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LIVRO - PSICOLOGIA SOCIAL - JORGE VALA (1)

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<p>PSICOLOGIA SOCIAL</p><p>SOCIAL PSICOLOGIA Maria Benedicta Monteiro 1941. em de Letras Nasceu em Lisboa, pela Faculdade em 1964, Psico- e em em Filologia Universidade de Lisboa, Superior de em Instituto da Psicologia pelo em 1974. de Lovaina, e pro- em Doutorou-se logia Aplicada, pela Universidade ISCTE desde 1986 com os Psicologia É docente do desde 1996. A a par construção fessora trabalhos catedrática de investigação tema da sobre sua outras tese de Social douto- de e social da desenvolvido tem da Psicologia ramento, nomeadamente no investigação no quadro do e das do senso relações inter- nio da identidade teorias e o grupais e das a educação e e apresen- do comum crianças. sobre Para trabalhos a prossecução tem sido bolseira Calouste das seus Fundação tação dos INICT, da Luso-Americana publi- INIC, Gulbenkian para o da revistas e da Fundação Tem e trabalhos livros, em Por- cados em estrangeiro. tugal e no Jorge Vala ano de 1947. Baleia, no Atouguia da Instituto Superior no Nasceu Formou-se em em Psicologia Aplicada (1971) da Universidade e de do doutorou-se de Psicologia de Psicologia catedrático e da na É professor Ciências do Trabalho coor- Lovaina Instituto Superior de 1996, e investigador de Empresa, denador desde Universidade no Instituto de de Lisboa. investigação Tem Processos cen- no Sociais os da seus trabalhos Social dos no campo trado da Psicologia domínio nomeadamente identidades sociais e das da agres- estudo no e das sociais, com comportamentos intergrupais. Os seus dos conflitos encontram-se são, políticos trabalhos publicados e dos sobre em livros estes e revistas temas especializadas estrangeiras. nacionais e Na Capa: BLAUFUKS, fotografia com de permissão DANIEL do autor</p><p>JORGE VALA MARIA BENEDICTA MONTEIRO COORDENADORES PSICOLOGIA SOCIAL Edição SERVIÇO DE EDUCAÇÃO E BOLSAS FUNDAÇÃO CALOUSTE GULBENKIAN</p><p>Apresentação da edição Seis anos de uso e a dupla reedição da Psicologia Social ao longo desse período mostraram o valor deste volume, mas também algumas das suas lacunas e limitações que agora vêm preencher-se por da publicação da sua edição Para isso foram importantes tanto a experiência docente de todos os seus autores como as sugestões de colegas e de estudantes, a quem aqui deixamos o nosso agradecimento. novo texto e os textos renovados que integram esta edição tiveram como objectivos comple- tar, actualizar e integrar mais e nova informação dos vários domínios da Psicologia Social. Manteve- -se, no entanto, a estrutura inicial, que organizava os textos em torno de cinco questões: 1. A história da disciplina desde a sua origem no século XIX, a par das restantes ciências sociais, até às princi- pais fases da sua construção ao longo do século XX e as suas orientações metodológicas; 2. Os fenó- menos e processos que intervêm em vastas áreas do comportamento, nas suas dimensões intrapessoal e interpessoal; 3. Os fenómenos e processos que intervêm no comportamento, nas suas dimensões de grupo e das relações entre grupos; 4. Os processos de construção colectiva dos significados sociais, e 5. Questões de epistemologia e de validade ecológica na investigação em psicologia social. Esta edição contém não só um novo capítulo sobre processos cognitivos e estereótipos sociais, como significativas alterações em dez dos restantes capítulos e ainda um Índice temático que facilite a procura de temas e de conceitos ao longo de todo o volume. Vejamos, então, em síntese, essas novas contribuições, que têm lugar a partir da segunda área de questões. No capítulo V, sobre o tema clássico da formação de impressões, António Caetano introduz as teorias implícitas da personalidade e apresenta um modelo recente que explora o processamento paralelo da informação. Com o objectivo de facilitar a pluralidade de propostas nesta área, o texto adianta ainda uma síntese integrada dos diferentes modelos sobre formação de impressões. O capítulo VI, sobre atracção interpessoal, sexualidade e relações íntimas, de Valentim Alferes, alarga a apresentação da investigação, nomeadamente ao tópico da amizade. No capítulo VII, que versa os processos de atribuição causal, Elizabeth Sousa desenvolve sobretudo a discussão sobre a especificidade dos processos de atribuição social. As atitudes, no capítulo VIII, sofrem nesta edição um alargamento importante Luísa Lima inte- gra neste capítulo as teorias da persuasão, complementando assim a última parte, que tratava das pro- postas teóricas sobre os processos de mudança de atitudes. Reservados todos os direitos de harmonia com a lei A fechar este conjunto de capítulos, e fazendo a transição para a terceira área de questões, Edição da FUNDAÇÃO CALOUSTE GULBENKIAN Leonel Garcia Marques estende o capítulo IX sobre a influência social, às teorias que os fenó- Av. de Berna Lisboa menos clássicos de influência à luz de novos processos, como de auto-categorização ou o do con- 2002 flito sociocognitivo. ISBN 972-31-0845-3 Os processos de grupo, tema do capítulo X, apresentam também alterações de Jorge Correia Jesuíno mostra agora de forma mais alargada fenómenos específicos da situação</p><p>4 tais como a polarização e o pensamento de grupo, e as suas repercussões sobre a tomada de decisão. Prefácio à primeira edição Os estereótipos sociais e os processos socio-cognitivos que os originam e mantêm é uma área de investigação que atravessa toda a psicologia social do século XX, com amplas ramificações e entrosamentos com muitos outros conceitos e áreas da interacção social, constituindo, a partir do final do século XX uma das áreas fortes da Cognição Social. Constituía, nas três primeiras edições da Em 1982 realizou-se em Lisboa, na Fundação Calouste Gulbenkian, um simpósio sobre Psicologia Social, uma lacuna que desde o início urgia colmatar. José Marques e Dário Paez, no capí- e Psicologia Este simpósio teve o apoio da European Association of Experi- tulo XI, sistematizam o percurso da investigação neste domínio, apresentando os processos cogni- mental Social Psychology e nele participaram, entre outros psicólogos sociais portugueses e tivos da construção dos estereótipos e a articulação contextual que lhes confere significado social. estrangeiros, Doise, H. Tajfel e Ph. Na sequência deste encontro, iniciaram-se laços de O capítulo sobre a identidade social e as relações entre grupos, de Lígia Amâncio, é agora o colaboração estáveis entre os psicólogos sociais portugueses e os seus colegas que, desde 1963, capítulo XII. A par da exposição crítica das propostas teóricas mais clássicas, as extensões contem- vinham procurando uma refundação da Psicologia Social na Europa. Este manual de Psicologia porâneas do modelo das relações de poder simbólico aparecem agora com novos desenvolvimentos Social reflecte os resultados dessa colaboração e é, em larga medida, uma expressão das questões decorrentes do cruzamento dos níveis de análise situacional e cognitivo, ilustrados com investigação que, pelo menos desde então, têm sido objecto de pesquisa teórica e empírica por parte dos investi- recente, nomeadamente na área das relações de género. gadores e docentes em Psicologia Social no nosso país. Ainda no domínio das relações entre grupos, o capítulo XIII, de Maria Benedicta Monteiro, A expansão do ensino da Psicologia Social criou a necessidade da elaboração de um manual apresenta novas contribuições, sobretudo em dois pontos teóricos da resolução de conflitos: o que é que apoiasse a formação dos estudantes do ensino superior que, nas mais variadas licenciaturas, expresso pela teoria da identidade social e das relações entre grupos e o que é estudado no quadro da seguem cursos desta disciplina. A diversidade dos interesses destes estudantes e a variabilidade dos negociação formal. graus de profundidade exigida na abordagem da Psicologia Social a nível de licenciaturas tão A quarta questão que estrutura a organização deste volume os processos de construção colec- díspares constituíram um dos constrangimentos que orientaram a programação desta obra. Por tiva dos significados sociais continua, nesta edição, a ser tratada no capítulo sobre as representações outro lado, pretendia-se fazer um manual que reflectisse os interesses e as orientações da Psicologia sociais, agora o capítulo XIV. Jorge Vala alargou a sua apresentação especialmente no domínio dos Social no nosso país. Não se trata, assim, de uma obra que abrange todas as temáticas desta processos sociocognitivos que presidem à formação dessas representações a ancoragem e a objec- disciplina, mas cuja preocupação é a de reflectir a especificidade do olhar psicossociológico nas tivação também eles agora ilustrados por investigação mais recente. diversas temáticas que são abordadas. Ora, uma das características deste olhar é a sua pluridirec- Por fim, o capítulo XV continua, com alterações sobretudo de actualização da literatura rele- cionalidade com uma coerência que the é conferida pela procura constante de novas articulações. vante, a propor-nos uma reflexão de contornos epistemológicos sobre o olhar e o pensar da psicolo- Este objectivo foi prosseguido através da colaboração de diversos autores. A diversidade dos espe- gia social, dividida entre as matrizes positivista e sistémica da sua forma de interrogar a interacção cialistas que colaboram nesta obra procura garantir a diversificação teórica, a par de uma profun- social. A sistematização das teorias e da investigação sobre contextos territoriais, sobre densidade didade equivalente ao longo dos diversos capítulos, o que dificilmente seria possível caso a sua populacional e distanciação interpessoal em meio urbano, a partir da qual Soczka ilustra e redacção tivesse cabido apenas a um ou dois autores. defende a instauração de uma perspectiva ecológica em psicologia social, remata de novo este volume em jeito de desafio. Os organizadores deste manual vêm ensinando Psicologia Social ao longo de quase vinte gosto com que agora trazemos ao público de língua portuguesa esta edição da Psicologia Para os estudantes, cujo espírito crítico e cuja criatividade os estimularam na sua progressão inte- Social é aquele que esperamos que os nossos leitores partilhem connosco ao Gosto pela lectual, vão os primeiros agradecimentos. Agradecemos também aos colegas que desde a primeira reflexão, pela pesquisa e pelo confronto crítico. Gosto existencial pelo perguntar. Até porque, como hora nos apoiaram neste projecto e que aceitaram colaborar nele, conferindo, assim, a este trabalho diz o Cônsul Honorário, de Graham Greene, únicas perguntas importantes são as que o homem o que nele há de positivo. nosso papel foi o de simples gestores de uma ideia a distância que faz a si separa a qualidade possível da qualidade conseguida é responsabilidade nossa. Jorge Vala Lisboa, Novembro de 1999 Maria Benedicta Monteiro Maria Benedicta Monteiro Fevereiro de 1993 Jorge Vala</p><p>Apresentação da primeira edição A Psicologia Social é uma disciplina animada pela paixão da investigação e pela preocupação com a intervenção. Pode dizer-se que a paixão pela investigação é uma característica forte desta disciplina, na medida em que o seu saber se oferece claramente como um saber em construção, sujeito a reformu- lações contínuas, em diálogo com a análise empírica. Para alguns, porém, isso não é uma manifes- tação de maturidade epistemológica, mas de inconsistência teórica. Fora maior a solidez teórica desta disciplina, e seria menor o seu recurso à investigação empírica. Para outros, a presença forte da inves- tigação empírica em Psicologia Social teria vantagens, sim, mas não para esta disciplina ela não seria mais do que um laboratório das ciências sociais mais nobres, que daí retirariam as ilustrações de que carecem sobre a dimensão individual dos fenómenos colectivos. Quanto à Psicologia ela própria, seria um epifenómeno que desapareceria com a maturação anunciada das demais ciên- cias sociais e humanas. Não é este o lugar para descortinar as razões da elevada produção empírica desta disciplina, nem para discutir o significado e o futuro dessa produção. Mas, tratando-se de apresentar o primeiro manual de Psicologia Social escrito por autores portugueses, vale a pena sublinhar que aquela foi uma das características desta disciplina a que se quis dar destaque. A apresentação de cada problema será, assim, pautada por referências a estudos empíricos. Neste sentido, as referências a investigações empíricas ou, por vezes até, a sua apresentação detalhada servem dois objectivos ilustrar a análise de um problema e ilustrar a estratégia de construção de conhecimentos nesta disciplina. É nosso propósito que este manual possa ser um pedagogo do jogo que consiste em lutar contra as hipóteses que se soube formular e, de uma forma mais geral, que possa contribuir para uma pers- pectiva não doutrinal e não opinativa em ciências sociais. Dissemos que a Psicologia Social era uma disciplina animada pela preocupação com a intervenção. Este objectivo cedo a associou à ideia de tecnologia social e em muito contribuiu para a identificação desta disciplina com os mecanismos de gestão dos sistemas dominantes. Dispen- samo-nos de entrar na polémica sobre a Psicologia Social como disciplina subversiva ou repressiva. Mas pretendemos que esta obra reflectisse a relevância social desta disciplina. Ora, poderá parecer que esta preocupação está ausente na medida em que não existe nenhum capítulo dedicado às apli- cações da Psicologia Social. Em nosso entender, dedicar um capítulo às aplicações desta disciplina estaria em contradição com a sua própria Na sua história, sempre que questões relativas a problemáticas sociais relevantes dominaram a Psicologia Social, a abordagem dessas questões fez-se numa perspectiva que não dissocia a investigação e a intervenção. Foi nessa perspectiva que traba- lharam investigadores como os que, a partir de 1944, se reúnem a K. Lewin e fundam o Research Center for Group Dynamics, num programa de investigações onde a preocupação com a democracia era um problema e um pressuposto importante. Ou os investigadores que, a partir de 1945, traba- lharam com Hovland sobre a influência social e a comunicação persuasiva, animados pela preo- cupação de esclarecer os mecanismos que haviam alimentado a força da propaganda durante a</p><p>8 9 Segunda Guerra Mundial. Ou ainda aqueles que, a partir de 1954, na esteira de Allport, estudaram a problema da medida como aquele a partir do qual reflecte sobre as orientações metodológicas em hipótese do contacto como meio de contribuir para a fundamentação das políticas de dessegregação. Psicologia Social. Na Europa, não é possível separar a teoria de Tajfel, sobre a categorização e a identidade social, das Após estes capítulos introdutórios, dois capítulos abordam um problema nuclear na pesquisa preocupações com a xenofobia e os preconceitos contra grupos culturais minoritários. Da mesma psicossociológica a percepção do outro e as relações interpessoais. No capítulo sobre a formação forma, a teoria de Moscovici sobre a influência social dos grupos minoritários e das minorias acti- de impressões está em causa a compreensão dos mecanismos básicos que nos permitem construir um vas, iniciada no dealbar de Maio de 1968, está fortemente ligada às preocupações com a eficácia dos retrato estável e coerente acerca de outrem, nomeadamente quando a informação de que se dispõe é novos movimentos sociais e com a mudança social. A relevância social desta disciplina encontra-se escassa. inscrita na sua própria teoria, e os seus períodos de desenvolvimento têm sido, simultaneamente, Mas será mesmo necessária qualquer informação para que seja possível formar uma impressão períodos de aumento da sua relevancia social e, consequentemente, da sua maturação teórica. e predizer o comportamento futuro de uma outra pessoa? É este o tipo de questões analisadas por Importância da investigação e relevância social foram dois dos eixos que organizaram a pro- António Caetano no capítulo V. Valentim Alferes no capítulo seguinte, uma análise dos gramação deste manual. O terceiro foi a atenção à produção nacional. A Psicologia Social é uma dis- factores que estão na base de modalidades específicas de relações interpessoais as relações de ciplina com uma história breve entre nós. Como as demais ciências sociais, esteve congelada pelo amizade e de amor e o seu contexto emocional. regime ditatorial que, até 1974, marcou a vida quotidiana, mas também a vida científica, do nosso Avaliar e explicar são duas actividades que povoam a nossa vida quotidiana. Avaliamos e país. Por via das suas implicações na gestão das organizações, algumas das preocupações da explicamos fenómenos sociais, comportamentos de outros e os nossos próprios comportamentos. Psicologia Social puderam ser ensinadas no período pré-25 de Abril de 1974, quando o regime de A Psicologia Social dedicou muita da sua investigação à análise destas actividades quotidianas, não então esboçou uma intenção de reforma administrativa e se verificaram ensaios de modernização da só porque elas se repercutem na programação dos comportamentos individuais e colectivos, mas gestão ao nível do sector privado. Mas essa vertente da Psicologia Social, que hoje, em larga medida, também porque constituem um lugar privilegiado de compreensão do funcionamento cognitivo. está na base dos estudos sobre o comportamento organizacional, não é toda a Psicologia Social. Para conceito de atribuição, abordado por Elizabeth Sousa no capítulo VII, é aquele que tem apoiado a além do mais, muita da utilização dos conhecimentos da Psicologia Social a esse nível só podia ser compreensão dos factores que regem as imputações de causalidade. conceito de atitude, por sua feita numa perspectiva de reprodução, dado o ensino universitário desta disciplina se encontrar limi- vez, é aquele que dá conta da dimensão avaliativa presente na apreensão de qualquer objecto. As ati- tado e as condições para a investigação serem nulas. Com o advento da democracia, foi possível tudes são analisadas no capítulo VIII por Maria Luísa de Lima. alterar este estado da disciplina o seu ensino expandiu-se e dão-se os primeiros passos na investi- Praticamente no centro deste manual, o leitor encontra um capítulo sobre a influência social, da gação. Uma parte importante dos trabalhos empíricos e da reflexão teórica realizados entre nós autoria de Leonel Garcia-Marques. Trata-se de uma temática também central na Psicologia Social. reflecte-se na programação e nos conteúdos deste manual. É evidente que nem essa produção é tanta Em sentido lato, poder-se-ia até definir esta disciplina como o estudo da influência social e que pudesse marcar de forma clara o manual, nem o seu carácter de introdução a uma disciplina o poder-se-ia dizer que este problema está presente em todos os capítulos. Mas exactamente porque deveria permitir, caso tal fosse possível. Procurou-se, assim, um equilíbrio aceitável entre as preo- esta temática é de tão grande importância para este ramo de conhecimento, ela foi-se especificando cupações pedagógicas, as necessidades de uma certa coerência transversal e a atenção à produção e assumindo progressivamente uma autonomia própria. É na sua dimensão restrita, embora percor- nacional e às orientações de cada autor. rendo vários paradigmas, que a influência social é abordada no capítulo IX. Examinemos agora a estrutura do manual. Os três primeiros capítulos são dedicados à história Nos últimos anos, o paradigma da cognição social tem sido dominante em Psicologia Social e da Psicologia Social. As raízes desta disciplina na filosofia social europeia e no movimento intelec- orientou o interesse desta disciplina para duas temáticas presentes em capítulos já apresentados- a tual que, nos finais do século passado, permitiu a emergência das diferentes ciências sociais são ana- formação de impressões e a atribuição causal. Mas estes últimos vinte anos de pesquisa ainda não lisadas por Álvaro Miranda Se tivéssemos que eleger uma questão-chave nesse debate, a atingiram os níveis de divulgação e popularidade alcançados por temas como as atitudes e os pro- opção recairia na tensão entre o individual e o colectivo. Esta é, aliás, uma das questões retomadas cessos grupais. Aliás, para alguns teóricos da Psicologia Social, iremos entrar numa nova era no por Orlindo Gouveia Pereira ao relatar os pontos de ancoragem da Psicologia Social nos Estados estudo das atitudes e no renascer do interesse pela análise da vida dos grupos. No capítulo X, Jorge Unidos. E é ainda em torno da resposta a esta mesma questão que Jorge Correia Jesuíno situa a Correia Jesuíno apresenta os aspectos mais centrais na pesquisa sobre o funcionamento dos grupos, distintividade da nova Psicologia Social europeia. Estes três primeiros capítulos contam-nos, afinal, tomando como problema a relação entre estruturas grupais, processos grupais e eficácia dos grupos. como se foi constituindo o objecto da Psicologia Social e quais as orientações básicas das respostas Na sua heterogeneidade, os quatro últimos capítulos estão ligados por uma clara mudança de desta disciplina às perguntas que foi formulando. nível de análise relativamente aos precedentes. A interacção desloca-se dos níveis interpessoal e Como qualquer disciplina, a Psicologia Social caracteriza-se pela natureza dos problemas que intragrupal para objectos de análise mais macrossociais. O manual termina, assim, com uma análise aborda e não pelos seus métodos. Mas a abordagem metodológica de um problema é ela própria con- das principais temáticas da Psicologia Social da vida social. figuradora desse problema. Este livro não poderia, por isso mesmo, deixar de conter um capítulo desenvolvimento das teorias das relações entre grupos, o significado das rupturas teóricas que dedicado aos métodos. Combinando questões epistemológicas e técnicas, Jorge da Glória escolheu o têm pautado o seu discurso e a análise crítica do seu alcance explicativo são desenvolvidos no capí-</p><p>10 tulo XI, apresentado por Lígia Amâncio Uma saliência especial é aí dada ao modelo da identidade social e às suas extensões As áreas mais específicas do conflito e da cooperação entre grupos são o tema do capítulo XII, de Maria Benedicta A identificação dos sucessivos níveis de análise que têm sido adopta- dos para explicar a génese dos conflitos entre grupos, bem como a forma de os reduzir, constitui, neste capítulo, o fio de ligação das diferentes hipóteses que se desenrolam ao longo de meio século de investigação. Num campo tensional entre o macrossocial e o psicológico, a análise dos processos através dos quais as pessoas constroem teorias sobre os objectos sociais, configurando assim o seu próprio AUTORES campo de significados e de práticas, integra desde os anos 60 um conceito e um paradigma da Psicologia Social que Jorge Vala apresenta no capítulo XIII as representações sociais. Nele se passa em revista a literatura mais consensual neste domínio, mas também a mais polémica, tentando traduzir a perspectiva de que estamos perante uma área de conhecimento em que se vivem as con- Álvaro Miranda Santos, professor jubilado da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade tradições e a fragilidade de um saber em construção. de Coimbra. No quadro do debate epistemológico entre o positivismo e o construtivismo social, Luís Soczka António Caetano, professor auxiliar do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, Lisboa. Elizabeth Sousa, professora associada do Instituto Superior de Psicologia Aplicada, Lisboa. apresenta, no capítulo XIV, uma perspectiva ecológica da Psicologia Social. Da densidade popula- Jorge Correia Jesuíno, professor catedrático do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, Lisboa. cional à proxémica, percorre as temáticas clássicas e contemporâneas que nos chegam dos estudos Jorge da Glória, professor da Universidade E encaminha-nos dialecticamente, bem ao seu jeito, para uma nova discussão. Jorge Vala, professor catedrático do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. Convidamos o leitor a utilizar este manual como quem usa um caleidoscópio: o movimento de Leonel Garcia-Marques, professor auxiliar de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa. uma leitura atenta e crítica produzirá combinações e articulações de teorias e problemas que, espe- Lígia Amâncio, professora associada do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, Lisboa. Luís Soczka, professor associado do Instituto Superior de Psicologia Aplicada. ramos, serão não só agradáveis como também estimulantes da pesquisa. Maria Benedicta Monteiro, professora catedrática do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa. Maria Luísa Pedroso de Lima, professora auxiliar do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa. Jorge Vala Orlindo Gouveia Pereira, professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa. Maria Benedicta Monteiro Valentim Rodrigues Alferes, professor auxiliar da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra. Fevereiro de 1993 José Marques, professor associado da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto. Dario Paéz, professor catedrático da Faculdade de Psicologia da Universidade de San Sebastian.