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AULA 1 GEOGRAFIA HUMANA E ECONÔMICA - CONCEITOS, TEORIAS E MODELOS Prof.ª Olga Lúcia Castreghini de Freitas 2 INTRODUÇÃO – GEOGRAFIA HUMANA E GEOGRAFIA ECONÔMICA – ORIGEM E TRAJETÓRIA A aula de hoje introduz alguns elementos importantes para o percurso que realizaremos visando compreender a importância da geografia humana e da geografia econômica no âmbito da geografia e, em especial, os principais conceitos, teorias e modelos explicativos utilizados nesses campos do conhecimento. Para tanto, faremos uma recuperação sucinta do que foi a trajetória da geografia para entender o movimento mais geral dessa área do conhecimento e que induziu, igualmente, o movimento interno das várias especialidades da geografia. Embora a geografia humana seja ampla e abarque uma variedade imensa de especializações e problemáticas, nessa disciplina haverá um enfoque especial na geografia econômica. O conceito de paradigma será basilar para compreendermos o citado movimento da ciência, ao longo do tempo. Após o quê, verticalizaremos esse conceito de modo a aplicá-lo à geografia para percebermos as diferentes trajetórias ocorridas ao longo do tempo. TEMA 1 – GEOGRAFIA – DE SABER POPULAR A CIÊNCIA Na atualidade, não temos dúvida em afirmar que a geografia é a ciência que tem como objeto de análise o espaço geográfico. Contudo, isso não foi sempre assim. Com o passar do tempo, novos desafios foram sendo colocados para a análise geográfica, como razão direta da maior complexidade do mundo, das inovações técnicas, das demandas sociais, das novas perspectivas metodológicas e das novas ferramentas de trabalho e compreensão do mundo. Nesse percurso, novos conceitos foram formulados e, por vezes, os mesmos termos passaram a ter novos significados. É fundamental entender que, embora certos termos permaneçam os mesmos ao longo da história da geografia, seus significados se alteraram, além de novos conceitos terem sido incorporados com maior força interpretativa no âmbito dessa ciência. Os conceitos não podem ser compreendidos descontextualizados de um tempo e um espaço específicos, pois são construções sociais e, como tais, seu 3 conteúdo é móvel em contextos espaço-temporais distintos. Isso será aprofundado na próxima aula. Vamos iniciar nosso percurso nesta disciplina por meio de uma introdução sobre a própria origem da geografia, sem o que não é possível entendermos o desenvolvimento dessas duas especialidades que intitulam a disciplina, respectivamente geografia humana e geografia econômica e seu escopo teórico- conceitual. Antes de tratarmos dos conceitos e teorias, é preciso ressaltarmos que esses também estão diretamente relacionados aos vários períodos ou momentos em que se pode reconhecer a trajetória da geografia. Uma observação importante é que a geografia é uma ciência relativamente recente quando se toma a história da humanidade como referência. Foi apenas no final do século XIX que ocorreu a sistematização do conhecimento geográfico sob a denominação de geografia. Etimologicamente, a palavra de origem grega geographia pode ser decomposta em geo, que significa Terra, e graphien, que significa descrever ou descrição, resultando, assim, em descrição da Terra. Portanto, todos os fenômenos que se manifestavam na superfície da Terra poderiam se constituir em tema de interesse geográfico. Apenas em meados do século XX o espaço passa a ser reconhecido como principal preocupação dessa área do conhecimento, como será tratado na próxima aula. Contudo, do ponto de vista do saber geográfico procedente do senso comum, ou seja, daquilo que está presente intuitivamente na interpretação e interesse das pessoas, os conhecimentos geográficos remontam à Antiguidade e sua prática estava diretamente relacionada aos viajantes, exploradores, entre outros. Moraes (2002, p. 33-34) afirma que [...] até o final do século XVIII, não é possível falar de conhecimento geográfico, como algo padronizado, com um mínimo que seja de unidade temática, e de continuidade nas formulações. Designam-se como Geografia: relatos de viagem, escritos em tom literário; compêndios de curiosidades, sobre lugares exóticos; áridos relatórios estatísticos de órgãos de administração; obras sintéticas, agrupando os conhecimentos existentes a respeito dos fenômenos naturais; catálogos sistemáticos, sobre os continentes e os países do Globo etc. Na verdade, trata-se de todo um período de dispersão do conhecimento geográfico, onde [sic] é impossível falar dessa disciplina como um todo sistematizado e particularizado. 