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Nicolo Zingales
Paula Farani de Azevedo
ORGANIZADORES
A aplicação 
do Direito 
antitruste em 
ecossistemAs 
digitAis
Desafios e propostas 
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“este livro já nasce sendo uma obra de leitura obrigatória para todos aqueles que 
trabalham, escrevem e/ou estudam com direito concorrencial. As discussões 
sobre mercados e ecossistemas digitais já deixaram de ser, há algum tempo, 
meros debates acadêmicos sem aplicação prática, para serem uma das principais 
(ou até a principal) questões atuais, tanto na academia, quanto, e principalmente, 
na seara das decisões tomadas pelas autoridades concorrenciais em quase todas 
as jurisdições.”
alexandre Cordeiro Macedo
Presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade)
Doutor em direito econômico pela Universidade Federal 
de Minas Gerais (UFMG)
“Ao fornecer uma análise elaborada sobre esses diferentes aspectos da 
competição ecossistêmica e explorar a forma como a aplicação da lei da 
concorrência tem lidado ou deveria lidar com a concorrência interecossistê­
mica e intraecossistêmica, este volume traz uma importante contribuição para 
a discussão intelectual global sobre a transformação do direito e da política de 
concorrência, da era dos mercados a dos ecossistemas.”
ioannis Lianos
Presidente da Comissão Helénica da Concorrência
Professor de Direito da Concorrência Global e Políticas Públicas,
Faculdade de Direito da UCL (University College of London)
9 786586 060416
SOBRE OS ORGANIZADORES
nicolo Zingales
Professor na Faculdade de direito da Fun­
dação getulio Vargas, no Rio de Janeiro, 
e coordenador do Núcleo de estudos em 
e­commerce. doutor em direito inter­
nacional da economia pela Università 
Bocconi e mestre em direito pela Univer­
sità degli studi di Bologna. Atualmente 
é consultor do Programa das Nações 
Unidas para o desenvolvimento (PNUd) 
no conselho Administrativo de defesa 
econômica (cade). também é pesquisa­
dor do centro de tecnologia e sociedade 
(cts) da FgV direito Rio, e pesquisador 
associado do stanford centre for internet 
& society, do tilburg institute of Law & 
technology (tiLt) e do tilburg Law & eco­
nomics centre (tiLec). Foi Professor Visi­
tante da University of Western Australia, 
e pesquisador visitante na Universidade 
de Harvard, no colégio da europa em Bruges 
e no max Planck institute of competi­
tion & innovation. Possui pós­doutorado 
pela New York University e pelo graduate 
institute of geneva.
Paula Farani de azevedo
ex­conselheira do conselho Administra­
tivo de defesa econômica (cade), de 2018 
a 2022. Professora no instituto Brasileiro 
de ensino, desenvolvimento e Pesquisa 
(idP). membro efetivo do comitê de estu­
dos em e­commerce da Faculdade de 
direito da Fundação getulio Vargas do Rio 
de Janeiro (FgV direito Rio). mestre em 
direito pela georgetown University Law 
school. Advogada.
1. direito antitruste e ecossistemas digitais: 
mapeando o debate
Paula Farani de Azevedo | Nicolo Zingales
2. das plataformas aos ecossistemas digitais: 
implicações para a definição do poder de mercado
Nicolo Zingales | Konstantinos Stylianou
3. A interseção das políticas de concorrência, 
consumo e proteção de dados no contexto de 
ecossistemas digitais
Juliana Oliveira Domingues | Eduardo Molan Gaban | 
Isabella Dorigheto Miranda
4. economia comportamental e antitruste: 
deu match?
Paulo Furquim de Azevedo
5. desafios à utilização da economia 
comportamental no antitruste
Luis Henrique Bertolino Braido
6. eficiências, justificativas legítimas e outras 
defesas em condutas unilaterais e condutas 
comerciais uniformes no Brasil: lições e insights 
para ecossistemas digitais
Nicolo Zingales | Rafaella Schwartz Jaroslavsky
7. Ajustando as lentes: novas teorias do dano 
para mercados digitais
Beatriz Kira | Diogo Rosenthal Coutinho
8. o dever de contratar no contexto dos 
ecossistemas digitais
Paula Farani de Azevedo | Bruno Droghetti Magalhães Santos
9. os limites da concorrência frente à 
inteligência artificial
Juliano Maranhão | Miguel Garzeri Freire | Marco Almada
10. efeitos práticos dos remédios em mercados 
digitais: as cláusulas mFN
Gabriel Nogueira Dias | Francisco Niclós Negrão | 
Leonardo Peixoto Barbosa
11. o open banking como estratégia regulatória 
voltada à promoção da concorrência no mercado 
bancário: a experiência do Reino Unido e o caso 
brasileiro
Carlos Emmanuel Joppert Ragazzo | João Marcelo da 
Costa e Silva Lima
12. Fusões e aquisições em ecossistemas 
digitais: concorrência potencial, nascente e 
killer acquisitions
Guilherme Mendes Resende | Thales de Melo e Lemos
13. Política antitruste e atos de concentração 
centrados em dados
Lucas Griebeler da Motta
14. Atos de concentração e ecossistemas de 
plataforma digital: revisão da experiência brasileira
Nicolo Zingales | Bruno Polonio Renzetti
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 513 16/11/2022 12:09:41
edição produzida pela FgV direito Rio 
Praia de Botafogo, 190 | 13o andar 
Rio de Janeiro | RJ | Brasil | ceP: 22250‑900 
55 (21) 3799‑5445 
www.fgv.br/direito‑rio
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 2 16/11/2022 10:55:27
Nicolo Zingales
Paula Farani de Azevedo
ORGANIZADORES
A aplicação 
do Direito 
antitruste em 
ecossistemAs 
digitAis
Desafios e propostas 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 3 16/11/2022 10:55:27
EDIÇÃO FGV Direito Rio 
Obra Licenciada em Creative Commons 
Atribuição — Uso Não Comercial — Não a Obras Derivadas
Impresso no Brasil. 
Fechamento da 1a edição em novembro de 2022. 
Este livro consta na Divisão de Depósito Legal da Biblioteca Nacional.
Este material, seus resultados e conclusões são de responsabilidade dos 
autores e não representam, de qualquer maneira, a posição institucional 
da Fundação Getulio Vargas/FGV Direito Rio.
A pesquisa conduzida pelos autores dos capítulos 2, 6 e 14 recebeu financiamento do 
International Institute of Advanced System Analysis (IIASA) no âmbito do projeto 
“Ecosystemic Antitrust” da FGV Direito Rio.
Coordenação: Ludmilla Totinick, Christian Danniel e Victor Almeida 
Capa: Estúdio Castellani 
Diagramação: Estúdio Castellani 
1a revisão: Carolina Palha 
2a revisão: Christian Danniel e Victor Almeida
Crédito de imagens: AliseFox/iStock
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) 
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Mario Henrique Simonsen/FGV
A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais : 
 desafios e propostas / Nicolo Zingales, Paula Farani de Azevedo (orgs.). – 
 Rio de Janeiro : FGV Direito Rio, 2022.
 Dados eletrônicos. 
 Inclui bibliografia. 
 ISBN 9786586060416
 1. Direito antitruste. 2. Concorrência. 3. Comércio eletrônico – Legislação. 
4. Direito comercial. I. Zingales, Nicolo. II. Silveira, Paula Farani de Azevedo. 
III. Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getulio Vargas.
CDD – 342.233
Elaborada por Márcia Nunes Bacha – CRB-7/4403
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 4 16/11/2022 10:55:27
Prefácio
O livro A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais: desafios e 
propostas já nasce sendo uma obra de leitura obrigatória para todos aque-
les que trabalham, escrevem e/ou estudam com direito concorrencial. 
As discussões sobre mercados e ecossistemas digitais já deixaram de ser, há 
algum tempo, meros debates acadêmicos sem aplicação prática, para serem 
uma das principais (ou até a principal) questões atuais, tanto na academia, 
quanto, e principalmente, na seara das decisões tomadas pelas autoridades 
concorrenciais em quase todas as jurisdições.
Nesse sentido, para um maior aprofundamento do debate em torno dos 
ecossistemas digitais, o livro conta com uma coletânea de catorze capítu-
los, compreendendo desde debates propedêuticos e introdutórios sobre as 
especificidades e idiossincrasias dos mercados digitaisno direito antitrus-
te (Capítulos 1 e 2); passando por questões como a correlação entre direito 
da concorrência, direito do consumidor e proteção de dados (Capítulo 3); 
discussões sobre economia e, em especial, economia comportamental e an-
titruste (Capítulos 4 e 5); diversos pontos importantíssimos envolvendo o 
controle de condutas em casos digitais (Capítulos 6, 7, 8 e 9); discussão so-
bre os efeitos práticos dos remédios em mercados digitais (Capítulo 10); a 
questão específica do open banking e seu debate regulatório e concorrencial; 
e, por fim, o debate sobre concentrações digitais e suas novas complexida-
des (Capítulos 12, 13 e 14).
O livro também foi especial ao conseguir reunir excelentes especialis-
tas do direito antitruste brasileiro. Entre os autores, temos ex-integrantes do 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 5 16/11/2022 10:55:27
6 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), como a ex-conselheira 
Paula Farani de Azevedo, o ex-conselheiro e presidente Paulo Furquim, 
e o ex-conselheiro e primeiro superintendente-geral do novo Cade 
Carlos Ragazzo; atuais integrantes do Cade, como o conselheiro Luis 
Braido, o economista-chefe Guilherme Resende e a procuradora-chefe Julia-
na Domingues; militantes na seara da concorrência como o advogado Juliano 
Maranhão, o advogado Gabriel Nogueira Dias, o advogado Francisco Niclós 
Negrão, o advogado Eduardo Gaban e o advogado Bruno Droghetti; e, por 
fim, representantes da academia, como o professor Nicolo Zingales, o pro-
fessor Diogo Rosenthal Coutinho e também novos membros que merecem 
destaque, como Lucas Griebeler, Thales de Melo e Lemos, Bruno Renzetti e 
Isabella Dorigheto Miranda — entre demais outros autores merecedores de 
aplausos pela excelente obra.
Agradeço imensamente o convite feito pela minha colega de Cade, a 
ex-conselheira Paula Farani de Azevedo, e pelo professor Nicolo Zingales 
para prefaciar esta obra. Fico muito honrado com a deferência a mim feita, 
ao mesmo tempo que admito ser de uma grande responsabilidade fazê-lo.
Tenho certeza de que a academia, os profissionais do direito antitrus-
te e a sociedade brasileira como um todo se beneficiarão com este livro. O 
que faz a evolução do direito concorrencial são justamente os debates qua-
lificados como os que constam no presente livro.
Desejo a todos uma ótima leitura!
Brasília, 22 de agosto de 2022.
alexandre Cordeiro Macedo
Presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade)
Doutor em Direito Econômico pela Universidade Federal 
de Minas Gerais (UFMG)
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 6 16/11/2022 10:55:27
Prefácio
Este volume coletivo perspicaz e bem estruturado examina a forma como 
o surgimento de ecossistemas de negócios impactou a lei e a política de 
concorrência. Todos os aspectos da lei e da política de concorrência são en-
dereçados: a economia dos ecossistemas (incluindo o impacto da economia 
comportamental), a conduta unilateral nos ecossistemas e possíveis justifica-
tivas, o uso de algoritmos, fusões e aquisições, concentração de dados, bem 
como a legislação mais ampla, contexto que influencia o ambiente compe-
titivo, como questões de direito contratual. O livro não oferece apenas uma 
análise interdisciplinar de “ecossistemas”, mas também de direito compa-
rado, com discussão da situação na União Europeia e nos Estados Unidos, 
embora seja dada ênfase especial à experiência brasileira.
Este é um tema de extrema importância global, já que as plataformas 
digitais situadas no centro dos ecossistemas de negócios capturam cada vez 
mais uma parte significativa do valor gerado no capitalismo digital, não ape-
nas do trabalho, seja empregado ou em regimes de trabalho alternativos, e 
da contribuição de seus usuários, mas também do capital investido por em-
presas independentes que criam conjuntamente valor (com eles) e fazem 
parte do mesmo ecossistema de negócios1. Esses complementadores (com-
plementors) muitas vezes são tecnologicamente dependentes da plataforma 
para seu acesso aos consumidores finais. As plataformas digitais adotam 
1 J. Bessen, The New Goliaths – How Corporations Use Software to Dominate Industries, Kill 
Innovation, and Undermine Regulation (Yale Univ. press, 2022).
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 7 16/11/2022 10:55:27
8 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
estratégias mistas complexas de captura e criação de valor em seus ecos-
sistemas, de modo que a ferramenta tradicional de direito concorrencial, 
concebida para uma simples economia de competição para e em mercados, 
pode não compreender plenamente.
Desenvolvido no início da década de 19902, o conceito de “ecossistema” 
foi definido em termos amplos como “um grupo de empresas em interação 
que dependem das atividades umas das outras”3. Os ecossistemas são ca-
racterizados por uma “estrutura de alinhamento” na medida em que “existe 
um acordo mútuo entre os membros quanto a posições e fluxos”4, embora o 
“orquestrador do ecossistema” determine os elementos do ecossistema que 
precisarão ser internalizados e aqueles que serão suportados externamente 
para capturar valor. A maioria dos estudos sobre ecossistemas se concen-
tra no papel do ecossistema como um “hub” de relações entre empresas que 
ocorrem dentro do contexto de uma plataforma. Os ecossistemas também 
podem ser considerados como “sistemas de valor”, onde diferentes empre-
sas que produzem principalmente produtos complementares cooperam para 
produzir mais-valia, usando seu capital (incluindo ativos físicos, humanos 
e organizacionais) e capacidades idiossincráticas para implementar a estra-
tégia de ecossistema e alcançar uma vantagem competitiva sustentável que 
possa constituir uma fonte de lucros anormais.
Isso levanta dificuldades importantes para a aplicação da lei de con-
corrência, que tradicionalmente se concentra na concorrência horizontal, 
concorrência entre empresas no mesmo mercado relevante e/ou potenciais 
concorrentes horizontais, e ignora amplamente a importância da concor-
rência vertical, ou seja, a concorrência para capturar a maior porcentagem 
da mais-valia gerada pelo ecossistema empresarial5. Numa economia di-
gital marcada por efeitos de rede, é bastante frequente que a posição dos 
incumbentes só possa ser contestada por empresas verticalmente situadas 
em mercados complementares que podem também beneficiar dos efeitos de 
2 J. Moore, “Predators and Prey: A New Ecology of Competition”, (1993) 71(3) Harvard 
Business Review, 75.
3 M. Jacobides, C. Cennano and A. Gawer, “Towards a Theory of Ecosystems”, (2018) 39 
Strategic Management Journal, 2255.
4 R. Adner, “Ecosystem as Structure – An Actionable Construct for Strategy”, (2017) 43(1) 
Journal of Management, 42.
5 M. Jacobides & I. Lianos, Ecosystems and competition law in theory and practice, (2021) 
30(5) Industrial and Corporate Change, 1199.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 8 16/11/2022 10:55:27
 Prefácio 9
rede, em vez de concorrentes situados no mesmo mercado relevante (con-
corrência vertical de inovação).
O importante papel dos mercados financeiros no desenvolvimento da 
economia digital e a monetização dos insumos digitais também desviam a 
atenção do foco tradicional do direito concorrencial sobre a concorrência 
dentro de um mercado de produto relevante, ou mesmo uma indústria, já 
que parte importante do valor de mercado é criada controlando ou investin-
do em ativos que irão se valorizar e, assim, aumentar o valor de mercado da 
empresa na perspectiva dos mercados financeiros. Essa criação de riqueza 
nem sempre está ligada a uma maior produtividade, mas sim à exploração 
de gargalos competitivos. Esse processo de avaliação de ativos leva a um im-
portante aumento da renda baseada na propriedade, que beneficia a cauda 
superior da distribuição de renda, mas não a parte inferior, que depende 
principalmentedos salários ou da renda gerada por trabalhos sem vínculo 
empregatício, às vezes dependente do uso de as mesmas plataformas digi-
tais para acessar os clientes6.
Ao fornecer uma análise elaborada sobre esses diferentes aspectos da 
competição ecossistêmica e explorar a forma como a aplicação da lei da con-
corrência tem lidado ou deveria lidar com a concorrência interecossistêmica 
e intraecossistêmica, este volume traz uma importante contribuição para 
a discussão intelectual global sobre a transformação do Direito e da política 
de concorrência, da era dos mercados à dos ecossistemas. Os organizadores de-
vem ser parabenizados por reunir esta excelente coleção de contribuições e 
por apresentar uma rica perspectiva sobre este novo campo do direito con-
correncial e análise de políticas para o público brasileiro.
ioannis Lianos
Presidente da Comissão Helénica da Concorrência
Professor de Direito da Concorrência Global e Políticas Públicas, 
Faculdade de Direito da UCL (University College of London)
6 I. Lianos, Competition Law as a Form of Social Regulation, (2020) 65(1) The Antitrust 
Bulletin 3.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 9 16/11/2022 10:55:27
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 10 16/11/2022 10:55:27
sumário
Prefácio Alexandre Cordeiro Macedo .................................................... 5
Prefácio Ioannis Lianos ............................................................................... 7
1 Direito antitruste e ecossistemas digitais: mapeando 
o debate ................................................................................................................. 13
Paula Farani de Azevedo  Nicolo Zingales
2 Das plataformas aos ecossistemas digitais: implicações 
para a definição do poder de mercado .............................................. 47
Nicolo Zingales  Konstantinos Stylianou
3 a interseção das políticas de concorrência, consumo e 
proteção de dados no contexto de ecossistemas digitais ... 83
Juliana Oliveira Domingues  Eduardo Molan Gaban  
Isabella Dorigheto Miranda
4 economia comportamental e antitruste: deu match? ............. 111
Paulo Furquim de Azevedo
5 Desafios à utilização da economia comportamental 
no antitruste ....................................................................................................... 139
Luis Henrique Bertolino Braido
6 eficiências, justificativas legítimas e outras defesas em 
condutas unilaterais e condutas comerciais uniformes 
no Brasil: lições e insights para ecossistemas digitais ........... 163
Nicolo Zingales  Rafaella Schwartz Jaroslavsky
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 11 16/11/2022 10:55:27
12 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
7 ajustando as lentes: novas teorias do dano para 
mercados digitais ............................................................................................ 227
Beatriz Kira  Diogo Rosenthal Coutinho
8 o dever de contratar no contexto dos ecossistemas 
digitais .................................................................................................................... 259
Paula Farani de Azevedo  Bruno Droghetti Magalhães Santos
9 os limites da concorrência frente à inteligência 
artificial ................................................................................................................. 293
Juliano Maranhão  Miguel Garzeri Freire  Marco Almada
10 efeitos práticos dos remédios em mercados digitais: 
as cláusulas MFn ............................................................................................. 323
Gabriel Nogueira Dias  Francisco Niclós Negrão  
Leonardo Peixoto Barbosa
11 o open banking como estratégia regulatória voltada 
à promoção da concorrência no mercado bancário: 
a experiência do reino unido e o caso brasileiro ....................... 357
Carlos Emmanuel Joppert Ragazzo  João Marcelo da Costa 
e Silva Lima
12 Fusões e aquisições em ecossistemas digitais: 
concorrência potencial, nascente e killer acquisitions .......... 389
Guilherme Mendes Resende  Thales de Melo e Lemos
13 Política antitruste e atos de concentração centrados 
em dados ............................................................................................................... 409
Lucas Griebeler da Motta
14 atos de concentração e ecossistemas de plataforma 
digital: revisão da experiência brasileira ......................................... 453
Nicolo Zingales  Bruno Polonio Renzetti
 sobre os autores .............................................................................................. 505
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 12 16/11/2022 10:55:27
1
Direito antitruste e 
ecossistemas digitais: 
mapeando o debate
Paula Farani de Azevedo
Nicolo Zingales
introdução: a importância de entendermos 
a concorrência em “ecossistemas”
O direito antitruste convive faz muito tempo com algumas importantes 
questões regulatórias de difícil resolução: pensa-se, in primis, na tensão en-
tre preços e variedade, ou entre concorrência e incentivos à inovação. Um 
regulador deveria proteger a concorrência potencial mesmo em detrimen-
to da eficiência? Qual seria a justa quantidade de incentivo concedido 
na forma de controle exclusivo sobre um determinado ativo, face à ne-
cessidade de incentivar a inovação sequencial de terceiros que procuram 
o acesso a esse ativo? Embora essas sejam questões de longa data no di-
reito antitruste, estão cada vez mais frequentes em mercados digitais. 
A título exemplificativo, destacam-se dois exemplos: a ação da Comissão 
de Comércio norte-americana (Federal Trade Commission, ou FTC) con-
tra a Meta, pela aquisição da Within, e as dinâmicas de competição entre 
provedores de filmes via streaming.
No dia 27 de julho de 2022, o FTC entrou com uma ação judicial na 
Corte do Circuito Norte da Califórnia, em São Francisco, solicitando o blo-
queio da aquisição, pela Meta, da Within1. A Within é uma empresa de 
1 Federal Trade Commission, “FTC Seeks to Block Virtual Reality Giant Meta’s Acquisition of 
Popular App Creator Within”, 27 jul. 2022. Disponível em: https://www.ftc.gov/news-even-
ts/news/press-releases/2022/07/ftc-seeks-block-virtual-reality-giant-metas-acquisition-popu-
lar-app-creator-within.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 13 16/11/2022 10:55:27
14 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
software que desenvolve uma série de aplicativos para a realidade virtual, 
incluindo o aplicativo “Supernatural”, muito popular na categoria de apli-
cativos “dedicados” (especificamente) ao fitness. Um ponto interessante da 
ação mencionada é que a Meta não possui presença no mercado de aplica-
tivos dedicados ao fitness na realidade virtual, embora possa contar com 
algumas funções parecidas dentro de aplicativos de outro tipo, chamados 
“de fitness incidental”. Contudo, o FTC argumentou que, considerando seus 
recursos econômicos, as capacidades, as vantagens e os incentivos da Meta 
para entrar no mercado de fitness dedicado, a aquisição substituiria uma 
possível concorrência entre a Meta e a Within e, ao mesmo tempo, impedi-
ria a entrada de outros concorrentes com a capacidade de desconcentrar o 
mercado, eliminando, assim, a pressão competitiva devido à existência da 
Within como uma concorrente independente da Meta.
O caso em questão ilustra efetivamente o dilema enfrentado na re-
gulação de mercados complexos que se beneficiam de efeitos de rede e de 
interconexões entre vários produtos e serviços. Por um lado, o regulador 
tenta prevenir a entrada em nichos específicos de players que detêm uma 
posição significativa em outros segmentos relevantes do mercado, visan-
do proteger o surgimento de possíveis forças competitivas independentes 
no mercado como um todo por meio da oferta de produtos e serviços 
complementares, a despeito do critério legal ser redução significativa da 
concorrênciaexistente (substantial lessening of competition); por outro, essa 
intervenção pode implicar no sacrifício de eficiências, ou gerar um efei-
to resfriador para a integração de concorrentes emergentes em produtos 
e serviços complementares. Como deveria uma autoridade determinar a 
melhor forma de agir em tais circunstâncias? Ademais, essa espécie de in-
tervenção preventiva é legítima?
Agora, suponhamos que, além do metaverso, no qual a Meta, para fins do 
presente exercício, detém um grande poder de mercado, existam outros tipos 
de metaverso — ainda em fase incipiente —, nos quais o aplicativo Within não 
tenha essa mesma popularidade, e nos quais estejam surgindo diversos aplica-
tivos alternativos dedicados ao fitness. Deveria a presença dessas alternativas 
ser considerada como suficiente para afastar qualquer preocupação compe-
titiva no mercado de fitness apps dedicados, ou deveria a autoridade proteger 
a própria competição dentro de cada um desses metaversos? Essa é, de uma 
certa forma, a pergunta que nós podemos levantar no contexto mais fami-
liar da concorrência entre provedores de filmes via streaming. Sem dúvida, a 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 14 16/11/2022 10:55:27
 direito antitruste e ecossistemas digitais: mapeando o debate 15
disrupção do setor de entretenimento pela Netflix gerou um grande valor para 
os consumidores, aumentando a gama de escolhas disponíveis ao alcance de 
um click e, inclusive, permitindo a criação de produções próprias da empresa, 
que refletem as preferências observadas na plataforma. Contudo, após alguns 
anos, em 2022, pela primeira vez, os resultados da Netflix no Brasil revelaram 
uma queda de assinantes2, explicada, em grande parte, pela entrada no mer-
cado de outros grandes fornecedores de streaming — por exemplo, a Prime 
Video, a Disney Plus, a HBO Max, a Globo Play e outros. Essa cisão em múl-
tiplos mercados paralelos era esperada, considerando o crescimento constante 
da demanda e a oportunidade que vários competidores da Netflix percebe-
ram de criar valor assegurando a exclusividade de um conteúdo que gerasse 
um diferencial competitivo, o que culminou na retirada de vários conteúdos 
da plataforma incumbente.
Essa competição pelo mercado tem gerado incentivos à inovação do 
modelo de negócio predominante, como é demonstrado pela introdução, 
na Netflix, da publicidade e pela atuação de alguns players (como a Prime 
Video) em múltiplos canais paralelos que geram economias de escopo en-
tre eles. Ao mesmo tempo, um efeito menos debatido dessa competição é 
a percepção pelos consumidores da insuficiência de uma única assinatura 
de streaming para poder acompanhar as principais novidades, com conse-
quente aumento geral dos custos, sem uma clara contrapartida do ponto de 
vista da qualidade dos conteúdos disponíveis. Não surpreende que, em face 
dessa situação, a pirataria de filmes no Brasil tenha aumentado em 16% no 
ano de 20213.
Novamente, o dilema do regulador se apresenta em relação aos acordos 
de exclusividade existentes entre as plataformas e os provedores de conteúdo, 
assim como na definição do que deveria ser considerado como o mercado a 
ser protegido: até que ponto seria legítimo tolerar uma conduta de exclusivida-
de em um desses canais de distribuição, particularmente por uma empresa 
que atualmente possui a maior quota de mercado? Seria importante prote-
ger a existência de canais alternativos ou seria mais interessante promover a 
2 Poder 360, ‘’Netflix tem queda de assinaturas pela 1a vez desde 2011”, 20 abr. 2022. Dispo-
nível em: https://www.poder360.com.br/tecnologia/netflix-tem-queda-de-assinaturas-pela-1a-
vez-desde-2011/?utm_source=meio&utm_medium=email.
3 DEMARTINI, F. “Acesso a sites de pirataria aumentou 16% em 2021”, Yahoo Finanças, 01 
fev. 2022. Disponível em: https://br.financas.yahoo.com/news/acesso-sites-pirataria-aumen-
tou-16-222000485.html?guccounter=1.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 15 16/11/2022 10:55:27
16 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
competição dentro de um único ecossistema, oferecendo aos consumidores 
uma experiência de one-stop-shop, embora potencialmente com preços mais 
altos? E mais: em que medida um eventual aumento da taxa de apropriação 
de valor da plataforma e uma simultânea diminuição na proporção de valor 
recebido pelos provedores de conteúdo deveria ser considerada uma prática 
anticompetitiva, especialmente considerando a incidência do multi-homing 
(ou seja, a participação em mais de um mercado, tanto pelos provedores de 
insumos quanto pelos consumidores)?
Essas são algumas das questões que serão abordadas por esta coletânea. 
Seu objetivo é jogar luz na concorrência em ecossistemas digitais — uma for-
ma de organização de negócios que se encontra facilitada pela transição da 
economia para o mundo digital — e nos desafios regulatórios que acompa-
nharão essa evolução da economia.
A título de esclarecimento, convém mencionar que esta obra não é mais 
uma tentativa de resumir as características dos mercados digitais e os desafios 
que eles trazem para a análise concorrencial, tal qual fizeram diversos relatórios 
e propostas regulatórias ao longo dos últimos anos4. Tampouco é pretensão 
dos organizadores cobrir de forma exaustiva o debate ou fornecer uma res-
posta definitiva às grandes questões envolvidas na interação entre Estado e 
mercado em relação à governança de ecossistemas digitais. O ponto central 
que se pretende colocar em pauta é a necessidade de um maior entendimen-
to das dinâmicas que caracterizam a concorrência em ecossistemas digitais, 
e uma maior reflexão sobre a adequação das ferramentas atualmente utiliza-
das na análise antitruste para fenômenos tão complexos e multidimensionais.
No Brasil, não faltam discussões sobre a aplicação da concorrência em 
mercados digitais, inclusive, há um recente caderno do Cade (Cade, 2021), que 
define como plataforma digital um serviço digital que facilita as interações en-
tre dois ou mais conjuntos distintos e interdependentes de usuários (empresas 
ou indivíduos) que interagem por meio da internet. O caderno corretamente 
reconhece as características mais importantes da concorrência nesse ambiente, 
4 Ver Cade, Mercados de plataformas digitais. Cadernos do Cade. Brasília, ago. 2021. Dis-
ponível em: https://cdn.cade.gov.br/Portal/centrais-de-conteudo/publicacoes/estudos-eco-
nomicos/cadernos-do-cade/plataformas-digitais.pdf. Cade, “BRICS in the Digital Economy: 
Competition Policy in Practice”. Disponível em: https://cdn.cade.gov.br/Portal/Not%C3%A-
Dcias/2019/Cade%20lan%C3%A7a%20relat%C3%B3rio%20sobre%20economia%20digi-
tal%20em%20reuni%C3%A3o%20do%20BRICS__brics_report.pdf. BRICS COMPETITION 
CENTRE, “Digital era Competition: a BRICS view”. Disponível em: https://bricscompetition.
org/uploads/publications/brics-book-full-00d8c66ce2.pdf.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 16 16/11/2022 10:55:27
 direito antitruste e ecossistemas digitais: mapeando o debate 17
que inclui baixos custos marginais, alcance global, economias de escala e de 
escopo, efeitos de rede e políticas de subsídio cruzado entre produtos (o que 
frequentemente implica preço zero), entre outros. Muitas reflexões poderiam 
ser feitas sobre esses elementos, dos quais cada um tem o potencial de afetar 
significativamente a forma como a concorrência se desenvolve e é analisada 
pelas autoridades. Contudo, conforme antecipado, não é o nosso objetivo aqui 
simplesmente revisitar esses conceitos: o ponto central é compreendermos as 
implicações de algumas dessas características na proliferação de uma forma 
organizacional predominante na economia digital: os ecossistemas digitais.
É igualmente importante destacar que, quando falamos de transição 
para o mundo digital, já não nos parece adequado considerar o digital como 
um setor específico, ou uma modalidade particular de venda distinta de ou-
tras. Isso porque as tecnologias digitais hodiernamenteestão sempre mais 
incorporadas aos modelos de negócio da maior parte das empresas, seja pela 
venda e promoção de produtos, seja pela possibilidade de conectar produ-
tos à internet e de oferecer serviços complementares aos clientes online. Por 
essa razão, e pela consequente atuação paralela de empresas em uma série 
de canais interconectados, vislumbra-se a necessidade de entender a evolu-
ção da concorrência não apenas em mercados digitais, mas nos ecossistemas 
de atores que se juntam para a criação de propostas de valor. Essa mudança 
de enfoque faz-se necessária, uma vez que a análise de condutas e estru-
turas dos operadores econômicos dentro de mercados específicos corre o 
risco de ignorar as “propriedades emergentes” que caracterizam o conjunto 
de atores que operam no ambiente digital, exatamente como um olhar para 
o comportamento de indivíduos de forma isolada não permite a apreciação 
integral das interações que acontecem em ecossistemas biológicos. Nes-
se sentido, ecossistemas são montagens não hierárquicas que dão origem a 
propriedades que ultrapassam aquelas de componentes individuais, e onde 
interconectividade e amplificação governam a construção, o crescimento e a 
manutenção das relações mútuas (Esayas, 2015). Por exemplo, a observação 
de uma única formiga de forma isolada pode levar a um mal-entendido so-
bre o seu comportamento, ou até mesmo a negligenciar o propósito coletivo 
da colônia de formigas como um todo. Outrossim, pode-se tomar o exemplo 
do valor dos direitos de transmissão de um jogo de futebol: ele não depen-
de apenas das características intrínsecas desse jogo, ou mesmo da soma dos 
desempenhos (esperados) de jogadores individuais nele, mas também de 
suas inter-relações, a combinação com os outros jogos disputados naquela 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 17 16/11/2022 10:55:27
18 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
liga (que determinam a importância relativa desse jogo), bem como o apoio 
(esperado) por parte das torcidas de futebol dessas equipes (que acrescen-
tam valor ao desempenho por meio da coreografia).
Com efeito, a emergente literatura sobre ecossistemas os define como 
“um conjunto de atores com […] complementaridades multilaterais e não 
genéricas que não são controladas hierarquicamente” (Jacobides et al., 2018). 
Elemento crucial dessa definição é a não hierarquização, que significa que 
não existe um sistema de controle dentro de uma empresa só para regular 
de forma granular todo aspecto da cadeia produtiva: vários aspectos, em 
particular os que requerem mais especialização, são deixados ao mercado 
(Williamson, 1975). Esse ponto é fundamental para distinguir os ecossis-
temas das cadeias de valor criadas por empresas (plataformas ou não), por 
meio de verticalização e atuação em mercados adjacentes: os ecossistemas 
dependem de uma terceira forma de organização entre mercado e hierar-
quia, chamada de “híbrida”, onde a empresa subcontrata algumas das suas 
funções, mas ao mesmo tempo mantém algum grau de coordenação das ati-
vidades dos contratados (Williamson, 1991).
No caso específico dos ecossistemas embasados em plataformas di-
gitais, ou outros ecossistemas que podem contar com grandes efeitos de 
redes indiretos, pode-se até afirmar que existe uma inversão da famosa 
“teoria da firma”, de Ronald Coase (Coase, 1927). Lembra-se que, confor-
me essa teoria, os empreendedores optaram pela regulação das operações 
dentro de uma empresa, em vez de contratarem alguém no mercado para 
o fornecimento dos mesmos serviços, devido aos custos transacionais en-
volvidos nesse processo. Diferentemente, a teoria da “firma invertida” 
argumenta que, atualmente, os líderes de mercado optaram por inovar e 
alcançar escala atraindo grandes números de clientes interdependentes 
(tanto consumidores quanto vendedores), e, para tanto, procuram con-
tratos “abertos” externos, em vez da integração vertical “fechada” ou dos 
subcontratos (Parker et al. 2017). Isso porque os ganhos que podem ser de-
rivados por meio dos efeitos de rede são mais expressivos, pelo menos em 
uma primeira fase de crescimento do ecossistema, do que as reduções de 
custos transacionais. Esse processo dá origem a uma corrida inicial entre 
poucos criadores de mercado, que se portam como infraestruturas-chave 
para a criação de valor, e torna possível o atingimento de um volume ele-
vado de transações. Para além dos ganhos que são percebidos por meio 
de taxas por transações intermediadas, a oportunidade de captar os dados 
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 direito antitruste e ecossistemas digitais: mapeando o debate 19
e a atenção dos usuários atrai essas empresas e lhes permitem moldar os 
mercados em torno de perfis de consumidores cada vez mais específicos, 
virando, assim, interlocutores ainda mais importantes para a criação de 
valor por meio da veiculação de ofertas direcionadas.
Ao mesmo tempo, é claro que esse círculo virtuoso de criação de va-
lor não é um resultado casual, mas pressupõe a existência de uma estrutura 
específica de governança e alinhamento de relações entre os atores do ecos-
sistema (Adner, 2017; Kapoor, 2018). Essa estrutura é definida por uma 
entidade particular, que tem controle sobre um produto, um serviço, uma 
inovação ou uma tecnologia apresentada aos consumidores como a ofer-
ta principal (ou “focal”), e que proporciona uma arquitetura para conectar 
essa oferta com a de atores parceiros (chamados, no caso de ecossistemas 
de plataformas digitais, de “complementadores”, ou “complementors”) e com 
os consumidores finais, assim como uma série de regras relacionais entre 
os atores do ecossistema. Essas regras envolvem três dimensões: (1) divisão 
de autoridade entre os proprietários da plataforma e os complementadores 
(ou seja, repartição de direitos de decisão); (2) mecanismos de controle das 
plataformas sobre os complementadores, garantindo que os trabalhos des-
tes estejam alinhados aos interesses dos primeiros; e (3) políticas de preços.
Atuando dessa forma, o orquestrador transmite uma verdadeira vi-
são para a criação de valor, bem como alguns limites à conduta tanto dos 
parceiros quanto dos consumidores: isso é necessário porque a “gerativi-
dade” do ecossistema, definida como a capacidade de promover inovação 
complementar por meio de atores autônomos, pode gerar efeitos positi-
vos assim como negativos, e, portanto, para ser bem-sucedida precisa de 
mecanismos de moderação (Cennamo e Santaló, 2019; Wareham et al., 
2014). Nos ecossistemas baseados em plataformas digitais (que chamare-
mos daqui para a frente de EPD), nos quais o ponto focal é a plataforma, 
essa estrutura é criada principalmente por meio de documentos contra-
tuais (como termos de uso e normas da comunidade) e padrões técnicos 
(tipicamente, definidos nos Software Development Kits e nas Application 
Program Interfaces).
Como veremos na Seção 2, o papel de regulador dessas empresas como 
orquestradores de sistemas é crucial para permitir o crescimento e evitar ex-
ternalidades negativas, mas, ao mesmo tempo, oferecer-lhes oportunidades 
de abuso e extração de rendas, de forma tal que pode impactar a concorrên-
cia, a inovação e a eficácia das políticas públicas.
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20 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
1. Fatores que determinam a concorrência 
nos ecossistemas
Todas essas características particulares dos ecossistemas levam a novas es-
tratégias e dinâmicas competitivas, que, por sua vez, são guiadas por fatores 
de sucesso também distintos daqueles que costumam pautar os setores tra-
dicionais da economia ou mesmo outros modelos de negócios estruturados 
no ambiente digital.
Por conta das suas características, os ecossistemas trouxeram novas 
dinâmicas competitivas e assimetrias de poder. Enquanto nos mercados 
tradicionais empresas concorrem, sobretudo, na dimensãopreço, os ecos-
sistemas, ao ofertarem uma miríade de produtos e serviços em constante 
inovação, por meio de uma diversidade de atores que se relacionam de ma-
neira complementar e interdependente, concorrem para gerar maior valor 
a seu sistema e torná-lo o mais atrativo possível.
Conforme aponta a Organização para Cooperação e Desenvolvimento 
Econômico (OCDE), diferentemente da dinâmica dos mercados tradicio-
nais, a concorrência entre os ecossistemas se dá pelo mercado, uma vez que 
as suas características levam empresas a competirem para se tornarem as 
ofertantes de um mercado como um todo, em vez de apenas uma parcela 
dele. Embora em tais mercados players dominantes (ou monopolistas) não 
enfrentem fortes pressões competitivas, eles podem rivalizar com players 
fora deles que almejem por eles competir. No entanto, como tais rivais ge-
ralmente inibem uma parcela não significativa de aumento de preços, por 
exemplo, tal mercado se traduz em maiores mark-ups para o player domi-
nante, e em uma menor competição, se comparada com um mercado no 
qual haja “concorrência no mercado”5.
A concorrência entre ecossistemas ocorre, portanto, pelo mercado 
— ampla mente definido — e não propriamente pela liderança ou posição 
dominante dentro de um mercado relevante já estabelecido. O objetivo é 
que os ecossistemas se tornem criadores e ofertantes da integralidade dos 
produtos que compõem o mercado, em vez de apenas tomarem para si uma 
parcela, ainda que relevante, dele.
5 OCDE. Global Forum on Competition. Competition for-the-market. Background note by 
the Secretariat, 2019, pp. 6–7. Disponível em: https://one.oecd.org/document/DAF/COMP/
GF(2019)7/en/pdf. Acesso em: 21 jan. 2022.
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 direito antitruste e ecossistemas digitais: mapeando o debate 21
Em razão disso, a disputa entre ecossistemas gera um importante im-
pulso para a criação de novos mercados por meio de inovações disruptivas. 
Nessa linha, em tais mercados, para que um competidor seja bem-sucedido, 
é necessário que um novo produto possa superar a barreira à entrada (e.g. 
inovação disruptiva) ou que uma nova versão de um produto alternativo 
já existente seja significativamente mais barata ou melhor que a anterior e, 
portanto, torne-se uma substituta mais próxima que a antiga. Tais merca-
dos podem, assim, oferecer um incentivo valioso para que a concorrência 
pela inovação crie novos mercados.6
Tal dinâmica pode ser facilmente observada em nosso cotidiano. 
Dentre inúmeros exemplos, menciona-se a introdução da loja virtual de 
música (digital music store) do Google no início da década passada. Mui-
to embora o Google já fosse um ecossistema dominante a partir de seu 
sistema de buscas, a referida loja virtual de música foi introduzida para 
posicioná-lo em competição direta com a Apple, a Amazon e o Facebook, 
e tornar o seu ecossistema ainda mais atrativo para os seus colaborado-
res e consumidores.7
Nesse contexto, as forças que determinam a dinâmica competitiva dos 
ecossistemas não são mais majoritariamente aquelas enumeradas por Porter 
na década de 19708, e, sim, aquelas que podem afetar o poder e a atrativi-
dade dos ecossistemas no mercado, tais como efeitos de rede, clustering da 
rede, desintermediação, multi-homing e network bridging.9
Dessa forma, tal como ressalta Lianos, para se realizar um exame acerca 
da dinâmica competitiva dos ecossistemas, mais importante do que focar a 
6 Op. Cit, p. 7.
7 Ver, nesse sentido: https://mediadecoder.blogs.nytimes.com/2011/11/16/google-opens-a-
digital-music-store/. Acesso em: 24 nov. 2021.
8 De acordo com Porter, as forças que determinam a concorrência são: ameaça de novos 
entrantes, poder de barganha de clientes, ameaça de produtos substitutos, poder de barga-
nha dos fornecedores e rivalidade entre concorrentes: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.
php/5048756/mod_resource/content/1/Porter-HBR.pdf.
9 Algumas dessas forças são depletivas, no sentido usado por Porter. A desintermediação é 
um exemplo claro disso. A desintermediação ocorre quando os usuários da plataforma de 
um lado e os ofertantes do outro lado estabelecem uma relação por meio da plataforma, 
mas fecham negócios fora da plataforma. Nesses casos, a plataforma gera valor, mas não 
captura os ganhos financeiros que são incorporados pelos próprios usuários. Ver, nesse 
sentido: ZHU, F. e IANSITI, M. “Why some platforms thrive and others don’t”, HBR Ma-
gazine, 2019. Disponível em: https://hbr.org/2019/01/why-some-platforms-thrive-and-o-
thers-dont.
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22 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
tradicional metodologia antitruste voltada à definição de mercado relevan-
te e à dimensão competitiva do preço, é preciso se atentar para estratégias 
de captura de valor desempenhadas por agentes econômicos que competem 
para: (i) aumentar a sua base de clientes, e/ou; (ii) obter vantagem de efei-
tos de rede e serem percebidos como detentores de gargalos, mesmo que tal 
estratégia, sob uma perspectiva de preço-custo, possa não ser lucrativa.10
A luta por uma maior base de clientes explica o motivo pelo qual empre-
sas continuam a oferecer produtos de graça, mesmo que os ganhos obtidos 
ou a habilidade de se coletar dados pessoais possam não ser monetizados 
imediatamente. Conforme aponta Lianos, a captura de uma maior base de 
clientes, amparada em uma lucratividade reduzida ou negativa, não seria, 
no entanto, o objetivo principal das referidas estratégias. Tais estratégias fa-
zem sentido se as empresas, ao obterem uma maior base de clientes, forem 
capazes de desenvolver habilidades em predições que gerarão benefícios a 
longo prazo.
