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DIFICULDADES DE APRENDIZAGENS 2 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 3 1 PROCESSOS DE APRENDIZAGEM HUMANA ..................................................... 4 1.1 As dificuldades de aprendizagem ..................................................................... 6 2 APRENDIZAGEM SOCIAL NA PERSPECTIVA DA TEORIA COGNITIVA SOCIAL E EMOCIONAL ......................................................................................................... 13 2.1 Dificuldades de aprendizagem e os encadeamentos psicossociais ............... 15 3 TRANSTORNO DO NEURODESENVOLVIMENTO ............................................. 19 4 O DIAGNÓSTICO E AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM ........................ 25 4.1 Estilos cognitivos de aprendizagem ................................................................ 28 4.2 Temperamento infantil e as estratégias de ensino ......................................... 31 5 FRACASSO E SUCESSO ESCOLAR .................................................................. 33 5.1 O fracasso escolar no Brasil: Perspectiva contextual ..................................... 34 6 METODOLOGIAS PAUTADAS EM RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS ................ 42 6.1 Estratégias para o desenvolvimento e para a avaliação das atividades ......... 46 6.2 Como elaborar questões norteadoras ............................................................ 47 6.3 A aprendizagem baseada em projetos e em problemas na prática ................ 48 7 PRÁTICAS ESCOLARES E SEUS DESAFIOS ................................................... 51 7.1 Projetos envolvendo a diversidade cultural ..................................................... 52 7.2 Como lidar com a diversidade cultural no “chão” da escola? .......................... 55 8 O PROCESSO DE EXCLUSÃO E A NECESSIDADE DA INCLUSÃO ................ 56 8.1 Política de educação inclusiva ........................................................................ 59 8.2 Inclusão social da pessoa com deficiência no universo escolar ..................... 61 9 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 63 3 INTRODUÇÃO Prezado aluno! O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 4 1 PROCESSOS DE APRENDIZAGEM HUMANA O conceito de aprendizagem é discutido por diversas perspectivas teóricas. Desde o século XIX muitas teorias foram propostas para explicar esse fenômeno. Algumas foram superadas, atualizadas e transformadas em novas perspectivas, entretanto, observa-se que atualmente muitas coexistem, dando uma característica multiparadigmática ao conceito. Ou seja, há diferentes abordagens para tratar desse mesmo fenômeno, sob diferentes aspectos (ILLERIS, 2013). Rotta, Bridi Filho e Bridi (2016) destacam que a aprendizagem é objeto de estudo de diferentes ciências, tais como a psicologia, a pedagogia e a neurologia. Isso ocorre devido à sua importância para a cultura, visto que todos os seres humanos precisam aprender formal ou informalmente. Na atualidade, a escolarização e a apropriação do conhecimento sistematizado é uma obrigatoriedade na nossa sociedade e essa característica tem trazido um olhar mais atento a esses processos. De acordo com Feldman (2015), Gazzaniga, Heatherton e Halpern (2018), a aprendizagem pode ser entendida, de uma maneira ampliada, como uma mudança relativamente permanente no comportamento humano em decorrência de uma experiência. Na mesma linha de compreensão, Illeris (2007) define aprendizagem como um processo que leva a uma mudança permanente na capacidade de um organismo vivo qualquer, que não seja decorrente unicamente do amadurecimento biológico ou do envelhecimento. Vale destacar ainda, de acordo com Gazzaniga, Heatherton e Halpern (2018), que a aprendizagem ocorre quando a experiência torna o sujeito mais bem preparado ou adaptado para lidar com o meio em situações futuras. Ou seja, nem toda a mudança pode ser considerada aprendizagem, ela precisa resultar em uma melhor adaptação ou preparação para lidar com algo ou com alguma situação, isto é, a aprendizagem requer uma melhoria. Nesse sentido, a capacidade de aprender é essencial para o ser humano, determinando desde o desenvolvimento de habilidades básicas, como andar e falar, até habilidades complexas, como se relacionar com outras pessoas ou realizar cirurgias cardíacas. 5 Desde o nascimento o ser humano já está preparado para aprender. Entretanto, os bebês apresentam um processo de aprendizagem mais simples chamado de habituação. Consiste na adaptação a um estímulo, como o que ocorre quando um bebê vê um brinquedo colorido pela primeira vez. Naquele momento o estímulo (brinquedo) chama muito a sua atenção, porém, com o passar do tempo, aquele estímulo já não surte o mesmo efeito, ou seja, o bebê se adapta ou se habitua àquela informação. Os adultos continuam apresentando o processo de habituação, contudo, a aprendizagem também passa a ocorrer de maneiras mais complexas (FELDMAN, 2015). Complementando esse raciocínio, Illeris (2013), na obra Teorias contemporâneas da aprendizagem, destaca três dimensões ou esferas da aprendizagem: 1. Conteúdo: diz respeito ao que é aprendido, engloba conhecimentos, habilidades, insigths, significados, valores, postura, modo de agir, entre outras coisas que contribuem para a compreensão e para a capacidade de quem aprende. 2. Incentivo: esfera relacionada à energia necessária para promover a aprendizagem. Engloba sentimentos, motivação, emoções. Sua função é garantir o equilíbrio mental. 3. Interação: diz respeito aos impulsos que dão início ao processo de aprendizagem, tais como: percepção, ação, experiência, imitação, participação, entre outros. Dando continuidade a essa compreensão, Illeris (2013) ainda destaca dois processos essenciais na aprendizagem: • Processo externo: remete à interação do indivíduo com o meio no qual está inserido. • Processo psicológico/interno: remete à aquisição e à elaboração das informações disponíveis no meio. Para Illeris (2013), esses processos ocorrem em toda forma de aprendizagem, contudo, algumas teorias se dedicam mais à compreensão e explicação de um ou de outro processo. Por exemplo, teorias cognitivistas costumam se dedicar mais aos processos internos, enfatizando os aspectos mentais. Já as teorias de aprendizagem 6 social tendem a destacar mais os processos externos, de interação do indivíduo com o meio. Destaca-se, nesse sentido, que ambas as teorias contribuem para o desenvolvimento da compreensão do conceito através de uma abordagem diversificada, demonstrando a característica multiparadigmática da aprendizagem. 1.1 As dificuldades de aprendizagem Antigamente a instrução dos filhos era dever exclusivamente da família. Contudo,a sociedade, a vida e o conjunto de conhecimentos foram mudando, e as necessidades de cada pessoa se estenderam, tendo como resultado disso o fato de a escola tomar o encargo de instruir e socializar as crianças e os adolescentes. Assim, o professor, como educador, forma o aluno não apenas em conhecimento, mas também em relação à sua inserção social e aos valores morais e éticos (BOCK, 1996; WEIL, 1960). Em uma visão sociointeracionista, a chave de todo ensino é as relações que se estabelecem entre os professores, os alunos e os conteúdos de aprendizagem, e as atividades mobilizam as comunicações que podem ser estabelecidas em classe. Nesse contexto, os professores utilizam uma diversidade de estratégias em suas ações educacionais. Sua interação com os alunos é direta, acompanhando os processos que eles vão realizando em aula, intervindo e interagindo em diferentes níveis: com a classe, com um grupo de alunos ou individualmente, de acordo com a necessidade de cada aluno (ZABALA, 2014). Assim, nas relações entre os sujeitos, vai se formando a aprendizagem, que é o processo pelo qual o ser humano se apropria do conhecimento produzido pela sociedade. Em qualquer ambiente, a aprendizagem é um processo ativo que conduz a transformações no homem. Na opinião de Alarcão (2003, p. 27), “a aprendizagem é um modo de gradualmente ir se compreendendo melhor o mundo em que vivemos e de melhor utilizar os nossos recursos para nele agirmos”. Bossa (2007) coloca que a complexidade do fenômeno da aprendizagem humana tem a dimensão da própria vida. Embora o conceito de aprendizagem tenha sobre si o peso da tradição intelectualista, ele abarca muito mais do que isso. Por isso, a despeito da importância que o aspecto intelectual possa ter, ele é só uma parte da aprendizagem total que o ser humano desenvolve. 7 Essa definição de aprendizagem, por si só, justifica seu caráter multidisciplinar (BOSSA, 2007). Historicamente, não se tinha uma visão multidisciplinar acerca da aprendizagem. Pelo contrário, a ciência buscava comprovar que as dificuldades de aprendizagem tinham uma origem biológica e uma herança genética, que formavam uma classe humana inferior. Isso ocultava a natureza predatória do sistema social e responsabilizava o próprio indivíduo pelo seu fracasso ou sucesso (PATTO, 1999). Segundo Bossa (2000), no século XIX, pela preocupação com os problemas de aprendizagem na área médica, acreditava-se que os comprometimentos na área escolar eram provenientes somente de causas orgânicas, pois se procurava identificar no físico as determinantes das dificuldades do estudante. A crença de que os problemas de aprendizagem eram causados por fatores orgânicos perdurou por muitos anos e determinou a forma do tratamento dada à questão do fracasso escolar até poucos anos atrás (BOSSA, 2000). Atualmente, novas abordagens teóricas sobre o desenvolvimento e a aprendizagem, bem como inúmeras pesquisas sobre os fatores intra e extraescolares na determinação do fracasso escolar, contribuíram para uma nova visão mais crítica e abrangente (BOSSA, 2000). Dessa forma, diferenciaram-se os termos “dificuldades de aprendizagem” de “distúrbios (transtornos) de aprendizagem”, ou seja, diferenciou-se quando os dificultadores têm uma causa psicossocial de quando têm uma causa biológica da criança. A quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5) reconhece o erro da ciência em generalizar a origem dos problemas escolares aos fatores biológicos (APA, 2015, documento on-line): [...] a vasta comunidade científica que trabalha com transtornos mentais reconhece que, anteriormente, a ciência não estava madura o suficiente para produzir diagnósticos plenamente válidos — ou seja, proporcionar validadores científicos consistentes, sólidos e objetivos para cada transtorno do DSM. A ciência dos transtornos mentais continua a evoluir. Contudo, as duas últimas décadas desde o lançamento do DSM-IV testemunharam um progresso real e duradouro em áreas como neurociência cognitiva, neuroimagem, epidemiologia e genética. Em suma, reconhecemos que os limites entre transtornos são mais permeáveis do que se percebia anteriormente. Assim, percebeu-se que, muito mais do que determinantes genéticos, o processo de aprendizagem requer uma troca de sensações, percepções, estímulos e mudança de padrão do comportamento e respostas do sujeito. Essa aquisição de 8 mudança implica em um comportamento diferenciado do anterior, constituindo uma evolução da aprendizagem. Existem, entretanto, fatores que poderão ocasionar falha no processo de aprendizagem, ficando subdivididos em deficiências, dificuldades e distúrbios de aprendizagem (ROMANELLI, 2003). As deficiências de aprendizagem, ou deficiências intelectuais, são classificadas em quatro níveis (leve, moderada, grave ou profunda), mensurados pelo quociente de inteligência (QI). Essas medidas de QI indicam maior ou menor capacidade de aprendizagem (ROMANELLI, 2003). As características essenciais da deficiência intelectual (ou transtorno do desenvolvimento intelectual) incluem déficits em capacidades mentais genéricas, ou seja, que não se limitam às aprendizagens escolares, incluindo prejuízo na função adaptativa diária. Há deficiência nas funções intelectuais que envolvem raciocínio, solução de problemas, planejamento, pensamento abstrato, etc. O início ocorre durante o período do desenvolvimento infantil, e o diagnóstico baseia-se tanto em avaliação clínica quanto em testes padronizados das funções adaptativa e intelectual. O funcionamento adaptativo envolve raciocínio em três domínios: conceitual, social e prático (APA, 2015). Outro fator são as dificuldades de aprendizagem. De aspecto muito sutil, a condição de dificuldade de aprendizagem está relacionada a bloqueios causados por percepções subjetivas (emoção) que, para serem amenizadas, dependem de um ambiente harmonicamente adequado à sensibilidade do aprendiz (ROMANELLI, 2003). Nesse ambiente, cabe observar todos os contextos socioemocionais da criança, principalmente a família, pois muitos dos que apresentam dificuldades de aprendizagem têm como uma das causas os problemas ou conflitos familiares, como separação dos pais, perda de um familiar próximo, nascimento de um irmão, etc. (MACHADO, 2000). O termo genérico “dificuldade de aprendizagem” se refere a um grupo heterogêneo de desordens, manifestadas por dificuldade na aquisição e no uso da leitura, da escrita, do raciocínio ou de habilidades matemáticas. Essa dificuldade pode ocorrer apenas por um período na vida. As dificuldades de aprendizagem não podem ser explicadas por deficiências intelectuais ou outros transtornos mentais ou neurológicos, mas sim por questões como adversidade psicossocial, acuidade visual ou auditiva não corrigida ou falta de proficiência na língua de instrução acadêmica. 9 Ainda, as dificuldades de aprendizagem podem ser explicadas simplesmente por uma consequência de falta de oportunidade de aprendizagem ou educação escolar inadequada (APA, 2015). A criança com dificuldade de aprendizagem é uma criança que apresenta um rendimento lento aquém da faixa etária das crianças ditas como “normais”. Contudo, a criança com dificuldade de aprendizagem não necessariamente é uma criança com deficiência ou distúrbio. Ela apenas tem, no plano educacional, um conjunto de condutas significativamente desviantes em relação à população escolar em geral (FONSECA, 2016). Para Stevanato et al. (2003), as dificuldades de aprendizagem quase sempre se apresentam associadas a problemas de outra natureza, principalmente comportamentais e emocionais. A concomitância dessas dificuldades é considerada muito frequente. De modo geral, as crianças com dificuldades de aprendizagem e de comportamento são descritas como menos envolvidas com as tarefasescolares do que os seus colegas sem dificuldades. Outro fator são os distúrbios de aprendizagem. O transtorno específico da aprendizagem refere-se às aprendizagens escolares. É um transtorno do neurodesenvolvimento com uma origem biológica que se torna base das anormalidades no nível cognitivo, que são associadas às manifestações comportamentais. A origem biológica inclui uma interação de fatores genéticos, epigenéticos e ambientais que influenciam a capacidade do cérebro de perceber ou processar informações verbais ou não verbais com eficiência e exatidão (APA, 2015). O caminho a ser seguido é descobrir em qual área ocorre tal distúrbio a partir de testes específicos (ROMANELLI, 2003). O distúrbio de aprendizagem é uma desordem no desenvolvimento normal característico por algum déficit psicomotor que, consequentemente, afeta os processos receptivos, integrativos e expressivos na realização simbólica do cérebro (FONSECA, 2016). “É uma desarmonia do desenvolvimento normalmente caracterizada por uma imaturidade psicomotora que inclui perturbações nos processos receptivos, integrativos e expressivos da atividade simbólica” (FONSECA, 2016, p. 246). O distúrbio de aprendizagem específica significa uma perturbação em um ou mais processos psicológicos básicos envolvidos na compreensão ou utilização da 10 linguagem falada ou escrita. Isso pode ser manifestado por uma aptidão imperfeita de escutar, pensar, ler, escrever, soletrar ou fazer cálculos matemáticos (APA, 2015). De acordo com o DSM-5, os transtornos da aprendizagem são diagnosticados quando os resultados do indivíduo em testes padronizados e individualmente administrados de leitura, matemática ou expressão escrita estão substancialmente abaixo do esperado para sua idade, escolarização e nível de inteligência (APA, 2015). A Classificação Internacional de Doenças, Transtornos Mentais e de Comportamento (CID-10) denomina esses distúrbios como transtornos do desenvolvimento das habilidades escolares, descrevendo-os como transtornos em que as modalidades habituais de aprendizado estão alteradas desde as primeiras etapas do desenvolvimento (OMS, 2007). O comprometimento não é somente a consequência da falta de oportunidade de aprendizagem ou de um retardo mental. Além disso, não é devido a um traumatismo ou a doenças cerebrais (OMS, 2007). Um transtorno (distúrbio) é uma síndrome caracterizada por perturbação clinicamente significativa na cognição, na regulação emocional ou no comportamento de um indivíduo que reflete uma disfunção nos processos psicológicos, biológicos ou de desenvolvimento subjacentes ao funcionamento mental. Transtornos estão frequentemente associados a sofrimento ou incapacidade significativos que afetam atividades sociais, profissionais ou outras atividades importantes. Uma resposta esperada ou aprovada culturalmente a um estressor ou perda comum, como a morte de um ente querido, não constitui transtorno. Desvios sociais de comportamento (p. ex., de natureza política, religiosa ou sexual) e conflitos que são basicamente referentes ao indivíduo e à sociedade não são transtornos (APA, 2015, documento on-line). Para diferenciar dificuldade e distúrbio de aprendizagem, a formulação de caso para qualquer estudante deve incluir a história clínica criteriosa e um resumo conciso dos fatores sociais, psicológicos e biológicos que podem ter contribuído para o prejuízo no desenvolvimento escolar. É preciso conhecer o desenvolvimento infantil (maturação, crescimento e evolução). Ainda assim, encontrados prejuízos no seu histórico de neuro desenvolvimento, é preciso tentar utilizar com o aluno metodologias educacionais baseadas em evidências antes de submetê-lo a um diagnóstico, a fim de verificar se as dificuldades escolares podem ser corrigidas pedagogicamente (APA, 2015). 