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Caso 3 Fisiologia do sist. cardiovascular Principais funções Transporte de nutrientes absorvidos pelo TGI para o resto do corpo. Transporte de gases (O2 e CO2, principalmente). Transporte de hormônios. Regulação da temperatura corporal, transferindo calor das partes mais internas para a superfície, onde o mesmo pode ser dissipado. Defesa contra agentes patógenos ao auxiliar o transporte das células de defesa, permitindo a ação do sistema imune e promovendo coagulação sanguínea. Transporte de dejetos metabólicos para excreção. Anatomofisiologia do coração O coração não está fixo à cavidade toráxica, mas trabalha livre deslizando entre duas membranas de tecido fibroso-seroso chamada de pericárdio. → Há o pericárdio fibroso e o seroso, sendo este último dividido em parietal (mais externo, maior contato com o líquido pericárdico) e visceral (reveste externamente o coração, também chamado de epicárdio). Entre os dois pericárdios encontra-se o líquido pericárdico, que tem a função de lubrificar as faces do coração para reduzir o atrito durante os movimentos. O coração é suspenso na cavidade toráxica pelo conjunto de vasos que chegam ou saem. Abaixo do epicárdio, há omiocárdio, cuja principal função é a contração. Logo, vem a última camada do coração, o endocárdio, que reveste internamente as câmaras cardíacas. → O suprimento sanguíneo para o próprio coração não é feito diretamente pelas câmaras cardíacas através do endocárdio, uma vez que apenas uma parte minúscula é feita dessa forma. A grande maioria é feita por um sistema de vasos especiais chamado de circulação coronariana. Fases do potencial de ação cardíaco Fase 0 (despolarização): abertura dos canais rápidos de sódio e influxo de sódio, tornando o potencial de membrana mais positivo. Fase 1 (repolarização inicial): fechamento dos canais rápidos de sódio e efluxo de potássio pelos canais abertos de potássio. Fase 2 (platô): abertura dos canais de cálcio e fechamento dos canais rápidos de potássio. Fase 3 (repolarização rápida): fechamento dos canais de cálcio e abertura dos canais lentos de potássio. Fase 4 (potencial de membrana em repouso): o p. de membrana volta a ser negativo e as correntes de influxo e efluxo se igualam. A difusão de cálcio para dentro das miofibrilas promove a contração muscular. Ciclo cardíaco Cada batimento começa com um potencial de ação espontâneo que é iniciado no nó sinoatrial, localizado no átrio direito próximo à abertura da veia cava superior. Há um atraso de cerca de 0,13 segundos no nó AV que possibilita a contração dos átrios antes da contração dos ventrículos. Nó sinoatrial→ ramos internodais→ nó atrioventricular→ feixe de His → ramos do feixe de His→ fibras de Purkinje. 1. Durante a sístole, as valvas AV estão fechadas e os átrios enchem-se de sangue. 2. No início da diástole, há o relaxamento isovolumétrico ventricular. Quando a pressão AV diminui abaixo da pressão atrial, as valvas AV se abrem, e a pressão mais elevada nos átrios + força da gravidade empurra o sangue para os ventrículos. → 80% do enchimento ventricular é pela gravidade, e 20% pela contração dos átrios. 3. No início da sístole, ocorre contração ventricular. As valvas AV se fecham e a pressão começa a aumentar no ventrículo, mas sem ejeção de sangue, caracterizando o período de contração isovolumétrica. 4. Quando a pressão ventricular excede a pressão aórtica (80 mmHg) ou a arterial pulmonar (8 mmHg), as valvas aórtica e pulmonar se abrem, respectivamente. → Esse fluxo de saída ventricular é chamado de período de ejeção. 5. Após o período de ejeção rápida e lenta, as pressões ventriculares caem abaixo da pressão aórtica e pulmonar, logo, as valvas aórtica e pulmonar se fecham. As fases do ciclo cardíaco são: período de enchimento (I), período de contração isovolumétrica (II), período de ejeção (III) e período de relaxamento isovolumétrico. Embora os ventrículos direito e esquerdo ajam como duas bombas separadas que ejetam simultaneamente volumes iguais de sangue, o lado direito tem uma carga de trabalho muito menor. → Ele bombeia o sangue a uma curta distância para os pulmões a uma pressão inferior, e a resistência ao fluxo sanguíneo é pequena. → O ventrículo esquerdo bombeia sangue por grandes distâncias