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Aula 5 - PROCESSO ORÇAMENTÁRIO PESSOAL1 Introdução Organizar a vida financeira, de modo que as preocupações relacionadas ao uso do dinheiro não nos atinja requer que todos os nossos compromissos financeiros estejam quitados; além disso, por que não dizer, que ainda possamos direcionar recursos para outras finalidades, como investimentos ou quitação antecipada de dívidas (CNDL, 2017). O Serviço de Proteção ao Crédito estudou o comportamento de consumidores aqui no Brasil e descobriu que “a maioria das pessoas admite algum tipo de dificuldade para controlar seu orçamento”. Uma grande porção2 desta amostra não considera o controle do orçamento pessoal uma prioridade (SPC, 2015). Saber lidar com um orçamento doméstico é fundamental para uma boa condução das finanças pessoais. É importante entender as vantagens de planejar-se para acompanhar o orçamento pessoal e familiar (MENDES, 2015). O planejamento nos permite antever o fluxo financeiro que irá ocorrer em nossa conta corrente e/ou em nosso caixa (o dinheiro que temos em nossa carteira). Seu uso possibilita o direcionamento dos nossos gastos e, desta maneira, temos condições de melhorar nossa situação financeira continuamente. Existe a recomendação (SANTOS E MOREIRA, 2018) de que o planejamento financeiro pessoal seja uma das alternativas para viver financeiramente de maneira equilibrada, através do controle de ganhos e despesas da família. De maneira equivalente, (ANDRÉ, 2018) indica o crescimento da necessidade da população saber gerenciar seu patrimônio. Precisamos considerar que a maioria das pessoas no Brasil cresce sem receber noções sobre educação financeira. Lidar com dinheiro exige de nós disciplina, comprometimento e estudo, além de uma grande mudança de mentalidade (NIGRO, 2018). Demandamos gerir nossas finanças de modo que tenhamos como objetivo a independência financeira, quando o valor de rendimentos que possamos ter possam prover o valor dos nossos gastos. Precisamos, para isso, investir em nossa independência financeira, planejando com cuidado cada uma de suas etapas (NIGRO, 2018) A CVM (2014) nos orienta sobre a criação de um orçamento: devemos fazer uma tabela listando receitas e despesas (estimadas) que pretendemos ter. Desta maneira, podemos priorizar gastos com base em metas e faremos isso com acompanhamento periódico, produzindo ajustes após comparação entre valores previstos e executados. É muito importante conversar com a família sobre o orçamento para que os nossos objetivos possam ser alcançados. O Serviço de Proteção ao Crédito (2015) evidencia que a maior parte dos brasileiros não estão à vontade para organizar e gerenciar seu dinheiro, indicando como motivos a disciplina para manter registros regulares, o fato de não se lembrar dos gastos, a falta de tempo, a preguiça e não saber fazer o orçamento ou ainda por onde começar essa tarefa. A educação formal parece ter relação com boas práticas financeiras pessoais. 2 A porção é de 64% desta amostra. 1 Texto produzido pelo Coordenador da Disciplina de Finanças Pessoais - fevereiro de 2022. 2 Previsão orçamentária Fazer a previsão orçamentária significa prever valores que irão ocorrer num período futuro. Por exemplo, no mês de março, podemos prever a movimentação financeira de abril, ou ainda, ao fim de um determinado ano, podemos prever o que vai acontecer no ano seguinte. Por ser uma previsão, devemos entender que os valores não tem exatamente um compromisso de precisão, sendo muito mais aceito que eles possam estar aproximados apenas. Para fazer essas previsões, podemos utilizar algumas metodologias, como usar valores médios do passado, considerar as tendências desses valores e também o desvio-padrão para aumentar a precisão das estimativas. Por exemplo, se temos uma sequência de valores de energia elétrica com média mensal de $ 250, é bem provável que um determinado valor futuro desta categoria aproxime-se deste valor. Vejamos uma previsão com base em uma média de valores: Categoria Mês 1 Mês 2 Mês 3 Média (em $) Taxa Condominial 880 900 890 890 Consumo de Combustível 450 380 410 414 Como podemos perceber, este indivíduo poderá usar os valores de previsão para as categorias de Taxa Condominial e de Consumo de Combustível como $ 890 e $ 414 respectivamente. Aqui não levamos em consideração as tendências e os desvios-padrão de cada categoria. Se assim