1. TEORIAS COGNITIVAS DE APRENDIZAGEM 11 Há diversas abordagens ou formas de se estudar a aprendizagem, o que evidencia a característica multiparadigmática desse conceito. Entre as diversas possibilidades, destacam-se neste capítulo as teorias ou abordagens cognitivas de aprendizagem. Essas teorias partem do entendimento de que o ato de aprender está relacionado aos processos de pensamento ou cognição, ou seja, essas teorias enfatizam os processos mentais (invisíveis) que ocorrem quando alguém aprende (FELDMAN, 2015). De acordo com os estudiosos dessa abordagem, um exemplo desse tipo de aprendizagem, que enfatiza os processos mentais não visíveis, é a chamada aprendizagem latente (ou encoberta). Entende-se que um novo comportamento pode ser aprendido, mas não demonstrado, até que haja uma oportunidade ou incentivo para que ele seja expresso. Ou seja, a aprendizagem pode ocorrer de uma forma não visível, sem que haja a relação estímulo-resposta-consequência, como descreviam os behavioristas. Sendo assim, entende-se que é possível aprender um conteúdo novo, mas não emitir uma resposta expressa, isto é, é possível que haja aprendizado sem que novos comportamentos sejam exibidos, apenas a partir da mudança mental. Assim, existe diferença entre a aquisição de um comportamento — o saber fazer — e o desempenho de tal comportamento — a ação em si (FELDMAN, 2015; GAZZANIGA; HEATHERTON; HALPERN, 2018). A aprendizagem latente pressupõe a existência de conteúdos latentes ou não aparentes, que foram chamados de mapas cognitivos. Esses mapas são representações mentais ou abstratas da realidade que permitem a obtenção, o armazenamento e o processamento de informações do ambiente em nível neural ou mental. Assim, a compreensão de mapas mentais permite pressupor que há uma elaboração interna anterior à emissão de um comportamento. Isto é, de acordo com a compreensão de mapas cognitivos, entende-se que a aprendizagem pode ocorrer através dos fenômenos mentais, a partir do armazenamento de informações do ambiente (mapa cognitivo), que abarca até mesmo informações que não foram utilizadas pelo sujeito até aquele momento (FURTADO, 2018; TOLMAN; HONZIK, 1930). 12 Complementando essa compreensão, Gazzaniga, Heatherton e Halpern (2018) destacam um outro tipo de aprendizagem que funciona de maneira semelhante à aprendizagem latente, a aprendizagem por insight. Na aprendizagem por insight o processo também ocorre de maneira encoberta, sem necessidade de expressão de um comportamento, e é identificado quando alguém está refletindo sobre um problema, fica um tempo indeterminado debruçado na questão e, de repente, chega à resposta (ou tem um insight). Note que, da mesma forma como ocorre na aprendizagem latente, na aprendizagem por insight não é possível que outra pessoa visualize o processo de aprendizagem, ele ocorre de maneira interna. Com essa compreensão, retoma-se o conceito ampliado de aprendizagem, entendida como uma mudança, derivada da experiência, relativamente permanente no comportamento ou nas capacidades de um indivíduo, resultando em uma melhor adaptação ou preparação, por parte desse indivíduo, para lidar com algo ou alguma situação. A partir desse entendimento, destaca-se que a aprendizagem, de acordo com o que propõem as abordagens cognitivas, pode ocorrer internamente, em nível neural ou mental, não necessariamente podendo ser observada por outras pessoas (GAZZANIGA; HEATHERTON; HALPERN, 2018; ILLERIS, 2007). Nessa perspectiva, enfatizou-se a concepção de aprendizagem latente e de aprendizagem por insight e, seguindo a mesma linha de raciocínio, destaca-se a aprendizagem observacional. A aprendizagem observacional pode ser entendida como um aspecto ou uma forma de desenvolvimento da aprendizagem em uma abordagem cognitiva, como fica claro no exemplo anterior (quando o adolescente pega o volante para dirigir pela primeira vez e sabe alguns movimentos que precisam ser feitos devido à observação que fez anteriormente).Assim, destaca-se que a aprendizagem latente, comumente tem como estratégia a observação (GAZZANIGA; HEATHERTON; HALPERN, 2018). A aprendizagem observacional foi foco de estudos do psicólogo Albert Bandura, que afirmou que uma grande parcela da aprendizagem humana se dá através da observação de outras pessoas se comportando, ou seja, a partir da relação de quem aprende com outra pessoa (um modelo). Desse modo, a aprendizagem ganha uma conotação social, sendo vista como um fenômeno social e a perspectiva de aprendizagem observacional ganha uma 13 conotação sociocognitiva. Devido à sua importância, na sequência você estudará sobre a aprendizagem com essa conotação social, sob a ótica da teoria conhecida como teoria cognitiva social de Bandura (GAZZANIGA; HEATHERTON; HALPERN, 2018). 2 APRENDIZAGEM SOCIAL NA PERSPECTIVA DA TEORIA COGNITIVA SOCIAL E EMOCIONAL Como visto até aqui, de maneira ampliada, pode-se entender que a aprendizagem é um processo de mudança no comportamento ou na capacidade de um sujeito, resultante da experiência, e tem como produto uma melhoria na sua adaptação ou na sua capacidade para lidar com uma situação ou com algo no futuro (GAZZANIGA; HEATHERTON; HALPERN, 2018; ILLERIS, 2007). Tendo esse entendimento como pano de fundo, nesse trecho do capítulo você estudará a forma ou estratégia de aprendizagem descrita por Albert Bandura, conhecida como aprendizagem social, baseada na teoria cognitiva social, também chamada de teoria sociocognitiva (GAZZANIGA; HEATHERTON; HALPERN, 2018). Albert Bandura, nascido em 1925, é um importante psicólogo canadense que desenvolveu sua carreira na Califórnia (Estados Unidos), como professor e diretor do departamento de psicologia da universidade de Stanford e presidente da APA (American Psychological Association — Associação Americana de Psicologia). Bandura foi autor de diversas obras, tendo como um de seus principais legados o desenvolvimento da teoria da aprendizagem social (GHEDIN, 2012). Na teoria da aprendizagem social, Bandura (1977) também enfoca os aspectos mentais envolvidos na aprendizagem, assim como ocorre nas abordagens cognitivas.Entretanto, o autor enfatiza também os aspectos sociais envolvidos no processo, descrevendo o desenvolvimento da aprendizagem a partir da observação de outras pessoas (que servem como modelos), por isso sua teoria também ficou conhecida como teoria da aprendizagem observacional (FURTADO, 2018; GHEDIN, 2012). Nesse sentido, destaca-se que a aprendizagem observacional é especialmente importante para casos em que não é possível aprender por tentativa e erro, ou seja, quando é necessária uma compreensão prévia, em nível mental, de um comportamento a ser emitido. Nesse sentido, para a teoria sociognitiva, assim como 14 para a teoria cognitiva, a aprendizagem de um comportamento é diferente de emissão desse comportamento. Uma pessoa pode saber fazer algo sem nunca, de fato, ter feito aquilo, apenas armazenando aquela informação em nível mental e, quando houver a oportunidade ou o desejo, ela poderá emitir aquele novo comportamento (FURTADO, 2018; GAZZANIGA; HEATHERTON; HALPERN, 2018; GHEDIN, 2012). Para Bandura (1977), a aprendizagem observacional é regida por quatro fatores principais: • Não associativa: é necessário que a pessoa foque sua atenção a determinada ação, isto é, perceba o que está ao seu redor. A atenção é influenciada tanto pelas características da ação observada, quanto pelo próprio observador (suas tendências cognitivas, como suas preferências e afinidades). • Retenção: é necessário que as informações captadas sejam armazenadas em nível mental. Para que a retenção das informações ocorra, é preciso o desenvolvimento de imagens mentais ou representações verbais relacionadas àquela informação (armazenamento cognitivo). • Produção: uma etapa importante do processo de aprendizagem é a ação propriamente dita do aprendiz, decorrente da atenção e da retenção de determinada informação. Esse fator diz respeito à produção propriamente dita do comportamento, ou seja, a passagem da esfera cognitiva para a ação em si. • Motivação: para que uma pessoa reproduza um comportamento observado, é necessário que ela acredite que aquela ação trará resultados positivos para ela (será recompensada). Sendo assim, entende-se que o fator motivação está relacionado à expectativa do aprendiz em relação à prática daquele conteúdo. Um dos principais experimentos de Bandura acerca da aprendizagem social ou observacional foi o experimento realizado na década de 1960 com um boneco inflável chamado Bobo. Nesse experimento, Bandura dividiu crianças em idade pré- 15 escolar em dois grupos. Para um dos grupos, Bandura apresentou um vídeo em que um adulto interagia com o Bobo de maneira bem tranquila, brincando com ele. Já no segundo grupo, Bandura apresentou um vídeo em que o adulto interagia com o Bobo de uma maneira bastante agressiva, batendo no boneco com um martelo, chutando- o, etc. Depois de assistirem ao vídeo, as crianças dos dois grupos foram colocadas em uma sala para brincar com diversos brinquedos, incluindo o boneco Bobo. O resultado do experimento mostrou que as crianças que assistiram o adulto agindo de maneira agressiva com o Bobo tinham duas vezes mais chances de agir de forma semelhante (também agressiva) quando interagiram com o boneco. Ou seja, os resultados desse experimento sugerem que a exposição de crianças à violência pode gerar comportamentos agressivos e, além disso, que a observação do comportamento de outras pessoas impacta no comportamento futuro de quem está observando (GAZZANIGA; HEATHERTON; HALPERN, 2018). Como você pôde observar ao longo do capítulo, pode-se definir aprendizagem como uma mudança relativamente permanente nas capacidades de um organismo vivo, decorrente da experiência. Aprendizagem é um tema estudado a partir de diversos enfoques, o que caracteriza sua natureza multiparadigmática. Entre esses enfoques, destacam-se as abordagens cognitivas, que enfatizam os aspectos mentais envolvidos no processo de aprendizagem, tendo como exemplo a aprendizagem latente (ou encoberta), em que se entende que, para que ocorra aprendizagem não necessariamente precisa ocorrer um novo comportamento. Ou seja, de acordo com essas abordagens, é possível que a aprendizagem ocorra em nível mental, através da construção de mapas cognitivos, e seja apresentada como uma ação apenas posteriormente, quando houver oportunidade ou desejo. No mesmo sentido, destaca-se a abordagem sociocognitiva da aprendizagem, que tem como seu principal autor Albert Bandura. A teoria de Bandura se assemelha às teorias cognitivas, enfocando, em específico, a aprendizagem a partir da observação do comportamento de outras pessoas, ou seja, a aprendizagem a partir da interação social (FURTADO, 2018; GAZZANIGA; HEATHERTON; HALPERN, 2018; GHEDIN, 2012; ILLERIS, 2013). 2.1 Dificuldades de aprendizagem e os encadeamentos psicossociais 16 Para poder compreender e intervir nas causas que acarretam dificuldades de aprendizagem, o objeto de trabalho vai necessitar das relações em que a criança circula, visto que as dificuldades de aprendizagem têm causas e desenvolvimentos múltiplos, em uma conjunção de fatores que, em um determinado momento, interagem e imobilizam o desenvolvimento do sujeito. Referente a isso, Bossa (2007) aponta que, entre essas causas, é possível encontrar como promotor dos problemas de aprendizagem o método de ensino, ou seja, a “ensinagem”. O professor pode ter dificuldades quanto à instituição de ensino e/ou às relações que nela se estabelecem (o seu grupo/equipe de trabalho). Carita (1999) complementa a ideia dizendo que a relação pedagógica é um campo social em que emergem conflitos,cujas representações advêm da instituição, do professor e do aluno. Isso porque, conforme Lapassade (1977), as instituições são um conjunto de atos ou ideias dos indivíduos que as compõem, e nesses atos e ideias se encontram os costumes, os modos, os preconceitos e as superstições. Quanto ao estudante, Ribeiro (1995) aponta que o ser humano só pode ser compreendido em uma relação de grupo, em que tudo influencia tudo, pois o sujeito é um ser holístico que se relaciona em comunidade. Machado (2000) acrescenta que para os fenômenos da vida não existem causas individuais, pois esses fenômenos não são individuais, mas sim efeitos que se produzem em uma rede de relações. Quanto aos alunos com dificuldades escolares, Machado (2000) diz que muitos deles têm problemas familiares, emocionais, pais alcoólatras, pobreza, etc.Entretanto, o autor aponta que não é possível estabelecer uma relação direta de causa e efeito entre essas questões emocionais e a capacidade de aprender, pois os fenômenos são viabilizados nas relações, ou seja, agimos diferentemente conforme as relações. Muitas vezes, espera-se que algum trabalho seja realizado apenas com as crianças com dificuldades escolares, mas o objeto de trabalho vai necessitar das relações em que essa criança circula. Com isso, Machado (2000) ressalta que os trabalhos diagnósticos precisam dar importância para as relações e práticas cotidianas como produtoras dos fenômenos que se analisa, e não apenas ter um olhar diagnosticador que produz graus de deficiência e definições individualistas atribuídas à criança encaminhada. 17 Assim, deve-se considerar a forma como a aula é dada, a relação professor- professor e professor-aluno, a história escolar da criança, entre outras questões, buscando processos que potencializem as crianças. Como afirma García Sánchez (1998), mesmo as teorias mais organicistas e baseadas na neuropsicologia admitem que os distúrbios mentais podem se tornar muito piores em resposta a um ambiente desestruturado e a uma família desestruturada emocionalmente. Quando a família funciona assim, a criança hiperativa vai se tornar mais hiperativa, a deprimida, mais deprimida, e a autista, mais autista. Também é preciso considerar os efeitos emocionais que essas dificuldades acarretam, agravando o problema. Se o rendimento escolar da criança for sofrível, talvez ela seja vista como um fracasso pelos professores e colegas ou até pela própria família. Infelizmente, muitas dessas crianças desenvolvem uma autoestima negativa. Isso agrava muito a situação e poderia ser evitado com o auxílio da família e com uma intervenção adequada. Fernández (1991) afirma que existe uma articulação entre inteligência e desejo, entre família e sintoma. De acordo com a autora, se pensarmos no problema de aprendizagem como derivado apenas do organismo ou da inteligência, para sua cura não haveria necessidade de recorrer à família. Se, pelo contrário, as patologias no aprender surgissem na criança ou no adolescente somente a partir de sua função equilibradora do sistema familiar, não precisaríamos, para seu diagnóstico e cura, recorrer ao sujeito separadamente de sua família. Só podemos observar a possível construção da inteligência ao considerarmos o sintoma como resultante da articulação construtiva do organismo, do corpo, da inteligência e da estrutura do desejo, incluído no meio familiar, onde seu sintoma tem sentido e funcionalidade. Fonseca (2016) também se refere à dificuldade de aprendizagem como um impedimento de um bom desempenho intelectual, vinculado a problemáticas emocionais associadas a conflitos familiares não explicitados. Além dos problemas de relacionamento, existem os problemas relacionados a abuso e negligência, problemas com a adesão a regimes terapêuticos, obesidade, comportamento antissocial e simulação. 