a todas as outras partes do corpo com uma pressão maior, e a resistência ao fluxo sanguíneo é maior. Mecanismo de Frank-Starling: dentro dos limites fisiológicos, o coração bombeia todo o sangue que retorna a ele sem deixar acumular nenhum excesso nas veias. A distensão da parede da musculatura cardíaca causa um aumento na força de contração do órgão. SNS: sua estimulação aumenta a força de contração do coração e a FC. Esses efeitos são mediados por abertura de canais de cálcio devido a ativação de receptores beta-adrenérgicos. SNP: sua estimulação reduz a FC, mas tem pouco efeito sobre a força de contração do coração. Isso ocorre porque as fibras parassimpáticas estão mais presentes nos átrios do que nos ventrículos. O mecanismo ocorre quando a ACh liberada age sobre os receptores muscarínicos cardíacos, aumentando a entrada de potássio e causando hiperpolarização. Outros mecanismos: químicos (como o pH), físicos (o aumento da temperatura causa aumento da força e FC. → A cada 1 grau de aumento = a FC aumenta em 18 batimentos. Insuficiência cardíaca É definida como uma síndrome complexa, resultante de qualquer distúrbio funcional ou estrutural do coração que reduza a capacidade de bombeamento do coração. Pode ocorrer em qualquer faixa etária, mas afeta primariamente idosos. Classificação As diretrizes do ACA/AHA classificam a IC em quatro estágios, de acordo com a progressão da doença: A: risco alto de desenvolver IC, mas sem anormalidades estruturais identificadas nem sinais de IC. B: presença de cardiopatia estrutural, mas sem histórico de sinais e sintomas de IC. C: sintomas atuais ou anteriores de IC com cardiopatia estrutural. D: cardiopatia estrutural avançada e sintomas de IC em repouso, com terapia clínica máxima. A IC pode ser classificada em disfunção sistólica, diastólica, direita, esquerda, aguda (quando se instala subitamente) e crônica (quando se instala lenta e progressivamente). Fisiopatologia O coração tem a capacidade de ajustar seu débito cardíaco para atender às necessidades variáveis do corpo. → A capacidade de aumentar o débito cardíaco durante o aumento das atividades é chamada de reserva cardíaca. Pré-carga: reflete o volume ou condições de enchimento do ventrículo no fim da diástole. É determinada pelo retorno venoso para o coração. → Conhecido como volume diastólico final, o volume máximo de sangue que o ventrículo recebe na diástole. Pós-carga: força que o músculo cardíaco deve gerar para ejetar o sangue do coração cheio. Seus principais componentes são a RVP e a tensão da parede ventricular. Quando a RVP é alta, deve ser gerada uma pressão intraventricular maior para que haja a abertura da valva aórtica e, em seguida, ejeção do sangue. A contratilidade (inotropismo) aumenta o débito cardíaco independentemente da pré-carga e pós-carga. Fração de ejeção é a porcentagem de sangue bombeada para fora dos ventrículos a cada contração (uma normal sendo de 55% a 70%). Disfunção ventricular diastólica Caracterizada por uma fração de ejeção normal, mas com relaxamento muscular comprometido, levando a uma diminuição no enchimento ventricular, que causa diminuição na pré-carga, volume sistólico e débito cardíaco. Não é sinônimo de IC, mas pode levar ao desenvolvimento de uma. Entre as causas, estão aquelas que impedem a expansão do ventrículo, aumentam a espessura da parede, reduzindo o tamanho da câmara, e adiam a diástole (com o envelhecimento, geralmente há um adiamento da diástole, de modo que o enchimento ventricular tem início quando o ventrículo ainda está rígido e resistente à distensão para aceitar um aumento no volume). A FC também influencia a função diastólica, vistoque determina o tempo disponível para que ocorra o enchimento ventricular (p.ex: se a FC for alta, o tempo disponível vai ser menor). A diminuição de volume causada pela disfunção diastólica aumenta a pressão intraventricular, e as pressões elevadas são transferidas do VE para o átrio esquerdo e o sistema venoso pulmonar, causando a redução da complascência pulmonar. Há então o aumento do trabalho respiratório e a dispneia. O débito cardíaco diminui pela diminuição da pré-carga, ou seja, diminuição de volume para um DC adequado. Disfunção ventricular sistólica Caracterizada pela redução da contratilidade do