</p><p>CAPÍTULO I Os primórdios de uma disciplina curso e percurso Álvaro Miranda Santos A psicologia social realizou vários percursos suas variantes (Comte,1828; Quételet,1869), até ao longo do seu caminhar em direcção à sua defi- à (Lilienfeld, 1896; Braga, nição epistemológica. Quase se poderia falar de 1908). Um outro percurso mais ou menos para- caminhos e descaminhos da psicologia social. lelo e bastante significativo iria da Não seria válido, no entanto. Com efeito, mesmo (Lazarus,1882; Steinthal,1877; Waitz,1849) até os descaminhos não são descaminhos. Se bem à dos povos ou popular (Wundt, reflectidos, se convenientemente reelaborados, 1960; Le Bon, 1894). Com McDougall (1908) e em convergência, podem constituir etapas váli- Ross (1908), enfim, ou a das para a rigorosa afirmação da validade episte- cologia no fim? Seguramente duma certa mológica da prática teórica e da prática aplicada, imagem ou ideia dessa mesma psicologia social. da psicologia social em constante renovação Haveria, portanto, um novo percurso, centrado em perante novos dados, encontrados na observação torno da convergência polémica entre as experimental. (Durkheim,1898)e Em consequência, na medida em que se nos (Tarde, 1890). Um último ou um primeiro per- deparam caminhos e descaminhos, o tecido desta curso seria o duma psicologia social em moldes breve apresentação vai patentear malhas que se li- Lundberg (1936), Kantor (1922), gam entre si, umas de forma mais rigorosa, outras Mead (1934), entre os mais significativos. de forma menos rigorosa, e algumas seguramente Esta possível pré-história, talvez proto-histó- sem ligação aparentemente nenhuma, vistas duma ria, da psicologia social quer evitar a todo o custo forma isolada. Perspectivadas no seu conjunto até cair no lugar-comum de buscar o início da podem apresentar um tecido relativamente acei- ciência ou das ciências aos Gregos. Em primeiro tável ou, mesmo, com subido interesse por deixar lugar, essa ida uma confusão entre o uma ou outra malha capaz de provocar um alarga- objecto sensorial e o objecto experimental ou mento, uma diversificação, um aprofundamento. científico. Para o caso presente, seria fácil remon- Situando-nos no século XIX, por razões facil- tar até ao dito da história>>, Heródoto, para mente compreensíveis, poderíamos apontar um encontrar alusões, apenas alusões, à temática da primeiro percurso, que iria da e psicologia social, já não falando de</p><p>14 15 neos e posteriores, como obra leva por título: características mentais do 2. indivíduo e a sociedade vincado em contraste com o colectivismo de qual- Sófocles Eurípides e principalmente Aristóteles. humano (são) de primeira importância para a sua quer que seja. Ideia de individual que apre- No mundo romano seria de realçar Tito Lívio, vida na E a segunda realça: inci- Ainda hoje se encontram estereotipias, mais ou senta o indivíduo como claramente independente Cícero, particularmente Plínio, o Mesmo dência das tendências primárias do pensamento menos avatares, da antinomia tradicionalista entre certas ideias de liberdade como podendo viver nos medievais, Agostinho de Hipona, Ibn Sinna humano na vida das McDougall é o indivíduo e a sociedade. Trata-se de antinomias isolado na sua de fora de qual- e Ibn Kaldum, Tomás de Aquino e Anselmo, e dado como psicólogo. Ross, apresentado como variadas que Palante (1913) resume do seguinte quer tipo de sociedade. Ora, como refere Palante, mesmo Herbert de Salisbury. Entre os modernos, sociólogo, publica no mesmo ano um outro livro: modo: a antinomia psicológica, na vida intelec- tal indivíduo não se encontra em lado nenhum. os portugueses das crónicas e dos relatos de via- Social Psychology, an Outline and Source Book. tual, na vida afectiva e na actividade voluntária; E aquele autor conclui com esta reflexão: gens e, entre os estrangeiros, tantas vezes apoia- Ao contrário da forma tradicional imi- e as antinomias: estética, religiosa, pedagógica, na-se indispensável reconhecer que a consciên- dos nos relatos portugueses, como é o caso de tação, Ross propõe como que unidade económica, política, jurídica, sociológica e moral. cia individual é sempre, numa parte razoável, o Montaigne, mesmo de Rousseau, de Campanella de príncipio a assim como Tais antinomias encontram-se mais ou menos reflexo das opiniões e dos costumes do seu meio, ou Th. Morus. McDougall propõe como unidade de princípio esquecidas ou, ao menos, postas de Trata-se mesmo que se encontre em reacção contra essas Vamos tentar compreender a história da psi- o E aqui se encontra a base para uma mesmo duma linguagem que, em algumas das opiniões e esses (Palante, 1913, n. 2). cologia social, desfiando os seus percursos. Por distanciação com interesse. Por outras palavras, suas modalidades, já nem sequer se encontra em- Por aqui se pode adivinhar quais vão ser os outras palavras: vamos procurar construir uma his- aqui se encontra o fim da ambiguidade em psico- pregue. A um olhar mais atento para a actualidade, conteúdos culturais presentes no vocábulo socie- tória da psicologia social, inventariando algumas logia social, ambiguidade que durou demasiado na sua manifestação global, encontra-se clara- dade. Não somente nem principalmente o Estado, das suas diversas ou tempo. No entanto, alternativas várias foram de- mente presente e, mais do que isso, claramente ex- mas o conjunto dos nos quais sabrochando ao longo dos anos, umas menos e tensiva à dicotomia criada pela dialéctica actual: a participa um indivíduo e as consequentes relações outras mais dominadas pelo bissubstancialismo, antinomia entre personalidade e cultura. Esta anti- complexas, nas quais se encontra envolvido pelo 1. A primeira possibilidade na forma particular que lhe imprimiu Comte nomia domina em muitas reflexões acerca da pre- facto mesmo da participação. Em qualquer (1828): o humano era perspectivado em divisão, sença e interacção de culturas diferentes, acerca da hipótese, convém procurar evitar os dois extre- Em 1908, McDougall publica An Introduction entre o biólogo instintividade e o sociólogo aprendizagem escolar e, insensivelmente, passou mos principais: e anatematizar a socie- to Social Psychology. A primeira secção desta Colocando em nomes, seria de para o linguajar do dia-a-dia. E não admira: fácil se dade (Palante, 1913, n. 1), pois pode-se verificar dizer entre McDougall e Ross. torna observar a tal respeito uma quase unifor- sempre um sem-número de influências, as quais William McDougall 1871-1938 Em consequência, esta primeira possibilidade midade de certos dizeres e de certas perspectivas ora se adicionam e se reforçam, ora se e tem uma característica muito especial: higiénica. em meios de comunicação social, quer escrita, até se neutralizam. Estamos numa certa actuali- Comporta claramente o seu papel específico, quer falada, quer televisiva. Toma-se, portanto, dade, razoavelmente ambígua: homem é pro- embora reforçando ora um biologismo estreito operacional situar a antinomia de fundo e como é duto e produtor da sociedade e/ou da cultura>>. na sequência da struggle for life, ora um socio- que se pensa superá-la. E, em primeiro lugar, de Seria de perguntar, nesta sequência: tudo se logismo sistemático de massas fabricam a que constará ela na síntese praticada por Palante. equivale? E a resposta surge: não, propriamente. história>>, ora uma junção curiosa das duas pers- As reflexões de Palante sintetizam bem um Com efeito, há uma diferença apreciável entre as pectivas num de largas certo número de ideias correntes nos fins de XIX e antinomias que se podem enumerar e o realçar aplicações e de considerável divulgação. inícios de XX. Assim, para os conteúdos do vocá- mais fortemente das antinomias entre o indivíduo Neste ponto, vamos ficar por esta primeira bulo indivíduo, convém superar o que ainda hoje e a sociedade. A primeira a ser equacionada vai parte dos caminhos e descaminhos, lobrigando ao é vulgar, ou seja: não se trata do indivíduo dito ser a antinomia psicológica, pois constitui longe a possibilidade definitiva da psicologia primitivo, da natureza, à Rousseau pri- antinomia Compreensivelmente: social como ciência e conteúdo científico especí- meira de bondade natural, claramente todas as outras nada mais são do que extensões ficos. O ponto seguinte irá demonstrar, adentro (Palante, 1913, n. 2). Menos ainda se pode tratar ou aplicações E torna-se interessante, para das perspectivas dos seus autores, como é que ela da individualidade, espécie de unidade absoluta, a análise que aqui me proponho, perspectivá-las foi acontecendo. Aqui ficará como é que ela se foi essência espiritual, mais ou menos universal como algo na dependência da antinomia psi- mostrando, ao menos no que diz respeito a gran- (Kant e Fichte). mais frequente é a ideia de indi- cológica: o sujeito é o ponto de partida dos fac- des linhas ou'a grandes espaços da sua temática. vidual, vindo do individualismo, particularmente tos, no que ao humano diz respeito, assim como</p><p>16 17 das leituras de tudo o resto e dele próprio. Acon- pode e deve dobrar-se perante o poder e/ou a resulta da vida social. A consciência será um epi- entre os juízos acerca das coisas; a verdade em tece até uma leitura particularmente significativa clareza das Até porque, segundo os mes- fenómeno, não do orgânico mas do social. Afir- perspectiva pragmatista apareceria com as carac- e mesmo representativa a este respeito. As anti- mos, a sensibilidade é uma espécie de forma mam textualmente: condição essencial que terísticas de utilidade e de eficiência. Em ambos nomias são inevitáveis. Com efeito, quanto mais inferior da como que uma razão estabelece a diferença entre homem e os animais os casos, porém, comporta sempre uma função diversificada é a sociedade mais se torna compli- confusa e Com efeito, segundo vários deve-se ao facto de o homem se desenvolver em social: unificação das inteligências, disciplina cado favorecer um mínimo de a partir autores, referidos por Palante (1913), encontra- sociedades em crescimento, enormes, ao passo que intelectual consequentemente, factor de coesão da acção rotineira, mais ou menos imposta, e da mos: razão nada mais é do que um sistema o animal se encontra a maior parte do tempo iso- social. Basta lembrar ter sido sempre ela, a ideia regulamentação crescente com vista a uma certa de categorias impostas a priori ao indivíduo lado também pode viver em bandos, mas desde de verdade, a cidadela dos dogmatismos, a pedra conformidade, por maior ou menor premência. pela consciência Por conseguinte, sempre estacionários e (1913, 9). angular das ortodoxias ideológicas, desde a ciên- afirma o primado e a preponderância do Por outro lado, o seu cepticismo em relação à cia à moral, desde a filosofia à Dos A vontade do indivíduo aspira à diversidade e ao poder, sobre a à independência a sociedade esforça-se por reprimir este hereditariedade, à raça, em suma, relativamente racionalismos correntes, claramente dogmáticos, tríplice esforço da vontade individual, (...) unicidade, inco- Como se pode depreender a questão funda- aos elementos fisiológicos, corresponde a um o mais forte hoje é o racionalismo municabilidade, instantaneidade, insaciabidade humana mental, em termos de antinomia, é para Palante acto de fé no factor único que é a socialidade, entendamos, experimentalista. É ele que hoje evidentemente imprópria para uma sociabilidade perfeita a seguinte: relações entre a vida espiritual e através da actividade educativa. Daqui, para o aspira à hegemonia social, quer sob a forma de ou mesmo um pouco aperfeiçoada ...corrigir o mais pos- o estado da sociedade. A vida espiritual no seu condicionamento em voga, à behaviourista ou à exclusiva verdade, quer sob a forma de eficiência sível a unidade pelo conformismo, a espontaneidade pela regra, a instantaneidade pelo seguidismo, a instabilidade do tríplice aspecto, inteligência, sentimento e von- reflexiologista, é um passo de palavra. A base da ou <<racionalismo (Palante, 1913, p. 38). desejo pelo apelo à resignação e pelas perspectivas dos tade é às influências sociais? favore- explicação é o paralelismo, estabelecido entre a Finalmente, haveria a considerar o uso e os paraísos humanitários (Palante 1913. p. 80). cida ou contrariada por elas e em que evolução social, dum lado, e, do outro, o grau de objectivos da inteligência depois de a termos (1913, pp 75-80). aperfeiçoamento e afinação das inteligências. considerado na sua origem ou génese e no Igualmente no que diz respeito a afectividade. Torna-se compreensível, na ciência psicológica Após uma longa análise e do debate sobre a objecto. Aqui encontra-se a mesma antinomia Duas perspectivas opostas e dois tipos de expres- actual, que na vontade, que é realidade do social e a realidade do individual, entre socialidade e individualidade. sões vão aparecer com uma certa nitidez. Dum tação de afectividade, assim como no sentimento Palante sintetiza: razões que nos levaram Uma pergunta final: tratar-se-á mesmo de lado, vai surgir a perspectiva sociologista, segundo e na emoção, igualmente expressões afectivas, se a conceder ao indivíduo uma certa realidade antinomias? A resposta é fácil, se tomarmos o a qual o facto social é, tem de ser, preponde- encontrem oposições, mais ou menos vincadas, fisiológica e psicológica, independente da socie- vocábulo antinomia no seu sentido mais viven- rante no que toca à expressão dos sentimentos e entre o indivíduo e a sociedade. Mas torna-se dade, arrastam como consequência a possibili- cial do que lógico. Com efeito, em termos de emoções, tendo em vista a possibilidade duma fortemente problemática a compreensibilidade da dade teórica duma antinomia entre o indivíduo e pares de noções contraditórias, acontece uma uniformização, por uma socialização progressiva oposição ou conflito ou antinomia entre as duas a (1913, p. 27). Mas isto no que diz exclusão recíproca. Em tal sentido não é plau- das Do outro lado, encontramos realidades que são a inteligência e a sociedade. respeito à forma de manifestação da sível tal antinomia, pois não só não há sociedade a perspectiva individualista, por vezes dita psico- No entanto, para Palante, trata-se dum facto cia, o que a torna menos compreensível hoje, a sem indivíduo, nem acontece indivíduo humano logista, em forma tradicional, evidentemente, a bem caracterizado. Com efeito, os partidários do não ser para aqueles que advogam a algum a não ser que seja em grupo humano qual afirma a sensibilidade de cada um constituir monismo sociológico Durkheim e Daghicesco cia (Festinger, 1957). Mas, se focar- mais ou menos extenso. Em perspectivas con- um fundo irredutível a qualquer influência social tentam reduzir tudo, fisiologia, hereditariedade mos o modo como essa inteligência se exerce, traditórias, torna-se admissível a antinomia. Com Impossível se torna, portanto, acabar com as e raça, ao determinismo social. Diferentemente, encontramos um novo tipo de antinomia, a qual efeito, a exclusão recíproca não é total nem de diferenças no que toca à expressão dos sentimen- por seu lado, criticam directamente o epifenome- consistiria no conflito entre a intuição e a noção, totalidade lógica nem de totalidade vivencial. tos e/ou das emoções. o fundamento desta dife- nismo de Maudsley e Ribot (Palante, 1983, 8 sendo esta constituída pelo senso comum ou Trata-se apenas duma totalidade didáctica e/ou rença encontra-se na sua base: o individualismo. e 9 g.), os quais fazem derivar as formas supe- espírito e aquela pelo senso próprio pedagógica, cujo objectivo consiste em realçar Com efeito, os individualistas tentam apoiar-se riores da intelectualidade humana do viver em ou individual (1913, p. 30). os factos e as perspectivas ou em realçar a afir- nas reflexões fisiológicas, segundo as quais se sociedade. A cerebralidade é um produto do meio Resta o problema da verdade. Este problema mação pessoal, a propósito ou a pretexto do torna quase impossível a unificação sentimental. social. Em boa tradição lamarckiana, afirmam: reveste, por sua conta, duas facetas: a verdade tema. Restaria uma última a exclusão Pelo contrário, os sociologistas apoiam-se nas o meio e a necessidade de se adaptar tansformam em perspectiva racionalista ou intelectualista, o dos dois termos da antinomia. Aqui encontra- afirmações daqueles, poder-se-ia dizer intelectua- e como que criam o órgão. Não é a sociabilidade mesmo é dizer, de clareza e distinção entre as mo-nos perante certas tomadas de posição em listas, segundo as quais a sensibilidade individual que resulta da cerebralidade, é a cerebralidade que ideias, entre as ideias e as coisas e que se procura proclamar o niilismo dos factos,</p><p>18 19 ou das perspectivas, ou dos domínios do saber. interesse. No entanto, é desviada do nosso objec- -cultura. Este último a tocar-nos muito mais de dros dum labirinto embrenhado, em direcção à E aqui vem com particular propósito: seria a tivo por ser desviante, na medida em que nega perto e muito rapidamente. Vamos ver porquê. ciência psicológica, capaz de abarcar o humano posição das antinomias em torno da psicologia validade epistemológica à psicologia social, por a Toda a história da ciência, como, aliás, a na sua especialidade e na sua globalidade. para impor a ideia da impossibilidade da ciência negar mesmo à própria psicologia. história em geral, encontra-se em maior ou Neste contexto adquire particular relevo a psicológica em moldes experimentais. Neste sen- Convém notar que o pretenso conflito entre menor proporção circunscrita a um grupo, a uma psicologia social apesar da sua tão propalada tido: como é impossível objectivar o subjectivo, indivíduo e sociedade, muito antes do advento da organização ou a um Estado (Nação), com mais (Allport, 1954), declarada e mesmo não pode haver psicologia, diz-se (Santos, 1972). sociologia, já era um dos temas preferidos dos ou menos ramificações. reclamada por diversos autores com responsabi- No que ao texto de Palante se refere, temos mais variados exercícios de retórica. Por isso sub- Toda a história da ciência, muito particular- lidades. Adquire ainda, e para o caso, particular que a antinomia entre indivíduo e sociedade siste, ainda hoje, uma razão a mais para o denun- mente, apresenta-se como uma história apolo- relevo o seu caminhar, feito de caminhos e des- acontece em perspectiva mais predominante- ciar no contexto desta reflexão sobre os caminhos gética das <<conquistas do espírito isto caminhos, os quais, em síntese, poderão cons- mente vivencial, de vivência das pessoas, a par- da psicologia social. Gurvitch, no entanto, acres- é, das grandes descobertas científicas. Claro e tituir fonte inesgotável de problemáticas diver- tir da opção efectuada concretamente por um centa algo de interessante: inúmeros técnicos, pen- perfeitamente compreensível. Como é igual- sas e permitir ampliar, aprofundar, diversificar dos dados da antinomia. Por outras palavras, sadores, filósofos e cientistas essas mente claro e compreensível que, pela novidade e, principalmente, especificar cada vez mais o como o refere Palante: antinomia pode significar realidades como se fossem entidades abstractas, da sua apresentação, pelo realce que recebeu em humano, como objecto científico. que duas coisas se encontram numa relação tal perfeitas e irredutíveis, facilmente utilizadas em termos de divulgação, principalmente pelo brilho que o desenvolvimento duma acontece à custa ora individualistas ora colectivistas, ora das suas aplicações técnicas, cada descoberta do da outra, uma tende a destruir, a diminuir ou nominalistas ora realistas, ora contratualistas, ora ofusque com a sua fulgurância outras verdades 4. Uma segunda possibilidade a enfraquecer a outra (Palante, 1913, p. 272). institucionalistas. Num passado próximo, encon- ou outras realidades, outras pesquisas ou outras tramos Comte, Spencer, Tonnies, Spann, etc., em possibilidades de mais longe, ou mais diversi- Por todo o século XIX, cresce em grande força perspectiva anti-individualista; Tarde, Mill, Ward, ficada ou diferentemente, na captação de qual- o interesse votado à linguagem, factor de base 3. Uma pergunta-chave Giddings, etc., em perspectiva individualista. quer outra realidade em qualquer outro campo da e para a comunicação. Nessa medida vê-se crescer o interesse em torno da manifestação Intermediariamente, vêem interdependência ou ramo do saber. Quase seguro, encontra-se Neste ponto ou momento seria de perguntar Simmel, Van Wise, Weber, Park, Burgess, Mac aqui em força a lei dos (Comte) a psicossociológica, ou seja, da interacção. Sem o singelamente: em qualquer hipótese e em termos Iver e muitos outros, ao passo que Durkheim e no sentido dum progressivismo de per- nome, apenas. Em realidade, claramente. nome epistemológicos, será legítimo falar de antino- tantos dos seus discípulos, em França, Cooley e feita rectilineidade, colocando como paradigma a era, na designação de Ribot (1876), psicologia mia entre indivíduo e sociedade? Tal pergunta sua escola, nos EUA, se afirmam pela indepen- realidade mais facilmente observável, mais facil- etnográfica. E foi na Alemanha que aconteceu pode justificar-se se tivermos presente uma ou- dência do facto social, irredutível aos indivíduos, mente sujeita a aplicações técnicas. Por conse- esse relevo especial dado ao tema. Waitz (1849, tra, subsequente e antecedente ao mesmo tempo. exercendo uma coerção, maior ou menor, sobre quência, parece querer impor-se mesmo decidida- 1859) centrou a atenção sobre povos em Por outras palavras, uma pergunta radical: se a eles (Gurvitch, 1957, 36). mente ao que é do foro humano, ou em modo de quase por oposição ao estado de antinomia não se manifesta ou não encontra Se antinomias existem, são-no mais na pers- exclusivo de análise experimental em tudo o que cultura. Sem aquela ponta de nostalgia por esse apoio nas vivências, a vivência de cada perso- pectiva do que na vivência. No entanto, podería- representa investigação sobre o humano. Apesar de chegando-se a acusar a nalidade ou indivíduo traduz o quê? mos formular a pergunta: a vivência é vivência da divulgação de vocábulos como progresso e/ou senão mesmo a ou a Comecemos pelo princípio. Qual será o funda- de quê, manifesta, traduz o quê? Sem a menor evolução, quase esvaziados do seu conteúdo e dade de o destruir (Moscovici, 1972; Roszak; mento que leva G. Gurvitch (1957) a apelidar sim- dúvida que a vivência traduz e manifesta uma grandemente devedores a uma espécie de destino 1967; Steiner, 1971). Waitz e mesmo Bastian plesmente de aquilo que consti- Se de se trata, partindo da cego, hoje, pouco ou muito pouco sentido podem (1881) tentavam compreender os povos tui o problema de fundo em Palante, como resumo perspectiva de que a própria realidade é a leitura ter. Ainda que se encontrem a imperar em força recorrendo aos quase de tantos manuais de sociologia e de antropolo- que dela efectuamos, há que a tomar como tal até dentro duma colectiva>> bastante típica. como aconteceu com Mead (1970). Caracteri- gia, de psicologia e mesmo de psicossociologia? que consigamos transformá-la duma forma capaz Evidentemente, insustentável (Santos, 1991). zavam, no entanto, o humano do seguinte modo: Gurvitch, por sua conta, é frontal no subtítulo de corresponder à totalidade do real em observa- A alternativa consiste numa espécie de história domina a natureza pelo trabalho; serve-se da que aduz: pretenso conflito entre