18 Em resumo, é possível definir a dificuldade de aprendizagem como um conjunto de sinais, de origem biopsicossocial, calcados em algumas constituintes básicas: a criança, a família, a escola e o meio social (GARCÍA SÁNCHEZ, 1998). Bossa (2007) aponta que há ainda muitas outras coisas que podem atrapalhar uma criança na escola. Veja a seguir alguns exemplos (BOSSA, 2007, p. 56-59): • Uma criança pode achar que ir para a escola não é importante, pois seus pais não conseguem mostrar essa importância. • Uma criança pode pensar que assim como seus pais não precisaram estudar, ela também não vai precisar. • Uma criança pode não aprender porque não sabe lidar com as leis e as regras da vida. • Uma criança pode não aprender porque seus pais, na tentativa de acertar, erraram ao não estabelecer regras e limites. Assim, não possibilitaram que a criança aprendesse a ser disciplinada. • Uma criança pode ter raiva da escola por acreditar que ela só vai para lá para deixar sua mãe sozinha com seu irmãozinho. • Uma criança pode ter um problema de saúde que atrapalha sua aprendizagem escolar. • Uma criança pode ir mal na escola por ser muito desorganizada. Ela esquece de fazer as tarefas, perde o material escolar, se atrasa na hora de ir para a escola e sua vida vira uma bagunça. • Uma criança pode ser muito inteligente e aprender muitas coisas, mas seu cérebro falha na hora de realizar aprendizagens específicas, como leitura e escrita. • Uma criança pode não aprender porque está em uma escola onde a forma de ensinar não está de acordo com sua forma de aprender. • Uma criança pode não compreender a importância do que está sendo ensinado na escola porque o professor não lhe mostra como utilizar aquele conhecimento na vida. • Uma criança pode não aprender porque o seu professor não sabe ensinar. 19 • Uma criança pode não aprender porque o seu professor não gosta da sua profissão, e por isso pode não ser um bom profissional. Bossa (2007, p. 60) ainda enfatiza: Só para você ter uma ideia, eu poderia ficar o dia inteiro escrevendo sobre as coisas que podem atrapalhar uma criança na escola. Mesmo assim não terminaria. Por isso, pode ser que o que atrapalha a criança na escola nem esteja escrito aqui. Mas se ela está com dificuldades para aprender, certamente tem um bom motivo para isso. O que o psicopedagogo pode fazer é descobrir esse motivo e ajudar você e a escola a encontrarem formas de solucionar esse problema. Pode, ainda, evitar que essas coisas cheguem a atrapalhar a aprendizagem escolar. Essas situações são apenas alguns exemplos que podem surgir no contexto avaliativo da dificuldade de aprender. 3 TRANSTORNO DO NEURODESENVOLVIMENTO A partir da publicação do DSM-5 pela Associação de Psiquiatria Americana (APA), os distúrbios de aprendizagem, ou seja, a falta ou o prejuízo no rendimento escolar que tem uma causa biológica, é persistente e não transitório, passaram a integrar o grupo dos transtornos do neurodesenvolvimento. Os transtornos do neurodesenvolvimento são um grupo de condições que já podem ser percebidas no início do período do desenvolvimento infantil. Os transtornos tipicamente se manifestam cedo no desenvolvimento, em geral antes de a criança ingressar na escola, sendo caracterizados por déficits que acarretam prejuízos no funcionamento pessoal, social, acadêmico ou profissional. Os déficits de desenvolvimento variam desde limitações muito específicas na aprendizagem ou no controle de funções executivas até prejuízos globais em habilidades sociais ou inteligência (APA, 2015). Nesse grupo dos transtornos do neurodesenvolvimento, estão incluídos os seguintes quadros (APA, 2015): • deficiência intelectual (transtorno do desenvolvimento intelectual); • atraso global do desenvolvimento; • transtorno da comunicação; • transtorno do espectro autista; • transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH); • transtornos motores do neurodesenvolvimento;20 Transtorno específico da aprendizagem: com prejuízo na leitura (dislexia); com prejuízo na expressão escrita (disgrafia); com prejuízo na matemática (discalculia). Os critérios diagnósticos identificam sintomas, comportamentos, funções cognitivas, traços de personalidade, sinais físicos, combinações de síndromes e o período de tempo que o problema persiste, exigindo perícia clínica para diferenciá-los das variações normais da vida e de respostas transitórias ao estresse, que não seriam caracterizados como transtornos (ou distúrbios) (APA, 2015). Os transtornos do neurodesenvolvimento, conforme o DMS-5 (APA, 2015) podem ser por deficiência intelectual. Transtorno do desenvolvimento intelectual: é um transtorno com início no período do desenvolvimento que inclui déficits funcionais, tanto intelectuais quanto adaptativos, nos domínios conceitual, social e prático. O nível de gravidade pode ser leve, moderada, grave ou profunda. Os vários níveis de gravidade são definidos com base no funcionamento adaptativo, e não em escores de QI, uma vez que é o funcionamento adaptativo que determina o nível de apoio necessário. Atraso global do desenvolvimento: essa nomenclatura de diagnóstico é utilizada de forma provisória, quando a criança não está atingindo os marcos do desenvolvimento esperados em várias áreas do funcionamento, mas ainda é jovem demais para participar de testes padronizados para um diagnóstico mais preciso. Transtorno da comunicação: os transtornos da comunicação incluem o transtorno da linguagem, o transtorno da fala, o transtorno da comunicação social (pragmática) e o transtorno da fluência com início na infância (gagueira). Os três primeiros são déficits no desenvolvimento e no uso da linguagem, da fala e da comunicação social, respectivamente. O transtorno da fluência: com início na infância é caracterizado por perturbações da fluência normal e da produção motora da fala, incluindo sons ou sílabas repetidas, prolongamento de sons de consoantes ou vogais, interrupção de palavras, bloqueio ou palavras pronunciadas com tensão física excessiva. 21 Assim como outros transtornos do neurodesenvolvimento, os transtornos da comunicação iniciam-se precocemente e podem acarretar prejuízos funcionais durante toda a vida. Transtorno do espectro autista: o transtorno do espectro autista caracteriza- -se por déficits persistentes na comunicação e na interação social em múltiplos contextos, incluindo déficits na reciprocidade social, em comportamentos não verbais de comunicação usados para interação social e em habilidades para desenvolver, manter e compreender relacionamentos. Além desses déficits, esse transtorno requer a presença de padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades. No diagnóstico do transtorno do espectro autista, as características clínicas individuais são registradas por meio do uso de especificadores (com ou sem comprometimento intelectual concomitante; com ou sem comprometimento da linguagem concomitante; associação a alguma condição médica ou genética conhecida ou a um fator ambiental). Tais especificadores oportunizam aos clínicos a individualização do diagnóstico e a comunicação de uma descrição clínica mais rica dos indivíduos afetados. Por exemplo, muitos indivíduos anteriormente diagnosticados com transtorno de Asperger atualmente receberiam um diagnóstico de transtorno do espectro autista sem comprometimento linguístico ou intelectual. TDAH: é um transtorno do neurodesenvolvimento definido por níveis prejudiciais de desatenção, desorganização e/ou hiperatividade-impulsividade. Desatenção e desorganização envolvem incapacidade de permanecer em uma tarefa, aparência de não ouvir e perda de materiais em níveis inconsistentes com a idade ou o nível de desenvolvimento. Hiperatividade-impulsividade: implica atividade excessiva, inquietação, incapacidade de permanecer sentado, intromissão em atividades de outros e incapacidade de aguardar. Na infância, o TDAH frequentemente se sobrepõe a transtornos em geral considerados “de externalização”, como o transtorno de oposição desafiante e o transtorno da conduta. O TDAH costuma persistir na vida adulta, resultando em prejuízos no funcionamento social, acadêmico e profissional. Transtornos motores do neurodesenvolvimento: incluem o transtorno do desenvolvimento da coordenação, o transtorno do movimento estereotipado e os 22 transtornos de tique. O transtorno do desenvolvimento da coordenação caracteriza-se por déficits na aquisição e na execução de habilidades motoras coordenadas, manifestando-se por falta de destreza e lentidão ou imprecisão no desempenho de habilidades motoras, o que causa interferência nas atividades da vida diária. O transtorno do movimento estereotipado é diagnosticado quando um indivíduo apresenta comportamentos motores repetitivos e sem propósito, como agitar as mãos, balançar o corpo, bater a cabeça, morder-se ou machucar-se. Os movimentos interferem em atividades sociais, acadêmicas, entre outras. Os transtornos de tique caracterizam-se pela presença de tiques motores ou vocais, ou seja, movimentos ou vocalizações repentinas, rápidos, recorrentes, não ritmados e estereotipados. Transtorno específico da aprendizagem: uma característica essencial do transtorno específico da aprendizagem são dificuldades persistentes para aprender habilidades acadêmicas fundamentais, com início durante os anos de escolarização formal. Habilidades acadêmicas básicas incluem a leitura exata e fluente de palavras isoladas, a compreensão da leitura, a expressão escrita e ortográfica, cálculos aritméticos e raciocínio matemático. Diferentemente de andar ou falar, que são marcos adquiridos do desenvolvimento que emergem com a maturação cerebral, as habilidades acadêmicas (leitura, ortografia, escrita, matemática) precisam ser ensinadas e aprendidas de forma explícita. Os critérios para que se possa atribuir o diagnóstico de transtorno específico da aprendizagem são quatro: A, B, C e D. Os quatro critérios diagnósticos devem ser preenchidos com base em uma síntese clínica da história do indivíduo (do desenvolvimento, médica, familiar, educacional), em relatórios escolares e em avaliação psicoeducacional. Se um desses quatro critérios não for identificado no sujeito, então não se pode aferir o diagnóstico (APA, 2015). Veja a seguir quais são os critérios (APA, 2015). Critério A: é necessária a presença de ao menos um dos sintomas a seguir que tenha persistido por pelo menos seis meses, apesar da provisão de intervenções dirigidas a essas dificuldades: • leitura de palavras de forma imprecisa ou lenta e com esforço; • dificuldade para compreender o sentido do que é lido; 23 • dificuldades para escrever ortograficamente correto; • dificuldades com expressão escrita, erros de gramática ou pontuação, ou expressão escrita das ideias sem clareza; • dificuldades para dominar senso numérico, fatos numéricos ou cálculo; • dificuldades no raciocínio para solucionar problemas quantitativos. Critério B: as habilidades acadêmicas afetadas estão muito abaixo do esperado para a idade cronológica do indivíduo, causando interferência significativa nas atividades cotidianas. Essa interferência é confirmada por meio de medidas de desempenho padronizadas administradas individualmente e por avaliação clínica abrangente. Critério C: as habilidades acadêmicas afetadas iniciaram-se durante os anos escolares ou posteriormente, quando as exigências excederam as capacidades limitadas do indivíduo. Critério D: as habilidades acadêmicas afetadas não podem ser explicadas por deficiências intelectuais, acuidade visual ou auditiva não corrigida, outros transtornos mentais ou neurológicos, adversidade psicossocial, falta de proficiência nalíngua de instrução acadêmica ou instrução educacional inadequada. Se forem satisfeitos os quatro critérios, no diagnóstico será preciso especificar todos os domínios acadêmicos prejudicados. Quando mais de um domínio estiver prejudicado, cada um deve ser identificado individualmente, conforme os especificadores a seguir (APA, 2015, documento on-line). • Com prejuízo na leitura (dislexia): falta de precisão na leitura de palavras, na velocidade ou na fluência da leitura e na compreensão da leitura. • Com prejuízo na expressão escrita (disgrafia): falta de precisão na ortografia, na gramática, na pontuação e na clareza ou na organização da expressão escrita. • Com prejuízo na matemática (discalculia): falta de precisão de senso numérico, de memorização de fatos aritméticos, de precisão ou de fluência de cálculo e de raciocínio matemático. 24 Ainda, será preciso especificar a gravidade atual, se é leve, moderada ou grave, conforme a capacidade de compensar ou funcionar bem quando lhe são propiciados adaptações ou serviços de apoio adequados, especialmente durante os anos escolares (APA, 2015). As dificuldades para dominar essas habilidades acadêmicas básicas podem também ser impedimentos para a aprendizagem de outras matérias acadêmicas (história, ciências, estudos sociais), mas esses problemas são atribuíveis a dificuldades de aprendizagem indiretamente. As habilidades acadêmicas distribuem-se ao longo de um contínuo. Assim, não há ponto de corte natural que possa ser usado para diferenciar indivíduos com ou sem transtorno específico da aprendizagem. Portanto, qualquer limiar usado para especificar o que constitui o desempenho acadêmico significativamente abaixo do esperado para a idade é, em grande parte, arbitrário. Uma avaliação abrangente é necessária. Um transtorno específico da aprendizagem só pode ser diagnosticado após o início da educação formal, mas, a partir daí, pode ser diagnosticado em qualquer momento em crianças, adolescentes e adultos, desde que haja evidência de início durante os anos de escolarização formal (i.e., o período do desenvolvimento). Nenhuma fonte única de dados é suficiente para o diagnóstico de transtorno específico da aprendizagem. Ao contrário, o diagnóstico é clínico e baseia-se na síntese da história médica, de desenvolvimento, educacional e familiar do indivíduo; na história da dificuldade de aprendizagem, incluindo sua manifestação atual e prévia; no impacto da dificuldade no funcionamento acadêmico, profissional ou social; em relatórios escolares prévios ou atuais; em portfólios de trabalhos que demandem habilidades acadêmicas; em avaliações de base curricular; e em escores prévios e atuais resultantes de testes individuais padronizados de desempenho acadêmico (APA, 2015, documento on-line). É necessária uma visão multidisciplinar. A dificuldade de aprendizagem tem causas e desenvolvimentos múltiplos, exigindo pesquisas em diversos campos do conhecimento, para que se tenha uma visão mais ampla sobre esse tema. Portanto, não basta simplesmente listar os sintomas nos critérios diagnósticos para se aferir um transtorno de aprendizagem. Embora a conferência sistemática da presença desses critérios e de como eles se aplicam a cada paciente assegure uma avaliação mais confiável, a gravidade e o peso relativos a critérios individuais e sua contribuição para um diagnóstico exigem discernimento clínico. O objetivo final de uma formulação clínica de caso é usar as informações contextuais e diagnósticas disponíveis para desenvolver um plano 25 terapêutico abrangente, que esteja em consonância com o contexto cultural e social do indivíduo (BOSSA, 2000). Significados, costumes e tradições culturais podem contribuir tanto para o estigma quanto para o apoio na reação social e familiar. O ambiente que o sujeito se insere pode fornecer estratégias de enfrentamento que aumentam a resiliência em resposta ao transtorno ou sugerir a busca de auxílio e opções de acesso à assistência à saúde de diversos tipos. O ambiente pode influenciar a aceitação ou a rejeição de um diagnóstico e a adesão ao tratamento, afetando o curso da doença e sua recuperação, bem como as decisões terapêuticas, as considerações sobre o prognóstico e a evolução clínica (APA, 2015). Por isso, tanto nas considerações caso a caso quanto em uma casuística mais ampla, encontrar um fio condutor para explicar a multiplicidade de sintomas é, às vezes, impossível, mesmo para os especialistas. Isso porque essa complexa e ampla sintomatologia corre paralela à igualmente complexa rede de possibilidades que a origina (BOSSA, 2000). Nesse sentido, Masini (1981) aponta que a intervenção psicopedagógica deve atuar junto com os professores, procurando estabelecer condições facilitadoras para o desenvolvimento escolar, pois um profissional da instituição escolar é “o que tem conhecimentos sobre os processos cognoscitivos e deverá dispor de recursos para lidar com as pessoas e grupos, neutralizando situações de tensão emocional e facilitando relacionamentos” (MASINI, 1981 p. 163). 