4 Ainda para Moraes (2002, p. 34), A sistematização do conhecimento geográfico só vai ocorrer no início do século XIX. E nem poderia ser de outro modo, pois pensar que a Geografia como um conhecimento autônomo, particular, demandava um certo número de condições históricas, que somente nesta época estarão suficientemente maturadas. Estes pressupostos históricos da sistematização geográfica objetivam-se no processo de avanço e domínio das relações capitalistas de produção. Portanto, é com a emergência do modo de produção capitalista que uma série de novos campos do conhecimento surgem, denominados de ciências modernas, e, em especial, as ciências humanas, no âmbito das quais a geografia passa a se inscrever. Isso está diretamente relacionado às novas demandas de leitura da realidade, ou seja: o mundo, em rápida transformação, estava a exigir novas possibilidade interpretativas para além daquelas oferecidas pelas ciências naturais e exatas. Alguns pressupostos foram fundamentais para que a geografia se transformasse num campo de conhecimento autônomo. Foram elas, de acordo com Moraes (2002): • conhecimento efetivo da extensão real do planeta; • existência de um repositório de informações, sobre variados lugares da Terra; • aprimoramento das técnicas cartográficas; • correspondência, no plano filosófico e científico, das transformações operadas nos níveis econômico e político. Assim, não podemos compreender o surgimento da Geografia como ciência, no séc. XIX, sem que se situe o processo de unificação de territórios originando os Estados-nação. A Alemanha é um exemplo emblemático: para sua unificação (ocorrida por volta de 1871), era imperioso que se construísse uma unidade territorial e de identidade capaz de unir fragmentos que eram, até então, dispersos e distintos, não constituindo uma visão nacional. É importante lembrar que os seus vários territórios eram independentes, em termos de decisões, culturas, línguas próprias (os dialetos de hoje), e a Geografia cumpriu papel relevante nesse processo, na medida em que representou a compreensão de processos espaciais, cruciais para a realidade de então. 5 Não foi por acaso que Humboldt (Alexandre Von Humboldt, conselheiro do rei da Prússia; naturalista e viajante) (Figura 1) e Ritter (Karl Ritter, tutor de uma família de banqueiros; filósofo e historiador) (Figura 2) passaram a ser considerados os “pais” da geografia, pois tiveram papel essencial na proposição da geografia como instrumento prático de viabilização das novas demandas daquele tempo. Figura 1 – Alexandre Von Humboldt (1769-1859) Créditos: Everett Historical/Shutterstock. Figura 2 – Karl Ritter (1779-1859) Crédito: Marzolino/Shutterstock. 6 Saiba mais Como nossa preocupação nesse curso não é com a história da geografia, mas com elementos relacionados à geografia humana de modo geral, não adentraremos as especificidades da gênese da geografia como ciência moderna, o que poderá ser conhecido por meio da leitura de textos de diversos autores que contribuíram para a interpretação crítica desse momento histórico. Dentre eles, recomenda-se a leitura de: MORAES, A. C. R. de. A gênese da geografiamoderna. São Paulo: Hucitec; Edusp, 1989. _____. Geografia: pequena história crítica. São Paulo: Hucitec, 2002. PEREIRA, R. M. F. A. Da geografia que se ensina à gênese da geografia moderna. 120 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Centro de Ciências da Educação, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 1988. Disponível em <https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/75444>. Acesso em: 1 fev. 2019. TEMA 2 – RUPTURAS NO CONHECIMENTO – OS PARADIGMAS Desde o século XIX até o século XXI muita coisa mudou: o mundo se transformou, as pessoas também, assim como mudaram as perspectivas analíticas e metodológicas necessárias para a compreensão da sociedade. Isso não foi diferente com a ciência. Novas perspectivas emergiram e superaram as anteriores, num processo cíclico e desejável para o avanço do conhecimento. Nesse sentido, recorremos à proposição de Kuhn (1975), que nos oferece uma interpretação muito adequada desse processo ao formular o conceito de paradigma. Para o autor, paradigmas são “as realizações científicas universalmente reconhecidas que, durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares para uma comunidade de praticantes de uma ciência” (Kuhn, 1975, p. 13). Para Brunet, Ferras e Théry (1993, p. 365), paradigmas são o conjunto de problemáticas e seus métodos adotados por uma ciência em um momento dado, segundo uma das concepções do momento; grupo de questões julgadas centrais, ou dominantes, em uma ciência. Por essa compreensão, a ciência não se desenvolve de modo linear ou cumulativo, mas por rupturas ou revoluções, como denomina Kuhn (1975). Esses 7 momentos de rupturas promovem uma grande transformação naquilo que se considera o papel central de determinado ramo do conhecimento, seu temário, seus métodos e seus conceitos prioritários. Figura 3 – Paradigma como ruptura Crédito: Olivier Le Moal/Shutterstock. TEMA 3 – OS PARADIGMAS DA GEOGRAFIA Podemos afirmar que a geografia passou por diferentes paradigmas, que podem ser sintetizados com base nas seguintes denominações: geografia tradicional ou clássica; geografia teorética ou geografia quantitativa; geografia crítica ou radical; e virada cultural. 