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CURSO DE DIREITO EMPRESARIAL @prof.andresantacruz Aula 66 – Títulos de crédito: endosso Conceito de endosso. O endosso é o ato cambiário mediante o qual o credor do título de crédito (endossante) transmite seus direitos a outrem (endossatário). É ato cambiário, pois, que põe o título em circulação. “O endosso é a declaração cambial lançada na letra de câmbio (ou em qualquer outro título de crédito) pelo seu proprietário, a fim de transferi-lo a terceiro. É por meio dele que se opera a circulação dos títulos à ordem e, na formação da teoria dos títulos de crédito, na sua disciplina, o que predomina é o interesse da circulação, e a segurança do terceiro de boa-fé, que recebe o título sem saber, e sem precisar saber das causas determinantes de sua criação” (BORGES, João Eunápio. Títulos de crédito. Rio de Janeiro: Forense, 1971. p. 71). @prof.andresantacruz Aula 66 – Títulos de crédito: endosso Cláusula à ordem. Os títulos de crédito típicos/nominados (letra de câmbio, nota promissória, cheque, duplicata etc.) circulam mediante endosso porque todos eles possuem, ainda que implícita, a cláusula “à ordem”. LUG Art. 11 - Toda a letra de câmbio, mesmo que não envolva expressamente a cláusula a ordem, é transmissível por via de endosso. Lei 5.474/1968 Art. 2º, § 1º. A duplicata conterá: VII - a cláusula à ordem; Lei 7.357/1985 Art. 17. O cheque pagável a pessoa nomeada, com ou sem cláusula expressa “à ordem”, é transmissível por via de endosso. @prof.andresantacruz Aula 66 – Títulos de crédito: endosso Cláusula não à ordem. Somente quando for inserida, expressamente, a cláusula “não à ordem” num título de crédito é que ele não poderá circular por endosso, e sim por mera cessão civil de crédito. LUG Art. 11 - Quando o sacador tiver inserido na letra as palavras "não a ordem", ou uma expressão equivalente, a letra só é transmissível pela forma e com os efeitos de uma cessão ordinária de créditos. Lei 7.357/1985 Art. 17, § 1º. O cheque pagável a pessoa nomeada, com a cláusula “não à ordem”, ou outra equivalente, só é transmissível pela forma e com os efeitos de cessão. * Se for feito um endosso num título de crédito em que se inseriu expressamente a cláusula não à ordem, o endosso é nulo? A maioria da doutrina entende que não: nesse caso, o ato é válido, mas não produz efeitos de endosso, e sim de uma mera cessão civil de crédito. @prof.andresantacruz Aula 66 – Títulos de crédito: endosso Endosso x Cessão civil de crédito. O endosso se submete ao regime jurídico cambial, e a cessão civil de crédito se submete ao regime jurídico civil. Enquanto o endosso é ato unilateral que deve ser feito no próprio título, em obediência ao princípio da literalidade, a cessão civil de crédito é negócio bilateral formalizado por meio de contrato, ou seja, instrumento à parte. O endosso acarreta a responsabilização do endossante, que passa a ser codevedor. Na cessão civil de crédito, o cedente responde apenas pela existência do crédito cedido (art. 296 do Código Civil). Em decorrência do princípio da autonomia, o endosso transfere o crédito sem nenhum vício relativo a negócios feitos anteriormente com o título. Assim, o devedor não poderá opor ao endossatário (de boa-fé) exceções que não lhe digam respeito. Na cessão civil de crédito, isso não ocorre: o devedor pode opor contra o cessionário qualquer exceção pessoal que tinha contra o cedente (art. 294 do Código Civil). O endosso não depende de comunicação ao devedor, enquanto a cessão civil de crédito só produz efeitos se cumprida essa formalidade (art. 290 do Código Civil). “(...) enquanto a cessão é sempre contrato bilateral, o endosso constitui ato unilateral. A cessão pode revestir qualquer forma, e o endosso é ato formal; a cessão é ato causal, o endosso, abstrato. A cessão transfere ao cessionário um direito derivado, o direito do cedente; o endosso não transfere ao endossatário o direito do endossador; transfere-lhe o título, com os direitos nesse assegurados ao seu legítimo possuidor. O endossatário adquire o direito literal e autônomo resultante do título, completamente imune às exceções que, na pessoa do antecessor, poderá paralisar a eficácia da promessa nele contida” (BORGES, João Eunápio. Títulos de crédito. Rio de Janeiro: Forense, 1971. p. 74). @prof.andresantacruz Aula 66 – Títulos de crédito: endosso Formalidades do endosso. Em princípio, o endosso deve ser feito no verso do título, bastando para tanto a assinatura do endossante. Caso o endosso seja feito no anverso da cártula, deverá conter, além da assinatura do endossante, menção expressa de que se trata de endosso. “Para simplificar e agilizar o endosso, entende-se que a simples assinatura do beneficiário no verso (dorso) do título é suficiente para representar a