Nesse contexto, muitas vezes não é aplicável a lógica de que a empresa 
está buscando o maior número de transações financeiras e não agiria de ma-
neira a diminuir o seu faturamento. O que a literatura vem demonstrando é 
que a estratégia competitiva adotada dependerá do momento de amadureci-
mento do sistema e do papel específico daquele ator dentro dele. No entanto, 
em uma perspectiva de longo prazo, as estratégias de captura de usuários 
por meio do preço-zero só farão sentido se as empresas, ao obterem uma 
maior base de clientes, forem capazes de desenvolver habilidades em predi-
ções que gerarão benefícios e lucratividade a longo prazo.11
Ademais, por conta das características da economia digital, observa-se 
não apenas a mudança substancial de elementos e dimensões competi-
tivas, mas também a substituição do até então tradicional do modelo 
industrial de pipeline (e.g., um modelo linear de “mão única”, que cria e 
transfere valor com produtos em uma extremidade e consumidores na 
outra) pelo modelo de negócio do próprio ecossistema, em que agentes 
econômicos utilizam plataformas e uma estrutura organizacional conglo-
merada para atrair usuários, agregar valor ao ecossistema e alavancar os 
10 LIANOS, I. Competition Law for the Digital Era: A Complex Systems’ Perspective. Research 
Paper Series 6/2019. Centre for Law, Economics and Society (CLES), Faculty of Laws, UCL, 
pp. 103–104. Disponível em https://www.ucl.ac.uk/cles/sites/cles/files/cles_6-2019_final.
pdf. Acesso em: 24 nov. 2021.
11 Op. Cit. pp. 103–104. 
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 direito antitruste e ecossistemas digitais: mapeando o debate 23
seus negócios por meio de uma série de trocas que não seriam possíveis 
fora do ecossistema.12 A mudança de tal modelo implica transformar a 
simples configuração do pipeline em um sistema complexo, em que pro-
dutores, consumidores e a própria plataforma estabelecem entre si um 
conjunto variável de relações.
Como consequência, a substituição de tal modelo fez com que os 
agentes econômicos invertessem a “arquitetura de produção” e deixas-
sem de controlá-la13. Assim, se antes o modelo de produção se dava por 
meio do controle de todosos elos da cadeia produtiva, atualmente, os 
agentes se tornaram “orquestradores” e arquitetos de um ecossistema que 
permite uma série de trocas de alto valor agregado entre os seus usuá-
rios e consumidores.
Nesse sentido, de acordo com Van Alstyne et al., a mudança do mo-
delo de pipeline para o modelo de ecossistema demandou três mudanças 
significativas, a saber: (i) de “controle de recursos” para “recursos de or-
questração”; (ii) de “otimização interna” para “interação externa”; e (iii) de 
“foco em valor ao consumidor” para “foco em valor para o ecossistema”.14 
Tem-se, em outras palavras, uma migração da tradicional economia pelo 
lado da oferta (supply-side economics) para uma economia de escala pelo la do 
da demanda (demand-side economies of scale), também conhecida como 
“efeitos de rede”.
Dessa forma, por conta dos efeitos de rede, a curva da demanda de um 
ecossistema possui a forma de um “U” invertido, conforme pode ser ob-
servado na Figura 1.1. Quando a demanda se encontra na fase inicial do 
mercado (isto é, a curva de demanda é ascendente), há ainda muitas in-
certezas. O mercado ainda não atingiu o ponto crítico ou de ruptura, e as 
decisões tomadas pela empresa podem afetar substancialmente a sua posi-
ção no mercado. Tal fase, de acordo com Petit, possui uma alta possibilidade 
de churn de sistema (network churn).
12 “[P]latform businesses bring together producers and consumers in high-value exchanges”. 
Ver VAN ALSTYNE, PARKER e CHOUDARY. “Pipelines, platforms, and the new rules of 
strategy”, Boston, Mass.: Harvard Business School Publ. Corp., ISSN 0017-8012, ZDB-ID 
2382-6 — vol. 94.2016, 4, pp. 54–62.
13 Op. Cit.
14 VAN ALSTYNE, PARKER e CHOUDARY. “Pipelines, platforms, and the new rules of strategy”, 
Boston, Mass.: Harvard Business School Publ. Corp., ISSN 0017-8012, ZDB-ID 2382-6. 
— Vol. 94.2016, 4, pp. 54–62.
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24 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
0 2 4 6 8 10 12
18
16
14
12
10
8
6
4
2
0
D
is
po
si
çã
o 
a 
pa
ga
r A+ B+B´
A´A
Número de usuários (em milhões)
Figura 1.1 curva de demanda em “U” invertido
Fonte: Petit, Nicolas. Big tech & the digital economy15
Observa-se, pelo gráfico, que o topo da curva de demanda representa 
o momento em que o mercado atinge o ponto de ruptura. Já na fase em que 
o mercado está na curva de demanda descendente, há o que Petit chama de 
network rigidity, ou rigidez do sistema. Em tal fase, as decisões da empresa 
não afetam sobremaneira a sua sobrevivência, e a saída ou entrada de no-
vos usuários não reduz a utilidade abaixo do nível esperado de qualidade 
do ecossistema.16
Portanto, dado que os agentes econômicos são obrigados a acelerar o 
seu crescimento o mais rápido possível para atingir o ponto de ruptura do 
mercado17, como operadores de um ecossistema, eles precisam incentivar 
15 Petit, N. Big Tech & the Digital Economy. Oxford University Press. 2020. p. 79.
16 Petit, N. Big Tech & the Digital Economy. Oxford University Press. 2020. pp. 78–79.
17 Tal efeito, denominado de market tipping, ocorre por conta dos efeitos multiplicadores (feed - 
back loops) originados pelas externalidades de rede que atraem cada vez mais usuários 
quanto maior for o seu número. Michael L. Katz e Howard Shapiro definiram tipping 
como “a tendência de um sistema de se afastar dos rivais em popularidade ao atingir uma 
vantagem inicial” (tradução livre de the tendency of one system to pull away from its rivals 
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 direito antitruste e ecossistemas digitais: mapeando o debate 25
atividades que agreguem valor à sua plataforma, além de monitorar forças 
contrárias a seu crescimento. Tal tarefa não é trivial e acaba por transformar o 
agente econômico em uma espécie de regulador privado do seu ecossistema.
Assim, tendo em vista que a dinâmica competitiva consiste em atrair 
o máximo de usuários e consumidores para os ecossistemas, tal dinâmica 
pode ocasionar uma sequência de “monopolistas” (no sentido não técni-
co do termo), na medida em que o mercado se torna tão atrativo, a ponto 
de os usuários convergirem para apenas um deles. Entretanto, a dominân-
cia dos ecossistemas não será necessariamente permanente, dado que um 
mercado, que já atingiu o ponto crítico ou de ruptura, pode atingir tal pon-
to novamente18.
Quanto a esse ponto, ressalta-se que não é a empresa ou o produto que 
atinge tal ponto, mas o próprio mercado19, e é por esse motivo que, em al-
guns mercados, a primeira empresa entrante não é necessariamente aquela 
que monetiza e se torna dominante quando o mercado atinge tal ponto20. 
Isso é verdade principalmente em mercados com mais de uma plataforma, 
em que há algum nível de multi-homing. É o que ocorreu, por exemplo, no 
mercado de redes sociais, em que o MySpace deu lugar ao Facebook, que 
hoje sofre uma intensa concorrência com o TikTok e o YouTube. Tal mode-
lo de concorrência, identificado por Schumpeter como inovação destrutiva 
(destructive innovation), não socorre aqueles que não conseguem acompa-
nhar a corrida pela inovação. O consumidor, por sua vez, muitas vezes é 
beneficiado por tal estratégia:
in popularity once it has gained and initial edge. Ver KATZ, M. L. e SHAPIRO, C. 1994. 
“Systems Competition and Network Effects”, Journal of Economic Perspectives, 8 (2): 
93-115.DOI: 10.1257/jep.8.2.93 e MORTON, F. S. et al. Report: Committee for the Study of 
Digital Platforms – Market Structure and Antitrust Subcommittee. George J. Stigler Center for the 
Study of the Economy and the State, The University of Chicago Booth School of Business (2019), 
p. 13. Disponível em: https://research.chicagobooth.edu/-/media/research/stigler/pdfs/market-
structure-report.pdf?la=en&hash=E08C7C9AA7367F2D612DE24F814074BA43CAED8C. 
Acesso em: 16 nov. 2021.
18 Op. Cit.
19 “It is neither a firm that reaches critical mass nor its product that tips. It is the market.” Op. 
Cit.
20 “Griffin offers the following example: Myspace made the early investments in social networks, 
pushing the market toward tipping. But Myspace was impatient. Facebook was not. Face-
book’s slow monetization strategy eventually paid off.” PETIT, P. 87. Ver também GRIFFIN, 
T. “Two Powerful Mental Models: Network Effects and Critical Mass”. Andreessen Horowitz, 
2016. Disponível em: https://a16z.com/2016/03/07/network-effects_critical-mass/.
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26 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
(…) in such markets periodic dominance by one firm or a few firms may 
be symptomatic of healthy, innovation based competition and may be 
subject to displacement, even when goods with network externalities 
are at issue. Creative destruction thus implies that antitrust policy ba-
sed on static analysis of today’s market conditions can be misleading 
and, over time, injurious to consumers.21
No entanto, no caso dos ecossistemas22, tendo em vista que há pouco 
espaço para a consolidação de mais de um agente no mercado, autoridades 
de defesa da concorrência ao redor do mundo têm cada vez mais se preo-
cupado com as condições de entrada e de acesso, visto que, em tais casos, a 
tendência é que os seus operadores necessitem estabelecer regras que garan-
tam que a concorrência seja justa, imparcial e pró-usuários:
In markets where network externalities and returns to scale are strong, 
and especially in the absence of multi-homing, protocol and data intero-
perability, or differentiation, there might be room in the market for only 
a limited number of platforms. The consequences for competition policy 
are twofold. First, to provide incentives to supply goods and services on 
reasonable conditions and to innovate, it is essential to protect compe-
tition “for” the market. (…). Second, it is equally important to protect 
competition on a dominant platform (which in many casesmight be the 
same as protecting competition “in” the market). In this respect, we argue 
that platforms play a form of regulatory role as they determine the rules 
according to which their users, including consumers, business users and 
providers of complementary services, interact, and, when they are domi-
nant, have a responsibility to ensure that competition on their platforms 
is fair, unbiased, and pro-users.23
Dessa forma, dado que os ecossistemas trouxeram novas dinâmicas com-
petitivas, as estratégias de competição também evoluíram para diferentes 
21 SCHUMPETER, J. Capitalism, Socialism and Democracy, 1942.
22 Em que há a presença de significativos efeitos de rede, relevantes economias de escala e de 
escopo, e nos quais existe pouca diferenciação (diminuindo, assim, as chances de multi- 
homing).
23 CRÉMER, J.; de MONTJOYE, Y.-A. e SCHWEITZER, H. “Competition policy for the digital 
era”, European Commission, 2019, p. 8. Disponível em: https://ec.europa.eu/competition/
publications/reports/kd0419345enn.pdf.
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 direito antitruste e ecossistemas digitais: mapeando o debate 27
práticas. Nesse sentido, em vez de erguerem barreiras à entrada, por exem-
plo, agentes econômicos têm aumentado as suas redes por meio da conexão 
entre elas (network bridging). Esse fenômeno explica por que algumas plata-
formas se transformaram em ecossistemas, já que a conexão entre diversas 
redes possibilita que alavanquem os dados e o poder de mercado obtidos 
em uma rede para as suas demais redes. Por tal motivo, algumas empresas, 
como a Amazon, a Alibaba e a Apple, dentre outras, entraram para merca-
dos correlatos. Essas são as empresas que Ezrachi e Stucke denominam de 
“superplataformas” e nais quais, de acordo com os autores, reside o verda-
deiro poder de mercado.
Já outra estratégia relaciona-se, por exemplo, à criação de trincheiras 
(moats) de proteção do mercado principal do ecossistema. Tais trinchei-
ras podem ser implementadas por meio de estratégias conglomeradas, de 
self-preferencing ou de alavancamento, e acabam por criar um ecossistema 
estruturado como um verdadeiro conglomerado.
Na medida em que o mercado e o próprio ecossistema se confundem, 
conforme já mencionado, o mercado deixa de ser um ambiente público, regu-
lado apenas pelo Estado, e passa a ser também regulado por um ente privado 
que, por vezes, possui conflitos de interesse com os usuários que atuam e se 
relacionam na sua plataforma. Um exemplo da referida regulação privada é 
a App Store, da Apple. A Apple possui um ecossistema fechado que veda o 
side-loading (isto é, que apenas permite que um aplicativo seja vendido em 
sua loja se cumprir com os seus termos e condições). Dentre tais termos, 
incluem-se os termos relacionados ao conteúdo do aplicativo. De acordo 
com a Apple, os seus aplicativos devem respeitar diferentes pontos de vis-
ta e não podem ser ofensivos para quem pense diferente. No entanto, a sua 
política não revela claramente o que constitui “ofensa” e tampouco qual é o 
limite de tolerância da Apple:
We strongly support all points of view being represented on the App Store, 
as long as the apps are respectful to users with differing opinions and the 
quality of the app experience is great. We will reject apps for any content 
or behavior that we believe is over the line. What line, you ask? Well, as a 
Supreme Court Justice once said, “I’ll know it when I see it”. And we think 
that you will also know it when you cross it.24
24 Disponível em: https://developer.apple.com/app-store/review/guidelines/. Acesso em: 17 set. 
2021.
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28 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
Tal regra denota claramente que a Apple determinará o que ela enten-
de ser razoável dentro do seu ecossistema e que ela é a autoridade máxima 
em tal ambiente. Referida regra denota também que o seu entendimento é 
subjetivo e, como toda política subjetiva, pode ser manipulada para excluir 
concorrentes.
Observa-se, portanto, que, em tal ambiente, constituído de concorrência 
e interdependência, o direito antitruste deve estar atento às inúmeras formas 
de abuso de posição dominante. Em situações em que o detentor do ecossis-
tema possui não apenas poder frente a outros ecossistemas, como também 
poder sobre as próprias regras que impõe a todos os atores que compõem 
o seu ecossistema, há uma clara situação assimétrica que não apenas gera 
uma vantagem competitiva, mas um reforço de poder de mercado que pos-
sibilita o seu abuso.
2. implicações e desafios para direito da concorrência
As observações mencionadas, acerca da emergência dos ecossistemas 
de plataformas digitais como modelo de organização, apontam algumas 
complicações relativas à análise antitruste tradicional. Nesta seção, elen-
camos as maiores implicações dessa mudança, na esperança de orientar o 
futuro debate. Contudo, cada um dos itens elucubrados a seguir consti-
tui um verdadeiro eixo de pesquisa que merece ser enfrentado de forma 
integral pela comunidade antitruste, e não apenas no âmbito da pesqui-
sa acadêmica.
A primeira implicação da emergência de ecossistemas é a de que preci-
samos repensar nossa metodologia para a avaliação de poder concorrencial, 
particularmente em um ambiente em que há competição entre firmas que 
atuam simultaneamente em vários mercados. Esse tipo de concorrência de 
“amplo espectro” (Petit e Teece, 2020) dificulta e torna menos determinan-
te a definição do mercado relevante, que constitui tipicamente o primeiro 
passo (e, em muitos casos, um passo determinante) da análise antitruste. A 
definição de mercado é embasada na substitutibilidade de produtos, olhar 
que ignora ao menos dois tipos de poderes que são relevantes para entender 
a capacidade dos orquestradores de ecossistemas de restringir a concorrência 
de forma prejudicial para o consumidor. Por um lado, em uma perspectiva 
macro, a competição de amplo espectro pode implicar uma perda da varie-
dade, na medida em que força concorrentes a entrar em múltiplos mercados 
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 direito antitruste e ecossistemas digitais: mapeando o debate 29
simultaneamente para competir efetivamente. Por outro, olhando de uma 
perspectiva micro, a posição privilegiada de intermediação dos orquestra-
dores permite a imposição de termos que impactam de forma expressiva a 
concorrência entre complementors, possibilitando também o alavancamen-
to dessa posição do orquestrador em mercados secundários. Essa segunda 
dimensão de concorrência pode se manifestar não apenas no fechamen-
to desses mercados, mas também na captura de uma parte maior do valor 
criado pelo produto ofertado por terceiros. Em outras palavras, os orques-
tradores podem aproveitar da própria posição privilegiada para se apropriar 
de uma fatia maior do bolo de valor criado pelos parceiros por meio da pla-
taforma, em vez de reparti-lo de forma justa entre os atores que participam 
da criação de valor.
Essa tensão entre os objetivos dos atores de um conjunto é ponto ca-
racterístico da competição em ecossistemas, levando especialistas a falarem 
de coopetition — uma mistura entre concorrência e cooperação (Petit e Te-
ece, 2020) e de frenemies — uma mistura de amigos e inimigos (Ezrachi e 
Stucke, 2016). Consequentemente, é importante examinar as relações de 
dependência existentes dentro dos EDPs para considerar, por um lado, a ne-
cessidade de incentivar e premiar investimentos específicos no ecossistema, 
e, por outro, a necessidade de proteger os atores do ecossistema de possível 
comportamento oportunista, em particular, na medida em que isso impli-
ca desincentivos à criação de valor no ecossistema. No Capítulo 8, Farani e 
Dorghetti explicam como esse aspecto é particularmente crucial para ana-
lisar a conduta de recusa de contratar de um orquestrador de ecossistema,implicando um foco nos efeitos que tal recusa geraria no concorrente afe-
tado, em vez do tradicional olhar para a replicabilidade do insumo que não 
está sendo compartilhado.
A jurisprudência internacional25 oferece diversos critérios relevantes 
para estabelecer a existência de dependência econômica, nomeadamen-
te no setor alimentar (Lianos e Lombardi, 2016). Eles incluem a existência 
de vias alternativas de distribuição ou de produção, a importância de um 
produto para o varejista, a força da marca e a existência do poder agregado 
do comprador. Com base nesses fatores, quatro tipos de relacionamentos 
25 O conceito de abuso de dependência econômica é reconhecido explicitamente pela legislação 
em Áustria, Bélgica, China, França, Alemanha, Itália, Japão, Coreia, República Eslovaca, 
África do Sul, Suíça e Taiwan.
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30 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
podem ser identificados: (i) dependência baseada em sortimento, se o pro-
duto da outra parte for considerado um bem de estoque obrigatório devido 
à sua notoriedade e popularidade; (ii) dependência baseada na escassez, se 
a outra parte for uma das raras fontes onde o bem pode ser encontrado; (iii) 
dependência baseada na demanda, se o insumo ou o recurso da outra par-
te tiver uma importância significativa no faturamento do empreendimento; 
(iv) dependência baseada em relacionamento comercial, se o investimento 
da outra parte no relacionamento tiver sido significativo.
A essas categorias tradicionais, é importante acrescentar aquela intro-
duzida pela 10a Emenda à Lei da Concorrência alemã, ao esclarecer que 
“a dependência também pode surgir do fato de uma empresa estar depen-
dente do acesso a dados controlados por outra empresa para suas próprias 
atividades” (§20, 1a). Além disso, a Emenda reconhece explicitamente o 
papel do poder de intermediação como um tipo de poder relacionado à 
importância das plataformas como intermediários para o acesso aos mer-
cados de vendas e compras. Contudo, pode-se argumentar que os fatores 
de dependência elencados nem sempre capturam as dinâmicas de inter-
dependência e de codependência, e, portanto, novos critérios deverão ser 
identificados.
Stylianou e Zingales exploram algumas possibilidades no Capítulo 2, 
focando a capacidade dos orquestradores de moldar as relações de mercado 
e de alavancar em prol de mercados conexos os mecanismos de navegação 
dentro dessa complexidade. Os autores sugerem alguns possíveis caminhos 
para medição desse tipo de poder econômico, incluindo o processo de for-
mação de padrões e termos da plataforma, a distribuição de risco entre os 
atores dos ecossistemas e o grau de centralidade para o comércio que as-
sumem os orquestradores, em particular, como intermediadores entre os 
outros atores do ecossistema (Lianos e Carballa Smichowski, 2021). Apesar 
da utilidade desses apontamentos iniciais, resta evidente que muito traba-
lho ainda precisa ser feito para integrar essas metodologias à abordagem 
mais clássica de definição de poder de mercado, sistematizá-las e torná-las 
mais precisas, assim como para avaliar eventual existência de formas adi-
cionais de poder conforme a sugestão de outros autores (Lianos e Carballa 
Smichowski, 2021).
Uma segunda implicação reside na análise de condutas com foco no bem- 
estar do consumidor do ecossistema, em vez do foco mais restrito do mer-
cado relevante. Hodiernamente, existe uma certa aderência dos elementos 
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 direito antitruste e ecossistemas digitais: mapeando o debate 31
centrais na análise de condutas, quais são as teorias de dano e as defesas le-
gítimas, ao conceito de mercado relevante. Como que esses elementos se 
aplicariam em um contexto caracterizado por uma concorrência de amplo 
espectro, onde os principais players estão ativos simultaneamente em múl-
tiplos mercados, e onde a coleta e a utilização de dados de consumo em um 
ambiente pode fornecer uma vantagem competitiva em outros contextos? 
Nesse sentido, é importante apontar três questões diferentes:
1. Em primeiro lugar, dar mais importância à atuação em múltiplos 
mercados não significa que o direito da concorrência deva ignorar possí-
veis prejuízos dentro de mercados estritamente definidos: o reajuste que 
se faz necessário, no contexto de ecossistemas, é o de adoção de um olhar 
mais cuidadoso para a concorrência ecossistêmica. Isso significa que as 
autoridades devem considerar, além da concorrência nos mercados re-
levantes que forem identificados, a existência de uma dinâmica externa 
de concorrência pelo conjunto de mercados interessados. Essa dinâmica, 
que pode ser chamada de “concorrência interecossistêmica” (ou seja, en-
tre ecossistemas alternativos), é a que realmente apresenta desafios para 
as autoridades, ressaltando a importância do multi-homing, dos custos de 
troca e das condutas visadas a limitar a pressão externa que os EPDs po-
dem, reciprocamente, exercer. No entanto, ainda temos a capacidade de 
enxergar e entender a concorrência “intraecossistêmica”, salvo prova em 
contrário, por meio das ferramentas tradicionais: para isso, as autoridades 
apenas precisam enquadrar o ecossistema da plataforma como um mer-
cado distinto dos ecossistemas geridos por plataformas concorrentes, em 
particular, na medida em que esses ecossistemas foram baseados em um 
diferente modelo de negócio, entender as respectivas consequências de 
um ponto de vista isolado. De uma certa forma, essa necessidade foi aten-
dida pelas decisões tomadas ao redor do mundo (por exemplo, na União 
Europeia, na Índia, na Rússia e na Turquia) em relação aos acordos entre 
o Google e os fabricantes de celulares sobre a disponibilização do sistema 
operativo Android para celulares, ao considerar distinto e isolado o sis-
tema iOS, da Apple, devido à política da empresa de não o licenciar para 
celulares de outras marcas. Contudo, conduzir uma análise em compar-
timentos impermeáveis para entender a concorrência intraecossistêmica 
não é recomendável quando a pressão interecossistêmica for significa-
tiva, ainda que de forma potencial ou incipiente, porque isso implicaria 
(conforme o ditado anglo-saxônico) “perder a floresta para as árvores”: 
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32 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
ou seja, deliberadamente renunciar a entender a complexidade na tomada 
decisões que podem ter consequências importantes, e, inclusive, nefastas, 
para a evolução do mercado (em sentido lato). Ignorar a concorrência in-
terecossistêmica pode ser uma escolha razoável face a uma insuficiente 
quantidade e variedade de produtos e serviços que atendem às preferên-
cias do consumidor, mas isso não pode ser feito, a priori, sem perder de 
vista uma dimensão importante de concorrência (Petit, 2020). De fato, é 
corretamente indicado que as autoridades evitem a subversão da concor-
rência “interecossistema”, na medida em que isso prejudica o bem-estar 
dos consumidores (Crane, 2019).
2. É essencial entender que a possibilidade para os orquestradores de 
ecossistemas usarem dados sempre mais detalhados sobre os seus próprios 
consumidores constitui uma fonte de poder, como já destacado. Especifica-
mente, esses dados permitem a identificação não apenas das preferências, 
mas também da suscetibilidade desses consumidores (tanto de forma 
particular quanto em conjunto) a serem influenciados em determinadas 
escolhas. Assim, o orquestrador de ecossistema pode desenhar a arqui-
tetura de escolha de uma forma que favorece a tomada de determinadas 
decisões convenientes pela plataforma, sem que estejam necessariamente 
alinhadas com a intenção do consumidor. Essas decisões podem envolver 
importantes aspectos de concorrência entre ecossistemas (como a própria 
reutilização de dados em ambiente diferente daquele da coleta)e de con-
corrência intraecossistêmica (como a definição de algum aplicativo por 
padrão ou o grau de compartilhamento de informação entre o orquestra-
dor e outros atores do ecossistema). Portanto, deve-se entender em que 
medida os padrões técnicos definidos pelo orquestrador tendem a mani-
pular a escolha do consumidor de uma forma que implica perda de uma 
dessas duas dimensões de concorrência. Como destacado por Furquim e 
Braido, nos Capítulos 4 e 5, a discussão sobre a incorporação no direito 
antitruste dos vieses comportamentais dos indivíduos, estudados pela eco-
nomia comportamental, está ainda em fase embrionária. Em particular, 
Braido aponta a dificuldade de se utilizar a literatura da economia com-
portamental no contexto da análise antitruste, devido à grande incerteza 
que isso geraria nos modelos tradicionais. Todavia, a coleta de dados em-
píricos sobre a manifestação desses vieses pode coadjuvar a autoridade 
permitindo uma análise mais fundamentada na realidade e ainda emba-
sada nos modelos econômicos clássicos. Em tese, esses dados podem ser 
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 direito antitruste e ecossistemas digitais: mapeando o debate 33
utilizados até para orientar a atuação das autoridades por meio de guias 
e presunções, na medida em que forem suficientemente robustos, sem se 
olvidar da importância de prevenir sua utilização de forma discricionária, 
para, assim, manter uma certa higiene decisória. Nesse sentido, Furquim 
utiliza a metáfora convincente de uma lente: se teorias são como lentes 
para a interpretação do mundo real, não há por que não utilizar lentes 
multifocais se isso melhorar a qualidade da política de defesa da concor-
rência. Continuando a analogia, é importante entender como essas lentes 
interagem com outras ferramentas de visualização da realidade (como, 
por exemplo, óculos de sol ou microscópios): se o caminho for no sen-
tido de criar guias e presunções de vulnerabilidade, o marco normativo 
de direito do consumidor e da proteção de dados fornecem importantes 
referências, que merecem ser consideradas no contexto das decisões an-
titruste, já que contribuem para a identificação do que o sistema jurídico 
considera como concorrência legítima. A questão que permanece, contu-
do, é a de como coordenar de forma sistemática a interação das três áreas 
citadas (direito da concorrência, direito do consumidor e direito à prote-
ção de dados). Como bem explicado por Domingues, Gaban e Miranda, 
no Capítulo 3, o diálogo do direito antitruste com os demais princípios da 
ordem econômica (como a defesa do consumidor) e com os direitos fun-
damentais (como o da proteção de dados) é constitucionalmente imposto. 
No contexto de ecossistemas, os autores destacam a insuficiência da teo-
ria de equilíbrio geral focada principalmente em preços, e a necessidade 
de incorporação na análise tradicional de conceitos como efeitos de rede, 
captura de dados e uso da inteligência artificial. Em linha com essa visão, 
no Capítulo 9, Maranhão, Garzieri Freire e Almada trazem importantes 
reflexões sobre a natureza dos algoritmos e como seu funcionamento gera 
uma propensão dos mercados digitais data-intensive a se organizarem em 
ecossistemas. Nesse contexto, os orquestradores se tornam cada vez melho-
res em (i) capturar e processar dados; e (ii) gerar valor — isto é, monetizar 
— os dados. No intuito de contribuir para auxiliar na análise desses mer-
cados, os autores exploram os efeitos do learning by doing e seus impactos 
sobre a rivalidade entre ecossistemas, os desafios de transparência e res-
ponsabilidade algorítmica, e potenciais soluções de compliance by design 
e de maior utilização da inteligência artificial pelos próprios reguladores.
3. Por fim, é fundamental assegurar a disponibilidade de defesas le-
gítimas para permitir a criação de valor no ecossistema e rejeitar o abuso 
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34 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
dessas justificativas em situações em que a criação de valor poderia ter 
sido atingida de uma forma menos restritiva da concorrência. Frequente-
mente, o levantamento de eficiências e de outras defesas no contexto de 
ecossistemas envolve medidas que aparentam ser restrições indevidas, em 
um olhar estanque e particularizado para os efeitos da prática no mercado. 
Portanto, torna-se central a avaliação da natureza sistêmica dessas medi-
das, conforme apontado por Zingales e Schwartz Jarolasky, no Capítulo 6, 
indo além da aplicação estrita dos critérios de identificação e repartição de 
benefícios geralmente utilizados pelas autoridades. Essa preocupação tem 
a mesma raiz que daquelas duas questões precedentes, entretanto, é mais 
relevante para a análise concorrencial por uma razão prática: enquanto 
as teorias de dano não dependem da concreta verificação dos efeitos (no 
sentido de identificação desses efeitos como já acontecidos), a tendência, 
na avaliação de defesas pelas autoridades de concorrência, é exigir uma 
identificação com suficiente precisão e verossimilhança dos benefícios ge-
rados pela conduta, assim como a demonstração da sua necessidade e da 
transferência desses para os consumidores.
Uma terceira implicação, em particular devido à incidência dos efeitos 
de rede, é a de que precisamos reconhecer que a evolução do mercado pode 
não acontecer de forma não linear: a possibilidade de cobrar preços altos 
ou de impor restrições ao consumidor pode representar o prêmio que o or-
questrador almeja atingir, uma vez que obtiver uma posição consolidada de 
gargalo de negócios. Prezar pelo bem-estar do consumidor nesse contexto 
implica também uma maior atenção para eventuais mudanças de compor-
tamento pelos orquestradores de ecossistema que possam ser explicadas 
pela expectativa de crescimento, e que não sejam justificáveis com base em 
eficiências, denotando uma possível exploração. Uma conduta que exem-
plifica tais dinâmicas é a reversão de política quanto à interoperabilidade: 
em uma primeira fase (de crescimento do ecossistema), anunciar a dispo-
nibilização do ecossistemas a diversos atores por meio de padrões abertos, 
e, em uma segunda (na qual a missão de extração de valor apareça como 
evidente, e frequentemente em tensão com a de criação do valor), limitar 
ou fortemente restringir essa interoperabilidade para poder aproveitar de 
forma exclusiva ou predominante do valor gerado pelos ecossistemas. Ou-
tras possíveis teorias de danos são apontadas por Kira e Coutinho, que, no 
Capítulo 7, trazem à luz a importância de se reconhecer os possíveis efeitos 
deletérios de condutas como aumento de preços não monetários, redução 
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 direito antitruste e ecossistemas digitais: mapeando o debate 35
de qualidade, redução de escolha e inovação, que parecem ter sido aborda-
dos de forma incompleta nas análises feitas pelo Cade em casos envolvendo 
plataformas e ecossistemas digitais.
Para não perder de vista essas dinâmicas, as autoridades devem, tam-
bém, considerar que os efeitos de uma conduta ou de uma aquisição podem 
se materializar em mercados adjacentes, ainda que inexistentes ou inci-
pientes: isso é justamente devido à natureza da concorrência de amplo 
escopo — a qual não se limita à dimensão de produtos, mas se estende 
àquela temporal.
No que diz respeito ao controle de concentrações, essa amplitude tende 
a aumentar a incerteza dos efeitos de eventual intervenção da autoridade, 
devido à dificuldade de estimar os efeitos líquidos de cada operação. Consi-
derando que uma postura muito restritiva poderia prejudicar um elemento 
importante para o desenvolvimento de produtos inovadores e mais comple-
tos, Resende e Lemos, no Capítulo 12, sugerem que o controle repressivo de 
condutas pode ser mais adequado para lidar com mercados digitais envol-
vendo ecossistemas, particularmente, observandoque os problemas podem 
derivar de eventuais condutas posteriores à aquisição (como fechamento de 
mercado, discriminação, criação de barreiras ao funcionamento de concor-
rentes), e que apenas 5,5% entre as aquisições feitas pelas Gafam (Google, 
Apple, Facebook, Amazon e Microsoft), de 2009 a 2018, constituíram killer 
acquisitions — ou seja, aquisições de produto seguidas pela descontinuação 
do desenvolvimento do mesmo. Considerando que muitas dessas aquisi-
ções ocorreriam logo abaixo dos critérios de notificação obrigatória para as 
autoridades antitruste dos Estados Unidos, Resende e Lemos entendem as 
killer acquisitions como estratégicas e intencionais; confirmando a hipótese 
de que essas preocupações poderiam ser analisadas sob uma perspectiva de 
conduta intencional de consolidação de poder de mercado. Quanto a uma 
eventual expansão dos critérios de notificação, os autores lembram que isso 
pode não apenas gerar incerteza, mas também outros efeitos indesejados em 
termos de tempo para aprovação, danos aos negócios envolvidos e outros 
custos de oportunidades.
Por outro lado, no Capítulo 13, Griebeler argumenta que as notificações 
deveriam ser obrigatórias quando a entidade adquirente possui participa-
ção de pelo menos 50% nos mercados que representam as maiores parcelas 
das suas receitas brutas no ano anterior à operação, e em outros casos nos 
quais a autoridade tenha identificado um determinado grau de influência 
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36 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
unilateral sobre os agentes de mercado por meio de market screening. Grie-
beler foca especificamente nas complicações derivadas das concentrações 
centradas em dados, destacando, para esses casos, a necessidade de uma 
análise diferenciada que leve em conta o histórico de violações pelas partes 
envolvidas não apenas na seara da concorrência, mas também na de prote-
ção de dados, implicando em investigações e colaborações de escala global 
(quando cabível) e atribuindo um papel mais ativo aos usuários na decisão 
sobre uma eventual transferência dos seus dados a terceiros.
Face à incerteza das dinâmicas competitivas em ecossistemas digitais, 
outros autores sugerem adotar uma postura conservadora, no sentido de 
prevenir o risco de situações dificilmente reversíveis, devido aos efeitos de 
rede e à rápida escalabilidade de produtos digitais. Por exemplo, no Capítulo 
14, Zingales e Renzetti destacam a importância de intervenção tempestiva 
durante a fase de crescimento de um EPD, antes de um eventual tipping do 
mercado e sugerem a adoção de parâmetros especiais de obrigações para 
empresas com efeitos sistêmicos (termos a serem definidos pela legisla-
ção), quais sejam: a notificação obrigatória de todas as aquisições realizadas 
pelos orquestradores de EPDs; a divulgação dos tipos de dados pessoais e 
concorrencialmente sensíveis em posse das partes do ato de concentração, 
bem como uma avaliação prospectiva de como sua confidencialidade e/ou o 
cumprimento da legislação pertinente serão assegurados. Por fim, em casos 
específicos em que um orquestrador adquira integralmente ou empobreça 
substancialmente um outro EPD, a necessidade de documentar já no for-
mulário de notificação as eficiências que deveriam fundamentar eventual 
aprovação. No entanto, Zingales e Renzetti concordam com Resende e Le-
mos sobre a necessidade de um controle repressivo de condutas, sugerindo 
que procedimentos preparatórios poderiam ser abertos sistematicamente 
para avaliar eventual necessidade de intervenção nas práticas de um or-
questrador de EPD.
Portanto, ainda seria importante aprofundar a discussão sobre as medi-
das ex-post necessárias para atender às preocupações existentes. Além disso, 
permanece a questão: o arcabouço regulatório atual é suficiente para lidar 
com concentrações que aumentam o poder de mercado das partes de forma 
inorgânica, sem necessariamente implicar um risco de condutas anticom-
petitivas? Esse pode ser o caso quando as partes atingem com a operação 
economias de escala e de escopo significativas, que seriam de impossível re-
plicação por um concorrente. O Capítulo 14 traz alguns exemplos de casos 
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 direito antitruste e ecossistemas digitais: mapeando o debate 37
em que a análise das concentrações negligenciou possíveis efeitos conglome-
rados desse tipo, e outros nos quais esses efeitos poderiam ser considerados 
mais sistemáticos e refletindo sobre possíveis padrões de análise para futu-
ros casos.
Por fim, considerando as novas estratégias de competição e as teorias 
de dano que têm se desenvolvido, perguntamo-nos se os remédios também 
não precisam evoluir. Os remédios aplicados aos mercados tradicionais, 
isto é, aqueles em que a concorrência se dá por preço, são adequados aos 
EPDs? Nessa toada, no Capítulo 10, Nogueira Dias, Niclós Negrão e Peixo-
to Barbosa nos fazem parar e refletir sobre se as condutas-alvo do controle 
repressivo no mercado digital são de fato novas e se merecem uma resposta 
nova. Em seu capítulo, as sessões traçam a evolução das cláusulas de nação 
mais favorecida (do inglês, most favored nation; MFN) e sua rica história no 
direito da concorrência em transações tradicionais e em plataformas digitais, 
a partir de um estudo de caso das agências de reserva online de acomodações 
(OTAs). Esse estudo de caso demonstra a dificuldade de se regular ecossis-
temas sem considerar as especificidades do contexto de mercado em que 
eles operam, e a forma como isso foi feito em diferentes países, em um le-
que que inclui: (i) ausência de intervenção; (ii) celebração de acordos para 
redução do escopo de cláusulas MFN; (iii) proibição expressa exarada por 
autoridades concorrenciais; ou (iv) intervenção regulatória por vias alter-
nativas ao enforcement concorrencial.
Sobre remédios, também é importante saber destilar as lições apren-
didas no passado em setores que apresentam caraterísticas de ecossistema. 
No Capítulo 11, Ragazzo e Lima emprestam um olhar para o ecossiste-
ma regulado do open banking e comparam o desenho e implantação desse 
ecossistema na sua origem no Reino Unido com a experiência brasileira, 
ressaltando todos os aspectos necessários para a criação e implantação de 
um ecossistema, bem como os desafios que estão por vir. Da experiência 
britânica, pode-se destacar o importante trabalho feito pela autoridade 
de concorrência em criar uma padronização quanto aos APIs e o forma-
to de compartilhamento das informações, além de requerer a adoção de 
protocolos de segurança sólidos, o que serviu para abordar algumas im-
perfeições reconhecidas na implementação da diretiva europeia que impôs 
aos bancos o compartilhamento de informações dos clientes (a chamada 
“PSD2”). No Brasil, o open banking nasceu a partir de uma iniciativa re-
gulatória do Bacen, e não da atuação da autoridade de concorrência. Isso é 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 37 16/11/2022 10:55:28
38 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
facilmente entendível, considerando que o Cade carece de uma ferramen-
ta de investigações de mercado como a da autoridade inglesa, que oferece 
a possibilidade de impor remédios para melhorar a competitividade do 
mercado sem a necessidade de uma prévia violação do direito concor-
rencial. Contudo, sua implementação não deixou de gerar contencioso 
concorrencial, e não é difícil imaginar que mais desafios virão, especial-
mente ao passo que o movimento regulatório de abertura de ecossistemas 
expandir do open banking para o open finance e open insurance — como 
está acontecendo no Reino Unido — ou até outro setores (pense-se, por 
exemplo, na área da saúde e na de entrega de alimentos, que estão sendo 
debatidas atualmente no Brasil), implicando diferentes complexidades de 
padronização, segurança e proteção de dados. Para assegurar a efetivida-
dedesse processo de criação de ecossistemas abertos, serão fundamentais 
a cooperação e interação estratégica entre órgãos reguladores, como res-
saltado por Ragazzo e Lima.
3. Desafios brasileiros para ecossistemas
Para além das inquietudes, desafios e reflexões enfrentados pela análise 
concorrencial dos EPDs, existem alguns desafios afeitos ao Brasil, seja em 
razão da tradição da aplicação da lei, seja pelos contornos da própria Lei n. 
12.529/2011.
Em relação à tradição da aplicação da Lei, o Cade tem uma cultura de 
transacionar muito forte. Nos casos de condutas unilaterais, são poucos os 
casos que vêm a julgamento, tornando assim, escasso o arcabouço jurispru-
dencial. Nesse sentido, é difícil para o Administrado prever como um caso 
seria decidido pelo Conselho caso viesse a julgamento. Isso tem um impacto 
direto na segurança jurídica, mas mais importante, tem um impacto sobre 
a capacidade das EPDs de formularem regras privadas e organizarem seus 
ecossistemas em acordo com a legislação concorrencial. Considerando a no-
vidade do tema e a ausência de julgados prévios, é certo que a autoridade 
deve ter alguma flexibilidade para aceitar a boa-fé das partes, considerando 
a novidade do assunto e a pouca jurisprudência.
Outra particularidade do sistema brasileiro contribui para a ausên-
cia de jurisprudência. Como destacado pela OCDE, poucos casos de abuso 
de posição dominante foram abertos pelo Cade desde a implementação da 
Lei n. 12.529/2011 e um número ainda mais reduzido foram julgados pelo 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 38 16/11/2022 10:55:28
 direito antitruste e ecossistemas digitais: mapeando o debate 39
Tribunal. A OCDE sugere que o Cade estabeleça uma unidade de investigação 
dedicada apenas para condutas unilaterais — o que foi recentemente feito 
pela superintendência-geral do Cade, mas ainda não teve tempo de mostrar 
sua efetividade —, dê maior prioridade a casos dessa natureza e reveja sua 
política de termos de compromisso de cessação para que uma jurisprudên-
cia efetiva seja criada.26 No contexto de ecossistemas, pode-se argumentar 
que a necessidade de desenvolver uma jurisprudência é ainda maior, devi-
do à dificuldade de se enquadrar algumas preocupações concorrenciais nas 
classificações tradicionalmente utilizadas para a análise de condutas, e a fre-
quência com a qual as práticas dos orquestradores são questionadas pelos 
diversos participantes do ecossistema. Cabe perguntar, portanto, se não seria 
oportuna a criação de um departamento especificamente encarregado com 
o acompanhamento dos maiores ecossistemas, no intuito de trazer clareza e 
abordar prontamente esses questionamentos — seja com a abertura de um 
inquérito, seja com uma resposta satisfatória que esclareça o posicionamento 
da autoridade face à figura do orquestrador. Tal inovação institucional seria 
estratégica, considerando o tempo médio de duração dos processos. É cer-
to que em investigações envolvendo EPDs, o mercado é tão dinâmico que 
um processo com essa duração não terá qualquer efetividade. Apenas para 
exemplificar, o caso do Google Shopping levou aproximadamente oito anos 
no Cade e sete anos na Comissão Europeia. Embora o caso tenha demora-
do muito mais tempo no Brasil, percebe-se que a morosidade dos processos 
não é um problema exclusivo do Brasil. No entanto, ter uma unidade de-
dicada e um corpo maior de jurisprudência deverá ajudar para que futuros 
casos tramitem com maior celeridade.
Outro problema causado pela junção da morosidade das investigações 
e a natureza dinâmica dos mercados é a possibilidade da conduta sob inves-
tigação ao longo do processo, dificultando a investigação e verificação de 
eventuais efeitos. Por exemplo, no caso do Google Shopping, ao longo dos oito 
26 “There have been relatively few abuse of dominance investigations by Cade since the intro-
duction of the new Competition Law and even fewer decisions of the Tribunal. As part of the 
actions aimed at strengthening its enforcement interventions against abuse of dominance 
cases, Cade should consider establishing separate units within the GS for investigating this 
kind of cases. Moreover, Cade should give higher priority to abuse of dominance investiga-
tions and rely less on settlement negotiations to conclude cases in order to generate a body 
of case law in this area.” OECD. OECD Peer Reviews of Competition Law and Policy: Brazil, 
2019, p. 26. Disponível em: https://www.oecd.org/daf/competition/oecd-peer-reviews-of-
competition-law-and-policy-brazil-ENG-web.pdf.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 39 16/11/2022 10:55:28
40 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
anos que o caso tramitou no Cade, o Google realizou alterações ao produto 
objeto da investigação: o Google mudou o desenho do mecanismo de pes-
quisa para PLAs (Product Listing Ads) e retirou do ar o Product Universal.
Embora as investigações demorem para ser resolvidas, a legislação 
brasileira prevê a adoção de medidas cautelares que permitem uma rápida 
intervenção por parte da autoridade e capacidade de sustar os efeitos das 
medidas tidas como suspeitas caso estejam presentes os elementos de fumus 
boni iuri e periculum in mora. Em que pese a existência desse instituto, ele 
foi pouco usado pelo Cade no passado. A nosso ver, isso decorre da depen-
dência do Cade de julgar com base no custo dos erros, isto é, com base nos 
efeitos hipotéticos dos erros tipo I ou tipo II.