4 O DIAGNÓSTICO E AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM As dificuldades de aprendizagem no contexto da sala de aula envolvem muito mais do que as situações adversas ao aprendizado, como o déficit sensorial, abandono escolar, baixa condição socioeconómica, problemas cognitivos e neurológicos entre outros. Ciasca (2008), afirma que vale ressaltar que o professor não é o profissional apto a diagnosticar as dificuldades de aprendizagem específica, pois o diagnóstico implica no conhecimento ampliado sobre a origem de determinada doença ou manifestação de seu sintoma. 26 Trentin (2019), ao citar Coelho (2014), afirma que ao professor cabe, estar preparado para detectar as dificuldades de seus alunos e encaminhá-los junto à família para profissionais especializados e responsáveis pelo diagnóstico. É no contexto que envolve o eixo diagnóstico das dificuldades de aprendizagem que emerge o psicopedagogo, o qual segundo Ciasca (2008) pode desenvolver seu trabalho com base na prevenção e intervenção. Buscando informações sobre o contexto que envolve a psicopedagogia, Ciasca (2008) destaca que o diagnóstico psicopedagógico antigamente era direcionado somente ao indivíduo e a origem de suas dificuldades de aprendizagem. No entanto com o passar do tempo e ampliação de estudos na área, passou-se a considerar no diagnóstico psicopedagógico além do indivíduo, o ambiente e o processo de ensino. Assim, podemos inferir que a compreensão das dificuldades de aprendizagem envolve a análise de uma amplitude de fatores que influenciam direta ou indiretamente o indivíduo, possibilitando ao psicopedagogo o desenvolvimento do trabalho com base na prevenção ou intervenção (CIASCA, 2008). No entanto, quando há a presença de dificuldades de aprendizagem, o processo de diagnóstico pode compreender os seguintes procedimentos: [...] anamnese, análise do material escolar, relacionamento com a escola, observação do desempenho em situação de aprendizagem, aplicações de testes psicopedagógicos específicos e solicitação de exames complementares (psicológico, neurológico, oftalmológico, audiométrico, fonológico e outros). Diante disso, observa-se que a intervenção psicopedagógica, quando necessária, é desenvolvida de formas variadas, ficando os procedimentos a serem executados a critérios do profissional que está atuando, geralmente influenciado pela sua formação. (CIASCA, 2008, p. 166-167). A partir dos procedimentos apontados por Ciasca (2008) vale destacarmos que o diagnóstico psicopedagógico busca por fatores que possam estar influenciando a dificuldade de aprendizagem na criança. No entanto antes de tudo, o profissional necessita averiguar como a criança aprende envolvendo as particularidades e as singularidades no desenvolvimento. A compreensãodo processo de aprendizagem e das dificuldades que as crianças enfrentam ao aprender é o objetivo da psicopedagogia, que busca integrar conhecimentos de diversas áreas. Assim, em um contexto multidisciplinar, o psicopedagogo procura esclarecer e desmistificar os termos correlacionados às dificuldades de aprendizagem. Essa desmistificação torna-se necessária devido ao fato de que crianças são encaminhadas 27 para avaliações com profissionais de diferentes áreas em consequência da ausência de conhecimentos dos professores e familiares sobre a causa das dificuldades de aprendizagem. No entanto, Ciasca (2008) aponta que a maioria das causas de dificuldades de aprendizagem se encontram relacionadas à “problemas de ensino”, cujo contexto é o escolar, ou aquelas de ordem afetivo-emocional proveniente do ambiente familiar. O profissional que realiza o diagnóstico necessita ampliar sua visão para além do momento em que se encontra, o que requer esmero e conscientização quanto à responsabilidade de sua atuação na Psicopedagogia, pois o diagnóstico psicopedagógico por ele realizado das dificuldades do aprendiz sempre se encontra vinculado ao âmbito clínico, institucional e familiar. Essa vinculação refere-se a uma necessidade de mudança e transformação das metodologias pedagógicas institucionais e familiares (CHAMAT, 2004, p. 26). Nesta perspectiva, podemos compreender que o diagnóstico precisa possibilitar ao profissional direção para uma intervenção que envolva a criança, a família e a escola, promovendo a autonomia e a motivação para a aprendizagem. O diagnóstico também necessita desvelar os tipos de dificuldades e transtor- nos de aprendizagem, possibilitando uma visão ampla da criança e encaminhamentos quando necessário. A visão ampla, segundo Chamat (2004) envolve uma leitura de como se dá o processo de aprendizagem; a procedência das dificuldades ou incoerências no sistema de ensino, considerando a visão que a criança tem do real voltado para suas relações e aquisição de novos conhecimentos (CHAMAT, 2004). Assim, consideramos o diagnóstico fundamental para a identificação das cau- sas das dificuldades de aprendizagem, possibilitando uma possível intervenção, pois ele avalia a situação do aluno no contexto escolar, considerando a influência de fatores internos e externos sobre a aprendizagem, permitindo assim que a dificuldade seja identificada. Vale destacarmos neste contexto que envolve o diagnóstico a importância da participação do professor, escola e a família (CIASCA, 2008). Mediante o que vimos até o momento sobre a importância do diagnóstico, podemos destacar que este, apresenta como objetivo principal identificar as difi- culdades de aprendizagem da criança e os processos psicológicos que envolvem a compreensão da língua falada e escrita. Diagnóstico este, que deve ocorrer em conjunto com outros especialistas (psicólogo, fonoaudiólogo, pedagogo etc.). 28 O processo que abarca o diagnóstico necessita subsidiar qualquer tipo de julgamento que se faça necessário para uma futura intervenção, a qual necessita estar vinculada à construção da aprendizagem na criança (CIASCA, 2008). Neste contexto, Ciasca (2008) ainda aponta que o sucesso do diagnóstico não depende do cumprimento de uma bateria de testes ou técnicas de avaliação, mas sim de um processo guiado pelo perfil da criança avaliada, onde haja flexibilidade para com a seleção e aplicação do material. Assim, podemos compreender que a psicopedagogia apresenta como objetivo principal a integração da criança no contexto escolar, oferecendo-lhes novas opções de interação com este meio, tendo em vista seu desenvolvimento. Torna-se válido ressaltar o ponto de vista de Ciasca (2008) quando esta se refere às bases pioneiras da Psicopedagogia, as quais envolvem a atuação da Medicina e Pedagogia enquanto o princípio de evolução de estudos no campo das dificuldades de aprendizagem. Neste contexto, discute-se o papel do psicopedagogo enquanto aquele que deve desenvolver atividade investigativa quanto à origem de tais dificuldades buscando alternativas para que as mesmas sejam superadas a fim de outras possíveis serem evitadas. Para tanto, torna-se imprescindível o conhecimento da criança e os recursos dos quais o mesmo se dispõe para a produção de conhecimento e aprendizagem. Assim sendo, torna-se fundamental que os profissionais especializados responsáveis pelo diagnóstico tenham conhecimento do que é ensinar e o que é aprender considerando a maneira com a qual sistemas e metodologias de ensino podem interferir positivamente ou negativamente neste processo. 4.1 Estilos cognitivos de aprendizagem Estilos cognitivos de aprendizagem não são capacidades, mas, sim, maneiras preferidas de utilização das capacidades (STERNBERG, 1997). Dessa forma, podemos aprender e pensar por meio de diversas maneiras. Aprender é construir “[...] seus conhecimentos e sua afetividade na interação [...]” com outros sujeitos e “[...] por meio de influências recíprocas que vão estabelecendo cada sujeito constrói o seu conhecimento de mundo e o conhecimento de si mesmo como sujeito histórico [...]” (LOPES, 1996, p. 111). 29 Cada pessoa apresenta diferenças individuais, sendo assim, a sua história de vida irá influenciará no modo pelo qual ela organizará e processará as informações recebidas pelo meio. É inegável que cada pessoa apresente interesses, valores, motivações, cultura, aspirações diferentes umas das outras, pois a forma como assimila os dados recebidos do meio onde está inserida é percebida de maneira diferente, ou seja, individual. Os estudos sobre os estilos cognitivos foram desenvolvidos com base em interesses nas diferenças individuais da capacidade de pensar, perceber, lembrar de fatos e situações e resolver problemas. Santos, Bariani e Cerqueira (2000) afirmam que, desde o século IX, estudiosos já tinham interesse pelas variações individuais nos modos de pensamento, porém a expressão “estilo cognitivo” foi usada pela primeira vez por Allport, em 1937. Esse autor considerava que todas as pessoas tinham tendências ou predisposições cognitivas e afetivas, que seriam os modos básicos para atuar e pensar e determinariam as percepções e os julgamentos, sendo denominados de estilos cognitivos (ALLPORT, 1973). Bariani (1998) destaca que os estilos cognitivos, além de serem características da estrutura cognitiva do indivíduo, também são modificados direta ou indiretamente pela influência de novos eventos, como os fatores biológicos, a própria cultura e as experiências de vida. Para o autor, os estilos são estruturas relativamente estáveis e podem sofrer impacto de experiências vividas durante os anos de escolaridade, inclusive na etapa do ensino superior. Santos, Bariani e Cerqueira (2000) estudaram os estilos cognitivos por meio de seus fatores psicológicos, adotando quatro dimensões. Campo dependente: este estilo cognitivo caracteriza indivíduos que requerem reforçamento extrínseco em suas atividades e têm como base uma estrutura externa de referência; assim, optam por conteúdos e sequências preestabelecidos. Preferem trabalhar em grupo e atribuem importância a uma interação informal no ambiente escolar (relação professor-aluno); no entanto, apresentam dificuldades em fazer avaliações críticas. Quando nos referimos que o indivíduo requer um reforço extrínseco, estamos dizendo que ele precisa de um apoio externo. 30 Campo independente: característica própria de indivíduos que tomam como base estruturas internas de referência e, por isso, optam por participar da organização de conteúdos e sequências. Preferem trabalhar individualmente e importam-se mais com o conteúdo do que com a interação professor-aluno. Não apresentam dificuldades em fazer análises críticas referentes às outras pessoas. Impulsividade de resposta:característica comum às pessoas que costumam responder sem uma prévia reflexão. Não dão importância à ponderação e à organização que precede a ação. Reflexividade de resposta: diz respeito às pessoas que se atêm mais às ponderações e organizações que antecedem uma resposta. Seus pensamentos são mais ordenados e contínuos. A dimensão impulsividade/reflexividade de resposta está ligada à organização da atenção. A impulsividade tende a dar respostas imediatas e, consequentemente, muitas vezes, imprecisas, com pouca ponderação e organização prévia. Já a reflexividade se refere a uma tendência para analisar e diferenciar estímulos complexos. Convergência de pensamento: constitui um aspecto que identifica indivíduos, cujo pensamento obedece ao raciocínio lógico, que têm habilidades para lidar com questões que exigem uma solução determinada a partir das informações fornecidas. Têm mais facilidade em trabalhar com tarefas mais convencionais e estruturadas, que requerem lógica. São pessoas disciplinadas, acomodadas e conservadoras. Há uma identificação do pensamento convergente com o pensamento lógico e o raciocínio. Indivíduos com essa dimensão acentuada são hábeis em lidar com problemas que requerem uma clara resposta convencional (uma solução correta), com base nas informações fornecidas. São inibidos emocionalmente e identificados como mais conformistas, disciplinados e conservadores (BARIANI, 1998; BARIANI; SISTO; SANTOS, 2000). Divergência de pensamento: é relativo à imaginação, criatividade, originalidade e fluência. São indivíduos que apresentam pouca sociabilidade e trabalham melhor com problemas menos estruturados, que requerem quantidade, variedade, originalidade e generalidade das respostas. O pensamento divergente é associado à criatividade, a respostas imaginativas, originais e fluentes. Os indivíduos com essa predominância preferem problemas informais, sendo hábeis em tratar de problemas que demandam a generalização de várias respostas igualmente aceitáveis. 31 Socialmente, são considerados irritadiços, disruptivos e até ameaçadores (BARIANI, 1998; BARIANI; SISTO; SANTOS, 2000). Holista: caracteriza aqueles que analisam uma tarefa sob o ponto de vista global, tentando estabelecer relações entre suas partes com a elaboração de hipóteses complexas. Indivíduos com pensamento holista dão maior ênfase ao contexto global desde o início de uma tarefa, preferem examinar uma grande quantidade de dados, buscando padrões e relações entre eles. Usam hipóteses mais complexas, às quais combinam diversos dados (RIDING; WHEELER, 1995; SANTOS; BARIANI; CERQUEIRA, 2000; BARIANI; SISTO; SANTOS, 2000; ZHANG, 2002). Serialista: são os indivíduos que trabalham com um problema, partindo de aspectos específicos e separados, que posteriormente serão integrados para a confirmação ou refutação de hipóteses simples, as quais, “passo a passo”, possibilitarão a resolução de um problema. Os serialistas dão maior ênfase a tópicos separados e em sequências lógicas, buscando padrões e relações somente mais tarde no processo, para confirmar ou não suas hipóteses, as quais são mais simples, além de uma abordagem lógico- -linear (RIDING; WHEELER, 1995; SANTOS; BARIANI; CERQUEIRA, 2000; BARIANI; SISTO; SANTOS, 2000; ZHANG, 2002). Salienta-se que o estilo cognitivo indica a tendência da pessoa a se comportar de determinada maneira, o que, por exemplo, influencia nas suas atitudes. Sendo assim, eles representam o modo preferido da pessoa processar a informação e descrevem o modo de ela pensar, relembrar ou resolver problemas. Percebe-se a importância dos estilos cognitivos para o desenvolvimento da aprendizagem, pois eles possibilitam a valorização das características de cada indivíduo, oferecendo a oportunidade de se adaptarem as diversas exigências do mundo contemporâneo. 4.2 Temperamento infantil e as estratégias de ensino Segundo LaHaye (1997), não existe outra coisa, que possa influenciar tanto a nossa vida quanto o temperamento ou a combinação deles. “O temperamento influencia tudo o que você faz – desde os hábitos de sono e de estudo, o estilo de alimentação, até a maneira que você se relaciona com outras pessoas [...]” (LAHAYE, 1997, p. 9). 32 No campo de estudo do temperamento, uma primeira abordagem adveio de um trabalho pioneiro realizado por Thomas e Chess, denominado Estudo Longitudinal de Nova Iorque (THOMAS et al., 1963 apud MURIS; OLLENDICK, 2005). Nela, o temperamento é entendido como uma categoria derivada de comportamentos exibidos em um determinado momento de vida, resultantes de todas as influências passadas e presentes, as quais os modelam e modificam em um processo constante e interativo. Segundo Muris e Ollendick (2005) as categorias de temperamento são: nível de atividade, ritmo, aproximação ou retraimento, adaptabilidade, limiar de responsividade, intensidade de reação, qualidade de humor, distraibilidade e período de atenção e persistência. • Nível de atividade é referente ao componente motor presente no funcionamento de uma criança e na proporção diurna de períodos de ativação e passividade. • Ritmo é direcionado à previsibilidade e/ou imprevisibilidade no tempo de qualquer função. • Aproximação ou retraimento estão ligados à resposta inicial a um estímulo novo, por exemplo, uma nova comida ou um novo brinquedo. • Adaptabilidade se refere à facilidade com que a criança modifica uma situação nova ou alterada na direção desejada. • Limiar de responsividade está voltada à intensidade do nível de estimulação necessária para evocar uma resposta deliberada, independentemente da forma específica que esta pode assumir ou da modalidade sensorial afetada. • Intensidade de reação diz respeito ao nível de energia da resposta, independentemente da sua qualidade ou direção. • Qualidade de humor fala da quantidade de prazer, divertimento ou comportamento amistoso em comparação ao desprazer, choro e comportamento não amistoso. • Distraibilidade está direcionada à efetividade de um estímulo ambiental externo em interferir no comportamento vigente e alterar sua direção. • Período de atenção e persistência é referente, respectivamente, ao período de tempo que uma atividade particular é realizada pela criança 33 e à continuação de uma na presença de obstáculos para a manutenção da direção da atividade. Segundo Rothbart et al. (2003), essas categorias deram origem às seguintes classificações de tipos de temperamento: • Temperamento fácil, que é caracterizado por regularidade nas funções biológicas, respostas de aproximação positiva a estímulos novos, alta adaptabilidade à mudança, assim como intensidade de humor de leve à moderada e preponderantemente positiva. • Temperamento difícil, e se caracteriza por sinais de irregularidade nas funções biológicas, respostas de retraimento negativo a novos estímulos, não adaptação ou adaptação lenta a mudanças e expressões de humor intensas, frequentemente negativas. • Temperamento lento para reagir, que é caracterizado pela combinação de respostas negativas a estímulos novos com adaptabilidade lenta após contatos repetidos. Segundo as ideias de Rothbart et al. (2003), as crianças de temperamento fácil têm a tendência de se adaptarem rapidamente a novas demandas do ambiente, enquanto as de temperamento difícil apresentam dificuldades de adaptação a novas situações e humor negativo. Já as crianças de temperamento lento apresentavam dificuldades moderadas de adaptação frente a novas demandas. 