indivíduo e ção, na fundamentação duma diferente. da ciência em génese. Tal em linguagem articulada (verbal); constrói noções sociedade (Gurvitch, 1957, n. 36). E em hipótese Vai ser o caso do binómio indivíduo-sociedade e por observação para descoberta do vai que são a base das relações pessoais e grupais; de reflexão a este propósito, a sua alternativa tem do outro, mais actual, o binómio personalidade- constituir o fio de Ariane, a conduzir pelos mean- estrutura concepções religiosas e/ou míticas,</p><p>20 21 a sua outra forma de presença no mundo físico diversas formas de expressão verbal na respec- colectivas. Haveria que considerar ainda as diver- mais quanto particularmente estéticas e duma e humano. tiva época. Particularmente as que se seguem: a sas actividades intelectuais, os trabalhos e as pro- faceta (Bastian, 1868, p. 45) De tudo Deste modo a procurava Volksseele não constitui, portanto, uma personali- duções que daí decorrem: língua, as artes, a isso são prova ou demonstração os variados com- uma descrição do homem social, do humano e dade real, mas apenas uma palavra para exprimir técnica repercutem-se na "alma do povo" e ao portamentos humanos a permitirem uma psicolo- seus grupos, na sua faceta de interacção. Esta inte- um conjunto de estados e fenómenos (Reich, mesmo tempo manifestam-na e gia comparada ou uma comparação das expres- racção encontrava-se igualmente presente nessa 1876, pp. 25 e 41). Duma forma curiosa, o autor Interessa considerar ainda como importante a sões pessoais, referenciadas a grupos diversos. outra problemática, designada por Volksgeist, e propõe uma sequência de actividades e perspec- moral na sua faceta de manifestação duma Este estudo comparativo permite a qualquer in- aqui a língua adquire mais importância e mesmo tivas para conseguir conhecer a alma do povo, já individual, já colectiva, particularmente vestigador libertar-se proveitosamente de especificidade como manifestação que é de da qual falou entre nós, mais recentemente, J. pela sua possibilidade de afrontamento ou choque mas de observação e de análise, tão grupo cultural. A língua consiste, efectivamente, Cortesão (1914): que todos os portugueses com as paixões. Com efeito, o estado moral dum quão parciais, permitindo-lhe atingir o humano, num conjunto de elementos a constituir o instru- se possam inteirar da sua Do mesmo povo varia com a organização física, a raça, o tanto quanto possível na sua globalidade. Em Der mento básico da comunicação adentro do grupo modo, e numa vasta gama de informações direc- modo de viver, o exemplo das classes dirigentes, Volkergedanke im Aufbau einer Wissenschaft vom e, consequentemente, objecto de aprendizagem tas sobre o viver popular e sobre a bibliografia a vida em família, as variadas formas de Menschen (o pensamento do povo na construção da parte dos membros. Por este lado, a psicologia acerca da popular encontramos T. Braga Finalmente, o estado social e político traduz e ao duma ciência dos humanos), Bastian (1881) pro- étnica ganhou impacte a partir de 1859. Este foi (1885) com os seus dois volumes Povo Portu- mesmo tempo incide sobre a Volksseele, as leis, que, muito para além de museus etnológicos o ano da fundação da Zeitschrift fuur Volkerpsy- guês. Em qualquer destes casos sempre houve a os regulamentos, as normas, a segurança e as pos- completos onde penduramos vestes, armas e uten- chologie und Sprachenwissenschaft, por obra de preocupação de descobrir, por um lado, o estado sibilidades de exercer a liberdade individual. sílios variados nos com estudar as Lazarus e Steinthal. Foi este que, a partir de estu- dos indivíduos e, pelo outro, as manifestações Torna-se vantajoso insistir noutras diferenças inventariadas, em termos de línguas, dos diferenciais em história, em geologia, em que resultam da sua aglomeração, as quais con- Assim, acontece que um pouco antes de costumes, tradições, instituições, leis, antropologia, em etnologia e, principalmente, em tribuem para a definição da Reich, aparecia um outro som, embora mais ou (Bastian, 1881, p. 28). Deste modo não corremos linguística, estabeleceu as leis psicológicas da A pergunta é simples: a aglomeração dos in- menos no mesmo sentido sob proposta de Bastian o risco de perder tudo o que duma forma ou linguagem. A psicologia étnica preparava a psi- divíduos incide na do como? Há (1968), revestindo-se de particular interesse para doutra nos pode falar do humano, no passado e no cologia social através da cujo instru- que realçar, entretanto, os elementos, constituin- o presente propósito: Beitrage zur vergleichenden presente. Esta sim, seria a psicologia dos povos, mento é a língua. No entanto, além ou aquém tes possíveis, dessa do São eles, Psychologie (Contributo para Uma Psicologie para melhor compreender a personalidade em desse instrumento encontram-se as mais diversas entre outros: a raça e o seu carácter primordial, Comparada). Um tal contributo em termos com- grupo e assim chegar à psicologia, simplesmente, formas vivenciais e vivenciadas para cada um as influências hereditárias são também de consi- parativos vai incidir sobre os dados da etnografia enquanto análise científica do humano. Especifi- em si mesmo considerado, assim como em grupo derar com rigor. Ainda a considerar seria essa subtítulo o confirma: Alma e Suas Mani- camente, ou seja, não apenas a partir da vivência ou grupos, dentro e fora das variedade importante de modos de viver, parti- festações e Aspectos na A reflexão do contacto com esses produtos em grupo. Por E daqui podemos apontar para um outro passo no cularmente, os ritos, rituais e hábitos alimentares. distribuiu-se por três partes principais as quais outras palavras, a psicologia pode ser, correcta- caminho para a psicologia social: a psicologia E ainda os cuidados exteriores do corpo na cidade permitem a Bastian demonstrar o caminho per- mente, uma ciência experimental, a tirar proveito dos povos. É o caminhar da psicologia da lin- e no campo, habitação e sol e sombra, assim como corrido pela ideia de seele: o conceito dum ele- desta galáxia de informações no sentido de ir guagem ou da psicolinguística para a psicologia os climas. Quanto mais se pormenoriza mais mento psíquico; os antepassados e os manes; construindo uma mais adequada sobre o dos povos. claro fica que os componentes exteriores recebem a patologia dos obsessivos e os curandeiros. humano que somos: psicologia social. Em 1876, Reich publicou Studien ueber der uma importância considerável na forma de anali- Não é fácil supor, a partir do que fica dito, qual Neste sentido, o serviço a prestar pela psi- Volksseele (Alma Popular ou do Povo), obra sar a Volksseele. Por outro lado, haverá que lan- caminho seguido por Bastian. Com efeito, há cologia social já se pode adivinhar. Desde há onde procura demonstrar que como çar um breve olhar para as manifestações do um facto mais relevante a apontar segundo este bastante tempo, no entanto, A. Schaeffle (1881) entendemos por alma o conjunto das manifes- da do Em primeiro lugar, autor. É o seguinte: rodeados de sugeriu algo com bastante interesse. Num título a tações da vida intelectual e moral dum sujeito, do observa-se o tipo de temperamento na medida em maravilhas várias, cujas explicações nos escapam. deixar-nos indiferentes pela sua generosidade, mesmo modo compreendemos sob a designação que ele tem influência directa na história desse Deste modo, ao longo dos séculos, na variedade Bau and Leben des socialen Koerpers (Orga- de Volksseele o conjunto das manifestações da povo. Em segundo lugar, há que ter em conta o dos espaços, foram inventados, transmitidos e/ou nização e Vida do Corpo Social), reflecte duma vida intelectual e moral duma nação, duma casta carácter, o qual se encontra directamente rela- transformados usos vários, rituais diversos prá- forma interessante. Apesar de tratar da ou duma classe de Há que situar estas cionado com o tipo de governo e as actividades ticas curiosas e "narrativas" interessantes, tanto zação da curiosamente, do social>>,</p><p>22 23 mais contrastante ainda, apela em várias pas- transformação. Curiosa forma de falar do que mostra uma ausência notória de bom humor, de mação à psicologia social, encontramos algo de sagens para a importância da psicologia social. mais tarde foi, entre outras coisas, a alegria de viver e de domínio da inquietação. As mais explícito e de mais significativo, ao menos Para o autor, a sociedade compreende dois ele- básica da (A. Kardiner, 1939) e ideias são coerentemente ligadas e os actos apon- historicamente. Antes de todos os autores, seria mentos um passivo e outro activo, ou sejam, as ainda a (Santos, 1987). tam para valores que dão à moral a forma de algo de focar com um certo relevo Lilienfeld (1873): coisas e as pessoas. Por outro lado, o humano Por este lado, poderia dar-se realce a outro a cumprir. Esta, por sua vez, vai incidir sobre a Gedanken Ulber die Social Wissenschaft der nasce numa sociedade e para uma sociedade. Por autor. Vierkandt (1896) inclina-se mais claramente religião. Toda a ordem parece divina quando é Zukunft (Reflexões sobre a Ciência Social do isso, é sociável, cria novas formas de sociedade para a psicologia social do que para a psicologia moral. Economia política previdente, arte criativa, Futuro). Que o autor a sociedade como para caracterizar novas formas de dos povos. Com efeito, não lhe interessam os ciência explicativa, consciência esclarecida pelo um organismo, aceita-se embora se discuta. Schaeffle utiliza mesmo uma comparação: os comuns às individuais, valor e uma religião-moral constituem a predomi- Apesar disso, no segundo tomo da sua obra as seres vivos compõem-se de moléculas materiais; duma nação, duma raça. que pretende é dispor, nancia da vontade sobre o instinto. Leis Sociais, já aponta para um sentido diferente no entanto, as moléculas enquanto tais não são regularmente, em torno dum centro psicológico, Vierkandt não pretende, está bem de ver, que do direito e da sua consagração em termos de pre- vivas. Do mesmo modo, a sociedade é composta a diversidade dos factos sociais. Um tal centro existam efectivamente estes dois grupos, nem ceitos. No terceiro tomo, no entanto, a começar de indivíduos e de coisas. Nem uns nem outros é constituído por actividades, particularmente por apenas estes dois grupos. Trata-se mais propria- pelo título há algo de significativo: Psicofísica são sociedade, mas, ou por isso, intermediaria- estas duas: o instinto ou actividade irreflectida mente de protótipos, a permitirem todos os Social. Desde o início, adentro das tentativas de mente, apareceu o grupo quer de referência, quer e a vontade ou actividade reflectida. A primeira matizes, quer neles mesmos quer entre os dois. atribuir à psicologia um lugar no domínio dos de pertença ou os dois. Consequentemente, e con- seria a dos selvagens e a segunda a dos civiliza- É deste modo que poderíamos analisar a grande saberes experimentais, logo apareceu um esboço tinuando a comparação, assim como no corpo há dos. Esta perspectiva constitui o fundo do livro variedade de manifestações societais e culturais. de perspectiva psicológica. Se Fechner (1860), fibras e gânglios, etc., no grupo as fibras são as Naturvoelker und Kulturvoelker (Povos Primiti- A passagem entre estes dois extremos depende qualquer que seja o significado da sua obra Ele- formas e os meios de comunicação, os quais, em vos e Povos Civilizados). E em subtítulo: da dominância do instinto ou da vontade. Domi- mente der Psychophysic (Elementos de Psicofí- vez de movimentos nervosos, transmitem sím- Betrag zur para nando o instinto, factor de atracção e de união sica), se propôs realizar algo de diferente no domí- bolos, veículos das ideias, diversificadas quase a Psicologia Nesta perspectiva, mais ou entre os humanos, o sentimento social encontra- nio da investigação sobre o humano, em plena até ao infinito. Por isso é que os indivíduos e/ou menos dicotómica, se podem compreender as va- -se no máximo. Dominando a vontade, factor de euforia da antropologia física, amplificada com a os grupos podem trocar ideias. riações dos costumes, dos usos, das ciências e das desunião ou de separação entre os humanos, a divulgação das perspectivas de Darwin e outros, E assim se forma a psicológica da artes, assim como das religiões: em conformidade sociedade que se civiliza caminha para o suicídio. do mesmo modo e logo no início alguém se propôs com as actividades fundamentais dos humanos. a psicossociologia, qualquer que seja Estamos em psicologia. Mais propriamente, o homem é um animal social não é um animal civilizado. Vierkandt, ao enumerar as características do o valor da sua obra. Importa, isso sim, realçar que em psicologia da vida social ou na vida psi- o instinto une, a vontade separa; onde domina o instinto, instinto, define o tipo de vida dos povos instin- a sociedade é forte e temos a barbárie: onde a vontade a perspectiva psicossociológica brota espontânea cológica da Por outras palavras: tivos: vida apaixonada, sem fins previstos, do que domina, na civilização, a sociedade enfraquece-se. É clara em momentos de observação do humano. Indu- existe uma social de que emanam, resulta a sua forma de deixar correr, a permitir a antinomia entre a sociedade e a civilização e a harmonia bitavelmente trata-se dum esboço, claramente real, ao menos em parte, as consciências uma forma de jogo de que resulta uma alegria con- entre a moral e a civilização. A civilização é uma flor rara do que pode vir a ser a psicologia social, quer (Schaeffle, 1881, p. 105). No entanto, estas não fiante, despida de preocupações, agindo ao sabor e efémera, na História da humanidade, como a actividade quanto ao objecto de estudo, a quer são independentes. Desta forma torna-se voluntária do indivíduo (Vierkandt, 1896, pp. 5, 24 e 26). das circunstâncias, físicas e sociais. Por outro quanto ao método rigorosamente científico, fácil explicar certos fenómenos do género lado, a actividade de analogia e de metáforas, base Algo convém reter nesta caminhada: na adentro dos quadros representacionais da época, demias morais>>, a falsear ou perverter as von- das mitologias é-lhes familiar, assim como uma diversidade das formas de interacção e dos con- facilmente identificados no sentido da sua própria tades, a favorecer resoluções comuns, ajuizamen- prática moral voltada para o exterior. O civilizado teúdos interactivos em foco, o humano encon- superação. Como será praticado na sequência. tos partilhados sobre os outros, sobre as coisas ou será algo em contraste total com o selvagem. tra-se todo, por inteiro, a justificar, pela sua cria- Já antes de Lilienfeld (1873) e mesmo de sobre os acontecimentos, sobre os gostos públicos De actividades livres, forma projectos vários para tividade, a diversidade das manifestações. Fechner (1860), algo de interessante, mesmo de ou sobre os costumes (Schaeffle, 1881, p. 78). objectivos de interesse e, por isso, age indepen- Apesar de toda esta reflexão, com um certo curioso, ao menos para o nosso olhar de hoje, Encontra-se aqui uma perspectiva ainda hoje dentemente das circunstâncias, vive ocupado, interesse, enfermar de generalidade pronuncia- estava acontecendo. Ventilou-se, duma forma corrente, a do contágio social. No entanto, é bom sobretudo preocupado com o futuro na maior da, é bom colocá-la em foco, pois encontra-se inédita ou significativa, no título e no conteúdo notar, as consciências, por si mesmas, encon- parte dos domínios, capitalizando sob as mais com certa frequência, sem as pessoas dela se duma obra: Humano e o Desenvolvimento das tram-se abertas às ideias e, consequentemente, à diversas formas para o depois. Em consequência, darem conta. E, neste contexto duma aproxi- Suas Potencialidades (Quételet 1835). A sua</p><p>24 25 Wilhelm resultados do que a observação interior, engana- modelos.. as realidades que vemos, levamo-las à que fazem parte. Wundt atribui mesmo como 1832-1920 dora e, ainda, impraticável. Mesmo limitando-nos conta de selvajaria, para com desprezo tratarmos objecto científico à psicologia étnica: a) os ao simples domínio dos factos, nada há a temer. o negro e chegarmos à triste e errónea conclusão problemas do mito, a pensar nos começos das A sua vasta Volkerpsychologie encontra-se ao que queremos faça eco no mundo civilizado: de religiões; b) os problemas dos costumes a pen- alcance de todos e apta a demonstrar que a vida, que os povos da África são brutos e como tais só sar na origem, formação e desenvolvimento os costumes, as tradições, as crenças, a própria a tiro se podem submeter aos nossos usos e cos- da cultura; c) os problemas da linguagem, a pen- linguagem dos selvagens oferecem uma tumes; ou então que deles nada se pode fazer por sar nos movimentos de expressão (criticando matéria demasiado vasta à investigação científica. rebeldes ao (Carvalho, 1890, p. 45). Darwin e Spencer para realçar as expressões de Wundt vai mais além e quase preanuncia, insis- Tinha afirmado páginas antes: há estudo que intensidade, de qualidade e de representação das tindo que o estado psíquico destes povos é o exija mais sossego de espírito e maior impar- emoções), a pensar na linguagem gestual, com resultado de circunstâncias tão complexas que cialidade de opinião é, sem contestação alguma, o particular realce para a faceta simbólica, a pen- podem escapar escapam e escaparam à obser- das tribos africanas com que se logra estar em sar nos sons, na sua faceta natural e na sua trans- vação desarmada. E acrescenta: é lamentável que contacto; e, sem este estudo despreocupado, a formação cultural, e a pensar finalmente na até hoje não se tenha arrancado a estes documen- etnografia não pode progredir nem fixar-se em palavra, particularmente na sua faceta específica tos um único facto em perspectiva psicológica. bases (Carvalho, 1890, p. 4). Propostas de linguagem, constituída pela língua (Wundt, E, no entanto, encontram-se elementos dum ele- preciosas contra o etnocentrismo, seja de qual cor 1880). Este realce dado à linguagem tem um vado interesse psicológico nas for ou mesmo de cor neutra, este a negar validade significado especial: a linguística pode ajudar tradicionais dos assim como nas e valiosidade à ciência e à prática psicológicas, a psicologia a atingir um ideal claro de objec- dos povos civilizados. Em ambos os particularmente de psicologia social. tividade, do qual beneficiaria, por sua vez, a proposta, expressa no subtítulo de casos, quanto há a esperar duma releitura desses Em Volkerpsychologie, Wundt realça a própria linguística. Quem for capaz de analisar Física consistia em aplicar a estatística dados arqueológicos vistos não apenas como pro- grande vantagem que pode trazer para a com- a história duma palavra, ao longo de milhares aos fenómenos para implementar a dutos mortos, mas como vivências vivas de pes- preensão da personalidade a análise dos fenó- de anos, consegue captar a história duma ideia teoria do soas e de grupos. Tais dados foram desconsidera- menos que resultam da acção psicológica recí- enquanto fenómeno cultural. Isto prende-se com Neste contexto e sem afirmar nem infirmar a dos, desprezados por vezes, mesmo destruídos, proca. Consiste nisto o papel da a importância atribuída por Wundt (1885) à validade para aqui irrelevante praticar até materialmente, sob pretexto de inutilidades cuidadosamente os fenóme- representação (Vorstellung). Esta constitui, com uma breve referência a Wundt. O menos conhe- supersticiosas, para uns e para outros, de crenças nos psicológicos que se encontram na base do efeito, a faceta objectiva (curiosamente) em cido talvez mesmo simplesmente desconhecido obscurantistas. No entanto, a partir duma inter- desenvolvimento geral das sociedades humanas relação ao sentimento, oposto, por sua vez, a pelas histórias da psicologia, tendo presente a pretação lúcida e aprofundada ou diversificada de e do aparecimento dos produtos colectivos dum sensação (ou impressões sensoriais directas), a divulgação, através do paradigma físico-mate- todos esses velhos documentos literários orais valor A seguir avança mais esta constituir a faceta subjectiva. Ao contrário de mático e biofisiológico, da sua obra: Grundzuge e/ou escritos tão importantes se não mais, tão ideia curiosa: a psicologia étnica diz respeito à Herbart (Ribot, 1876), o qual faz derivar o sen- der Psysiologischen Psychologie (Princípios ou ricos se não mais do que os monumentos em alma e não ao espírito. A ideia de alma, com timento da representação, Wundt vê nas duas Elementos na Psicologia Fisiológica) (Wundt, matéria dura, algo bem desconhecido. efeito, e de fenómenos psicológicos comporta expressões humanas fenómenos coordenados 1874). No entanto, basta e é fundamental lembrar Toda essa literatura, oral e/ou escrita, muito sempre a relação a um corpo, os fenómenos psi- dum só e mesmo processo. A dificuldade sub- a Voelkerpsychologie (Psicologia do Povo) poderá contribuir para mais adequada leitura- cológicos são-nos dados, ligados a um corpo. siste em clarificar as diferenças entre fuhlen (Wundt, 1900) para se nos deparar uma contra- -interpretação, isto é, para mais específica obser- E a alma colectiva (Volksseele) é tão real como (sentir), begehren (desejar) e wollen (querer) partida notável a essa divulgação por e vação científica, do humano e dos humanos, atra- a alma individual. Observação mais pertinente e, consequentemente, a relação de cada uma para uma ideia inadequada da psicologia e, no vés da análise da linguagem e dos seus conteúdos ainda é esta: os fenómenos sociais não são nada dessas actividades com a representação. Pro- caso, redutora dum pensamento e de perspectivas mais do que das suas formas, adentro da comu- que possa acontecer fora das almas individuais blema que se encontra em Novikov (1897) com largas e diversificadas. próprio Wundt o afirma nidade humana e de cada comunidade humana. e a alma colectiva é assim um produto (não a chamada e, particular- mais ou menos por estas palavras: são inúmeras e Já antes, convém frisá-lo, se exprimia um por- um somatório) das almas individuais de que mente, a Social, como? Soma ricas as fontes de informação objectiva que se tuguês lúcido, em contacto com as populações se compõe (não é mistura); estas, por sua vez, ou síntese ou outra coisa? Assunto para outro oferecem à psicologia, a prometerem melhores kiokas que o maravilhavam: são igualmente produto das almas colectivas de espaço (Santos, 1978).