Em que pese o apoio cada vez menor da comunidade científica pela 
utilização dessa metodologia para as tomadas de decisão27, o Cade tem se 
apoiado na aversão a erros do tipo I — aqueles que produzem falsos positivos 
— para justificar que a intervenção errônea terá custos maiores à socieda-
de do que a ausência dela.
Esse pensamento tem apoio na teoria de Easterbrook, o qual propõe 
uma agenda de priorização de enforcement,28 foi exposta no voto do conse-
lheiro-relator, Maurício Bandeira Maia, no caso do Google Shopping:
577. No caso em análise, um falso positivo teria um alto efeito nocivo à 
concorrência por se tratar de uma inovação, o que repercutiria negativa-
mente em um setor altamente pulsante em nossos dias, o de mercados 
digitais. Falsos positivos que punam inovações pró-competitivas e benéficas 
ao consumidor têm o perverso efeito de inibir o comportamento inova-
dor, por receio de que a inovação venha a ser considerada uma estratégia 
anticompetitiva no futuro. Esta posição é também endossada por Bork e 
Sidak, ao se debruçarem sobre as investigações antitruste abertas contra 
o Google, em 2010, nos Estados Unidos e na União Europeia. O ponto de 
partida de ambos é o princípio de que o que importa é a concorrência e 
não os concorrentes, sendo estes muitas vezes vítimas do próprio vigor da 
concorrência dinâmica.
27 Para uma discussão aprofundada, ver HOVENKAMP, H. J., “Antitrust Error Costs”. Faculty 
Scholarship at Penn Law, 2021, 2.742. Disponível em: https://scholarship.law.upenn.edu/
faculty_scholarship/2742. Acesso em: 20 mar. 2022.
28 Victor Fernandes realizou uma análise profunda sobre o estado da arte da literatura rela-
cionada ao error cost framework em sua obra. FERNANDES, V. O. Direito da Concorrência 
das Plataformas Digitais. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2022. pp. 82–86.
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 direito antitruste e ecossistemas digitais: mapeando o debate 41
578. Nessa conjuntura, o presente caso apresenta um desafio ainda maior 
por se tratar de uma intervenção no produto final do Google. Um possí-
vel remédio afetaria o mecanismo de busca do Google e o design da sua 
página. Seria, portanto, uma intervenção na atividade-fim do Google.
579. Em uma eventual intervenção, o Cade teria que se substituir ao 
Google na decisão de como programar seu algoritmo e como elaborar 
seu design de página.29
Embora o custo do erro seja relevante e deva ser levado em consideração, 
é importante que a autoridadeo pondere dentro de um exame de concor-
rência dinâmica, baseando suas presunções em dados.
Por fim, é importante realçar duas particularidades da própria Lei An-
titruste. Primeiro, é o art. 88, §7o, que prevê que “[é] facultado ao Cade, no 
prazo de 1 (um) ano a contar da respectiva data de consumação, requerer 
a submissão dos atos de concentração que não se enquadrem no disposto 
neste artigo”. Esse instituto permite que o Cade determine a submissão de 
atos de concentração porventura considerados relevantes, porém, não su-
jeitos aos critérios de notificação obrigatórios. Esse instituto é de extrema 
importância para que casos envolvendo empresas com baixo faturamento e 
alta relevância competitiva — como é típico na economia de preço zero — 
sejam passíveis de revisão de maneira tempestiva pela autoridade. Embora 
o Cade tenha feito isso muito raramente30, o exercício de tal poder é poten-
cialmente apto para abordar as preocupações com concentrações abaixo 
dos critérios de notificação que vem sendo levantadas em várias jurisdições. 
Contudo, sua efetividade depende da medida em que as autoridades con-
seguirem acompanhar as transações relevantes, o que na prática pode ser 
mais complicado do que aparenta ser. Por esse motivo, a eventual obrigação 
para os orquestradores de ecossistemas de um certo tamanho de informar 
todas as aquisições, consoante sugerido por alguns autores, pode suprir a 
29 BRASIL. MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Cade. Processo Administrativo n. 08012.010483/2011-
92. Voto-Relator do Conselheiro Maurício Oscar Bandeira Maia (SEI n. 0632170). 2019. 
§577–579. Disponível em: https://sei.cade.gov.br/sei/modulos/pesquisa/md_pesq_
documento_consulta_externa.php?DZ2uWeaYicbuRZEFhBt-n3BfPLlu9u7akQAh8m-
pB9yPHUhYhwVr_Fy5GjGeoicanFI5jnfj6G1JbwffnEXRm88aaHv2JhZaXQxKL1AtIzCVpe-
LrcA8lvKyuEfYnt1gH-.
30 Até recentemente, apenas quatro vezes. Ver 16 do voto da Conselheira Farani, Ato de 
Concentração no 08700.005079/2019-06. Requerentes: Prosegur Brasil Transportadora 
de Valores e Segurança S.A.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 41 16/11/2022 10:55:28
42 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
assimetria informativa e criar um banco de dados para maior conhecimen-
to das dinâmicas de concorrência em ecossistemas.
Uma segunda particularidade do sistema brasileiro é a ausência de di-
ploma legal sobre concentrações conglomeradas. O critério previsto no art. 
88, §5o, prevê que “[s]erão proibidos os atos de concentração que impliquem 
eliminação da concorrência em parte substancial de mercado relevante, que 
possam criar ou reforçar uma posição dominante ou que possam resultar 
na dominação de mercado relevante de bens ou serviços, ressalvado o dis-
posto no §6o deste artigo.”31Pensando na estrutura típica dos ecossistemas 
descrita e nos fatores que determinam a concorrência entre ecossistemas, é 
possível depreender que inúmeros atos de concentração envolvendo ecossis-
temas não terão, necessariamente, concentração horizontal ou vertical, mas 
serão de complementos que agregarão valor ao sistema. Nesse sentido, caso 
seja de submissão obrigatória, a aquisição seria analisada pelo rito sumário.
Ocorre que algumas aquisições de natureza conglomerada podem ter 
efeitos significativos sobre a concorrência e merecem atenção, a despeito 
da ausência de um reforço de participação de mercado quando submetidas 
à análise estática que define o “menor potencial ofensivo à concorrência”32 
das operações de rito sumário.33 Ainda não existe qualquer menção na 
31 Art. 88, §7o da Lei n. 12.529/2011.
32 Art. 6, Resolução 33/2022.
33 As operações passíveis de apresentação pelo rito sumário são aquelas de “menor potencial 
ofensivo à concorrência” e que se enquadram no art. 8o da Resolução n. 33/2022:
“Art. 8o São hipóteses enquadráveis no Procedimento Sumário, as seguintes operações:
I – Joint-Ventures clássicas ou cooperativas: casos de associação de duas ou mais empresas 
separadas para a formação de nova empresa, sob controle comum, que visa única e exclu-
sivamente à participação em um mercado cujos produtos/serviços não estejam horizontal 
ou verticalmente relacionados;
II – Substituição de agente econômico: situações em que a empresa adquirente ou seu gru-
po não participava, antes do ato, do mercado envolvido, ou dos mercados verticalmente 
relacionados e, tampouco, de outros mercados nos quais atuava a adquirida ou seu grupo;
III – Baixa participação de mercado com sobreposição horizontal: as situações em que a 
operação gerar o controle de parcela do mercado relevante comprovadamente abaixo de 
20%, a critério da Superintendência-Geral, de forma a não deixar dúvidas quanto à irrele-
vância da operação do ponto de vista concorrencial;
IV – Baixa participação de mercado com integração vertical: nas situações em que nenhu-
ma das requerentes ou seu grupo econômico comprovadamente controlar parcela superior 
a 30% de quaisquer dos mercados relevantes verticalmente integrados;
V – Ausência de nexo de causalidade: concentrações horizontais que resultem em variação 
de HHI inferiores a 200, desde que a operação não gere o controle de parcela de mercado 
relevante superior a 50%;
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 direito antitruste e ecossistemas digitais: mapeando o debate 43
jurisprudência do Cade sobre o valor dos dados ou sobre como quantificar 
seu valor competitivo. Para além, não existe uma interpretação consolidada 
da forma como objetivos não econômicos (como a sustentabilidade, a privaci-
dade, a pluralidade informativa e até a dispersão de poder político) deveriam 
ser considerados na análise tanto de condutas quanto de estruturas. Há quem 
rechaça a competência da autoridade para avaliar essas questões. Essa inter-
pretação, contudo, não é unívoca: por um lado, pode-se argumentar que o 
princípio da justiça social, consagrado no artigo 170 da Constituição Fede-
ral, fornece bases de ação contra a exploração de partes mais vulneráveis da 
sociedade. Por outro lado, o artigo 1o da Lei de Concorrência, ao listar os 
princípios constitucionais que devem orientar a prevenção e repressão das 
violações à ordem econômica, não contém alguns dos princípios que estão 
explicitamente protegidos pela parte específica da Constituição Federal que 
trata da ordem econômica: quais sejam, o tratamento favorecido às empre-
sas de pequeno porte, à soberania nacional, à proteção ambiental, à redução 
das desigualdades regionais e sociais e à busca do pleno emprego. Em uma 
interpretação meramente textual da LDC, os princípios que se sobrepõem 
são os da livre-iniciativa, livre concorrência, defesa do consumidor, função 
social da propriedade e à repressão aos abusos de poder econômico. No en-
tanto, ao mínimo, a referência à função social da propriedade implica uma 
implícita proibição à utilização da mesma por finalidades que prejudicam 
a sociedade, conforme apontado pelo artigo 1.128, §1 e §2, do Código Ci-
vil34. Qual seria a implicação dessa delimitação da propriedade nos EPDs?
Mais uma vez, levantamos a pergunta sem poder dar uma resposta 
unívoca, limitando-nos a destacar a importância de considerar as caracte-
rísticas específicas dos ecossistemas, e como desafiam as categorias jurídicas 
com as quais estamos acostumados a trabalhar. O intuito das contribuições 
presentes nesta coletânea foi dialogar sobre esses conceitos, para auxiliar a 
comunidade antitruste a enxergar de forma mais clara o caminho a seguir.
VI – Outros casos: casos que, apesar de não abrangidos pelas categorias anteriores, forem 
considerados simples o suficiente, a critério da Superintendência-Geral, a ponto de não 
merecerem uma análise mais aprofundada.”
34 “§1 O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades eco-
nômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido 
em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio 
históricoe artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.”
“§2 São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, 
e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem.”
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44 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
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2
Das plataformas aos 
ecossistemas digitais: 
implicações para a definição 
do poder de mercado
Nicolo Zingales
Konstantinos Stylianou
introdução
O antitruste está em um estado de fluxo. Nos últimos anos, assistimos a nu-
merosas propostas de reforma do direito antitruste em várias jurisdições ao 
redor do mundo, principalmente devido ao reconhecimento do papel cada 
vez mais onipresente de algumas empresas de tecnologia: em particular, o seu 
papel crucial tanto como plataforma para interações competitivas, quanto 
como criadora de mercado para uma gama de terceiros intervenientes que 
dependem de sua infraestrutura tecnológica. A centralização da atividade 
econômica em um número limitado de empresas de tecnologia, juntamente 
com a hospitalidade variável de seus serviços para fornecedores de produtos 
e serviços complementares (os chamados “complementors”), afeta não só a 
forma como concebemos mercados que envolvem plataformas de múltiplos 
lados, mas, também, a natureza da concorrência entre os diferentes ecossis-
temas. Quando uma organização pode unilateralmente definir e alterar as 
condições sob as quais uma gama de fornecedores heterogêneos coloca seus 
produtos no mercado, por meio de uma infraestrutura tecnológica comum, 
e, ao fazê-lo, contribui para a criação conjunta de valor para o proprietá-
rio da infraestrutura e para os fornecedores de insumos, já não estamos no 
domínio em que os mercados possam ser devidamente compreendidos por 
meio de uma abordagem centrada nas transações inter partes que tem ca-
racterizado a análise antitruste tradicional: o locus da concorrência passa 
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48 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
dos produtos individuais para grupos de produtos, e a lógica das relações 
de clientes de dois a múltiplos lados. Para compreender o significado dessa 
mudança, o nosso trabalho pressupõe uma distinção entre dois conceitos — 
plataformas e ecossistemas — como atores-chave que moldam a forma como 
o valor é criado e extraído dentro do complexo conjunto de relações que se 
formam a partir da arquitetura e dos regimes de governança das plataformas.
1. Plataformas digitais
Partindo de uma perspectiva histórica1, “plataforma” é uma estrutura sobre 
a qual alguma coisa — um produto, um serviço, ou mesmo uma ativida-
de não econômica — pode ser construída e operacionalizada. Várias têm 
sido as tentativas de reutilizar ou redefinir esse conceito no âmbito digital, 
com variações significativas no rol de características que são atribuídas às 
plataformas (às vezes, até de forma incompatível). Uma das tentativas mais 
completas foi feita pela Comissão Europeia como parte do seuprocesso de 
consulta para um ambiente regulatório de plataformas, intermediários onli-
ne, computação de dados e em nuvem e economia colaborativa, que definiu 
a plataforma como “uma empresa que opera em mercados de dois ou múlti-
plos lados, que utiliza a internet para permitir interações entre dois ou mais 
grupos de usuários distintos, porém interdependentes, de modo a gerar va-
lor para pelo menos um dos grupos” (Comissão Europeia, 2015). Embora 
essa seja uma definição reconhecidamente ampla, o seu alcance exato de-
pende de uma compreensão clara dos mercados de dois ou múltiplos lados.
O conceito de mercado de dois lados foi introduzido por Rochet e Tirole 
(Rochet eTirole, 2003). Os autores descrevem mercados em que a platafor-
ma pode afetar o volume das transações cobrando mais de um dos lados 
do mercado e reduzindo proporcionalmente o preço pago pelo outro lado. 
Em outras palavras, os mercados para plataformas são desenhados de for-
ma que ambos os lados sejam trazidos a bordo. Isso porque o volume de 
transações e de lucro da plataforma depende não apenas do valor total co-
brado das partes, mas também da estrutura de precificação. Importante 
ressaltar que Rochet e Tirole reconhecem como característica essencial a 
1 Segundo o dicionário histórico Larousse, o termo “plataforma” apareceu pela primeira vez 
na língua francesa em 1434, para definir uma “superfície horizontal que atua como um 
suporte”.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 48 16/11/2022 10:55:28
 das plataformas aos ecossistemas digitais 49
existência de efeitos indiretos da rede, mais especificamente, em sua adesão 
e utilização pelos usuários (e.g. de um lado para o outro da plataforma), e a 
falta de internalização desses efeitos pelos usuários. Nesse sentido, merca-
dos de dois lados diferem consideravelmente de mercados multiprodutos, 
nos quais consumidores internalizam efeitos indiretos de rede comprando 
produtos relacionados (como no caso de giletes e lâminas); também dife-
rem do mercado em que compradores e vendedores podem negociar entre 
si, pois isto prejudicaria o papel da plataforma na fixação dos melhores pre-
ços. Por fim, cabe salientar que Rochet e Tirole admitem que o conceito de 
dois lados pode envolver firmas que simplesmente conectam fornecedores 
de insumos por um lado e consumidores do produto final no outro, desde 
que elas definem de forma otimizada as taxas de acesso de cada um. Con-
tudo, esclarecem, esta possibilidade continua a ser em grande parte teórica, 
uma vez que tais empresas teriam pouca margem de manobra para ma-
nipular a estrutura de preços (Rochet e Tirole, 2006). Por isso, a natureza 
two-sided desses mercados é uma questão de grau, dependendo da capaci-
dade da plataforma de afetar o volume alterando a estrutura de preços: as 
empresas se tornam plataformas não por sua natureza, mas por uma esco-
lha consciente, na medida em que estabelecem uma estrutura de preços não 
neutra. Isto significa também que uma empresa pode ter o potencial de ser 
uma plataforma, mas decidir não utilizar tal potencial em relação a qual-
quer atividade específica que empreenda. O que, em última análise, importa 
é se um determinado intermediário do mercado de dois lados pode efetiva-
mente otimizar a produção alterando a estrutura de preços sem alterar seu 
nível de preço (Nachbar, 2021). Também significa que a utilização do termo 
“plataforma” no direito da concorrência pode divergir da utilização desse 
termo na linguagem comum, que tipicamente inclui empresas que operam 
em apenas um lado (isto é, o WhatsApp) e/ou sem efeitos de rede (isto é, a 
Netflix) (Nooren et al., 2018).
Um trabalho recente (OCDE, 2018) alargou as perspectivas dos mer-
cados de dois lados para mercados de múltiplos lados: esse é um conceito 
mais amplo que reconhece que a interdependência entre grupos de usuá-
rios pode ir além de uma relação bilateral, abrangendo um terceiro ou até 
um quarto grupo de usuários (e, potencialmente, mais). O mesmo trabalho 
sublinhou a importância de distinguir os casos em que as externalidades da 
rede fluem em apenas uma direção (caso em que a empresa coordenadora 
é chamada de “plataforma provedora de audiência”, ou audience-providing 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 49 16/11/2022 10:55:28
50 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
platform) e aqueles em que ambos os grupos se beneficiam de tais externa-
lidades (caso em que a empresa coordenadora é chamada de “plataforma de 
correspondência”, ou matching platform). Seguindo essa definição, no con-
texto de múltiplos lados (ao contrário do que acontece com os mercados 
de apenas dois lados), a mesma empresa pode ser simultaneamente uma 
plataforma de correspondência e uma plataforma provedora de audiência. 
Como ilustrado a seguir (ver a Seção 4.1), essa distinção tem implicações 
importantes para a definição do mercado. Uma distinção igualmente im-
portante ocorre entre mercados transacionais (transactional), em que uma 
transação observável ocorre entre os usuários finais em ambos os lados da 
plataforma (como ocorre, por exemplo, com cartões de pagamento e casas de 
leilão), e mercados de dois (ou mais) lados não transacionais (non-transactio-
nal), em que tal transação não ocorre (como no caso de jornais e televisão) 
(Filistrucchi et al., 2013; OCDE, 2018).
2. ecossistemas de plataformas digitais
O conceito de ecossistema busca capturar o fenômeno da coexistência e in-
terdependência de múltiplos atores e produtos (ou serviços), tipicamente 
(mas não exclusivamente) no contexto das plataformas digitais. Do ponto 
de vista da organização industrial, esse conceito pode ser visto como uma 
evolução da chamada “teoria do sistema”: uma abordagem que reconhece a 
importância de fortes complementaridades entre determinados produtos e 
serviços ligados por meio de uma interface que permite aos consumidores 
desses produtos internalizarem benefícios dessa complementaridade (por 
exemplo, parafusos e porcas, videojogos e consoles, automóveis e serviços 
de reparação); e, por isso, sugere analisar esses sistemas como um todo e 
não como uma soma de seus componentes (Katz e Shapiro, 1994). A pala-
vra “ecossistema” se alinha com essa abordagem, mas com a complexidade 
adicional gerada pela riqueza de relações de sinergia e interdependência 
que podem ocorrer dentro de redes, bem como nos ecossistemas que são 
estudados em biologia, e não sob a governança hierárquica de uma cadeia 
de abastecimento.
Os estudos de administração reconheceram o valor dessas interações 
sistêmicas e forneceram uma estrutura para visualizá-las no contexto de ecos-
sistemas de negócios, ecossistemas de inovação e ecossistemas de plataforma, 
dando, assim, à palavra “ecossistema” conotações ligeiramente diferentes: no 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 50 16/11/2022 10:55:28
 das plataformas aos ecossistemas digitais 51
primeiro caso, uma visão mais ampla que inclui “comunidade de organizações, 
instituições e indivíduos que impactam a empresa e os clientes e suprimentos 
da empresa”; no segundo, uma visão mais orientada para o propósito focada 
nos “arranjos colaborativos por meio dos quais as empresas combinam suas 
ofertas individuais em uma solução coerente voltada para o cliente”; e, no ter-
ceiro, uma visão mais orientada para a tecnologia que foca a infraestrutura 
crítica fornecida por uma plataforma e inclui o patrocinador da plataforma 
junto com todos os provedores de complementos que tornam a plataforma 
mais valiosa para os consumidores. Uma revisão abrangente dessa literatu-
ra tentou fornecer uma estrutura unificadora, visualizando os ecossistemas 
como “grupo de empresas que devem lidar com complementaridades únicas 
ou supermodulares que não são genéricas, exigindo, portanto, a criação de 
uma estrutura específica de relacionamentos e alinhamento para criar valor”. 
Embora essa definição possa ser criticada por ser, talvez, muito restrita ao ní-
velda empresa e, portanto, não levar em conta suficientemente o papel que 
clientes e instituições podem ter na formação do ecossistema, ela tem o mé-
rito de enfatizar a complementaridade, que é fundamental para reunir uma 
variedade de vendedores e clientes. No entanto, podem-se listar outras carac-
terísticas das relações comerciais que caracterizam os ecossistemas, e isso pode 
ser feito adotando uma ampla gama de diferentes perspectivas: por exemplo, 
distinguindo elementos técnicos e comerciais dos ecossistemas ou analisando 
as partes constitutivas de diferentes categorias de ecossistemas (como ecos-
sistemas de inovação, ecossistemas de dados pessoais, ecossistemas de saúde 
etc.). Neste trabalho, concentramo-nos tanto nas características técnicas dos 
ecossistemas digitais, quanto nas características de negócios que permitem 
que os ecossistemas digitais floresçam.
Duas características técnicas que prevalecem nas plataformas digitais 
— modularidade e interconectividade — facilitam complementaridades que 
beneficiam não só a plataforma e os fornecedores de insumos complementa-
res — (também chamados de “complementos”) 2, mas também um conjunto 
2 Uma tentativa de sistematização de ecossistemas empresariais (Jacobides et al., 2018) 
forneceu uma definição mais específica do tipo de “complementaridade” necessária para 
a qualificação de um conjunto de relações como “ecossistema”: tais complementaridades 
devem ser não genéricas, no sentido de não se referirem a produtos padronizados; e devem 
ser únicas, no sentido de que um produto não funciona sem o outro, ou “supermodular” 
ou “Edgeworth”, significando que o valor de um produto aumenta na presença do outro e 
vice-versa (na produção ou no consumo).
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52 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
mais vasto de participantes que são afetados por sua infraestrutura. Partindo 
da ecologia, a modularidade pode ser definida como uma propriedade do sis-
tema que mede o grau em que os compartimentos densamente ligados dentro 
de um sistema podem ser dissociados em comunidades ou agrupamentos 
separados que interagem mais entre si do que com outras comunidades. 3 A 
interconectividade, por sua vez, refere-se à forma como diferentes espécies 
dentro de um ecossistema se relacionam (Nordbotten et al., 2018). Levan-
do em consideração tais características, um ecossistema pode ser definido 
como “um grupo de empresas que interagem e que dependem das atividades 
umas das outras… dependentes da liderança tecnológica de uma ou duas 
empresas que fornecem uma plataforma em torno da qual outros membros 
do sistema, fornecendo insumos e bens complementares, alinham os seus 
investimentos e estratégias” (Teece, 2012).
Com o crescimento da economia da plataforma, a interconexão, a modula-
ridade e os efeitos exponenciais da rede deram origem ao chamado fenômeno 
da “empresa invertida”: os líderes de mercado optam por inovar e alcançar es-
cala reunindo grandes números de clientes interdependentes, e, para tanto, 
utilizam contratos “abertos” externos em vez da integração vertical “fecha-
da” ou subcontratos (Parker et al., 2017). A oportunidade de captar os dados 
e a atenção dos usuários permite a essas empresas intermediarem transações 
com níveis de personalização sem paralelo, moldarem mercados em torno de 
perfis de consumidores cada vez mais específicos e alavancarem o seu poder 
em mercados secundários. Isso dá origem a uma corrida entre poucos cria-
dores de mercado, que viram infraestruturas-chave para a criação de valor, 
e tornam possível um volume elevado de transações. O papel dessas empre-
sas como orquestradores de sistemas é crucial para permitir o crescimento e 
evitar externalidades negativas, mas, ao mesmo tempo, oferece-lhes oportu-
nidades de abuso e extração de rendas de forma a impactar a concorrência, 
a inovação e a eficácia das políticas públicas. Consequentemente, alguns au-
tores chamaram os reguladores para analisar mais de perto a forma como o 
excedente é gerado nos ecossistemas e a sua distribuição pelos diferentes ato-
res da cadeia de valor digital (Jacobides e Lianos, 2021). Outros notaram que, 
para além da concorrência “intraecossistema”, as autoridades deveriam consi-
derar a concorrência “interecossistema” e evitar sua subversão na medida em 
que prejudica o bem-estar dos consumidores (Crane, 2019).
3 “Modularity”, Encyclopedia of Ecology, 2. ed., 2019.
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 das plataformas aos ecossistemas digitais 53
Em suma, é cada vez mais evidente que a dinâmica da concorrência 
dentro dos ecossistemas digitais sinaliza uma mudança do locus da con-
corrência no mercado: de um mercado relevante estritamente definido, 
para o próprio ecossistema, onde os seus membros competem a longo 
prazo — fazendo investimentos em recursos, capacidades e parceiros que 
são compensados ao longo do tempo — e descontam oportunidades de 
lucro a curto prazo, rivalidade baseada em roubar participação de mer-
cado no estilo “jogo de soma zero” ou em segredos de negócios (Petit e 
Teece, 2021). Conforme revisão da literatura existente sobre adminis-
tração de empresas e gestão (ver a Seção 1), identificamos uma série de 
elementos técnicos e empresariais que revelam a utilidade de uma aborda-
gem “ecossistêmica”. Embora reconhecendo que esses elementos não são 
exclusivos dos ecossistemas de plataformas digitais, e que o ecossistema 
pode surgir sem depender necessariamente da existência de uma plata-
forma comum, para efeitos deste projeto, centramo-nos nos ecossistemas 
de plataformas digitais (EPDs), que podem ser definidos como conjuntos 
de produtos e serviços que são interoperáveis dentro de uma plataforma, 
fornecidos dentro de limites contratuais e técnicos estabelecidos por ela 
em uma relação não hierárquica, e que aumentam o valor que oferece 
a seus usuários.
Os elementos técnicos chave são modularidade, interconectividade, com-
plementaridade e interoperabilidade.
1. A modularidade é o modelo organizacional de um sistema por meio 
do qual os seus componentes podem ser recombinados, misturados 
ou mesmo utilizados com novos componentes sem alterar outras par-
tes dele.
2. A interconectividade significa que a função ou utilização dos compo-
nentes está ligada entre si, de modo que, ou a alteração de um afeta a 
função de outro, ou, para obter valor do sistema, é necessário utilizar 
vários componentes em conjunto.
3. A complementaridade significa que os bens ou serviços geram mais va-
lor quando utilizados em conjunto do que separadamente. Em outras 
palavras, a combinação gera mais valor para os consumidores ou pelos 
produtores, conforme explicado a seguir (elemento de negócio 3).
4. A interoperabilidade é definida como a capacidade de transferir e utilizar 
dados e informações por meio de sistemas, aplicações ou componentes. 
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54 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
Para funcionarem em conjunto, os produtos do ecossistema precisam 
ter algum nível de interoperabilidade. Dentro dos EPDs, essa intero-
perabilidade ocorre principalmente em nível vertical, que se refere à 
interoperabilidade de um produto, serviço ou plataforma com produ-
tos e serviços complementares. Contudo, existem ocasiões limitadas em 
que a interoperabilidade facilitada pelo orquestrador do ecossistema 
será horizontal, referindo-se à interoperabilidade de produtos, servi-
ços ou plataformas concorrentes.
Para além dessas características técnicas, o sucesso dos EPDs de-
pende da sua capacidade de aproveitar um dos elementos técnicos 
chave — a complementaridade — para moldar todo um ecossistema de 
atores à sua volta, oferecendo uma proposta valiosa aos seus participan-
tes. Nesse sentido, existem vários indicadores que podem ser utilizados 
para descrever a natureza dos EPDs bem-sucedidos,que são do nos-
so interesse para efeitos deste trabalho. Esses elementos-chave de negócio 
são: (1) concorrência para além de um mercado, negócio ou indústria; 
(2) coevolução; (3) complementaridade; (4) “coopetição”; (5) direção cons-
ciente; (6) atração combinatória.
Dito de outra forma, para prosperar, os EPDs devem não só en-
volver certo número de players nos mercados, mas também facilitar a 
criação de valor nas transações, que, por sua vez, dependem das comple-
mentaridades que são criadas pela combinação de produtos, a quem são 
direcionados os benefícios. No centro disso, está a “direção consciente” 
(conscious direction) do ecossistema, ou seja, uma visão para o ecossis-
tema que é implementada por meio da sua “estrutura de alinhamento” 
(alignment structure). Em outras palavras, as regras contratuais e normas 
técnicas permitem à plataforma orquestrar a coordenação com seus com-
plementos, incluindo a definição de como o valor é criado (e extraído) 
dentro do ecossistema. Essa visão assegura que o sucesso de mercado de 
complementos que operam em diferentes linhas de negócio traz valor a 
todo o ecossistema, mantendo-os em relação caracterizada, ao mesmo 
tempo, pela concorrência e cooperação com o orquestrador e outros ato-
res do ecossistema. A importância desses elementos pode ser visualizada 
de acordo com os cinco conceitos de Petit e Teece que caracterizam um 
ecossistema empresarial (5 “Cs”):
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 das plataformas aos ecossistemas digitais 55
Concorrência
intermercados
Coevolução Complemen-
taridade
Coopetição Direção
consciente
Figura 2.1 os 5 “cs” de um ecossistema empresarial
Fonte: Petit e teece, 2020
1. Concorrência intermercados (cross market competition): platafor-
mas e complementos não são membros de uma única indústria, mas 
participam de uma concorrência de espectro largo que atravessa uma 
variedade de indústrias.
2. Coevolução (Co-evolution): interação recíproca entre membros de ecos-
sistemas heterogêneos e autônomos, que conduz à generatividade (ou seja, 
a criação de novos resultados, estrutura ou comportamento). Na melhor 
das hipóteses, a coevolução poderia criar serviços, indústrias ou tecno-
logias de finalidade genérica/de habilitação inteiramente novos.
3. Complementaridade (Complements): o valor agregado provém da intera-
ção com e entre os complementos (tanto em termos de qualidade quanto de 
variedade). Contudo, é importante salientar que o conceito empresarial de 
complementaridade difere da complementaridade como elemento técnico, 
uma vez que se centra não apenas na existência de algum nível mínimo de 
valor combinatório, mas na forma como este valor pode ser maximizado. 
Nesse sentido, é possível distinguir alguns tipos de complementaridades, 
que podem ser relevantes em diferentes níveis para diferentes EPDs ou 
para diferentes atores dentro dos EPDs. Em primeiro lugar, deve ser fei-
ta uma relevante distinção entre ecossistemas de consumo e de produção. 
No ecossistema de consumo, a relação dos complementos envolve algum 
grau de decisão do lado da demanda. Ou seja, o usuário define como in-
tegrar a oferta central com os complementos (Lusch e Nambisan, 2015). 
Por outro lado, em um ecossistema de produção, a relação envolve um au-
mento da proposta de valor por meio de interdependências desenvolvidas 
na cadeia de valor da empresa central (plataforma).
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56 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
Uma segunda distinção deve ser feita entre complementaridade forte 
e complementaridade fraca. Os complementos fortes são bens específicos e 
únicos, e não têm valor (ou têm valor muito diminuído), a menos que to-
dos estejam presentes na sua utilização. Por outro lado, complementos fracos 
existem quando um bem, habilidade ou atividade tem valor de modo inde-
pendente ou em conjunto com outros bens, mas seu valor é reforçado pela 
presença de outros bens, habilidades e atividades que não são únicas.
Uma terceira distinção pode ser feita centrando-se na natureza divisí-
vel do valor agregado de acordo com o nível dos insumos. Em particular, 
a comple men taridade supermodular existe quando mais de um insu-
mo aumenta o valor de mais outros insumos (como é o caso da presença 
de efeitos de rede diretos e indiretos). O oposto (que pode ser chamado de 
complementaridade não modular) ocorre quando mais de um insumo não 
aumenta o valor do outro para o consumidor, que fica satisfeito desde que 
possa comprar ambos no mercado.
Finalmente, é importante saber se a complementaridade depende da 
centralização do ecossistema, ou se pode ser alcançada independentemen-
te da coordenação. A complementaridade supramodular distribuída existe 
quando dois ou mais atores independentes, podendo criar valor comple-
mentar, na perseguição dos seus próprios interesses, não acham vantajoso 
se combinarem entre si para coordenar suas ações. O oposto é a comple-
mentaridade supermodular unificada, em que os insumos complementares 
estão sujeitos à governança unificada, ou seja, são escolhidos por um único 
agente para otimizar o valor de todo o sistema (Baldwin, 2017).
4. Coopetição (Co-opetition): os parceiros dos ecossistemas trabalham tanto 
cooperativamente como competitivamente para desenvolver novos pro-
dutos, serviços e inovações; ou seja, competem a longo prazo — fazendo 
investimentos em recursos, capacidades e parceiros que são compensados 
ao longo do tempo — e descontam oportunidades de lucro a curto prazo, 
rivalidade baseada em roubar quota de mercado no estilo “jogo de soma 
zero”, ou segredos de negócios. Deve ser encontrado um equilíbrio delica-
do de cooperação e concorrência entre os fornecedores de complementos. 
A gestão das forças centrífugas e centrípetas é crucial para um ecossistema 
sustentável, e isso está inevitavelmente ligado à natureza das complementari-
dades. Por um lado, se forem demasiado fortes, o ecossistema desmorona-se 
em algumas grandes organizações; por outro, se forem demasiado fracas, 
os membros podem simplesmente ignorar-se (Baldwin, 2017).
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 das plataformas aos ecossistemas digitais 57
5. Direção consciente (Conscious direction): a liderança auto-organiza-
da é particularmente necessária para propagar uma visão, alcançar a 
unidade de objetivos e produzir consistência de ação. Como menciona-
do, isso é acometido por meio de regras contratuais e normas técnicas 
(incluindo, entre outros componentes, Application Program Interfaces 
e Software Development Kits).
Para além desses 5C, uma característica empresarial chave dos EPDs é 
sua atração combinatória: os EPDs competem entre si com base na experiên-
cia do usuário, ou seja, na proposta de valor global que oferecem aos usuários 
finais do ecossistema, em vez de uma dimensão específica da concorrência 
centrada no produto. Isso é importante porque é um elemento verdadeira-
mente distintivo da concorrência dos ecossistemas: permite-nos distinguir 
os ecossistemas das plataformas de outras entidades que possam satisfazer 
os outros elementos empresariais e técnicos descritos. Essa dimensão cen-
trada na experiência difere da forma como tradicionalmente encaramos a 
concorrência, na medida em que vai além de um exame do preço, da quali-
dade e da variedade dos produtos que são vendidos dentro do ecossistema: 
isso inclui, por exemplo, a segurança e o apoio fornecido pelo seu orques-
trador, o status social ligado ao fato de dele fazer parte, sua perspectiva de 
crescimento e inovação e quaisquer outras eficácias geradas pela aquisição 
de um determinado produto dentro do ecossistema.
3. Definição de mercado em ecossistemas
3.1. Introdução
Apesar da fluidez do conceito de ecossistemas, pode-se começar a exami-
nar como aspectos-chave da análise antitruste nos ecossistemas podem ser 
operacionalizados. A definição demercado é um ponto natural de partida.
A definição de mercado é o processo pelo qual as autoridades de con-
corrência buscam os limites dentro dos quais o ator de mercado desafiado 
opera, onde surge a concorrência efetiva e onde os esforços investigativos esta-
rão focados (Baker, 2007). Nesse sentido, a definição de mercado é tanto uma 
ferramenta de foco quanto uma ferramenta de medição. É uma ferramenta 
focalizada no sentido de que ela serve como a área em que uma investiga-
ção antitruste é conduzida, e é uma ferramenta de medição considerando 
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58 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
que ajuda as autoridades de concorrência a avaliarem o poder de mercado 
do ator em questão dentro da área de concorrência efetiva. Como a Corte 
Geral da União Europeia explicou, no caso do Mastercard: “Para os propó-
sitos do artigo [102 TFEU], a definição adequada do mercado relevante é 
uma condição necessária para qualquer julgamento quanto a um comporta-
mento supostamente anticompetitivo, uma vez que, antes de ser constatado 
um abuso de uma posição dominante, é necessário estabelecer a existência 
de uma posição dominante em um determinado mercado, o que pressupõe 
que tal mercado já tenha sido definido.”4 Isso se segue a uma jurisprudência 
estabelecida que remonta à Continental Can, que explicou que “as possibi-
lidades de concorrência só podem ser julgadas em relação às características 
dos produtos em questão em virtude de que esses produtos são particular-
mente aptos a satisfazer uma necessidade inelástica e são apenas até uma 
medida intercambiáveis com outros produtos”.5
Embora as autoridades e tribunais de concorrência continuem a con-
fiar fortemente na definição de mercado no curso de sua análise dos casos, 
também está bem documentado que a definição tradicional do mercado está 
cercada de fraquezas que a impedem de capturar a dinâmica dos mercados 
digitais modernos, e ainda menos dos ecossistemas digitais (Pleatsikas e Te-
ece, 2001). As inadequações da definição tradicional do mercado seguem 
diretamente de seu foco original: mercados de “tijolos e argamassa” (brick 
and mortar), ou seja, não virtuais, onde as empresas competem principal-
mente quanto ao preço, produto por produto, com concorrentes horizontais 
que oferecem produtos substitutos. Nenhuma dessas condições se mantém 
em ecossistemas digitais. Em primeiro lugar, muitos produtos e serviços nos 
ecossistemas são gratuitos, o que torna o preço um parâmetro inviável. Em 
segundo lugar, por definição, os produtos e serviços ecossistêmicos fazem 
parte de um sistema e, portanto, não podem ser examinados isoladamente 
mesmo quando o foco é um produto ou serviço específico. Aos olhos dos 
consumidores, embora tecnicamente tais produtos e serviços possam ter 
substitutos um para um, a decisão de adotá-los ou rejeitá-los é tomada em 
conjunto com o resto do pacote ou sistema. Em terceiro lugar, enquanto os 
4 Case T-111/08, Mastercard Inc, Mastercard International Inc e Mastercard Europe SPRL 
v Commission, ECLI:EU:T:2012:260, para 171.
5 Caso 6/72, Europemballage Corp e Continental Can Co Inc v Comission [1973] ECR 215, 
para 32.
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 das plataformas aos ecossistemas digitais 59
concorrentes horizontais existentes que oferecem produtos ou serviços subs-
titutos continuam a ser a força mais forte da concorrência no mercado, eles 
certamente não são os únicos. Se a definição de mercado é definir o escopo 
dentro do qual procuramos forças competitivas, então teríamos que olhar 
além de apenas atores que oferecem produtos ou serviços substitutos como 
concorrentes horizontais, e incluir qualquer um que possa exercer uma pres-
são disciplinar sobre o ator de mercado desafiado.
A literatura desenvolvida em torno dos mercados de plataformas digitais 
nas últimas duas décadas ajudou a abordar algumas dessas questões (Evans, 
2016). A falta do elemento preço foi parcialmente resolvida contando com 
outros elementos além dele, principalmente a qualidade do produto ou ser-
viço (Eben, 2017). Em seguida, em vez de um pequeno, mas significativo e 
não transitório aumento de preço, que a definição tradicional do mercado 
usa para detectar substitutos, o teste analisa uma diminuição na qualidade 
(Small but Significant Non-transitory Decrease in Quality, ou SSNDQ). Se 
tal redução na qualidade do produto ou serviço focal faz com que os con-
sumidores se voltem para outros substitutos, estes devem ser incluídos na 
definição de mercado. A qualidade pode ser medida em várias dimensões, 
incluindo a quantidade de dados coletados, que se torna particularmente 
pertinente nos mercados digitais e/ou ecossistemas.
O problema de olhar para produtos e serviços isoladamente tem sido 
parcialmente abordado pelo reconhecimento das interações entre os di-
ferentes lados das plataformas. Tais interações foram reconhecidas já no 
início dos anos 1990 nos chamados pós-mercados (com notável aplicação 
no caso da Kodak)6, quando o valor econômico de um produto ou serviço 
durável estava vinculado ao de outro produto ou serviço, que geralmente era 
adquirido posteriormente e constituía um consumível (por exemplo, uma 
fotocopiadora e seu serviço de manutenção e reparo) (Katz e Shapiro, 1994; 
Shapiro e Teece, 1994). Mercados e plataformas multisided levaram esse 
pensamento um passo adiante. Sem a limitação temporal ou uma distinção 
de produto primário-secundário de mercados de reposição, os mercados 
multisided consistem em vários produtos e serviços distribuídos em dois 
ou mais lados que se conectam por meio de um intermediário, e, nessa 
forma de organização, os vários lados afetam uns aos outros predominan-
temente por gerarem efeitos diretos e indiretos da rede (Filistrucchi, 2018). 
6 Eastman Kodak Company v. Image Technical Services, Inc. et al.,112 S. Ct. 2072 (1992).
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60 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
Essa interação levantou a possibilidade de que os vários lados de um de-
terminado mercado multilateral, incluindo o intermediário, sejam tratados 
como um todo. Isso dependerá se os vários lados têm condições de deman-
da e fornecimento semelhantes e de quão entrelaçados os vários lados estão 
(Filistrucchi et al., 2014).
Por fim, o foco estreito na concorrência horizontal foi abordado por 
um reconhecimento crescente de que a concorrência vertical também deve 
ser considerada (Steiner, 2008). A concorrência vertical expressa a ideia de 
que as empresas não só competem por novos clientes horizontalmente, mas 
também competem com outras empresas, que a lei de concorrência nor-
malmente vê como complementos, para capturarem uma parcela maior na 
própria cadeia de valor.
3.2. As complexidades dos ecossistemas 
para definição de mercado
Os aprimoramentos descritos são todos passos na direção certa, mas ainda não 
capturam totalmente a natureza dos ecossistemas. Crucialmente, a definição 
do mercado de plataformas, que continua sendo a aproximação mais próxima 
da análise do ecossistema, tem sido realizada com base em lados bem identi-
ficados delas, que estão sempre engajados em todos os seus usos. Isso permite 
a aplicação da análise de substituição padrão, não importa quantos lados de 
uma plataforma sejam identificados (Filistrucchi, 2018). Por exemplo, uma 
plataforma de console de jogos consiste em dois lados, os desenvolvedores de 
jogos e os jogadores, e toda vez que o console de jogos é usado, esses dois lados 
interagem. Um esquema de pagamento consiste em quatro lados, o compra-
dor/pagador, o banco que emite o cartão de pagamento, o banco que recebe o 
pagamento do banco que emite o cartão de pagamento, e o vendedor, e todos 
eles se envolvem sempre que uma transação ocorre por meio da empresa de 
cartão de pagamento que atua como plataforma. A definiçãode mercado da 
plataforma nesses casos trata os vários lados separadamente e realiza análises 
de substituição sobre eles separadamente, ou define um único mercado de pla-
taforma e realiza análises de substituição sobre isso (Filistrucchi et al., 2014).7
Devido às supramencionadas características dos ecossistemas, ou seja, 
o grande número de produtos e atores existentes em diferentes mercados e, 
7 Ver também Ohio v. American Express Co., 585 U.S. ___ (2018).
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 das plataformas aos ecossistemas digitais 61
muitas vezes, em relações coopetitivas diagonais, e o papel do patrocinador 
do ecossistema na formação da direção do ecossistema e da experiência de 
seus membros constituintes, essa metodologia estrita que define um sistema 
estático e homogêneo ao redor da plataforma falha em capturar os limites de 
um sistema maior mais fluido e dinâmico, em que o poder é avaliado de for-
ma mais abrangente. Como mencionado, a função da definição de mercado 
é concentrar os esforços investigativos de um inquérito antitruste e forne-
cer a área econômica dentro da qual o poder de mercado será medido. Será 
mostrado a seguir que, diferentemente do que ocorre com as plataformas 
com um pequeno número de lados e com papéis estáticos e bem definidos, 
a identificação do poder de mercado nos ecossistemas é mais complexa não 
apenas em termos de escopo, mas também em termos de interações entre as 
partes constituintes do ecossistema. Nos ecossistemas, o poder de mercado 
não pode mais ser entendido simplesmente como o poder de elevar os pre-
ços ou excluir concorrentes e não se reflete mais apenas contra substitutos 
(= concorrentes), nem reflete um posicionamento estático em um merca-
do estático. Esse novo entendimento do poder precisa de uma metodologia 
revisada de definição dos limites dentro dos quais será medido. Isso é apre-
sentado a seguir.