5 FRACASSO E SUCESSO ESCOLAR Apesar de a escola ser um espaço de aprendizagem e formação, percebe-se a existência de uma cultura educacional na qual o aluno deve possuir habilidades e competências já estabelecidas para ser inserido na escola e, se não as tiver, é encaminhado para os serviços de saúde. Assim, a escola nemsempre procura refletir seu fazer e pensar em soluções para o fracasso em seu interior, como, por exemplo, rever metodologias de ensino e processos de avaliação. Essas práticas demonstram um processo de ruptura vigente das próprias teorias pedagógicas, na medida em que alguns pesquisadores e profissionais desconsideram os múltiplos fatores que determinam os fracassos 34 escolares, fazendo com que o foco esteja somente no âmbito do individual e do orgânico da criança e do aluno e não nas questões sociais, econômicas, educacionais e de concepção histórica da escola. 5.1 O fracasso escolar no Brasil: Perspectiva contextual Com frequência, a qualidade educacional é pauta nos contextos acadêmicos e políticos, nos quais se evidencia que, no Brasil, essa qualidade está muito longe do esperado e que os objetivos escolares não alcançam cerca de metade dos alunos. No âmbito da Política Nacional de Avaliação da Educação Básica, resultados coletados em diferentes anos demonstraram que o fracasso escolar se encontra presente na realidade brasileira de maneira preocupante. Com altos índices de fracasso escolar, não se pode falar em oportunidades iguais, tampouco em escola democrática (PINHEIRO et al., 2020). Conforme levantamentos realizados nos estudos de Pinheiro et al. (2020), o motivo mais apontado pelos educadores é o "aluno problema", que é apresentado como portador dos fatores que resultam em seu próprio fracasso, retirando do profissional da educação a responsabilidade de uma reflexão constante sobre a sua prática. Entretanto, existem autores, como Patto (1999), que causaram impactos nessa visão e entendem que este é um fenômeno multideterminado, que deve ser analisado por diversos ângulos, não somente a partir do sujeito e da família, mas a partir das relações e do contexto social. Dessa forma, o fracasso escolar não deve ser naturalizado, mas analisado dentro de um contexto social, político e econômico. Patto (1999), em sua obra “A produção do fracasso escolar: histórias de submissão e rebeldia”, inicia um de seus capítulos com uma frase de Berthold Brech, que já desacomoda aqueles que condenam o aluno por suas dificuldades escolares: "A árvore que não dá frutos é xingada de estéril. Quem examina o solo?" (PATTO, 1999, p. 26). Nessa metáfora, se reconstitui o modo dominante de pensar as coisas referentes à escolaridade, em que comumente se busca avaliar e diagnosticar o aluno que não rende, mas esquece-se de avaliar e diagnosticar a escola e seus métodos, sem qualquer laço de dependência com as condições sociais e históricas. 35 Patto (1999), então, utiliza-se do modo materialista histórico de pensar essa relação para reforçar a necessidade de conhecer a realidade social, na qual se construíram ideologias sobre as diferenças de rendimento escolar entre crianças de diferentes origens sociais. Para isso, torna-se necessário reunir informações que permitam conhecer como surgiram as ideias sobre a dificuldade de escolarizar-se, seja na forma de crenças ou das certezas cientificamente fundadas. É inevitável, então, relembrar o surgimento das sociedades industriais capitalistas, para captar a essência da natureza das concepções dominantes sobre o fracasso escolar em uma sociedade de classes (PATTO, 1999). Para Euzébios Filho e Guzzo (2009), o mecanismo ideológico do capitalismo é utilizado para ocultar a natureza predatória desse sistema social e responsabilizar o próprio indivíduo pelo seu “fracasso” ou “sucesso”. A ideologia propagada pelo capitalismo é a de que o sucesso social de cada indivíduo só pode ser conquistado a partir do esforço individual, tentando justificar as desigualdades sociais e ocultar a lógica predatória do próprio capitalismo, que sobrevive a partir dessas desigualdades e da acumulação de riquezas por uma minoria dominante. Patto (1999) destaca a crítica de que a grande revolução industrial foi o triunfo não da indústria como tal, mas de uma indústria capitalista e exploradora. A passagem do modo de produção feudal para o modo de produção capitalista causou grandes convulsões sociais: a relação de produção dominante empurrou grandes contingentes das populações rurais para os centros industriais, gerou os grandes centros urbanos com seus contrastes, veio coroar uma nova classe dominante — a burguesia — e uma nova classe dominada — o proletariado —, que é explorada economicamente seguindo as regras do jogo capitalista. As comunidades que antes se constituíam de artesãos e camponeses perderam suas condições anteriores de produtores independentes e de agricultores, tornando-se uma massa popular faminta e militante que se acumulava nas cidades. De vida produtiva e criativa, o trabalho reduziu-se a meio para satisfação da necessidade de manter a existência (PATTO, 1999). A cidade industrial típica, nesse período, era uma cidade superpovoada, carente de infraestrutura, que aglomerava os trabalhadores na periferia e em vilas operárias, que contrastavam com os bairros da vida burguesa. A nova burguesia deixa de ser apenas formada pelos que herdam tais 36 títulos e forma- -se por aqueles que foram crescendo às custas da exploração do trabalhador assalariado. Assim, o mundo atingido direta ou indiretamente pela economia capitalista estava basicamente dividido em perdedores e vencedores. Os perdedores eram os grandes contingentes de trabalhadores assalariados, de serviços braçais subalternos e mal-remunerados. Os vencedores eram os novos homens bem-sucedidos (PATTO, 1999). Essa crença liberalista de que a divisão social em classes superiores e inferiores teria como critério o talento individual ajuda a compreender os caminhos trilhados do fracasso escolar no advento dos sistemas nacionais de ensino, com a produção de uma escolarização para os mais pobres, dando-lhes uma formação mais precária e com falta de investimentos, o que mantinha os interesses do capitalismo. Com essa desigualdade educacional, se fortalece a ideologia de que o sucesso ou fracasso, em termos de progresso científico, técnico e econômico, depende exclusivamente dos esforços e méritos próprios. O contexto contribuía para que os vitoriosos na nova ordem social acreditassem nisso, pois é compreensível que essa ideologia/crença encontrasse maior receptividade e entusiasmo entre aqueles mais diretamente beneficiados pela nova ordem econômica e em ascensão: os círculos mercantis e os financistas; os proprietários; os administradores sociais e econômicos; os de espírito científico; a classe média instruída; os fabricantes e os empresários (HOBSBAWM, 1982). A escola universal, obrigatória, comum e gratuita seria também o meio de obter a grande unidade nacional, onde se fundiriam as diferenças de credo e de raça, de classes e de origem, com mecanismos sociais que garantissem a transformação dos súditos em cidadãos e, ainda, a serviço da nação capitalista. Daí a concepção da escola como instituição “redentora da humanidade" (ZANOTTI, 1972). A escola não teria sido inicialmente uma instituição necessária à qualificação das classes populares para o trabalho. Mesmo quando a especialização técnica do operário passou a ser uma necessidade, seu treinamento era feito na própria fábrica. A missão da escola para a classe trabalhadora não era a aquisição de habilidades cognitivas específicas, era de ajustes comportais para atender às medidas mais imediatas para essa classe: ensinar uma disciplina rígida para forçá-lo a aprender a trabalhar sem descanso; ensinar a submissão na relação entre alunos e 37 professores para garantir a disciplina e a obediência do trabalhador na relação entre patrões e empregados. Nesse momento não havia consciência crítica do explorado, nem oposição a esse modelo educacional, pois acreditavam nos discursos de méritos justificadores das desigualdades existentes.Assim, a universalidade de ideias era real e, à medida que a classe ascendente se transformava em classe dominante, criavam-se as condições para que seus interesses particulares aparecessem mais ainda como universais e se tornassem senso comum (CHAUÍ, 1981; PATTO, 1999). A escola adquiriu funções diferentes para diferentes grupos e segmentos de classes: para as classes médias, a escola era o instrumento real de ascensão e de prestígio social; para as elites emergentes e para os empresários, era a instituição a serviço do desenvolvimento tecnológico necessário para racionalizar, aumentar e acelerar a produção; para a grande massa de trabalhadores miseráveis, a escola era apenas a manutenção do sonho de deixar a condição de trabalhador braçal desvalorizado e de vencer na vida. Para estes, no sistema público de ensino, a educação primária já era negligenciada, e onde existia limitava-se a ensinar rudimentos de leitura, de aritmética e obediência moral (HOBSBAWM, 1982; PATTO, 1999). Conforme Patto (1999), Galton foi um desses cientistas que teve como objetivo principal o de medir a capacidade intelectual e comprovar a sua determinação hereditária, concluindo que brancos e nobres são geneticamente de intelectualidade superior. Para ele, as aptidões naturais humanas são herdadas exatamente da mesma forma como os aspectos constitucionais e físicos de todo o mundo orgânico. As ideias de Galton a respeito de que a inteligência é herdada para uns e não para outros marcaram época na psicologia, e sua influência sobre o movimento dos testes mentais que davam escores mais altos para a classe dominante foi marcante. Ao focar a distribuição desigual dos dons e dos talentos de acordo com genética das famílias e das linhagens, em uma ordem social em que o acesso aos bens materiais e culturais não é o mesmo para todos — mais do que isso, em uma sociedade em que a discriminação e a exploração incidem mais sobre determinados grupos étnicos —, a definição da superioridade só pode resultar em um grande erro: 38 acreditar que é natural o que, na verdade, é socialmente determinado — o fracasso escolar (HOBSBAWM, 1982; PATTO, 1999). Torna-se possível entender que a história, que deveria ser passado, ainda se faz presente nas representações de mundo de hoje e no modo como os homens se relacionam para produzir e reproduzir a vida. 5.2 Fatores que constituem o fracasso escolar O aumento da demanda social por escola nos países industriais capitalistas trouxe consigo dois problemas para os educadores: de um lado, a necessidade de explicar as diferenças de rendimento da clientela escolar; do outro, a de justificar o acesso desigual dessa clientela aos graus escolares mais avançados. Tudo isso sem ferir o princípio essencial da ideologia liberal, segundo o qual o mérito pessoal é o único critério legítimo de seleção educacional e social (PATTO, 1999). A ambiguidade imposta por esse duplo problema trouxe argumentos de diferentes naturezas sobre os fatores que constituem o fracasso escolar; argumenta- se que a culpa é dos estudantes e de suas famílias: desinteresse, pouco repertório, pobreza, carência afetiva, indisciplina e desestruturação familiar, entre outros. Argumenta-se que a culpa é dos docentes: pressupõe-se que os docentes são desinteressados, principalmente em razão dos baixos salários ou da falta de vocação; diz-se que têm formação precária, desconhecem metodologias ativas e reproduzem planos de aula sem qualquer crítica ou conexão com as questões sociais. Pressupõe-se que a culpa é da gestão educacional: falta de compromisso dos gestores, ou de nenhum investimento em infraestrutura (falta de bibliotecas, laboratórios de informática, quadras de esportes, salas de leitura e dependências acessíveis). Dizem que a culpa é da organização seriada do ensino: a teoria é que a organização seriada favorece as reprovações, mas experiências que utilizam outros modelos revelam que os docentes encontram mecanismos para continuar retendo os alunos. Justificam que a culpa é das concepções de currículo: o argumento é de um currículo por competências, em que alunos expostos aos conhecimentos desenvolverão atributos e méritos pessoais, ignorando que a educação é um processo coletivo 39 Argumenta-se que a culpa é da avaliação: a centralidade nos resultados das avaliações também isenta a responsabilidade aos que ensinam, fazendo com que a avaliação quantitativa da aprendizagem tenha o objetivo de identificar se os estudantes conseguem reproduzir os conteúdos ensinados, garantindo a neutralidade do processo de julgamento avaliativo e que também a culpa é da política de inclusão escolar: estudiosos referem que a abertura da escola para todos diminuiu a qualidade da educação. Chamando de escola de massas, o professor tem que ensinar a todos, no mesmo tempo e no mesmo espaço, retirando do docente a possibilidade de atender com qualidade ao aluno normal e merecedor de estar na escola, para dedicar atenção especial aos diferentes, atrasados, pobres e desobedientes, que deveriam estar com especialistas de apoio ou em uma escola ou classes próprias para eles. As discriminações são reforçadas e sistematizadas na escola, contribuindo para a perda de vínculos, para perseguições e para o desinteresse dos estudantes, acarretando possíveis reprovações e abandono escolares. 5.3 A relação entre fracasso escolar e desigualdade social Desde o início século XX, pesquisas e informações têm desmentido a ideia de que a escola obrigatória e gratuita viera para transformar a humanidade, para redimi- la da ignorância e da opressão. O que se mostra é que a escola não cumpriu seu papel, e que a posse do alfabeto, da constituição e da imprensa, da ciência e da moralidade não havia livrado os homens da tirania, da desigualdade social e da exploração (PATTO, 1999). Não é possível falar que todos têm igualdade de oportunidades e que o sucesso depende do esforço pessoal enquanto a relação entre fracasso escolar e desigualdade social tem reflexo dessa desigualdade já ao entrar no portão da escola, já que apenas 0,6% delas possuem infraestrutura próxima ao padrão mínimo para escolarização, ou seja, biblioteca, laboratório de informática, quadra esportiva, laboratório de ciências, além de dependências adequadas para atender a estudantes com necessidades especiais e básicas. Destaca-se também que somente 44% das instituições de educação básica possuem água encanada, sanitário, energia elétrica, esgoto e cozinha em sua infraestrutura (MOTTA et al., 2015). 40 A definição da educação como promotora do “pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1988, art. 205) intensifica a dimensão do quanto as perdas nas aprendizagens e na qualidade do ensino podem representar para o desenvolvimento econômico, social e cultural das pessoas e das localidades. Isso acontece na medida em que determinados estudantes, que não se moldam ao tipo de estrutura escolar capitalista vigente, são excluídos dos processos de aprendizagem, reforçando que a escola se constituiu como mais uma forma de divisão social, gerando em diversos alunos com baixo rendimento escolar a noção de que o espaço educacional no qual estão inseridos não lhes pertence, ocasionando o que se observa como fenômeno imediato: o fracasso e a evasão escolar (KUENZER, 2005). A relação entre fracasso escolar e desigualdade social se evidencia, então, nesses alunos, que, excluídos do fluxo escolar, serão excluídos dos mercados de trabalho formais e, consequentemente, incluídos em trabalhos informais, nos quais o nível de exploração será muito maior e a precarização mais intensa, internalizando a responsabilização individual pela sua condição, que passa a constituir sua forma de ser (KUENZER, 2005). Oaumento dos anos de estudos facilita o acesso a melhores oportunidades de trabalho e possibilita maiores rendimentos. A Unicef (2021) descreve a contribuição da escolarização para a melhoria das possibilidades de: a) trabalho e renda (correlação entre anos de estudo e rendimentos); b) prevenção de enfermidades (correlação entre anos de estudo e expectativa de vida); c) superação de desigualdades sociais e econômicas (correlação entre anos de estudo e justiça social). A compreensão histórica do fracasso escolar brasileiro tantos, a reforçar o caráter fundamental da educação para o desenvolvimento econômico e social do país e a diminuição das desigualdades. Ao logo deste capítulo, você viu o contexto histórico do fracasso escolar brasileiro. Descreveu-se que a escola não teria sido inicialmente uma instituição necessária à qualificação das classes populares e que coube responsabilizar o próprio indivíduo pelo seu “fracasso” ou “sucesso”, mesmo diante da produção de uma escolarização para os mais pobres que lhes dava uma formação mais precária e com falta de investimentos. 