miocárdio, com uma fração de ejeção inferior a 40%. Com a redução na fração de ejeção, há um aumento na pré- carga, dilatação ventricular e tensão da parede ventricular (acredita-se que esse seja um mecanismo compensatório de Frank-Starling para manter o volume sistólico). Apesar de ser um mecanismo compensatório, o aumento da pré-carga pode levar a acúmulo de sangue nos átrios e no sistema venoso, causando edema pulmonar e periférico. Disfunção ventricular direita Compromete a capacidade de transporte do sangue desoxigenado para os pulmões. Sua causa mais comum é a insuficiência ventricular esquerda. Logo, quando o VD é insuficiente, ocorre redução na quantidade de sangue para a circulação pulmonar e, em seguida, para o lado esquerdo do coração, causando redução do débito cardíaco. Além disso, há o acúmulo de sangue no sistema venoso sistêmico, o que eleva as pressões do lado direito do coração e também a venosa sistêmica. Isso resulta em edema periférico que, por ação da gravidade, acaba sendo mais pronunciado nas partes inferiores do corpo. A insuficiência do lado direito também causa congestão das vísceras, fazendo com que o sangue se acumule nas veias hepáticas que drenam na veia cava inferior, e o fígado fica congestionado. Isso pode causar hepatomegalia e dor. Também pode haver congestão do baço e desenvolvimento de ascite. As veias jugulares se tornam distendidas e podem ser visualizadas com a pessoa sentada ou em pé. Disfunção ventricular esquerda Compromete omovimento do sangue da circulação pulmonar até a sistêmica. As causas mais comuns são hipertensão e infarto agudo do miocárdio. Quando o VE é insuficiente, ocorre uma diminuição no débito cardíaco e o sangue se acumula no VE, átrio esquerdo e na circulação pulmonar. Há o aumento de pressão nos capilares pulmonares, ocorrendo então a saída do líquido intravascular para o interstício dos pulmões, causando edema pulmonar. Conforme a pressão pulmonar aumenta como resultado da congestão, pode haver progressão da IC para o lado direito. Mecanismos compensatórios As diminuições iniciais podem ser impercetíveis, uma vez que esses mecanismos mantêm o DC. Mas, além de contribuírem para a adaptação do coração insuficiente, eles também favorecem a fisiopatologia. M. de Frank-Starling: a tensão aumentada da parede ventricular aumenta a demanda de oxigênio, o que pode resultar em isquemia . SNS: o aumento da atividade simpática por meio da estimulação dos receptores beta-adrenérgicos do coração causa taquicardia, vasoconstrição e arritmias cardíacas. A taquicardia aumenta a demanda de oxigênio, podendo causar isquemia, e as arritmias podem contribuir para a alta taxa de morte súbita observada na IC. SRAA: além de seus efeitos isolados sobre o equilíbrio do sódio e água (que tem início com a diminuição do fluxo sanguíneo renal), a ang. II e a aldosterona estimulam o crescimento de fibroblastos e a síntese de colágeno. A deposição deles resulta em hipertrofia ventricular e fibrose da parede do miocárdio, que aumenta a rigidez e causa o remodelamento inadequado do coração, contribuindo para a disfunção ventricular. Peptídeos natriuréticos: são produzidos pelo músculo cardíaco e são antagonistas do SRAA. O peptídeo natriurético atrial (ANP) é liberado pelas células atriais em resposta ao estiramento atrial (pressão ou sobrecarga de líquido). O peptídeo natriurético cerebral (BNP) é liberado pelos ventrículos quando há aumento da pressão ventricular ou sobrecarga de líquido. Seus níveis circulantes estão constantemente elevados em pessoas com IC, e os de BNP e NT-proBNP (porção N-terminal do pró-hormônio) indicam a extensão da disfunção ventricular. Endotelinas: são peptídeos vasoconstritores potentes liberados pelas células endoteliais da circulação, aumentando a liberação de ANP, aldosterona e catecolaminas, além de exercerem efeitos antinatriuréticos nos rins. Quadro clínico Uma pessoa com IC anteriormente compensada pode desenvolver sinais de IC pela primeira vez quando a condição alcançar um ponto crítico. → A IC pode ser manifestada precipitadamente por conta de infecção, estresse emocional, hipertensão não controlada ou sobrecarga de líquido. Manifestações respiratórias A dispneia decorrente da congestão pulmonar é uma das principais. Ortopneia é a falta de ar