidenciou que a adoção integral de um sistema estrangeiro, tal como os mais difundidos na época: o Soil Taxonomy (Estados Unidos, 1975) e a Legenda da FAO para o Mapa de Solos do Mundo (FAO, 1974), era inapropriada para classificar os solos do território brasileiro, de forma que permitisse identificá-los em classes mais gerais, em níveis taxonômicos elevados, até os níveis inferiores, com classes de solos mais homogêneas. Assim, o desafio para o estabelecimento de um sistema de classificação brasileiro de solos foi assumido, em 1978, pelo então Serviço 28 Nacional de Levantamento e Conservação de Solos - SNLCS (sucessor da antiga Comissão de Solos) da Embrapa, através do Projeto: "Desenvolvimento do Sistema Brasileiro de Classificação de Solos", sob a coordenação do eminente pedólogo Marcelo Nunes Camargo. Com a maior prática em execução de levantamentos de solos, os pedólogos, do atual CNPS, Embrapa Solos, do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), do Departamento de Produção Mineral, do Ministério das Minas e Energia, através do projeto RADAMBRASIL (hoje no IBGE) e de muitas outras instituições no Brasil, com grande contribuição de equipes das Universidades nos levantamentos e na produção de pesquisas pioneiras sobre a gênese dos solos brasileiros, foram sedimentando e aprimorando a concepção sobre classes de solos para atender a particularidades de solos e ambientes brasileiros. A partir de 1980, foi criado um grupo de trabalho no SNLCS, para desenvolver um Sistema Brasileiro de Classificação de Solos, através de aproximações, que eram documentosde trabalho de circulação restrita, visando arrecadar contribuições, críticas e sugestões para serem selecionadas e analisadas pelo grupo de trabalho. Ainda em 1980, a primeira aproximação define propriedades categóricas - muitas delas listadas atualmente como atributos diagnósticos, reações do solo, grupamentos texturais e define 11 classes em primeiro nível, a seguir: i) Classe 1 – solos minerais muito pouco ou pouco desenvolvidos, seja pelo pouco tempo de exposição do material de origem, seja por esse apresentar resistência que não favorece a pedogênese; ii) Classe 2 – solos minerais, com mais de 30 % de argila expansível, pronunciada mudança de volume em função do teor de umidade, intenso fendilhamento, slickensides, gilgai e agregados cuneiformes; iii) Classe 3 – solos minerais, com B incipiente subjacente a qualquer horizonte diagnóstico superficial, exceto o turfoso e o A chernozêmico; iv) Classe 4 – solos minerais, de alta saturação por bases, Ta e horizonte A fraco, A moderado ou A chernozêmico sobrejacente a horizonte B textural; 29 v) Classe 5 – solos minerais, não hidromórficos, B textural imediatamente abaixo de qualquer tipo de horizonte diagnóstico superficial, exceto turfoso; vi) Classe 6 – solos minerais, textural abrupto subjacente a horizonte A fraco, A moderado, A proeminente e A chernozêmico; vii) Classe 7 – solos minerais com Bh, Bhs ou Bs subjacente a horizonte A álbico; viii) Classe 8 – solos minerais, não hidromórficos, com B latossólico; ix) Classe 9 – solos minerais hidromórficos ou que pelo menos apresentam restrição temporária à percolação de água; x) Classe 10 – solos minerais, hidromórficos, com horizonte glei dentro de até 50 cm de profundidade; xi) Classe 11 – solos hidromórficos, pouco evoluídos, orgânicos. Com o avanço das discussões, algumas das classes listadas foram combinadas e outras foram criadas, mas a maioria foi mantida; porém, com evolução significativa nos critérios para a sua classificação. Em 1987, é apresentada uma classificação de solos, na qual estão relacionadas as classes dos níveis mais elevados, com indicação de atributos para uso nos níveis subsequentes (CAMARGO et al., 1987). Foi também relevante para a padronização dos levantamentos, o documento “Critérios para distinção de classes de solos e de fases de unidades de mapeamento: normas em uso pelo SNLCS” (Embrapa, 1988). Após um período de menor intensidade