fizéssemos, provavelmente, a previsão estaria com uma precisão ainda maior. Inicialmente, podemos estranhar essa rotina de fazer previsões, pois como é que iremos saber tais valores? Entretanto, a prática nos levará a entender cada vez mais sobre esses itens, tornando nossas previsões mais efetivas. Abrir mão de fazer o processo orçamentário nos leva a uma deficiente condução de nossas finanças tanto para o curto como para o longo prazos. DIETRICH & BRAIDO (2016) indicam motivos para não fazer planejamento financeiro para a aposentadoria: a falta de recursos para poupar/investir ou se considerar muito novo para iniciar este planejamento. Entretanto, em sua maioria, há a pretensão de fazê-lo. Um conceito simples, quase sempre negligenciado, é possuir uma relação favorável entre a renda e os gastos pessoais indicando boa gestão financeira, apresentado como requisito para a nossa independência. Os dados obtidos (valores, datas e categorias) precisam ter boa qualidade para que o planejamento assim também o seja. A gestão de nosso orçamento deve nos conduzir à sua melhor situação, ou seja, o superávit; este é o ponto de partida para qualquer planejamento financeiro (PLANEJAR, 2016). 3 Execução orçamentária A gestão financeira do nosso fluxo de caixa é essencial (PLANEJAR, 2016). Esta essencialidade requer que os procedimentos de coleta e processamento de informação seja efetivo, de modo que toda a movimentação financeira seja registrada e contextualizada num fluxo de caixa que irá, basicamente, informar os valores de entradas (encaixes) e os valores de saída (desembolsos) em nossos meios de fluxo de dinheiro, como o caixa ou a conta corrente. Um exemplo de registro de movimentação financeira segue abaixo: Dia 5: Almoço $ 25,00. Transporte $ 18,00. Lanche $ 12,00. Dia 8: Almoço $ 30,00. Lanche $ 5,00. Podemos considerar que nesses dois dias, somando os valores de cada categoria, tivemos a seguinte movimentação: Almoço $ 55,00. Transporte $ 18,00. Lanche $ 17,00. Com registros diários, uma possibilidade de elaborar um fluxo de caixa representativo é coletar informação ao longo de três meses em sequência. Após esse prazo, devemos elaborar um fluxo de caixa que representa todo esse trimestre, usando os valores médios de cada categoria. Com base nessas médias (além de considerar também as tendências dos valores e os desvios-padrão, para maior precisão), podemos fazer a previsão orçamentária, descrita no item anterior. O Serviço de Proteção ao Crédito, (2015) em pesquisa, evidenciou que 60% da amostra3 possui algum controle sistemático de seu orçamento pessoal e que 1/3 dessa amostra o faz em planilhas de computador. Também divulgou que a maioria das pessoas não está pronta para gerenciar seus próprios recursos. O baixo grau de conhecimento financeiro contribui para essa constatação. O baixo grau de conhecimento financeiro contribui, portanto, para a não prontidão dos indivíduos para gerenciar suas finanças. Desta maneira, é prudente que possamos destinar esforços para esse desenvolvimento. A prática orçamentária costuma ser melhor assimilada quando aumentamos a complexidade aos poucos, ou seja, inicialmente, começamos a lidar com orçamentos mais simples e, com o tempo, aumentamos a complexidade. Para exemplificar o aumento da complexidade numa prática orçamentária, podemos começar considerando apenas algumas categorias como energia elétrica, taxa de 3 Pesquisa conduzida com indivíduos no Brasil. 4 condomínio, aluguel e consumo de gasolina. Conforme a operação dessas categorias vá ficando mais simples de ser entendida, vamos incluindo mais categorias que neste exemplopoderia incluir transportes, gastos com alimentação fora de casa, vestuário, etc. Todos esses procedimentos têm como objetivo nos levar a uma boa gestão do fluxo de caixa. Deste modo, temos a tendência, na maioria das vezes, a dispor de recursos para cumprir a grande maioria dos pagamentos. Entretanto, num estágio inicial, mesmo com todos esses procedimentos, podemos participar de situações em que haverá falta de recursos financeiros. Lidar com a situação de não ter dinheiro nos dias finais de um mês em curso faz com que as pessoas usem seus cartões de crédito de maneira forçada, peçam dinheiro emprestado a amigos e familiares, usem seus limites de cheque especial, além de utilizar suas reservas financeiras (SPC, 2015). Por isso, precisamos colocar em prática, rotineiramente, as atitudes