</p><p>26 27 5. A terceira possibilidade ou polémica substrato respectivo. No entanto, esta aproximação, longe de Em resumo, podíamos recorrer de novo a posição de Durkheim: que um fenó- radical justificar a concepção que reduz a sociologia a ser apenas Durkheim e às suas preciosas Règles de la meno social é explicado por um fenómeno psí- um colorário da psicologia individual, acentuará, pelo con- thode sociologique (1895-1968): quico, podemos estar certos de que a explicação é Encontramo-nos uma vez mais com o vocá- trário, o realce da independência relativa destes dois mundos (Durkheim, 1897, p. 128). E pratica-se bulo representação. A variedade dos seus conteú- e destas duas ciências (Durkheim, 1898, pp. 273-4). Eis uma ordem de factos que apresentam características tanto esta atitude como a inversa: um fenómeno muito especiais; consistem em modos de agir, de pensar dos pode receber alguma clarificação, se nos ati- Muito mais fácil se torna, deste modo, libertos e de sentir, exteriores ao indivíduo e que se encontram pessoal aparecer explicado por um fenómeno vermos à sua primeira grande aplicação nestes das estereotipias do passado, ainda cultivadas no dotados dum poder de coerção em virtude do qual se lhe sociológico, o que, consequentemente, não deixa domínios, obra ou iniciativa de Durkheim (1898). presente, por anacronismo, evidenciar a especi- impõem; não poderão ser confundidos, por conseguinte, de ser menos errada. E tão frequente! Ao passar à Sugeriria que se trata duma reflexão fundamental com fenómenos orgânicos, pois consistem em represen- ficidade da psicologia social, especificidade já enumeração dos mesmos, Durkheim afirma: para o nosso propósito. A psicologia social não tações e acções; nem com os fenómenos psíquicos, pois real e ainda a tornar muito mais real no futuro. mesmo modo que os povos antigos eram coagidos não existem fora da consciência individual e por meio dela. tem aqui nem caminho nem descaminho. Pelo Se tivermos presente que as representações conti- Esses factos constituem, portanto, uma nova espécie e a pela necessidade de fé comum para viver, nós contrário, encontra aqui uma rampa de lança- nuam a existir, já porque se pode demonstrar essa eles apenas deve ser dada e reservada a qualificação de somo-lo pela necessidade de (1897, mento para muita da sua originalidade. E isto por persistência, já porque agem umas sobre as ou- sociais (1968, p. 17, subl. do autor). E assim se toca directamente num dos gru- várias A primeira, por exemplo, aquela tras, autonomamente em relação ao estado dos Deste modo, é muito mais fácil e significativa pos de conteúdos: as práticas, as realidades e os que ressalta das posições de Durkheim (1898), centros ou seja, a vida representativa, a ênfase dada por Durkheim aos fenómenos valores religiosos que lhes dão consistência, quer dizendo não ao sociologismo biológico, ao biolo- porque não é inerente natureza intrínseca da Em que sentido? sejam organizados quer não, quer se encontrem gismo psicológico e ao psicologismo biossocio- matéria subsistindo por suas próprias institucionalizados quer não. Vejamos outros lógico (Durkheim, 1998, pp. 296-7 e 302). Quanto às suas manifestações particulares, participam de forças ou características, possui, consequente- exemplos de factos sociais, além dos religiosos: Mas ainda se encontra tanta gente a racio- algo de social, pois reproduzem em parte um modelo colec- mente, modos de ser que lhe são próprios. fala de templos e de monumentos, refere-se aos tivo; no entanto, cada uma delas depende também e numa cionar dentro destes esquemas tradicionalistas! Por outro lado, se os factos sociais são, até larga medida da continuação organo-psíquica do indivíduo, livros e aos códigos, evidencia os mitos ao lado E tudo isto, porquê? Por causa do abuso das ana- certa medida, independentes dos indivíduos e das circunstâncias particulares em que se encontra colocado. dos ritos, os formulários ao lado das instituições. logias, por outras palavras, por virtude de conver- exteriores às individuais, o reino Não são, portanto, fenómenos propriamente sociológicos. E avança: assim como a psicologia contempo- ter a analogia em demonstração. Claramente: Dizem respeito, simultaneamente, aos dois reinos; poder- social estrutura-se por si próprio como o reino rânea, alargando a noção tradicional de realidade -se-iam apelidar sociopsíquicos (Durkheim, 1968, pp. 1-17). A sem-razão dos sociólogos biologistas não consiste, psíquico. A sociedade comporta como substrato psíquica, reconhece existência positiva ao incons- portanto, em usarem da analogia, mas de a terem usado o conjunto dos indivíduos associados, como o in- Embora numa linguagem da época, encontra- ciente, do mesmo modo a sociologia deve admi- mal. Quiseram, não controlar as leis da sociologia pelas da divíduo o conjunto de células nervosas. Mas nem -se aqui algo de muito mais adequado e, porque tir um modo de existência própria, ainda que num biologia, mas induzir as primeiras das segundas. Tais infe- rências não possuem qualquer valor; com efeito, se as leis o indivíduo nem a sociedade são constituídos lúcido se compararmos com o que ainda sentido inexpressável, seja na linguagem do me- da vida se encontram na sociedade, é sob formas novas e pelo simples somatório dos seus componentes hoje por aí circula. Num outro escrito, diz com canismo biológico, seja na linguagem da cons- com características específicas que a analogia não permite (Durkheim, 1898, p. 294). uma certa ponta de humor: ciência clara ou da reflexão, às representações sequer conjecturar e que, por outro lado, só podem atingir As representações colectivas são algo de dife- Não vemos o mínimo de inconveniente em que se diga da colectivas, às tendências, às crenças e às regras por observação directa (Durkheim, 1898, p. 273). rente das representações individuais. Cada uma sociologia que é uma psicologia se se toma o cuidado de ajun- sociais. Resumindo: mundo novo que assim Uma segunda reflexão coloca-nos no objectivo delas é outra Um composto químico con- tar que é psicologia social, com as suas leis próprias, muito se abre à ciência ultrapassa todos os outros em que directamente procuro atingir, apoiando-me centra, unifica elementos e, pelo facto mesmo, diferentes da psicologia individual (Durkheim, 1897, p. 352). complexidade e não é apenas uma forma ampliada em Durkheim: transforma-os. É sabido: as propriedades do com- Anteriormente já tinha dito algo de semelhante dos reinos (Durkheim, 1968, 302). Mas é ainda muito mais natural procurar as analogias posto não são as propriedades dos elementos e, e diferente: Esta preocupação de preservar a especificidade dos fenómenos sociais - o vocábulo encontra-se que podem existir entre as leis sociológicas e as leis psico- muito menos pelo facto mesmo, o seu Quando dizemos simplesmente psicologia, entendemos lógicas porque estes dois reinos encontram-se muito mais As representações colectivas não são as individuais, psicologia individual e conviria, para a clareza das discus- neste espaço a qualificar a ciência psicológica imediatamente vizinhos um do outro. A vida colectiva, nem o seu somatório. A sociologia não é a biologia restringir deste modo sentido do vocábulo. A psi- não permitindo, sob nenhum pretexto, que sejam como a vida mental do indivíduo, consiste em representa- ções; consequentemente, é presumível que representações e vice-versa; nem a biologia a psicologia e vice- cologia colectiva é simplesmente a sociologia (Durkheim, reduzidos a algo não social, encontra-se reforçada -versa; nem a psicologia a sociologia e vice-versa. 1898, p. 302). com outra ideia: a obrigatoriedade é prova pro- individuais e representações sociais sejam, até certa medida, comparáveis. Vamos, efectivamente, tentar mostrar que umas Do mesmo modo, a psicologia social nem é psi- Relativamente aos conteúdos da ciência, en- vada de haver factos, resultando de modos de e outras comportam o mesmo tipo de relações com o seu cologia nem é sociologia (Durkheim, 1898, p. 302). quanto objecto científico, apresenta-se clara a pensar e agir, que não são apenas obra do sujeito</p><p>28 29 ou, por outro modo, tudo o que é obrigatório tem constituem os seus próprios factores, que elas existem Les lois de l'imitation, encontramos claramente: mente no fisiológico. E levanta-se a pergunta: e a sua origem fora do indivíduo. independentemente das pessoas humanas, que elas gover- as semelhanças são devidas a a invenção? A invenção, como manifestação ex- A coerção: eis o que se encontra totalmente fora nam despoticamente, projectando sobre as pessoas a sua (Tarde, 1890, p. 15). A repetição é a lei do mundo: clusiva do indivíduo, só se torna social na medida sombra opressiva (Tarde, 1898, p. 142). das perspectivas de Tarde (1890). Muito longe. em que for imitada. E assim se compreende que Haveria, no entanto, uma reserva a realçar Todas as semelhanças que podemos observar no mundo fenómeno social por excelência, cujas leis per- adentro do pensamento de Tarde: para ele, não químico, físico, astronómico (átomos dum mesmo corpo, estas duas manifestações humanas, antitéticas e mitem compreender a maior parte dos fenómenos ondas dum mesmo raio luminoso, camadas concêntricas de essenciais, a invenção e a imitação e, subsequen- colectivos, é a imitação. As leis da psicologia indi- comporta o mínimo significado nem o sociobiolo- atracção das quais cada globo celeste é o foco, etc.) têm por temente, as duas disciplinas, a psicologia e a vidual bastam para dar conta da psicologia social, gismo, ou biossociologismo, nem o sociopsicolo- única explicação e causa possível movimentos periódicos e, sociologia, se misturam e se provocam recipro- a qual constitui, no fundo, toda a sociologia: gismo ou o psicossociologismo. Apenas, que há principalmente, vibratórios (Tarde, 1904, p. 15). camente (Tarde, 1895, pp. IX e 9, e 1998, p. 36). sempre manifestações em grupo e manifestações Existe um feitiço, um deus ex machina de que todos os Qual será o cientista químico ou físico que Daqui se pode avançar: Tarde, com o seu individuais para toda e qualquer personalidade: novos sociólogos usam como um "Sésamo, abre-te", de poderá aceitar esta reflexão, ou o biólogo que magnífico artigo de 1904, lançou uma perspec- cada vez que se encontram embaraçados. É tempo de Como é que, repito, estas realidades sociais se auto-rea- poderá aceitar estoutra: tiva mista mais adequada ao título de iniciador denunciar este abuso que se torna realmente inquietante. lizam? Vejo com facilidade que, uma ou outra vez, o foi por iniciante na psicologia social do que os dois Este talismã explicativo é o meio. Quando esta palavra é coerção, a maior parte das vezes por persuasão, por sugestão, Todas as semelhanças no mundo vivo resultam da trans- homens, Ross e McDougall, comprometidos em largada, tudo fica dito. meio é a fórmula que serve para pelo prazer singular de que gostamos, desde o berço, de nos missão hereditária, da geração quer intra, quer todos os fins e cuja ilusória profundidade serve para enco- impregnar dos exemplos dos nossos modelos circundantes, nica. É através da parentidade das células e das espécies atavismos culturais, negadores na especificidade brir o vazio da ideia (Tarde, 1898, p. 80). como a criança aspira ao leite da mãe. Vejo tudo isso clara- que se explicam hoje as analogias ou as homologias de desta perspectiva científica. mente. Mas como é que estes monumentos prestigiosos de qualquer tipo, inventariadas pela anatomia comparada É exactamente o que afirma Durkheim, inver- que falo foram construídos e por quem, a não ser por homens entre espécies e pela histologia entre os elementos corpo- tendo, no entanto, a ordem: dúvida, todo o e por esforços humanos? Quanto ao monumento rais (Tarde, 1904, p. 15). 6. Abertura ao futuro facto social é imitado, tem, como o acabamos de talvez o mais grandioso de todos os monumentos humanos, demonstrar, uma tendência a generalizar-se, mas não pode haver a menor dúvida (Tarde, 1898, p. 143). E os psicologistas, os educadores, os pedago- porque é social, isto é, obrigatório. poder de gistas ainda hoje aceitam o vocábulo imitação, E voltamos à data celebrada por todos, 1908, Tarde concluiu: expansão de que se encontra dotado constitui não glosando-o em termos de identificação, empre- e à considerável ambiguidade das perspectivas na Durkheim formula e sublinha a regra seguinte, que lhe gando-o como a explicação mais objectiva sob clareza dos títulos: Social Psychology. Ao passo a causa mas a consequência da sua característica parece capital: deve-se procurar a causa determinante do sociológica (...). Além disso, podemos interro- a forma de pedagogia ou de educação pelo que McDougall se contenta com um título pru- facto social entre os factos sociais antecedentes e não entre exemplo. Até na psicologia do desenvolvimento dente Introduction, Ross procura afirmar, An gar-nos se o vocábulo imitação é, ao certo, aquele os estados de consciência individual. Vamos às aplicações: a que convém para designar uma propagação, causa determinante da rede de caminhos de ferro deve (Guillaume, 1968, p. 1926). outline and SourceBook. Segundo Allport (1954, devida a uma influência coercitiva (...). Como ser procurada, não nos estados de consciência de Papin, de Para Tarde, as características da imitação são as p.44), das dúzias de textos publicados nos EUA, Watt, de Stephenson e outros, não na série lógica das con- mesmas que se encontram no hipnotismo. Trata- um pouco mais de metade foi escrito por psicólo- estamos longe da definição que serve de base ao cepções e das descobertas que inspiram estes grandes espíri- engenhoso sistema de Tarde (1895, p. 12). -se de algo automático: estado social como gos e um pouco menos de metade por sociólogos. tos, mas sim na rede das estradas e nos caminhos de mala- E a polémica, para o presente propósito, sobe o estado hipnótico não passam duma forma de Seria de perguntar: que psicologia, que sociolo- posta que existiam anteriormente (Tarde, 1898, p. 80). de tom: Tarde começa pelo largo, com notória sonho, um sonho de ordem e um sonho de gia? Ambas se apresentam de grande pendor Aqui nos encontramos num tema frontal acerca (Tarde, 1898). Socialmente, a imitação manifesta- biofisiológico. McDougall, ao fazer depender o aplicabilidade um século depois. do qual as posições se extremizam com facilidade, Desçamos, no entanto, um pouco. Ao quase -se sob duas formas: através do tempo, duma gera- social da actividade instintiva, e Ross, ao inter- tomam mesmo os antípodas. Se a perspectiva de sensorial: ção para outra, imperiosa e indiscutida, princípio pretar os factores situacionais e sociais, pendem psicologia social, actualizada, estivesse presente, de imobilidade e de conservação. Toda-poderosa para uma leitura corrente, realçando a base orgâ- Quando se considera uma destas grandes coisas sociais, dificilmente aconteceriam estes extremismos. nas sociedades restritas e isoladas, é a tradição. nica. Significativamente, já antes, Galton tinha uma gramática, um código, uma teologia, o espírito indi- Com efeito, nem a personalidade é contra a cul- Através do espaço, entre contemporâneos, mais estabelecido uma distinção clara entre Nature vidual parece tão pouca coisa por comparação com estes tura nem vice-versa, nem a personalidade é nada fugitiva e passageira, diversa e múltipla, princí- and Nurture (1874). E, em 1911, Baldwin volta grandes monumentos que a ideia de ver nele o único pe- especificamente sem a cultura (grupo sociocul- dreiro destas catedrais gigantescas parece ridículo a certos pio de mudança e muitas vezes de progresso, a afirmar algo de interessante em termos ambí- sociólogos (...). Daí para diante é só um passo para pre- tural), nem a cultura é nada sem a personalidade. dominante nas sociedades vastas e móveis, é a guos, para a nossa época - The Individual and tender, como o meu eminente adversário, Durkheim, que, Outra é a orientação da reflexão de Tarde, em moda. E assim se explica tudo em termos de se- Society. Será o prenúncio claro de algo notório muito longe de se tratar duma função dum indivíduo, elas contraposição à de Durkheim. Se olharmos à melhanças, excepto aquelas que radicam directa- e notável com Kardiner: The Individual and His</p><p>30 Society (1939), assim como The Psychological acções, músicas, gentes, jogos, deuses, etc. Algu- CAPÍTULO II Frontiers of Society (1945). mas das instituições são coisas, outras são acções; Seria de referenciar, porque significativa, a algumas possuem uma base física ou estrutural reflexão do próprio McDougall (1922). Uso e e muitas outras são exclusivamente culturais. Abuso de Instinto em Psicologia Social, a pre- Todas, no entanto, a uma resposta indi- A emergência ceder a pergunta, mais interessante ainda, Can vidual em referências grupais. Daí esta reflexão Sociology and Social Psychology Dispense with final: be a science social, psychology must do paradigma americano Instinsts ? (McDougall, 1924). E a pergunta radi- become the study of responses to institutional cal aconteceu um pouco antes: How is a Science stimuli, and the origin and development of such of Social Psychology Possible? (Kantor, 1922). phenomena must be investigated as the operation E aqui encontra-se a observação seguinte, em of mutual interchanges in social responses of Orlindo Gouveia Pereira dupla vertente: primeira, base de todos estes persons to specific (Kantor, 1922, p. 77). preconceitos de inúmeras ramificações consiste Em suma: estes caminhos e descaminhos da na concepção fisiológica da psicologia>>; segunda, psicologia social podem sintetizar-se em três concepção, recordamo-lo, começou a ser momentos: primeiro, uma certa síntese histórica; desenvolvida e elaborada por meados do século segundo, uma certa síntese epistemológica; ter- Nos Estados Unidos da América, na primeira A psicologia, com Galton (1869, 1875), no (Kantor, 1922, p. 62). E conclui: for- ceiro, uma tentativa de construção progressiva metade do século XX, a psicologia social tor- Reino Unido, e com Fechner (1860) e Helmholtz tiori, se as ciências físicas podem ser e são, efec- certa. Convém realçar, finalmente: ao insistir na nou-se uma disciplina científica autónoma. Por (1853, 1878), na Alemanha, torna-se um campo tivamente, disciplinas que investigam e avaliam atenção aos conteúdos vivenciais, propus-me su- isso mesmo, tem uma curta existência e uma de pesquisa em que os efeitos de aspectos da factos como ocorrem na natureza, sinto-me em blinhar que todo o agente age a partir de conteú- longa história Os problemas a que procura dar realidade, traduzidos pelos parâmetros físicos confiança para afirmar que a psicologia social dos vivenciais, manifestados através de formas de resposta são interrogações perenes da humani- (intensidade, frequência, altura, etc.), são pro- pode tomar o seu lugar apropriado no domínio interacção, criados pelo agente ou pelos intera- dade, surgem nos ditos da sabedoria oriental, são curados na inflexão que produzem em aconteci- das ciências (Kantor, 1922, p. 78). gentes. Desse modo, torna-se inevitável insistir precisados nos primórdios da filosofia grega, res- mentos mentais (estar consciente de sentir ou E responde à pergunta titular do seguinte modo: na atenção ao humano como o único capaz de soam na retórica romana, surgem nos escritos dos não sentir variações, por exemplo). Este radical Para fazer da psicologia social uma ciência há agir. E não por qualquer humanismo, até porque padres da Igreja, reformulam-se na Renascença e, reducionismo do estímulo à sensação e aos seus que abjurar vigorosamente duas concepções: se reveste de pouco interesse apelar para o huma- a partir daí, dividem-se e intersectam-se nos mais correlatos neurológicos, não obstante o indis- a) estamos a tratar com causas no sentido de que nismo. Tantos se julgam humanistas!... Mesmo diversos ramos de conhecimento humano e social. cutível sucesso e consequente respeitabilidade, os fenómenos sociais dependem de condições aqueles que reduzem os humanos ao não humano o século XIX é o momento em que, como que se alicerçava também na capacidade de uti- inevitáveis; b) estas causas residem nos consti- ou a parcelas do humano através de afirma Gordon Allport (1954, 1968, 1985) no lizar a estatística e modelos matemáticos, cedo tuintes estruturais e funcionais do indivíduo, a mais ou menos texto clássico que tem sobrevivido a todas as foi denunciado como tal. Outras dimensões, in- saber, todos os complexos fenómenos sociais são, Insistir no humano, enquanto realidade especí- reedições do Handbook of Social Psychology, clusive a social, pareciam indispensáveis à cons- meramente, o desenvolvimento e o cumprimento fica em manifestações específicas, procura dizer as simples e competem para trução de uma psicologia humana. dos impulsos e necessidades inatas do que a observação praticada sobre ele não pode alcançar um princípio unitário de explicação Nos Estados Unidos da América, a psicologia Torna-se indispensável uma boa purga, higiénica, esquecer nem as semelhanças nem as diferenças. comum a psicólogos, sociólogos, antropólogos, adquiriu uma marcada orientação funcionalista destes preconceitos. Pela positiva: todos os fenó- A observação deverá ter em conta a globalidade economistas, politólogos e eticistas. Mas este é (W. James, 1890) e pragmatista (Dewey, 1886, menos, adentro da psicologia social, constituem na sua complexidade, em perspectiva de obser- também o ponto em que os saberes de referência 1922) e cedo se envolveu, em grau muito mais expressões comuns de sujeitos particulares, a par- vação experimental. Futuro da psicologia social: se separam e os métodos de cada um se espe- marcado que no Velho Continente, com a neces- tir da sua elaboração pessoal das mensagens, em prestar serviço aos humanos em comunidade e cializam, com claro pendor para privilegiar o sidade de a aplicar a domínios como a educação, interacção. Na linguagem do autor, há estímulos contribuir, secundariamente, embora importante, cânone da ciência positiva. a indústria, a opinião pública, a medicina, etc. institucionais objectos, acções ou circunstân- para a especificação da psicologia, pela especifici- cias - que chamam a resposta do sujeito enquanto dade da perspectiva sobre o humano, qual seja, 1 Disse-o Ebbinghaus (1908) da psicologia. Aplicou-o, entre outros, R. Farr (1991) à psicologia social, desimpli- membro dum grupo. Por exemplo: edifícios, a sociabilidade por intermédio da culturalidade. cando os preconceitos positivistas latentes na afirmação.</p><p>32 33 Foram estes dois aspectos dominantes da psi- refinamentos metodológicos, estas novas disci- e a sugestão (fenómenos colectivos). Para além consenso intragrupal, dirigem segmentos impor- cologia transatlântica o funcionalismo e a apli- plinas são hoje e mais do que há quarenta anos o dos clássicos, na linha que leva de W. James a tantes e decisivos das relações intergrupais. cação que melhor explicam que a América principal das investigações psicosso- McDougall, encontramos o evolucionismo de Não obstante o pioneirismo de McDougall e reunisse as melhores condições para que, aí, a ciológicas. Falta na lista acima a ética social. Darwin, os estudos de Galton e dos naturalistas Ross, foi o livro de Baldwin, The Individual and psicologia social se autonomizasse. Em boa ver- A. Comte (1830) e o positivismo contribuíram britânicos sobre o comportamento animal e a psi- Society, publicado em 1919, que deu foro à psi- dade, as principais figuras que vieram a desta- para que os psicólogos sociais se sentissem, cologia comparativa. E esta via que irá desembo- cologia social no seio das ciências sociais. (Aliás, car-se no fundo americano e a fornecer os im- durante quase um século, envergonhados por se car no comportamentismo, que se manterá hedo- Baldwin parece ter sido o primeiro americano a pulsos fundamentais para que tal se produzisse debaterem por tais questões, mas certos desen- nista e associacionista (tal como a psicanálise). usar a expressão numa con- foram um inglês, Bartlett (através de um livro volvimentos da própria disciplina (manipulação Mas comportamentismo, atomismo de estímulo ferência em 1897.) sempre republicado, desde 1932, Remembering), experimental de sujeitos), bem como mudanças e resposta, tinha sido precedido pelas demons- Presente nos escritos dos três primeiros auto- um turco emigrado, Sherif, um alemão fugido ao significativas das relações sociais e da própria cul- trações da Escola de Wuertzburg sobre o pensa- res espelha-se uma outra controvérsia, que parte nazismo, Lewin, um austríaco emigrado, Heider, tura, questões próprias da intervenção sobre famí- mento sem imagens e a tendência de Galton, e que opõe explicações sociais em e um polaco, também emigrado, Asch. Todos lias, grupos étnicos, minorias, etc., estão a pressio- Watt (1905) e Ach (1905) demonstraram que toda termos de factores biológicos (hereditariedade e eles contribuíram para que um objecto específico nar a psicologia social para que volte a confrontar a acção finalizada é determinada por um esquema instinto) ou em termos de factores sociais (apren- da psicologia social emergisse das hesitações a interdependência do comportamento moral. dinâmico, que relaciona, ordena e dizagem e desenvolvimento pessoal social e entre, por um lado, tentar explicar o domínio faz entrar em acção os diversos comportamentos culturalmente condicionado), the nature versus socioeconómico-cultural postulando mecanis- necessários para que ela possa ser levada a cabo. nurture controversy. o êxito do comportamen- mos psicológicos e, por outro, ao invés, a fazer 1. Os livros e as correntes Ora o instinto, o hábito, a imitação, a atitude, tismo na América irá fazer pender a balança para do psicológico uma mera decorrência daquele são, antes de mais, modelos de acção, embora o prato da aprendizagem social. Esta mesma pos- domínio. Ao demonstrarem que a interdepen- Como foi referido no capítulo precedente, em postulem processos formativos diversos. As ati- tura irá influenciar a sociologia americana (teoria dência do comportamento podia ser estudada e, 1908, curiosa coincidência ou, como diria Boring tudes irão aparecer como o constructo central da do papel social) e a antropologia cultural (influen- mais do que isso, podia fornecer