em decúbito dorsal, quando o líquido das pernas é redistribuído para a circulação pulmonar, que já está distendida. A dispneia paroxística noturna é uma crise súbita durante o sono. A tosse seca e não produtiva crônica ocorre por conta do broncoespasmo (diminuição do calibre dos brônquios) decorrente da congestão. É um sintoma sútil e frequentemente subestimado. A respiração de Cheyne-Stokes, além de atuar como um marcador de gravidade crescente da IC, também atua como um agravante. O ciclo recividante de hipoventilação/apneia e hiperventilação pode aumentar a atividade simpática e predispor arritmias. O edema pulmonar agudo dificulta a expansão pulmonar e as trocas gasosas, resultando em dispneia e cianose. Há fadiga, fraqueza e confusão mental (por hipóxia). SICA Alterações graduais ou rápidas nos sinais e sintomas da IC que resultam na necessidade de terapia urgente. Normalmente são resultado de edema pulmonar grave. A IC crônica é a causa mais comum da síndrome. Acredita-se que as SICA englobem 3 condições diferentes: piora da disfunção sistólica ou diastólica crônica, IC aguda de início recente secundária a um evento precipitador (ex: infarto do miocárdio) e agravamento de IC em estágio final/avançada refratária ao tratamento. Diagnóstico Os métodos são direcionados ao estabelecimento da causa do distúrbio e à determinação da extensão. Histórico: deve incluir informações relativas aos sinais e sintomas da IC (dispneia, tosse, fadiga generalizada, etc). Exame físico: avaliação da FC, das bulhas cardíacas, da PA, das veias jugulares em relação à congestão venosa, dos pulmões (sinais de congestão pulmonar) e dos MMII em relação ao edema. Exames laboratoriais: usados no diagnóstico de anemia, desequilíbrios eletrolíticos e para detectar sinais de congestão hepática crônica. → A determinação dos níveis de BNP e NT-proBNP podem ser úteis se o diagnóstico de IC for incerto, tendo um grande valor prognóstico. → Servem para identificar a gravidade da condição. OBS: A creatinina é uma substância produzida pelos músculos e é responsável por fabricar energia para que ocorra a contração muscular. Ela é excretada através dos rins e é um indicador importante da função renal. Quando os rins não estão funcionando de forma adequada, ela pode se acumular no sangue, causando problemas de saúde. → O Clearence de creatina é uma maneira de estimar a função renal, calculando a capacidade que os rins tem de excretar a creatina (valores de referência: 0,60 a 1,10 mg/dl). ECG: avalia a movimentação da parede ventricular direita e esquerda (normal, acinesia ou hipocinesia), da espessura, tamanho, da função das valvas, defeitos cardíacos e da fração de ejeção. Radiografias toráxicas: fornecem informações sobre o tamanho e formato do coração, bem como a vasculatura pulmonar. A silhueta cardíaca pode ser utilizada para detectar hipertrofia e dilatação cardíaca. Tratamento Não farmacológico: exercício físico, restrição de sódio e líquidos, manejo do peso, etc. Farmacológico: importante quando a IC se torna moderada a grave. A escolha do agente farmacológico é baseada na sintomatologia do paciente. Diuréticos: promovem a excreção de líquido e ajudam a manter o débito cardíaco por meio da redução da pré-carga. Ex: furosemida, bumetanida. Inibidores da ECA: impedem a conversão de ang. I em ang. II, reduzindo a vasoconstrição, o remodelamento ventricular inadequado e a liberação de aldosterona. Ex: inalapril, captopril. BRA II: tem efeitos parecidos com os IECA, mas seu uso tem a vantagem de não causar tosse, um efeito colateral dos IECA. Ex: losartan, valsartan. Beta-bloqueadores: usados para reduzir a ativação do SNS. Acredita-se que as elevações crônicas de catecolaminas e a ativação do SNS causem lesão miocárdica progressiva, então eles ajudam a reduzir esses efeitos. Ex: bisoprolol, carvedilol. Glicosídios cardíacos: digitálicos que melhoram a função cardíaca por aumentarem a força e a potência das contrações ventriculares. Diminuem também a FC ao diminuirem a atividade do nó SA e aumentam o tempo de enchimento diastólico. Ex: digoxina. Medicamentos vasodilatadores: não sabe-se seus efeitos para o controle da IC, mas eles são eficazes no manejo dos sintomas. São utilizados em casos de IC crônica e nas SICA. Ex: nitrato de hidralazina.