41 A história da educação, que deveria ser passado, ainda se faz presente nas representações ideológicas. Você pode perceber que dentre os fatores que constituem o fracasso escolar, ou seja, a reprovação, a evasão e a distorção idade- série, surgem argumentos de diferentes naturezas, de que a culpa é dos estudantes e de suas famílias, dos docentes, de gestão educacional, da organização seriada, das concepções de currículo, da avaliação e até da escola de massas. É necessário e urgente superar as alegações de culpas, pois em alguma medida elas encontrarão mérito em algum segmento social e continuarão com a cultura do fracasso educacional, continuarão combinando aspectos e discursos que se implantam como verdades nas memórias e práticas de educadores e da comunidade escolar. De acordo com a Unicef (2021), ao conhecer essas alegações, pode-se confrontá-las com o direito à educação, que se objetiva no direito a conhecer e a aprender e começar a construir uma cultura de trajetórias escolares bem-sucedidas, que construam e devolvam os desejos e aspirações para meninas e meninos. O direito à educação deve se desdobrar na conquista de outros direitos e, também, nas oportunidades de vivenciar a cultura democrática e de ações contra todas as discriminações. Finalmente, neste capítulo, você pôde relacionar o fracasso escolar com a desigualdade social, em que os excluídos do fluxo escolar são excluídos do trabalho. O enfrentamento da cultura do fracasso nas escolas de todo o país e, em especial, das escolas que atendem às populações mais vulneráveis, é responsabilidade de cada docente e de cada gestor em todas as instâncias dos sistemas educacionais (PATTO, 1999; UNICEF, 2021). Reverter essa cultura não é fácil, pois não se destrói em pouco tempo uma ideologia que por séculos foi construída e faz parte até hoje do pensamento social, segundo o qual o mérito pessoal é o único critério legítimo de sucesso educacional (PATTO, 1999). É fundamental um esforço conjunto do governo, da sociedade e da comunidade escolar para conhecer a fundo o problema, debater as diversas visões e enfrentar a cultura do fracasso escolar. A compreensão histórica do fracasso escolar brasileiro 15 No entanto, combater o fracasso escolar não pode ser um ato burocrático, mas de compreensão 42 de que o fracasso escolar é um mecanismo contra a educação, contra o sistema educacional, contra os profissionais da educação, contra os estudantes e, por fim, contra a sociedade (UNICEF, 2021). A escola precisa ser um lugar seguro, onde se conhece, se debate, se constroem e se reconstroem conhecimentos sem ameaças. É preciso rever os currículos, a avaliação das aprendizagens e os cotidianos escolares, criando espaços inclusivos, em que todos tenham direito a trajetórias de sucesso escolar. As escolas são instituições importantes para a ampliação do acesso aos bens culturais, materiais e imateriais e para romper com o isolamento cultural a que estão submetidos diversos segmentos sociais. No entanto, a cultura da reprovação incide fortemente sobre as trajetórias escolares de crianças e adolescentes e, combinada com características pessoais e limitações de acesso decorrentes das desigualdades sociais, aumenta a incidência de abandono e perpetua os ciclos de exclusão. A elaboração e a execução de ações voltadas para o enfrentamento do fracasso escolar dependem do quanto se pode conhecer sobre as características desse fenômeno, sua incidência sobre determinados territórios e, neles, sobre determinados grupos, mas levando em conta eventuais dificuldades relacionadas às suas características e condições de vida como dados da realidade, e não como obstáculos ao trabalho educacional (UNICEF, 2021). Sem o reconhecimento de que a melhoria dos resultados escolares passa pela transformação das relações, pela inclusão, pelo combate ao racismo e aos descasos com determinados grupos, não haverá mudança nos patamares atuais. 6 METODOLOGIAS PAUTADAS EM RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS No final da década de 1960, professores da faculdade de Medicina da Universidade MacMaster, no Canadá, introduziram uma abordagem específica educacional, com o objetivo de mudar a forma de ensino da medicina, denominada aprendizagem baseada em problemas (ABP). O intuito da equipe de professores era formar médicos que soubessem aplicar, na prática, todo o conhecimento obtido de forma teórica. Para tanto, essa 43 proposta era introduzida nos últimos anos do curso, em que os alunos já possuíam conhecimento teórico suficiente para resolver determinados problemas. Conhecida como aprendizagem baseada em projetos, aprendizagem baseada em problemas ou aprendizagem por descoberta, a abordagem é sempre a mesma: colocar o aluno em contato com problemas ou situações que se aproximem de sua realidade, para que possa resolvê-los utilizando seus conhecimentos. A maior diferença entre a aprendizagem baseada em projetos e a aprendizagem baseada em problemas está na necessidade de integração das diferentes áreas do conhecimento, na capacidade de solução da questão em forma de um produto e na cooperação para resolução da proposta de trabalho. A ABP, originalmente denominada project based learning (PBL), representa uma estratégia de ensino ativa e inovadora, em que o aluno irá construir o conhecimento de forma coletiva e interdisciplinar, por meio de atividades de projeto. Em linhas gerais, a ABP é a solução de um ou mais problemas que podem se desenvolver durante o ensino de projeto. Trata-se de uma abordagem pedagógica na qual os estudantes iniciam sua atividade partindo de um problema que pode ser real ou uma situação simulada de qualquer área do conhecimento, desde que atenda aos objetivos de aprendizagem de um curso ou disciplina. É importante considerar que os problemas são situações contextualizadas e apresentadas pelo professor em forma de questões, casos e cenários que necessitam de uma solução/resposta por meio de um processo investigativo realizado pelos discentes. Apesar de ter sua origem na década de 1960, foi a partir de 1990 que a ABP passou a ser aplicada nos Estados Unidos. É uma metodologia que tem ganhado cada vez mais espaço, por ser “[…] um formato de ensino empolgante e inovador, no qual os alunos selecionam muitos aspectos de sua tarefa e são motivados por problemas do mundo real que podem, e em muitos casos, irão contribuir para a sua comunidade” (BENDER, 2014, p. 15). Diferentes universidades passaram a introduzir a metodologia em seus cursos de Medicina, inclusive o Brasil, que em 1993, implantou a ABP pela primeira vez na Escola de Saúde Pública do Ceará. Em seguida, a prática começou a ser empregada em diferentes universidades e áreas que não fossem somenteda saúde, como administração, pedagogia, engenharias, entre outras. 44 Analisando o modelo educacional tradicional, baseado demasiadamente em aulas expositivas e na memorização de conteúdos, entendemos a importância de repensarmos sobre metodologias inovadoras, que possibilitem maior participação do aluno em seu processo de aprendizagem. A ABP entende que o problema é apresentado para ajudar os alunos a identificarem suas próprias necessidades de aprendizagem, à medida que tentam entendê-lo, reunir, sintetizar e aplicar informações sobre o problema e começar a trabalhar efetivamente para aprender com os membros do grupo e com o tutor (professor). Os fundamentos da aprendizagem baseada em problemas estão descritos a seguir. • Aprendizagem em grupos pequenos: a aprendizagem baseada em projetos e em problemas ocorre em uma configuração de tutoria, em grupos de sete a oito alunos. Um aluno é designado para um grupo tutorial e há um facilitador diferente em cada uma das cinco áreas de fundamentação. Os tutoriais ocorrem duas vezes por semana. • Facilitação por parte dos professores: o tutor procura estabelecer um equilíbrio entre guiar a conversa do tutorial e solicitar ativamente o feedback dos alunos, para garantir que suas lacunas de conhecimento sejam abordadas e resolvidas. • Uso de casos reais: os alunos são apresentados a casos reais durante o primeiro tutorial da semana. Espera-se que os alunos estudem, investiguem o caso e apresentem seus resultados durante o segundo tutorial dessa semana. • Objetivos de aprendizagem: simplesmente propor aos alunos um caso não garante que eles entenderão os conceitos apropriados. Cada caso/ tutorial é fundamentado em um conjunto de objetivos de aprendizagem definidos, essenciais para garantir que os alunos abordem o conteúdo correto e identifiquem seus pontos fortes e fracos naquela área em particular. Para Bruner (1976), o processo de aprendizagem ocorre a partir da aquisição e da transformação de uma nova informação, adaptando novas ideias e avaliando a aquisição dessa informação. 45 Entendendo o processo de aprendizagem e considerando os fundamentos da ABP, é importante destacar que, para o sucesso desse processo e para que o aprendizado realmente aconteça, é necessário o envolvimento do aluno, seu interesse e sua curiosidade em aprender. Para que esse interesse desperte no aluno, os problemas trazidos para sala de aula não podem ser rotineiros: devem ser construídos, privilegiando problemas reais, que desenvolvam as habilidades dos alunos, instiguem a busca criativa de soluções e o pensamento crítico. O papel do professor é fundamental, uma vez que ele é o mediador entre o aluno e o conteúdo a ser estudado, estimulando-o em suas descobertas. É ele quem cria as situações de aprendizagem e seu papel na construção dos problemas é fundamental, uma vez que ao formulá-los, ele precisa fazer conexões entre a teoria e a prática, buscando as relações entre o que ensina e as habilidades necessárias aos futuros profissionais, de forma que estimule os alunos a tomarem suas próprias decisões. Quando bem aplicada, a ABP pode produzir efeitos positivos na prática educativa, levando os alunos a interagir com a realidade e a desenvolverem o senso crítico. Ao analisar as constantes mudanças sociais, é de suma importância repensar os métodos adotados pelo professor em sala de aula, para que estes também atendam às necessidades da sociedade. Entendendo que a aprendizagem não é um processo passivo, em que um obrigatoriamente ensina e outro aprende, a ABP coloca professor e aluno como parceiros na construção do conhecimento. Para Mamede e Penaforte (2001), a ABP possibilita que o aluno, autodirigindo sua aprendizagem, construa o conhecimento de forma ativa e colaborativa, aprendendo de forma contextualizada e dando um significado pessoal ao saber. Nesse sentido, para construir um bom problema, o professor deve pensar em atrair a atenção e o interesse de seus alunos, a fim de motivá-los a buscarem respostas para a questão, não esquecendo que este (o problema) venha ao encontro dos objetivos da disciplina para que os educandos percebam a correspondência entre o conteúdo e a proposta apresentada. Outro aspecto importante é propor um problema desafiante, porém não muito extenso, que contenha informações claras e contemple os conhecimentos prévios dos alunos para que tenham interesse em pesquisar e descobrir mais. 46 6.1 Estratégias para o desenvolvimento e para a avaliação das atividades A aplicação da ABP em sala de aula requer profunda reflexão sobre o(s) objetivo(s) que se pretende atingir, para que a partir disso seja elaborada a questão que norteará a aprendizagem. No desenvolvimento da atividade, o professor deve estar ciente de que não se trata de mera obtenção de conceitos por parte dos alunos, mas do desenvolvimento de habilidades cognitivas como compreensão, raciocínio e estratégia. Para a aplicação da ABP, Souza e Dourado (2015) apresentam uma estrutura básica de passos que podem ser adaptados e aplicados em diferentes níveis de ensino. • Elaboração do cenário ou contexto problemático: deve ser de acordo com o objetivo que se pretende atingir e chamar a atenção do aluno para que este identifique o tema do objeto de estudo. Além disso, deve haver relação com o conteúdo, ser funcional e de um tamanho ideal. • Questões-problema: ao receber as questões-problema, os grupos devem organizar as informações, dividir as tarefas, esclarecer as dúvidas com o professor/tutor para então decidirem como vão aprofundá-las. • Resolução dos problemas: é a fase em que os alunos colocam em prática todas as ações planejadas anteriormente. • Apresentação do resultado e autoavaliação: o grupo deve elaborar uma síntese com as reflexões e os debates realizados. Todos deverão apresentar a solução encontrada para o grupo. No final, é importante que o grupo e que cada aluno realize uma autoavaliação junto ao professor, que irá verificar se o objetivo foi ou não atingido, realizando, assim, a avaliação da aprendizagem. A construção de conhecimentos por meio da ABP se caracteriza não só por ser uma oportunidade rica e significativa para que o aluno confronte suas ideias com as de outros colegas, mas também propicia uma visão concreta e prática do aprendizado. Ao trabalhar em grupo, os alunos percebem a importância da troca de saberes e da colaboração, apoiam-se mutuamente, significando a importância de atingirem os objetivos que lhes são comuns, acordados pelo coletivo, o que, por sua vez, exige o 47 estabelecimento de relações que prezem pela liderança compartilhada, pela confiança mútua e a corresponsabilidade para a condução das tarefas. A aprendizagem em grupo na ABP se configura como uma estratégia de ensino na qual os sujeitos, de diferentes níveis de desempenho, trabalham juntos e em pequenos grupos a fim de atingir uma meta — a partir da qual entram em expressiva e significativa interatividade. Uma das mais importantes mudanças que acontecem na prática docente da ABP começa pela concepção que se tem de avaliação, uma vez que esta deve vir carregada de significados e não ser apenas uma forma de mensurar quantitativamente o quanto o aluno sabe ou não. A ABP permite o feedback imediato para que o professor avalie o progresso da aprendizagem dos alunos, obtendo pistas da assimilação do conteúdo e das possíveis dificuldades encontradas. Já para o aluno, é a oportunidade de refletir, em tempo real, sobre as estratégias utilizadas e avaliar o caminho que percorreu. Ao receber o feedback imediato, o aluno desmistifica a ideia negativa que se tem do erro na aprendizagem, uma vez que o percebe como parte natural do processo e isso o leva a experimentar diferentes formas de pensar. 6.2 Como elaborar questões norteadorasAo planejar a questão norteadora, o professor deve privilegiar para que a avaliação ocorra durante todo o processo e na sua aplicação, estando atento às impressões dos alunos. Na elaboração de uma questão norteadora, deve-se considerar que: • as questões devem ser provocativas, ir além de superficialidades, instigando e despertando o interesse dos alunos; • devem ir além da obtenção por respostas fáceis, levando os alunos a um pensamento superior, exigindo que eles integrem, sintetizem e avaliem criticamente as informações; • não podem privilegiar apenas uma disciplina ou tópico; é importante que promovam conexões e quando possível, a interdisciplinaridade; • podem surgir a partir de dilemas da vida real dos alunos e responder às suas dúvidas ou curiosidades; 48 • não se detenham a responder “o que é isso?” ou “quais são?”, mas sim, “por que isso acontece?” ou “como isso acontece?”