explicações (1950), o historiador americano da psicologia, psicologia social nascente por congregarem ciada pela psicanálise). Em síntese: práticas, novas e relevantes, aquelas figuras con- emanação do Zeitgeist, um psicólogo de origem num só o conceito, a percepção e a crença sobre papel social modelo de desempenho tribuíram para que um objecto, singular e inde- inglesa, W. McDougall, e um sociólogo, E. Ross, uma realidade social (componente cognitivo), a ligado a uma posição social é igualmente uma pendente, se tornasse o foco da psicologia social. publicam livros intitulados Social Psychology. sua atractividade ou repulsa (componente afec- disposição comportamental adquirida. Na sua A questão do método levou muito mais tempo Nestes dois livros pioneiros, podemos ver o tivo) e a propensão para agir sobre ela de uma origem encontramos três autores: G. H. Mead a estabilizar e resultou, por um lado, do processo reflexo de duas orientações dominantes nos pri- maneira específica e com certo (com- (1912), que, em conjunto com Dewey, foi o úl- negativo de da ciência, operado meiros anos da psicologia social americana, cen- ponente volitivo). timo dos psicólogos-filósofos americanos, com pelos professores universitários, candidatos a trada sobre a possoa e sobre a situação social. A construção de métodos fiáveis para avaliar as Mind Self and Society, publicado em 1934; Mer- doutoramento e directores de revistas, fazendo Contudo, se repararmos que W. James e J. Dewey atitudes permitará uma rápida aplicação ao diag- ton, com Social Theory and Social Structure, pu- exigências formais cada vez mais estritas, e, por usaram como constructo explicativo da acção nóstico e intervenção sobre a realidade social. Esta blicado em 1957, e Goffman, com The Presenta- outro, do processo positivo de autonomização social o hábito e se atentarmos que por esta altura tradição culminará num livro decisivo que sinte- tion of Self in Everyday Life, publicado em 1959. de psicologias sociais aplicadas à gestão (com- se iniciam os estudos sobre as atitudes, podemos tiza os estudos de G. H. Allport e colaboradores, A década de 30 é dominada pelos antropó- portamento organizacional), engenharia (factores verificar que todos os autores tendiam para utilizar The Nature of Prejudice, publicado em 1954, e logos. Em 1935, Ruth Benedict publica Patterns humanos), saúde (psicologia clínica), política o que Campbell (1963) virá a chamar disposições que alguém já disse dever ser of Culture, de matriz estruturalista, e Margareth (opinião pública e intervenção social), jurispru- comportamentais adquiridas como fundamento para qualquer ser humano. Os preconceitos, como Mead, Sex and Temperament in three Primitive dência (comportamento no processo judicial e teórico das explicações funcionalistas. disposições comportamentais adquiridas, que Cultures, muito mais funcionalista. A obra de G. desviacionismo), preservação do ambiente (psi- Compreende-se o peso das teorias simples assentam em forte e repetidamente actualizado Bateson (1971), que com ela foi casado, e se dedi- cologia social ecológica), economia (comporta- soberanas de que G. Allport falava: o hedonismo mento económico), educação (psicopedagogia (prazer e dor), a simpatia (relações de amor), o 2 Em inglês set. Em português não há vocábulo consagrado. é outro modo de os autores social), antropologia (etnopsicologia e cultura), egoísmo (poder), a imitação (empatia, condicio- referirem Einstellung. enquadra-se na moda dos computadores, mas também poderá ser etc. Exigindo novos desenvolvimentos teóricos e namento, estruturação cognitiva, identificação) usado, pois esta é mais uma disposição comportamental adquirida.</p><p>34 35 PSICOLOGIA SOCIAL 1920 Herry Head introduz a noção de 1921 Teste de Rorschach e tipologia de Kretschmer. Testes alfa e beta do exército americano. Detector de mentiras. os FACTOS 1922 L. Levy Bruhl estuda a mentalidade primitiva. 1759 Adam Smith publica Teoria dos Sentimentos Morais, em que discute o papel dos motivos humanos na estru- 1923 Discípulos de Pavlov definem a neurose experimental. tura social. Piaget estuda a linguagem e o pensamento das crianças. 1779 Anton Mesmer, e hipnotismo. F. C. Bartlett defende que o estudo das culturas primitivas esclarece a psicologia social contemporânea. 1789 Jeremy Bentham publica Introdução aos Princípios da Moral e da Lei, em que defende o hedonismo em bases 1924 Floyd Allport publica Psicologia Social. éticas e sociais. 1925 Kornilov funda a psicologia materialista dialéctica. 1793 Philippe Pinel funda a psiquiatria modema. Burt estuda as causas da criminalidade juvenil. 1798 - Robert Malthus publica Ensaio sobre o Princípio da 1926 - B. Malinowski estuda o sexo e repressão nas sociedades primitivas. 1809 - Karl F. Gauss descobre a curva normal dos erros. 1927 Bluma Zeigarnick defende a tese sobre a memória das tarefas incompletas, sob a orientação de Lewin. Jean B. Lamark apresenta a teoria da hereditariedade das características adquiridas. Heidegger publica Ser e Tempo. 1813 Robert Owen cunha os termos e 1929 - Moreno desenvolve a técnica psicodramática. 1838 Isaac Ray publica Um Tratado de sobre alnsanidade, um dos primeiros sobre psi- Szondi funda a análise do destino. cologia social. Fenomenologia de Husserl. 1846 - Soeren Kierkgaard publica as bases do existencialismo. Lasker estuda as atitudes sociais nas crianças. 1834-1850 Weber, Fechner e Helmholtz lançam as bases da psicologia experimental 1930 Teoria da homeostasia de 1852 - Herbert Spencer usa a palavra 1932 Zucherman estuda o comportamento social dos símios. 1855 D. Noble publica Elementos de Psicologia Médica. F. C. Bartlett estuda a memória individual e social. 1859 Conceito de meio intemo de Claude Bemard. 1933 Desenvolvimento da escala de distância social de Bogardus. Teoria da evolução de Charles A Universidade de Yale funda o Instituto de Relações Humanas. Teoria dos instintos sociais de John Stewart C. G. Jung publica o Homem Moderno em Busca da Alma. Teoria da determinação social de consciência de Karl Marx. 1934 Desenvolvimento de diversas escalas de medida. 1869 - Teoria da hereditariedade da inteligência de Francis 1935 Suspensão da publicação de revistas de psicologia social na URSS. 1872 - Darwin publica Expressão das Emoções nos Homens e nos Animais. Desenvolvimento do thematic apperception test (TAT), por C. Morgan e H. Murray. 1876 - Galton introduz o dilema versus Kurt Lewin publica Uma Teoria Dinâmica da Personalidade e, no ano seguinte, Princípios de Psicologia Topológica. 1877 - Galton utiliza a correlação estatística. 1936 Leucotomia de Egas Moniz. Alexander Bain lança as bases da psicologia da educação. Formação da Sociedade para o Estudo Psicológico das Questões Sociais. 1879 - Fundação do primeiro laboratório de psicologia experimental por Wilhelm Wundt. William James fundara um 1938 B. F. Skinner introduz o condicionamento operativo. laboratório de documentação, em Harvard, em 1874. Desenvolvimento da cibernética por N. Wiener. 1883 Nosologia piquiátrica de F. Kraeplin. 1940 H. S. Sullivan propõe a teoria interpossoal da psiquiatria. 1890 James Frazer trata as culturas primitivas em termos de psicologia social; 1941 Visão social da psicanálise de E. Fromm. Gabriel Tarde publica As Leis da Imitação. 1942 - Desenvolvimento da psicoterapia centrada sobre o cliente, de C. Rogers. 1895 Gustave le Bon publica A Multidão, teorizando sobre a sugestão no grupo e a mente grupal. 1943 - J. Sartre desenvolve a psicanálise existencial. 1897 Havelock Ellis publica Estudos sobre Psicologia Sexual. Desenvolvimento da terapia de grupo. Theodor Lipps introduz o termo empatia. 1945 Harvard funda o Departamento de Relações Sociais, o Massachusetts Institute of Technology (Mm e o Centro 1898 E. L. Thorndicke estabelece as leis de efeito e do exercício, fundamentos do comportamentismo moderno. de Investigação de Dinâmica de Grupos, sob a direcção de K. Lewin. Descoberta da droga psicoactiva, mescalina; M. Merleau-Ponti publica A Fenomenologia da Percepção. E. B. Titchener desenvolve a psicologia estrutural, em confronto com o funcionalismo (James, Dewey). 1946 V. Frankl introduz a logoterapia e a noção de intenção paradoxal. 1900 Publicação da Psicologia dos Povos (dez volumes) por Wundt. Primeiros estudos sobre engenharia de factores humanos. Publicação, por Sigmund Freud, da Interpretação dos Sonhos. 1947 G. Allport publica os estudos sobre boatos realizados durante a guerra. Publicação, por A. Binet, de Sugestionabilidade. Publicação do Relatório Kinsey sobre a sexualidade masculina nos Estados Unidos. 1901 Definição dos reflexos condicionais por Ivan P. Pavlov. C. Shanson publica a Teoria Matemática da Comunicação, desenvolvida durante a guerra. 1904-1905 Na Escola de Wuerzburg, Watt e N. Ach estabelecem a noção de Einstellung (tendência determinante), que Um psicólogo é elevado a par do reino C. Bartlett). terá lugar dominante no estabelecimento da noção de atitude em psicologia social. 1950 A teoria do stress, de H. Selye, expande-se no campo psicológico. 1908 William McDougal e Edward Ross publicam livros com Psicologia Social. 1951 K Lewin publica A Teoria do Campo em Ciências Sociais. 1909 Publicação de A Vontade de Poder, de Friedrich 1952 Descoberta da cloropromazina, o primeiro Maria Montessori desenvolve um sistema de educação. Solomon Asch publica Psicologia Social, estudo do comportamento de grupo do ponto de vista da psicologia Fundação da psicologia da configuração por Max Wertheimer. da configuração. 1913 S. Freud publica Totem e Tabu. 1953 Desenvolvimento da psiquiatria social. J. Watson publica o do comportamentismo. Primeiro código deontológico dos psicólogos. Hugo Muensterberg aplica a psicologia à indústria. 1954 Desenvolvimento de teorias comportamentistas sociais. 1916 Primeiro professor de psicologia aplicada nos EUA, Walter D. Scott. 1956 Desenvolvimento das teorias do duplo laço da esquizofrenia, por Gregory Bateson e colaboradores, em Palo Alto. 1919 Primeira empresa americana de psicología industrial. 1960 Expansão dos estudos de engenharia de factores humanos e ergonomia.</p><p>36 37 cou sucessivamente à biologia, antropologia, psi- (colectadas em 1890, nos Principles of Psycho- Se este fundo funcional-pragmático constitui o Bartlett toma como exemplos de referência quiatria, teoria dos jogos e comunicação, pro- logy), mas não deixava de a criticar, opondo-se de ideal para o desenvolvimento as suas observações em África, sobre o povo curando estabelecer uma interdisciplinaridade ao elementismo de Wundt. Por exemplo, quando de uma psicologia social ele Suazi, e procura estabelecer a continuidade ne- sistémica, só muito mais tarde se tornou influente. examina a corrente do pensamento, James afirma também, por representar um optimismo social, im- cessária entre a psicologia cognitiva, na qual Em 1932, F. C. Bartlett pulica em Inglaterra que a consciência é pessoal, isto é, cada pensa- pediu os psicólogos americanos de encararem cer- seu livro é ainda um marco fundamental, e a psi- Remembering, livro de uma originalidade notória mento é de alguém. Além disso, a tos aspectos estruturais e certas tensões e conflitos cologia social. Na sua óptica, três tipos de áreas e que, através de sucessivas reimpressões, viria a consciência está sempre a mudar: esta- inerentes à vida social e à sua dinâmica. Mesmo a de estudo se abrem a esta disciplina: influenciar tanto a psicologia cognitiva quanto a do de consciência pode alguma vez recorrer e ser psicologia social sociológica-racionalista, por ter Todos os os tipos de conduta indirectamente social, em diversas gerações de americanos. idêntico ao que foi Mas a mudança opera- escolhido a mínima unidade possível de análise determinados por factores sociais, detecta- Na década de 40, a psicologia social deu os -se na (mesmo depois de dormir, papel social acabou por estar demasiado en- dos no interior do grupo e não fora dele e em passos decisivos para a sua independência por a possoa reconhece-se a si própria). Finalmente, volvida em si própria e sofreu da mesma cegueira. que o grupo definitivamente conti- força dos emigrados europeus, fundamental- e essencialmente, a consciência é selectiva, isto Isto tornou-se particularmente evidente quando a nuidade física>>. mente Kurt Lewin, que, mais que uma escola ou é, Tal escolha não tem como referente psicologia social foi aplicada ao mundo do traba- Todos os tipos de conduta indirectamente uma ortodoxia, sempre procurou estimular os tanto a liberdade quanto a atenção. Esta é ditada lho. Coube à psicologia social europeia corrigir de determinados pela sociedade, mas em rela- discípulos a que explorassem vias próprias de pela dos estímulos. algum modo esta distorção, embora, por vezes, o ção às quais a referência ao grupo nada mais investigação. Por isso criou muitas amizades e Quem ler original, mais que por este resumo, tenha feito à custa de cedências evidentes à ideo- significa que a crenças, tra- muitos tornando- apreciará o cruzamento do pensamento antigo, logia (estas tornaram-se bem evidentes após 1989, dições, sentimentos e instituições caracterís- -se o homem mais influente neste campo. pré-socrático, com as sugestões de modernidade, com a desideologização da psicologia soviética). ticas de uma organização social particular. livro de S. Asch, Social Psychology, que só muitos anos depois deram fruto. A teoria Situações em que dois grupos sociais dife- publicado em 1952, será o último dos grandes do proprium aparece aqui esboçada, bem como rentes entram em contacto um com o outro e clássicos influenciado por uma corrente, a psi- o conceito fundamental de psicologia cognitiva 3. As figuras nas quais os núcleos de crenças, tradições, cologia da configuração (Gestalt). A sua eru- e, para além dela, a implícita resposta ao porquê costumes e instituições sofrem modificações. dição e originalidade experimental assegurar- da escolha atentiva. 3.1. individual e o colectivo -lhe-ão sucessivas reedições. John Dewey (1986), discípulo e amigo de Mas Bartlett, ainda em Remembering, através Finalmente, com C. Murchisson (1935) e, James, irá, em Chicago, aliar o funcionalismo ao F. C. Bartlett dos métodos utilizados, faz propostas implícitas a partir de 1954 e com novos editores, Lindzey pragmatismo e, por esta via, a psicologia ameri- e explícitas, de largo alcance. e Aronson, em 1968 e 1985, será o Handbook cana, no dealbar do século, irá lidar com a mente No Reino Unido, F. C. Bartlett, em 1932, no Para estudar a recordação, Bartlett apresentava of Social Psychology a referência fundamental em acção e não com um mero sujeito passivo livro que mais o celebrizou, Remembering, cri- a um sujeito um estímulo complexo (um desenho, da área. Começa a era dos livros especializados que responde a estímulos. tica a orientação de McDougall, inglês de nas- uma pequena história, um ensaio) e pedia-lhe que sobre assuntos específicos. Os manuais de psi- Por vezes, são as figuras secundárias que cimento: Não obstante a sua notória originali- o reproduzisse de memória. resultado da repro- cologia social passam a ser, antes de mais, tex- melhor resumem as linhas de força de uma cor- dade e valor, tem tido uma má influência, uma dução ia servir de estímulo ao sujeito seguinte tos didácticos para uso universitário. rente. Assim, Angell (1904), discípulo de James vez que torna a psicologia social um exemplo e assim sucessivamente. Fica implícito que as e Dewey, define os princípios da psicologia de batalha entre psicólogos instintivistas e todos transformações que o material original sofre, de funcionalista. Ela é psicologia das opera- os outros, impedindo deste modo a produção de sujeito para sujeito (reprodução da cadeia social), 2. fundo ções mentais em contraste com a psicologia dos investigações e que são condensação, destacamento e raciona- elementos o que ela visa são uti- Bartlett (1932) considera a psicologia social lização, são homólogas das que sofre na memória A psicologia social constituiu-se nos Estados lidades fundamentais da consciência, isto é, os como sendo estudo sistemático das modifica- individual. Um só sujeito a recordar o mesmo Unidos, como se referiu, a partir de uma psicolo- actos psicológicos que são e ções da experiência e respostas individuais direc- material, em diversos momentos temporais, pro- gia que era fundamentalmente funcionalista. entre ambiente e as necessidades tamente devidas à pertença a um e avança duz semelhantes transformações. Por outro lado, William James, que não era um experimenta- do organismo. Pode mesmo dizer-se que se trata a ideia de que um grupo, como tal, como cada grupo cultural (étnico, de classe, etc.) pro- lista, reconheceu a importância da linha alemã e de uma psicofísica, por abranger a totalidade deve ser considerado como a duz inflexões próprias ao material. Então, os descrevia-a com muito pormenor nas suas aulas orgânica dadeira condição da reacção schemata e as atitudes, através dos quais a memó-</p><p>38 39 ria elabora os estímulos, são, simultânea e homo- estes, ao fim de pouco tempo, viam a luz mover- a que se obtém através de inquéritos (explícita), Kurt Lewin logamente, sociais e individuais. -se (efeito autocinético), e desenvolviam sobre a 1890-1947 e como tal terá influência mais forte e perdurável Explicitamente, Bartlett, que começara os seus situação uma pessoal (pertinente à am- sobre o comportamento. ensaios em 1914, assume uma atitude própria plitude do movimento aparente). Quando expos- McClelland interessou-se primeiro pelo motivo relativamente ao método experimental quando tos a juízos de grupo (por vezes, constituídos por de êxito (achievement) e depois pelos do poder e aplicado a pessoas (e não a objectos físicos). cúmplices do experimentador), os sujeitos con- afiliação, completando, finalmente, o quadro dos fundamental é que os sujeitos sejam todos vergiam para uma de grupo. motivos sociais com o motivo de inibição da acção. examinados nas mesmas condições psicológicas. Sherif introduz assim uma técnica de manipu- estudo do motivo do fornece uma Para se atingir esta finalidade, o que importa não lação dos sujeitos de experimentação e defende linha de explicações que teria a ver com o espí- é garantir que os sujeitos são colocados nas mes- que base psicológica das normas sociais esta- rito empreendedor, a nível individual, e com o mas condições objectivas (como ainda hoje tão belecidas, tal como os estereótipos, as conven- desenvolvimento económico, a nível colectivo. acerbamente se defende). Pelo contrário, não ções, os costumes e os valores, e a formação de Esta última inferência foi documentada com hesitou em variar a apresentação do material quadros de referência comuns, são produto de estudos históricos dos seus discípulos em que se pessoa para pessoa, de momento para momento, contactos entre (Sherif, 1936, p. 91). correlacionaram dados relativos a grandes cen- e adaptar as condições da sua apresentação, se o lugar central que as relações entre indivíduos tros de desenvolvimento económico de diversos me parecesse que, fazendo assim, poderia obter ocupam tanto na explicação da vivência indivi- povos e a motivação avaliada na literatura popu- melhores condições comparáveis do ponto de dual quanto dos fenómenos colectivos, e que lar da geração anterior (e. g., Pereira, 1981). vista subjectivo>> (Bartlett, 1932, p. 30). Bartlett e Sherif tão energicamente defenderam, Com a análise do motivo do poder, os estudos Pela mesma ordem de ideias, Bartlett, tal como tal como depois deles Kurt Lewin e os seus dis- começaram a conhecer uma inflexão clínica (por logia da criança. Contudo, igualmente, desde o os psicólogos da configuração, atribuía um valor cípulos, nunca foi suficientemente apreciado pela exemplo, o alcoolismo) e uma teorização mais início da sua carreira, Lewin dá particular relevo à secundário ao uso da estatística. que importava psicologia social, influenciada pela sociologia e directamente influenciada por Freud. Actual- psicologia aplicada, isto é, a psicologia inserida na era colher variações suficientemente demonstrati- pela antropologia cultural de cariz psicanalítico. mente, o desenvolvimento das investigações vida quotidiana, nos problemas hu- vas de que certo processo mental tinha actuado. centra-se sobre doenças psicossomáticas. manos e na solução das questões sociais. Guerra, Finalmente, anote-se a posição de Bartlett rela- David McClelland aspecto central a realçar na contribuição de trabalho, minorias, grupos são já encarados na tivamente ao valor da investigação das culturas McClelland refere-se ao uso do mesmo corpo Alemanha, muito antes dos desenvolvimentos, primitivas (que ele próprio realizou em África). A psicanálise tomou, nos Estados Unidos, teórico para explicar tanto o comportamento mais conhecidos, que virão a ter na América. Considerava-as mais propícias para o estudo das um caminho algo inesperado. H. Murray (1938, individual quanto o colectivo. A experiência como soldado na Grande Guerra sociais, uma vez que nestes contex- 1948) foi o primeiro psicólogo americano a leva-o a escrever paisagem da (1917, tos são mais simples e mais evidentes. adoptar Freud. Numa tentativa de sistematizar o cit. in Marrow, 1969), no qual define as noções de rico manancial oferecido pelas múltiplas impli- 3.2. Da teoria à prática barreira, espaço vital e direcção de zona, que virão M. Sherif cações oferecidas pela clínica, procura estabe- e da prática à teoria a integrar-se na sua teoria topológica. Em 1920, lecer um quadro das necessidades humanas e publica um artigo sobre o taylorismo, no qual Pouco depois da saída do livro de Bartlett, construir um instrumento para as avaliar, o the- Kurt Lewin defende que as pessoas produzem para viver e não que continuou sempre a ser republicado e a ser matic apperception test (TAT), um teste projec- vivem para produzir. Por isso mesmo, o bem-estar lido pelas sucessivas gerações de estudantes bri- tivo que usa como estímulo figurações ambíguas. Kurt Lewin nasceu em Mogilno, na província do trabalhador e a sua satisfação não resultam só tânicos e americanos, M. Sherif (1935, 1936, seu discípulo McClelland (1961) apreciou prussiana de Posen, em 1890, e faleceu em de diminuição das horas de trabalho e da organi- 1937), de origem turca, demonstrou que os qua- plenamente o facto de esta técnica fornecer um Newton, Massachusetts, nos EUA, em 1947, natu- zação da tarefa, mas, fundamentalmente, da sua dros de referência culturais eram determinantes novo método de avaliar a motivação humana ralizado americano. Doutorou-se na Universidade postura psicológica, do aumento do fundamentais do modo como os indivíduos inter- através da análise de produções fantasiosas de de Berlim, o bastião da Gestaltpsychologie, e foi a do próprio trabalho (Lewin, 1920). pretavam os acontecimentos. sujeitos (escritos, desenhos, etc.) ou dos povos figura cimeira da sua segunda geração. Os seus Por esta mesma altura, Lewin envolve-se com Colocando sujeitos numa sala escura onde (literatura popular). A motivação avaliada atra- interesses primeiros dizem respeito à memória e à a filosofia da ciência. Dois artigos assumem pon- eram expostos a um ponto de luz estacionário, vés da fantasia será implícita, por contraste com percepção (Lewin, 1926) e, por extensão, à psico- tos de vista fortes e anunciam uma revolução epis-</p><p>41 40 tológica. São eles: conceito de génese em os quais um número notório de mulheres, e tinha -se da máxima que regula a vida académica ame- tico e autoritário (uma vez que subjacente à inves- física, biologia e história natural (Lewin 1922) e por hábito reunir-se com eles num café onde dis- ricana, to publish or to perish, publicar ou perecer, tigação psicológica havia uma clara preocupação conflito entre as modalidades de pensamento cutiam muitas vezes problemas científicos. Neste dedicou-se à edição do livro, originalmente em de contrastar sistemas políticos, democráticos e aristotélico e galileico na psicologia contempo- como em qualquer outro café da época, as pessoas alemão, Uma Teoria Dinâmica da Personalidade totalitários). Só mais tarde se reconheceu a neces- rânea>> (Lewin,1931). Para ele, as ciências sociais iam e vinham, sentavam-se e levantavam-se, pe- (Lewin, 1935) e à preparação de uns novos Prin- sidade de avaliar o papel da liderança laissez- e, particularmente, a psicologia devem abando- diam