3.2.1. Algumas propostas para a definição 
de mercado em ecossistemas
O ponto de definição de mercado nos ecossistemas é encontrar os limites 
deles, de tal forma que possam ser delimitados quais atores, produtos e servi-
ços de mercado servem como fontes de pressão competitiva no ecossistema, 
independentemente de serem substitutos no sentido estreito. Uma vez que a 
definição de mercado é o exercício pelo qual as autoridades de concorrência 
determinam a área de concorrência efetiva, quaisquer forças que tenham um 
efeito de como um ecossistema como um todo ou seus componentes se po-
sicionam competitivamente no mercado devem ser contabilizadas.
Trata-se de um exercício complicado nos ecossistemas, pois, como 
sistemas complexos, eles muitas vezes têm limites abertos e sua adesão é 
definida com base nas relações entre os componentes. Assim, seria preci-
so identificar as relações entre componentes que determinam as fronteiras 
entre o ecossistema e seu ambiente (Cilliers, 2001). Sem uma forma ope-
racional de definir os limites de um ecossistema, seu uso na análise de leis 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 61 16/11/2022 10:55:29
62 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
antitruste seria impraticável, uma vez que não haveria uma maneira viável 
de determinar o escopo da investigação e, consequentemente, a área em que 
o poder de mercado é construído e exercido, e seus resultados sentidos pe-
los consumidores e atores do mercado. Isso não quer dizer que exista uma 
expectativa de definir os limites de um ecossistema com precisão absoluta; 
afinal, mesmo a definição tradicional de mercado não é um exercício preci-
so, mas, sim, é bem reconhecido que os substitutos dentro de um mercado 
são uma questão de grau, e não uma distinção absoluta de inclusão-exclusão.
A definição de limites nos ecossistemas pode partir do reconhecimento 
de que os ecossistemas no direito de concorrência compartilham caracte-
rísticas com estruturas complexas em outras disciplinas, principalmente 
economia/gestão, estudos sociais e ciência da computação. Conceitos como 
mercados de cluster (ou seja, por grupo de produtos), sistemas complexos 
e análise de rede podem se tornar relevantes e fornecer insights sobre como 
os limites do ecossistema podem ser identificados. Provavelmente, nenhu-
ma metodologia será adequada em todos os contextos, e uma combinação 
delas pode funcionar melhor em certos casos, mas é importante reconhecer 
que existem de fato maneiras viáveis de definir os limites do ecossistema.
Talvez a estrutura mais próxima dos ecossistemas do ponto de vista da 
lei da concorrência seja os mercados de cluster. Os mercados de cluster têm 
uma longa história no direito antitruste, mas o conceito também foi surpreen-
dentemente subutilizou e foi apenas recentemente que viu um ressurgimento 
(Hovenkamp, 2021). No caso antigo de Crown Zellerbach8, a Circuit Court 
tentou definir uma “linha de comércio” (como foi exigido pela Seção 7 da 
Lei Clayton, aplicável no caso) procurando uma linha de produtos que fos-
se “suficientemente inclusiva para ser significativa em termos de realidades 
comerciais”. A linha de produtos não tinha que ser um único produto, mas 
qualquer pacote baseado em realidades comerciais poderia ser visto como 
o mercado relevante a ser afetado pela conduta competitiva dos atores en-
volvidos (no caso em questão, uma fusão). No caso de Philadelphia National 
Bank9, a Suprema Corte se recusou a examinar produtos e serviços ofereci-
dos por instituições bancárias como separados, embora houvesse demanda 
separada por eles, mas, sim, combinou-os em um “cluster de produtos (vá-
rios tipos de crédito) e serviços (como contas correntes e administração de 
8 Crown Zellerbach Corporation v. Federal Trade Commission, 296 F.2d 800 (1961).
9 Estados Unidos v. Philadelphia Nat’l Bank, 374 U.S. 321, 374 (1963).
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 das plataformas aos ecossistemas digitais 63
confiança) denotados pelo termo “banco comercial”: isso porque as reali-
dades comerciais revelaram que, enquanto os produtos e serviços tomados 
separadamente foram isolados da concorrência, juntos não foram. Em Grin-
nell10, a Corte Suprema juntou vários serviços de proteção patrimonial sob o 
mercado global de serviços de estações centrais credenciados, reconhecen-
do novamente que, embora haja substitutos para cada serviço em particular 
separadamente, “seria irrealista […] dividir o mercado nos vários tipos de 
serviços de proteção da estação central que estão disponíveis”. Na União 
Europeia, os mercados de one-stop-shop têm sido tratados como mercados 
de cluster, nos quais “a experiência mais ampla de compras em um super-
mercado ou outro tipo de estabelecimento de varejo de alimentos onde [o 
consumidor] pode encontrar todas as mercadorias que ele precisa no lo-
cal (compras pontuais)” não é comparável a “compras em pontos de venda 
especializados”11 e, portanto, os estabelecimentos especializados não com-
petem com os estabelecimentos de uma parada única, mesmo que possam 
vender produtos substitutos individualmente.12
Embora os mercados de clusters pareçam ser uma construção estreita 
para acomodar as complexidades dos ecossistemas, tornam-se úteis quando 
se identifica o elemento que une os produtos e serviços incluídos no mer-
cado de clusters. Ayres colocou o principal identificador dos mercados de 
clusters nas complementaridades transacionais entre diversos produtos e 
serviços (Ayres, 1985). Nesse sentido, para identificar se e quais produtos e 
serviços podem ser agrupados em um cluster e por ecossistema de extensão, 
deve-se olhar para o comportamento do consumidor para ver se os consu-
midores usam ou compram o grupo de produtos ou serviços de empresas 
individuais e, também, se os vendedores/fabricantes os oferecem ou os co-
mercializam em conjunto (mas não necessariamente os vendem de forma 
casada). Hovenkamp também reconhece os mercados de clusters, seja quan-
do as preferências dos consumidoresrevelam uma preferência pelo cluster 
(ou parte dele), ou quando o vendedor/fabricante agrupado se beneficia 
de economias de escopo na oferta de bens diferentes (Hovenkamp, 2021). 
Nessas condições, o cluster tem um significado econômico além dos pro-
dutos ou serviços individuais que contém e, portanto, pode ser visto como 
10 Estados Unidos v. Grinnell Corp., 384 EUA 563, 572–73 (1966).
11 Decisão da Comissão IV/M.1221, Rewe/Meinl (1999) C (1999) 228, parágrafo 13.
12 Decisão da Comissão COMP/M.4590, Rewe/Delvita (2007), parágrafo 12.
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64 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
constituindo um mercado próprio, independentemente de os produtos e ser-
viços contidos no interior serem substitutos ou mesmo complementos13. Os 
custos transacionais aqui devem ser interpretados de forma ampla para in-
cluir pesquisa, compra, uso e outros custos envolvidos na localização, uso 
ou compra de produtos e serviços. Isso pode até incluir atenção ou aspectos 
cognitivos. Por exemplo, mesmo quando “a concorrência está a um clique de 
distância”, os consumidores podem achar preferível usar dois serviços pelo 
mesmo provedor do que fazer o esforço de considerar sair da “zona” de um 
provedor e fazer a transição para outro, mesmo que o serviço deste último 
possa ser superior (isso, às vezes, é chamado de “árvore de abrangência cogni-
tiva mínima”, ou “menor carga cognitiva”) (Candeub, 2014; Newman, 2019).
Para dar um exemplo, o ecossistema da Apple poderia compor todos os 
produtos e serviços oferecidos pela empresa, bem como os de concorrentes 
nas mesmas categorias, se os padrões de consumo revelarem que são usados 
ou comprados juntos, independentemente de serem complementos. Por exem-
plo, Apple TV e iMacs não são complementos, mas, se os padrões de consumo 
revelarem que os consumidores que usam a Apple TV também comumente 
usam iMacs (a uma taxa maior do que outras combinações de hardware de 
streaming de TV e hardware de computador pessoal), porque a combinação 
reduz seus custos transacionais (que podem consistir em custos monetários 
reais, ou em custos de pesquisa, custos de compatibilidade, custos de deci-
são etc.), então esses produtos podem ser trazidos sob o mesmo ecossistema. 
O exercício é então repetido de forma iterativa para encontrar os limites do 
mercado de clusters que se desenvolve em torno da Apple. Uma vez definido 
o ecossistema da Apple, pode-se procurar ecossistemas semelhantes que com-
petem com o ecossistema Apple, e para os concorrentes em um por produto/
serviço incluído no ecossistema. Note-se que a questão de saber se apenas 
outros ecossistemas ou produtos e serviços individuais também podem exer-
cer pressão competitiva também é para a metodologia de poder de mercado 
a considerar (veja a Seção 4).
Uma maneira diferente de definir os limites do ecossistema é usando 
um processo de seleção de bolas de neve (Doreian et al., 1994). Neste pro-
cesso começa-se com um único produto/serviço, ou um conjunto do mesmo 
baseado em uma forte regra específica de inclusão. Regras de inclusão fortes 
são aquelas que definem critérios rigorosos de quais produtos/serviços serão 
13 Estados Unidos v. Phillisburg Nat’l Bank and Trust Co, 399 U.S. 350, 360–362 (1970).
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 das plataformas aos ecossistemas digitais 65
incluídos na seleção inicial, de tal forma que a seleção inicial compreende 
apenas produtos/serviços que cumprem todas as regras (por exemplo, em 
vez de fazer de um único aplicativo do Google o ponto de partida para a 
definição de um ecossistema a seu redor, pode-se optar por fazer a regra 
relevante “aplicativos no Google App Suite” e construir o ecossistema ao re-
dor do Suite). Em seguida, identificam-se insumos a montante e a jusante e 
complementos ao redor que podem interagir diretamente com o usuário fi-
nal (mesmo que nem todos os usuários realmente interajam com eles), e em 
que a empresa do ecossistema está presente. Para cada um desses mercados 
de insumo ou complemento, são identificados os concorrentes dentro do método 
tradicional de substituição. As duas etapas anteriores são repetidas até que 
não haja mais mercados de entrada/complemento que interajam diretamente 
com seu usuário final dependente e no qual a empresa do ecossistema este-
ja presente pode ser encontrada.
Por exemplo, no ecossistema da Apple, pode-se começar a partir da 
App Store. Em seguida, todos os insumos e complementos na App Store, 
onde a Apple está presente e por onde interage com os usuários finais, são 
identificados. Isso incluiria aplicativos, sistemas de pagamento e o celular. 
No entanto, não incluiria o kit de desenvolvedor de software (SDK), porque 
ele não interage diretamente com os usuários finais, embora a Apple esteja 
presente nesse segmento. O processo é repetido para cada um dos insumos 
e complementos acima. Por exemplo, para desenvolvedores de aplicativos, o 
mercado de SDK seria incluído, porque os SDKs interagem diretamente com 
os desenvolvedores e a Apple fornece seu próprio SDK. Os sistemas de paga-
mento também seriam incluídos pelo mesmo motivo. No entanto, serviços 
de suporte à infraestrutura (como o AWS da Amazon) que os desenvolve-
dores de aplicativos comumente usam não seriam incluídos porque a Apple 
não está presente nesse segmento. A ideia é capturar todos os segmentos da 
cadeia de valor em que a empresa desafiada está presente e que exercem in-
fluência direta sobre seus dependentes sem se limitar aos substitutos.
Um método relacionado para definir os limites do ecossistema é a aná-
lise de proximidade (Porter, 1998; Boja, 2011). A análise de proximidade 
analisa semelhanças entre empresas de uma determinada dimensão para 
identificar aquelas que são mais próximas entre si. Passado um certo limiar 
de proximidade, essas empresas e seus produtos e serviços podem ser pen-
sados como parte do mesmo ecossistema, independentemente de eles serem 
complementos ou substitutos no sentido estreito da palavra. Obviamente, 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 65 16/11/2022 10:55:29
66 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
esse método não é adequado para construir ecossistemas em torno de uma 
única empresa; em vez disso, é mais instrutivo na construção de ecossiste-
mas em torno de tipos de produtos ou serviços, a fim de identificar as forças 
competitivas relevantes dentro desse produto ou serviço. Como tal, a análise 
de proximidade pode ser mais útil em casos de atos de concentração e tam-
bém em casos envolvendo acordos anticompetitivos: esses são mais flexíveis 
em termos dos mercados em que os efeitos serão examinados, em compa-
ração com casos de abuso de dominância que são construídos em torno de 
conduta específica de uma empresa específica em um ou mais mercados es-
pecíficos de produtos ou serviços.14
Existem inúmeras dimensões em que a proximidade pode ser medida, 
cada uma expressando um aspecto diferente de afinidade, mas geralmente 
podem ser agrupadas em três tipos: proximidade organizacional, tecnológi-
ca e geográfica (Knoeben e Orlemans, 2006). A proximidade organizacional 
refere-se ao nível de semelhança das normas e rotinas entre as organizações 
(Torre e Rallet, 2005; North, 1991); a proximidade tecnológica baseia-se 
em conhecimentos tecnológicos semelhantes, que vão além do conheci-
mento da própria tecnologia e abrange o conhecimento sobre os processos 
em torno do desenvolvimento e uso do know-how técnico (Tushman e An-
dersson, 1996); a proximidade geográfica denota proximidade territorial, 
espacial, local ou física (Torre Shaw e Gili, 2000). A análise de proximida-
de não avalia se o produto ou serviço de uma empresa pode ser substituído 
pelo de outra aos olhos dos consumidores, mas foca como as empresas se 
percebem no mercado em relação a outras empresas, para determinar pres-
sões competitivas que possamagir para constranger a empresa (Petit, 2020). 
Os limites desse grupo estratégico de empresas formam os limites do ecos-
sistema no qual as empresas exibem afinidade competitiva e, portanto, 
potencialmente exercem maior influência competitiva. Como Reger e Huff 
(1993) explicam: “A percepção gerencial de semelhanças e diferenças entre 
os concorrentes influenciam a tomada de decisões estratégicas […] [e] os 
14 No direito da concorrência da União Europeia, nos casos que envolvem acordos/restrições 
comerciais, o mercado é definido para determinar se existe efeito do comércio entre estados-
membros e se o acordo tem objeto ou efeitos anticompetitivos. Por essa razão, a Corte de 
Justiça permitiu que a Comissão utilizasse definições amplas de mercado, mesmo incluindo 
produtos não substituíveis separados, desde que os efeitos competitivos nesses mercados 
pudessem ser mostrados. Ver Casos T-259/02 a 264/02 e T-271/02, Raiffeisen Zentral-
bank Osterreich e outros v Comission (2006) ECR II-5169.
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 das plataformas aos ecossistemas digitais 67
esquemas de agrupamento dos estrategistas podem ser mais significativos 
[…] para entender a concorrência e o desempenho porque, através de pro-
cessos de promulgação, espera-se que a forma como as empresas se veem e 
veem seus concorrentes tenham efeitos tangíveis na reformulação da estra-
tégia e na subsequente estrutura do setor.”
Existem vários métodos de identificação de grupos e empresas dentro de 
grupos (o equivalente à análise de substituição na definição de mercado) (Nath 
e Gruca, 1997; Rudie Harrigan, 1985; Hruschka,1986). Por exemplo, na aná-
lise de fatores e agrupamento das entidades candidatas, são descritos por sua 
posição em um conjunto de atributos (dimensões), e os limites dos grupos 
são derivados de acordo com padrões encontrados nas medidas de atributos. 
Na percepção de julgamentos de escala multidimensional de similaridade ou 
preferência, eles são transformados em distâncias representadas no espaço 
multidimensional, que mostram o posicionamento relativo de todos os obje-
tos). Em congruência com a análise de proximidade, os grupos estratégicos não 
operam em uma rigorosa base binária de inclusão/exclusão — ao contrário, 
exibem uma gradação de adesão (Reger e Huff, 1993), com algumas empresas 
formando o núcleo, algumas mais periféricas e outras transitórias; isso signifi-
ca que nem sempre são membros estáveis do mesmo grupo, mas sua posição 
estratégica está ao longo de dimensões comuns a outras empresas do setor.
Outra forma quantitativa de determinar os limites do ecossistema é 
inspirada no fechamento informacional (Bertschinger et al., 2006). O fe-
chamento de informações veio como uma resposta às teorias qualitativas 
de fechamento do sistema, como o fechamento organizacional, com base 
no qual foram definidos limites para incluir processos que estão se manten-
do/reproduzindo as condições para sua própria existência. O fechamento 
organizacional baseou-se fortemente no conceito biológico de sistemas au-
topoiéticos, que os criadores do termo descreveram como “uma rede de 
processos de produção (transformação e destruição) de componentes que: 
(i) por meio de suas interações e transformações se regeneram continua-
mente e percebem a rede de processos (relações) que os produziram; e (ii) 
constituem a máquina como uma unidade concreta no espaço em que eles 
(os componentes) existem, especificando o domínio topológico de sua rea-
lização como tal rede” (Maturana e Varela, 1980). Embora tais métodos 
qualitativos tenham ganhado alguma tração teórica, eles são muito vagos 
e abstratos para qualquer inquérito formal. Pelo contrário, o fechamento 
de informações depende da medição dos fluxos de informações do ambiente 
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68 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
de um sistema para o sistema, e o limite é colocado onde o fluxo de informa-
ções do ambiente para o sistema tende a zerar. Nessa teoria, a “informação” 
é usada como um proxy geral para quantificar a entrada “que o ambiente 
fornece adicionalmente sobre o próximo estado do sistema dado o estado 
anterior do sistema” (Bertschinger et al., 2008).
A ferramenta de medição de entrada pode ser útil na determinação dos 
limites do ecossistema no direito da concorrência também, mas, em vez de 
entradas informacionais, pode-se contar com proxies mais relevantes para a 
concorrência, como receita e usuários. Os limites do ecossistema, portanto, 
são onde não há mais entrada de receitas e usuários na seleção inicial do sis-
tema. A seleção do sistema nesta metodologia pode ser construída em torno 
de uma empresa ou em torno de um produto/serviço, nesse caso serão in-
cluídas todas as empresas que oferecem substitutos do produto/serviço focal.
Para fins de ilustração, se alguém quisesse construir o ecossistema do 
Google, eles incluiriam todos os produtos e serviços do Google que geram 
receita ou entradas de usuários. A soma de todos os produtos e serviços 
contados é o ecossistema do Google, pois expressa os dois proxies mais 
relevantes competitivamente, ou seja, receita e clientes. Outros proxies com-
petitivamente relevantes, como dados, também poderiam ser usados, mas 
seria mais difícil de medi-los.
4. Poder de mercado nos ecossistemas
4.1. Introdução
O poder de mercado é comumente definido tanto como a capacidade de ele-
var os preços acima dos níveis competitivos, quanto como a capacidade de 
excluir os concorrentes, ou mais geralmente como a capacidade de agir sem 
levar em conta os concorrentes e, em última instância, para os consumidores 
(Landes e Posner, 1981)15. Essas definições só são moderadamente úteis no 
contexto dos ecossistemas. O elemento preço é comumente ausente tornando 
a estimativa de poder de mercado baseada na capacidade de elevar os preços 
inviável. Além disso, mesmo quando os preços estão disponíveis, é extrema-
mente complexo calcular margens no contexto de sistemas multiprodutos/
serviços e multiatores (como ecossistemas), onde os preços não refletem os 
custos e receitas de produtos e serviços isoladamente, mas sim uma estratégia 
15 Ver também Caso 85/76, Hoffman – La Roche v. Comission [1979] ECR 461.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 68 16/11/2022 10:55:29
 das plataformas aos ecossistemas digitais 69
global de subsídios cruzados dentro dos ecossistemas. Em seguida, a capaci-
dade de agir independentemente de concorrentes ou consumidores, embora 
tão relevante no contexto dos ecossistemas como qualquer outro contexto de 
mercado, é muito genérica para ser viável. Isso deixa a capacidade de excluir os 
concorrentes como uma definição relevante e específica de poder de mercado 
nos ecossistemas. No entanto, excluir os concorrentes não é a única maneira 
que o poder de mercado pode ser exercido nos ecossistemas, mas, importan-
te, as fronteiras entre concorrentes e complementos são cada vez mais difíceis 
de discernir, e os ecossistemas podem não procurar exercer principalmente o 
poder de mercado dessa forma.
Além disso, mesmo depois de se estabelecer onde se deve procurar o poder 
de mercado com base no entendimento do poder de mercado, seja conven-
cionalmente, conforme descrito, seja definindo-o de novo (como será feito a 
seguir), surge a questão concomitante de como medir o poder de mercado. 
Tradicionalmente, dependendo da definição escolhida de poder de merca-
do, a medição pode ser feita direta ou indiretamente. Quando o poder de 
mercado é definido como a capacidade de elevar os preços acima dos níveis 
competitivos, o Índice Lerner é uma maneira comum de quantificar o po-
der de mercado, com base na margem preço-custo, ou seja, a diferença entre 
o preço de saída de uma empresa e o custo marginal dividido pelo preço de 
saída. Quando o poder de mercado é definido como a capacidade de excluir 
concorrentes, evidências diretasde concorrência fechada, ou seja, rivais que 
saíram do mercado, também são comumente citadas, embora a hipoteca real 
não seja estritamente necessária. As evidências indiretas podem tomar qualquer 
forma, desde que instrua o posicionamento competitivo da empresa desafia-
da no mercado (Crane, 2014). Como seria de esperar, se, como mencionado, 
novas concepções e fontes de poder de mercado precisarem ser determina-
das, também surge a necessidade de identificar as medidas adequadas. Para 
ambos, o ponto de partida são as características dos ecossistemas que podem 
exigir irmos além de elevar os preços ou excluir concorrentes, com seus pro-
xies relevantes, como evidência de poder de mercado.
Como já sugerido, e como analisado em maior comprimento na Seção 1, 
os ecossistemas são sistemas grandes, complexos, multiprodutos, multiatores. 
Os produtos, serviços e atores presentes no ecossistema são interdependen-
tes tanto tecnicamente, como também em termos de valor, uma vez que a 
proposta de valor que atinge o usuário final é o resultado combinado das 
contribuições do produto, serviço e ator. Nos ecossistemas, as escolhas dos 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 69 16/11/2022 10:55:29
70 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
consumidores sobre produtos e serviços não são feitas isoladamente, mas 
sim em conjunto com outros produtos e serviços dentro do mesmo ecos-
sistema, ou em outros ecossistemas assumindo compatibilidade. Portanto, 
as escolhas dos consumidores também, e não apenas as dos fabricantes/for-
necedores, refletem as interdependências entre os diversos componentes 
dos ecossistemas. Como os ecossistemas compreendem diversos produtos/
serviços e em vários níveis da cadeia de valor, também é possível que seu 
patrocinador subsidie de forma cruzada entre eles, espalhe risco e aloque 
capital conforme necessário sem essencialmente mudar sua posição econô-
mica ou modelo de negócio. Isso concede a máxima flexibilidade em termos 
de acumular e alavancar o poder. Esses recursos são distintos e separados 
das plataformas, pelo menos na forma como as plataformas são entendidas 
na literatura antitruste, ou seja, como intermediários que conectam vários 
lados permitindo que eles interajam diretamente, beneficiem-se de efeitos 
de rede direta e indireta e usem preços (muitas vezes sob a forma de comis-
sões) para gerenciar incentivos de participação na plataforma (por exemplo, 
sistemas de pagamento de cartão de crédito, plataformas de distribuição de 
aplicativos digitais etc.). Por causa disso, os ecossistemas têm diferentes fon-
tes de poder de mercado, que serão discutidas a seguir.
4.2. Fontes de poder de mercado nos ecossistemas
4.2.1. Capacidade de moldar relações de mercado
Como mencionado, uma vez que nos ecossistemas o foco da concorrência 
nem sempre é o preço, mas, sim, outros elementos qualitativos, como a qua-
lidade do produto/serviço, características, interoperabilidade e reputação da 
marca (Comissão Europeia, 2021), a capacidade de elevar o preço nem sempre 
captura as maneiras em que os patrocinadores do ecossistema podem exer-
cer o poder de mercado. Isso não quer dizer que o preço seja irrelevante; por 
exemplo, a investigação em curso da Comissão Europeia contra a comissão 
de 30% da Apple sobre transações in-app por meio da App Store é um abuso 
de preços (pelo menos, essa é a teoria de dano). Mas porque, ao contrário dos 
mercados e plataformas tradicionais, em que o jogo de preços quase sempre 
desempenha um papel predominante, nos ecossistemas, os preços são um pa-
râmetro menos determinante. Além disso, nos ecossistemas, a distinção entre 
concorrentes e complementos é obscura, uma vez que as empresas tendem 
a competir, mas também dependem umas das outras para entregar valor ao 
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 das plataformas aos ecossistemas digitais 71
consumidor final, e, por tanto, a capacidade de excluir concorrentes também 
se torna menos relevante.
Em vez disso, uma fonte crescente de poder de mercado para os patro-
cinadores do ecossistema é a capacidade de ditar as regras sobre as quais o 
ecossistema é construído e opera (Adner, 2017; Lingens et al., 2021). Esse 
poder de “modelagem” não se refere nem a elevar os preços nem a excluir 
concorrentes; trata-se de moldar o mercado em torno do ecossistema de 
maneiras que correspondam às capacidades e necessidades do patroci-
nador do ecossistema para que o patrocinador possa entrincheirar sua 
posição. Esse tipo de poder de modelagem se manifesta de várias manei-
ras. Em primeiro lugar, no sentido estreito, a capacidade de ditar os termos 
e condições que os participantes do ecossistema têm de respeitar significa 
que o patrocinador do ecossistema pode moldar o ecossistema de manei-
ras que atendam principalmente a seu modelo de negócio. Os termos e 
condições podem ser contratuais (termos de uso online) ou tecnológicos 
(por exemplo, projetos de interface). Ambos podem enfrentar na direção 
de usuários finais ou parceiros de negócios e ambos são mais comumen-
te completamente inelásticos, o que significa que os usuários finais e/ou 
parceiros não têm margem para negociação; eles só podem aceitá-los ou 
rejeitá-los. O resultado desse tipo de fonte de poder de mercado é que o 
patrocinador do ecossistema pode efetivamente moldar o mercado e afe-
tar sua estrutura competitiva.
Em um sentido mais estreito, a capacidade de moldar as relações den-
tro do ecossistema reflete a capacidade do patrocinador do ecossistema de 
capturar uma parcela maior do valor gerado no ecossistema. Isso se tra-
duz em espremer as margens dos parceiros ao longo da cadeia de valor ou 
impor condições comerciais injustas. Esse tipo de poder exploratório não 
é novidade na lei antitruste. Antigos monopolistas de serviços de utilida-
de pública, que transitavam para mercados liberalizados, têm sido capazes 
de pressionar concorrentes que dependiam de acessar a infraestrutura do 
atual para competir no mercado16. No entanto, as diferenças no contex-
to dos ecossistemas é, em primeiro lugar, que o poder do patrocinador do 
ecossistema é exercido contra concorrentes complementares (também), 
não (apenas) concorrentes, tornando-o materialmente mais difundido, e 
em segundo lugar que o poder das utilidades anteriormente monopolistas 
16 Ver, por exemplo, Deutsche Telekom AG v Comissão (2010) C-280/08.
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72 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
foi herdado; foi, de certa forma, empurrado sobre eles, para usar as pala-
vras do Juiz Learned Hand em Alcoa17, enquanto os ecossistemas visam 
desenvolvê-lo do zero como uma questão de engenharia de negócios. Nesse 
sentido, o poder de moldar as relações é um arquiteturamento conscien-
te e planejado do mercado.
A captação de valor tem sido uma consideração fundamental nos es-
tudos de administração de empresa, mas menos no direito antitruste, pois 
a alocação do valor gerado ao longo da cadeia de valor foi vista como uma 
questão de negociação, não uma questão de concorrência (isso, por sua vez, 
foi devido à pré-ocupação do direito de concorrência com a concorrência 
horizontal). Como explicou Teece, a apropriação de valor está longe de ser 
automática, e muitas vezes exige que as empresas exerçam controle em várias 
partes da cadeia de valor para evitar que o valor gerado por seus produtos e 
serviços sejam apropriados por outras empresas da cadeia de valor (Teece, 
1986). Embora isso possa ser justo, uma vez que uma empresa estabeleceu 
uma posição de gargalo na cadeia de valor, ela pode muito bem explorá-la 
para capturar mais valor do que gera.
Algumas leis nacionais de concorrência já estão começando a captu-
rar essas dinâmicas. Por exemplo, a Lei Alemã de Concorrência inclui uma 
medida preventiva no artigo 19-A, segundo a qual o Bundeskartellamt pode 
proibir certos tipos de conduta por partedas empresas que, devido à sua 
posição estratégica e seus recursos, são de suma importância para a concor-
rência entre os mercados (uma descrição semelhante à de orquestrador de 
ecossistema)18. Tal conduta inclui, por exemplo, o autofavorecimento dos 
serviços próprios de um grupo ou impedir que empresas terceiras entrem no 
mercado, processando dados relevantes para a concorrência. De forma mais 
ampla, a recente atividade antitruste examina condutas que se concentram 
em práticas comerciais desleais, que não excluem, nem elevam os preços, mas 
indevidamente incomodam os concorrentes. O caso francês contra o Goo-
gle por abusar de sua posição dominante ao aplicar arbitrariamente termos 
obscuros de serviço19, e o caso da Comissão Europeia contra a Apple por 
17 Estados Unidos contra Alumínio Co. da América, 148 F.2d 416, 429 (1945).
18 Seção 19a, Ato contra Restrições de Concorrência, na versão publicada em 26 de junho de 
2013 (Bundesgesetzblatt (Diário oficial da União) I, 2013, pp. 1.750, 3.245), conforme 
último alterado pelo artigo 1o da Lei de 18 de janeiro de 2021 (Lei Federal Gazette I, p. 2).
19 https://www.autoritedelaconcurrence.fr/fr/communiques-de-presse/lautorite-sanctionne-goo-
gle-hauteur-de-150-meu-pour-abus-de-position.
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 das plataformas aos ecossistemas digitais 73
abusar de sua posição dominante ao determinar o uso do sistema de compra 
de aplicativos proprietário da Apple (“IAP”) são exemplos nesse sentido.20
4.2.2. Flexibilidade de mercado como fonte de poder de mercado
Flexibilidade e adaptabilidade são, normalmente, boas qualidades para as 
empresas terem, pois significa que elas podem superar as dificuldades do 
mercado e permanecer no jogo. No entanto, como os orquestradores de ecos-
sistemas podem ser responsáveis pela extrema complexidade das relações 
comerciais e técnicas no mercado, a capacidade de navegar nessa complexi-
dade e alavancá-la em atividades secundarias pode ser, por si só, uma fonte 
de poder de mercado. Isso não quer dizer que a complexidade seja ruim ou 
indesejável em si, mas que, quando a complexidade atinge níveis que poucos 
ou uma empresa podem navegar, então essa capacidade pode ser a fonte do 
poder de mercado. A complexidade, então, protege essas empresas da con-
corrência, e permite que elas atuem sem se preocupar com os concorrentes 
ou mesmo as autoridades de fiscalização.
A complexidade do mercado não é necessariamente o resultado exclu- 
sivo do arquiteto próprio de um patrocinador do ecossistema, conforme 
falado. Em vez disso, a complexidade é a confluência de características da 
indústria, bem como escolhas de negócios. Existem vários fundamentos 
deste tipo de poder. Como mencionado, os ecossistemas são sistemas mul-
tiprodutos e multiatores, o que significa que o patrocinador do ecossistema 
pode muitas vezes estar presente em inúmeros mercados e camadas da ca-
deia de valor. Nesse contexto, o patrocinador do ecossistema compete em 
duas arenas separadas: uma por produto/serviço e outra em uma base ecos-
sistêmica. Embora os ecossistemas possam enfrentar uma concorrência 
intensa por produto/serviço (por exemplo, a Amazon produz/vende baterias 
e compete com vários outros fabricantes de baterias), eles podem enfrentar 
menos concorrência em uma base ecossistêmica, porque isso exigiria que 
os concorrentes construíssem uma semelhante construção multiníveis, mul-
tiprodutos e multiator21. Isso não é apenas mais intensivo em capital, mas 
20 https://ec.europa.eu/commission/presscorner/detail/en/ip_21_2061.
21 Sobre as preocupações anticompetitivas em torno da entrada multinível ver 1984 Linhas de 
Fusão §4.21, e, geralmente, COMANOR, W. S. “Vertical Mergers, Market Powers and the 
Antitrust Laws” 57, American Economic Review Papers and Proceedings 254, pp. 259–62, 
1967; RIORDAN, M. H. R. e SALOP, S. “Evaluating Vertical Mergers: a Post-Chicago 
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74 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
também requer expertise na gestão da complexidade da construção de tal 
construção, que é mais difícil de adquirir do mercado. A Microsoft, apesar 
de seus veneráveis recursos financeiros e dos investimentos concomitantes 
no desenvolvimento de um ecossistema móvel para competir com o Goo-
gle e a Apple, falhou, em parte porque não conseguia navegar nos meandros 
dos ecossistemas móveis.
De forma correlata, como os patrocinadores do ecossistema podem 
estar presentes em inúmeros mercados e camadas da cadeia de valor, eles 
podem se beneficiar de uma recombinabilidade aumentada entre seus ati-
vos (ou os de terceiros sobre os quais eles podem exercer controle) bem 
como de economias significativas de escopo. A recombinabilidade é um 
dos principais benefícios dos sistemas modulares, pelo qual o sistema pode 
reutilizar e reutilizar seus ativos a um custo menor do que desenvolvê-los 
de novo para cada aplicação em que são necessários (Schilling, 2000). A re-
combinabilidade aumenta de valor quando os vários componentes a serem 
reutilizados e recombigrados são heterogêneos, de modo que cada reorga-
nização produz um novo utilitário (Schilling, 2000). É provável que seja o 
caso dos ecossistemas que reúnem múltiplos atores e produtos em inúme-
ros mercados. Quando os patrocinadores dos ecossistemas são capazes de 
controlar a reutilização e a reorganização de peças constitutivas, eles estão 
exclusivamente posicionados para gerar um novo valor que outros players 
de mercado, seja dentro do ecossistema ou externos a ele, não podem igua-
lar. Como resultado, o patrocinador do ecossistema está em uma posição 
que gera um poder de exclusão.
Além disso, a presença extensiva de ecossistemas patrocinadores em todo 
o ecossistema significa que eles podem espalhar risco e capital em todos os 
produtos/serviços e camadas em que estão presentes, de maneiras que são 
impossíveis de igualar para empresas que não ostentam o mesmo alcance. 
Isso é verdade para a linha de produtos/serviço existente de um patrocina-
dor do ecossistema, mas também para quaisquer novos mercados nos quais 
desejam se expandir. A capacidade de disseminar o risco entre os produtos/
serviços existentes e novos torna a recombinação de ativos e a expansão em 
novos mercados muito mais fácil para os ecossistemas, em oposição a ne-
gócios mais focados.
Approach” 3, Antitrust Law Journal 513, 1995.
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 das plataformas aos ecossistemas digitais 75
Por fim, as condições de complexidade de mercado criadas pelos ecos-
sistemas, e o alto grau de interconexão entre os produtos/serviços e mercados 
em que estão presentes, significam que eles podem ser capazes de mudar o lo-
cus das práticas empresariais que lhes concedem poder, facilitando, assim, a 
criação e o exercício do poder. A razão pela qual eles gostariam de fazer isso 
é para escapar da atividade de execução, que eles alcançariam mudando con-
duta potencialmente problemática em partes do ecossistema onde eles (ainda) 
não parecem dominantes. Por exemplo, um ecossistema que deseja manter 
um ponto de controle de gargalo no ecossistema pode mudar o lócus desse 
ponto, sem, no entanto, perder o controle sobre o ecossistema. Esse pode ser 
o caso de assistentes de voz digitais que estão começando a funcionar como 
um ponto de controle semelhante às plataformas de distribuição de aplica-
tivos. Estes últimos estão cercados com atividade de execução, enquanto os 
primeiros não são.
4.3. Medição do poder de mercado nos ecossistemas
Na medida em que novas fontes e tipos de poder de mercado são definidos 
nos ecossistemas, o próximo desafio é definir as medidas adequadas. As 
fontes e os tipos de poder de mercado nos dizem onde devemos olhar para 
o poder, mas eles não nos dizem quanto dele os patrocinadores do ecossis-
tema realmente possuem.
A medição do poder de mercado nãotem sido, tradicionalmente, um 
exercício preciso, talvez com exceção do proxy das ações de mercado. As 
ações de mercado são quantificáveis e têm servido por muitos anos como um 
proxy-chave para o poder de mercado. Mas outras fontes comuns de poder 
de mercado, como barreiras de entrada, efeitos de rede, lealdade/reputação 
da marca etc. são mais difíceis de quantificar. Como resultado, a medição 
do poder de mercado é uma confluência de fatores quantitativos e qualita-
tivos que são ponderados caso a caso.
Esta subseção fornece uma visão geral das medidas potenciais e proxies 
para as fontes e tipos de poder de mercado definidos anteriormente. Não 
explica metodologias exatas, nem é uma lista exaustiva de medidas dispo-
níveis. O objetivo é demonstrar a praticidade e a viabilidade de contar com 
novas fontes e tipos de poder de mercado nos ecossistemas. Se as fontes e 
tipos definidos fossem impossíveis de usar em uma investigação, então o 
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76 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
conceito de ecossistemas seria impraticável para análise antitruste, não im-
porta o quão teoricamente atraente.
O primeiro tipo de poder de mercado definido anteriormente foi a ca-
pacidade de moldar suas relações. Quando esse tipo de poder é baseado na 
intermediação, de tal forma que o patrocinador do ecossistema visa capturar 
uma parte maior do valor total criado, então ele pode ser medido por meio 
da betweenness centrality, ou por meio do aperto de margem. A betweenness 
centrality mede o quão central um ator (nó) está em um sistema baseado 
na medida em que eles intermediários como o caminho mais curto entre o 
resto dos atores no sistema (Lianos e Carballa Smichowski, 2021). Quanto 
mais um ator é passado para conectar outros atores no sistema, mais cen-
tral eles se tornam e, portanto, mais poder eles têm para moldar as relações 
entre outros atores. A betweenness centrality é uma forma indireta de me-
dir o poder de mercado no sentido de que o que ele mede é a capacidade de 
se tornar um gargalo no ecossistema. Uma maneira mais direta de medir o 
poder de mercado quando baseada na intermediação é calcular o aperto de 
margem que o suposto ator dominante impõe aos atores com os seus conta-
tos. O aperto de margem aqui não é o tipo de crime de competição. A ofensa 
ao aperto de margem visa excluir concorrentes que dependem da empresa 
dominante, enquanto o aperto de margem como método de cálculo do po-
der relacional de um ator sobre outro demonstra a capacidade do primeiro 
de espremer as margens de lucro deste último — uma indicação de poder de 
mercado. Na verdade, o ator dominante não quer que o parceiro espremido 
saia do mercado, pois o ecossistema perderia um complemento; em vez dis-
so, o que eles querem é que o complemento permaneça, mas capture menos 
do valor gerado. O aperto de margem é uma medida difícil de obter porque 
requer informações detalhadas de custos e potencialmente estimativas de 
margens hipotéticas de concorrentes (Oxera, 2009), mas as metodologias 
não são estrangeiras às autoridades de concorrência.
Quando o poder de moldar as relações não é expresso como interme-
diação, mas como orquestração, pode-se obter indicações qualitativas de 
poder de mercado olhando para o processo de formação dos termos e pa-
drões técnicos do negócio no ecossistema. Em indústrias que consistem em 
uma infinidade de participantes em diversos níveis da cadeia de valor e em 
diversos mercados, cada um vindo de um lugar diferente e cada um repre-
sentando interesses diferentes, seria de esperar que as relações comerciais e 
as normas técnicas sejam o resultado de compromisso ou consenso (Besen 
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 das plataformas aos ecossistemas digitais 77
e Saloner, 1989). De Nardis (2014) afirma influentemente que “as normas 
técnicas não só proporcionam interoperabilidade tecnológica, mas também 
produzem externalidades políticas e econômicas significativas. Batalhas sobre 
standards são às vezes conflitos de mercado entre empresas de tecnologia… 
[S]tandards também são políticos, tomando decisões sobre liberdades civis 
individuais online”. Olhando para o processo de definição padrão e forma-
ção de relacionamento comercial pode-se fazer avaliações qualitativas de 
quem coagir quem e em que medida. Por exemplo, o padrão AMP (Accele-
rated Mobile Pages, páginas móveis aceleradas), do Google, ajuda a fornecer 
páginas móveis mais rapidamente, mas também vem com várias restrições e 
condições que promovem o negócio de publicidade do Google e podem su-
bestimar as páginas de resultados de pesquisa que não o usam (Scott, 2018). 
Observando o processo de adoção do AMP pode-se fazer uma avaliação se 
o Google o impõe ou é adotado voluntariamente e organicamente, e a partir 
daí usá-lo como evidência de poder de mercado na forma de orquestração 
da dinâmica do ecossistema do Google.
O segundo tipo de poder de mercado definido anteriormente foi a ca-
pacidade de alavancar a complexidade e a flexibilidade no mercado. Os 
ecossistemas são sistemas multiprodutos e multiatores, que exibem inter-
dependências intrincadas, e patrocinadores do ecossistema podem estar 
presentes em muitos níveis e partes desse sistema. Isso significa que, se um 
concorrente quisesse oferecer uma experiência substituível, precisaria entrar 
na maioria ou em todas as camadas em que o patrocinador do ecossistema 
está presente e também ser capaz de navegar na complexidade de reunir os 
diferentes elementos. Se isso acontecesse, criaria pressão competitiva para 
o ecossistema desafiado. Para medir a pressão, seria preciso então calcular a 
demanda residual agregada do ecossistema desafiado tomado como um todo 
(Hovenkamp, 2021). Ou seja, em vez de focar um único produto ou serviço, 
calcularia a demanda residual para todo o ecossistema, e a elasticidade me-
nor implicaria maior poder de mercado. Essa metodologia vê o ecossistema 
como uma agregação de produtos e serviços que compartilham um destino 
comum no sentido de que a demanda residual do ecossistema é uma expres-
são da resposta agregada dos consumidores a mudanças competitivas em 
qualquer um dos produtos e serviços que estão incluídos no ecossistema. Se 
um patrocinador do ecossistema aumentasse o preço ou reduzisse a qualida-
de ou mudasse aspectos competitivos de um produto ou serviço dentro do 
ecossistema, não se olharia para a elasticidade da demanda individual por 
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78 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
esse produto ou serviço, mas para todo o ecossistema. Obviamente, a lógi-
ca aqui é que os produtos e serviços não podem ser tratados isoladamente, 
devido às suas interdependências, o que significa que a escolha dos consu-
midores de adotar um produto ou serviço em um ecossistema é um reflexo 
não apenas das características do produto ou serviço separadamente, mas 
também de como ele se encaixa no resto do ecossistema. A interdependên-
cia, provavelmente, afetará a elasticidade da demanda por outros produtos 
e serviços também, e é por isso que a demanda agregada em todo o ecossis-
tema pode ser mais instrutiva.
Além disso, como mencionado, como os patrocinadores do ecossistema 
estão frequentemente presentes em vários segmentos dele, eles têm maior 
flexibilidade na disseminação de risco e capital entre esses segmentos, e tam-
bém suportando o risco de entrar em novos segmentos também. Como o 
risco é um dos principais determinantes da conduta empresarial, enfrentar 
riscos reduzidos pode permitir que um patrocinador do ecossistema descon-
sidere pressões competitivas externas. Para medir esse aspecto do poder de 
mercado, pode-se contar com uma avaliação qualitativa da distribuição de 
riscos. Isso é inerentemente impreciso, mas pode ser informativo. A avalia-
ção das próprias empresas sobre fatoresde risco (tanto aumentando quanto 
aliviando o risco) em seus formulários de 10K, relatórios anuais de reunião 
de acionistas e relatórios de gestão pode ser o primeiro lugar a se analisar.