3.1 Geografia tradicional ou clássica A geografia tradicional ou clássica é justamente aquela que apontamos nos parágrafos anteriores, muito influenciada pelo método positivista de análise, que tem como uma de suas principais características o monismo metodológico, ou seja, o pressuposto de que as ciências são regidas por um método único. Nesse caso, oriundo das ciências naturais, tendo em vista serem estas as mais desenvolvidas à época. De forte influência alemã e francesa, em especial pela adoção do método monográfico regional, tinha por características ser descritiva e preocupar-se, sobremaneira, com inventários. Ressaltamos que, nesse momento, essas características convergiam para as demandas de um mundo que estava sendo ainda conhecido e explorado. Assim, a catalogação dos fenômenos existentes na superfície terrestre era útil e necessária. A geografia era feita por naturalistas, exploradores, viajantes. Não havia a formação universitária em geografia, fato que só ocorre, no Brasil, no início do século XX. 8 Nesse momento, as sociedades geográficas têm papel importante no debate e na sistematização do conhecimento produzido. No Brasil, o processo de institucionalização da geografia é marcado por três fatos importantes: 1. a criação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (USP), no ano de 1934, seguida, em 1935, pela criação da Universidade do Distrito Federal (atual Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ), sob forte influência da geografia francesa; 2. a criação da Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB), no ano de 1934; 3. a criação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no ano de 1936. Dessa maneira, teve início o processo de formação em geografia pela via do ensino superior, resultando na possibilidade de rompimento com a situação vigente anteriormente a esse período, quando aqueles que faziam geografia eram, na verdade, engenheiros militares, cartógrafos, advogados, historiadores, viajantes, entre outros profissionais. Saiba mais Recomenda-se o filme As montanhas da Lua (1990), que retrata a trajetória de dois “geógrafos” britânicos para encontrar as nascentes do rio Nilo, na África. O filme contribui para o conhecimento do contexto existente no século XIX, das dificuldades práticas das expedições até os debates para legitimar o conhecimento produzido. 3.2 Geografia teorética ou quantitativa Também denominada de nova geografia, na medida em que propunha uma perspectiva distinta da anterior, a geografia teorética ou quantitativa prioriza a elaboração de teorias e modelos explicativos da realidade. Parte dos modelos que trabalharemos em aula futura são originários desse momento ou paradigma. Com ele, o neopositivismo tomado como referencial metodológico implicava a tentativa de matematização dos fenômenos, de modo a legitimar a condição de ciência, da geografia. Assim, uma importante influência da estatística e da matemática é observada, abstraindo-se a sociedade, por vezes reduzida meramente à noção de população. De forte influência anglo-saxônica, essa corrente se manifestou no Brasil no final dos anos de 1960 e, de modo mais expressivo, na década de 1970. 9 Saiba mais Para um contato mais próximo ao tipo de conhecimento produzido no âmbito desse paradigma, recomendamos a consulta aos seguintes textos: MENEZES, A. C. F.; MENEZES, W. C.; OLIVEIRA, E. X. G. Um modelo para estudo da difusão de emissoras de televisão nas cidades brasileiras: uma versão preliminar. Revista Brasileira de Geografia, Rio de Janeiro, v. 37, n. 3, jul./set. 1975, p. 56-72. NASCIMENTO, M. das G. de O.; BECKER, O. M. S. O uso da cadeia de Markov como instrumento de mensuração de uma distância funcional percebida entre lugares. In: FAISSOL, S. (Org.). Tendências atuais na geografia urbano- regional: teorização e quantificação. Rio de Janeiro: IBGE, 1978. p. 217-224. 