um café, um bolo, ou qualquer outra coisa. cípios de Psicologia Topológica (Lewin, 1936). -faire (laxista). Por outro lado, por influência de nar a comparação entre absolutas e Um discípulo comentou que era extraordinário No ano seguinte, teve de se mudar para a Uni- Lewin, foram Lippitt e White que desempenha- estáticas>>, tais como branco e preto, e adoptar como, ao fim de algumas horas, o criado ainda se versidade de Iowa, onde conseguiu reagrupar al- ram, cada um deles, os vários papéis de liderança mudança galileica>>, que pensa em termos de lembrava de tudo o que todos tinham tomado e guns dos seus antigos alunos e atrair muitos outros. dos grupos de escuteiros. Lewin afastava-se aqui sequências dinâmicas. Consequentemente, branco apresentava a conta sempre certa. Lewin, então, R. Lippitt e L. Festinger realizaram aqui os seus da postura clássica do investigador de física, como e preto não são opostos, mas partes correspon- chamou o criado e, mais uma vez, a conta estava doutoramentos, em 1940 e 1942, respectivamente. observador independente dos fenómenos, come- dentes do mesmo domínio contínuo. Só assim se certa e ele pagou-a. Ao fim de uma hora, chamou Lewin começou por trabalhar na clínica psi- çando a estruturar a sua ideia de observador par- podem perceber variações e estados de transição. de novo o criado e, com uma desculpa qualquer, quiátrica da universidade, em psicologia infantil, ticipante e de investigação-acção (Lewin, 1951). De Galileu, Lewin parece adoptar também, pediu-lhe que especificasse a conta. O criado fi- e no seu primeiro estudo as persona- Nestes estudos os grupos de rapazes eram pelo menos, a noção de representação matemá- cou indigado: já não sei o que é que os senho- lidades em duas culturas, a alemã e a americana. avaliados em termos de produtividade (executa- tica da realidade: através do todo concreto res tomaram. Os senhores já pagaram a Seguidamente, Lippitt publica a tese vam tarefas típicas de escuteiros), de satisfação que compreende o objecto e a situação se podem Em termos psicológicos, esta resposta demons- estudo experimental das atmosferas de grupo de- e de comportamento emergente, tanto em cada definir os sectores que determinam a dinâmica trava que o sistema de tensão que se tinha cons- mocrática e autoritária>>. Em 1939, junta-se-lhes uma das situações como quando mudavam de do (Lewin, 1935, p. 30). Por tituído e aumentado à medida que o criado ia rece- R. White, publicando os três, do com- umas para outras. influência da postura gestáltica fundamental, vai bendo ordens (para que pudesse vir a receber um portamento agressivo em climas sociais experi- Se a liderança democrática é a que induz maior pensar a psicologia em termos de física, adop- pagamento que não o prejudicasse), ao ser des- mentalmente (1939). Esta linha de satisfação e cooperação, não é a que leva a maior tando as noções de campo de forças, de fontes carregado, não tinha deixado traços na memória. pesquisa irá convergir no livro de Lippitt e White, produção. Isto acontece na situação autocrática, de energia, de sistemas de tensão, etc. Só atra- Era isto mesmo que Bluma Zeigarnik (1927), estu- de 1960, Autocracia e Democracia: Uma Inves- mas com muito menor satisfação. Nela os escutei- vés da apreciação do campo psicológico total dante russa, estava a investigar na tese de doutora- tigação Experimental (precedida de: Lewin e ros perdem a iniciativa, tornam-se inquietos, des- (espaço vital), num dado momento e num caso mento, em que concluiu que as tarefas inacabadas Lippitt, 1938; Lewin, Lippitt e White, 1938). confiados e agressivos e criam bodes-expiatórios. concreto, é possível prever o comportamento. (em que o sistema não é descarregado) são muito Estes estudos, em que começaram por usar A situação laxista é a que produz piores resulta- Lewin (1935) intui que topologia é a disci- mais bem recordadas que as tarefas terminadas. grupos de escuteiros como sujeitos e procuraram dos em ambas as avaliações. plina matemática que mais convém ao estudo do Uma série de novas teses se seguiram, transi- avaliar o papel da liderança e das atmosferas de Quando os rapazes são transferidos da situa- comportamento, mas, por falta de conhecimen- tando-se pouco a pouco dos problemas relativos à grupo, marcaram a transição de uma psicologia ção laxista para a autoritária, ficam assustados tos, nunca levará tal intuição para além do uso percepção e memória para o estudo das acções e centrada no indivíduo para uma psicologia cen- e perturbados e distraem-se da finalidade do tra- de esquemas nas aulas. Igualmente, as metáforas valores de substituição, em relação com a questão trada no grupo: vez de se observarem pro- balho em grupo. Lewin escreveu que o que mais físicas são mais expedientes para passar, com a das necessidades e com os efeitos da frustração, priedades dos indivíduos, são as propriedades impressionou nestes estudos foi ver a cara dos facilidade que lhe era inerente, da teoria à prá- isto é, demonstração de que não é possível estu- dos grupos que são uma vez que rapazes no primeiro dia dessa transição. tica e da prática à teoria. dar a cognição isoladamente da para um indivíduo é, em certo grau, Verificou-se também que a mudança da situa- Uma anedota da sua biografia (Marrow, 1969), Ao assistir aos primeiros sinais da expansão do detectada pelo que é socialmente aceite ção autocrática para a democrática, que é ilustra bem como procedia o homem que adoptou nazismo na Alemanha, Kurt Lewin foi dos pri- realidade difere de acordo com o grupo bem-vinda, demora mais tempo a estabilizar que o lema: é mais prático que uma boa teo- meiros cientistas judeus a emigrar para os EUA, a que o indivíduo a inversa. A este propósito, Lewin comenta que Na Universidade de Berlim, Lewin, cujas onde, não obstante a sua fama como psicólogo da É interessante notar que estas investigações não autocracia é imposta ao indivíduo, mas a aulas eram muito vivas e apreciadas, congregava criança, encontrou certa dificuldade em ser contra- partiram de uma hipótese completa e que se foram democracia tem de ser por ele à sua volta um grupo distinto de discípulos, entre tado pela Universidade de Cornell. Apercebendo- desenvolvendo, ao longo do tempo, de acordo Um outro estudo em que a importancia da com as intuições de Lewin. De início apenas dois dinâmica de grupo termo cunhado por Lewin 3 Vide lista completa das teses e resumos em Marrow (1969). tipos de liderança foram considerados, democrá- se manifestou teve a ver com a incumbência do</p><p>42 43 Governo americano, a ele e outros cientistas, o mesmo princípio dominou a intervenção terística essencial do grupo como tal. Sem Comunicação e difusão da influência social para que o ajudassem a modificar hábitos ali- social. Por solicitação das autoridades ou de gru- ela, não seria lícito falar-se de grupo. (Festinger, Schachter e Deutsch). mentares, sanitária e economicamente nefastos, pos de cidadãos, Lewin participou, na cidade de Um dos factores que mais contribuíram para Percepção social, que levou aos estudos de da população americana na altura da guerra Nova em estudos sobre o comportamento a coesão é a verificação individual de que, atribuição causal (mais influenciados por (relutância em dar sumo de limão, laranja e óleo dos ianques, a integração dos caixeiros negros no grupo, se têm mais probabilidades de F. Heider). de fígado de bacalhau aos bebés; não consumir nas lojas, a lealdade de grupo, o problema da in- atingir as próprias finalidades. Por isso, os Relações intergrupais, que acabaram por vísceras de animais, como o fígado, o rim, a tegração dos diversos grupos étnicos, judeus e grupos formam-se espontaneamente sempre ser mais desenvolvidas na Europa (ver sub- dobrada e certas carnes, como a de coelho, etc.). negros, em novos bairros de carácter social e em que há dificuldades em resolver tarefas capítulo seguinte). Uma vez que os métodos tradicionais, como a procedimentos para uma comunidade se estudar colectivas e não há barreiras à sua formação. Participação no grupo e ajustamento indi- propaganda patriótica, nada tinham conseguido a si própria. Neste último aspecto, Lewin (1948) Com o tempo e com as no grupo, vidual, que justificou a psicossociologia e que a abordagem individual não produzia re- defendeu com fervor que o psicólogo (bem como desenvolvem-se finalidades e padrões de organizacional. sultados, Lewin começou a fazer experimenta- o cientista social) deve actuar, relativamente à acção comuns. Então, os membros são leva- Treino de líderes, que começou com os gru- ções com grupos, concluindo que nestes pode comunidade, apenas como consultor. Para ele, dos a reformular as suas próprias finalidades pos T e se estendeu em diversas direcções, residir a força necessária para modificar atitudes não é ao psicólogo que compete estabelecer pessoais. A partir de então, pertencer a um mesmo fora da psicologia social, na situa- individuais, mesmo as mais arreigadas e tradi- diagnóstico e prescrever a cura. Se o grupo de grupo significa aderir aos seus padrões, isto ção clínica ou nas organizações. cionais (Lewin, 1948). cidadãos interessados não trabalhar empenhada- é, ao código do grupo. Pela mesma razão um A partir desta base, os discípulos de Lewin, mente para a descoberta das causas, das curas grupo pode servir de referência. Bavelas e French, começaram a intervir com e dos remédios dos diversos problemas sociais, 3.3. A interdependência Qualquer grupo de trabalho para a resolu- sucesso em organizações produtivas, relançando nunca o psicólogo poderá ter êxito na sua missão. ção de problemas oscila sempre entre duas do comportamento em bases sólidas a psicologia das organizações. Não obstante Lewin ter sido, como se tentou modalidades de acção, incompatíveis no nas relações intergrupais Em 1945, Lewin funda no Instituto de dar a entender, mais uma personalidade incenti- mesmo momento: um grupo ou trabalha F. Heider e S. Asch Tecnologia de Massachusetts (MIT), o Centro de vadora de novos desenvolvimentos que um teó- para a coesão ou trabalha para a resolu- Investigação de Dinâmica de Grupo, onde reúne rico de referência, a sua contribuição, mormente ção do problema. Fritz Heider, natural de Viena, nascido em a nata dos psicólogos americanos, e no ano da sua no que respeita à dinâmica de grupo, pode ser Os grupos bem organizados e produtivos 1896 e doutorado pela Universidade de Graz, após morte, 1947, publica fronteiras da dinâmica resumida assim: têm membros muito diversos. Não é a simi- ter estado com K. Lewin em Berlim, foi, em 1930, de grupo>>, em que sintetiza a sua contribuição. laridade entre pessoas que mantém um grupo, trabalhar com Koffka no Smith College, tendo Os seus discípulos Lippitt, Bradsorth e Bené Sempre que um homem se junta a um grupo mas sim a interdependência. Em termos de passado, em 1947, para a Universidade de Kansas. tinham-se lançado, entretanto, noutra direcção, é, significativamente, mudado e induz mu- grupo, o todo não é apenas mais que a soma Heider denvolveu uma teoria configuracional com implicação na área clínica e organizacional, danças nos outros membros. Quanto mais das partes, é qualitativamente diferente. das relações interpessoais, que elabora em A Psi- os grupos de encontro ou grupos T. atractivo for um grupo, mais pressão exerce cologia das Relações Interpessoais (1958). Para Mantendo-se fiel às suas preocupações epis- sobre os seus membros; um grupo fraco não Em resumo, a psicologia de grupo demonstra ele, uma relação entre duas pessoas é uma confi- temológicas, Lewin cria, também, o Grupo da exerce este poder. que uma psicologia que procure elucidar os proble- guração (Gestalt), uma vez que qualquer pessoa Topologia, que reunia anualmente e no qual Para se conseguir uma mudança num grupo mas através do estudo da personalidade é incom- <<reage ao que ela pensa que a outra pessoa está foram feitas importantes comunicações não só é indispensável alterar o seu equilíbrio. pleta, visto que é claro e facilmente demonstrável a perceber, sentir ou pensar, para além do que na linha lewiniana mas, também, nos domínios Tentar isto apelando individualmente para que o comportamento de grupo é tanto função ela está a (Heider, 1958, p. 107). Por isso psicanalítico, antropológico, fenomenológico e cada um dos seus membros é muito pouco das pessoas individuais quanto da situação social. uma pessoa desenvolve relativamente sociológico. Aliás, ele próprio nunca pretendeu eficiente. comportamento de um grupo A partir desta base, Lewin definiu seis áreas às outras que são reguladas por um prin- ter seguidores nem criar uma ortodoxia, insis- como um todo pode ser mais facilmente de estudo na psicologia de grupo, que acabaram cípio de equilíbrio (Heider, 1958, p. 167). tindo que a sua preocupação era desenvolver alterado que o dos seus membros isolados. por ser desenvolvidas pelos seus continuadores: Gostar ou não gostar de uma pessoa (ou de um linhas de acção e instrumentos de investigação desejo de se manterem juntos, ou coesão objecto) constitui uma relação unitária de per- que pudessem ser comuns a diversas escolas e de grupo (resultante das forças de atracção Produtividade de grupo (Lippitt, French e tença, uma configuração, que tem de se manter nunca competir com qualquer delas. e repulsão entre os membros), é a carac- Festinger). em equilíbrio cognitivo, isto é, modificações na</p><p>44 45 percepção induzem mudanças em todo o sistema Uma das últimas personalidades directamente menos exuberantemente, a sua preocupação, este cologia social. Entre todas domina, sem margem de pensamento, sentimento e acção, de modo a influenciadas pela Gestalt psychologie foi Asch. via-se perante o dilema de dizer o que realmente de dúvida, o cognitivismo social. que ele seja de novo equilibrado. ideia central Nascido em Varsóvia, em 1907, doutorou-se na via, ou dizer o que os outros tinham dito e o expe- Cuidado, contudo! A adição do social é muito é que algumas destas configurações são prefe- Universidade de Colúmbia, em 1932, e influen- rimentador havia confirmado. mais que adjectivação. As próprias correntes de ridas e que, permitindo-o as circunstâncias, elas ciou mais de uma geração com o livro Psicolo- Um extenso grupo de experimentações, com base são alteradas nos fundamentos. Esta psi- serão realizadas pela pessoa quer em fantasia gia Social (1952), no qual evidencia, em para- inúmeros sujeitos e incontáveis variações, de- canálise não é a de Freud, pois, agora, homem já (wishful thinking) quer como mudanças reais lelo, uma profunda cultura humanística e o gosto monstrou que, globalmente, 67 por cento das não é produto da natureza mas da sociedade (e daí através da (Heider, 1958). pela experimentação. pessoas optam pela solução conformista de ne- a abertura à antropologia cultural) e esta não é já Esta psicologia social veio a ser Os princípios da Gestalt, formulados por Von gar a própria evidência sensorial e de dizer o que necessariamente repressiva (daí o deslize para os desenvolvida formalmente por Cartwright e Ehrenfels (1890) e M. Wertheimer os outros disseram! freudo-marxismos). Por seu lado, o comporta- Harary) (1956), na Universidade de Michigan, na foram transpostos para o estudo experimental de mento social tem de se haver com teoria dos grafos. E, por esta via, por Abelson e pressão em grupo. comportamentais em cuja constitui- M. Rosenberg (1958), na Universidade de Yale, percebermos uma pessoa devemos en- 4. tempo e os modos ção como conceito entram pressupostos cogni- na teoria do equilíbrio da mudança de atitudes, e cará-la no contexto da sua situação e do problema tivos. Mesmo o sociocognitivismo não é uma psi- ainda por Newcomb (1961), na Universidade de que e devemos exercer cautela no modo Nas décadas que mediaram desde os aconteci- cologia em que os estímulos são sociais; é, antes, Winsconsin, na teoria dos actos comunicativos. como observamos, uma vez que, o fenó- mentos assinalados até ao presente, a psicologia um mentalismo social que defende que é o que se Heider influencia também a teoria da dissonância meno observado tem ordem e estrutura, é peri- social manteve-se, nos Estados Unidos, funda- sabe da sociedade que guia a nossa actuação nela! cognitiva de Festinger (1957) e constitui a base goso concentrarmo-nos nas pessoas e perdermos mentalmente como uma subdisciplina da psicolo- Pelas mesmas razões apontadas necessi- das teorias da atribuição causal (Heider, de vista as suas (Asch, 1952, p. gia. A influência inicial da sociologia, da antro- dade de uma referência de base as ciências Para além destas influências, directas e indi- Asch levou estes princípios, bem como a lei pologia e da psicologia clínica, que constituíram sociais contribuíram para o desenvolvimento de rectas, Heider, cuja simpatia, bonomia e espírito da praegnanz, à própria estruturação das situa- os outros três pilares do programa da Universidade duas outras correntes em psicologia social, o de finura ainda hoje são lendários na América, ções experimentais sociais, como aconteceu nos de Harvard, ao criar o Departamento de Relações interaccionismo simbólico e a teoria do papel ajudou a descentrar o foco da psicologia social estudos sobre o conformismo, constituindo um Sociais, em 1946, foi diminuindo ao longo do social. Em ambas se parte da premissa de que das pessoas para as relações interpessoais. paradigma que ainda hoje é utilizado e discutido. tempo. Os próprios considerandos epistemológi- a estrutura social é imprescindível ao desenvol- Nas experimentações originais, Asch (1951, que apontaram para uma disciplina autónoma F. Helder vimento da pessoa social e à manifestação do 1896-1988 1956) convocava sujeitos para uma experimen- centrada nas relações interpessoais também não comportamento social. tação sobre discriminação perceptiva. Sem que conseguiram desviar a corrente dominante. êxito As bases desta última premissa podemos ir disso se apercebesse, cada sujeito experimental dos sucessivos desenvolvimentos de aplicação a buscá-las à emergência da sociologia, em França, era sentado num lugar, previamente escolhido, no campos cada vez mais alargados (problemas so- com A. Comte e Durkheim facto social é contexto de um grupo constituído por confedera- ciais, organizações complexas, saúde e medicina, externo e ou, dos do experimentador. Depois, era pedido a cada direito, etc.) mais acentuaram aquela tendência. nos Estados Unidos, a Cooley e, depois, a Mead. um dos sujeitos, por ordem do seu lugar na sala, O estreitamento do campo originado pela Contudo, mesmo considerando os desenvolvi- que dissesse qual de duas rectas, muito próximas especialização clama sempre por um alarga- mentos actuais, ambos os casos continuam a ser em comprimento, era maior. experimentador, mento das referências de base. Uma vez que os mais metáforas teatrais que teorias formais, o após cada uma das respostas, dizia se estavam paradigmas emergentes na psicologia social se que as torna pouco atractivas para a certas ou erradas. De início tudo corria normal- caracterizaram quase sempre por um alcance americana. mente, mas, a certa altura, os sujeitos, sentados limitado, só a psicologia geral foi capaz de Pode encarar-se, alternativamente, o desen- antes do verdadeiro sujeito experimental, davam oferecer arquitecturas de fundo suficientemente volvimento da psicologia social americana respostas erradas (que a recta menor era maior) e estruturadas, como a psicanálise, o condutismo como a aplicação de um método com fraca que o experimentador considerava como certas. ou o cognitivismo. Se lhes acrescentarmos o referência à teoria. Tal método tem sido, pre- Chegada a vez do sujeito cujo comportamento, adjectivo social, encontraremos as designações dominantemente, quantificante e tem benefi- nos momentos anteriores, demonstrava, mais ou das linhas mestras dos corpos teóricos da psi- ciado dos progressos da estatística multivariada.</p><p>46 De um lado, há que ser capaz de operacionalizar em algo mais complexo que o comportamento inventados foram parte integrante da sua busca. pioneiros foram fortemente contestados tudo o que, genericamente, se refere por observável, isto é, sempre visaram mais dispo- A capacidade inventiva, a começar em Lewin pel de Lewin neste domínio foi tambén mulos sociais>>. Do outro, buscam-se procedi- sições comportamentais persistentes (atitudes, e em Festinger, permitiria estabelecer métodos se viu, decisivo. mentos para dar conta das crenças, motivos, valores, etc.) que aquilo que específicos e é o seu êxito na situação de labo- Quem comparar as duas edições do Contudo, o estado da arte nunca pareceu tão simplesmente os sujeitos fazem e dizem. Por ratório que ainda hoje explica a dominância do Roger Brown (1965 e 1985), separadas simples como aqui se esquematizou. Os psicólo- outro lado, e também desde sempre, os estímu- cognitivismo social. anos, não terá dificuldade em se aperceb gos sociais estiveram desde sempre interessados los sociais virtuais, antecipados, imaginados ou Pode, ainda, encarar-se o desenvolvimento da vertente (caixa 2). O mesmo se diga das psicologia social americana como uma resposta do Handbook of Social Psychology. N específica e articulada para resolver problemas gem dos cinco volumes anteriores aos SUMÁRIO DO DE PSICOLOGIA DE ROGER BROWN, sociais. Esta vertente, mais ligada à relevância da presente edição (Lindzey e Aronson, NAS EDIÇÕES DE 1965 E DE 1985 disciplina que à sua generalidade, e mais ligada primeiro retém as teorias e os ao método que à teoria, foi acentuada por suces- dezassete capítulos do segundo tratam (Roger Brown, 1965) sivas crises, por diversos movimentos sociais, pos específicos e aplicações. Uma base de comparação Personalidade e sociedade entre os quais o feminista e o estudantil no final Para onde vai a psicologia social am o comportamento social dos animais o motivo do exito dos anos 60, pela necessidade de captar fundos Nada faz prever, nos próximos anos, un Dimensões básicas das relações interpessoais A personalidade autoritária e a organização das ati- para a investigação e ainda pela preocupação xão estratégica. Contudo, assinale-se a Estratificação tudes crescente com questões éticas. (Os procedimen- siva comunicação com a psicologia Papéis e estereótipos tos manipulatórios dos sujeitos praticados pelos peia, da qual se trata no capítulo seguin A socialização da criança o desenvolvimento da inteligência Processos psicológicos sociais o sistema de aquisição: o princípio da consistência na mudança de atitudes I Fonologia e gramática Impressões da personalidade, inclusive da própria II Linguagem, pensamento e sociedade dinâmica de grupo Aquisição da Comportamento colectivo e a psicologia da multidão Roger Brown, 1985 Forças sociais na obediencia e rebelião Algumas questões da libertação sexual A personalidade andrigina Trocas, equidade e altruísmo Fontes de orientação erótica Trocas e equidade Impressões da Altruísmo e afecto Linguagem e comunicação Teoria da atribuição As origens da linguagem o leigo como cientista Linguagem e pensamento * Viés na atribuição Comunicação não verbal e registos de discursos Algumas questões psicológicas Identificação por testemunha - Conflito étnico Número de pessoas no e a regra de decisão Etnocentrismo e hostilidade Resolução do conflito Saúde e comportamento social. * Questões com alguma continuidade.