. Além dessas dicas, é importante que o professor tenha claro seu objetivo e evite “armadilhas”, pois a questão norteadora deve promover a reflexão por parte dos alunos. Isso o possibilitará a melhora de possíveis futuros aspectos que acabaram não funcionando em determinada atividade. A avaliação contínua permite uma melhor reflexão sobre as relações entre professor e aluno, professor e conhecimento, estudante e estudante, estudante e conhecimento (SOUZA; DOURADO, 2015). A avaliação se caracteriza como um dos maiores desafios da ABP, uma vez que as instituições escolares ainda privilegiam avaliações formais. Nesta metodologia, a avaliação acontece de forma contínua e exige cuidados por parte do professor, uma vez que é baseada na observação direta, nos argumentos e nos registros realizados pelos alunos. O professor deve pensar em uma forma de avaliar por meio da APB, solicitando um produto final da solução encontrada pelo grupo, podendo ser: • uma apresentação de slides; • a produção de um artigo científico; • um relatório escrito; • qualquer outra produção que evidencie a construção significativa do conhecimento. É preciso ter em mente que a ABP possibilita a integração de conhecimentos, uma vez que considera o conhecimento prévio do aluno para a construção de novos conhecimentos. Nesse sentido, é importante valorizar aquilo que o aluno já sabe, planejando questões que instiguem sua curiosidade e seu pensamento crítico. 6.3 A aprendizagem baseada em projetos e em problemas na prática A aprendizagem baseada em projetos e em problemas não tem como objetivo a mera transmissão e a aquisição de conteúdos, mas é caracterizada pela articulação entre teoria e prática, com a intenção de apresentar ao aluno um problema ou uma situação próxima da realidade, que resulte em uma solução e leve o aprendiz a tomar consciência da sua participação efetiva nesse processo. A aprendizagem baseada em projetos desenvolve nos educandos o senso de responsabilidade, amplia seus conhecimentos e desperta a atenção às diferenças 49 individuais. Os resultados obtidos refletem a coletividade, favorecendo futuras discussões e o intercâmbio de ideias, permitindo uma comunicação direta em que todos percebam os problemas e as dificuldades durante a atividade. Esta interação possibilita o desenvolvimento de lideranças, o compartilhamento de expectativas, dificuldades e metas, promovendo o sentimento de coleguismo e, principalmente, de aprendizagem colaborativa. Segundo Bender (2014), para se conceber o planejamento dos projetos de ABP são necessários alguns componentes essenciais retratados a seguir. Âncora do projeto: Simples narrativas que descrevam o problema, podendo ser algo mais envolvente e que desperte o interesse dos alunos. É imprescindível que ela descreva um projeto real para os alunos. Questão motriz: Em conjunto com a âncora, a questão motriz deve tanto motivar os alunos quanto ajudá-los a delinear parâmetros que orientem seu trabalho. Voz e escolha dos alunos: O professor deve envolver os alunos na escolha do projeto, considerando não apenas os tipos de escolhas de ABP significativas para eles, mas principalmente qual delas tem maior possibilidade de funcionar para eles. Processos específicos para investigação e pesquisa: Apenas algumas atividades e alguns processos de aprendizagem devem ser estipulados pela tarefa inicial, proporcionando experiências autênticas para que os grupos possam resolver o problema. Investigação e inovação dos alunos: O professor deve usar meios que estimulem a investigação e o pensamento inovador dos alunos durante o processo de planejamento, pesquisa e desenvolvimento das atividades, por exercer o papel de facilitador. Cooperação e trabalho em equipe: Ajudar os alunos a trabalharem juntos na resolução de um problema, desempenhando diferentes papéis e se ajudando mutuamente. É uma das principais contribuições da ABP. Oportunidades para a reflexão: Estimulando e levando o aluno a usar o pensamento reflexivo, ele é capaz de encontrar soluções para o problema de forma criativa e inovadora. 50 Feedback e revisão: Quando o aluno recebe o feedback constante dos caminhos percorridos em cada etapa e tem a oportunidade de revisar seu trabalho, ele se sente mais motivado durante o processo. Apresentações públicas dos resultados dos projetos: O professor pode dar como alternativa para os alunos publicarem os resultados do projeto em formato de vídeos, relatórios, websites, apresentação de slides, entre outros, a fim de divulgar para outras pessoas as soluções encontradas. A seguir, podemos analisar uma sequência didática de aplicação da metodologia da ABP. Primeiro: O professor seleciona um problema, caso, cenário ou uma situação a partir das necessidades do conteúdo trabalhado. Segundo: Os estudantes realizam pesquisas ou a coleta de informações, individualmente ou em grupo, ou seja, passam a investigar o assunto/ solução conforme as especificidades de cada situação, com o intuito de desvendar ou resolver o problema que receberam. Terceiro: Para que os estudantes consigam solucionar o problema elencado, o professor pode indicar as fontes ou autores de base para a investigação, mas nesta forma de trabalho também é possível utilizar outras referências como parte do processo de busca e de qualificação da resposta/solução. Quarto: O professor deve indicar a forma de apresentação da resolução do problema, bem como critérios para sua solução, como a capacidade de execução, a viabilidade, entre outros. Moura (1993) apresenta também três categorias de projetos que podem ser adotadas no planejamento da ABP. • Projeto construtivo: tem o objetivo de construir algo novo, inovador ou uma nova solução para um problema. • Projeto investigativo: adotando o método científico, o aluno utiliza da pesquisa em diversas fontes para encontrar a solução do problema. • Projeto didático ou explicativo: com base nas questões: “Como?” e “Para quê?”, explica a funcionalidade do objeto de estudo. Para enriquecer sua proposta, o professor pode organizar o projeto fazendo uso das tecnologias disponíveis para o ensino. Quando bem utilizadas, estas 51 aumentam a eficácia da aprendizagem e o envolvimento dos alunos na atividade, abrindo oportunidade para integrar, enriquecer e expandir os materiais educacionais, apresentando novas maneiras de interação. É importante utilizar tecnologias nas metodologias adotadas pelo professor, pois ao mesmo tempo em que inovam a prática docente, elas também vão ao encontro da realidade dos alunos. Quando aplicadas à ABP, as tecnologias se tornam ferramentas que proporcionam possibilidades de aprendizagem que colaboram para o professor estreitar laços de fala e interação com os educandos. É possível planejar atividades que utilizem a internet, softwares, celulares, câmeras fotográficas e de vídeo, quadros interativos, aplicativos,jogos digitais, entre outros. 7 PRÁTICAS ESCOLARES E SEUS DESAFIOS A escola hoje apresenta inúmeros desafios. Um deles é contribuir para a formação de educandos e cidadãos, pessoas críticas, conscientes e atuantes na sociedade. É uma tarefa bastante complexa que exige do espaço escolar um movimento que vá além de temas, conteúdos e programas. Soares (2003) destaca a importância de compreender a relação entre cultura e educação. De um lado, temos a educação e, de outro, a cultura como um espaço que influencia o processo educacional. Sob essa perspectiva, a abordagem da temática da diversidade cultural é fundamental no momento em que a escola desenvolve um ensino que procura atender à comunidade em que está localizada. Conforme Soares (2003), a escola precisa fomentar as diferenças e dar significados para oportunizar e produzir saberes em diferentes níveis de aprendizagem, porque as diferenças fazem parte do processo social e cultural de cada educando e não servem para explicar que homens e mulheres, negros e brancos, distinguem-se entre si. Antes de tudo, é preciso compreender que, ao longo do processo histórico, as diferenças culturais foram produzidas e usadas socialmente como critérios de classificação, seleção, inclusão e exclusão. Sendo assim, a escola deve oportunizar a apropriação do conhecimento científico e da cultura em geral, não perdendo de vista o aspecto fundamental, que é a noção de que o conhecimento não se constrói com uma série de informações, mas 52 sim por meio de saberes. Nessa perspectiva, se abre um vasto campo de possibilidades, pois “o saber do povo” designa muitas formas de conhecimentos. Segundo Freire e Guimarães (1982), o processo educativo é organizado na relação entre currículo, conhecimento e cultura. Segundo Lerner (2007, p. 9-10): É indispensável instrumentalizar didaticamente a escola para trabalhar com a diversidade. Nem a diversidade negada, nem a diversidade isolada, nem a diversidade simplesmente tolerada. Também não se trata da diversidade assumida como um mal necessário ou celebrada como um bem em si mesmo, sem assumir seu próprio dramatismo. Transformar a diversidade conhecida e reconhecida em uma vantagem pedagógica: este me parece ser o grande desafio do futuro. O currículo deve-se voltar para a formação de cidadãos críticos comprometidos com a valorização da diversidade cultural, da cidadania e aptos a se inserirem em um mundo global e plural. Segundo Lopes (1987), é possível trabalhar o currículo na visão multicultural, formando identidades abertas à pluralidade cultural, sem preconceitos, com foco em uma educação para a cidadania, para a paz e para a crítica as desigualdades sociais e culturais. 7.1 Projetos envolvendo a diversidade cultural Segundo Vygotsky, todo o conhecimento é construído através das relações sociais, no âmbito das relações humanas (OLIVEIRA, 2002). A sua teoria tem por base o desenvolvimento do indivíduo como resultado de um processo sócio-histórico, enfatizando o papel da linguagem e da aprendizagem nesse desenvolvimento, sendo essa teoria considerada histórico-social. Este processo realiza-se na relação com outro, nas trocas em que o professor aperfeiçoa sua prática e, ao mesmo tempo, constrói, consolida, fortalece e enriquece seu aprendizado. Neste sentido, Nóvoa (1997) afirma que a troca de experiências, no momento da partilha de saberes, consolida espaços de formação, onde professor é chamado a desempenhar, simultaneamente, o papel de formador e de formando. Assim, o papel do professor é de fundamental importância. Atualmente, muitas transformações vêm ocorrendo na sociedade. A concepção de escola e sua função social precisam ser revistas e repensadas, uma vez que a educação autoritária, compartimentada, com currículo fragmentado e distante das transformações sociais e das vidas dos educandos está perdendo seu significado. Não há mais espaço para 53 essa escola em que o sujeito não tem autonomia e participação na construção de seus saberes. Conforme Dewey (1897), a educação é um processo de vida e não uma mera preparação para a vida que está por vir, e a escola deve representar a vida presente - tão real e vital para o aluno como o que ele vive em casa. Ou seja, além das preocupações em formar o aluno para ser capaz de ler, escrever, interpretar, realizar operações matemáticas, ter conhecimentos sobre as várias áreas do saber e preparando-o para se inserir na vida profissional, a escola deve também se ocupar da formação de valores morais e éticos que são inerentes aos humanos, como a autonomia, a solidariedade, a coletividade, o respeito ao próximo, a autoestima positiva, para assim se tornarem indivíduos completos. Nesse sentido, o trabalho por projetos contribui de forma significativa para a educação e vai ao encontro com as exigências da sociedade moderna, pois o trabalho por projetos envolve um processo de construção, participação, cooperação, noções de valor humano, solidariedade, respeito mútuo, tolerância e formação da cidadania tão necessária à sociedade emergente (LUCK, 2003). Um bom exemplo de como os projetos podem ser úteis para repensar o currículo e a cultura é o caso de uma escola pública de periferia que realizou o projeto que chamaremos aqui de “Projeto Viva a Diversidade”, que se dedicou a trabalhar com a cultura afrodescendente. Durante o desenvolvimento do trabalho, houve uma análise de diversos autores que escrevem sobre a dança e a cultura afro-brasileira. Desse modo, foi possível realizar, por meio de aula expositiva e dialogada, um encaminhamento de pesquisas, além de um levantamento das informações encontradas, produções de texto, entrevistas com funcionários da escola e da comunidade sobre o tema em questão. Também foram desenvolvidas outras atividades: exposição de trabalhos para os demais alunos e professores da escola e da comunidade, apresentação de comidas típicas, confecção de livro ilustrando a história do Zumbi dos Palmares e confecção de máscaras e esculturas de diversas tribos africanas (de acordo com os significados que lhes são atribuídos). Com esse projeto, foi possível observar as obras de artistas que foram influenciados pela cultura africana, como Pablo Picasso. Discutiram-se estilos de dança outras manifestações culturais, como o filme “Kiriku e a feiticeira”. Outro projeto sobre diversidade cultural para educação infantil 54 foi desenvolvido de uma forma um pouco diferente. Na escola infantil, o projeto foi construído a fim de explorar a diversidade cultural existente no Brasil, proporcionando às crianças o contato com outras culturas e, consequentemente, com o novo, fomentando o desenvolvimento do respeito ao diferente e reforçando a autoestima e identidade de cada um. A educadora estruturou objetivos, de acordo com o foco do projeto: • Pesquisar diferentes culturas da comunidade em que a escola está inserida. • Trabalhar a relação entre família e escola; • Trabalhar a autoestima nos alunos para que estes possam relacionar-se com o outro; • Desenvolver uma imagem de si, atuando de forma mais independente, com mais confiança em suas capacidades e percepção de seus limites; • Estabelecer vínculos afetivos e de troca com adultos e seus pares, a fim de fortalecer sua autoestima; • Desenvolver o hábito de ouvir; • Trabalhar a oralidade. Assim, é na escola que as crianças se tornam conscientes das diferenças religiosas, raciais e de classes sociais. Nenhuma criança herda os preconceitos dos pais por intermédio da genética: na verdade, eles são aprendidos. As atitudes (conscientes ou inconscientes) dos pais são, no mínimo, um começo no desenvolvimento dos preconceitos das crianças. Os pais manifestam suas próprias atitudes para com os grupos, controlando as relações sociais dos filhos por meio de restrições ou encorajamento dadosà formação de amizades. O preconceito sujeita a criança a certas barreiras contra a sua aceitação social. Isso se reflete no conceito que a criança vai criando sobre si, tornando-a um sujeito com baixa autoestima. O preconceito penetra na percepção e na vida das crianças afetando seu desenvolvimento, podendo ter impacto nas relações sociais. A tarefa da escola, no combate aos preconceitos, não é fácil. Muitas vezes no ambiente escolar, as atitudes de professores e administradores reforçam os preconceitos que as crianças aprendem em casa e na comunidade. O convívio com o racismo, o preconceito e a discriminação 55 racial no cotidiano escolar consolida danos, muitas vezes irreparáveis, para todas as crianças, sejam elas negras ou brancas, enfim, para toda a sociedade. 7.2 Como lidar com a diversidade cultural no “chão” da escola? Para além das dúvidas e dos anseios que rodeiam o imaginário escolar em torno dos entraves e desafios culturais enfrentados atualmente, são os professores e professoras que têm, fazendo jus às suas atividades-fim, melhor ensinado como fazer. A partir de algumas conclusões de Moreira e Candau (2003), em cima de diálogos com professores de escola, apresentam-se aqui algumas possibilidades mais procedimentais para se reinventar, ainda que de maneira gradual, a escola. Uma primeira lição de Moreira e Candau (2003) seria a importância de se estabelecer um marco contextual. Neste sentido, seria importante que a escola (ou mesmo um grupo de professores ou o professor em particular) se organizasse para compreender o cenário atual de globalização e de influência neoliberal em que se encontra a escola, por exemplo, e que também pudesse estabelecer aonde quer chegar. Outra questão importante é, nas palavras de Moreira e Candau (2003, p. 166): Favorecer uma reflexão de cada educador(a) sobre a sua própria identidade cultural: como é capaz de descrevê-la, como tem sido construída, que referentes têm sido privilegiados e por meio de que caminhos. Temos desenvolvido várias vezes este exercício com os(as) educadores(as) e, em geral, o processo tem-se revelado muito provocador e instigante. Os níveis de autoconsciência da própria identidade cultural encontram-se, na maior parte das vezes, pouco presentes e não costumam constituir objeto de reflexão pessoal. Muitos(as) profissionais da educação nos têm afirmado, em diversos momentos, que a primeira vez em que haviam parado para pensar sobre essa temática tinha sido por ocasião dos exercícios propostos, que certamente mobilizaram memórias, emoções e experiências. Em muitos casos, os exercícios fizeram aflorar histórias de vida, fortemente dramáticas, em que as questões culturais geraram muito sofri- mento. Os relatos de discriminação e preconceito, reprimidos e silenciados por longo tempo, mostraram-se, então, particularmente fortes. Expressar-se, dizer sua palavra, tem um efeito profundamente libertador, permitindo que a experiência do “outro” se aproxime da nossa. Moreira e Candau (2003) também apontam para outra necessidade imediata, que impacta mais indiretamente a escola, porém também com grande força: a necessidade de formação universitária e continuada sobre a formação cultural brasileira. 