Considerações finais
À medida que os ecossistemas começaram a migrar da literatura de gestão de 
empresa e economia para o campo jurídico, a questão inicial tem sido se eles 
são materialmente diferentes dos conceitos existentes de direito antitruste, 
e particularmente de plataformas e mercados conectados (como mercados 
de pós-venda). Se todos os ecossistemas fossem simplesmente uma maneira 
extravagante de descrever plataformas complexas e mercados conectados, 
então o novo conceito só poderia servir para complicar as coisas, em vez de 
realmente ajudar a descrever novos fenômenos com a análise distinta neces-
sária. Ao apresentar novas formas de definir ecossistemas e avaliar o poder 
de mercado dentro, este capítulo mostrou que os ecossistemas são analitica-
mente diferentes de outras construções econômicas. A adoção da análise do 
ecossistema produz resultados diferentes da análise de plataforma ou merca-
dos conectados, e pode de fato ser mais apropriado seguir quando a análise 
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 das plataformas aos ecossistemas digitais 79
do ecossistema, conforme definimos, de fato indica dinâmica de poder que 
análises mais convencionais perderiam. É bem reconhecido que vários as-
pectos da análise do ecossistema ou sua definição ainda estão em fluxo e 
provavelmente não emprestam os mesmos padrões rigorosos que as ferra-
mentas analíticas convencionais. Mas, ao mesmo tempo, é evidente que as 
autoridades de concorrência estão ansiosas para examinar certos segmentos 
da atividade econômica sob a nova nomenclatura dos ecossistemas, incluin-
do a Internet das Coisas (IoT) e os sistemas de aplicativos e telefones móveis. 
Isso é uma indicação de que o conceito de ecossistemas está amadurecendo 
e se achando praticamente útil (European Commission, 2022; CMA, 2021). 
A esperança deste capítulo é a de que a estrutura até aqui desenvolvida pos-
sa ajudar nessa direção.
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3
a interseção das políticas 
de concorrência, consumo e 
proteção de dados no contexto 
de ecossistemas digitais
Juliana Oliveira Domingues
Eduardo Molan Gaban
Isabella Dorigheto Miranda
introdução
As relações entre política da concorrência e política consumerista são ine-
gáveis. A interação entre o ambiente competitivo empresarial e as relações 
de consumo é natural da sociedade contemporânea, na qual os usuários 
finais dos produtos e serviços ofertados pelas empresas são vistos como 
consumidores. Assim, a eles são cabíveis, de acordo com o ordenamento 
jurídico brasileiro, uma série de direitos específicos, consubstanciados no 
Código de Defesa do Consumidor e na Lei no 12.529/2011 (Lei Antitruste 
Brasileira).
Apesar da existência desse diploma e da previsão da livre concorrência 
e da defesa do consumidor como princípios que regem a atividade econô-
mica do Estado, conforme o artigo 170 da CF/881, por vezes a interseção 
entre direito concorrencial e a experiência do consumidor parece distan-
te em determinadas abordagens. Tal ótica desconsidera que as relações de 
consumo dependem da ação dos consumidores junto aos fornecedores e a 
busca pela geração de valor.
1 Ver DOMINGUES, J. O.; GABAN, E. M. “Livre Iniciativa, Livre Concorrência e Democracia: 
Valores Constitucionais Indissociáveis do Direito Antitruste?”, in RODAS, J. G. (org.) A Ordem 
Econômica Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019.
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84 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
Hoje, a conexão entre a aplicação do direito antitruste e a defesa dos consu-
midores assume contornos diferenciados. Deve-se considerar as especificidades 
da tendência global de digitalização e do crescente número de ecossistemas 
digitais2, para os quais a coleta e o processamento de dados funcionam tanto 
como matéria-prima para construção quanto podem representar consolida-
ção de poder de mercado. Dessa forma, a demanda por dados tem aumentado, 
tanto no setor público quanto privado.
Em especial, ressalta-se o papel da captura e do tratamento dos dados 
de seus usuários como ativos empresariais de grande relevância3, que po-
dem representar o sucesso ou a falha de negócios no ambiente digital. Para 
os ecossistemas de plataforma digital (EPDs)4, o papel informacional do dado 
dos usuários tem fundamental relevância no momento de sua criação e per-
manece ao longo de seu funcionamento, em razão da alimentação constante 
necessária ao funcionamento regular dos serviços e produtos ofertados. Des-
sa forma, a utilização de tais ativos torna-se ponto focal para a aplicação do 
direito de forma multidisciplinar5. Adicionalmente ao tratamento conferi-
do aos dados dos usuários, o direito deve também ocupar-se de tutelar as 
2 Neste artigo, utilizaremos o termo ecossistemas digitais nos termos e com a abrangência de 
Petit e Teece, 2021.
3 Neste sentido, BAGNOLI, V. “A definição do mercado relevante, verticalização e abuso de 
posição dominante na era do big data”, in DOMINGUES, GABAN, MIELE, SILVA (orgs.). 
Direito Antitruste 4.0 — Fronteiras entre Concorrência e Inovação. São Paulo: Singular; 
2019.
4 Partindo da noção de ecossistema digital, passaremos a utilizar o conceito sugerido na in-
trodução desta obra por Zingales e Azevedo, para os quais um ecossistema de plataforma 
digital, ou EPD, compreende um detentor de plataforma digital que implementa ferramentas 
para facilitar a criação de valor pela interação da plataforma e um ecossistema de consu-
midores e agentes conexos, facilitando as transações entre eles. In BÖHM, M.; HEIN, A.; 
KRCMAR, H.; RIASANOW, T.; SCHREIECK, M.; SETZKE, D. S.; WIESCHE, M. “Digital 
Platform Ecosystems”, Electronic Markets, vol. 30, 2020. Disponível em: https://doi.
org/10.1007/s12525-019-00377-4. Acesso em: jan. 2022. Conforme explicado na intro-
dução desta obra, “podem ser definidos como um conjunto de produtos e serviços que são 
interoperáveis dentro de uma plataforma, fornecidos dentro de limites contratuais e técnicos 
estabelecidos, e que aumentam, de alguma forma, o valor oferecido pela plataforma aos 
seus usuários”. In AZEVEDO; P.; ZINGALES, N., 2022. 
5 Importante destacar que o conceito de ecossistemas digitais é já reconhecido pela Comissão 
Europeia, bem como seus impactos concorrenciais. No caso do Google Android, a Comissão 
considerou a integração da plataforma do Google com outros aplicativos; e a necessária inter-
conexão entre eles. In BERCITO, D. “União Europeia multa Google em R$19 bi por prática an-
ticompetitiva com Android”, Folha de São Paulo, 18 jul. 2018. Disponível em: https://www1.
folha.uol.com.br/mercado/2018/07/uniao-europeia-multa-google-em-r-19-bi-por-pratica-anti-
competitiva-com-android.shtml. Acesso em: dez. 2021.
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 A interseção das políticas de concorrência,consumo e proteção de dados... 85
formas e os métodos de disputa pela atenção dos consumidores6, já que a 
atenção dos usuários se apresenta como o bem escasso objeto da agressiva 
concorrência dos mais variados tipos de EPDs.
Atualmente, a atenção se apresenta como um dos principais fatores de 
competição (ou competition drivers)7, sendo de especial importância a tutela 
das formas e dos métodos de como essa atenção é alcançada, retida, maxi-
mizada e explorada pelos EPDs. Especificamente, importa dar um enfoque 
especial às arquiteturas algorítmicas subjacentes aos EPDs, bem como à 
informação adequada por elas disponibilizadas aos usuários permitindo-
-lhes realizar escolhas conscientes, notadamente, os mais vulneráveis. Pelo 
tratamento de dados, os EPDs conseguem fornecer espaços cada vez mais 
personalizados, que geram um maior tempo de exposição pelos usuários; su-
jeitos, no ambiente virtual, aos conteúdos que os EPDs lhes disponibilizam.
Os EPDs trabalham para reter cada vez mais a atenção dos consumido-
res. A atenção do consumidor é um bem escasso e não duplicável. Os EPDs 
nem sempre trabalham com a devida transparência no tocante aos tipos de 
dados que coleta de seus usuários e muito menos sobre como e para qual fi-
nalidade os utilizam. Em paralelo, os EPDs experimentam ganhos de escala 
e efeitos de rede incontestáveis à medida que logram ampliar o rol de seus 
usuários. Como resultado, o acesso aos EPDs adquire propriedades de bem 
escasso. Isso, sem dúvida, impacta a concorrência em, no mínimo, duas di-
mensões: intraecossistemas e interecossistemas.
A relação entre os EPDs e os usuários consumidores está afeita ao direi-
to do consumidor e à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Por vezes, o 
próprio consumidor não possui a compreensão plena de quais dados estão 
sendo capturados e como eles refletem em sua experiência dentro da EPD.8 
6 Para estudo econométrico sobre o tema, ver BRUGGEN, G. van; GELPER, S.; LANS, R. van 
der. “Competition for Attention in Online Social Networks: implications for seeding strate-
gies”, Management Science. vol. 67, n. 2, fev. 2021. Disponível em: https://pubsonline. 
informs.org/doi/abs/10.1287/mnsc.2019.3564. Acesso em: nov. 2021. 
7 Nesse sentido, ver NEWMAN, J. Antitrust in Attention Markets, 2020; Regulating Attention 
Markets, 2019.
8 Nesse sentido, a Lei Geral de Proteção de Dados “estabelece que, se o tratamento dos dados 
pessoais for condição para o fornecimento de produto ou de serviço ou para o exercício de 
direito, o titular será informado com destaque sobre esse fato e sobre os meios pelos quais 
poderá exercer seus direitos enumerados no art. 18 da lei”. In TEFFÉ, C. S. de; TEPEDINO, 
G. “O Consentimento na Circulação de Dados Pessoais”, Revista Brasileira de Direito 
Civil, vol. 25, jul.-set. 2020. Disponível em: https://rbdcivil.ibdcivil.org.br. Acesso em: jan. 
2022. p. 94. 
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86 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
A relação dos EPDs com os usuários não consumidores (isto é, ofertantes 
ou agentes econômicos que de qualquer forma dependam do ecossistema) 
está afeita ao direito da concorrência.
É justamente na relação entre os EPDs e os consumidores (ou usuários 
— em uma acepção amplíssima, que inclui desde civilmente incapazes, ci-
vilmente relativamente capazes aos civilmente capazes) que observamos a 
maior interface entre as diferentes disciplinas jurídicas existentes, como o 
direito do consumidor, o direito antitruste e as questões atinentes à privaci-
dade e proteção dos dados.
1. a interface entre o antitruste e a defesa do consumidor
O movimento antitrust surgiu como reação ao abuso de poder econômi-
co ocorrido no final dos anos 1890, nos Estados Unidos9. Seu grande marco 
existencial foi a publicação do Sherman Act10, norma ainda vigente, que busca 
abordar as preocupações concorrenciais nos Estados Unidos, dentre as quais, 
o abuso de poder econômico, que pode ser definido como o abuso da liberda-
de de iniciativa por parte daquele dotado de poder em determinado mercado.
O direito pátrio incorporou o movimento antitrust. A Constituição de 
1988 (art.170 e ss. e a Lei no 12.529/2011), chamada de Constituição eco-
nômica, passou a ser a plataforma jurídico-positiva de expressão que 
pavimentou o fortalecimento do antitrust no ordenamento jurídico brasileiro.11 
Assim, as relações empresariais no Brasil, bem como os impactos da atua-
ção dos agentes econômicos, devem ser observadas com base em referidos 
diplomas, que elegem como um de seus objetivos o combate aos abusos do 
poder econômico para instrumentalizar os princípios constitucionais da 
livre-iniciativa, da livre concorrência e da defesa do consumidor12. Assim, “são 
impostas regras de conduta a serem observadas pelos agentes econômicos, 
9 Veja-se: DOMINGUES, J. O.; GABAN, E. M. “Direito Antitruste e Poder Econômico: o movi-
mento populista e o ‘neo-brandeisiano’”, in Revista Justiça do Direito, vol. 33, no 3, 2019, 
Universidade de Passo Fundo. 
10 DOMINGUES, J. O.; GABAN, E. Direito Antitruste, 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
11 Para mais informações sobre a história do antitruste e sua relação com os princípios da 
Constituição de 1988, ver GABAN, E. M.; DOMINGUES, J. O. Direito Antitruste, 4. ed. São 
Paulo: Saraiva, 2016.
12 DOMINGUES, J. O.; GABAN, E. M. “Direito Antitruste e Poder Econômico: o movimento 
populista e o ‘neo-brandeisiano’”, in Revista Justiça do Direito, vol. 33, no 3, 2019, Uni-
versidade de Passo Fundo, pp. 223–224.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 86 16/11/2022 10:55:29
 A interseção das políticas de concorrência, consumo e proteção de dados... 87
de sorte a disciplinar suas práticas no mercado”13. As normas antitruste, no 
Brasil, representam o conjunto normativo infraconstitucional apto a viabi-
lizar a concretização dos princípios constitucionais da ordem econômica.14
A Defesa do Consumidor, por sua vez, também possui uma afinidade 
em sua origem com o movimento antitrust. Isso porque também decorreu 
da necessidade de limitar o abuso por parte dos ofertantes em prol da defe-
sa dos direitos dos mais vulneráveis ou hipossuficientes: os consumidores. 
Como instrumento didático no tocante às finalidades e considerando os 
bens jurídicos protegidos pelas respectivas legislações, costumamos afirmar 
que o direito concorrencial (ou direito antitruste) busca defender o consu-
midor “no atacado”, ou seja, em ambiente macro, ao passo que o direito do 
consumidor busca defender o consumidor “no varejo”, na esfera individual, 
em que pese o papel da Senacon ser diferente dos entes que compõem o 
Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC), já que se encarrega 
da coordenação da política do SNDC e, portanto, ultrapassa a esfera indi-
vidual do consumidor15.
Frequentemente, as condutas empresariais assumem reflexos nas re-
lações de consumo. Assim, não apenas a defesa da concorrência se liga ao 
ambiente consumerista. Também a defesa dos consumidores passa a depen-
der do enfrentamento de práticas anticompetitivas16. Nesse sentido, Pfeiffer 
vê o direito da concorrência e o direito do consumidor como intimamente 
ligados. Para o autor, a defesa da concorrência estaria conectada, necessaria-
mente, ao bem-estar do consumidor, uma vez que é “o interesse específico 
dos destinatários finais econômicos do produto ou serviço que compõe o 
mercado relevante”, que representaria um objetivo central na política de 
13 FORGIONI, P. A. Os Fundamentos do Antitruste, 6. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tri-
bunais, 2013. p. 79. 
14 Nesse sentido, ver GABAN, E. M.; DOMINGUES, J. O. Direito Antitruste, 4. ed. São Paulo: 
Saraiva, 2016.
15 Para saber mais sobre o tema: O Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC) está 
regulamentado pelo Decreto Presidencial no 2.181, de 20 de março de 1997, e congrega 
Procons, Ministério Público, Defensoria Pública, Delegacias de Defesa do Consumidor, Jui-zados Especiais Cíveis e Organizações Civis de defesa do consumidor, que atuam de forma 
articulada e integrada com a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon). Disponível em: 
https://www.novo.justica.gov.br/seus-direitos-2/consumidor/a-defesa-do-consumidor-no-bra-
sil/anexos/sistema-nacional-de-defesa-do-consumidor-sndc. Acesso em: 16 nov. 2021.
16 TAUFICK, R. D. “Introdução ao Direito da Concorrência”, Comunidade Virtual do Programa 
Nacional de Promoção da Concorrência. Secretaria de Acompanhamento Econômico, dez. 
2014. p. 25.
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88 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
defesa da concorrência e, portanto, deveria vincular as autoridades respon-
sáveis pela sua execução17.
Dessa forma, é necessário compreender que a atuação da autoridade 
antitruste — no Brasil, o Cade —, tanto no aspecto preventivo quanto re-
pressivo, precisa considerar também o impacto aos consumidores; de forma 
que se advoga, ao longo deste capítulo, por atuação conjunta com a Secreta-
ria Nacional do Consumidor (Senacon).
A interação entre concorrência e consumo é parte natural do sistema 
capitalista. Os usuários finais dos produtos e serviços ofertados pelas em-
presas são aqueles que efetivamente se beneficiam ou são prejudicados por 
estratégias comerciais. Se há um aumento de preços ou uma diminuição de 
produtos; se o mercado experimenta inovações relevantes; se há aumento 
de impostos e custos envolvidos nas cadeias de produção; tudo reflete, ao 
final, na situação do consumidor e em como ele interage no mercado com 
seus diferentes atores.
Essa conexão assume conformações também no mundo jurídico. Es-
pecialmente com relação à legislação antitruste, hoje tem-se sedimentado 
que ao menos um de seus objetivos é voltado para o bem-estar do consu-
midor, ou seja, para que as condutas empresariais sejam analisadas também 
por tal ótica.
Para Oliveira, a política antitruste visa proteger o ambiente econômico com-
petitivo, evitar formação de poder de mercado e de ineficiências e aumentar o 
bem-estar — tanto geral quanto do consumidor18. Forgioni inclusive destaca que, 
ao contrário de outras jurisdições, a legislação antitruste nacional nasceu por meio 
do Decreto-lei 869/1938 como repressão ao abuso do poder econômico e “tendo 
como interesse constitucionalmente protegido o interesse da população, do 
consumidor”19.
Atualmente, com a ampliação das oportunidades de escolha, passou 
a ter maior peso o comportamento dos consumidores. No ambiente dos 
17 PFEIFFER, R. A. C. Defesa da Concorrência e Bem-Estar do Consumidor. Tese (Doutorado 
em Direito) — Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, 2010. p. 5. 
18 OLIVEIRA, G. A. S. “Economic Globalization and Competition: institutional responses”, 
Revista do IBRAC, vol. 23, n. 2, 2017, pp. 259–277. Disponível em: https://ibrac.org.br/
UPLOADS/PDF/RevistadoIBRAC/Revista_23_n%C2%BA_2.pdf. Acesso em: mai, 2021. 
p. 268. 
19 FORGIONI, P. A. Os Fundamentos do Antitruste, 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. 
p. 100. 
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 A interseção das políticas de concorrência, consumo e proteção de dados... 89
EPDs, sobretudo, em que usualmente há uma miríade de alternativas para 
o usuário em termos de produtos e serviços, negligenciar comportamen-
to de grupos específicos de consumidores pode implicar a exclusão de um 
dado ofertante do ecossistema.
No mesmo sentido, porém abordando outra perspectiva, a ausência de 
informação adequada para o consumidor sobre um determinado produto, 
serviço ou funcionalidade de um EPDs (notadamente a “preço zero”20) pode 
maximizar sua experiência de consumo por intermédio de um oportunismo 
sobre sua fragilidade psicossocial, criando-lhe inclusive dependência. Nesse 
sentido, é bem ilustrativo o documentário intitulado O dilema das redes21, que 
descreve estratégias de negócios utilizadas por grandes players do cenário di-
gital para ampliar a retenção dos usuários.
Assim, a atenção do consumidor pode ser retida por intermédio de abu-
sivos subterfúgios que exploram suas fragilidades psicossociais. Ao fazê-lo, os 
EPDs, em paralelo, capturam virtualmente todos os seus dados relacionados 
à sua experiência existencial e social. Nesse contexto, não é despropositada a 
afirmação de que o consumidor pode ser induzido a consumir produtos, ser-
viços ou — principalmente — funcionalidades que não o faria naturalmente, 
ou ao menos titubearia em fazê-lo se adequadamente informado pelo ofer-
tante (ou pelo EPD) das reais consequências decorrentes dessa experiência 
de consumo. Essa assertiva é ainda mais robusta se aplicada aos consumi-
dores vulneráveis, quais sejam, os incapazes ou relativamente capazes (isto 
é, crianças, adolescentes, idosos, portadores de transtornos mentais e afins).
Tome-se, por exemplo, O estudo recente conduzido por Schacter22 
sobre os impactos das mídias e tecnologia na memória humana, principal-
mente com relação à suscetibilidade e aos lapsos de atenção que levam ao 
20 Termo utilizado para se referir ao oferecimento de produtos e serviços gratuitos, especial-
mente em estratégias de negócios vinculadas ao ambiente da Economia Digital. Santos 
destacada que as “estratégias adotadas pelas empresas nos mercados digitais remetem-se 
diretamente ao comportamento que a firma exerce sobre o consumidor nas plataformas di-
gitais”. In SANTOS, N. C. dos. Perspectivas Para a Análise Antitruste Frente a Economia 
de Preço Zero: um ensaio a partir da Economia Comportamental. Monografia (Bacharelado 
em Ciências Econômicas) — Escola Paulista de Política, Economia e Negócios, Universidade 
Federal de São Paulo, 2021. p. 11. 
21 ORLOWSKI, J. O Dilema das Redes. Documentário Netflix. 2020. Disponível em: https://
www.netflix.com/br/title/81254224. Acesso em: out. 2021.
22 SCHACTER, D. L. “Media, technology, and the sins of memory”, Memory, Mind & Media, 
2022. 
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90 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
esquecimento. O autor identificou que fotos manipuladas ou enganosas são 
associadas a memórias falsas e fake news, sendo que o uso de tais artifícios 
nas redes sociais é bastante divulgado.
Seja como for, o aumento do número de usuários (no sentido lato, isto é, 
consumidores, ofertantes, agências de marketing etc.) de um EPD implica au-
mento de seu poder econômico e amplia os dados a que tal agente tem acesso. 
Bem assim ocorre com parte das empresas que ali orbitam e prosperam. Essa 
prosperidade de parte das firmas em vezes ocorre em detrimento de outras 
firmas que sobrevivem no mesmo ecossistema, já que nem todo o processo 
competitivo intraecossistema se passa no esquema jogo de soma zero, no qual 
o ganho de uma empresa representaria a perda de outra empresa, ou decorre 
de isonomia de condições ou de oportunidades.
Além disso, quanto maior e mais relevante se torna um EPD, maiores 
os incentivos para atuar de maneira abusiva tanto dentro quanto fora de seu 
espectro. Isto é, na perspectiva interecossistêmica, passa a contar com incen-
tivos para criar barreiras artificiais à portabilidade dos dados de seus usuários 
para outros EPDs, limitando assim o surgimento e o crescimento de EPDs 
rivais. Nesse cenário, passa a ter incentivos para desenvolver produtos, ser-
viços e funcionalidades concorrentes com as desenvolvidas e ofertadas por 
seus usuários (nesse caso, firmas ofertantes). E mais, a depender da arqui-
tetura algorítmica adotada ou da deliberada atuação humana, é possível que 
faça uso indevido de dados sensíveis de seus usuários consumidores para 
alcançar as mais diversas formas e níveis de desempenho.23
Portanto, a aparente espiral virtuosa de um EPD pode esconder perdas 
de bem-estar (em grande maioria distintas da variável “preço”) não despre-
zíveis. Passa a ser importante, então, um olhar antitruste combinadocom a 
defesa do consumidor, com a privacidade e com a proteção de dados para 
esses fenômenos.
O direito do consumidor estabelece normas com padrões de transpa-
rência adequados às relações de consumo. Isto é, contempla determinações 
23 No mesmo sentido, os proprietários de EPDs podem impor seus serviços de publicidade di-
gital; restringir a escolha dos consumidores, evitando o acesso a produtos complementares 
em outras plataformas; e impor termos abusivos para as empresas com as quais se rela-
cionam, atuando como espaço único para a oferta de produtos e serviços. In JACOBIDES, 
M. G.; LIANOS, I. “Ecosystems and competition law in theory and practice”, Industrial and 
Corporate Change, 18 nov. 2021. Disponível em: https://academic.oup.com/icc/advance
-article/doi/10.1093/icc/dtab061/6428760?login=true. Acesso em: dez. 2021.
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 A interseção das políticas de concorrência, consumo e proteção de dados... 91
aos fornecedores para disponibilizar informações claras e precisas aos con-
sumidores com o fito de viabilizar o pleno exercício de suas capacidades de 
decisão no ato do consumo. Em outras palavras, as normas consumeristas 
afeitas à redução da assimetria de informação voltam-se a viabilizar o ple-
no exercício do consumo consciente.
O direito do consumidor, embora abrangente, não foi capaz de trazer 
a plena eficácia ao nível desejável de transparência às relações de consumo 
no ambiente digital. Isso é fato. Daí a necessidade de ser aplicado em com-
binação com a LGPD, uma vez que essa lei (e sua regulamentação infralegal) 
agregou eficácia aos comandos consumeristas no tocante à transparência nas 
relações de consumo e, em especial, à plena capacidade de consumir de for-
ma consciente por parte dos consumidores brasileiros.
O direito antitruste, à sua vez, possui comandos voltados à não dis-
criminação entre agentes econômicos nos EPDs. As conhecidas FRAND 
(condições fair, reasonable, and non discriminatory), sedimentadas pela 
jurisprudência concorrencial, acabam por compor o arsenal normativo su-
ficiente a tutelar o interesse do consumidor nos EPDs, já que, pelo lado da 
oferta, garante alternativas ao consumo. Isso, por sua vez, potencializa o ato 
de consumo consciente.
A coordenação dos temas diante da atração das competências parece 
ser salutar, ainda que possíveis remédios não possam ser efetivamente apli-
cados isoladamente, como por meio do tradicional ferramental de análise 
antitruste24. Afirma-se isso pois parte dos possíveis problemas não decorre 
do esquema lógico tradicional de autoria-intenção-resultado-nexo e, em sua 
maioria, eles estão permeados de instrumentos de inteligência artificial25. 
Tais ferramentas podem representar vantagens competitivas e modificar a 
forma como os agentes econômicos interagem em determinado mercado. 
Tome-se, por exemplo, o aprendizado de máquina, que possibilita a tomada 
de decisões autônomas por sistemas a partir do fornecimento de dados. Con-
dutas decorrentes da atuação de sistemas de inteligência artificial carecem 
24 Sobre a dificuldade da análise antitruste em cenários digitais, ver DOMINGUES, J. O.; 
DORIGHETO, I. M. “A Prova Econômica Na Análise De Atos De Concentração Em Merca-
dos de Competição Dinâmica”, Revista Brasileira de Filosofia do Direito, v. 7, n. 1, 2021. 
Disponível em: https://www.indexlaw.org/index.php/filosofiadireito/article/view/7614/pdf. 
Acesso em: nov. 2021.
25 Nesse sentido, ver GABAN, E. M.; KLEIN, V. A New Language for A.I. and The Legal Dis-
course, 2021
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92 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
do elemento “intenção”, dado que não há pessoalidade no agente artificial. 
Isso não impede, porém, que comportamentos colusivos ocorram.
No âmbito dos ecossistemas digitais, a utilização de instrumentos de 
inteligência artificial para propiciar maior personalização de anúncios, servi-
ços e do próprio espaço digital experimentado pelo consumidor é de grande 
frequência. Nesse sentido, a concentração e a coleta de dados pelas grandes 
empresas de tecnologia, estimuladas cada vez mais pelo incremento das téc-
nicas de aprendizado de máquina, podem vir a representar uma vantagem 
competitiva frente aos concorrentes26.
Especificamente sobre o uso do bem-estar, Jacobides e Lianos27 res-
saltam que, no âmbito de ecossistemas digitais, tem-se uma complexidade 
adicional a ser considerada. Como os efeitos de qualquer conduta são diver-
sos em cada lado da plataforma, qualquer forma de medida que pretendesse 
calcular o bem-estar total, deveria comparar essa variável em diferentes cate-
gorias de usuários — o que envolveria a eleição dos parâmetros de cálculo. A 
princípio, seria preciso decidir qual mercado relevante seria a unidade prin-
cipal de análise ou balancear custos e benefícios para diferentes categorias de 
consumidores em todos os mercados relevantes envolvidos no ecossistema.
Nessa linha, a ideia tradicional de equilíbrio geral28 como objetivo da 
atuação regulatória especializada torna-se insuficiente para mitigar os pro-
blemas atuais envolvendo as EPDs. As particularidades das EPDs, melhor 
26 THE ECONOMIST. “The world’s most valuable resource ir no longer oil, but data: the data 
economy demands a new approach to antitrust rules”, The Economist. Leaders, maio 2017. 
Disponível em: https://www.economist.com/leaders/2017/05/06/the-worlds-most-valuable- 
resource-is-no-longer-oil-but-data. Acesso em: ago. 2018.
27 JACOBIDES, M. G.; LIANOS, I. “Ecosystems and competition law in theory and practice”, 
Industrial and Corporate Change, 18 nov. 2021. Disponível em https://academic.oup.com/
icc/advance-article/doi/10.1093/icc/dtab061/6428760?login=true. Acesso em: dez. 2021.
28 A teoria do equilíbrio geral visa explicar o comportamento da oferta, da demanda e dos preços em 
uma economia constituída de vários mercados interagentes, buscando provar que a interação 
entre demanda e oferta resultará no equilíbrio geral. Uma das primeiras tentativas dos economis-
tas neoclássicos para estipular preços para uma economia completa foi feita por Léon Walras. 
O equilíbrio geral walrasiano refere-se à situação em que há igualdade entre oferta agregada 
e demanda agregada nos mercados de bens e de fatores. Esse equilíbrio é garantido por um 
vetor de preços responsável pela igualdade. Em seu livro Elementos da Economia Pura, Walras 
fornece uma série de modelos, cada um levando em conta um crescente número de variáveis 
componentes de uma economia real (duas mercadorias, várias mercadorias, produção, cres-
cimento, dinheiro). Assim, Walras acabou criando um programa de pesquisas que resultou na 
teoria da utilidade marginal, muito influente entre os economistas do século XX. Particularmen-
te, a pauta de Walras inclui investigações sobre quando o equilíbrio é único e estável. Ele se 
ocuparia, sobretudo, do equilíbrio mediante o mecanismo de preços.
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 A interseção das políticas de concorrência, consumo e proteção de dados... 93
explicitadas na Seção 3, reclamam das autoridades a incorporação da aná-
lise de características como a criação de efeitos de rede, a captura de dados 
e a adoção de ferramentas como as de inteligência artificial. As vocações e 
competências jurídicas limitam a atuação regulatória stand-alone a partir da 
ideia de equilíbrio geral. Para lograr maior eficácia na tutela dos interesses 
envolvidos nas EPDs, além da atuação coordenada para combinar vocações 
e competências jurídicas, a noção de equilíbrio passa a ter que lidar com 
conceitos mais variáveis do que demanda e oferta, que envolvem, nas EPDs, 
questões além do preço dos produtos e serviços ofertados.
Parece estarmos diante de uma nova espécie de falha de mercado, que 
demandará uma atuação coordenada de autoridades especializadas em busca 
da aplicação conjuntade remédios para sua efetiva mitigação. Para o direito 
concorrencial, o desafio é abordar conceitos como poder de mercado a par-
tir de outras variáveis que não preço, considerando apenas os bens finais, de 
forma a aproximar o panorama regulatório da realidade digital, no qual se 
deve apreciar a dinâmica de ecossistemas que ofereçam, simultaneamente, 
diversos produtos e envolvem múltiplos atores29.
2. Direito antitruste e proteção de dados
Como é assente, os consumidores são os destinatários finais da tutela antitruste. 
A captura de seus dados pelos agentes econômicos faz com que eles assumam, 
ainda que de forma inconsciente, um papel central na atuação empresarial 
em ambiente digital. Os modelos de negócios dos EPDs envolvem, necessa-
riamente, a captura e o tratamento de dados de seus usuários. Veja-se, por 
exemplo, que as redes sociais passam a direcionar o conteúdo apresentado 
conforme as preferências de cada usuário — o que é possível apenas após 
compreensão pelos algoritmos de quais são os conteúdos mais acessados 
por determinada pessoa natural.
Para que um dado tenha relevância mercantil, é necessário que ele seja 
tratado. Isso significa dizer que, apenas coletado em uma base de dados, não 
há valor sem a aferição das tendências que ele representa. Ao final, são tais 
29 JACOBIDES, M. G.; LIANOS, I. “Ecosystems and competition law in theory and practice”, 
Industrial and Corporate Change, 18 nov. 2021. Disponível em: https://academic.oup.com/
icc/advance-article/doi/10.1093/icc/dtab061/6428760?login=true. Acesso em: dez. 2021. 
Veja-se também: DOMINGUES; J. O.; SILVA, B. M. “Fake news: um desafio ao antitruste?”, 
Revista de Defesa da Concorrência, vol. 6, Brasília, 2018. 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 93 16/11/2022 10:55:29
94 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
inferências que possibilitam que os agentes econômicos moldem seus com-
portamentos para melhor personalizar seus produtos e serviços e, ao final, 
obter mais lucro.
Nessa linha, empresas que possuem maior quantidade de dados e con-
seguem tratá-los para adequação a seus objetivos empresariais passam a 
deter verdadeiro ativo empresarial. Como regra geral, fornecedores com 
mais informações de seus consumidores podem aumentar sua capacidade 
de vendas se adequando melhor às expectativas dos usuários e/ou adotan-
do práticas que captem sua atenção de forma mais eficiente e duradoura. No 
mundo digital, no qual a apreensão de dados assume escala de maior poten-
cial, quanto maior a coleta de dados pessoais, melhores serão os resultados 
e maior pode ser o poder econômico resultante30.
Não se deve esquecer, porém, que os dados utilizados são provenien-
tes de usuários específicos — estes, enquanto consumidores dos serviços 
dos EPDs, nem sempre estão cientes de que existe uma troca entre o uso 
dos serviços digitais e o fornecimento de dados, que posteriormente serão 
tratados para maximizar os objetivos do EPD. A captura e o tratamento 
devem, portanto, ser regulados e se relacionarem diretamente com a noção 
de proteção do elo mais vulnerável da cadeia consumerista. Ao final, tan-
to direito da concorrência quanto proteção de dados pessoais convergem 
para a promoção do bem-estar do indivíduo e se relacionam com prin-
cípios constitucionais: enquanto o direito da concorrência liga-se com a 
livre-iniciativa; a proteção de dados está conectada ao direito à privacidade.
Nesse sentido, a relação entre concorrência e proteção de dados pos-
sibilita a inter-relação entre instituições estatais específicas, que passam a 
cooperar para abranger as novas nuances dos mercados digitais31. No Brasil, 
30 DOMINGUES, J. O.; MIRANDA, I. D.; SILVA, B. F. M. e. “Compliance de Dados no Setor 
de Publicidade Digital: em busca das melhores práticas”, in CUEVA, R. V. B.; FRAZÃO, A. 
Compliance e Políticas de Proteção de Dados. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021, 
p. 1.037.
31 Por exemplo, na Alemanha tanto a Autoridade de Controle Federal para Proteção de Da-
dos e Liberdade de Informação — Bundesbeauftragte für den Datenschutz und die Infor-
mationsfreiheit (BfDI) quanto o Bundeskartellamt, instituição federal alemã de defesa da 
concorrência e proteção do consumido, atuam em resoluções conjuntas demonstrando a 
relação entre proteção de dados e concorrência, com impactos em reformas legislativas rele-
vantes no direito concorrencial alemão. In RAFFOUL, J. “Benchmarking Internacional sobre 
as Instituições de Defesa da Concorrência e de Proteção de Dados”, Cade. Documento de 
Trabalho no 002/2021. Brasília: Departamento de Estudos Econômicos, 2021. Disponível 
em: https://cdn.cade.gov.br/Portal/centrais-de-conteudo/publicacoes/estudos-economicos/
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 94 16/11/2022 10:55:29
 A interseção das políticas de concorrência, consumo e proteção de dados... 95
a Lei Geral de Proteção de Dados é o diploma que se presta a regular de for-
ma específica a matéria. Como objetivo central, pode-se definir a garantia do 
fluxo de dados com respeito aos direitos dos titulares, instrumentalizando 
os conceitos de autodeterminação sobre o uso32. Assim, voltar-se-ia à esfe-
ra do direito individual, sem voltar-se necessariamente para a regulação do 
mercado e dos agentes econômicos que utilizam os dados de seus usuários.
Destaca-se que a relação entre concorrência e proteção de dados as-
sume facetas variadas; e pode atingir áreas não tão óbvias a princípio, 
tais como a análise de atos de concentração, a aplicação de remédios 
pela autoridade antitruste33, além, é claro, do combate a condutas anti-
competitivas. Os impactos que as condutas empresariais de tratamento e 
utilização de dados podem ter envolve, dessa forma, situações complexas 
que requerem a atenção redobrada das autoridades públicas.
A privacidade está relacionada à qualidade do dado, já que a aquiescên-
cia do titular é exigida para a coleta e tratamento dos dados ante a vigência 
da LGPD e de ter sido esse bem jurídico alçado à categoria de direito cons-
titucional fundamental com a promulgação da Emenda Constitucional no 
115/2022. Como já explorado neste capítulo, dados pessoais e a atenção do 
usuário são fatores de competição no ambiente digital, possuindo, em vezes, 
importância superior à variável preço na concorrência. Dados e atenção são 
bens escassos, logo, qualquer alteração artificial em sua obtenção, seu trata-
mento e seu regular fluxo (ou portabilidade) pode atrair a incidência da Lei 
Antitruste. Sendo assim, a proteção de dados e a privacidade dos usuários 
devem ser considerados como fatores essenciais na análise do mercado en-
volvido na análise concorrencial, já que, na economia digital, as empresas 
competem para adquirir e tratar dados pessoais dos usuários34.
documentos-de-trabalho/2021/Documento%2 0de %20Trabalho%20-%20Benchmarking
-internacional-Defesa-da-Concorrecia-e-Proteacao-de-dados.pdf. Acesso em: jan. 2022. 
32 MARIOTTO, C.; NUNES, S. L. Economia digital, proteção de dados e concorrência. Dis-
ponível em: https://www.levysalomao.com.br/publicacoes/artigo/economia-digital-protecao-
de-dados-e-concorrencia. Acesso em: jan. 2022. 
33 DOUGLAS, E. M. Digital “Crossroads: the intersection of competition law and data privacy. 
Report to the Global”, Privacy Assembly Digital Citizen and Consumer Working Group, jul. 
2021. Disponível em: https://edps.europa.eu/system/files/2021-10/1.3h-version-4.0-digi-
tal-citizen-and-consumer-working-group-adopted_en.pdf. Acesso em: jan. 2022. p. 1. 
34 COSTA-CABRAL, F.; LYNSKEY, O. “Family Ties: the intersection between data protection 
and competition in EU Law”, Common Market Law Review, vol. 54. n. 1, 2017. Disponível 
em: https://core.ac.uk/download/pdf/77615074.pdf. Acesso em: jan. 2022. 
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96 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
3. Particularidades dos ecossistemas de 
Plataforma Digital: impactos paraas políticas 
de concorrência e para os consumidores
Os EPDs geram desafios consideráveis para atuação das autoridades. Nesse 
cenário, a atenção do consumidor, a coleta e o processamento de dados fi-
guram como peças centrais dos modelos de negócios em ascensão, podendo 
representar fonte de poder de mercado35.
A princípio, deve-se esclarecer que empresas que atuam nos mercados 
digitais não necessariamente participam ou formam ecossistemas digitais, 
conceito que se passa a explicitar. Parte-se da noção de plataformas, nas quais 
dois ou múltiplos lados de um determinado mercado são conectados, para 
a de ecossistema digital. Mais ampla, a abordagem cobre a coexistência de 
múltiplos atores em um mesmo cenário, representando empresas que inte-
ragem e dependem das atividades umas das outras.
Petit e Teece definem ecossistemas como redes de agentes empresariais 
que trabalham juntos para criar e capturar valor. Há, normalmente, a lide-
rança tecnológica de um ou dois agentes, que fornecem uma plataforma, em 
torno dos quais os demais participantes do mercado encontram-se agrupa-
dos36, alinhando seus investimentos e estratégias.
A introdução dos chamados ecossistemas digitais, na realidade, tem 
gerado questionamentos sobre conceitos-chave da normativa concorrencial 
e consumerista, tais como mercado relevante e a própria noção de consu-
midor. Se um mercado envolve múltiplos lados, como ocorre no âmbito 
dos ecossistemas digitais, ao mesmo tempo em que um usuário pode atuar 
como fornecedor de serviços e produtos para o cliente, pode assumir a po-
sição de consumidor dos serviços da plataforma. Diversos estudos indicam 
que a aplicação tradicional do direito concorrencial é insuficiente para li-
dar com problemas concorrenciais nos ecossistemas digitais37.
35 KIRA, B.; SINHA, V. e SRINIVASAN, S. “Regulating Digital Ecosystems: bridging the gap 
between competition policy and data protection”, Industrial and Corporate Change, no prelo. 
36 PETIT, N.; TEECE, D. J. “Taking Ecosystems Seriously in the Digital Economy: a (preliminary) 
dynamic competition/capabilites perspective”, Hearing on Competition Economics of Digital 
Ecosystems, OECD, 03 dez. 2020. Disponível em: https://ssrn.com/abstract=3745453. 
Acesso em: out. 2021. p. 3. 
37 JENNY, F. “Competition Law Enforcement and Regulation for Digital Platforms and Ecosys-
tems: understanding the issues, facing the challenges and moving forward”, Working Paper 
(Under Review, ICC), 2021.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 96 16/11/2022 10:55:29
 A interseção das políticas de concorrência, consumo e proteção de dados... 97
Nesse ínterim, mesmo alternativas que consideram a utilização de 
ferramentas já existentes na análise tradicional antitruste deve se adaptar 
à dinâmica do cenário digital. Jacobides e Lianos38, por exemplo, trazem à 
tona a opção de analisar os efeitos anticompetitivos no preço pelo lado da 
publicidade, considerando a mudança de demanda criada no mercado pe-
las ferramentas de busca. Outra possibilidade, de acordo com autores, seria 
definir “mercados de atenção” no lado da procura; e atribuir foco aos efei-
tos abusivos a partir de outros parâmetros de competição valorizados pelos 
usuários finais, como a privacidade.
Além disso, considera-se que os ecossistemas digitais personificam a 
noção de concorrência dinâmica: marcados por alterações rápidas e altas 
taxas de inovação, nem sempre possibilitam que as autoridades regulató-
rias desenvolvam em tempo econômico, seja ex-ante, seja ex-post, modelos 
para uma efetiva intervenção. Nesse contexto, possuir informação torna-se 
ainda mais crucial.
Veja-se, portanto, que os dados têm, desde logo, uma importância cen-
tral nesse cenário, podendo representar benefícios consideráveis. A OCDE 
destaca, por exemplo, a facilidade para colaboração, o incentivo a novas 
descobertas tecnológicas e inovações nos setores privados e públicos, que 
poderiam auxiliar a resolver desafios econômicos, sociais e ambientais. Para 
a entidade, é preciso se atentar a usos não éticos de dados, incluindo vieses 
negativos e discriminação contra determinados grupos39.
Hoje, determinadas empresas de tecnologia estão inseridas como agen-
tes dominantes no mercado (big techs)40, claramente funcionando como 
orquestradores de ecossistemas digitais, e sua atuação tem levantado ques-
tionamentos a respeito da consolidação do poder de mercado e possíveis 
38 JACOBIDES, M. G.; LIANOS, I. “Ecosystems and competition law in theory and practice”, 
Industrial and Corporate Change, 18 nov. 2021. Disponível em: https://academic.oup.
com/icc/advance-article/doi/10.1093/icc/dtab061/6428760?login=true. Acesso em: dez. 
2021.
39 ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO. “Recom-
mendation of the Council on Enhancing Access to and Sharing of Data”., Meeting of the 
Coun cil at Ministerial Level, 05–06 out. 2021. Disponível em: https://www.oecd.org/mcm/
Recommendation-of-the-Council-on-Enhancing-Access-to-and-Sharing-of-Data_EN.pdf. 
Acesso em: out. 2021. p. 2. 
40 Estima-se que Google, Apple, Amazon e Microsoft, por exemplo, tenham, individualmente, 
valor de mercado superior a US$1 trilhão. In KIRA, B.; SINHA, V. e SRINIVASAN, S. “Regu-
lating Digital Ecosystems: bridging the gap between competition policy and data protection”, 
Industrial and Corporate Change, no prelo, p. 2.
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98 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
impactos para consumidores e concorrentes, principalmente considerando 
a quantidade de dados a que têm acesso.
Ao passo que ampliam seu escopo de atuação, criando verdadeiros mar-
ketplaces e oferecendo serviços que, a princípio, nem mesmo aparentavam 
complementaridade — como a criação de redes sociais e oferta de produtos 
— tais empresas fazem cada vez mais parte do cotidiano das pessoas. Na atua-
ção das plataformas, os dados customizados dos usuários são ofertados aos 
anunciantes, o que os tornam ativos valiosos resultantes de uma dominân-
cia não fundada no preço dos serviços e produtos ofertados. Tem-se, dessa 
forma, uma relação em que a predominância de determinadas empresas se 
mantém: quanto maior a captação de dados, mais fácil que continuem em 
posição de dominância.