</p><p>CAPÍTULO III A psicologia social europeia Jorge Correia Jesuíno Os capítulos precedentes permitem ilustrar a mos aduzir várias razões para manter a designa- muito citada observação de Ebbinghaus (1908) ção de PSE. sobre a psicologia e que, por mais forte razão, se Em primeiro lugar, ela é corrente na literatura poderia aplicar à psicologia social: um longo da especialidade, sobretudo europeia. Não se passado e uma breve história. trata duma categoria inventada por nós, mas Neste capítulo centramo-nos nos desenvolvi- a expressão duma prática que a tradição já con- mentos mais recentes da psicologia social, pro- sagrou. Em seguida, a PSE corresponde a um curando situar aí a corrente da psicologia social movimento que se institucionalizou, ou seja, se europeia, que constitui o quadro de referência preferirmos a terminologia de Moscovici, é uma básico embora não exclusivo, das contribuições representação social já objectivada. Essa objec- para este manual. tivação teve lugar através da criação duma asso- ciação - a Associação Europeia de Psicologia 1. Uma psicologia social europeia? Social A Associação edita uma revista, o European Journal of Social Psycho- conceito de psicologia social europeia logy (EJSP), promove a publicação duma série (PSE) é, de certo modo, controverso e houve de monografias, organiza reuniões periódicas mesmo alguma hesitação em adoptá-lo. Faz, frequentes reuniões plenárias, reuniões Leste- com efeito, pouco sentido admitir que uma dis- -Oeste, seminários especializados e ainda cursos ciplina científica possa estar submetida a cri- de Verão, dirigidos a estudantes que preparam térios de geografia. Mas se isso é válido para teses de doutoramento. as ciências fortemente paradigmáticas, como a Esta actividade institucional tem contribuído física, sensu lato, o mesmo não acontece no de forma significativa para a formação dum domínio das ciências sociais, onde as questões espírito de grupo e para a definição duma iden- epistemológicas estão mais sujeitas às influên- tidade social. Também aqui se aplicam concei- cias culturais e sociais. tos desenvolvidos no âmbito da PSE, designada- No caso que aqui nos ocupa, e sem entrar mente por Tajfel e associados. De acordo com em complexas questões epistemológicas, pode- esta perspectiva, os grupos não estão isolados,</p><p>50 51 não existem no vácuo, pelo que a sua identidade as práticas dos seus colegas europeus na repre- logos norte-americanos adopta a perspectiva é, em grande parte, formada mediante meca- sentação restritiva, mas com valor universal, do de que a ciência é universal e não ideológica, QUADRO I nismos de diferenciação relativamente a outros que deva entender-se por psicologia social. pelo que não teria sentido recorrer a critérios Popularidade dos temas grupos. No caso vertente, os psicólogos euro- regionais em questões de natureza substantiva. no JESP e EJSP entre 1970 e 1980 peus teriam adquirido a sua identidade reivindi- 2. Orientações da psicologia social Em contrapartida, os seus colegas europeus re- (Jaspars, 1986) cando uma especialidade que os diferencia da na Europa e nos EUA velam-se mais sensíveis à influência do factor psicologia social praticada pelos seus colegas ideológico, determinando os temas, as teorias JESP 2 EJSP JESP EJSP JESP 2EJSP A PSE fornece um quadro Scherer (1990), numa comunicação recente, e métodos adoptados na investigação em Teoria da atribuição Desvio para o risco Influência social de referência teórico que permite explicar e le- apresentada numa conferência sobre o tema ciências E aquilo que aos olhos dos Ajuda (helping) (risky-shift) Processos gitimar o seu próprio movimento enquanto tal. Ciências Sociais na Europa que se psicólogos americanos parece constituir ciência Atracção interpessoal Agressão intergrupo E essa é também outra razão, porventura a mais realizou em Berlim, em Abril de 1990, reporta universal revela-se, como procuram mostrar os Teoria da equidade Mudança de Autoconsciência atitude forte, para utilizar conceito da PSE. Uma con- que enviou um questionário a cerca de oitenta seus colegas europeus, tributário de pressupos- (Self firmação indirecta da identidade social da PSE psicólogos dos Estados Unidos e da Europa, tos implícitos decorrentes do sistema de valores Comparação de teorias Correlação atitude- é dada pelo facto de serem sobretudo os seleccionados a partir das listas de endereços e representações que determinam as suas práti- -comportamento logos europeus a recorrerem ao conceito. Nos da Society for Experimental Social Psychology cas disciplinares. textos norte-americanos, a expressão não apa- (SESP) e da European Association of Experi- De acordo com esta perspectiva, a PSE não rece por via de regra, nem tão-pouco se reco- mental Social Psychology (EAESP) e onde lhes se limita assim a um papel de diversificação ou ciada ao nome de Moscovici, e os processos nhece na prática dos psicólogos europeus qual- pedia que identificassem os desenvolvimentos de especialização subdisciplinar. Ela vai mais intergrupo, associados ao nome de São, quer semelhança de estilo ou de preferência mais importantes bem como algumas das princi- longe, já que, dessa forma, reivindica um maior aliás, os dois pólos da PSE. No que se refere à temática. A psicologia social americana (PSA), pais insuficiências identificáveis na psicologia alcance e um maior rigor epistemológico para influência social, há que observar que se trata enquanto grupo dominante e homogéneo, tende social nos últimos vinte anos, ou seja, a partir da o produto que oferece. Sob esse aspecto, a PSE dum tema que fora anteriormente desenvolvido a classificar, a ancorar como diria Moscovici, década de 70. questionário incluía igualmente é não apenas uma psicologia diferente mas tam- no âmbito da PSA por psicólogos de origem e uma questão sobre as diferenças entre a PSA e a bém uma psicologia social alternativa. formação europeia. É tradicional incluir nos pro- Henry Tajfel PSE, em que medida reconheciam os inquiridos Com vista a especificar um pouco mais este cessos de influência social o fenómeno da con- 1920-1982 um papel especial para a PSE, tanto no passado aspecto vamos analisar quais os temas predomi- formidade, estudado por Asch, e o fenómeno como no presente e no futuro. As respostas obti- nantes na PSA e PSE nos últimos vinte anos. da convergência, estudado por Sherif. Moscovici das por Scherer são elucidativas: cerca de metade Recorremos para o efeito à comparação estatís- veio enriquecer este domínio introduzindo um dos respondentes norte-americanos não reconhe- tica feita por Jaspars (1986) com base na análise terceiro processo o processo de inovação. ciam a existência ou a necessidade dum papel de duas publicações o European Journal of que há de revolucionário na perspectiva de Moscovici foi ter relativizado os conceitos de especial para a PSE, enquanto praticamente todos Social Psychology (EJSP) e Journal of Expe- os representantes europeus concordavam forte- rimental Social Psychology (JESP), escolhidos maioria e de minoria em função do contexto mente tanto com a sua existência como pela sua por virtude das suas semelhanças no que se re- social em que se inserem. Sendo assim, as expe- necessidade. Quanto à natureza das práticas, veri- fere a ritmo de publicação e ênfase no método riências conduzidas por Asch prestavam-se a ficou-se acordo em que a PSE adoptava uma experimental. Jaspars agrupou os temas que apa- uma reinterpretação: o juízo do sujeito ingénuo orientação menos individualista, mais filosófica reciam, com uma frequência dupla ou superior, isolado, enquanto representante do senso comum, e mais consciente da história, e que se revelava numa e outra publicação e aqueles com frequên- é o juízo da maioria, enquanto o juízo do grupo particularmente forte no domínio das relações cia sensivelmente idêntica em ambas. o quadro I de comparsas, que emite um parecer obviamente intergrupo. Na melhor das hipóteses, o seu papel dá os resultados obtidos (Jaspars, 1986, p. 11). discordante de senso comum, passa a constituir, limitar-se-ia a dar diversidade cultural e linguís- Esta comparação, não obstante as limitações por isso mesmo, o juízo da minoria. É esta con- tica e a moderar alguns dos excessos da PSA. de possível falta de representatividade, fornece textualização do laboratório que permite uma As diferenças apuradas por Scherer sugerem algumas oportunidades de comentário. Os tópi- reinterpretação do fenómeno da conformidade e, de forma muito clara que a maioria dos psicó- cos fortes da PSE são a influência social, asso- ao mesmo tempo, uma reorientação dos estudos</p><p>52 53 Serge Moscovici curso ao método experimental funcionou aqui paração ser estabelecida em termos de psico- como processo de legitimação, permitindo a assi- QUADRO logia social experimental. Jaspars (1986), no milação das contribuições de Tajfel e seus associa- Popularidade dos temas depoimento pessoal que nos deixou sobre este dos pela psicologia social da corrente dominante. no JESP e EJSP entre 1981 e 1989 tema, também acabará por concluir que as duas Note-se que a PSE tem uma história ainda psicologias sociais são mais interdependentes (Scherer, 1990) mais curta que a PSA, muito embora se invoque do que antagónicas, limitando-se o papel social por vezes que esta beneficiou da contribuição dos JESP 2 EJSP JESP EJSP JESP EJSP da PSE a contribuir para criar uma maior diver- psicólogos europeus que emigraram para os EUA sidade temática e analítica. na altura da Segunda Guerra Mundial, enquanto Mudança de atitude Cognição social Processos Atracção interpessoal Teoria da atribui- intergrupo Tais conclusões novamente em causa a PSE, precisamente por isso, se interrompia, só ção Comunicação a inovação duma PSE enquanto orientação epis- voltando a readquirir expressão a partir dos anos Correlação atitude- Influência social Agressão temológica específica e concorrente com a psi- -comportamento Percepção de grupo 60, ou seja, na altura em que começam a ganhar Emoção cologia social normal, praticada não apenas forma os mecanismos de institucionalização que motivação pelos psicólogos sociais americanos mas por referimos todos aqueles que adoptam exclusiva ou pre- Curiosamente, deve-se sobretudo à iniciativa de dominantemente o método experimental. psicólogos sociais americanos, e designadamente Vários aspectos poderão ser aqui salientados. Esta dificuldade tem as suas raízes numa de John Lanzetta, a constituição da Associação Em primeiro lugar o abandono de temas como ambiguidade que percorre a PSE desde o seu Foto: Luís Carvalho/Expresso Europeia (Tajfel, 1972; Jaspars, 1980; Doise, o risky-shift, a equidade e o comportamento de início e que consiste justamente na tendência de 1982; Nuttin, 1990), pelo que por vezes se observa, ajuda, ilustrando o fenómeno da moda, sempre conciliar o método experimental com uma de influência social centrados, a partir de então, ironicamente, que também aqui o veio a mor- muito referido como um dos calcanhares de psicologia social mais social. Tal conciliação, a nos processos de mudança veiculados pelas mi- der a mão do dono. Esta emergência tardia da PSE Aquiles da psicologia social. Não é de excluir avaliar pela evolução que se verifica em norias activas. Há todavia que notar que esta con- ajuda, por outro lado, a explicar que, não obstante que os temas da comunicação e agressão, predo- psicologia social, parece todavia cada vez mais tribuição de Moscovici viria a ser amplamente as zonas de distintividade relativa, haja igualmente minantes neste período na PSE, reflictam igual- problemática. reconhecida pela PSA. Ela inscreve-se no para- uma série de temas que mobilizam atenção idên- mente tendências apenas conjunturais. Note-se, com efeito, que a própria Associa- digma da ciência normal sobretudo pela meto- tica aos psicólogos sociais de ambos os lados do Em seguida, e talvez seja este o aspecto mais ção Europeia adoptou o qualificativo de expe- dologia experimental sofisticada que adoptou. Atlântico. E mesmo quanto aos temas predomi- relevante, os dados parecem sugerir uma certa rimental, a exemplo do que se verifica com a A única voz europeia na terceira edição do consa- nantemente desenvolvidos sobretudo no âmbito da aproximação, se não mesmo convergência, entre a sua congénere norte-americana. O mesmo não grado Handbook of Social Psychology, editado PSA, como designadamente a teoria da atribuição, PSA e a PSE. Muito embora os processos inter- se verifica na publicação European Journal of por Lindzey e Aronson (1985), é justamente a a atracção interpessoal e outros, também na PSE grupo continuem a construir um tema forte na Social Psychology, mas é bem conhecido que de Moscovici e precisamente no capítulo sobre se encontram numerosos estudos utilizando para- PSE, tal como a atracção interpessoal e a autocons- a política editorial privilegia o método experi- social e Quanto aos digmas e métodos idênticos aos dos seus colegas ciência parecem interessar sobretudo os psicólo- mental. É tentador fazer aqui um processo de processos intergrupo, tema desenvolvido sobre- norte-americanos. Um traço que todavia marca gos americanos, o que entretanto se verifica é uma intenção: os psicólogos sociais europeus preten- tudo a partir dos trabalhos de Tajfel, também os toda ou pelo menos grande parte da PSE, mesmo área alargada de convergência e sobretudo uma deriam, por um lado, beneficiar das vantagens podemos inserir numa linha de investigação ini- quando aborda temas como a atribuição causal, é a atenção igualmente partilhada para com os pro- que o método experimental oferece, e desde cialmente centrada nos processos interindividuais preocupação em inserir a explicação num contexto cessos cognitivos, evidenciando a aceitação gene- logo, duma maior aceitação pela comunidade o chamado movimento do New Look, prota- social mais alargado, centrada nos grupos e na ralizada da revolução cognitiva (Markus e Zajonc, científica, mas procurariam evitar, por outro gonizado por Bruner, e que progressivamente se sociedade (Doise, 1982). Numa palavra, uma psi- 1985). Idêntica convergência se verifica no tema lado, os inconvenientes duma inevitável perda desloca para níveis de análise mais societais. cologia social mais social (Tajfel, 1984). da influência social, aí porventura com a contri- em termos de pertinência e relevância do seu A teoria da identidade social, a que já fizemos O quadro comparativo de Jaspars foi recente- buição dos psicólogos europeus, mas, insistimos, objecto de estudo. A chamada crise da psico- referência anteriormente, é uma teoria centrada mente actualizado por Scherer (1990) por forma sem que tal signifique mudança de paradigma. logia social, que periodicamente atormenta os nos processos intergrupais, designadamente nos a cobrir o período de 1981 a 1989. Os resultados Esta convergência entre psicólogos sociais psicólogos sociais dos dois lados do Atlântico, conflitos intergrupos. Mas, da mesma forma, o re- constam do quadro II. pode, todavia, explicar-se pelo facto de a com- deriva, em grande parte, das dúvidas que se</p><p>54 55 colocam quanto à adequação do método expe- lela (p. 342). Moscovici e Doise são dois nomes experiência inteligente. Estes trabalhos de Para não falar da própria psicologia, cujas prin- rimental às exigências do objecto, demasiado mais do que consagrados e, juntamente com o Moscovici foram aceites et urbi et orbi e, para cipais teorias foram proclamadas com base num complexo, da disciplina. falecido Tajfel, constituem os pais fundadores o psicólogo social americano, seria bizarro con- número limitado de protocolos ou de observa- da PSE. siderá-los como exemplo da psicologia social ções de pacientes hipnotizados. A extrapolação 3. Os pontos de debate A posição por eles sustentada neste recente europeia. Poderá argumentar-se que, em ambos é justificada desde que se mantenham trocas debate sobre a crise da psicologia social vem os casos, o traço distintivo residiria numa maior com outras disciplinas que levantem as mesmas Recentemente, o EJSP editou um número claramente ilustrar e confirmar a ideia duma preocupação em situar o fenómeno a níveis mais questões, forneçam um conjunto de dados e especial dedicado ao problema da crise e que tentativa de superação de posições antagónicas sociais, mas nem sequer é o caso. De acordo dêem algumas orientações (Moscovici, constitui um documento importante para uma através duma síntese conciliando as vantagens com Doise, explicação da influência minori- 1989, p. 411). melhor clarificação da situação da PSE face à epistemológicas de ambas as orientações. Não é, tária dada por Moscovici envolve os dois pri- A obra que Moscovici escreveu sobre as mi- PSA (EJSP, 1989, 19, 5). debate foi organi- todavia, claro que tais posições estejam isentas meiros níveis de análise. Mais precisamente, a norias activas (Moscovici,1976) documenta de zado por Rijsman e Stroebe, e nele intervêm, de ambiguidades. Um exame, necessariamente influência minoritária teria a sua origem na con- forma eloquente esta coragem em extrapolar a segundo a ordem dos artigos, Zajonc, Nuttin, muito breve, dos projectos desenvolvidos no sistência diacrónica ou intra-individual (repeti- partir da reduzida evidência empírica colhida no Doise, Moscovici, Harré e Gergen, e inclui igual- âmbito da PSE, e designadamente por estes dois ção no tempo da mesma resposta ou do mesmo Na edição em francês inclui inclusi- mente comentários de Lemaine, Crano, Semin, autores e seus associados, mostra, com efeito, sistema de respostas) e na consistência sincró- vamente um apêndice com o título dissidên- Gergen, Gardner, e Stroebe e Kruglanski. Num que o compromisso epistemológico é precário e nica ou inter-individual (consenso dos membros cia dum onde aplica a sua teoria à figura comentário de síntese da autoria dos organiza- instável, se não mesmo insustentável. Por outras da minoria)>> (Doise, 1982, p. 99). de Soljenitsyne. Os psicólogos sociais de ser- dores, concluiu-se que o panorama actual da dis- palavras, entre objecto e método existiria uma É, todavia, de referir que a linha desenvolvida viço dirão, certamente cheios da razão que lhes ciplina se caracteriza por dois paradigmas anta- solidariedade e uma determinação recíprocas, posteriormente por Mugny e associados (Mugny, assiste, que já não estamos no domínio da psi- gónicos: o velho paradigma, exemplificado por difíceis de contornar. Vejamos em primeiro 1981, e Mugny et al., 1984) procura ir um pouco cologia social, mas possivelmente o próprio investigadores como Nuttin e Zajonc, baseado lugar o caso de Moscovici. Em termos da sua mais longe na explicação da influência minori- Moscovici terá consciência disso, sendo o seu na perspectiva da psicologia social como ciência contribuição, imensa, para a psicologia social, tária ao articular processos interindividuais com objectivo ir além dos limites estritos que a disci- natural. De central neste paradigma a orientação poderemos indicar em primeiro lugar os estudos representações ideológicas. Independentemente plina impõe. Tal como a passagem acima trans- hipotético-dedutiva e a crença nos mecanismos que levou a efeito sobre fenómeno do risky- do nível do fenómeno, bem como dos processos crita sugere, o que importa é estabelecer pontos causais internos que podem ser detectados atra- -shift, que revolucionou, ao mostrar que este era psicológicos envolvidos, o que pode todavia com outras disciplinas que sobre o mesmo fenó- vés duma investigação empírica rigorosa. No apenas um caso particular dos grupos para adop- salientar-se aqui é o partido que Moscovici vai meno possam fornecer interpretações conver- outro extremo, os representantes do novo para- tarem posições mais extremas do que a média tirar das experiências que realizou neste domí- gentes ou alternativas. digma, como Harré e Gergen que, embora dife- das posições individuais (Moscovici e Zavalloni, nio, extrapolando para fenómenos sociais com- Mas, por muita simpatia que este ponto de rentes sob muitos aspectos, concordam em rejei- 1969). Em seguida, os estudos sobre as minorias plexos, como sejam a introdução de novas teo- vista nos inspire, continua a não ser muito clara tar o modelo hipotético-dedutivo, a crença nos activas e a influência social que elas podem rias científicas ou de novas formas sociais e a necessidade do próprio recurso ao laboratório. mecanismos causais internos e a ideia de que exercer sobre as maiorias. Deve-se a estes estu- políticas. No artigo que redigiu para o número que é que o laboratório acrescenta, em rigor, as leis da psicologia social tenham de ser desco- dos a abertura duma linha de investigação extre- especial do EJSP, afirma, a dado passo, que con- a uma teoria cujos contornos ultrapassam larga- bertas através duma investigação empírica rigo- mamente importante sobre os processos de ino- sidera a psicologia social como uma mente os resultados experimentais? Este pro- rosa (p. 341). vação e mudança social (Moscovici, 1976), que gia da cultura moderna>>, e a este respeito acres- blema vai colocar-se com maior acuidade ainda Quanto às posições de Moscovici e de Doise, culminaram na formulação da teoria da con- centa: que os nossos métodos são ao passarmos à terceira linha de investigação a conclusão global que se extrai, e também aqui versão (Moscovici, 1980). Nestes dois grandes inadequados e que as nossas hipóteses foram lançada por Moscovici relativa às representa- salvaguardadas as diferenças, é a de uma tenta- domínios de investigação e limitamo-nos aos exclusivamente verificadas à escala do labora- ções sociais (RS). Cronologicamente corres- tiva de compromisso, uma posição a meia distân- mais salientes Moscovici adoptou o método tório. E que seria, pois, não científico extrapo- ponde, aliás, ao seu primeiro trabalho de fundo cia entre os dois paradigmas extremos. Típico experimental. No que se refere designadamente lá-los para uma maior escala. Mas será conce- La Psychanalyse, son Image et son Public de ambos é a sua adesão à experimentação e à aos estudos sobre as minorias activas, são de bível o progresso sem tais saltos? Não é isso (1961), reeditado em 1976. Desta obra, não investigação de campo. Ao seu construtivismo relevar a notável engenhosidade dos protocolos o que se faz constantemente na ciência, seja obstante a sua reconhecida importância, não teórico não corresponde uma metodologia para- utilizados, constituindo um exemplo típico da na cosmologia, na economia ou na biologia? existe ainda versão em enquanto o livro</p><p>56 57 sobre as minorias activas foi primeiro editado entendida esta como uma sociologia do conheci- e E os fenómenos que tem em que observação desempenha um papel proe- em inglês e só cinco anos depois vertido para mento prático (Munné, 1989, p. 250). Reticente mente, acrescenta, são: religião, o poder, a minente no estudo das representações sociais. francês. Isto constitui um sintoma de audiência quanto à sua definição, conforme explica na comunicação de massas, os movimentos colec- Liberta-nos duma quantificação e experimenta- e penetração não só das teorias mas dos objectos sua réplica a Jahoda (Moscovici, 1988, p. 239), tivos, a linguagem e as representações sociais>> ção prematuras, as quais fragmentam os factos e métodos que lhes estão associados. A teoria Moscovici aceita todavia as definições propos- (Moscovici, 1989, p. 410). em peças minúsculas e levam a resultados sem das RS tem tido uma difusão até agora limitada tas por outros autores, e designadamente a pro- Uma outra ligação disciplinar que pode estabe- significado. Por vezes, poderá ser uma espécie aos investigadores com acesso e familiaridade posta por Doise: representações sociais são lecer-se, admitida pelo próprio Moscovici (1989, de sem dúvida, com a língua francesa para uma bibliografia princípios geradores de tomadas de posição liga- p. 409), é a que se refere ao interaccionismo mas pode dar lugar a progressos importantes.. actualizada veja-se Jodelet (1989) e um acolhi- das a posições específicas no conjunto de rela- simbólico, desenvolvida no âmbito da microsso- Esta orientação pode ocupar um lugar na psico- mento tímido, e nem sempre favorável, dos in- ções sociais e organizam os processos simbóli- ciologia americana (Mead, 1934; Blumer, 1969; logia social (Von Cranach, 1980) comparável vestigadores britânicos (Potter e Wetherell, 1987; cos que intervêm nessas (1986, p. 85). Striker e Statham, 1985). Tal como observa Farr, à posição ocupada pela orientação etológica em Jahoda, 1988). A definição de Doise estabelece convergências o behaviourismo social de Mead como biologia, e exactamente pelas mesmas Se compararmos dois manuais europeus de e complementaridades entre RS e as noções de o interaccionismo simbólico de Blumer são (1988, p. 241). psicologia social, um editado por Moscovici disposições e hábitos propostas por Bourdieu consonantes com a versão forte da investigação Mas, por outro lado, acrescenta, nada impede (1984) e outro por um conjunto de dois autores (1972), acentuando, porém, Doise que os soció- francesa contemporânea sobre representações o recurso a métodos quantitativos, tais como o britânicos, um autor alemão e um autor francês logos não se preocupam, por via de regra, com a (Farr, 1984, p. 147). Por versão forte uso de escalas e questionários, bem como o re- (Hewstone, Stroebe, Codol e Stephenson, 1988), descrição dos processos psicológicos