3.3 Geografia crítica ou radical A geografia crítica ou radical se caracteriza pela ruptura com a forma anterior de pensar e fazer geografia, propondo uma crítica radical às concepções, modelos e práticas anteriores. Sua base metodológica é o materialismo histórico e a lógica dialética, utilizando, assim, de formas mais sofisticadas de reflexão e colocando a sociedade e suas demandas e problemas como centro da atenção dos geógrafos. Em especial, as condicionantes oriundas da economia foram ressaltadas. A realidade passa a ser lida por meio de contradições e os pares dialéticos têm papel essencial nesse momento. Assim, o subdesenvolvimento, por exemplo, só pode ser compreendido pela existência de seu oposto, o desenvolvimento, numa relação de dependência indissociável, pois um só existe em face do outro. No Brasil, foi na década de 1980 que essa perspectiva se fortaleceu e passou a orientar a maioria da produção acadêmica na geografia, embora correntes anteriores ainda fossem observadas, mas de modo residual. Metaforicamente, podemos dizer que a lógica dialética proporciona uma forma de raciocínio tal qual uma espiral na qual o ponto de chegada jamais será o de partida, tendo em vista a complexidade crescente que se incorpora ao pensamento, por meio da formulação de uma tese, confrontada com sua antítese e posterior alcance da síntese, que se revela como uma nova tese e assim sucessivamente. Logo, essa metáfora da espiral se contrapõe àquela do círculo que se fecha em si mesmo (Figura 4). 10 Figura 4 – A espiral e o círculo como metáforas Créditos: Yes - Royalty Free/Shutterstock. 3.4 Virada cultural Embora a corrente crítica ainda seja muito importante na atualidade, sobretudo porqueé capaz de oferecer explicações acerca da realidade vigente no Brasil, a mudança do milênio se fez acompanhar, igualmente, de novas proposições e preocupações. Assim, para muitos autores, teríamos vivido, no final do século XX e início do XXI uma virada cultural, muito relacionada às proposições que afirmam estarmos num período de pós-modernidade, portanto, com transformações substanciais na forma de interpretação da realidade e com alteração no temário da própria geografia. A cultura passa a ser o fio condutor das novas narrativas que analisam os grupos sociais e possui relação direta com a determinação dos fenômenos políticos e econômicos. Saiba mais Para o aprofundamento dessa discussão, recomenda-se a leitura do texto: PEDROSA, B. V. O império da representação: a virada cultural e a geografia. Espaço e Cultura, v. 1, n. 39, p. 31-58, 2016. Disponível em: <https://www.e- publicacoes.uerj.br/index.php/espacoecultura/article/view/31750/22475>. Acesso em: 1 fev. 2019. https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/espacoecultura/article/view/31750/22475 https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/espacoecultura/article/view/31750/22475 11 TEMA 4 – AS SUBDIVISÕES DA GEOGRAFIA Concomitantemente às transformações da geografia, e de modo a responder às demandas necessárias à sociedade dos vários tempos tratados anteriormente, também ocorreu o aprofundamento temático e emergiram novas especialidades, ao longo do tempo. Certos ramos, como são comumente denominadas essas especialidades, surgiram, outros assumiram um segundo plano nas preocupações da geografia. Assim, podemos pensar em alguns agrupamentos, que podem nos ajudar a entender “onde” se situam a geografia humana e a geografia econômica, nosso objeto de preocupação nessa disciplina. De modo amplo e em relação à escala, podemos apontar duas perspectivas de análise, na geografia: • geral; • regional. No campo temático, também podemos distinguir duas perspectivas: • geografia física; • geografia humana. Observe que preferimos utilizar a palavra distinguir e não dividir, isso porque não se pode entender a geografia “partida”, embora se deva reconhecer a distinção entre seus componentes temáticos e as especificidades que eles requerem. Dessa forma, são reconhecidos – dentre outros – como ramos da geografia física: • climatologia; • geomorfologia; • biogeografia; • hidrologia; • paleogeografia. Por sua vez, a geografia humana se desdobra em diversas especialidades, com destaque para: 12 • geografia urbana; • geografia rural ou agrária (a depender da perspectiva teórico-metodológica adotada e da ênfase pretendida na análise); • geografia da população; • geografia política; • geografia econômica, subdividida em: • geografia agrícola; • geografia industrial; • geografia dos transportes. Recentemente, emergiram outras especializações, em razão das novas problemáticas do mundo moderno. Entre outras, podemos citar: • geografia da internet e do ciberespaço; • geografia feminista; • geografia da inovação; • geografia do comércio. Esforços de totalização do conhecimento geográfico devem ser registrados. O mais relevante nos parece ser aquele que propõe uma geografia socioambiental, que considera que [...] a abordagem geográfica do ambiente transcende à desgastada discussão da dicotomia geografia física versus geografia humana, pois concebe a unidade do conhecimento geográfico como resultante da interação entre os diferentes elementos e fatores