em relação ao uso do dinheiro para a condução de uma vida financeira equilibrada, mas isso não é algo simples. (CNDL, 2017). A habilidade de bem gerir o dinheiro vem com o tempo. Cada vez mais, vamos entendendo o que fazer para que o dinheiro possa ser destinado sabiamente às diversas categorias de gastos que temos, de modo que vamos criando uma rotina de execução orçamentária. Para criar esse costume, devemos manter registros diários que incluem, pelo menos, a data, a categoria e o valor da movimentação. No fim do mês, precisamos determinar os valores acumulados em cada categoria, para elaborar o fluxo de caixa do mês. 5 Controle orçamentário O controle orçamentário é, dentro de todo o processo, a fase mais crítica, tanto pela baixa adesão por parte dos indivíduos, como pelos procedimentos que são necessários para exercer o controle. É comum a expressão “tenho controle de meus gastos”. Podemos considerar que entendemos que esta pessoa tenha gastos dentro da renda. Entretanto, tecnicamente, o controle dos gastos precisa ser exercido apenas quando há uma previsão desses gastos. Portanto, ter os gastos sob controle deve significar que houve uma previsão deles e que a pessoa está gastando valores menores que a previsão. Vejamos um simples exemplo (valores em $): Categorias Previsão Execução Controle Habitação 2.200 2.200 sem variação Transporte 480 500 20 desfavorável Acima, vemos a categoria Habitação com valores de previsão e de execução iguais, levando a uma constatação (controle) de que não houve variação, ou seja, o gasto foi exatamente o valor previsto. Já, na categoria Transporte, houve um gasto de $ 500 quando o valor previsto tinha sido de $ 480, com uma constatação (controle) de que houve um gasto de $ 20 a mais - uma variação desfavorável. Neste contexto, uma variação favorável ocorre quando um gasto executado é menor do que o gasto previsto. Apenas com a informação listada acima, a ação da pessoa que possui este orçamento será no sentido de gastar $ 20 a menos em uma outra categoria para poder considerar todos os gastos sob controle. Portanto, o controle precisa de valores previstos para poder ocorrer, por isso a Associação Brasileira de Planejamento Financeiro (2016) nos sugere que registremos por escrito nossos planos financeiros. Isso viabiliza a orientação por prioridades estratégicas e objetivos estabelecidos. Havendo um superávit previsto, devemos conduzir a gestão de nosso fluxo de caixa de modo que ele ocorra realmente. O orçamento nos auxilia na manutenção do superávit mensal (manter gastos dentro da renda) de modo a não comprometer seriamente nossa renda (PLANEJAR, 2016). Embora alguns dados constatados sob observação4 indiquem o contrário, o Serviço de Proteção ao Crédito (2015) apurou em pesquisa que uma parte expressiva da amostra (83%) consegue fechar as contas no final do mês com grande parte (61%) indicando haver sobras para poupar ou para fazer gastos extras. Mais da metade dessa porção afirma manter alguma reserva financeira. 4 Com base em pesquisa conduzida pelo Coordenador da disciplina de Finanças Pessoais. 6 Usos do orçamento pessoal Um orçamento pessoal, basicamente, faz projeções de valores a receber e a pagar. Conforme o tempo passa, o usuário desta demonstração faz uma comparação entre os valores previstos e os valores executados. Desta maneira, está apto a exercer o controle, com base na diferença entre esses dois itens. Na medida em que o mês avança5, a informação obtida no processo orçamentário torna possível enxergar onde fazer cortes. Ao procedermos ao controle orçamentário, observando as variações em cada categoria, devemos, basicamente, interpretar as variações no sentido de entender suas causas e colocar em prática ações corretivas, com o objetivo de manter os valores que foram planejados, como um superávit, por exemplo. NIGRO (2018) expõe que nem tudo na vida pode ser decidido apenas com uma calculadora na mão, de onde entendemos que a prática orçamentária não será algo simples de resolver, como enquadrar todos os gastos desejados dentro de uma renda, seja ela qual for. Há restrições diversas e precisamos lidar com elas. A prática orçamentária pode ter muitas influências emocionais, em contraponto com questões puramente racionais. A elaboração de uma demonstração à qual possamos chamar de orçamento pessoal terá seu melhor modelo quando nos dedicarmos à construção de nossa própria