manifestação de vontade apta a transferir o título. Embora esse seja o padrão formal para o endosso, é certo que nossa legislação admite uma segunda forma para tal declaração de vontade. Também vale como endosso a assinatura do beneficiário na face (anverso) do título, desde que acompanhada de alguma expressão que demonstre que a intenção ali era transferir o título (Pague-se a, Transfiro para...)” (TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial. Vol. 2. São Paulo: Atlas, 2017). @prof.andresantacruz Aula 66 – Títulos de crédito: endosso Endosso em branco x Endosso em preto. O endosso em branco não identifica o seu beneficiário. Nesse caso, simplesmente o endossante assina no verso do título, sem identificar a quem está endossando, o que acaba, na prática, permitindo que o título circule ao portador, ou seja, pela mera tradição da cártula. O beneficiário de endosso em branco pode: (i) transformá-lo em endosso em preto, completando-o com o seu nome ou de terceiro; (ii) endossar novamente o título, em branco ou em preto; ou (iii) transferir o título sem praticar novo endosso, ou seja, pela mera tradição da cártula (art. 14 da Lei Uniforme e art. 913 do Código Civil). Na segunda situação acima descrita, o endossatário, ao realizar novo endosso, passa a integrar a cadeia de codevedores, responsabilizando-se pelo adimplemento da obrigação constante do título. Na terceira situação descrita, todavia, o endossatário transfere o crédito sem assumir nenhuma responsabilidade pelo seu adimplemento, já que não pratica novo endosso. O endosso em preto, por sua vez, é aquele que identifica expressamente a quem está sendo transferida a titularidade do crédito, ou seja, o endossatário. Assim, só poderá circular novamente por meio de um novo endosso, que poderá ser em branco ou em preto. Nesse caso, pois, o endossatário, ao recolocar o título em circulação, assumirá a responsabilidade pelo adimplemento da dívida, uma vez que deverá praticar novo endosso. @prof.andresantacruz Aula 66 – Títulos de crédito: endosso O endosso em branco e a Lei 8.088/1990. Art. 19. Todos os títulos, valores mobiliários e cambiais serão emitidos sempre sob a forma nominativa, sendo transmissíveis somente por endosso em preto. § 2° A emissão em desobediência à forma nominativa prevista neste artigo torna inexigível qualquer débito representado pelo título, valor mobiliário ou cambial irregular. * A despeito dessa regra, entende-se que os títulos de crédito podem circular por meio de endosso em branco, sendo necessário, porém, que ele seja completado no momento do pagamento. CHEQUE. ENDOSSO EM BRANCO. ARGÜIÇÃO DE NULIDADE DO TÍTULO E DE ILEGITIMIDADE DO CREDOR. EXIGÊNCIA LEGAL DE QUE O BENEFICIÁRIO SEJA IDENTIFICADO. LEIS NºS 8.021, DE 12.04.90, E 8.088, DE 31.10.90. - Satisfeito pelo credor o requisito da identificação para fins de controle fiscal, não há falar em nulidade do título ou ilegitimidade de parte. (REsp 204.595/GO) AÇÃO MONITÓRIA. PROCURAÇÃO. RECONHECIMENTO DE FIRMA. CHEQUE. IDENTIFICAÇÃO DO ENDOSSATÁRIO. ARTS. 1º E 2º DA LEI Nº 8.021, DE 12.4.1990. - Satisfeito pelo credor o requisito da identificação para fins de controle fiscal, não há falar-se em nulidade do título ou ilegitimidade de parte. O fato de não haver o endossante aposto, noverso da cártula, o nome do endossatário não o nulifica, nem obsta a que o credor, identificando-se, venha a cobrar o quantum devido. Precedente da Quarta Turma. (REsp 329.996/SP) @prof.andresantacruz Aula 66 – Títulos de crédito: endosso Endosso parcial. A legislação cambiária específica veda o endosso parcial ou limitado a certo valor da dívida representada no título (art. 8º, § 3º, do Decreto 2.044/1908), bem como o endosso subordinado a alguma condição (art. 12 da LUG), caso em que esta será considerada não escrita. No mesmo sentido, o Código Civil dispõe em seu art. 912 que “considera-se não escrita no endosso qualquer condição a que o subordine o endossante”, prevendo ainda, no parágrafo único do referido dispositivo, que “é nulo o endosso parcial”. “Indicando ou não o nome do beneficiário, o endosso deverá transferir sempre a totalidade dos direitos incorporados ao documento. O princípio da cartularidade impede que seja feita uma cisão do direito mencionado do título, uma vez que terá que se apresentar o documento para exercer o direito. A divisibilidade do crédito é incompatível com a unidade do crédito ali representado, em especial pela exigência de um protesto único do título. Além disso, a necessidade da entrega do original como recibo de pagamento afasta qualquer possibilidade de divisão no endosso. Assim sendo, o endosso parcial de uma letra de câmbio é nulo (LUG – art. 12)” (TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial. Vol. 2. São Paulo: Atlas, 2017). @prof.andresantacruz