que compõem seu objeto de estudo. (Mendonça, 2002, p. 123) Expressa, assim, o reconhecimento da necessidade de superação da dicotomia entre geografia física e geografia humana, buscando uma perspectiva integradora. TEMA 5 – GEOGRAFIA HUMANA E GEOGRAFIA ECONÔMICA Nessa disciplina nos interessam mais de perto a geografia humana e a geografia econômica. Contudo, uma advertência é necessária: a geografia humana se constitui numa dimensão mais ampla e em seu âmbito encontra-se a 13 geografia econômica. Portanto, temos uma questão de ordem a considerar na análise de ambas. A geografia humana se preocupa, de modo geral, com a expressão espacial dos grupos sociais em suas mais diversas dimensões. Tem, portanto, um amplo espectro de preocupações. Seu temário é amplo e abrange questões relacionadas às populações, migrações, religiões, cidades, modos de vida, atividades econômicas, consumo, transporte, agricultura, entre outras, sempre na perspectiva de sua compreensão como elementos essenciais à constituição do espaço geográfico, conceito que será desenvolvido oportunamente. Pela natureza e diversidade de problemáticas, não se faz geografia humana sem que se busquem elementos em uma gama variada de outras disciplinas, com ênfase em: sociologia, economia, urbanismo, antropologia, ciência da comunicação, demografia. Assim, o conhecimento geográfico é também caracterizado pelo diálogo com as demais áreas do conhecimento. Não se trata de afirmar que a geografia é, ela própria, interdisciplinar, mas que o conhecimento por ela produzido depende em muito daquilo que é tratado por outras disciplinas. A geografia econômica, por sua vez, preocupa-se, segundo Small e Witherick (1992, p. 128), “com a distribuição das actividades económicas e com os factores e processos que afectam a sua ocorrência no espaço”. Trata-se de uma definição ampla, mas que permite compreender os principais elementos constitutivos dessa especialidade. Assim, setores como o agrícola, o industrial e o de transportes são considerados como núcleo duro desse ramo. Benko e Scott (2004, p. 152) afirmam que a tarefa atribuída à geografia econômica contemporânea “consiste em descrever a organização espacial da economia, e em particular, esclarecer as maneiras pelas quais a geografia influencia o funcionamento econômico do capitalismo”. Foi somente após os anos de 1950 que ela se afirma como campo de pesquisa do escopo da geografia. Com os fundamentos tratados na aula de hoje, esperamos que as bases da conformação do pensamento geográfico estejam claras, de modo que possamos prosseguir e nos aprofundar sobre seus conteúdos teóricos e analíticos, com o enfoque na geografia humana e da geografia econômica como ramos do conhecimento geográfico e diretamente dependentes do movimento maior dessa disciplina. 14 5.1 O que virá nas próximas aulas... Após essa visão ampla da geografia, de modo a situar as duas especialidades de nosso interesse, respectivamente geografia humana e geografia econômica, nas próximas aulas vamos abordar as bases conceituais desse campo do conhecimento, com ênfase nos conceitos de espaço, região, território, paisagem e lugar. Teorias e modelos também farão parte de nossas preocupações, assim como a discussão das bases de dados e fontes de informação, em especial daquelas disponíveis no Brasil, ressaltando os temas mais recorrentes na pesquisa atual. 15 REFERÊNCIAS BENKO, G.; SCOTT, A. J. La géographie économique: traditions et turbulences. In: BENKO, G.; STROHMAYER, U. (Org.). Horizons géographiques. Paris: Éditions Bréal, 2004. p. 151-192. BRUNET, R.; FERRAS, R.; THÉRY, H. Les mots de la géographie: dictionnaire critique. Montpellier: La Documentation Française, 1993. p. 365. KUHN, T. S. A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva, 1975. MENDONÇA, F. de A. Geografia socioambiental. In: MENDONÇA, F. de A.; KOZEL, S. (Org.). Elementos de epistemologia da geografia contemporânea. Curitiba: Ed. UFPR, 2002. p. 121-144. AS MONTANHAS da Lua. Direção: Bob Rafelson. EUA: TriStar Pictures, 1990. 136 min. MORAES, A. C. R. de. A gênese da geografia moderna. São Paulo: Hucitec: Edusp, 1989. _____. Geografia: pequena história crítica. São Paulo: Hucitec, 2002. PEDROSA, B. V. O império da representação: a virada cultural e a geografia.Espaço e Cultura, v. 1, n. 39, p. 31-58, 2016. PEREIRA, R. M. F. A. Da geografia que se ensina à gênese da geografia moderna. Dissertação (Mestrado em Educação) – Centro de Ciências da Educação, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 1988. Disponível em <https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/75444>. Acesso em: 1 fev. 2019. SMALL, J.; WITHERICK, M. Dicionário de geografia. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1992.