de recursos e projetos para levantamentos de solo no Brasil, em que as atividades da Comissão também foram reduzidas, foi concluída a 4ª Aproximação (Embrapa, 1997) pelo Comitê Executivo de Classificação de Solos. Este documento gerou a versão preliminar do Sistema Brasileiro de Classificação de Solos – SiBCS (Embrapa, 1998), que foi testado, consolidado e divulgado com a sua primeira edição (Embrapa, 1999), com tiragem de mil exemplares, no Congresso Brasileiro de Ciência do Solo, realizado em Brasília, em 1999. A partir desta primeira edição do SiBCS, várias revisões e alterações foram implementadas na medida em que o seu uso se expandia no país, estando 30 no momento em sua quinta edição (Santos et al., 2018) e com uma edição em inglês, ambas lançadas no Congresso Mundial de Ciência do Solo, no Rio de Janeiro, em 2018, organizado pela Sociedade Brasileira de Ciência do Solo. As tiragens das sucessivas edições do SiBCS, entre a segunda e quinta, somam 18 mil exemplares impressos e a quinta edição é um dos documentos com maior número de “downloads” dentre as publicações da Embrapa. Portanto, se comprova o acerto em sua elaboração e sua importância para a Ciência do Solo no Brasil. Atualmente o SiBCS dispõe-se como um sistema aberto, em contínua transformação, baseado na morfologia como expressão de processos pedogenéticos, sendo que existem 13 (treze) classes no primeiro nível categórico. Mais informações sobre o SiBCS serão apresentadas na disciplina Sistema Brasileiro de Classificação do Solo, mais adiante neste curso, ou podem ser consultadas na publicação Santos et al. (2018). Para conhecer mais detalhes do histórico da Pedologia no Brasil, consulte a Linha do Tempo elaborada pela Embrapa, disponível no endereço https://www.embrapa.br/pronasolos/ciencia-do-solo-no-brasil [Fim de “Saiba mais”] Nesta unidade você conheceu um pouco sobre a Pedologia, sua definição, histórico no mundo e no Brasil. Vimos que: A Pedologia é um ramo científico da Ciência do Solo que aborda os estudos relacionados à identificação, formação, classificação e mapeamento dos solos. Para produzir conhecimentos sobre o solo, a Pedologia se relaciona com diversas outras ciências, assumindo um caráter multidisciplinar. A institucionalização da Pedologia como área do conhecimento científico ocorre no final do século XIX, e tem na Rússia sua primeira escola. Foi o cientista russo Vasili Dokuchaev quem deu início ao corpo teórico e metodológico que garantiu 31 à Pedologia a configuração de ciência. Os trabalhos desenvolvidos por ele apresentaram ao mundo os fatores de formação e o perfil de solo, que marcaram profundamente a maneira como os solos foram estuados desde então. Não devemos confundir a institucionalização do estudo de solos a partir da Pedologia, enquanto ciência, com a primeira vez em que conhecimentos sobre os solos foram produzidos. Antes disso, desde as populações humanas pré- históricas, o solo já era objeto de interesse e investigação, principalmente porque estava relacionado a ele uma das atividades mais indispensáveis à vida humana: a produção de alimentos. A história da Pedologia no Brasil se confunde com a do desenvolvimento do Sistema Brasileiro de Classificação de Solos (SiBCS), sendo o Brasil o único país da América do Sul e Central com um sistema nacional, desenvolvido a partir de colaboração entre instituições de pesquisa e universidades para atender as especificidades dos solos e dos biomas brasileiros. [Fim de “ Em síntese”] 32 Unidade 3 O solo Caro(a) estudante, Após conhecer um pouco sobre a Ciência do Solo e a Pedologia, discutiremos o conceito de solo, abordando as diferentes perspectivas sobre ele ao longo do tempo definindo qual o conceito que será utilizado em nosso curso. É importante esclarecer que como qualquer outro componente abordado por muitas áreas do conhecimento, o solo pode ser entendido de maneira distinta conforme o olhar de cada profissional ou da área do conhecimento. Contudo, é preciso definir um conceito de solo para que possamos dar encaminhamento ao curso, e neste caso, utilizaremos o adotado pela Pedologia. Conteúdo Programático 3.1 O que é solo 3.2 As funções do solo Objetivos Esperamos que você, ao final dessa unidade, seja capaz de: Compreender o que é solo; Reconhecer o solo como um produto de síntese; e Reconhecer as múltiplas funções que um solo apresenta. 