Veja-se o exemplo da Apple: apesar de representar 17% das vendas de 
smartphones mundiais, em 2021 a empresa representava 42% da receita glo-
bal ligada aos usuários de smartphones. Como a maioria dos usuários tem 
apenas um aparelho; e estão inseridos no ecossistema da Apple, no qual os 
produtos são interligados (iPod, iPad, iTunes, Safari etc.), eles encontram 
dificuldade em utilizar outros e, portanto, estão suscetíveis à exploração. 
Mesmo empresas de grande relevância, como outros aplicativos, não tem 
escolha a não ser participar do ecossistema da Apple — se não o fizessem, 
estariam renunciando a uma parte relevante de usuários41. Não sem razão 
a ação da Senacon no caso envolvendo a venda de aparelhos sem carrega-
dores no Brasil42.
Efetivamente, discute-se a noção de cidadania e inclusão digital, cená-
rio que foi ampliado com o avanço da pandemia de Covid-19 e o necessário 
distanciamento social como medida sanitária. A atuação das grandes empre-
sas de tecnologia passou a receber maior escrutínio — tanto das autoridades 
quanto dos consumidores —, e, de forma motivada, questiona-se se os be-
nefícios ofertados são suficientes para justificar a forma como os dados dos 
usuários são utilizados.
41 JACOBIDES, M. G.; LIANOS, I. “Ecosystems and competition law in theory and practice”, 
Industrial and Corporate Change, 18 nov. 2021. Disponível em: https://academic.oup.
com/icc/advance-article/doi/10.1093/icc/dtab061/6428760?login=true. Acesso em: dez. 
2021.
42 BRASIL. MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Senacon. Disponível em: https://www.gov.br/mj/pt-br/
assuntos/noticias/mjsp-instaura-processo-para-apurar-irregularidades-na-venda-de-celulares-
sem-carregador Acesso em: 03.jan. 2022.
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 A interseção das políticas de concorrência, consumo e proteção de dados... 99
Não se nega o papel que os ecossistemas digitais têm no fomento à inova-
ção ou nas melhorias que a sociedade experimentou recentemente. Entretanto, 
questiona-se se o poder de mercado e as possibilidades de interferência são 
abordados em toda sua complexidade pelas autoridades regulatórias.43 É 
preciso que elas estejam atentas às novas formas de comportamento abusivo 
pelas empresas, e ajam para que os usuários experimentem um ambiente di-
gital que lhes possibilita maior autonomia sobre o uso de suas informações.
No Brasil, vale também registrar que a Senacon assumiu protagonismo 
no tema em decorrência de seu mandamento legal de tutelar a proteção de 
dados dos consumidores face à incipiência da LGPD até a criação da ANPD. 
Desde o processo administrativo envolvendo o Facebook44, a Senacon — e o 
Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC) — tem avalia-
do as questões de privacidade do consumidor à luz do CDC, do Marco Civil 
da Internet e da Constituição Federal no âmbito das relações de consumo.
Inclusive, a Secretaria recentemente instaurou procedimento adminis-
trativo em face do aplicativo de mensagens instantâneas WhatsApp, com a 
finalidade de obter informações mais detalhadas sobre os novos termos de 
uso e da nova política de privacidade do aplicativo de mensagens, uma vez 
que a plataforma havia anunciado que promoveria mudanças nessa políti-
ca e, a partir da alteração, passaria a compartilhar os dados pessoais de seus 
usuários com empresas do grupo econômico do Facebook.
Agora, para a estruturação de uma ação estatal efetiva e duradoura, é 
necessária a coordenação interinstitucional entre Senacon, ANPD e Cade 
para que se identifiquem as principais disfuncionalidades que permeiam 
os EPDs e, assim, defina-se um conjunto de medidas a serem adotadas por 
cada qual segundo sua esfera de competência jurídica previamente defini-
da pelo legislador pátrio.
4. Dados como ativo empresarial: interdisciplinaridade
Considerando o crescimento do comércio digital e a realidade operacional 
dos sistemas de tecnologia da informação que o sustentam, a importância 
43 Nesse sentido, ver DOMINGUES, J. O.; GABAN, E. M. “Direito Antitruste e Poder Econômi-
co: o movimento populista e o ‘neobrandeisiano’”, Revista Justiça do Direito, vol. 33, no 3, 
2019, Universidade de Passo Fundo. 
44 BRASIL. SenaconSenacon/MJSP. Processo Administrativo 08012.000723/2018-19 
(Facebook Analytica). Publicado no D.O.U em 30 de dezembro de 2019.
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100 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
do tratamento e captura dos dados é inegável. Uma plataforma online que 
queira realizar diferenciação de preços com base na localização, ou em ou-
tras informações relacionadas ao consumidor, necessariamente os utilizará 
para tanto. A princípio, esse uso pode assumir contornos benéficos tanto 
para o usuário quanto para o ofertante do serviço: o direcionamento permi-
tiria maior satisfação do usuário e maior possibilidade de sucesso do modelo 
de negócios da plataforma.45
Jacobides e Lianos explicam que, principalmente em mercados de publi-
cidade que se desenvolvem nos ecossistemas digitais, os lados da plataforma 
têm interesses diversos. Assim, para alguns participantes, poderia haver cria-
ção de valor positivo; enquanto, para outros, o resultado seria negativo. Os 
autores dão como exemplo o interesse dos anunciantes de expor os usuários 
à prática intensiva de publicidade; enquanto os usuários finais podem pre-
ferir uma experiência com menos anúncios46.
Na atuação dos ecossistemas digitais, a utilização de dados pode ocor-
rer de forma a prejudicar a concorrência e os consumidores. A exemplo, é 
possível que represente fechamento de mercado para potenciais competi-
dores, em situações nas quais os dados são estritamente necessários para a 
criação de novas plataformas. Vejam-se, também, diversos casos comprova-
dos de uso indevido de dados dos usuários nos quais se verifica ausência do 
consentimento necessário e abuso da posição de vulnerabilidade do consu-
midor, a exemplo de processo administrativo conduzido pela Senacon que 
condenou uma rede varejista pela coleta de dados de clientes sem informa-
ção e, sem consentimento, por meio de câmeras de reconhecimento facial 
instaladas em uma loja modelo da empresa47.
Tais cenários já ocupam a preocupação das organizações internacionais. 
A OCDE, por exemplo, mostra-se alinhada com o tema, demonstrando 
preocupação com o crescente número de práticas abusivas pelos agentes di-
gitais que utilizem as tendências inconscientes para induzir o consumidor a 
45 Nesse sentido, ver QUINELATO, P. Preços Personalizados à luz da Lei Geral de Proteção 
de Dados: viabilidade e juridicidade. Dissertação (Mestrado em Direito) — Faculdade de 
Direito de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, 2021.
46 JACOBIDES, M. G.; LIANOS, I. “Ecosystems and competition law in theory and practice”, 
Industrial and Corporate Change, 18 nov. 2021. Disponível em: https://academic.oup.com/
icc/advance-article/doi/10.1093/icc/dtab061/6428760?login=true. Acesso em: dez. 2021.
47 BRASIL. Senacon/MJSP. Processo Administrativo 08012.001387/2019-11 (Hering). Publi-
cado no D.O.U em 14 de agosto de 2020.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 100 16/11/2022 10:55:29
 A interseção das políticas de concorrência, consumo e proteção de dados... 101
adquirir certo produto48. Considerando que essa utilização pode, também, 
impactar concorrentes de forma ilegal, fomentando uma posição de predo-
minância no mercado que não se justifica apenas pela eficiência empresarial, 
tem-se estabelecido um problema que concretamente demonstra a sobre-
posição entre política concorrencial, consumerista e a proteção de dados.
Com a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados e com o 
início da atividade regulamentar da ANPD, a tendência é que as autoridades 
regulatórias exerçam um maior monitoramento das atividades empresariais 
exercidas nos mercados digitais para avaliar a conformidade das práticas com 
o atual arcabouço jurídico em vigor. Nesse sentido, sempre que necessário, 
as autoridades públicas poderão atuar no modelo coordenado de task-forces 
tanto para investigar, quanto para estruturarem soluções ex-ante ou ex-post 
revestidas de maior grau de eficácia jurídica.
Nesse sentido, observamos o recente bom exemplo de atuação interins-
titucional levada a efeito pela Senacon, ANPD, MPF e Cade no caso concreto 
envolvendo o WhatsApp, explicado anteriormente. Mediante a política pre-
tendida pelo WhatsApp, as autoridades referidas emitiram recomendação 
conjunta pelo adiamento da vigência da nova política até a adoção das me-
didas sugeridas pelos órgãos reguladores. Dentre elas, a não restrição pelo 
WhatsApp ao acesso de usuários que não tivessem aderido à nova política; 
e o não compartilhamento ou tratamento pelo Facebook de dados obtidos a 
partir do WhatsApp. A atuação conjunta das autoridades, no caso, envolveu 
a preocupação com políticas de privacidade, tratamento de dados, direitos 
dos usuários e possíveis violações concorrenciais49-50.
Na aplicação do direito, o papel dos dados na economia digital não pode 
ser menosprezado. Efetivamente, eles possibilitam que as empresas esqua-
drinhem a vida e a teia de relações (de consumo, pessoais e profissionais) de 
48 Conforme a publicação do Consumer Policy Toolkit (OECD, 2010) demonstra. In ORGANI-
ZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO. Consumer Policy 
Toolkit. OECD Multilingual Summaries, 2010. 
49 ANPD; Cade; MJSP; MPF. Recomendação. Disponível em: https://www.gov.br/anpd/pt-br/
assuntos/noticias/inclusao-de-arquivos-para-link-nas-noticias/recomendacao_whatsapp_-_
assinada.pdf. Acesso em: nov. 2021.
50 AUTORIDADE NACIONAL DE PROTEÇÃODE DADOS. “Após esforço interinstitucional, 
WhatsApp se compromete a atender às recomendações sobre sua política de privacidade”, 
Gov.br., publicado em 20 de agosto de 2021. Disponível em: https://www.gov.br/anpd/pt-br/
assuntos/noticias/apos-esforco-interinstitucional-whatsapp-se-compromete-a-atender-as-re-
comendacoes-sobre-sua-politica-de-privacidade. Acesso em: nov. 2021.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 101 16/11/2022 10:55:30
102 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
qualquer consumidor minimamente inserido no universo digital51. No mundo 
atual, em que o uso de mídias sociais e de plataformas digitais em substituição 
aos modelos tradicionais de negócios tem crescido — impulsionado também 
pela pandemia de Covid-19 —, deve-se assumir que a captura de dados pelas 
empresas cresceu proporcionalmente. No mesmo contexto inserem-se as for-
mas e métodos para reter e explorar a atenção dos usuários consumidores.52
A partir do tratamento dos dados, as empresas podem estabelecer estra-
tégias como o direcionamento específico de produtos e com a personalização 
de preços, criando um ambiente para cada consumidor que o leve a despen-
der mais tempo no ambiente digital. Além disso, a organização de empresas 
complementares ao redor de uma líder tecnológica, cujo poder delimite a atua-
ção das demais, pode ocasionar tendência de monopolização dos mercados53.
A introdução de novas ferramentas de tecnologia, a automatização dos 
processos e a identificação de conteúdo nos ecossistemas digitais utilizam, 
essencialmente, a gestão de cookies e de bases de dados. Há, portanto, um im-
portante caráter do uso de dados com relação a permitir a continuidade da 
oferta de serviços digitais. Contudo, isso não pode ser utilizado como justifica-
tiva ampla para permitir a coleta e o processamento irrestrito pelas empresas, 
ou fomentar abusividade em práticas como a publicidade comportamental, 
por meio da qual se torna possível identificar os históricos de navegação dos 
usuários, sua geolocalização e seu comportamento de consumo54.
O uso deve ser pautado pela ética, pelo respeito aos direitos humanos, 
pelo respeito às privacidades e às liberdades individuais55. Nesse particular, 
51 Para saber mais sobre o tema: Toolkit da OCDE. Disponível em: https://goingdigital.oecd.org/. 
52 Nesse sentido, veja-se a Campanha de Proteção de Dados da Senacon e o guia “Como Pro-
teger seus Dados Pessoais”, iniciativa conjunta da Senacon, ANPD e CNDC. Disponível em: 
https://www.gov.br/anpd/pt-br/documentos-e-publicacoes/arquivos-de-documentos-de-publi-
cacoes/guia-do-consumidor_como-proteger-seus-dados-pessoais-final.pdf].
53 Para saber mais sobre o tema ver: DOMINGUES, J.; GABAN, E. “Direito Antitruste e Poder 
Econômico: o movimento populista e ‘neobrandeisiano’”, Revista Justiça do Direito, v. 33, 
n. 3, pp. 222–244, 31 dez. 2019. WU, Tim. The Curse of Bigness: antitrust in the new gilded 
age. Nova York: Columbia Global Reports, 2018.
54 IAB BRASIL. Mídia Programática. Disponível em: https://iabbrasil.com.br/wp-content/upload-
s/2012/09/E-BOOK-IAB-BRASIL-M%C3%8DDIA-PROGRAM%C3%81TICA.pdf. Acesso em: 
17 mai. 2021.
55 ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO. Recommendation 
of the Council on Enhancing Access to and Sharing of Data. Meeting of the Council at Ministerial 
Level, 05–06 out. 2021. Disponível em: https://www.oecd.org/mcm/Recommendation-of-the-
Council-on-Enhancing-Access-to-and-Sharing-of-Data_EN.pdf. Acesso em: out. 2021. p. 3.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 102 16/11/2022 10:55:30
 A interseção das políticas de concorrência, consumo e proteção de dados... 103
enfatizamos a aprovação da PEC no 17/2021 que, dentre outros temas, alçou 
a proteção de dados pessoais à categoria de direito constitucional fundamen-
tal, passando a integrar o rol do art. 5o, da Constituição de 1988. Isso inclui 
a autonomia dos usuários quanto aos dados que são coletados, bem como 
a consulta a tais informações.
No âmbito das relações de consumo, os dados sempre foram de gran-
de importância. O tema envolve questões como privacidade, autonomia 
dos consumidores, liberdade de escolha e igualdade nas contratações, sem 
contar temas como o do perfilamento do consumidor56. Tais temas são 
igualmente relevantes do ponto de vista concorrencial, já que impactam 
no desempenho das firmas em ambiente competitivo. Assim, o fenômeno 
requer uma análise interdisciplinar, visando reduzir as assimetrias de in-
formação57 presentes na relação entre usuários e ecossistemas digitais e, 
também, entre as autoridades regulatórias e os agentes privados.
Exemplos dessa atuação já existem no Brasil. Com a instituição da ANPD, 
a Senacon, enquanto reguladora das relações de consumo, buscou construir 
institucionalmente o diálogo com a autoridade, assim como com todos os 
demais reguladores. Essa deve ser a tônica a pautar a abordagem das inter-
seções entre a proteção de dados e as políticas concorrencial e consumerista.
Os próprios diplomas legais que regulam a matéria no país estimulam 
essa aplicação. Veja-se que o Marco Civil da Internet já havia instituído a 
56 Para saber mais sobre o tema, ver QUINELATO, P. Preços Personalizados à luz da Lei Geral 
de Proteção de Dados: viabilidade e juridicidade. Dissertação (Mestrado em Direito) — Fa-
culdade de Direito de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, 2021.
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-algoritmica-de-precos-perfilizacao-e-responsabilidade-civil-nas-relacoes-de-consumo-jose
-luiz-de-moura-faleiros-junior-filipe-medon/. Acesso em: 16 nov. 2021.
57 A assimetria de informação é caracterizada como falha de mercado, ou seja, trata-se de 
fator que altera o funcionamento regular do mercado. “A criação e recriação de assimetrias, 
reforçadas pelo desenvolvimento de novas tecnologias, é um fator que condiciona o compor-
tamento das firmas”, in MARCATO, M. B. “Eficiência Econômica e Inovação: considerações 
acerca da análise antitruste”, Revista Administração em Diálogo, vol. 18, n. 1. pp. 81–111, 
jan.-fev.-mar.-abr 2016. p. 96. Assim, as informações disponibilizadas pautam a tomada 
de decisões, de forma que sua assimetria gera discrepâncias. Nesse sentido, as autorida-
des regulatórias têm sob suas atribuições lidar com esse tema. A Senacon, por exemplo, 
assume o papel de mitigar a assimetria informacional, regulando as relações de consumo, 
atendendo ao princípio do artigo 6o do Código de Defesa do Consumidor. 
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104 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
exigência de consentimento expresso para a coleta de dados (art. 7o, IX). A 
LGPD, por sua vez, passou a regular o tema de forma mais detalhada, en-
caminhando os agentes que lidam com dados pessoais diretamente para 
identificação e construção de medidas para abordar os riscos presentes nos 
processos da organização. Especificamente, a lei permite a adequação de 
seus dispositivos a setores específicos em diferentes níveis de risco. Ecossis-
temas digitais, portanto, não fogem à regra e à necessidade de observância 
das normas legais.
Internacionalmente, a OCDE publicou uma recomendação para aprimo-
rar o acesso e o compartilhamento de dados. No documento, a organização 
destaca que os Membros devem empoderar e engajar todos os participan-
tes a adotar esforços para aumentar a confiança no ecossistema de dados. 
Como medidas específicas, destacam-se o encorajamento a parcerias de 
compartilhamento de dados de concorrência neutra e o empoderamento de 
indivíduos, grupossociais e organizações. Ao adotá-las, a recomendação é 
de que os Membros se utilizem de uma abordagem estratégica envolvendo 
todo o aparato governamental58.
Assim, não se questiona se o direito da concorrência deve ou não dialo-
gar com os demais princípios da ordem econômica, dentre os quais a defesa 
do consumidor, dado que tal diálogo é imposição da Constituição de 198859. 
Deve-se, na realidade, passar à identificação de como realizá-lo de forma 
efetiva, para o que se advoga pela necessária atuação articulada ou coorde-
nada60. O entendimento é de que não haveria interferência nas competências 
individuais das autoridades61.
58 ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO. Recommen-
dation of the Council on Enhancing Access to and Sharing of Data. Meeting of the Council at 
Ministerial Level, 05–06 out. 2021. Disponível em: https://www.oecd.org/mcm/Recommenda-
tion-of-the-Council-on-Enhancing-Access-to-and-Sharing-of-Data_EN.pdf. Acesso em: out. 2021.
59 FRAZÃO, A. Direito da Concorrência: pressupostos e perspectivas. São Paulo: Saraiva, 
2017. pp. 47–48.
60 Nesse sentido, ver “Maior plataforma online de defesa do consumidor é brasileira”. Ver 
DOMINGUES, J. O. Folha de São Paulo, 15 mar. 2021. Disponível em: https://www1.folha.
uol.com.br/opiniao/2021/03/maior-plataforma-online-de-defesa-do-consumidor-e-brasileira.
shtml. Acesso em: 17 mai. 2021. 
61 Importante ressaltar, por exemplo, o Acordo de Cooperação Técnica entre Senacon e ANPD, 
para ações conjuntas na proteção de dados pessoais e defesa do consumidor. Ver AUTORI-
DADE NACIONAL DE PROTEÇÃO DE DADOS. ANPD e Senacon assinam acordo de coopera-
ção técnica. Gov.br, 22 mar. 2021. Disponível em: https://www.gov.br/anpd/pt-br/assuntos/
noticias/anpd-e-senacon-assinam-acordo-de-cooperacao-tecnica. Acesso em: 20 mai. 2021.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 104 16/11/2022 10:55:30
 A interseção das políticas de concorrência, consumo e proteção de dados... 105
Como bem destacam Kira et al.62, há espaço para que o direito antitrus-
te considere a proteção dos dados, de forma que a integração entre tais áreas 
pode tanto representar fomento às decisões da autoridade concorrencial 
quanto aprimorar sua aplicabilidade. Por exemplo, em determinado mercado 
e/ou para determinado produto, a proteção de dados e a privacidade do usuá-
rio podem ser peças centrais da análise antitruste (e.g. o caso da plataforma 
WhatsApp, descrito anteriormente). Sendo essa a situação específica, a auto-
ridade pode se pautar em tais conceitos para construir o racional de decisão a 
respeito, considerando, portanto, os efeitos para usuários finais das platafor-
mas. No caso da aquisição da Doubleclick pelo Google, em 2007, a U.S. Federal 
Trade Commission considerou, por exemplo, preocupações sobre os efeitos 
que a aquisição poderia ter sobre a privacidade dos usuários pela combina-
ção das bases de dados de publicidade das empresas envolvidas na operação63.
Considerações finais
Antitruste e defesa do consumidor possuem inegáveis zonas de interconexão. 
Isso fica ainda mais evidente quando o objeto de análise são as relações en-
tre os usuários dos Digital Platform Ecosystems (EPDs). Nesse cenário, dois 
são os elementos-chave para a atuação concomitante e coordenada do di-
reito antitruste e direito do consumidor: a atenção e os dados dos usuários, 
as formas e os métodos empregados para atraí-los, retê-los e explorá-los. É 
nessa relação que pode haver desvios comportamentais das firmas ofertan-
tes e dos proprietários dos EPDs.
Ainda que se considere o argumento — possivelmente levantado pe-
las empresas-alvo de regulação — de que os usuários seriam prejudicados 
caso tivessem sua atuação controlada, não se podem ignorar os problemas 
concorrenciais que podem advir desses modelos de negócio64. Uma análise 
62 KIRA, B.; SINHA, V.; SRINIVASAN, S. “Regulating Digital Ecosystems: bridging the gap 
between competition policy and data protection”, Industrial and Corporate Change, no prelo.
63 DOUGLAS, E. M. “Digital Crossroads: the intersection of competition law and data privacy”, 
Report to the Global Privacy Assembly Digital Citizen and Consumer Working Group, jul. 
2021. Disponível em: https://edps.europa.eu/system/files/2021-10/1.3h-version-4.0-digi-
tal-citizen-and-consumer-working-group-adopted_en.pdf. Acesso em: jan. 2022. p. 12. 
64 Esses podem ainda envolver a restrição a inovações ou a aquisição de rivais potenciais In 
JACOBIDES, M. G.; LIANOS, I. “Ecosystems and competition law in theory and practice”, 
Industrial and Corporate Change, 18 nov. 2021. Disponível em: https://academic.oup.com/
icc/advance-article/doi/10.1093/icc/dtab061/6428760?login=true. Acesso em: dez. 2021.
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106 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
muito ligada ao viés permissionário poderia, portanto, ignorar situações 
em que o resultado levaria à diminuição de benefícios ao consumidor final.
Caberia ao Estado, por intermédio das autoridades especializadas, dedi-
car-se a desenvolver métodos de apuração dos desvios, bem como desenvolver 
remédios capazes de mitigar os resultados das distorções eventualmente 
identificadas no universo dos EPDs. Entretanto, e aqui repousa o grande 
desafio: como calibrar e dosar essa possível atuação estatal especializada?
O que se sabe, até aqui, é que será ineficaz atuar de maneira isolada e não 
coordenada seja qual for o viés escolhido (isto é, antitruste, consumidor, ou 
proteção de dados)65. Até porque, a depender das características do remédio, 
não é desprezível a chance de haver questionamentos sobre a capacidade ju-
rídica da autoridade postulante.
A regulação de novas formas de negócio é uma tarefa complexa e de-
manda um olhar interdisciplinar e holístico dos fenômenos jurídicos.
Assim, os reguladores devem analisar a situação sob um prisma analítico, 
pelo qual podem identificar comportamentos abusivos. Ecossistemas, princi-
palmente, carecem de doutrinas e conceitos tradicionais da aplicação legislativa 
adaptados para sua realidade — e, nesse cenário, a multiplicidade de argumen-
tos e narrativas regulatórias demonstra a necessidade de maturação na área66.
Alguns exemplos de cooperação entre as agências reguladoras têm incluí-
do o reconhecimento da importância estratégica de uma atuação colaborativa, 
a formalização de acordos de colaboração, a publicação de diretivas e reco-
mendações conjuntas (como no caso do WhatsApp, tratado neste capítulo), 
a cooperação em situações específicas e o desenvolvimento de esforços con-
juntos para construir estudos interseccionais e melhores práticas na área67. 
Apesar disso, há ainda um espaço relevante para amadurecimento da coope-
ração institucional envolvendo proteção de dados, o consumidor e a defesa 
da concorrência, especialmente no ambiente digital.
65 No mesmo sentido, ver DOMINGUES, J. O. Folha de São Paulo, 15 mar. 2021. Disponível 
em: https://www1.Folha.Uol.com.br/opiniao/2021/03/maior-plataforma-online-de-defesa-do-
consumidor-e-brasileira.shtml. Acesso em: 17 mai. 2021.
66 JACOBIDES, M. G.; LIANOS, I. “Ecosystems and competition law in theory and practice”, 
Industrial and Corporate Change, 18 nov. 2021. Disponível em: https://academic.oup.com/
icc/article/30/5/1199/6428760. Acesso em: dez. 2021.
67 DOUGLAS, E. M. “Digital Crossroads: the intersection of competition law and data privacy”, 
Report to the Global Privacy Assembly Digital Citizen and Consumer Working Group, jul. 
2021. Disponível em: https://edps.europa.eu/system/files/2021-10/1.3h-version-4.0-digital-
citizen-and-consumer-working-group-adopted_en.pdf. Acesso em: jan. 2022, p. 4.
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 A interseção das políticas de concorrência, consumo e proteção de dados... 107
Em resumo, diante da revolução tecnológica e da mudança do com-
portamento dos consumidores, a atuação-padrão deve ser interdisciplinare transversal, abdicando-se de eventual protagonismo de um e elegendo-
-se a atuação conjunta e racional como a verdadeira plataforma para se 
alcançar a desejada atuação estatal em prol do bem-estar social e da se-
gurança judiciária.
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4
economia comportamental 
e antitruste: deu match?
Paulo Furquim de Azevedo
introdução
A economia é parte indissociável da política de defesa da concorrência. Está 
também, é claro, no campo do direito, pois trata da aplicação de normas 
legais e infralegais a casos concretos. Mas os conceitos fundamentais que 
orientam a aplicação dessas normas são econômicos. Como interpretar se 
em um caso concreto há concorrência ou se uma fusão é ou não prejudicial 
aos consumidores finais? A economia é a área de conhecimento que oferece 
as lentes para a interpretação desses fatos e a sua mediação com as normas 
concorrências. Mais ainda, é também a economia, mas não apenas, que dá 
fundamento à própria existência das normas concorrenciais. Por isso, é im-
pensável o antitruste sem a economia.
Mas qual economia? A história revela que o conjunto de conhecimentos 
em que se apoia a política de defesa da concorrência modificou-se conforme 
a evolução e a disputa acadêmica entre os diversos paradigmas de pesquisa 
dentro desse campo de conhecimento. Desde a década de 1980, a nova orga-
nização industrial se consolidou como a principal referência para a análise 
concorrencial, aportando também nas décadas subsequentes uma série de 
instrumentos de análise empírica que foram crescentemente incorporados 
à prática antitruste, tais como modelos para simulação de fusões ou para a 
detecção de carteis.
Em paralelo, na academia, floresceu o campo da economia comporta-
mental, questionando teórica e empiricamente o pressuposto de racionalidade 
plena, base fundamental nos modelos da nova organização industrial. Já se 
trata de paradigma consolidado, tendo ocupado espaço significante nos prin-
cipais periódicos de economia e alcançado reconhecimento com a concessão 
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112 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
do prêmio Nobel de economia para alguns de seus principais pesquisado-
res. É agora absolutamente pertinente a questão: deve o antitruste beber na 
fonte da economia comportamental?
Esse é o tema a que se dedica este artigo. Ele também é motivado por 
uma transformação do mundo real, com o desenvolvimento de ecossiste-
mas digitais, os quais, com acesso sem precedentes a dados individualizados 
de consumidores e capacidade de processamento, são capazes de explorar 
regularidades comportamentais, seja para melhorar a qualidade de seus 
serviços, seja para impedir que consumidores desviem o seu consumo para 
concorrentes. Seria esse um motivo adicional para trazer a economia com-
portamental para dentro do antitruste?
Como se verá nas páginas subsequentes, a resposta para as duas ques-
tões levantadas nos parágrafos anteriores é afirmativa. Há contribuições 
relevantes da economia comportamental que podem e devem ser incorpo-
radas pela prática antitruste; e a emergência de ecossistemas digitais, como 
atores de enorme relevância econômica, torna esse movimento de aproxi-
mação ainda mais pertinente.
Para as respostas a essas questões, é importante notar que o conhe-
cimento econômico útil à política de concorrência não é caracterizado 
apenas pelo seu objeto, a capacidade de analisar mercados, firmas e suas 
interações. Sua relevância e utilidade dependem também e fundamen-
talmente de sua capacidade preditiva. A conclusão pela aprovação ou 
não de uma fusão depende não apenas da observação dos fatos corren-
tes — quais são as empresas envolvidas, seus produtos, concorrentes, 
condições de entrada, entre outros —; mas também da capacidade de pre-
dizer as consequências de um ato, a fusão, ainda não realizado. Mesmo 
para a análise de condutas, um escrutínio do passado, o conhecimento 
preditivo é necessário para se avaliar como seria o mundo se não tivesse 
havido a conduta. A caracterização de eventual ilícito antitruste muitas 
vezes exige essa espécie de exercício, que somente pode ser realizado por 
meio do aporte de um conhecimento com capacidade preditiva. Avaliar 
a viabilidade e conveniência da incorporação de resultados da econo-
mia comportamental ao antitruste passa, portanto, pela avaliação de sua 
capacidade preditiva. O que interessa, no final, é a qualidade da inter-
venção antitruste.
Para desenvolver esse tema, este artigo apresenta a seguinte estrutu-
ra. A próxima seção apresenta uma síntese da economia comportamental, 
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 economia comportamental e antitruste: deu match? 113
destacando as suas contribuições centrais e com maior potencial de aplicação 
à política de defesa da concorrência. A terceira seção, sem a preocupação 
de ser exaustiva, desenvolve possíveis contribuições para a análise con-
ceitual de casos concretos, suas implicações para abordagens empíricas 
e para o desenho da própria política de defesa da concorrência. A quarta 
seção dedica-se ao tema de ecossistemas digitais e por que seu desenvol-
vimento traz maior urgência à consideração de resultados da economia 
comportamental no antitruste. Finalmente, as considerações finais apon-
tam algumas dificuldades e caminhos para que a defesa da concorrência 
possa se beneficiar dos avanços da economia comportamental.
1. a revolução da economia comportamental
É difícil encontrar algum economista que, de fato, acredite que os seres hu-
manos — ele incluso — sejam perfeitamente racionais.Por “perfeitamente 
racional”, entenda-se: ter ciência das alternativas de escolha, capacidade de 
formar expectativas sobre o que não é conhecido, ter preferências claras so-
bre essas alternativas e escolher suas ações de modo deliberado após algum 
processo de otimização.1 Ainda que a razão seja um traço distintivo dos seres 
humanos, nem sempre a utilizamos em nossas escolhas; e quando o fazemos 
não é sem esforço e limites de nossa capacidade cognitiva. Nós, economistas 
(este autor permite-se aqui o uso da primeira pessoa), lembramo-nos dis-
so sempre que apresentamos aos alunos modelos em que o pressuposto de 
racionalidade plena é utilizado com absoluta falta de cerimônia, como um 
fato da vida, para depois, na correção das provas, a alta dosagem de tinta 
vermelha nos revelar o contrário.
A exigência de racionalidade é ainda maior em modelos de intera-
ção estratégica, especialmente úteis para análises concorrenciais como as 
requeridas no antitruste. Estas estão baseadas em teorias dos jogos não 
cooperativos, cujos conceitos de equilíbrio mais relevantes, como o Equilí-
brio de Nash, requerem não apenas a racionalidade de cada indivíduo, mas 
que essa racionalidade seja de conhecimento comum, ou seja, que todos os 
indivíduos sejam plenamente racionais e que todos saibam que todos são 
plenamente racionais. Trata-se, portanto, de um superuso do conceito de 
1 OSBORNE, M. J.; RUBINSTEIN, A. A course in game theory. MIT press, 1994, p.4.
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114 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
racionalidade, estando na base de modelos de simulação de fusões, como 
os apresentados Hausman et al.2 e Nevo3.
Se há um razoável consenso de que o pressuposto de racionalidade ili-
mitada não é uma boa representação do comportamento humano, por que 
ainda é a base de praticamente a totalidade dos modelos econômicos? Há 
duas respostas para essa questão. Primeiro, a validade de uma teoria não 
decorre da veracidade de seus pressupostos, mas da aderência de suas pro-
posições às evidências empíricas, ou seja, de sua capacidade de explicar o 
mundo. Em particular, como já comentado na introdução deste capítulo, 
os modelos econômicos são fundamentais ao antitruste por sua capacida-
de preditiva, o que independe do quão realistas são os seus pressupostos.
Essa discussão remete ao célebre exemplo de Milton Friedman, em 
seu Essays in Positive Economics4, sobre jogadores de sinuca, os quais não 
são experts em trigonometria, mas agem, no momento de escolher a traje-
tória desejada para a bola, por intuição, como se fossem (ou, como ficou 
conhecido na literatura, as if).5 O pressuposto de que esses jogadores rea-
lizam cálculos trigonométricos a cada jogada é obviamente irrealista, mas 
uma teoria baseada nesse mesmo pressuposto é capaz de predizer razoavel-
mente bem como jogam os jogadores profissionais de sinuca. Vale reforçar 
a palavra “profissionais” na sentença anterior. Este autor, nas raras vezes em 
que se arriscou em jogar sinuca, realizou jogadas que em nada se asseme-
lhavam ao que seria predito pelo emprego de cálculo trigonométrico, ainda 
que conscientemente tentasse fazer exatamente isso. No caso de profissionais, 
há algum processo de seleção de jogadores que faz com que o pressuposto 
de uso de cálculo trigonométrico produza boas predições.
Em síntese, se o valor de uma teoria está em sua capacidade prediti-
va, o que deve ser aderente à realidade são suas predições, que devem ser 
validadas empiricamente, e não seus pressupostos. Se as proposições de 
2 HAUSMAN, J.; LEONARD, G.; ZONA, J. D. “Competitive analysis with differenciated pro-
ducts”, Annales d’Economie et de Statistique, pp. 159–180, 1994.
3 NEVO, A. “Mergers with differentiated products: The case of the ready-to-eat cereal indus-
try”, The RAND Journal of Economics, pp. 395–421, 2000.
4 FRIEDMAN, M.; FRIEDMAN, M. Essays in positive economics. Chicago: University of Chi-
cago press, 1953.
5 Para uma discussão sobre o uso dessa opção metodológica em economia, ver MURAMATSU, 
R.; BARBIERI, F. “Consequências metodológicas das formulações ‘as if’: como a abordagem 
evolucionária sugere uma interpretação realista da economia”, Estudos Econômicos (São 
Paulo), v. 39, pp. 255–276, 2009.
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 economia comportamental e antitruste: deu match? 115
modelos econômicos baseados no pressuposto de plena racionalidade são 
validadas empiricamente, o modelo é válido — e útil à política de defesa da 
concorrência — mesmo sendo incontroverso que seres humanos são, com 
o perdão da redundância, humanos. Como se verá à frente, algumas vezes 
os modelos econômicos explicam mal os fenômenos do mundo real. É por 
esse motivo — e não pelo irrealismo do pressuposto de racionalidade plena 
— que há espaço para a economia comportamental na regulação e na defe-
sa da concorrência.
A segunda resposta para a predominância do pressuposto de racio-
nalidade é uma mera disfunção do sistema de produção de conhecimento. 
Qualquer paradigma de pesquisa — a economia inclusa — está sujeita a uma 
certa inércia, denominada na literatura por path dependence, que torna mais 
difícil a mudança de rumo do modo de pensar e resolver problemas. O co-
nhecimento é cumulativo, construído por pesquisadores e organizações que 
acumularam anos de estudos e investimento, cujo valor depende da conti-
nuidade do paradigma incumbente.6
Tomando-se as duas respostas em conjunto, parece claro que há um 
espaço importante para a incorporação de resultados da economia com-
portamental no antitruste. O que exatamente deve ser incorporado e de que 
forma é o tema a que se dedica o restante deste capítulo, sem a pretensão de 
ser exaustivo. Seu ponto de partida é sumariar as principais contribuições 
da economia comportamental e como vem sendo incorporadas em algumas 
áreas da política pública. As implicações para a análise antitruste ficam re-
servadas para a seção seguinte.
1.1. Economia comportamental: origem 
e principais contribuições
A denominação da economia comportamental como uma área do conhe-
cimento é algo relativamente recente. O termo é citado esparsamente em 
algumas publicações nos anos 1960, mas com impacto reduzido, resultando 
em apenas algumas dezenas de citações. Foi somente nas décadas de 1970 
e, sobretudo, de 1980 que é possível notar a consolidação do termo e de um 
conjunto de práticas de pesquisa compartilhado que permite a classificar 
6 DOSI, G. “Sources, procedures, and microeconomic effects of innovation”, Journal of eco-
nomic literature, pp. 1.120–1.171, 1988.
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116 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
como um paradigma de pesquisa.7 É desse período também o lançamento 
de periódicos científicos dedicados ao tema, como o Journal of Behavioral 
Economics (atualmente denominado Journal of Experimental and Behavioral 
Economics), em 1972, e o Journal of Economic Psychology, em 1981. Tratavam-
se ainda, contudo, de periódicos periféricos. Foi somente a partir da década 
de 1990 que o tema passou a ganhar mais espaço nos principais periódicos 
de economia8.
Sua origem está na confluência de duas áreas de pesquisa que, por déca-
das, não apresentavam qualquer interface entre si: a economia experimental 
e a ciência cognitiva ligada à psicologia experimental. O estudo do compor-
tamento humano é a espinha dorsal da psicologia experimental, em suas 
várias vertentes e aplicações. Uma destas, o estudo de processos decisórios, 
tinha implicações obviamente relevantes para as escolas de negócios, o que 
aproximou alguns de seus pesquisadores dos economistas. Esse foi o caso de 
Amos Tvesrky e Daniel Kahneman, psicólogos de formação que estão entre 
os principais nomes da economia comportamental.
E por que o estudo sobre o comportamento é também tão caro à eco-
nomia? Um dos pilaresdo estudo em economia é teorizar sobre como agem 
as pessoas. A finalidade é entender o funcionamento do sistema econômico, 
como resultado da interação entre diversos atores (e.g. pessoas, organiza-
ções etc.) que gozam de algum grau de autonomia da vontade. Predizer o 
funcionamento do sistema econômico requer, portanto, teorizar e antecipar 
em alguma medida como as pessoas e organizações agem em determina-
dos contextos.
Na época de Adam Smith a John Stuart Mill, as considerações sobre o 
comportamento humano eram abrangentes, incluindo considerações morais 
e relativas a normas sociais; mas eram também relativamente vagas e flexíveis 
7 Ver, por exemplo, as seguintes referências do início do programa de pesquisa: HURSH, S. R. 
“Behavioral economics”, Journal of the experimental analysis of behavior, v. 42, n. 3, 
pp. 435–452, 1984. KAGEL, J. H.; WINKLER, R. C. “Behavioral Economics: areas of coope-
rative research between economics and applied behavioral analysis”, Journal of Applied 
Behavior Analysis, v. 5, n. 3, pp. 335–342, 1972.
8 Os cinco principais periódicos em economia, universalmente reconhecidos, são American 
Economic Review, Econometrica, Journal of Political Economy, Quartely Journal of Econo-
mics e Review of Economic Studies. Os rankings disponíveis são unânimes em destacá-los, 
sendo também utilizados como critério para concessão de tenure nos principais departa-
mentos de economia mundo afora. Uma análise de ranking de periódicos de Economia bas-
tante utilizada é a proposta por COMBES, P.-P.; LINNEMER, L. Inferring missing citations: 
A quantitative multi-criteria ranking of all journals in economics, 2010.
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 economia comportamental e antitruste: deu match? 117
para as exigências de modelos hipotéticos-dedutivos. Com o desenvolvimento 
de modelos econômicos formais foi necessário explicitar um pressuposto com-
portamental tratável em linguagem matemática, período em que se consolidou 
a noção de homo economicus plenamente racional. Quando Von Newman e 
Morgerstern publicam Theory of Games and Economic Behavior,9 em 1944, 
consolidou-se o pressuposto de racionalidade plena e de conhecimento co-
mum como base das escolhas em condições estratégicas. É também a partir 
desse momento que floresce o ramo de economia experimental, voltada predo-
minantemente para testar proposições da economia e da teoria dos jogos, em 
ambientes controlados (e.g. em laboratórios), como já faziam os psicólogos.10
É interessante notar que entre os primeiros pesquisadores de econo-
mia experimental encontravam-se os mais destacados teóricos de teoria 
dos jogos, como Thomas Shelling, Maurice Allais e John Nash. Portanto, 
a preocupação de averiguar a aderência das predições comportamentais às 
evidências empíricas era parte da agenda de pesquisa de teoria dos jogos 
desde seu nascimento. Já nos anos 1950 e 1960, foram observados diversos 
resultados em que era evidente a dissonância entre a predição de modelos 
teóricos (em particular do modelo de escolha de utilidade esperada, base 
da teoria dos jogos) e as evidências colhidas em experimentos em laborató-
rios. Exemplos clássicos, como o Paradoxo de Allais e o Paradoxo de Elsberg, 
apontavam para a insuficiência da teoria de utilidade esperada para predi-
zer a escolha dos indivíduos em contextos de efeito dotação (endowment 
effect) e ambiguidade, dois aspectos que vieram a ter um papel central na 
economia comportamental. Também digno de nota foram os resultados em 
experimentos de bens públicos e do jogo do ultimato, em que a estratégia do-
minante é não cooperar. Diferentemente do predito por esses modelos, que 
assumem indivíduos racionais e interessados na maximização de seu pró-
prio bem-estar, os participantes, em sua maioria, tendem a cooperar, ainda 
que parcialmente, e também gastam seus recursos para punir um compor-
tamento não cooperativo, percebido como injusto.
Esses resultados, contudo, por mais robustos que tenham se mostrado em 
experimentos subsequentes, em que foram testadas e modificadas inúmeras 
9 VON NEUMANN, J.; MORGENSTERN, O. Theory of games and economic behavior. Nova 
Jersey: Princeton University Press, 1944.
10 KAGEL, J. H.; ROTH, A. E. (Ed.). The Handbook of Experimental Economics, Volume 2. 
Nova Jersey: Princeton University Press, 2020.
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118 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
hipóteses auxiliares, não foram suficientes para que o mainstream de eco-
nomia reformulasse a base do comportamento plenamente racional em que 
estava assentada. Na maior parte das vezes, esses resultados inspiraram teó-
ricos a reformularem seus modelos, de modo que suas proposições fossem 
consistentes com as regularidades empíricas observadas, mas mantendo a 
ilimitada capacidade cognitiva dos agentes econômicos. Desse movimen-
to, decorreram diversos avanços em teoria dos jogos, como, por exemplo, a 
modelagem formal de ambiguidade.11
Outra promissora linha de pesquisa desenvolveu métodos para mensu-
rar os desvios de comportamento em relação ao que seria esperado em um 
modelo de escolha racional, assim como para relacionar o efeito de caracte-
rísticas individuais, como educação, inteligência e renda, à magnitude desses 
desvios.12 Essa linha, contudo, ainda não alcançou o nível de maturidade, 
mensurada pelo consenso entre os pares, que permita o desenvolvimento 
de aplicações úteis à política pública. As formas de medição da magnitude 
de desvios em relação ao comportamento racional (e.g. medida de irracio-
nalidade) ainda estão restritas a um contexto de experimentos controlados, 
com aplicabilidade limitada em casos concretos de regulação ou antitruste. 
Trata-se de situação distinta da que alcançou a economia comportamental, 
que já goza do status de programa de pesquisa consolidado, ainda que apar-
tado dos modelos econômicos convencionais.