Aula 66 – Títulos de crédito: endosso Efeitos do endosso. O endosso produz dois efeitos, basicamente: a) transfere a titularidade do crédito; e b) responsabiliza o endossante, passando este a ser codevedor do título (se o devedor principal não pagar, o endossatário poderá cobrar do endossante). O endosso, portanto, não transfere apenas o crédito, mas também a efetiva garantia do seu pagamento. Pode o endosso, todavia, conter a chamada “cláusula sem garantia”, que exonera expressamente o endossante de responsabilidade pela obrigação constante do título. LUG Art. 15 - O endossante, salvo cláusula em contrário, é garante tanto da aceitação como do pagamento da letra. Lei 7.357/1985 Art. 21. Salvo estipulação em contrário, o endossante garante o pagamento. Código Civil Art. 914. Ressalvada cláusula expressa em contrário, constante do endosso, não responde o endossante pelo cumprimento da prestação constante do título. @prof.andresantacruz Aula 66 – Títulos de crédito: endosso Endosso impróprio. O endosso impróprio não produz os efeitos normais do endosso translativo, mas apenas legitima a posse do detentor. O endosso-mandato, ou endosso-procuração, está previsto no art. 18 da LUG (art. 917 do Código Civil). Por meio dele, o endossante confere poderes ao endossatário para agir como seu legítimo representante, exercendo os direitos constantes do título. Faz-se o endosso-mandato mediante o uso das expressões “para cobrança”, “valor a cobrar” ou “por procuração”. O endosso-caução, ou endosso-pignoratício/endosso-garantia, está previsto no art. 19 da LUG (art. 918 do Código Civil), e nele o endossante transmite o título como forma de garantia de uma dívida contraída perante o endossatário. Faz-se o endosso-caução com o uso das expressões “valor em garantia”, “valor em penhor” ou outra que implique uma caução. “O endosso mandato concede todos os poderes para o recebimento da letra, neles se compreendendo os de dar quitação, transigir, substabelecer (mediante novo endosso-mandato, inclusive) etc., etc. Não, porém, o de obrigar cambialmente o mandante” (BORGES, João Eunápio. Títulos de crédito. Rio de Janeiro: Forense, 1971. p. 78-79). “[O endossatário-pignoratício] não pode realizar endosso translativo. Assim, qualquer endosso que ele realizar deverá ser entendido como um endosso-mandato, na medida em que as demais modalidades de endosso não podem ser realizadas por ele, que é um mero possuidor. Nem outro endosso-caução ele poderá realizar, pois não se pode dar em garantia apenas a posse do título” (TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial. Vol. 2. São Paulo: Atlas, 2017). @prof.andresantacruz Aula 66 – Títulos de crédito: endosso Endosso-mandato e responsabilidade por protesto indevido. O STJ entende que os bancos, como mandatários decorrentes de endosso-mandato, só respondem por eventuais danos causados por protesto indevido do título se for comprovada a sua atuação culposa, o que ocorre, por exemplo, quando o banco tem conhecimento inequívoco de que o negócio jurídico que embasou a duplicata foi desfeito. Direito Civil e Cambiário. Recurso especial representativo de controvérsia. Art. 543-C do CPC. Duplicata recebida por endosso-mandato. Protesto. Responsabilidade do endossatário. Necessidade de culpa. 1. Para efeito do art. 543-C do CPC: Só responde por danos materiais e morais o endossatário que recebe título de crédito por endosso-mandato e o leva a protesto se extrapola os poderes de mandatário ou em razão de ato culposo próprio, como no caso de apontamento depois da ciência acerca do pagamento anterior ou da falta de higidez da cártula. (REsp 1.063.474/RS). Súmula 476: “O endossatário de título de crédito por endosso-mandato só responde por danos decorrentes de protesto indevido se extrapolar os poderes de mandatário”. @prof.andresantacruz Aula 66 – Títulos de crédito: endosso Endosso póstumo ou tardio. Normalmente, o endosso é feito antes do vencimento do título, mas nada impede que seja feito após o vencimento. Caso, porém, o endosso seja feito após o protesto ou após o prazo para a realização do protesto, o que a doutrina chama de endosso póstumo ou endosso tardio, ele não produz os efeitos normais de um endosso, valendo tão somente como uma mera cessão civil de crédito. LUG Art. 20 - O endosso posterior ao vencimento tem os mesmos efeitos que o endosso anterior. Todavia, o endosso posterior ao protesto por falta de pagamento, ou feito depois de expirado o prazo fixado para se fazer o protesto, produz apenas os efeitos de uma cessão ordinária de créditos. Salvo prova em contrário, presume-se que um endosso sem data foi feito antes de expirado o prazo fixado para se fazer o protesto. Código Civil Art. 920. O endosso posterior ao vencimento produz os mesmos efeitos do anterior. @prof.andresantacruz