33 3.1 O que é solo O conceito de solo pode variar conforme a área do conhecimento e sua aplicação. Isso porque se trata de um componente com o qual vários profissionais lidam. Por exemplo, para agrônomos(as) o solo pode estar relacionado ao substrato que sustenta as plantas cultivadas, oferecendo-lhes reserva de nutrientes, ar e água. Para geólogos(as) e engenheiros(as) de minas pode significar o produto da alteração intempérica das rochas, que sob determinados aspectos, contém minerais acumulados em processos supergênicos (com várias origens) passíveis de serem explorados na indústria. Para engenheiros(as) civis, por usa vez, o solo pode representar o material friável a ser compactado para a construção de fundações e/ou manejado em aberturas de estradas, por exemplo. Considerando a Ciência do Solo como um todo, o conceito de solo também sofreu variações ao longo do tempo, porque mesmo internamentea essa, como vimos até aqui, ocorrem interesses e abordagens múltiplas. Nesse caso, Bockheim et al. (2005) destacam que ao longo do tempo as principais definições para solo foram: como um meio para o crescimento das plantas; como produto do intemperismo das rochas, sedimentos ou ainda da transformação de outros solos; como um corpo natural da paisagem que evolui no tempo, com forte registro dessa evolução na sua composição expressa em propriedades químicas, físicas e mineralógicas, além de vestígios dos organismos que nele habitaram; como uma camada descontínua que recobre a litosfera; e como um conjunto composto de sólidos (minerais e matéria orgânica), líquidos e gases, que ocupa um dado espaço e é estruturado em horizontes ou camadas que o distinguem do seu material de origem. Estes mesmos autores identificam diversos marcos ao longo da história da Pedologia que nos ajudam a explicar a variação do conceito de solo. Esses marcos foram sintetizados na linha do tempo da Figura 5. 34 Figura 5 – Linha do tempo indicando alguns marcos importantes na evolução das abordagens sobre solos. Adaptado de Bockhein et al. (2005). O que podemos observar pela análise da linha do tempo é que o solo deixa de ser apenas um meio para o desenvolvimento das plantas com a institucionalização da Pedologia e ganha o escopo de objeto de estudo com a criação de outros conceitos relacionados, como perfil de solo, horizontes e fatores de formação. Posteriormente, considerando a expansão dos estudos pedológicos pelo mundo, o solo é reconhecido como um corpo natural e tem sua gênese ampliada na medida em que ocorre o refinamento dos sistemas de classificação e a definição de critérios para categorização de horizontes. Esse processo perdura até meados do século XX. Após, ocorre uma proliferação de outros conceitos relacionados ao solo, ora tentando definir suas variações no espaço, ora servindo de categoria para seu estudo, como nos levantamentos pedológicos. Destacam-se os conceitos de pedon, polipedon, corpo de solo, cobertura pedológica, pedosfera, pedometria, pedoforma, entre diversos outros. Esses conceitos serão abordados ao longo das disciplinas seguintes do curso, já que muitos deles são aplicados ao levantamento e mapeamento de solos. Para iniciar seus estudos busque mais informações sobre alguns conceitos importantes da Pedologia, tais como pedon, polipedon, pedosfera, pedoforma. [Fim de “Saiba mais”] 35 Um conceito que já deve ser trabalho nesse momento é o de Pedosfera. Conforme Lal et al. (1997) a pedosfera é a esfera terrestre composta pelos solos no planeta, dando aos solos uma dimensão de componente físico global (Figura 6). Ela se relaciona com as demais geosferas, sendo que cada uma contém um conjunto de componentes e processos em si, e outros que surgem da relação com a pedosfera. Esse modelo revela o caráter do solo como um componente síntese, cuja origem está ligada ao papel de diversos fatores, conforme será abordado em outra disciplina do curso. Figura 6 – Concepção da Pedosfera como um produto da síntese das interações entre as demais esferas terrestres. Adaptado de Lal et al. (1997). 