O desenvolvimento da economia comportamental ocorreu apenas 
quando houve o encontro providencial entre economistas experimentais 
e psicólogos. Os primeiros aportaram a estrutura metodológica e de mo-
delagem do processo de escolha, enquanto os segundos trouxeram lentes 
para entender a cognição e processos mentais que lhes permitiram uma 
reformulação do pressuposto dominante de racionalidade plena. Entre 
eles se destacaram Amos Tversky e Daniel Kahneman, coautores com 
formação em psicologia e matemática, o que facilitou publicações em 
periódicos de economia e formulações teóricas que estabeleciam diá-
logo com estes. Como coloca o próprio Kahneman, suas contribuições 
iniciais, como a Prospect Theory, modificaram o mínimo possível do 
11 KLIBANOFF, P.; MARINACCI, M.; MUKERJI, S. “A smooth model of decision making under 
ambiguity”, Econometrica, v. 73, n. 6, pp. 1.849–1.892, 2005.
12 RIBEIRO, M. Comparative Rationality. documento do mercado de trabalho, Nova York: New 
York University, 2022.
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 economia comportamental e antitruste: deu match? 119
modelo prevalecente de escolha adotado pelos economistas.13 A conso-
lidação do programa de pesquisa se deu com a atração de economistas 
mais jovens, como Richard Thaler, que veio a receber o Prêmio Nobel de 
Economia por suas contribuições à economia comportamental em 2017, 
seguido por Colin Camerer e diversos outros.
É de Thaler a publicação que é tida como um marco inicial da eco-
nomia comportamental, o artigo “Toward a Positive Theory of Consumer 
Choice”, de 1980. Nele, está manifesta uma característica que sempre acom-
panhou este programa de pesquisa. Como expresso no próprio título do 
artigo, a análise do comportamento humano serve ao propósito da cons-
trução de uma teoria sobre como, de fato, consumidores (e outros agentes 
econômicos) escolhem. Em síntese, seu propósito é a construção de uma 
teoria com capacidade preditiva, algo que a aproxima do quese espera 
em uma aplicação no antitruste. Não é apropriada, portanto, a crítica de 
que se trataria de um paradigma ateórico, baseado apenas na documen-
tação de “anomalias” comportamentais observadas em experimentos em 
laboratórios.
Em apertada síntese, a economia comportamental modela o processo 
decisório como dois sistemas cognitivos, denominados automático e refle-
xivo. Esses sistemas cognitivos interagem com características do ambiente 
(e.g. normas sociais, precedentes etc.) e dos procedimentos que regulam a 
tomada de decisão (e.g. informações disponíveis, decisão monocrática ou 
deliberação colegiada, ordenação dos eventos etc.).14 O sistema cognitivo 
13 KAHNEMAN, D.; TVERSKY, A. (eds). Choices, values, and frames. Cambridge: Cambridge 
University Press, 2000. KAHNEMAN, D. Thinking, fast and slow. Nova York: Macmillan, 
2011.
14 A preocupação em explorar as consequências do relaxamento do pressuposto de racio-
nalidade plena não é exclusividade da economia comportamental. Oliver Williamson, um 
dos principais nomes da Nova Economia Institucional e recipiente do prêmio Nobel de 
economia de 2009, utiliza o pressuposto de racionalidade limitada, inicialmente proposto 
por Hebert Simon, segundo o qual o comportamento humano é intencionalmente racional, 
porém, de modo limitado. É por conta da incapacidade humana de resolver problemas 
complexos que contratos são incompletos. Racionalmente cientes de seus limites cogniti-
vos para desenhar um contrato completo, indivíduos desenham estruturas de governança 
para lidar com as contingências não antecipáveis no momento da celebração do contrato. 
As principais contribuições de Oliver Williamson já foram incorporadas ao antitruste, em 
particular na análise de restrições verticais e de fusões verticais. E o foram, essencialmente, 
por terem sido empiricamente bem-sucedidas. WILLIAMSON, O. E. “The new institutio-
nal economics: taking stock, looking ahead”, Journal of economic literature, v. 38, n. 3, 
pp. 595–613, 2000.
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120 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
automático é inconsciente, rápido, associativo, não controlável e demanda 
pouco esforço. Em contraposição, o sistema cognitivo reflexivo é conscien-
te, lento, dedutivo, controlável e custoso. Seres humanos utilizam ambos 
quando fazem suas escolhas (choices) e o modo como são combinados de-
pendem de normas sociais15 (values) e da estrutura do processo de decisão 
(frames). É esse modo de modelar o comportamento humano que dá títu-
lo a uma das principais referências em economia comportamental, Choices, 
Values and Frames, de Kahneman e Tversky16.
As implicações desse pressuposto de inspiração na psicologia cogniti-
va são várias. Mesmo quando utilizam o sistema reflexivo, seres humanos 
são limitados em sua capacidade de resolver problemas complexos, e quan-
do o fazem sua decisão é lenta e custosa. Por isso, apoiam-se em heurísticas 
de decisão (ou “regras de bolso”) que geram padrões de comportamento. 
Entre estas, três são destacadas na literatura: ancoragem, disponibilidade e 
representatividade.17
A ancoragem refere-se a um processo mental em que uma informação 
inicial (âncora) é tomada como referência para a decisão, que é posterior-
mente ajustada, porém de modo insuficiente, gerando um viés relacionado 
à âncora inicial. Há inúmeros experimentos em que essa heurística é docu-
mentada, como no efeito da primeira impressão na avaliação de candidatos 
a um emprego ou na ordem de votação em um colegiado.18
A segunda heurística trata do papel de exemplos e associações que es-
tão presentes na memória recente, que são utilizados como referência para 
decisões e escolhas dos indivíduos, sendo denominada disponibilidade. Por 
exemplo, em momentos de maior incerteza quanto à sua renda, por conta 
de seca profunda, agricultores têm pior memória e capacidade cognitiva 
em assuntos não associados à água, um efeito denominado tunneling. Ou 
15 A relação entre normas sociais e interação estratégica é uma das fronteiras de pesquisa em 
economia comportamental. A esse respeito, ver, por exemplo: BURSZTYN, L. et al. “Mo-
ral incentives in credit card debt repayment: evidence from a field experiment”, Journal of 
Political Economy, v. 127, n. 4, pp. 1.641–1.683, 2019. BURSZTYN, L.; EGOROV, G.; 
JENSEN, R. “Cool to be smart or smart to be cool? Understanding peer pressure in educa-
tion”, The Review of Economic Studies, v. 86, n. 4, 2019. pp. 1.487–1.526.
16 KAHNEMAN, D.; TVERSKY, A. (eds.). Choices, values, and frames. Cambridge: Cambrigde 
University Press, 2000.
17 THALER, R. H.; SUNSTEIN, C. R. Nudge. Nova York: Penguin Books, 2009.
18 KAHNEMAN, D.; SIBONY, O.; SUNSTEIN, C. R. Noise: a flaw in human judgment. Boston: 
Little Brown, 2021.
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 economia comportamental e antitruste: deu match? 121
seja, a proeminência desse tema na cabeça desses agricultores afeta o modo 
como escolhem e fazem julgamentos.19 Finalmente, a terceira heurística trata 
do efeito de estereótipos que induzem a associações que divergem da infe-
rência estatística que seria esperada se seres humanos fossem plenamente 
racionais. Muitas de nossas decisões pressupõem algum raciocínio estatís-
tico, como “devo confiar em uma dada marca?” ou “qual é a chance de um 
produto quebrar com um ano de uso”. A terceira heurística revela que não 
somos naturalmente estatísticos; ao contrário, utilizamos estereótipos para 
formar as expectativas utilizadas em nossas escolhas.
Essas três heurísticas geram padrões de comportamento que se mos-
tram robustos em estudos de laboratório e em evidências empíricas obtidas 
em ambientes não controlados. Em outras palavras, possibilitam predi-
ções robustas sobre o comportamento das pessoas, sejam consumidores, 
sejam empregados, sejam empresários. De modo irônico, Kahneman e 
outros denominaram essas regularidades comportamentais por “anoma-
lias”, como se fossem desvios em relação a um comportamento “normal”, 
quase aberrações.20 Ocorre que esses comportamentos ditos “anormais” 
são a melhor predição sobre como agem as pessoas em situações variadas 
— e não anômalas —, muitas das quais de elevada relevância econômi-
ca. São aqui denominadas “anomalias” não por sua falta de aderência 
ao mundo real, mas apenas por serem inconsistentes com o comporta-
mento racional.
Entre as diversas regularidades comportamentais observadas, duas me-
recem destaque: excesso de confiança e viés de status quo. A primeira está 
associada a uma subutilização sistemática de mecanismos de seguro, que 
não pode ser explicada apenas pelo grau de aversão ao risco. A segunda tra-
ta da inércia em decisões de consumo e investimento, entre outras, havendo 
maior propensão à manutenção da situação prevalecente. O viés de status 
quo decorre tanto da limitação cognitiva, que restringe o uso do sistema re-
flexivo que poderia revisar uma determinada escolha, quanto do chamado 
efeito de dotação (ou endowment effect), que gera um padrão de comporta-
mento de aversão à perda.
19 LICHAND, G.; MANI, A. Cognitive droughts. University of Zurich, Department of Economics, 
papéis de trabalho, n. 341, 2020.
20 KAHNEMAN, D.; KNETSCH, J. L.; THALER, R. H. “Anomalies: The endowment effect, loss 
aversion, and status quo bias”, Journal of Economic perspectives, v. 5, n. 1, pp. 193–206, 
1991.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 121 16/11/2022 10:55:30
122 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
Há diversas implicações desses resultados para a teoria econômica e, em 
particular, para o antitruste. Por exemplo, consumidores são mais relutantes 
em modificar suas decisões de consumo em contratos continuados, o que 
faz com que custos de mudança sejam mais relevantes. Também os custos 
de oportunidade, tão fundamentais para a análise econômica, deixam de ser 
equivalentes a um custo que implique desembolso,ou seja, deixar de ganhar 
algo é substancialmente diferente do que gastar em algo, algo que é indis-
tinto nos modelos convencionais. Finalmente, uma menção de particular 
interesse ao tema deste livro, empresas que são capazes de desenhar o con-
texto da escolha de consumidores, denominadas choice designers, dispõem 
de mecanismos para aumentar a fidelização e, portanto, reduzir a rivalidade 
em seus mercados. Essas e outras implicações são desenvolvidas em maior 
detalhe na seção seguinte.
2. implicações para o antitruste
São inquestionáveis as contribuições da economia comportamental para 
áreas tão variadas como marketing21, regulação22 e desenvolvimento23. Resta 
perguntar qual deve ser o seu impacto, se é que há algum, sobre a política 
e a prática da defesa da concorrência. Embora já existam algumas reflexões 
sobre o uso da economia comportamental no antitruste24, sua prática perma-
nece praticamente inalterada, diferentemente do que se observa em outras 
áreas da política pública.25 Deve-se questionar o porquê dessa relativa resis-
tência à mudança e quais áreas do antitruste deveriam ser mais permeáveis 
aos achados da economia comportamental.
Como um dos papéis fundamentais do conhecimento econômico no 
antitruste é a sua capacidade preditiva, o primeiro passo para se responder 
a essa questão é identificar em quais situações a economia comportamental 
21 THALER, R. “Toward a positive theory of consumer choice”, Journal of economic behavior 
& organization, v. 1, n. 1, pp. 39-60, 1980.
22 THALER, R. H.; SUNSTEIN, C. R. Nudge. Nova York: Penguin Books, 2009.
23 KREMER, M.; RAO, G.; SCHILBACH, F. “Behavioral development economics”, in Handbook of 
Behavioral Economics: Applications and Foundations 1. North-Holland, 2019. pp. 345-458.
24 Ver, por exemplo, publicação da Competition Policy International, dedicada ao tema. “Beha-
vioral Antitrust”, CPI Antitrust Chronical, jan., v. 1, 2019. 
25 Essa foi a conclusão unânime em evento do The Role of Behavioral Economics in Antitrust, 
organizado pelo Ibrac, 5 out. 2020. 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 122 16/11/2022 10:55:30
 economia comportamental e antitruste: deu match? 123
pode gerar melhores predições do que a dos modelos econômicos conven-
cionas de organização industrial, área da economia dedicada à análise da 
concorrência e estratégias empresariais. Para essa avaliação, é conveniente 
separar dois tipos de atores que interagem no mercado. De um lado, consu-
midores e investidores individuais agem autonomamente, defrontando-se 
com toda sorte de limitação em seu processo de escolha, de natureza cog-
nitiva, psíquica e de disponibilidade de tempo e de informação. De outro, 
empresas e demais organizações desenvolvem mecanismos de ação coleti-
va que podem abordar várias dessas limitações. Isso indica que o emprego 
da economia comportamental tende a ser mais promissor na análise de 
relações entre empresas e consumidores.
Mesmo no caso de empresas, contudo, a utilização do pressuposto de 
racionalidade plena deve ser qualificada. A literatura de gestão e de com-
portamento organizacional é pródiga em exemplos de decisões empresariais 
que são fruto de julgamentos apressados e sujeitos a viés.26 Não se tratam de 
“anomalias”, no sentido de incomuns; ao contrário, são problemas frequen-
tes, denominados na literatura por vieses sistemáticos, que geram efeitos 
relevantes nos mercados.27
Ainda assim, em que pesem essas ocorrências de viés e erros em decisões 
empresariais, parte considerável das proposições dos modelos convencio-
nais de organização industrial tem razoável corroboração empírica. Por 
exemplo, empresas que recebem um choque positivo de eficiência tendem 
a repassar parte desse ganho para os consumidores e este repasse é tan-
to maior quanto maior a intensidade de concorrência no mercado em que 
atuam.28 Ainda que empresas não sejam perfeitas maximizadoras de lucro, 
em média e em diversas circunstâncias, elas agem como se fossem, de tal 
modo que os modelos que utilizam racionalidade plena podem apresentar 
uma boa capacidade preditiva.
26 KAHNEMAN, D.; SIBONY, O.; SUNSTEIN, C. R. Noise: a flaw in human judgment. Boston: 
Little Brown, 2021.
27 DE BONDT, W.; F. M.; THALER, R. “Does the stock market overreact?”, The Journal of 
finance, v. 40, n. 3, pp. 793–805, 1985.
28 Como ilustração, ganhos de eficiência em fusões no setor de educação superior resultam 
em maior ampliação do número de matrículas se os mercados locais forem mais competi-
tivos. Ou seja, o repasse do ganho é maior quanto maior a concorrência, como predito pelo 
modelo teórico. Ver GARCIA, C. P.; AZEVEDO, P. F. de. “Should competition authorities care 
about conglomerate mergers?”, International Journal of Industrial Organization, v. 66, 
pp. 78–118, 2019.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 123 16/11/2022 10:55:30
124 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
Como no exemplo do jogador de sinuca, citado por Milton Friedman, 
há aqui um mecanismo de seleção, a própria concorrência, que faz com que 
o comportamento das empresas, em média e com o passar do tempo, cor-
responda aproximadamente ao que se esperaria de uma organização que 
maximiza lucros. Há dois mecanismos que geram esse processo de seleção. 
O primeiro é a exclusão das empresas ineficientes por força da concorrên-
cia. Uma empresa muito sujeita a erros de decisão ou vieses que a afastam 
das decisões que maximizam lucro não é capaz de se manter sustentável fi-
nanceiramente em um ambiente concorrencial.
O segundo é um mecanismo de imitação. As inúmeras empresas respon-
dem aos problemas complexos que lhes são apresentados de modo variado, 
sendo as melhores práticas selecionadas pelo mercado. As empresas com 
desempenho inferior, para sobreviver à concorrência, emulam práticas das 
mais bem-sucedidas, o que gera, neste caso, não um processo de seleção de 
empresas, mas de seleção de práticas empresariais. De um modo ou de outro, 
se há um mecanismo de seleção pela concorrência, os modelos econômi-
cos baseados em racionalidade plena são úteis para interpretar e predizer o 
comportamento das empresas.
A principal conclusão que se deriva do parágrafo anterior é a de que há 
mais motivos para a tutela da concorrência do que pressupõem os modelos 
convencionais de organização industrial. Mais do que promover a eficiência 
alocativa e redução do chamado “peso morto”, a concorrência é um meca-
nismo de seleção dinâmica de práticas (e empresas) mais eficientes. É por 
meio da concorrência que as melhores práticas empresariais são premiadas 
e emuladas pelas demais empresas que não foram capazes de apresentar a 
solução ótima para problemas que lhe foram apresentados. Um corolário 
dessa conclusão é que o objetivo da política de defesa da concorrência não 
deve se restringir à maximização do bem-estar do consumidor, mas antes à 
concorrência em si, por permitir o surgimento (entrada) de novas ideias e 
a seleção das mais eficientes. O bem-estar do consumidor, do modo como 
é representado e estimado empiricamente, pode não capturar essa dimen-
são fundamental da concorrência, que, como visto, não decorre do modelo 
convencional que pressupõe a escolha ótima das firmas.
Uma segunda implicação é a de que, na ausência de concorrência, não 
há fundamento para se pressupor que as empresas decidam sem vieses ou 
erros. Alguns modelos de organização industrial fazem uso de jogos dinâ-
micos que se apoiam fortemente no pressuposto de racionalidade plena e 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 124 16/11/2022 10:55:30
 economia comportamental e antitruste: deu match? 125
de conhecimento comum; e tratam justamente de interações entre empre-
sas com poder de mercado. Esse é o caso, por exemplo, da maior parte dos 
modelos de simulação de fusões. Neles, a estrutura típica é de um modelo 
de competição Bertrand em que se simula os efeitos de uma fusão. Versões 
mais sofisticadas podem acrescentar estágiosadicionais ao jogo, permitin-
do a entrada de empresas ou a formação de conluio. Seu uso em fusões de 
maior complexidade é razoavelmente disseminado, mesmo em jurisdições 
com maiores restrições de recursos, como é o caso do Brasil.
É interessante notar, contudo, que a capacidade preditiva desses mo-
delos está longe de ser um sucesso empírico. Como coloca Weinberg, em 
uma publicação em um dos mais prestigiosos periódicos de economia, “as 
simulações de fusões subestimaram de modo significativo seus efeitos so-
bre os preços”.29 Em resumo, as evidências empíricas sugerem que a prática 
da defesa da concorrência deveria ser mais cética em relação aos resultados 
obtidos por esses modelos. Além disso, evidências factuais que são expres-
são dos processos de entrada e de seleção de empresas, como histórico de 
entradas, ocorrência de inovações e volatilidade de participações de mer-
cado, poderiam desempenhar um papel mais relevante na inferência sobre 
a intensidade de concorrência nos vários mercados.
Essa cautela no uso de modelos econômicos cujos resultados dependam 
excessivamente da racionalidade plena e de conhecimento comum deve ser 
ainda maior em países em desenvolvimento. Nesses países a concorrência é 
muitas vezes menos intensa, por deficiências regulatórias ou protecionismo 
local, e a grande maioria das empresas são pequenas ou individuais, o que 
as torna mais sujeitas aos vieses e erros de decisão identificados pela eco-
nomia comportamental.30
Embora a discussão dos parágrafos precedentes revele motivos para 
ceticismo no uso de alguns modelos econômicos convencionais no anti-
truste, sua modificação depende da existência de uma alternativa superior, 
não apenas por sua aderência às evidências empíricas, mas também por 
29 WEINBERG, M. C. “More evidence on the performance of merger simulations”, American 
Economic Review, vol. 101, n. 3, pp. 51–55, 2011. Uma análise mais abrangente da 
acurácia de modelos de simulação de fusões pode ser encontrada em WEINBERG, M. C.; 
HOSKEN, D. “Evidence on the accuracy of merger simulations”, Review of Economics and 
Statistics, vol. 95, n. 5, pp. 1.584–1.600, 2013. 
30 KREMER, M.; RAO, G.; SCHILBACH, F. “Behavioral development economics”, in Handbook of 
Behavioral Economics: Applications and Foundations 1. North-Holland, 2019, pp. 345–458.
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126 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
sua aplicabilidade e capacidade de orientar o comportamento dos admi-
nistrados. Essa é uma crítica recorrente aos novos aportes teóricos, para os 
quais não foram ainda desenvolvidas regras de decisão claras e facilmente 
aplicáveis pelas autoridades da concorrência. Essa crítica, contudo, acaba 
por descartar usos pontuais e complementares que a economia comporta-
mental pode trazer à análise antitruste, sem a necessidade de substituição 
das práticas correntes.
A seguir, são elencadas algumas oportunidades de utilização dessas con-
tribuições, sem a pretensão de ser exaustivo. Tais contribuições são separadas 
em três blocos, que tratam de aplicações conceituais, análises empíricas e 
implicações para o desenho da política de defesa da concorrência. Seu propó-
sito é complementar à crescente literatura que explora possíveis intersecções 
entre a economia comportamental e o antitruste.31
2.1. aplicações conceituais
Uma das regularidades comportamentais com óbvio efeito concorrencial 
é o viés de status quo. Mesmo considerando, de modo conservador, que os 
resultados da economia comportamental se aplicam apenas a consumido-
res, o modo como estes reagem ao status quo tem importantes implicações 
para a intensidade de concorrência e condições de entrada. Quanto mais 
relevante for o viés de status quo, maiores devem ser os custos de mudança 
(switching costs) e os efeitos de inércia de consumo. Como consequência, 
quanto maior este viés, menor devem ser as oportunidades de contestação 
do poder de mercado e a intensidade de concorrência em um dado mercado. 
Um modelo empírico que estime apropriadamente o comportamento 
do consumidor frente a novas alternativas de compra pode ser suficiente 
para incorporar esses efeitos sem a necessidade de explicar a origem dos al-
tos custos de mudança. Mas a compreensão do mecanismo que está por trás 
desses custos (isto é, um viés de status quo) pode ser útil para a inferência 
qualitativa e para formulação de remédios.
31 BAILEY, E. M. “Behavioral firms: does antitrust economics need a theoretical update?”, Jour-
nal of Industrial Organization, vol. 47, n. 3, pp. 355–66, 2015. FLETCHER, A. “The EU 
Google Decisions: Extreme Enforcement or the Tip of the Behavioral Iceberg?”, Competi-
tion Policy International, 2019. REEVES, A. P.; STUCKE, M. E. “Behavioral antitrust”, Ind. 
LJ, vol. 86, p. 1.527, 2011. MARTIN, S. “Behavioral antitrust”, Handbook of Behavioral 
Indus trial Organization, 2018.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 126 16/11/2022 10:55:30
 economia comportamental e antitruste: deu match? 127
Um segundo ponto que merece ser considerado é a inclusão do acesso 
a dados e da expertise em como utilizá-los entre os ativos concorrencial-
mente relevantes. Em uma análise de fusões, a preocupação fundamental 
é a mudança de propriedade sobre ativos, como é típico de um ato de con-
centração, da qual podem decorrer mudanças de incentivo no modo de se 
utilizar esses ativos, no limite ocasionando uma redução da oferta e aumen-
to de preços. A prática usual do antitruste, contudo, não observa os ativos, 
mas a quantidade, o preço e a qualidade de um determinado bem, e esses 
critérios são implicitamente utilizados como um proxy para os ativos sob o 
controle de uma determinada empresa. Esse proxy guarda alguma relação 
com os ativos de produção, como máquinas, equipamentos e instalações, mas 
há ativos concorrencialmente relevantes que não se relacionam diretamen-
te com o volume produzido e, portanto, na prática antitruste, podem passar 
desapercebidos. Um desses é a propriedade de dados e da expertise em uti-
lizá-los de modo a explorar vieses comportamentais. Em atividades em que 
esses ativos são especialmente importantes, a delimitação do mercado re-
levante e a avaliação das condições de concorrência deveriam incorporar o 
controle sobre esses ativos como um item relevante da análise.32
Finalmente, um terceiro ponto que merece atenção são as condições 
para cooperação e condutas concertadas. Um dos resultados robustos ob-
tidos nos primeiros experimentos com a teoria dos jogos foi o elevado — e 
inesperado — nível de cooperação em interações estratégicas, como o jogo 
do ultimato e o dilema dos prisioneiros, em que a estratégia dominante é a 
defecção.33 A motivação para a propensão a cooperar pode ser atávica ou 
fundada em normas sociais, como explorado em inúmeros experimentos 
de campo por Elinor Olstrom, ganhadora do Prêmio Nobel de Economia 
em 200934.
Independentemente de seu fundamento, o fato é que o nível de coo-
peração no mundo real é maior do que o predito em jogos que procuram 
representar esse mesmo mundo; e essa cooperação é maior se for basea-
da em relações familiares ou como parte de uma rede social. A fim de dar 
32 ZINGALES, N. “Product market definition in online search and advertising”, Competition 
Law Review, 2013.
33 KAGEL, J. H.; ROTH, A. E. (eds.). The Handbook of Experimental Economics, vol. 2. Nova 
Jersey: Princeton University Press, 2020.
34 OSTROM, E. Governing the commons: The evolution of institutions for collective action. 
Cambridge: Cambridge University Press, 1990.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 127 16/11/2022 10:55:30
128 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
maior concretude a essa conclusão, vale citar o caso do cartel de peróxidos, 
cujos membros eram amigos, frequentavam o mesmo clube e selaram essa 
cooperação como compadres de batismo de seus filhos. O cartel no Brasil 
somente se rompeupor ordem da matriz de uma das empresas, que tinha 
a intenção de celebrar um acordo de leniência em diferentes jurisdições, 
como o fez, para desgosto dos executivos e compadres no Brasil. Normas 
sociais e redes de relacionamento pessoal afetam as condições de coopera-
ção, algo que merece ser considerado na análise de condutas concertadas.
2.1.1. Análises empíricas
A prática antitruste utiliza técnicas empíricas, como estimação de de-
manda e de efeitos de condutas, e modelos teóricos que estabelecem 
relações esperadas entre variáveis. Em algumas aplicações, o modelo teó-
rico está integrado às estimações empíricas, os denominados modelos de 
econometria estrutural, que possuem a virtude de permitir a estimação 
de variáveis relevantes que não são diretamente observáveis. Por exem-
plo, qual é a variação do bem-estar social decorrente de uma conduta? 
Ou, em uma análise prospectiva, qual será a variação de preços e even-
tual entrada de empresas após uma fusão? Uma estimação desprovida 
de uma estrutura teórica não permitiria quantificar, no primeiro caso, o 
bem-estar social (que não é observado, de fato, em nenhum momento) 
ou, no segundo caso, os preços futuros. Está aí muito da atração exerci-
da por modelos estruturais.
Mas o que muda se considerarmos que as pessoas — e as empresas, em 
ambientes menos competitivos — estão sujeitas a limites cognitivos e vieses 
de decisão? O estado da arte dos modelos de econometria estrutural requer 
a utilização do pressuposto de racionalidade plena; e muitas vezes com ele-
vado grau de exigência do cálculo racional desses agentes, como no caso de 
jogos dinâmicos. Como agravante, nesses modelos não há ambiguidades no 
ambiente em que empresas e consumidores decidem; diferenças infinitesi-
mais de payoffs esperados são suficientes para descartar possíveis reações 
estratégicas e caminhos fora do equilíbrio. É preciso muita fé para acreditar 
em seus resultados. E a consolidação dos resultados de economia compor-
tamental desafia essa fé.
É por esse motivo que Angrist e Pischke, ironicamente, denominam essa 
linha de pesquisa de industrial disorganization. Reconhecendo a relevância 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 128 16/11/2022 10:55:30
 economia comportamental e antitruste: deu match? 129
de modelos estruturais para orientar a política pública, os autores questio-
nam o grau de confiança que deve ser atribuído às suas estimações. Em suas 
palavras,
devem as autoridades antitruste favorecer as estimações derivadas de 
simulações de modelos complexos da nova organização industrial empí-
rica em comparação com análises transparentes da experiência passada? 
No mínimo, seria de se esperar que esta escolha seja baseada em evi-
dência que mostre que a abordagem baseada em simulação resulta em 
predições acuradas.35
As evidências empíricas trazidas pela economia comportamental con-
trastam com a relativa falta de evidências empíricas da validade das hipóteses 
auxiliares de modelos estruturais de organização industrial empírica. Esse 
fato é suficiente para olhar com maior ceticismo para os resultados desses 
modelos estruturais e dar maior ênfase às estimações empíricas que pres-
cindam da mesma exigência de racionalidade dos agentes econômicos. Esse 
é o caso, por exemplo, de estimações usando métodos de diferenças em di-
ferenças para a avaliação de efeitos de condutas passadas ou em mercados 
análogos para uma análise prospectiva. Também evidências qualitativas ou 
mais fracas do ponto de vista de identificação de causalidade não devem 
ser descartadas em uma análise antitruste. Aqui é importante notar que as 
autoridades antitruste, de modo sensato, muitas vezes as utilizam, mesmo 
quando não amparadas pelos seus departamentos econômicos.
2.1.2. Desenho da política de defesa da concorrência
Os resultados obtidos pela economia comportamental podem também ser 
úteis ao desenho da própria política de defesa da concorrência. Para além 
do uso do conhecimento em casos concretos, é interessante considerar suas 
implicações para a organização das investigações, para o processo de julga-
mento e para a negociação de acordos, apenas para citar alguns exemplos.
A princípio, o modelo de decisão colegiada e de separação entre inves-
tigação e julgamento atende a alguns critérios relevantes do que Kahneman 
35 ANGRIST, J. D.; PISCHKE, J.-S. “The credibility revolution in empirical economics: How 
better research design is taking the con out of econometrics”, Journal of economic pers-
pectives, v. 24, n. 2, pp. 3–30, 2010.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 129 16/11/2022 10:55:30
130 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
et al. (2021) denominam de higiene decisória.36 Mas há, obviamente, pon-
tos para aprofundamento. Uma área que pode se beneficiar de uma revisão 
de procedimentos sob as lentes da economia comportamental é a de rela-
cionamento com administrados, em particular a negociação de acordos. 
Segundo os mesmos autores, quanto mais estruturada for essa relação, me-
nos sujeita a erros de decisão estarão as autoridades ao rejeitar ou aceitar 
um acordo.
Deve-se também atentar para os riscos do uso inapropriado da eco-
nomia comportamental pelas autoridades antitruste, elas próprias sujeitas 
a vieses comportamentais. A prescrição de higiene decisória é a de res-
tringir a discricionariedade e latitude de interpretação das autoridades 
antitruste. Quanto maior é a discricionariedade em um julgamento — 
em oposição ao uso de regras de decisão —, maior é o ruído decisório 
(isto é, a variabilidade das decisões sem fundamentos nas característi-
cas do caso concreto).
Por isso, o uso da economia comportamental pela autoridade antitrus-
te não deve estar associado a uma maior discricionariedade na avaliação 
ou reinterpretação de atos de empresas e consumidores. O reconhecimento 
de que há vieses nas decisões de consumidores não autoriza as autorida-
des a elegerem qual seria a decisão “correta” a tomar, como se apenas elas, 
autoridades, não fossem sujeitas aos limites cognitivos. Há uma importan-
te implicação dessa discussão sobre a validade do princípio da preferência 
revelada, que toma a escolha do consumidor como um indicador de prefe-
rência e, portanto, útil para se inferir a qualidade percebida de um produto 
ou o bem-estar do consumidor. Ainda que o consumidor, por estar sujeito 
a vieses de decisão, possa fazer escolhas que não faria em outros contextos 
ou momentos do tempo, a autoridade antitruste não está em uma posição 
superior para presumir qual seria a melhor decisão para esse mesmo con-
sumidor. Isso equivale a dizer que a escolha de um consumidor ainda é o 
melhor indicador de sua preferência e, portanto, de bem-estar. Conferir à 
autoridade o poder de reinterpretar fatos, como a escolha do consumidor, 
traria maior discricionariedade ao julgamento, o que aumentaria erros de 
decisão e diminuiria seu desejável efeito de orientar comportamentos dos 
administrados.
36 KAHNEMAN, D.; SIBONY, O.; SUNSTEIN, C. R. Noise: a flaw in human judgment. Boston: 
Little, Brown, 2021.
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 economia comportamental e antitruste: deu match? 131
Esse problema pode ser contornado por meio da utilização de guias de 
análise e presunções explicitadas em, por exemplo, resoluções da autoridade 
antitruste, que preservem a higiene decisória e reduzam a discricionarie-
dade interpretativa na aplicação a casos concretos. Esse pode ser o caso de 
aplicações de conceitos já consolidados e com elevada corroboração empí-
rica, como viés de status quo, que pode orientar análises sobre barreiras à 
entrada e rivalidade. Eventualmente, com o desenvolvimento de análises a 
casos concretos e depuração pelo teste do tempo, a economia comporta-
mental pode contribuir para a fundamentação de presunção de ilicitude. 
Em paralelo, há um espaço muito relevante para ser ocupado pela economia 
comportamental no desenho daregulação ex-ante de ecossistemas digitais, 
tema aprofundado na próxima seção.
3. o que é particular para a análise de 
concorrência entre ecossistemas
As regularidades comportamentais identificadas pela economia comportamen-
tal e suas implicações para o antitruste não são particulares de ecossistemas 
digitais. A exploração de vieses comportamentais por parte de vendedores, 
selecionados por intenso processo concorrencial, era comum nas feiras da 
Pérsia, Roma, Timbuktu ou Istambul. As regularidades do comportamento 
humano são particulares aos seres humanos e não ao mundo digitalizado. É 
comum, contudo, associar os resultados iluminados pela economia compor-
tamental aos ecossistemas digitais, implícita ou explicitamente imputando 
maior efeito ou gravidade dos vieses comportamentais na economia digital.
Há fundamento nessa associação. Os ecossistemas digitais acumulam 
duas espécies de ativos que, uma vez combinados, possuem capacidade 
ímpar de explorar vieses comportamentais em sua relação com usuários e 
consumidores. Em suas diversas áreas de atuação, esses ecossistemas coletam 
dados individuais em circunstâncias diversas, como, por exemplo, hábitos de 
compra, preferências por assuntos e notícias, deslocamento geográfico, in-
teração em redes sociais, rotinas diárias, como horário de dormir e acordar, 
entre outras. Esse ativo pode ser combinado com um segundo, a capacidade 
de análise de dados, de forma a possibilitar a essas empresas ações de mar-
keting mais eficazes, aumento da fidelidade de consumidores e, portanto, 
redução da rivalidade e condições menos favoráveis para a entrada e o de-
senvolvimento de concorrentes. No limite, ecossistemas podem discriminar 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 131 16/11/2022 10:55:30
132 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
indivíduos de um modo que as grandes lojas de autosserviço seriam inca-
pazes, como comunicações e ofertas individualizadas.37
Além das considerações apresentadas no parágrafo anterior, ecossistemas 
digitais são tipicamente choice designers, ou seja, são capazes de manipular, 
em algum grau, as alternativas de escolha, informações e contexto apresenta-
dos para usuários e consumidores. As alterações de framing, de ancoragem, 
disponibilidade de informação e manipulação de propriedades de associa-
ção podem afetar de modo significante a escolha de consumidores.
Esses recursos, muito antes do desenvolvimento da economia com-
portamental como área de conhecimento, eram também utilizados por 
supermercados convencionais e, mais ainda, pelos vendedores das feiras 
da Pérsia ou, no século XXI, de Marrakech. Supermercados cobram pre-
ços distintos por produtos em gôndolas à altura dos olhos em comparação 
com aquelas situadas à altura dos pés; o mesmo ocorre na fila do caixa, onde 
buscam a última chance de se aproveitarem da compra por impulso. Muitos 
também contam com locutores que anunciam “ofertas imperdíveis”, que, por 
óbvio, alteram a disponibilidade e framing das escolhas dos consumidores. 
Também quem já passou pela experiência de barganhar por qualquer pro-
duto em uma feira em Marrakech sabe a diferença entre o amador (isto é, o 
consumidor) e o profissional (isto é, o vendedor) no processo de constru-
ção do contexto de barganha.
Ainda que essa prática esteja presente há séculos, na competição en-
tre ecossistemas, ela atinge outra dimensão. As oportunidades de desenho 
do contexto de escolha, subsidiadas por enorme quantidade de dados in-
dividualizados e processadas por sofisticados modelos de aprendizado de 
máquina, permitem estratégias mais eficazes, para o bem e para o mal, com 
o propósito de afetar as escolhas de usuários e consumidores.
Essa característica de ecossistemas digitais tem implicações diretas e 
claras para a tutela das relações de consumo e para o desenho regulató-
rio, em linha com o que desenvolvem Thaler e Sustein.38 A assimetria entre 
consumidor e empresas é magnificada na economia digital pelo controle 
sobre dados individuais e, sobretudo, pela capacidade que essas empresas 
37 Esse ponto é desenvolvido, entre outros, em SCOTT MORTON, F. et al. Committee for the 
study of digital platforms: Market structure and antitrust subcommittee report. Chicago: 
Stigler Center for the Study of the Economy and the State, University of Chicago Booth School 
of Business, 2019.
38 THALER, R. H.; SUNSTEIN, C. R. Nudge. Nova York: Penguin Books, 2009.
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 economia comportamental e antitruste: deu match? 133
têm de desenhar o contexto de consumo. A solução regulatória ótima, por 
consequência, difere daquela empregada para os setores convencionais da 
economia, sendo esperado um maior nível de proteção aos usuários e con-
sumidores. As suas implicações sobre a análise antitruste, contudo, não são 
tão claras e diretas como o são para a defesa do consumidor.
A assimetria entre empresas e consumidores não é uma condição su-
ficiente para justificar tratamento distinto pela defesa da concorrência. 
A indústria farmacêutica, por exemplo, tipicamente comercializa bens 
de crença (isto é, bens que possuem atributos relevantes para o consumo 
que não são observáveis pelo consumidor mesmo após sua utilização), 
um caso de informação assimétrica aguda e que, exatamente por isso, está 
sujeito à forte regulação setorial. Mas isso não implica necessariamente 
a ocorrência de problemas concorrenciais que exijam uma intervenção 
antitruste. Por exemplo, quando há diversos ofertantes de um mesmo 
medicamento, interagindo em intensa concorrência, não há posição do-
minante de nenhuma das empresas ou preocupações relacionadas a uma 
eventual fusão. Mas os problemas informacionais nas relações de consu-
mo continuam existentes.
Em síntese, não é a assimetria entre empresas e consumidores, ao menos 
de modo direto, que justifica um cuidado especial do antitruste com ecossis-
temas digitais. Se há forte concorrência entre plataformas, não há motivação 
para uma intervenção antitruste, mas permanecem os efeitos adversos da 
assimetria entre empresas e consumidores, que podem ser abordados pela 
política pública por meio de regulação ex-ante ou proteção a consumidores 
e à privacidade dos dados de usuários. O problema antitruste da assimetria 
entre plataformas digitais e usuários pode se dar de modo indireto, por meio 
da redução do número de concorrentes, das possibilidades de entrada e da 
rivalidade entre eles. A elevação de custos de mudança, fortalecidos pelo viés 
de status quo, e a maior capacidade de grandes empresas de tecnologia em 
elaborarem estratégias exclusionárias, por meio do desenho apropriado do 
contexto de consumo, podem reduzir a concorrência. Por serem elas também 
choice designers, possuem instrumentos adicionais para afetar as decisões de 
consumo de modo a facilitar estratégias anticompetitivas.
Não é demais acrescentar que há outros elementos relevantes para se 
justificar um cuidado especial da defesa da concorrência com ecossistemas 
digitais. A consolidação de empresas com elevado controle sobre informa-
ções e capacidade de afetar o jogo político e o desenho de políticas públicas 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 133 16/11/2022 10:55:30
134 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
talvez seja o mais importante deles. Como já comentei em alguns eventos 
sobre o tema, as chamadas tech-giants podem se tornar too big to be (pro-
perly) regulated. Mas esse tema extrapola o propósito deste artigo, dedicado 
às contribuições da economia comportamental para a análise antitruste.
Talvez seja desnecessário, por sua obviedade, fazer uma qualificação 
final. O fato de ecossistemas digitais, por sua característica de choice desig-
ners e controle de grande e variada massa de dados, gozarem de condições 
favoráveis para implementar condutas exclusionárias, não significa que o 
façam ou que o façam sempre. Há diversos outros elementosque condicio-
nam as estratégias dessas empresas, como a concorrência entre ecossistemas 
e a potencial inovação disruptiva de entrantes. Os incentivos, portanto, para 
estratégias pró-competitivas estão postos nesse mercado, e as evidências de 
intensa inovação pedem algum cuidado para que as análises antitruste sejam 
capazes de discriminar condutas pró-competitivas daquelas com propósito 
exclusionário. Está aqui a principal contribuição da economia comporta-
mental ao antitruste, de modo complementar ao conhecimento econômico 
convencional. A análise concorrencial necessária para se identificar se uma 
determinada conduta é ilícita pode ganhar acurácia com o poder preditivo 
da economia comportamental, sobretudo, na análise de ecossistemas digi-
tais, pela sua capacidade de explorar vieses comportamentais no desenho 
do ambiente em que usuários tomam as suas decisões.
Considerações finais
É incontestável o avanço da economia comportamental na academia e em 
diversas áreas da política pública. É crescente e relevante o espaço ocupado 
por essa linha de pesquisa nos principais periódicos de economia, no corpo 
de professores das principais universidades e, com alguma defasagem, em 
áreas da política pública em que a sua aplicação é mais imediata. Enquanto 
isso, a prática antitruste permaneceu relativamente imune a esse movimento.
Há dois tipos de objeções dominantes entre aqueles que explicitamente 
rejeitam uma maior permeabilidade do antitruste à economia comportamen-
tal. Primeiro, esta teria se desenvolvido como uma coleção de “anomalias” 
comportamentais, sem uma estrutura teórica que alavancasse a sua capaci-
dade preditiva. Para esses críticos, essas anomalias não seriam suficientes 
para afetar de modo relevante o comportamento de consumidores e firmas 
nos mercados.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 134 16/11/2022 10:55:30
 economia comportamental e antitruste: deu match? 135
A segunda objeção trata da dificuldade de incorporação dos resulta-
dos da economia comportamental ao paradigma vigente da nova economia 
industrial. Há diversos esforços em andamento, alguns sumariados no re-
cém-lançado Handbook of Behavioral Industrial Organization39, mas são 
esforços ainda incipientes. Esses críticos concluem que, no atual estado da 
arte, não há ganhos em se utilizarem os resultados da economia comporta-
mental na prática antitruste.
Essas duas objeções não merecem prosperar. Primeiro, a economia 
comportamental reporta mais do que “anomalias”. São regularidades com-
portamentais robustas e relevantes economicamente. Para a política pública, 
não deve haver nenhum apego especial a um determinado modelo teórico ou 
pressuposto comportamental. Interessa, em especial, a capacidade preditiva 
de uma teoria. Se modelar o comportamento humano é uma parte central 
para o desenho da política pública, então a economia comportamental me-
rece plena consideração, justamente por sua capacidade preditiva superior 
do comportamento humano. Além disso, o casamento entre teoria e testes 
empíricos sempre foi uma marca da economia experimental, e, posterior-
mente, pela economia comportamental. Esta não faz uso do mesmo tipo de 
modelagem formal que se consolidou na economia, mas não deixa de ser 
teórica e capaz de fornecer lentes para a interpretação de fatos observados.
A segunda objeção, por sua vez, parece presumir que o único modelo 
possível para se analisarem mercados é o da nova organização industrial, sen-
do os achados da economia comportamental úteis ao antitruste se e somente 
se forem passíveis de incorporação na estrutura analítica desse paradigma. 
Aqueles que advogam essa objeção parecem ser vítimas dos mesmos vieses 
comportamentais identificados pela economia comportamental, o excesso de 
confiança e o viés de status quo. Parece haver um desvio de julgamento em 
considerar que o paradigma corrente de organização industrial (viés de status 
quo) será capaz, preservando seu núcleo duro, de dar conta das evidências 
empíricas trazidas pela economia comportamental (excesso de confiança).
O problema aqui não está no apego à nova organização industrial, cuja 
contribuição à política pública é indiscutível, mas em se considerar que 
ela deve ser a única referência de análise da concorrência a ser utilizada da 
política antitruste. Fazendo uso da analogia de teorias como lentes para a 
39 TREMBLAY, V. J.; SCHROEDER, E.; TREMBLAY, C. H. (eds.). Handbook of behavioral 
industrial organization. Reino Unido: Edward Elgar Publishing, 2018.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 135 16/11/2022 10:55:30
136 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
interpretação do mundo real, não há por que não utilizar lentes multifo-
cais se isso melhorar a qualidade da política de defesa da concorrência. Em 
outras palavras, há ganhos na incorporação de resultados da economia com-
portamental à prática antitruste, seja para a análise de casos, seja para o seu 
próprio desenho institucional. Este capítulo, de modo não exaustivo, pro-
curou apontar algumas dessas oportunidades.