56 Especificamente no tema de raça, ainda é comum a narrativa da “democracia racial” no Brasil, que supõe que o racismo não existe no país, sendo urgente problematizar certos lugares comuns que ainda não foram superados. Outra indicação interessante que surge dos dois autores a partir de seu contato com professores e professoras é a possibilidade de solidariedade para com grupos culturais e étnicos. A ideia seria uma interação mais concreta e reflexiva, estimulando a entrada das pessoas na escola que, afinal, a ela pertence. 8 O PROCESSO DE EXCLUSÃO E A NECESSIDADE DA INCLUSÃO Podemos pensar no currículo escolar como um mapa que orienta a escola e conduz seus estudantes pelo caminho de sua inclusão na vida social. Nesse sentido, o professor seria o norteador que mostra a direção necessária pela trilha da formação humana integral e para a construção de uma sociedade mais justa, democrática e inclusiva. Entretanto, o que se evidencia de forma geral são mapas que guiam muitos deles para o caminho oposto. Desde o início do século XX, pesquisas como as de Maria Helena Souza Patto, na obra A produção do fracasso escolar, vem desmentindo a ideia de que a escola obrigatória e gratuita viera para transformar a humanidade e para redimi-la da ignorância e da opressão. O que se mostra é que a escola não cumpriu seu papel e não livrou os seres humanos da exclusão e da desigualdade social. A definição da educação como promotora do “pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1988, documento on-line) intensifica a dimensão do quanto as perdas nas aprendizagens e na qualidade do ensino podem atravancar o desenvolvimento econômico, social e cultural das pessoas e das localidades. Assim, a compreensão das políticas de inclusão social surge em oposição ao conceito de exclusão. Dessa forma, cabe uma breve exposição que faça essa relação entre exclusão e inclusão. Por isso, inicialmente, para nos aprofundarmos nas questões de desigualdades, diversidade humana e paradigma da inclusão, precisamos fazer uma retrospectiva histórica de como se constituiu o pensamento da posição sociocultural de algumas características humanas, para então ter a dimensão 57 do entendimento e da representação que a sociedade nutre sobre determinados grupos. Se a inclusão, para alguns, implica um processo longo e dispendioso, esses mesmos deveriam fazer contas ao preço da trajetória histórica da exclusão (RODRIGUES, 2003). Precisa-se, então, reportar ao passado e localizar nas diferentes épocas o retrato que se fixou culturalmente sobre a ideia das diferenças individuais. Nesse sentido, por estarmos todos imersos em processos históricos complexos, somos inescapavelmente produtores e produzidos por tais processos (BAPTISTA, 2006). Os processos de exclusão criaram diversos grupos sociais que não têm reconhecidos seus direitos básicos, que não são visíveis enquanto sujeitos, que não possuem garantias de políticas sociais, culturais e econômicas, e que não têm força para falar e fazer-se ouvir, como, por exemplo, pobres, negros, índios, pessoas com deficiência (PCDs), mulheres, homossexuais, idosos e crianças. Podemos citar ainda três situações diferentes: 1. Pessoas com deficiência que são "cuidadas" exclusivamente em casa ou em instituições permanentes; 2. outras que recebem apoio socioeducacional em instituições especializadas, mas separadas das demais pessoas sem deficiência; 3. outras que estão na escola comum, em convívio social com todos. A situação 1 pode equivaler à atividade dos povos primitivos, com as PCDs sendo "asfixiadas" na superproteção ou representando empecilho à sobrevivência do grupo (família). A situação 2, de colocar PCDs em instituições que segregam, pode equivaler à postura dos astecas, pois em algumas instituições não há uma proposta inclusiva. Campanhas publicitárias que geram sentimento de pena podem equivaler à postura da tribo Xaga, pois se deliciam com suas generosidades, sentindo-se bem por não terem o mesmo "problema", avivando sua "normalidade". Na situação 3, ainda há muito que se caminhar da integração à inclusão verdadeira, pois "aceitam" alunos com deficiência nos contextos sociais, mas os veem como os egípcios, ou seja, apenas estão pertos, mas não estão próximos. Nesta realidade, por exemplo, deixar de conduzir um aluno com deficiência às atividades 58 escolares comuns, como ao ato de escrever e de se apropriar de sua autonomia na construção da escrita e do conhecimento, seria como deixá-lo no meio do caminho,como faziam os nômades sirionos, para não terem trabalho. Obviamente, existe uma infinidade de diferentes casos, situações, instituições e famílias diferentes; por isso, esse comparativo não pode ser visto com generalização, nem como afronta aos que resistem à inclusão total, e sim como metáforas dos resquícios históricos de postura frente ao outro. Mas foi com o Renascimento que os fundamentos humanísticos exigiram que a postura diante da pesquisa naturalista sobre os males físicos de certa forma avançasse. A visão assistencialista cedeu lugar definitivamente à postura profissionalizante e integrativa das PCDs. A maneira científica de perceber a realidade daquela época começou a derrubar o estigma social que influenciava o tratamento das pessoas com deficiência, e a busca racional da integração se fez por várias leis que passaram a ser promulgadas (FONSECA, 2001). Essas leis foram surgindo pari passu a novas formas de pensar e agir sobre a deficiência, a partir de diversos movimentos em defesa dos direitos da dignidade humana, constituindo-se como marcos legais de inclusão em combate à exclusão. Tais marcos, por sua vez, são devolvidos à sociedade como um conjunto de normas da vida que busca expressar e também alcançar um ideal de justiça, traçando as fronteiras do ilegal e do obrigatório. A partir dessa visão histórica, a dignidade humana da PCD passou a ser pauta de discussões internacionais, cujas publicações mais tarde afetariam as políticas públicas brasileiras. Desde a maturação do capitalismo, o mundo direta ou indiretamente passou a estar basicamente dividido em perdedores e vencedores. Os perdedores eram os grandes contingentes de trabalhadores assalariados, de serviços braçais subalternos e mal remunerados, enquanto os vencedores eram os novos homens bem-sucedidos. Esse mecanismo ideológico do capitalismo surge para ocultar a natureza predatória desse sistema social e responsabilizar o próprio indivíduo pelo seu “fracasso” ou “sucesso”. A ideologia propagada, então, é de que o sucesso social de cada indivíduo só pode ser conquistado a partir do esforço individual, tentando justificar as desigualdades sociais e ocultar a lógica predatória do próprio capitalismo, que sobrevive a partir dessas desigualdades e da acumulação de riquezas por uma minoria dominante (PATTO, 1999; EUZÉBIOS FILHO; GUZZO, 2009). 59 Foi nesse contexto histórico que surgiu a escola tradicional. A partir da crença de que a divisão social em classes superiores e inferiores teria como critério o talento individual, é possível compreender os caminhos trilhados do fracasso escolar (reprovação e evasão) e de currículos escolares que dividem perdedores e vencedores, que perduram até a atualidade nos sistemas de ensino. Com a produção de uma escolarização para os mais pobres de forma mais precária e sem investimentos não é possível então falar que todos têm igualdade de oportunidades. Além disso, a escola não teria sido inicialmente uma instituição necessária à qualificação intelectual das classes populares para o trabalho, nem mesmo quando a especialização técnica do operário passou a ser uma necessidade, pois seu treinamento era feito na própria fábrica. A missão da escola para a classe trabalhadora, em seu currículo, não era a aquisição de habilidades cognitivas específicas, mas era de ajustes comportamentais para atender as medidas mais imediatas para essa classe: ensinar uma disciplina rígida para forçá-los a aprender a trabalhar sem descanso; ensinar a submissão na relação entre alunos e professores para garantir a disciplina e obediência do trabalhador na relação entre patrões e empregados; e ensinar habilidades domésticas para as meninas se tornarem boas donas de casa (CHAUÍ, 1981; PATTO, 1999). 8.1 Política de educação inclusiva Diante das formulações de direitos humanos e fomentos de políticas inclusivas, sociais e educacionais, a DUDH da ONU, em 1948, foi um marco histórico mundial. Além dessa declaração, diferentes localidades do planeta têm buscado definir, implementar e aprimorar esses direitos. Assim, as sociedades locais e globais se veem cada vez mais como uma só, aceitando cada vez menos a negligência de seus direitos, inclusive para gerações futuras. É bem verdade que milhões de pessoas ainda estão sujeitas a escravidão, abuso sexual, exclusão em função de deficiência e perseguições por sua opção sexual, religião, etnia, etc. Entretanto, o coletivo humano encontra um escudo: o primeiro artigo da DUDH, que afirma que “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade” (UNICEF, [2022], documento on- 60 line). Não se pode negar que a DUDH foi um avanço para a humanidade (UNICEF, 2022), mas também é inegável que a humanidade ainda tem um longo caminho a percorrer quando o assunto é a construção de uma sociedade humanitária, inclusiva e justa. A sociedade se define pelo seu fim, mas a pessoa humana deve ser princípio, sujeita e fim de todas as instituições sociais, principalmente as educacionais. Dessa forma, com políticas inclusivas a sociedade como um todo dá possibilidades para que cada pessoa, na sua individualidade, possa se desenvolver e se tornar parte integrante do meio social, pela sua inserção e participação no que diz respeito aos seus interesses pessoais e ao bem comum. Essa participação é chamada de socialização e cidadania, e exprime a tendência natural dos seres humanos de se associarem para atingir objetivos que ultrapassam as capacidades individuais (SILVA; JUNIOR, 2010). O currículo escolar torna-se, então, um instrumento que emerge para promover a socialização, que é ação ou efeito de desenvolver nos indivíduos de uma comunidade o sentimento coletivo, o espírito de solidariedade social e de cooperação. É viver numa sociedade aberta e acessível a todos os grupos, mas que também estimula a participação e oferece oportunidades iguais para todos realizarem seu potencial humano. O termo sociedade inclusiva coloca a sociedade como aquela que deve mudar para lidar com a diversidade humana (SOCIEDADE INCLUSIVA, 2001; RATSKA, 1999). Todos esses esclarecimentos mostram que a inclusão escolar é muito necessária para garantir uma educação mais democrática a todos os que dela participam. Porém, esse processo educacional só se tornará realidade se todos os agentes envolvidos no processo conseguirem transpor a legislação para a prática cotidiana. Para tanto, a formação de professores é fundamental para romper com abordagens pedagógicas excludentes e para capacitá-los a construir planejamentos pedagógicos voltados a uma transposição didática do currículo para um ensino significativo, conectado com a realidade e a transformação social. Para isso, é preciso considerar as individualidades e necessidades de cada educando, suas aptidões e os diferentes tipos de inteligências, promovendo adequação de espaços e materiais de acordo com as singularidades de cada aluno. Ensinar é marcar um encontro com o outro, e a inclusão escolar provoca basicamente 61 uma mudança de atitude. É reconhecer que o outro é implacavelmente diferente, pois a diferença é o que existe, a igualdade é inventada e a valorização das diferenças impulsiona o progresso humano. Quando se fala em educação inclusiva, fala-se de colaboração, cooperação, solidariedade, mas é preciso vivenciar esses valores para que não fiquem apenas num discurso vazio. Conforme o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) ([2022]), o conceito de desenvolvimento humano nasceu definido como um processo de ampliação das escolhas das pessoas para que elas tenham capacidades e oportunidades para ser aquilo que desejam. Diferentemente da perspectiva do crescimento econômico, que vê o bem-estar de uma sociedade apenas pelos recursos ou pela renda que ela pode gerar, a abordagem de desenvolvimento humano procura olhar diretamente para as pessoas, suas oportunidades e capacidades (PNUD, 2022). 8.2 Inclusão social da pessoa com deficiência no universo escolar Historicamente a pessoa com deficiência frequentava uma instituição específica, onde todos os estudantes possuíam algum tipo de deficiência, ocasionando uma segregação e separação da sociedade. Ainda hoje existem há escolas de educação especial, porém há uma tentativa de que cada vez mais esse público possa ser inserido nas instituições de ensino regular. No entanto, para que aconteça de fato a inclusão social na escola regular, não basta somente matricular os alunos com deficiência nas escolas, é necessária uma série de adaptações para que o ambiente receba o aluno. Para identificar quais são as dificuldades e necessidades da pessoa com deficiência, o modelo social, que se instaurou com o avanço das legislações em torno do tema, trouxe uma nova forma de compreender a deficiência. Esse modelo passou a influenciar as várias políticas sociais, dentre elas a política de educação, assim como a Lei nº 13.146 (BRASIL, 2015, documento on-line) que assegura à pessoa com deficiência o direito a uma educação de qualidade: Art. 27. A educação constitui direito da pessoa com deficiência, assegurados sistema educacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao longo de toda a vida, de forma a alcançar o máximo desenvolvimento possível de seus talentos e habilidades físicas, sensoriais, intelectuais e sociais, segundo suas características, interesses e necessidades de aprendizagem. 62 Além de garantir o direito à educação, essa lei também prevê, em seu artigo 28, inciso II (BRASIL, 2015, documento on-line), o: [...] aprimoramento dos sistemas educacionais, visando a garantir condições de acesso, permanência, participação e aprendizagem, por meio da oferta de serviços e de recursos de acessibilidade que eliminem as barreiras e promovam a inclusão plena. Ou seja, os sistemas educacionais precisam adaptar-se à realidade desse público, atuando para eliminar as barreiras e impedimentos para o desenvolvimento pedagógico pleno. Estar incluído na sociedade e no âmbito escolar não significa apenas estar no mesmo ambiente daqueles considerados sem deficiência, mas estar no meio de todos e ter condições de estar ali, diferente da integração, que apesar de estar em um mesmo ambiente encontra-se distante dos demais. Isso envolve também, a interação com os demais alunos, professores e toda a comunidade escolar, brincar no pátio da escola, participar de excursões organizadas, ou seja, tudo o que é comum para estudantes que não são considerados deficientes. Nesse sentido: [...] para entender totalmente a participação na educação, deve-se atentar para como as tarefas ou rotinas podem ser modificadas para assegurar a participação geral em um dado ambiente. Não basta simplesmente medir o desempenho do aluno na execução de tarefas pré-definidas em um ambiente pré-definido (OMS, 2013, documento on-line). Além disso, o ambiente educacional também deve ser avaliado com relação à sua adaptação às necessidades de todos os alunos, em especial daqueles com deficiência, como a capacidade de oferecer acessibilidade física, como rampas de acesso, elevadores, e de comunicação, como intérprete de linguagem de sinais, entre tantas outras possibilidades, conforme prevê NBR 9050 (ABNT, 2020). De modo geral, para a educação numa sociedade global e no contexto social humano, o professor e a escola são de grande relevância na mediação das práticas educativas inclusivas, que promovem a consciência crítica dos sujeitos e a consciência de transformação social, requisitos básicos para o desenvolvimento humano. 63 9 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABNT. NBR 9050: acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. Rio de Janeiro: ABNT, 2020. ALARCÃO, I. Professores reflexivos em uma escola reflexiva. São Paulo: Cortez, 2003 APA – The American Psychological Association, Annual Report, 2015. 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