36 Mas, afinal, diante de tanta diversidade: o que é solo? Qual conceito podemos utilizar? O conceito de solo que utilizaremos neste curso é aquele que melhor atende à Pedologia, e que fundamenta o Sistema Brasileiro de Classificação de Solos – SiBCS (Santos et al., 2018). Considerando esse conceito, podemos definir como solo: O solo é uma coleção de corpos naturais, constituídos por partes sólidas, líquidas e gasosas, possuem pelo menos três dimensões espaciais e uma dimensão temporal e são dinâmicos. São formados por materiais minerais e orgânicos dispostos em aglomerados de partículas sólidas chamados agregados. Os agregados são organizados em horizontes e/ou camadas conforme sua morfologia e, geralmente, estão dispostos paralelamente à superfície. Os solos ocupam a maior parte do manto superficial das extensões continentais do nosso planeta, contêm matéria viva e podem ser vegetados na natureza onde ocorrem e, eventualmente, terem sido modificados por interferências antrópicas. Quando examinados a partir da superfície, consistem em seções aproximadamente paralelas, organizadas em camadas e/ou horizontes que se distinguem do material de origem inicial, como resultado de adições, perdas, translocações e transformações de energia e matéria, que ocorrem ao longo do tempo e sob a influência dos fatores clima, organismos e relevo. Os horizontes refletem os processos de formação do solo a partir do intemperismo do substrato rochoso ou de sedimentos de natureza diversa. As camadas, por sua vez, são pouco ou nada afetadas pelos processos pedogenéticos, mantendo, em maior ou menor proporção, as características do material de origem. O solo tem como limite superior a atmosfera, embora alguns solos possam ter uma coluna de água sobreposta (permanente ou periódica), desde que não haja impedimento ao desenvolvimento de raízes de plantas adaptadas a essas condições. Os limites laterais são os contatos com corpos d’água superficiais, rochas, gelo, áreas com coberturas de materiais detríticos inconsolidados, aterros ou terrenos sob espelhos d’água permanentes. O limite inferior do solo é difícil de ser definido. Em 37 geral, o solo passa gradualmente, em profundidade, para rocha dura ou materiais saprolíticos ou sedimentos que não apresentam sinais da influência de atividade biológica. O material subjacente (não solo) contrasta com o solo pelo decréscimo nítido de constituintes orgânicos e pelo decréscimo de alteração e decomposição dos constituintes minerais, ou seja, pelo predomínio de propriedades mais relacionadas ao substrato rochoso ou ao material de origem não consolidado. Modificado de Santos et al., 2018 Sistema Brasileiro de Classificação de Solo 3.2 As funções do solo Finalizaremos essa unidade com a apresentação da importância de se estudar o solo através do detalhamento de suas múltiplas funções. Funções do solo são compreendidas como serviços ambientais prestados pelo solo e que possibilitam a vida no planeta (FAO, 2015). São elas que mostram como o solo é um componente fundamental em questões de saúde humana, socioculturais, de resgate de conhecimentos tradicionais e relacionadas às seguranças alimentar, energética e hídrica (Brevik et al., 2018). De acordo com a FAO (2015) (Figura 7), as principais funções do solo são: Meio para a produção de alimentos, fibras e combustíveis; Reservatório para o sequestro de carbono; Meio de purificação da água e degradação de contaminantes; Agente de regulação do clima; Meio para a ciclagem de nutrientes; Habitat para diversos organismos; Agente