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5
Desafios à utilização da 
economia comportamental 
no antitruste
Luis Henrique Bertolino Braido
Este artigo versa sobre possíveis contribuições da economia experimental 
para o antitruste e lista alguns desafios a serem superados. Antes, porém, su-
mariza as influências clássicas da área de modo a permitir uma comparação 
desta com a proposta alternativa trazida pela economia comportamental.
A primeira seção descreve as bases filosóficas do pensamento econômico. 
Aponta para o fato de a ética utilitarista — base da economia clássica e da aná-
lise antitruste — ser consequencialista e, portanto, ordenar as escolhas sociais 
a partir do bem-estar que elas geram aos indivíduos. Discorre sobre como o 
problema de atribuição de valor quantitativo ao bem-estar individual evoluiu 
ao longo dos séculos e culminou nos conceitos de excedente do consumi-
dor e suas generalizações modernas, a variação equivalente e compensatória. 
A seção discute também as dificuldades de se compararem medidas de bem-
-estar entre indivíduos, passando pela visão utilitarista cardinal, pela crítica 
do utilitarismo ordinal e também por resultados recentes indicando a impos-
sibilidade de se agregar o bem-estar de agentes heterogêneos.
A segunda seção, por sua vez, expõe os pilares da economia comporta-
mental, apresentando os principais vieses cognitivos documentados. Debate 
o caráter eminentemente empirista de parte significativa dessa literatura, 
construída a partir da observação de padrões de comportamento humano 
obtidos em experimentos e, com raras exceções, sem grandes esforços deduti-
vos, visando à compreensão de suas causas. O empirismo experimental puro 
torna difícil a validação externa e a generalização dos padrões documentados.
A terceira seção faz uma breve discussão sobre se a origem de nos-
sos vieses cognitivos seria biológica — e, portanto, imutável — ou fruto de 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 139 16/11/2022 10:55:30
140 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
aprendizado a partir de nossas experiências de vida. À luz dessa discussão, 
apresenta o conceito de paternalismo libertário, o qual busca organizar o 
ambiente de escolha de forma a compensar os vieses comportamentais do 
ser humano sem, entretanto, restringir as opções disponíveis ao tomador 
de decisão.
Segundo os norte-americanos Cass Sunstein (jurista renomado) e Ri-
chard Thaler (economista laureado com o prêmio Nobel em 2017) caberia 
ao setor público induzir os indivíduos a “voluntariamente” escolherem o 
que é “verdadeiramente melhor” para si, em vez daquilo advindo de seus 
instintos “irracionais”. Entretanto, deve-se notar que, sob as hipóteses 
subjacentes à economia comportamental, não seria possível auferir o bem-
-estar a partir da escolha individual, tornando indeterminado o conceito 
de “verdadeiramente melhor”. A consistência interna do paternalismo li-
bertário depende de ética alternativa, não utilitarista, para determinar o 
que seria desejável e indesejável ao ser humano irracional. Uma possível 
saída seria adotar a ética utilizada na área de saúde para lidar com condi-
ções biologicamente determinadas e as psicologicamente construídas ao 
longo da história dos indivíduos.
A seguir, a quarta seção discute algumas tentativas bem-sucedidas de 
racionalização de vieses documentados pela economia comportamental. 
Algumas dessas pesquisas estudam como custos de atenção, de busca (search) 
e de troca (switching) poderiam levar agentes racionais a se comportarem 
de modo estranho e aparentemente irracional. Outra parte foca o desenvol-
vimento de estruturas utilitaristas (matematicamente consistentes) capazes 
de representar padrões de comportamento documentados experimental-
mente, tais como aversão a perdas, miopia, dificuldades de autocontrole e 
vícios. Trata-se de agenda de pesquisa muito promissora, capaz de incor-
porar à análise econômica tradicional alguns dos padrões comportamentais 
experimentalmente documentados.
A quinta seção traz uma discussão sobre as possíveis contribuições que 
os experimentos comportamentais poderiam trazer ao antitruste. Sumariza 
o estado da arte da análise concorrencial e discute o papel que o reconheci-
mento de vieses comportamentais teria sobre algumas questões tradicionais 
da área, tais como: (i) o papel da competição de mercado quando os agentes 
são racionais; (ii) a definição de mercado relevante; (iii) os efeitos potenciais 
de condutas unilaterais; (iv) os riscos da experimentação online; (v) o equi-
líbrio de mercados em que os consumidores tenham custos para trocar de 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 140 16/11/2022 10:55:30
 desafios à utilização da economia comportamental no antitruste 141
fornecedor; e (vi) a sustentabilidade de cartéis com administradores míopes; 
e (vii) a escolha entre diferentes frentes de combate a ilícitos.
Por fim, a última seção tece considerações sobre a atual estrutura do 
conhecimento e expõe alguns desafios que se apresentam a agenda compor-
tamental no antitruste.
1. Princípios do utilitarismo
Em sua acepção clássica, a ciência econômica baseia-se no princípio de os in-
divíduos serem capazes de comparar diferentes cestas de bens e escolher a(s) 
sua(s) preferida(s). Adicionalmente, costuma-se trabalhar com a hipótese de 
que essa estrutura de preferências seja racional (isto é, completa e transitiva) 
e, dessa forma, a escolha de um agente refletiria, por construção, aquilo que 
lhe traz máximo bem-estar dentre as opções disponíveis em seu orçamento. 
Vem daí o respeito dos economistas às escolhas realizadas, por mais absurdasque possam parecer a um observador externo.
A sustentação filosófica dessa visão de mundo deve-se ao trabalho de 
autores utilitaristas, defensores de uma ética na qual uma ação seja conside-
rada boa quando capaz de gerar felicidade a si e a outros. Seria difícil datar 
a origem desse pensamento, mas há traços dessa visão nas obras de Epi-
curo, na Grécia Antiga1. No século XVII, o bispo anglicano inglês Richard 
Cumberland defendeu a ética utilitarista com bastante clareza em sua obra 
De legibus naturae, de 1672, traduzida posteriormente para o inglês2.
No século XVIII, o teólogo presbiteriano irlandês Francis Hutcheson 
definiu “boa ação” como sendo aquela que busca a maior felicidade ao maior 
número de indivíduos. Em suas palavras: “In the same manner, the moral 
evil, or vice, is as the degree of misery, and number of sufferers; so that, that 
action is best, which procures the greatest happiness for the greatest num-
bers; and that, worst, which, in like manner, occasions, misery.”3
Pouco tempo depois, o filósofo escocês David Hume, célebre por sua con-
tribuição ao empirismo britânico, também analisou a virtude em termos de 
1 RUSSEL, B. A history of western philosophy, livro I, Capítulo XXVII. Nova York, 1945.
2 CUMBERLAND, R. A treatise of the laws of nature. Londres. John Maxwell (tradução), 
1727 (primeira edição, 1672).
3 HUTCHESON, F. An inquiry into the original of our ideas of beauty and virtue, Londres, 
1725.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 141 16/11/2022 10:55:31
142 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
sua contribuição útil. Em suas palavras: “The circumstance of utility, in all sub-
jects (…) is constantly appealed to in all moral decisions concerning the merit 
and demerit of actions.”4
No campo do direito, o italiano Cesare Beccaria realizou importan-
te defesa da utilidade social das punições legais, considerando injustas as 
penas baseadas em justificativas expiatórias ou revanchistas, assim como 
aquelas que excedam o necessário para dissuadir o espírito humano de in-
fringir a regras5.
No final do século XVIII e início do XIX, o filósofo e jurista inglês Je-
remy Bentham6 estendeu o pensamento utilitarista a diversos campos do 
conhecimento, incluindo o direito, a economia e a política. Tornou-se im-
portante porta-voz dessa visão consequencialista das ações humanas. Teve 
vida longa e participou da educação de John Stuart Mill, responsável por 
empregar a filosofia utilitarista para abordar temas práticos do século XIX7. 
Em obra vasta, Stuart Mill escreveu sobre lógica dedutiva, religião, economia 
política, liberdade, democracia, escravidão e sujeição das mulheres. Conso-
lidou o pensamento econômico clássico e influenciou de forma definitiva 
a ciência econômica8.
Na segunda metade do século XIX, os economistas Carl Menger9 (aus-
tríaco) e Willian Jevons10 (inglês) formalizaram e aplicaram o conceito de 
utilidade marginal, correspondente ao ganho de bem-estar (ou felicida-
de) advindo da adição de uma quantidade infinitesimal de consumo. Logo 
após, o inglês Alfred Marshall11, um dos mais influentes economistas de 
seu tempo, aprimorou tal entendimento e desenvolveu o conceito de exce-
dente do consumidor, o qual mensura a felicidade (ou utilidade) obtida no 
consumo de certo bem a partir da disposição a pagar do consumidor. Para 
4 HUME, D. An enquiry concerning the principles of morals, Londres, 1751.
5 BECCARIA, C. Dos delitos e das penas. Trad. de Alexis Augusto Couto de Brito. São Paulo: 
Quartier Latin, 2005.
6 BENTHAM, J. An Introduction to the Principles and Morals and Legislation. Londres: 
Batoche Books, 1781.
7 MILL, J. S. Utilitarianism. Londres, 1863.
8 ANSCHUTZ, R. P. “John Stuart Mill”, Encyclopedia Britannica, 2021.
9 MENGER, C. Principles of Economics. Mises Institute, James Dingwall and Bert F. Hoselitz 
(tradução), 2007 (primeira edição, 1871).
10 JEVONS, W. S. The theory of political economy. Oxford, 1871.
11 MARSHALL, A. Principles of Economics. Londres, 1890.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 142 16/11/2022 10:55:31
 desafios à utilização da economia comportamental no antitruste 143
esse autor, apesar de ser não observável, o bem-estar individual poderia ser 
medido indiretamente na métrica monetária. A disposição a pagar passou 
a ser compreendida como forma de se quantificar a felicidade obtida por 
cada indivíduo.
Temo não ser capaz de enfatizar adequadamente a importância do 
avanço conceitual patrocinado por Marshall. Ao atribuir valor às escolhas 
a partir da disposição a pagar de cada agente, alterou-se o patamar de apli-
cabilidade da agenda utilitarista.
Convém, ainda, notar a semelhança entre esse raciocínio e a estrutu-
ra de um leilão, no qual cada agente deve postar o quanto estaria disposto 
a pagar por um determinado bem. Leilões são conhecidos desde as primei-
ras civilizações da Antiguidade e tiveram seu uso bastante ampliado a partir 
do século XVII.
Por fim, deve-se mencionar que a construção proposta por Mar-
shall pressupõe a existência de um bem com utilidade marginal constante. 
A extensão do conceito de excedente do consumidor para estruturas de pre-
ferências mais gerais foi desenvolvida no século XX pelo economista inglês 
John Hicks, gerando os conceitos de variação equivalente e compensatória12.
1.1. Agregação de bem-estar
A agenda de atribuir valores quantitativos ao nível de bem-estar individual 
e comparar tais níveis entre diferentes indivíduos é denominada utilitarismo 
cardinal. Note-se que os trabalhos de Marshall e Hicks lidam com a questão 
de como mensurar a utilidade (ou felicidade) individual. Para os cardina-
listas, entretanto, faria sentido somar as utilidades obtidas por diferentes 
indivíduos de modo a se obter uma medida de bem-estar social — uma es-
pécie de felicidade agregada.
Esse aspecto da tradição cardinal não é bem aceito na microeconomia 
moderna. Como comparar a variação equivalente de indivíduos em diferen-
tes estratos de renda? Se um bilionário estiver disposto a pagar cem vezes 
mais do que eu mais por um copo d’água, isso significa que a sede dele é 
cem vezes maior do que a minha? Adicionalmente, como comparar políti-
cas públicas com efeitos heterogêneos sobre diferentes grupos da sociedade? 
12 HICKS, J. R. Value and capital: An inquiry into some fundamental principles of economic 
theory. Oxford, 1939.
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144 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
Bastaria escolher a política pública com maior efeito agregado? Ou faria senti-
do priorizar aquelas com efeitos positivos sobre grupos menos privilegiados?
Essas questões foram notadas pelo economista franco-italiano Vilfredo 
Pareto, ainda no século XIX. Em sua obra Manuale d’economia politica13, 
desenvolveu o conceito de curva de indiferença — o conjunto de cestas 
capazes de gerar o mesmo nível de bem-estar a um indivíduo. Esse ins-
trumental analítico tornou desnecessária a atribuição de valores cardinais 
às diferentes opções de consumo. Diante da impossibilidade de se agre-
gar o bem-estar de diferentes indivíduos, Pareto apresentou o critério de 
eficiência alocativa como forma de se atribuir valor às escolhas sociais.
Uma alocação é considerada eficiente no sentido de Pareto quando 
não existir realocação factível capaz de melhorar o bem-estar de um in-
divíduo sem piorar o de outro. Políticas públicas que não satisfaçam esse 
critério deveriam ser descartadas ou, ao menos, modificadas, de modo a 
incorporar a realocação geradora de ganhos coletivos. Restringe-se, assim, 
o conjunto de políticas públicas consideradas aceitáveis. Porém, o cri-
tério de Pareto é insuficiente para definir uma escolha social específica, 
pois o conjunto de alocações eficientes costuma ser amplo.
A questão sobre como escolher uma alocação dentre as várias que sejam 
eficientes atormentou os economistas durante a primeira metade do século 
XX.Modernamente, há consenso quanto à impossibilidade de se encon-
trar um sistema de escolha social que independa de algum tipo de arbítrio. 
Tal consenso se deve ao trabalho do economista norte-americano Kenneth 
Arrow e seu memorável teorema de impossibilidade, publicado em 195014, 
bem como às extensões deduzidas por seus compatriotas Allan Gibbard15 e 
Mark Satterthwaite16, na década de 1970, dentre outros.
Deparamo-nos, no antitruste, com situações em que a defesa da con-
corrência gera efeitos potencialmente benéficos ou maléficos a todos os 
13 PARETO, V. “Manual of Political Economy”, A Critical and Variorum Edition by Aldo Monte-
sano, Alberto Zanni, Luigino Bruni, John S. Chipman, and Michael McLure. Oxford: 1906.
14 ARROW, K. J. “A difficulty in the concept of social welfare”, Journal of Political Economy, 
58 (4), pp. 328–346, 1950.
15 GIBBARD, A. “Manipulation of voting schemes: A general result”, Econometrica, 41 (4), 
pp. 587–601, 1973.
16 SATTERTHWAITE, M. A. “Strategy-proofness and Arrow’s conditions: Existence and corres-
pondence theorems for voting procedures and social welfare functions”, Journal of Economic 
Theory, 10 (2), pp. 187–217, 1975.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 144 16/11/2022 10:55:31
 desafios à utilização da economia comportamental no antitruste 145
consumidores, tornando a questão da agregação irrelevante. Esse é o caso, 
por exemplo, quando se utilizam conceitos de excedente do consumidor 
para se analisar o efeito de condutas unilaterais ou de atos de concentração.
Entretanto, há também temas em que o problema de agregação se 
impõe, como, por exemplo, na análise de discriminação de preços a con-
sumidores heterogêneos. Deve-se permitir discriminação de preços pelas 
características do consumidor? Preços diferenciados por faixa etária? 
Descontos a quem se dispuser a comprar online durante a madrugada? E 
àqueles que escolham viajar fora de temporada?
Essas são questões que podem ou não envolver aspectos de eficiência 
produtiva (redução de custos). Porém, independentemente disso, qualquer 
análise dependerá de critérios subjetivos para ponderar ganhos e perdas ob-
tidos por diferentes consumidores.
2. economia comportamental
A tradição utilitarista guarda enorme respeito à liberdade de escolha indivi-
dual, da qual extrai seu juízo sobre o bem e o mal. Não questiona as escolhas 
individuais, ao contrário, orienta-se por elas.
A economia comportamental, por sua vez, baseia-se em uma construção 
alternativa na qual as escolhas humanas não seriam fruto de reflexão racional, 
mas, sim, de impulsos biológicos e hábitos, passíveis de erros e vieses cogniti-
vos. Experimentos com seres humanos sugerem que temos uma tendência a 
seguir as escolhas dos demais membros de nosso grupo social, fenômeno des-
crito pelo termo “comportamento de manada”. Costumamos preferir opções 
padronizadas (default bias) ou mais visíveis (saliency bias), fruto, em parte, de 
problemas de atenção. De maneira similar, a forma como as opções nos são 
apresentadas afeta nossas escolhas (framing bias).
A literatura na área também documenta que aceitamos pagar enormes 
prêmios para obter consumo imediato devido à miopia. Isso nos leva, muitas 
vezes, a adotar mecanismos custosos de comprometimento ou planejar certas 
atividades duras e abandoná-las quando chega a hora de começar (e.g., dietas, 
exercícios físicos e poupança para a aposentadoria). O fenômeno estaria presen-
te, ainda, na compulsão que algumas pessoas possuem com compras a crédito 
(como se as parcelas não fossem chegar).
Ademais, muitos agentes apresentam aversão à perda, o que é respon-
sável pela tendência de não vendermos ativos que se desvalorizaram ou 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 145 16/11/2022 10:55:31
146 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
valorizaram menos do que o esperado. Possuímos empatia pelos demais se-
res humanos e temos um sentimento de equidade que nos leva, por vezes, 
a adotar retaliações custosas diante de algo que nos pareça injusto. Temos 
também dificuldades com cômputos probabilísticos, dentre outros vieses 
documentados.
2.1. Dedução versus empirismo
O avanço da economia digital e das técnicas de aprendizado de máquina tem 
propiciado a experimentação em massa com seres humanos em ambiente 
de mercado. Muitos profissionais de marketing creem conseguir tirar pro-
veito disso. Sendo assim, por que discutir o que causa o comportamento? 
Não bastaria documentar como os seres humanos se comportam na prática 
e usarmos esse padrão em nossas análises?
Convém lembrar um fato relativamente recente que nos ajuda a pensar 
sobre essas duas perguntas. Tim Harford17 descreve a enorme repercussão 
gerada na comunidade científica pelos experimentos de um time de pes-
quisadores do Google, que, sem qualquer acesso a exames médicos, foram 
capazes de prever a forma como o vírus influenza se espalharia, e de fato o 
fez, pelas cidades norte-americanas ao longo de 2009. Faziam isso de modo 
mais rápido, barato e acurado do que o Centro de Controle e Prevenção de 
Doenças. Usavam dezenas de milhões de buscas no Google por termos re-
lacionado à doença e, assim, criaram o Google Flu Trends.
Perguntava-se à época sobre as razões de empenhar recursos para en-
tender as forças que levavam o vírus a se espalhar se pudermos prever onde 
ele está na prática. Raciocínios dedutivos seriam dispensáveis em um mun-
do com muitos dados.
Após o sucesso inicial, o Google Flu Trends passou a se mostrar menos 
acurado, apontando surtos da doença em locais nos quais ela não existia. 
Algo parecia estar errado com as previsões puramente empíricas.
Cogita-se que, ao longo dos anos, pessoas saudáveis também passaram 
a buscar informações sobre os sintomas e tratamentos ao vírus influenza. 
É possível também que esse mecanismo tenha força motriz própria. Quan-
do pessoas em um local começam a pesquisar sobre o vírus influenza no 
17 HARFORD, T. “Big Data: Are We Making a Big Mistake?”, Financial Times, 2014. Disponí-
vel em: https://www.ft.com/content/21a6e7d8-b479-11e3-a09a-00144feabdc0.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 146 16/11/2022 10:55:31
 desafios à utilização da economia comportamental no antitruste 147
Google, acende-se um alerta para a região no Google Flu Trends, multipli-
cando o interesse local pela doença mesmo sem qualquer caso registrado. 
Os pesquisadores do Google identificaram uma correlação empírica, mas 
ignoraram as relações causais subjacentes e, consequentemente, não foram 
capazes de prever as mudanças no padrão de comportamento.
Na verdade, a crítica ao empirismo puro não é nova. O olho nu vê o Sol 
girar em torno da terra, do Leste para o Oeste. A mente humana foi capaz 
de conjecturar, na Grécia Antiga, que o movimento de rotação do planeta 
Terra também poderia gerar dias e noites. Passaram-se muitos séculos até 
desenvolvermos experimentos capazes de comprovar esses movimentos.18 
Foi por meio da combinação de dedução lógica e experimentação empírica 
que avançamos nessa e em várias outras questões científicas.
Faria sentido abandonar isso agora? Ignorar as razões que motivam 
o comportamento humano e passar apenas a documentar escolhas ob-
servadas na prática? Desistir da análise dedutiva que nos permite pensar 
sobre situações nunca antes experimentadas? Metodologicamente, re-
side aí minha principal resistência à versão mais extremada da agenda 
comportamental.
3. Paternalismo libertário
Poderíamos atribuir uma origem biológica aos comportamentos experi-
mentalmente documentados. Nesse caso, nossos vieses cognitivos seriam 
inatos, selecionadas ao longo de muitas gerações por meio do processo de 
evolução da espécie.
Por outro lado, os profissionais ligados à psicologia costumam crer que 
nosso repertório de comportamentos é construído ao longo da vida. Nos-
sas experiências passadas modelariam as escolhas presentes. Não teríamos 
capacidade de antecipar as consequências de nossocomportamento a não 
ser a partir de projeções derivadas de experiências passadas similares. Serí-
amos, assim, filhos do hábito.
18 As teses sobre os movimentos de rotação e translação não foram aceitas na Grécia antiga. 
Elas foram retomadas pelo astrônomo polonês Nicolau Copérnico, no século XV, para com-
por seu modelo heliocêntrico para o sistema solar. As primeiras observações empíricas que 
permitiram testar a validade das teses de Copérnico foram geradas pelos diferentes teles-
cópios desenvolvidos no século XVII pelo italiano Galileu Galilei e pelo germânico Johannes 
Kepler.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 147 16/11/2022 10:55:31
148 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
O bem-estar individual não é levado em conta na teoria da seleção natu-
ral das espécies. Vieses selecionados para garantir a sobrevivência da espécie 
poderiam se tornar inúteis ao atual estágio de nossa evolução. Hábitos, por 
sua vez, são selecionados a partir de sua funcionalidade ao indivíduo. Isso 
lhes confere um caráter razoavelmente racional. Mas eles também poderiam 
nos limitar quando nos deparássemos com mudanças no ambiente.
Se a biologia ou os hábitos nos limitam, deveríamos confiar nossas deci-
sões a outrem? Na verdade, costumamos contratar profissionais habilitados 
para nos aconselharem ou até mesmo decidirem em nosso nome sobre tarefas 
consideradas complexas. Ademais, para algumas condições de saúde men-
tal, consultamos psiquiatras e psicólogos capazes de nos ajudar a controlar 
impulsos indesejados, por meio de medicamentos ou técnicas de modifica-
ção comportamental.
Naturalmente, teríamos interesse em pagar por inovações nessas áreas 
se elas fossem capazes de nos livrar de vieses cognitivos indesejáveis. Porém, 
mesmo na área de saúde, considera-se que a decisão de procurar ajuda deve 
ser prioritariamente do indivíduo. Cabe a ele decidir se algum viés cognitivo 
o incomoda suficientemente para isso. A defesa de tal autonomia, entretan-
to, depende da atribuição de alguma dose de razão ao indivíduo, nem que 
seja apenas para reconhecer que um comportamento irracional lhe gere 
frustração ou mal-estar.
Nesse contexto, teria o Estado o papel de proteger os consumidores de 
seus impulsos “irracionais”? Os norte-americanos Cass Sunstein e Richard 
Thaler creem que sim. Em um artigo publicado em 2003, esses autores 
cunharam a expressão “paternalismo libertário”, um tipo de paternalismo 
que organizaria o ambiente de escolha de forma a compensar os vieses e 
dificuldades cognitivas do ser humano19.
A economia comportamental considera que as pessoas sejam mal in-
formadas e tenham suas escolhas influenciadas, por exemplo, por miopia 
ou pela forma como as opções lhes são apresentadas. Os agentes públicos, 
equipados com o conhecimento iluminado da economia experimental, 
seriam capazes de direcionar as escolhas de forma a melhorá-las, sem re-
tirar grau substancial de nossa autonomia. Fariam isso sem restringir as 
opções disponíveis, apenas apresentando-as de forma a induzir a escolha 
19 SUNSTEIN, C. R.; THALER, R. H. “Libertarian Paternalism is Not an Oxymoron”, University 
of Chicago Law Review, 70 (4), pp. 1.159–1.202, 2003.
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 148 16/11/2022 10:55:31
 desafios à utilização da economia comportamental no antitruste 149
que promoveria o máximo bem-estar. O setor público idealizado por esses 
autores daria apenas um “empurrãozinho” para que os indivíduos façam 
“por si só” as escolhas certas.
Mas como definir bem-estar e escolha certa sem preferências racionais? 
A tradição utilitarista, conforme argumentado na primeira seção deste capí-
tulo, extrai o conceito de bem-estar a partir da escolha dos indivíduos. Não 
há juízo moral. Se o indivíduo aceita pagar para beber refrigerante porque 
a bebida lhe gera bem-estar, considera-se que ele ponderou adequadamen-
te sobre a felicidade instantânea do consumo e as consequências de longo 
prazo dessa escolha sobre sua saúde. A economia comportamental, por sua 
vez, argumenta que essa escolha poderia ser fruto de desinformação sobre 
os efeitos de longo prazo do consumo de refrigerante; de miopia, que nos in-
duziria a preferir o prazer imediato à saúde futura; ou ainda da forma como 
as opções estavam dispostas no cardápio (tornando, por exemplo, o refrige-
rante mais visível do que a água). O agente público — guiado pela economia 
comportamental e por essa proposta de paternalismo libertário — deveria 
desenhar o ambiente de forma a induzir a escolha que maximiza o “verda-
deiro” bem-estar individual.
Chamo atenção para o fato de que, sob as hipóteses da economia compor-
tamental, o bem-estar não poderia ser deduzido da escolha — excetuando-se 
casos de comportamentos “racionalizáveis”, conforme discutido na próxima 
sessão. A disposição a pagar estaria impregnada por nossos vieses e irracio-
nalidades, bem como pela forma de apresentação das opções disponíveis. 
Não obstante, Cass Sunstein e Richard Thaler consideram que o conceito 
de bem-estar não deva ser abandonado. Tanto no artigo original, quanto 
em livro publicado posteriormente20, os autores defendem uma avaliação 
mais “aberta” sobre o bem-estar individual. Trata-se, a meu ver, de propos-
ta vaga e perigosamente mal definida, ainda que os autores se restrinjam a 
sugerir que a ordem de apresentação das opções favoreça escolhas considera-
das moralmente corretas, tais como poupar e consumir produtos saudáveis, 
mantendo-se sempre a opção ao consumidor de não aderir à proposta pa-
drão sugerida.
Pessoalmente, penso que, se quisermos lidar com irracionalidades e vieses 
cognitivos que nos afetem mais profundamente, devemos olhar para a área 
20 THALER, R. H.; SUNSTEIN, C. R. Nudge: Improving Decisions About Health, Wealth, and 
Happiness. Londres: Yale University Press, 2008.
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150 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
de saúde. Os nutricionistas alertam sobre os benefícios de se reduzir o con-
sumo de refrigerantes. Entretanto, prevalece a máxima de avisar às pessoas 
sobre as consequências de seus hábitos e deixá-las escolherem como vivem.
Mas nem tudo são flores na área da saúde. A política pública torna-se 
bastante mais intervencionista quando trata de produtos mais danosos. O 
consumo de cigarro, por exemplo, é considerado muito nocivo à saúde. 
Adicionalmente, devido à escolha constitucional por um sistema de saúde 
universal, com seus custos rateados entre todos os brasileiros, o consumo 
de cigarro torna os fumantes em um peso financeiro aos não fumantes. 
Seja por conta dessa externalidade pecuniária, seja por crer na irraciona-
lidade dos fumantes, a política púbica brasileira obriga os fabricantes a 
informar os riscos mais graves do fumo nas embalagens de cigarros. Não 
apenas informações objetivas, mas também imagens chocantes de fetos e 
pulmões doentios. Algumas dessas imagens são de tirar o apetite, além da 
vontade de fumar. Promovem informação e mal-estar visando reduzir o 
hábito de fumar.
A política pública é ainda mais intervencionista quando se trata do con-
sumo de drogas consideradas ilícitas. As restrições ao cigarro e a proibição às 
drogas ilícitas se baseiam em outro tipo de ética, que prioriza a vida e a saúde 
da população, sem necessariamente ter compromisso com o seu bem-estar.
Sim, garantir a vida e a saúde das pessoas a qualquer custo pode ser 
extremamente danoso ao bem-estar. Essa dicotomia é, até certo ponto, re-
conhecida pelos profissionais de saúde. A autonomia do paciente — para 
escolher o tratamento ou decidir não se tratar — é um dos princípios da 
bioética. O paciente deve procurar voluntariamente ajuda profissional para 
tratar suas doenças, vícios e transtornos psiquiátricos e psicológicos. Ele 
deve ser informado sobre as opções disponíveis, podendo, ainda, recorrer à 
opinião de outros especialistas.
Por analogia, caso os viesesidentificados pela economia comportamen-
tal se mostrarem significativos na vida das pessoas, penso que deveríamos 
preservar a autonomia individual para procurar ajuda profissional ou acon-
selhamento. Na ausência de outras falhas de mercado, penso caber ao poder 
público promover campanhas educativas, alertando a população dos princi-
pais vieses e dificuldades cognitivas documentadas. Definir, aqui ou acolá, 
o que seria a opção padrão — a mais prudente, a mais saudável, a ecologi-
camente mais correta, ou a socialmente mais aceita — não causaria grandes 
danos caso as demais opções existentes continuarem disponíveis. Nesses 
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 desafios à utilização da economia comportamental no antitruste 151
casos, considero importante explicitar o critério de escolha pública, sem a 
falácia de que a intervenção vise o bem-estar social — conceito indefinido 
na ausência de preferências racionais.
4. racionalizando comportamentos estranhos
Nem todos os vieses cognitivos são automaticamente incompatíveis com a 
racionalidade. O comportamento de manada, por exemplo, pode ser fru-
to de algum instinto biológico, mas também apareceria em um ambiente 
com informação assimétrica, no qual o comportamento dos demais revele 
algo sobre fatos desconhecidos. Por exemplo, recomenda-se a um motoris-
ta dirigindo seu veículo em rua de mão única que, ao se deparar com uma 
sequência de carros se movimentando em sentido contrário, avalie a pos-
sibilidade de estar na contramão ou de algum evento externo ter mudado 
o sentido daquela rua. Nesse caso, seria racional aderir ao comportamento 
da manada, dar meia-volta e evitar acidentes.
Existe uma literatura dedicada a entender o comportamento de con-
sumidores submetidos a custos de transação, de procura (search costs) e 
de troca de fornecedor (switching costs). Alguns dos vieses atribuídos à 
cognição humana poderiam, na verdade, ser fruto da tentativa de redu-
zir tais custos.
Custos de processamento de informação, por sua vez, são capazes de 
gerar uma racionalidade limitada (bounded rationality). As aplicações dessa 
literatura à macroeconomia foram descritas por Thomas Sargent em 199321. 
A estrutura formal por trás desse tipo de análise é bastante padrão, com 
preferências racionais e sem maiores desafios para a análise de bem-estar.
Do ponto de vista de axiomatização microeconômica de resultados da 
economia comportamental, destaca-se o trabalho de Daniel Kahneman, lau-
reado com o prêmio Nobel de economia em 2002, e Amos Tversky. Esses 
autores documentaram, com base em estudos experimentais controlados, 
a presença de aversão a perdas no comportamento de agentes em situação 
de risco.
Inicialmente, em um artigo puramente empírico, de 1974, Tversky e Kahe-
neman realizaram diversos experimentos documentando como a cognição 
21 SARGENT, T. J. Bounded Rationality in Macroeconomics: The Arne Ryde Memorial Lectures. 
Oxford: Oxford University Press, 1993.
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152 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
humana utiliza “um número limitado de princípios heurísticos” para sim-
plificar a tomada de decisão em ambientes probabilísticos22.
Posteriormente, em 1992, os mesmos autores apresentam experimentos 
nos quais os agentes exibem aversão à perda — isto é, aceitam pagar prêmios 
para evitar o risco de perda23. Dito de outra forma, os autores documentam 
que, para evitar apostas nas quais perdem zero ou certo valor, com proba-
bilidades conhecidas, os agentes se dispõem a pagar quantias superiores ao 
valor médio da aposta. Entretanto, demandam receber menos que tal média 
para desistirem de apostas em que ganhem zero ou certo valor (com proba-
bilidades igualmente conhecidas).
Nesse trabalho de 1992, os autores também desenvolveram uma fun-
ção-utilidade capaz de racionalizar as escolhas com aversão à perda. Tal 
representação foi incorporada na literatura de apreçamento de ativos em um 
importante trabalho de Nicholas Barberis, Ming Huang e Tano Santos24. Foi 
também utilizada para estudar outros problemas práticos envolvendo risco, 
demonstrando como se dá a incorporação de novos conceitos à economia 
tradicional, após sua compreensão formal.
A miopia nas decisões de consumo e poupança é outro exemplo 
muito interessante. Convém detalhar o problema. Imagine que um indi-
víduo prefira consumir dois doces depois de amanhã em vez de um doce 
amanhã. Ou seja, aos olhos de hoje, o prêmio de 100% para postergar o 
consumo de amanhã para depois de amanhã seria aceitável. Imagine agora 
que amanhã, ao se deparar com a opção de consumir um doce imediata-
mente ou dois doces no dia seguinte, o indivíduo sucumba à tentação e 
mude seus planos.
Seria esse um comportamento completamente irracional? A racionali-
dade na economia é definida pela existência de um sistema de preferências 
completo e transitivo25. Evito detalhar esses conceitos, mas enfatizo que a 
existência de uma função-utilidade capaz de representar a escolha individual 
22 TVERSKY, A.; KAHNEMAN, D. “Judgment under Uncertainty: Heuristics and Biases”, Science, 
185 (4157), pp. 1.124–1.131, 1974.
23 TVERSKY, A.; KAHNEMAN, D. “Advances in Prospect Theory: Cumulative Representation 
of Uncertainty”, Journal of Risk and Uncertainty, 5 (4), 297–323, 1992.
24 BARBERIS, N.; HUANG, M.; SANTOS, T. “Prospect Theory and Asset Prices”, Quarterly 
Journal of Economics, 116 (1), pp. 1–53, 2001.
25 MAS-COLELL, A.; WHINSTON, M. D.; GREEN, J. R. Microeconomic Theory. Oxford: Oxford 
University Press, 1995, Capítulo 3.
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 desafios à utilização da economia comportamental no antitruste 153
dependa e implique esse nível de racionalidade. Sendo assim, a miopia não 
é um comportamento irracional, nesse nível mais elementar, uma vez que 
tais escolhas podem ser representadas por uma função-utilidade com des-
conto hiperbólico, conforme apresentado por David Laibson em 199726.
Tal função-utilidade, entretanto, apresenta o problema denominado 
“inconsistência temporal”. Ou seja, na data inicial, o agente decidiria um 
plano de consumo futuro, porém, no futuro, sem qualquer mudança em 
suas preferências, decidiria mudar seu plano inicial. Mesmo tendo prefe-
rências racionais (completas e transitivas), o agente míope não apresentaria 
estabilidade intertemporal de suas escolhas, um nível mais profundo de 
“racionalidade”.
Dito de outra forma, ainda que exista uma função-utilidade que re-
presente o comportamento míope, é desconfortável usar a ética utilitarista 
nessa situação. Se o agente pensar uma coisa hoje e outra amanhã, qual das 
duas personalidades deveria ser levada em conta para lhe atribuir bem-es-
tar? Não há resposta satisfatória para esta pergunta sem se recorrer a algum 
tipo de juízo moral. A maioria dos autores em economia orienta a análise de 
bem-estar pelas preferências do período inicial (antes de qualquer tomada 
de decisão), pois esta seria a preferência que prevalece caso exista possibili-
dade de comprometimento de longo prazo.
De modo alternativo, Faruk Gul e Wolfgang Pesendorfer desenvolve-
ram, em artigos de 200127 e 200428, uma estrutura de preferências capaz 
de representar situações em que sofremos tentações, compulsões, vícios, 
dificuldades de autocontrole, dentre outras condições capazes de levar a es-
colha com comprometimento de longo prazo a diferir daquela feita sem tal 
comprometimento. Posteriormente, em um artigo de 200729, os autores uti-
lizaram essa estrutura de preferências para comparar os efeitos de diferentes 
políticas de combate às drogas. Encontraram que políticas de proibição com-
pleta são preferíveis (aos olhos do agente, no período inicial) a políticas que 
26 LAIBSON, D. “Golden Eggs and Hyperbolic Discounting”, Quarterly Journal of Economics, 
112 (2), pp. 443–477, 1997.
27 GUL, F.; PESENDORFER, W. “Temptationand Self-Control”, Econometrica, 69 (6), pp. 
1.403–1.435, 2001.
28 GUL, F.; PESENDORFER, W. “Self-Control and the Theory of Consumption”. Econometrica, 
72 (1), 119–158, 2004.
29 GUL, F.; PESENDORFER, W. “Harmful Addiction”. Review of Economic Studies, 74 (1), 
147–172, 2007.
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154 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
aumentem os custos de se consumir drogas, sejam eles financeiros (taxação), 
sejam de oportunidade (estigma). A inconsistência intertemporal justifica-
ria políticas mais intervencionistas.
Enfatizo a importância metodológica de tais trabalhos, uma vez que a 
principal dificuldade de se incorporarem vieses cognitivos na análise eco-
nômica tradicional advém da ausência de estrutura matemática capaz de 
representá-los. A análise do equilíbrio de mercado — seja ele competitivo 
ou estratégico — depende de preferências bem definidas que guiem as es-
colhas dos diferentes atores.
Considero promissora a agenda de pesquisa que combina experimen-
tação empírica e dedução analítica formal. É preciso combinar a análise 
teórico-dedutiva com os novos “telescópios” que os experimentos compor-
tamentais oferecem. Eis um importante desafio a ser vencido para que a 
economia comportamental tenha impacto nas análises econômicas.
5. aplicações ao antitruste
Antitruste é uma área multidisciplinar. Nasce da interação entre direito e econo-
mia com o intuito de coibir práticas nocivas à concorrência e à livre-iniciativa. 
A defesa da concorrência é justificada por alguns resultados econômicos 
fundamentais. Descrevo-os brevemente a seguir.
Em um primeiro momento, a teoria econômica considera um ambien-
te idealizado, desprovido de irracionalidades, retornos crescentes de escala 
(que levem ao monopólio natural), externalidades e assimetrias de infor-
mação. Nesse cenário, sabe-se que o equilíbrio competitivo gera o máximo 
bem-estar para a sociedade, alocando eficientemente tanto os insumos entre 
firmas com diferentes níveis de produtividade quanto os bens finais entre 
os consumidores com diferentes preferências. O preço de mercado em um 
equilíbrio competitivo iguala-se ao custo de produção da última unidade 
produzida (custo marginal). As plantas mais produtivas são acionadas para 
produzir as primeiras unidades demandadas, gerando lucro às empresas. 
Quando o custo de se produzir a unidade extra se iguala ao preço de mer-
cado, firmas maximizadoras de lucro param de expandir sua produção. Os 
consumidores dispostos a pagar o preço de mercado são atendidos. Deixam 
de consumir o bem apenas os agentes cuja disposição a pagar pela unidade 
extra é inferior ao preço de mercado e, por consequência, ao custo de produ-
ção de tal unidade. Essa propriedade do equilíbrio competitivo é conhecida 
FGV-011_Aplicacao do Direito Antitruste_BOOK.indb 154 16/11/2022 10:55:31
 desafios à utilização da economia comportamental no antitruste 155
como sendo o “Primeiro Teorema do Bem-Estar”, resultado fundamental 
da ciência econômica.
Sabe-se, também, que o monopólio e diferentes formas de oligopólio 
geram perdas de bem-estar. Firmas com poder de mercado influenciam o 
preço de equilíbrio visando aumentar seus lucros, gerando como resultados 
tanto uma restrição na quantidade demandada quanto um preço superior ao 
custo marginal de produção. Em equilíbrio, alguns consumidores deixam de 
consumir o bem por não estarem dispostos a pagar o preço de equilíbrio, a 
despeito de estarem dispostos a pagar mais do que o custo de produção da 
unidade extra. Portanto, o equilíbrio com poder de mercado não é eficiente 
no sentido de Pareto, uma vez que deixa alguns agentes sem consumir, ainda 
que eles estejam dispostos a pagar mais do que o custo de produção do bem. 
Assim, haveria como aumentar tanto o lucro das firmas quanto o bem-estar 
dos agentes. Evitar essa fonte de ineficiência motiva e justifica o antitruste.
Por fim, a economia reconhece que os efeitos do poder de mercado 
podem não ser tão deletérios na presença de retorno crescente de escala, 
externalidade ou assimetria de informação. Diferentes estudos sobre esses 
temas motivaram a regulação de alguns mercados, tais como, energia elé-
trica, telecomunicação, saneamento, fármaco, seguro-saúde, dentre outros. 
Derivam daí as subáreas do direito e da economia dedicados a estudar a re-
gulação de mercados.
Esse é o contexto no qual a economia comportamental se apresenta ao 
antitruste. Seria prematuro afirmar se os experimentos comportamentais terão 
ou não impacto no campo de organização industrial — subárea da economia 
dedicada ao estudo de mercados não competitivos — e, consequentemente, 
no antitruste. Apresento exemplos práticos com o objetivo de ilustrar alguns 
desafios para a utilização dessa agenda de pesquisa no antitruste.
5.1. O papel da competição
Como visto, a competição tem um papel fundamental à promoção de bem-
-estar em ambientes sem irracionalidades ou fricções. Como isso se altera 
diante de agentes com vieses comportamentais? Pouco sabemos a esse res-
peito, mas é certo que a resposta dependerá do tipo de viés cognitivo tratado 
(se racionalizável ou não); da possibilidade de comprometimento do agente 
que tenha consciência de seus vieses; e do tipo de interação entre as firmas 
e os consumidores.
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156 A aplicação do direito antitruste em ecossistemas digitais 
A competição poderia disciplinar as empresas concorrentes, de modo a 
evitar a exploração de consumidores distraídos ou irracionais? Se cientes de 
nossas limitações cognitivas, demandaríamos pacotes ou políticas de preços 
capazes de evitar arrependimentos? Nesse caso, empresas interessadas em 
ganhar mercado deveriam ofertar soluções em vez de explorar oportunis-
ticamente os vieses dos consumidores? Agentes irracionais escolheriam as 
empresas que lhes oferecem tratamento justo em detrimento daquelas que 
os enganam? O atual estágio da economia comportamental não nos ofere-
ce respostas a essas perguntas.
5.2. Mercado relevante
A literatura experimental ainda não avançou a respeito de como nossos vie-
ses cognitivos afetam os padrões de substituição entre produtos semelhantes. 
A análise tradicional destes padrões é eminentemente empírica e, portan-
to, já incorpora eventuais vieses comportamentais. Assim, parece-me que o 
teste do monopolista hipotético continuará sendo o principal instrumento 
para definir o mercado relevante.
Seria possível conjecturar que, se a análise comportamental avançasse so-
bre os padrões de substitutibilidade, ela provavelmente nos levaria a definições 
mais refinadas de mercado relevante, considerando não apenas as dimensões 
de produto e geográfica, mas talvez alguma segmentação adicional pelo tipo de 
consumidor. Entretanto, produtos direcionados a diferentes tipos de consumi-
dor costumam conter características distintas, e, nesses casos, a segmentação 
por tipo de consumidor já estaria incorporada na dimensão do produto.
5.3. Condutas unilaterais
A licitude de condutas unilaterais que limitem a livre concorrência ou cons-
tituam abuso de poder dominante são analisadas a partir de seus efeitos. A 
presença de consumidores parcialmente incapazes potencialmente amplia 
os efeitos de certas práticas. Haveria um interesse do antitruste em saber 
quais práticas exclusionárias (visando limitar a livre concorrência) e explo-
ratórias (visando extrair renda do consumidor) seriam potencializadas pelos 
vieses cognitivos humanos.
A título de exemplificação, consideremos a prática de venda casada. 
Pode-se argumentar que, se uma parcela dos consumidores apresentar uma 
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 desafios à utilização da economia comportamental no antitruste 157
dependência psicológica por um produto fornecido por uma empresa com 
posição dominante, seu fornecedor teria uma enorme capacidade de

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