planilha, pois ela será nossa melhor escolha para uso nas finanças pessoais. Deste modo, precisamos ter algum domínio de planilhas eletrônicas para que possamos construir nossa melhor peça orçamentária (NIGRO, 2018). O uso do orçamento terá como um de seus principais objetivos a manutenção de sadia proporção entre gastos e renda, de modo a manter um superávit. Com base nesses superávits, podemos destinar recursos para investimentos e/ou redução de dívidas. Uma boa gestão orçamentária nos leva a conhecer nossos custos domiciliares. Para que isso ocorra, precisamos saber onde gastamos dinheiro e ter boa ideia sobre o fato de eles estarem altos demais. Para isso, precisamos compreender os limites dos gastos indicados por um planejamento bem feito. Administrar a renda implica em ter bom conhecimento sobre nossas prioridades. Isso pode levar a decisões torturantes. Podemos imaginar o clima tenso de uma família que, de posse de alguns dados orçamentários, tenha que fazer cortes em gastos em função de alguns objetivos traçados. Como podemos elaborar nosso orçamento? Uma boa maneira é conversar com especialistas em finanças pessoais ou ainda manter contato com pessoas próximas (familiares e/ou amigos) que já o fazem de maneira produtiva, além de aprender com vídeos e livros. Com o passar do tempo, vamos entendendo nossa própria dinâmica orçamentária. Passamos a aproveitar as datas para fazer determinadas ações, como preparar os números para o período seguinte, prever datas máximas para o pagamento de algumas contas, 5 Quem faz um orçamento com base anual, neste ponto, deveria entender “Na medida em que o ano avança”. 7 preparar metodologias para determinar os valores de energia elétrica, consumo de gás ou outro gasto qualquer. Aos poucos, vamos entendendo a simetria necessária entre os valores que chamamos de renda e/ou gastos. Aumentos na renda devem manter relação economicamente sadia com eventuais aumentos nos gastos, de modo que a capacidade de poupança possa ser mantida ou, até mesmo, aumentada 8 Considerações finais Nesta aula, vimos várias coisas: ● O orçamento é fundamental para a organização de nossa vida financeira. ● Há diversas vantagens ao se utilizar o orçamento doméstico. ● Lidar com dinheiro exige disciplina, comprometimento e estudo. ● O orçamento possui três fases distintas, o planejamento, a execução e o controle. ○ Planejamento: previsão de valores. ○ Execução: registro dos valores para acompanhamento. ○ Controle: comparação entre os valores previstos e executados. ● O uso do orçamento nos permite, efetivamente, o controle das finanças. ● O orçamento não envolve, simplesmente, operações matemáticas; ele possui importante componente emocional. ● A melhor planilha será aquela que nós mesmos iremos desenvolver.● Podemos aprender sobre orçamento com especialistas, familiares e amigos. O orçamento é uma importante parte de nossas finanças. Sem ele, praticamente estaremos conduzindo as alterações de nosso patrimônio de maneira aleatória, sem propósitos e sem condições de orientação. 9 Referências ANDRÉ, Mauricio Moreira Freire Mansano - O IMPACTO DE UM PLANEJAMENTO FINANCEIRO PESSOAL NA QUALIDADE DE VIDA DO INDIVÍDUO - Monografia, Rio de Janeiro, 2018. CNDL - CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE DIRIGENTES LOJISTAS - EDUCAÇÃO FINANCEIRA DOS BRASILEIROS: GESTÃO DO ORÇAMENTO PESSOAL - Brasília, 2017. CVM - COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS - GUIA CVM DE PLANEJAMENTO FINANCEIRO - Rio de Janeiro, 2014. DIETRICH, J & BRAIDO, G M - PLANEJAMENTO FINANCEIRO PESSOAL PARA A APOSENTADORIA: UM ESTUDO COM ALUNOS DOS CURSOS DE ESPECIALIZAÇÃO DE UMA INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR - Sociedade, Contabilidade e Gestão, Rio de janeiro, 2016. MENDES, Juliana de Souza - EDUCAÇÃO FINANCEIRA PARA UMA MELHOR QUALIDADE DE VIDA - Tubarão, 2015. NIGRO, Thiago - DO MIL AO MILHÃO SEM CORTAR O CAFEZINHO - Monografia, Rio de Janeiro, 2018. PLANEJAR - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PLANEJAMENTO FINANCEIRO - PLANEJAMENTO FINANCEIRO DA TEORIA À PRÁTICA - Módulos 1 e 2 - São Paulo, 2016. SANTOS, E M R; MOREIRA F G & SILVA, L C - A IMPORTÂNCIA DO PLANEJAMENTO PARA O EQUILÍBRIO FINANCEIRO DAS FAMÍLIAS - Artigo, 2018. SPC - SERVIÇO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO - PESQUISA DE EDUCAÇÃO FINANCEIRA, ORÇAMENTO PESSOAL E CONHECIMENTOS FINANCEIROS - SPC Brasil, 2015.