na regulação de enchentes; Fonte de recursos genéticos e farmacêuticos; Base de sustentação e suporte para as infraestruturas humanas; 38 Matéria prima para diversos fins, como no fornecimento de materiais de construção; e Herança cultural e reservatório de memórias dos povos. Figura 7 – As funções do solo conforme a FAO – Organização das Nações Unidas para alimentação e Agricultura. Fonte: www.fao.org Podemos também agrupar as funções do solo em biológicas, alimentares, de trocas e filtros, de matéria-prima e suporte e sociais, culturais e políticas. Em 2015, na comemoração do Ano Internacional do Solo, a FAO lançou um vídeo comemorativo sobre as funções do solo. Assista ao vídeo em https://www.youtube.com/watch?v=CZNanlXMXk4. [Fim de “Multimídia”] 39 Nesta unidade discutimos um pouco sobre o conceito de solo e suas funções. Vimos que: O conceito de solo pode variar conforme a área do conhecimento e sua aplicação. Isso porque se trata de um componentecom o qual vários profissionais lidam. O conceito de solo foi sendo alterado com o tempo, em virtude da expansão dos estudos e conhecimentos gerados sobre ele. O solo, conforme definido para estudos pedológicos no Sistema Brasileiro de Classificação de Solos (SiBCS), é uma coleção de corpos naturais, constituídos por partes sólidas, líquidas e gasosas, tridimensionais, dinâmicos, formados por materiais minerais e orgânicos que ocupam a maior parte do manto superficial das extensões continentais do nosso planeta, contêm matéria viva e podem ser vegetados na natureza onde ocorrem e, eventualmente, terem sido modificados por interferências antrópicas. Esse será o conceito que utilizaremos em nosso curso. Os solos possuem diversas funções, e são elas que mostram sua irrefutável importância para a humanidade. As principais funções do solo são: o Meio para a produção de alimentos, fibras e combustíveis o Reservatório para o sequestro de carbono o Meio de purificação da água e degradação de contaminantes o Agente de regulação do clima o Meio para a ciclagem de nutrientes o Habitat para diversos organismos o Agente na regulação de enchentes o Fonte de recursos genéticos e farmacêuticos o Base de sustentação e suporte para as infraestruturas humanas o Matéria prima para diversos fins, como no fornecimento de materiais de construção o Herança cultural e reservatório de memórias dos povos [Fim de “ Em síntese”] 40 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANJOS, L.H.C. dos; JACOMINE, P.K.T.; SANTOS, H.G.; OLIVEIRA, V.A. de; OLIVEIRA; J.B. de. Sistema Brasileiro de Classificação de Solos. Capítulo VIII. In: KER, J.C.; CURI, N.; SCHAEFER, C.E.; VIDAL-TORRADO, P. (Ed.) Pedologia: Fundamentos. Viçosa, SBCS, 2013. BALDWIN, M.; KELLOG, C.E. & THORP, J. Soil classification. In: Soils and men. 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Springer, 2023, pp. 1-23. THORP, J.; SMITH, G.D. Higher categories of soil classification: order, suborder and great groups. Soil Science 67:117-126, 1949. 42 SOBRE OS AUTORES Fábio Soares de Oliveira - Graduado em Geografia pela UFV, Mestre em Solos e Nutrição de Plantas pela UFV e Doutor em Ciências Naturais (Geologia Ambiental) pela UFOP. É professor no Instituto de Geociências da UFMG (IGC/UFMG). Atua nas áreas de Pedologia, Geomorfologia e Geoarqueologia, principalmente nos temas: gênese de solos; relação solo e paisagem; couraças; solos e relevos de ilhas oceânicas, solos da Antártica, solos antrópicos. Lúcia Helena Cunha dos Anjos - Graduada em Engenharia Agronômica pela UFRRJ, Mestre Agronomia (Ciências do Solo) UFRRJ e Doutora em Agronomy (Soil Science) pela Purdue University. É professora no Departamento de Solos da UFRRJ (DPS/UFRRJ). Atua na área de Pedologia, principalmente nos temas: classificação de solos, etnopedologia, manejo de solos, indicadores edáficos de qualidade e relação entre erosão do solo e degradação. José João Lelis Leal de Souza - Graduado em Geografia pela UFV, Mestre e Doutor em Solos e Nutrição de Plantas