subjacen- entende-se aqui a representação social na sua curso a técnicas estatísticas como a análise facto- podemos verificar que neste último a referência tes e necessários para que um indivíduo possa acepção durkheimiana. Para além disso, e não rial ou o MDS (multidimensional scaling), como, às RS ocupa apenas duas páginas. Curiosamente, participar na vida social e que, por seu turno, obstante os paralelismos e convergências que aliás, muitas das investigações levadas a efeito e ainda neste último manual, o único capítulo a psicólogos têm todavia tendência para des- possam estabelecer-se entre RS e interacções claramente ilustram (Mugny e Carrugati, 1985; cargo de autores de língua francesa é o que res- crever esses processos duma forma quase autó- simbólicas, os cientistas sociais que trabalham Di Giacomo, 1980; Soczka, 1985; Vala, 1981). peita à cognição social (Leyens e Codol, 1989). noma, abstraindo da sua inserção num contexto nestes domínios parecem preferir trilhar vias Identicamente, não há qualquer dificuldade Em contrapartida, o manual de Moscovici dedica social (Doise, 1986, p. 91). paralelas, por vezes com programas conceptual- em usar o método experimental e, de facto, fo- uma das quatro partes em que está organizado ao Com a teoria das RS a psicologia social apro- mente idênticos e apenas separados por diferen- ram conduzidas numerosas experiências, sempre tema do e vida e nele se xima-se mais da sociologia e, nessa medida, está ças meramente terminológicas. que surgiu uma hipótese que a elas se prestas- incluem vários capítulos sobre RS, entre eles um mais perto da sua vocação inicial interdiscipli- No caso vertente, a incorporação dos proces- sem (Moscovici, 1988, p. 240). Exemplos típi- redigido por Jaspars e Hewstone sobre a teoria nar, evitando tornar-se mera subdisciplina da SOS de socialização, tão caros ao interaccionismo cos de tais experiências acham-se incluídos no da atribuição. A cognição social surge, assim, psicologia. É esta subalternidade da psicologia simbólico, poderiam contribuir para enriquecer volume editado por Farr e Moscovici, tais como nesta perspectiva, subordinada às RS. social que Moscovici se recusa a aceitar. o quadro de referência, porventura demasiado as de Abric (1984), Codol (1984) e Flament A edição recente do volume Social Repre- Tal como escreve, na medida em que a psi- lewiniano, que caracteriza a teoria das RS. (1984). Mas é justamente esta abertura a todos os sentations, por Farr e Moscovici (1984), na série cologia social tende, cada vez mais, a tornar-se Para completar o exame, falta, porém, con- azimutes que levanta problemas. No que con- dos Europeus em Psicologia Social>>, um ramo subsidiário da psicologia, vê-se for- siderar um aspecto básico - o da metodologia. cerne aos métodos de inquérito, e por sofisticada correspondente a um colóquio sobre este tema çada a ter cada vez mais em conta os factos bio- É sobretudo aqui que vão colocar-se as maiores que seja a estatística utilizada, é dificil captar os realizado em Paris, poderá, todavia, contribuir lógicos e a afastar-se dos fenómenos sociais. Em ambiguidades. Na sua formulação actual, a teo- processos que definem o núcleo da representação para sensibilizar um público mais alargado e vez de criar uma continuidade dá origem a uma ria das RS não impõe quaisquer restrições e con- social. Claro que é sempre possível extrapolar eventualmente despertar o interesse dos círculos descontinuidade, cortando, por assim dizer, o sidera que todos os métodos de investigação, e, sob esse aspecto, o céu é o limite, mas não norte-americanos. ramo em que estava (Moscovici, 1989, incluindo o laboratório experimental, são não faltarão obviamente do templo para Mais do que uma teoria entre outras, as RS p. 409). A esta tendência negativa, Moscovici apenas compatíveis mas todos eles importantes denunciar as arbitrariedades interpretativas. Para constituem um programa de investigação e um contrapõe um lugar central e inclusivamente para a obtenção de resultados e de hipóteses. evitar tais arbitrariedades, só resta a verificação quadro de referência teórico. Levado às suas uma função unificadora para a psicologia social, É certo que Moscovici parece privilegiar a experimental. extremas consequências, o conceito de RS pro- a estudar a ligação entre a cultura e a orientação observacional à orientação experi- Mas quando se envereda por esta via de pro- como uma psicologia social alternativa, natureza, bem como entre os fenómenos sociais mental. Na réplica a Jahoda, observa, com efeito, curar detectar os mecanismos causais explicati-</p><p>58 59 vos, recorrendo ao método experimental, cai-se mentos estudados da sua localização no espaço/ original o construtivismo genético, que con- referência, a causalidade deverá ser considerada no terreno armadilhado da cognição social. Por /tempo no interior duma cultura particular tinua e prolonga os estudos piagetianos sob o como bidireccional, e também os efeitos das con- outras palavras, a análise desce para os níveis (Farr, 1984, p. 141). A isto gostaríamos de desenvolvimento cognitivo. Neste último domí- sequências antecipadas devem ser tidos em con- individuais e interindividuais e a psicologia acrescentar que as exigências de rigor levam nio, é de salientar a investigação reunida sob (1989, p. 397). social regressa ao seu estado de subdisciplina da forçosamente a delimitar segmentos cada vez o título de marcação social e que se refere às Esta análise, muito breve, das actuais orien- psicologia ou, se se preferir, das ciências cogni- mais moleculares dos processos psicológicos, correspondências que poderão existir entre, por tações e tensões na psicologia social leva-nos tivas. Moscovici parece aperceber-se disso ao mudando sucessivamente de escala numa pro- um lado, as relações sociais que presidem à assim a concluir por uma versão fraca da PSE citar, a propósito, o ponto de vista de Neisser: gressão que, no limite, torna problemática a interacção de pessoas, real ou simbolicamente e a diagnosticar uma progressiva polarização desenvolvimento da psicologia cognitiva nos fronteira entre processos psicológicos e proces- presentes numa dada situação e, por outro, as dos paradigmas. exame a que procedemos últimos anos tem-se revelado desapontadora- biológicos. Nestas condições, parece-nos relações cognitivas derivadas de certas proprie- sugere, com efeito, que o espaço interdisciplinar mente estreito, voltando-se para dentro da aná- de facto difícil sustentar a possibilidade duma dades dos objectos através dos quais essas re- articulando a psicologia e a sociologia comporta lise de situações experimentais específicas em psicologia social que consiga estabelecer uma lações sociais se materializam (Doise, 1989, problemas epistemológicos cuja solução não vez de se voltar para fora, para o mundo além do síntese entre paradigmas opostos. As grandes p. 395). Numerosas experiências têm sido con- parece, de forma alguma, evidente. A PSE, aliás, laboratório>> (Neisser, 1976, p. XII, citado por ambiguidades da teoria das RS, como, aliás, de duzidas neste domínio, confirmando o papel como vimos, muito dividida no seu interior, é, Moscovici, 1988, p. 240). toda a PSE enquanto projecto autónomo, deri- dum metassistema de regulações sociais contro- como foi sugerido por Jaspars (1986), menos Moscovici rejeita, aliás, com veemência, a vam desse dilema. Não nos parece, porém, e aí lando as operações cognitivas (De Paolis, Doise uma alternativa do que um estilo traduzido em recomendação de Jahoda segundo a qual estamos novamente de acordo com Farr, que e Mugny, 1987). preferências temáticas e formas de verificação mais realista ligar (as RS) ao corpo crescente psicólogos sociais franceses Esta hipótese de metassistemas reguladores empírica. Qualquer leitor medianamente experi- do trabalho em cognição social do que reclamar neos tenham descoberto o segredo, que confun- fora já formulada por Moscovici na sua teoria mentado é capaz de reconhecer que um artigo a existência não verificada de domínios espe- diu Wundt, de serem capazes de facilmente se das RS (1976, p. 254). Tais ligações deixam que tenha entre mãos foi produzido por um autor (Jahoda, 1988, p. 207). Para Moscovici, a movimentarem entre o laboratório e o terreno, entrever possíveis desenvolvimentos, articulando norte-americano, britânico ou francês. constitui tipo de psicologia mantendo-se fiéis à natureza do seu objecto de o construtivismo genético com as representações Dum modo geral, os psicólogos sociais euro- social que ele não se cansa de denunciar e que, (1984, p. 145). sociais. Mas convém acentuar que, do ponto de peus, em contraste com os seus colegas norte- a seu ver, conduz inexoravelmente à subalter- No interior da PSE a teoria RS representa sem vista metodológico, a orientação de Genebra é -americanos, e possivelmente isso também se nização da psicologia social. Em estreita coerên- dúvida a tentativa mais radicalizada de rompi- inequivocamente experimentalista. Se é certo verifica noutras disciplinas sociais, manifestam cia, haveria que ir mais longe, renunciando ao mento com a psicologia social normal e a cons- que Doise sempre procurou estabelecer articula- uma maior preocupação com os problemas do laboratório como meio de investigação das RS. tituição duma disciplina alternativa, estabele- ções interdisciplinares, sobretudo com a sociolo- conflito e do papel que ele poderá desempenhar É o que sugere, aliás, Farr ao recordar toda cendo a ligação entre a psicologia e a sociologia, gia francesa, de que é leitor atento e conhecedor na mudança social. Esta tónica está presente na uma linha que remonta a Wundt e a Durkheim, entre o indivíduo e a sociedade. As posições (Doise,1985; Doise e Cioldi,1989 também, por escola de Bristol, com a linha que desenvolveu e segundo a qual a experiência adequada aos defendidas por outros autores, como é o caso de outro lado, as suas reservas quanto às orientações sobre as relações intergrupo, está igualmente processos individuais não seria, porém, ao nível Doise, que igualmente contribui para o debate mais recentes da psicologia social, e designada- presente no construtivismo genético da escola colectivo. organizado por Rijsman e Stroebe (1989), ape- mente a revolução cognitivista, são mais miti- de Genebra, através do lugar central atribuído ao observa Farr, um dispo- nas reforçam a conclusão que tiramos. Doise, gadas do que as de Moscovici. Enquanto este, conflito sociocognitivo como motor do desen- sitivo para isolar os fenómenos dos contextos ou, antes, como prefere Munné (1989), a escola nas suas intervenções mais recentes, vai ao ponto volvimento, e está ainda presente, e aí duma sociais em que eles naturalmente ocorrem, o de Genebra, que reúne uma série de investiga- de pôr em causa que uma ciência híbrida, como forma insistente, em todas as linhas de investi- lá fora. Os acontecimentos histó- dores de prestígio agrupados em torno de Doise, é o caso da psicologia social, possa ser explica- gação desenvolvidas por Moscovici. ricos que ocorrem entre e t2 no decurso da tem procurado desenvolver e compatibilizar tiva (1989, p. 428), Doise, nesse mesmo debate, Recorde-se que Moscovici não se cansa de experiência ameaçam a sua "validade interna" várias linhas de investigação, sendo de salientar defende sem ambiguidade o recurso ao método definir a psicologia social e em vários momen- e, se não forem controlados, podem ser confun- as relações intergrupo, iniciada em Bristol por experimental, admitindo todavia - e essa é uma tos da sua vasta produção, como o conflito entre didos com os efeitos da variável independente. Tajfel, as minorias activas e o efeito de inova- ressalva importante uma maior flexibilidade o indivíduo e a sociedade. Por outro lado, na Um bom controlo experimental é, pois, virtual- ção, na linha de Moscovici, as representações do jogo entre variáveis independentes, ou seja, réplica a Jahoda pode ler-se: tenha tido mente sinónimo do isolamento dos aconteci- sociais e ainda e esta é a sua contribuição mais uma causalidade circular: tal quadro de a paciência suficiente para seguir os meus escri-</p><p>60 tos notará que o seu fio condutor é o enigma da polizar por seu turno a psicologia social na CAPÍTULO IV mudança e da (Moscovici, 1988, Europa, erigindo-se, como traduz a linguagem p. 223). das suas instituições e de muitos dos seus au- É possível especular que esta preocupação tores, em representantes da psicologia social com o conflito e a mudança na psicologia quando na realidade é apenas uma psicologia Orientações metodológicas se não mesmo nas ciências sociais europeias, (Munné, 1989, p. 244). comporta a sua própria psicologia social ou, se É, todavia, um facto que entre várias psico- na psicologia social preferirmos, corresponde a uma representação logias sociais identificadas por este autor, tais social condicionando a orientação temática dos como a psicanálise social, o behaviourismo so- cientistas sociais europeus. Também num domí- cial, o interaccionismo simbólico e tendências nio muito próximo da psicologia social, e para afins, nas quais poderíamos incluir as represen- Jorge da Glória alguns uma sua aplicação possível o das tações sociais na sua versão forte e a psicologia organizações, mas onde não existe qualquer social marxista, é, sem dúvida, o sociocogniti- reivindicação de especificidade epistemológica vismo que mais mobiliza hoje em dia a atenção regional é todavia detectável uma maior sensi- dos investigadores e é também neste domínio 1. Método e teoria dos experimentais, que caracteriza a psicologia bilidade dos investigadores europeus, em con- que se verifica uma produção significativa e enquanto projecto de conhecimento científico, traste com os seus colegas norte-americanos, para consistente. É nesta tradição que o presente Tal como outros domínios da psicologia, a psi- mas sim a elaboração de um discurso relativo a o papel desempenhado pelo conflito na mudança manual igualmente se inscreve. cologia social caracteriza-se pela natureza dos determinados aspectos do real, seleccionados de tanto interna como externa às organizações. Poderão, sem dúvida, identificar-se metassis- temas que aborda e não pelo uso de métodos espe- tal forma que fique assegurada a correspondên- Mas a psicologia social de tais especificida- temas de regulação que detemminam que esta cíficos. recurso a algumas técnicas próprias cia entre as observações destes e os termos e pro- des culturais remeter-nos-ia para outras alterna- seja de facto a ciência normal praticada pela para além das utilizadas em psicologia geral, por posições do discurso teórico. É nesta concepção tivas que nos projectariam para além do quadro grande maioria dos psicólogos sociais. exemplo, sociogramas (Moreno, 1949) ou proto- que se fundamenta a construção de um padrão da PSE, com a sua adesão, na melhor das hipó- É possível que minorias activas venham um colos de observação de interacções sociais (Bales, de validade único do discurso científico, aplicá- teses hesitante, ao experimentalismo. Tal como dia a revolucionar este estado de coisas e a 1950), situa-se no enquadramento metateórico e vel tanto às observações experimentais como aos adverte judiciosamente Munné, sociocogni- impor um paradigma alternativo. Mas nem sem- epistemológico do método das ciências naturais. dados da observação passiva. Segundo esta posi- tivismo europeu, quando em causa o mono- pre, não obstante o optimismo de Moscovici, as Se bem que o domínio da psicologia social esteja ção, a articulação essencial entre o real e o dis- pólio norte-americano, tende de facto a mono- minorias têm uma vida fácil. balizado por uma vasta literatura metodológica curso teórico, a qual constitui a pedra-de-toque aparentemente autónoma, esta impressão de au- do método científico, é a noção de medida, quer tonomia deve-se essencialmente a circunstâncias esta seja entendida num sentido primitivo ao históricas da formação da disciplina e não deve, qual a linguagem corrente não atribui sequer de modo algum, conduzir à conclusão da existên- a acepção de medida, pois consiste na mera iden- cia de um terreno metodológico independente, por tificação de aspectos discrimináveis do real, per- um lado, das elaborações teóricas concretas e, por mitindo efectuar contagens, quer num sentido outro, do método das ciências naturais. derivado, consistindo na avaliação de grandezas Apesar de o aspecto mais saliente do método só indirectamente acessíveis à observação. das ciências naturais residir na realização de expe- Dois aspectos do projecto de conhecimento da riências em laboratório, na psicologia como nes- psicologia social tomam a medida uma tarefa par- tas, simples observações passivas e experiências ticularmente árdua neste campo: por um lado, fora do laboratório constituem instrumentos de o psicólogo social interessa-se, em geral, por fenó- conhecimento válidos e produtivos. Assim, não menos complexos, tais como os comportamentos será tanto a realização de experiências em labo- dos agentes sociais, cuja unidade e linhas de cli- ratório, ou simplesmente a realização de estu- vagem naturais assentam sobre uma determinada</p><p>62 63 cultura, ela própria resultante de uma evolução his- sando de moda na prática científica geral sem numa escala eventualmente diferente. Duas das dicos especializados, foram alvo de críticas tanto tórica; por outro lado, os comportamentos sociais afectar esta de modo notável. Não será talvez este dimensões ao longo das quais se opera com mais de pesquisadores afectos a uma orientação his- traduzem significações para os agentes sociais, o lugar próprio para uma avaliação crítica da dis- frequência a redução de escala a dimensão tem- tórica e sociológica (Gergen, 1984; Lubek, 1979) as quais não se identificam necessariamente com cussão sobre a validade da psicologia social expe- poral e a dimensão valorativa dos objectivos pro- como de pesquisadores ligados a uma orientação os factores explicativos desses comportamentos, rimental, mas convém, no entanto, extrair duas postos aos sujeitos experimentais geram dificul- cognitivista (Tedeschi, Smith e Brown, 1974) ou factores cuja identificação constitui justamente o conclusões desta discussão: em primeiro lugar, dades que constituem ilustrações claras do tipo neobehaviourista (Da Gloria e Duda, 1979). Apesar objectivo do psicólogo. Estas dificuldades têm sido uma parte importante das críticas dirigidas à psi- de mal-entendido reinante neste Dada a desta variedade de orientações teóricas, todos estes objecto de uma acesa polémica e levaram mesmo, cologia social experimental pelos partidários da natureza diferente dos processos mnemónicos que autores estão de acordo quanto ao facto de que o por vezes, a pôr em dúvida a possibilidade do perspectiva histórica e sociológica dizem respeito intervêm a curto, médio e longo prazo, a generali- ponto de partida da noção científica de agressão conhecimento dos fenómenos sociais por meio de à relação entre os fenómenos sociais naturais e zação frequente de conclusões tiradas de observa- não é mais de que uma palavra da linguagem cor- aplicação do método das ciências naturais. Alguns as representações teóricas e empíricas destes na ções fazendo intervir a memória a curto prazo a rente exprimindo um julgamento relativo a uma anos atrás, esteve na moda a discussão daquilo prática científica, pondo em causa práticas de fenómenos que naturalmente implicam a memória conduta. Este termo teria sido abusivamente trans- que então se chamou a da psicologia inferência que, do ponto de vista do método cien- a longo prazo constituem abusos de interpretação formado numa noção descritiva de um comporta- Criticava-se então a psicologia social, e sobretudo tífico, constituem, muitas vezes, se não erros pelo que nada justifica. Paralelamente, são conhecidas mento observável, por via de uma definição ar- a psicologia social experimental, por esta abordar menos procedimentos discutíveis; em segundo as modificações introduzidas na percepção e na bitrária privilegiando injustificadamente uma das fenómenos de natureza cultural e histórica formu- lugar, esta discussão deu azo a uma reflexão sobre avaliação intrínseca das tarefas, em função do va- dimensões do comportamento que intervêm no lando-os num quadro conceptual que, ao ignorar a as fronteiras da psicologia social, a partir da dis- lor das recompensas extrínsecas propostas aos su- processo natural de julgamento. Estes consideram significação e a historicidade (Gergen, 1973), con- tinção entre factos culturais enquanto produtos de jeitos para a execução destas. Em ambos os casos, ainda que, não tendo esta noção científica um re- duziria a um formalismo artificial, desinserido do uma evolução histórica e enquanto resultados do se o que interessa ao experimentador é um fenó- ferente exacto nos comportamentos observados mundo prático. Dados os limites do método expe- processo de socialização, cujas implicações estão, meno natural a longo termo ou implicando recom- nos estudos experimentais em que hipóteses rela- rimental, esses problemas deveriam ser estudados por hora, longe de terem produzido os seus frutos. pensas extrínsecas elevadas, a única experimen- tivas às suas determinações são postas à prova, por métodos de investigação de carácter histórico tação que pode permitir a extracção de conclusões são, portanto, infundadas as generalizações dos e sociológico. Ao serem aplicadas a fenómenos 1.1. o problema da redução da escala aplicáveis é a que implica recompensas elevadas e resultados daqueles aos fenómenos usualmente sociais, essencialmente históricos, as exigências se situa numa escala temporal implicando a inter- chamados agressões. A partir deste ponto, as posi- do método experimental levariam a simplificações Em muitos dos casos citados nas discussões venção dos mesmos mecanismos de memória que ções destes autores divergem, mas este acordo ini- abusivas, dando origem a reduções arbitrárias de relativas à validade das pesquisas de psicologia os implicados no fenómeno natural visado. Em cial significa que uma noção teórica não pode ser variáveis culturais e históricas a as social, por exemplo na polémica sobre o conflito muitos casos, uma tal experimentação pode ser constituída por uma simples explicitação dos refe- quais, em virtude desta redução de escala, perde- e a sua representação nos chamados jogos expe- praticamente irrealizável. Resta então ao rentes na linguagem convencional de um termo riam a sua natureza própria. Segundo os críticos rimentais, a redução de escala dos fenómenos logo renunciar à abordagem experimental do supostamente denotativo, desembocando o seu es- da psicologia social, este seria o preço a pagar pela naturais estudados experimentalmente não parece problema, ou, se os conhecimentos disponíveis o tudo sobre uma reprodução controlada de alguris possibilidade da abordagem experimental dos pro- assentar de facto sobre uma teoria coerente explí- permitem, reformular aquele em termos tais que a aspectos desses referentes. Um autor clássico, que blemas postos pelos cita das relações entre fenómenos de escalas dife- memória a longo prazo ou as variações do valor em seu tempo se apercebeu desta dificuldade então os críticos, a psicologia social experimental rentes, mas antes reflectir predilecções e suposi- intrínseco das tarefas propostas aos sujeitos cessem (Brunswik, 1956), propôs uma solução consis- não pode constituir nem um modo de conheci- ções dos investigadores. de ter incidências sobre as explicações propostas. tindo numa amostragem aleatória dos referentes mento de utilização prática, nem uma construção No entanto, uma tal teoria constitui um passo Os estudos sobre os comportamentos agressi- implicados pela noção teórica, solução infeliz- cientificamente válida, pois, por um lado, os seus indispensável para uma utilização criteriosa do vos realizados no quadro da psicologia social expe- mente irrealista dada a indefinição das fronteiras objectos de estudo são factícios e, por outro, a método experimental; com efeito, uma redução de rimental constituem uma excelente ilustração das da noção teórica, quando construída por esta via. construção desses objectos assenta em distorções escala só pode ser justificada quando é possível dificuldades com as quais é confrontado o psicó- Este género de dificuldade comporta, contudo, ideológicas do real, traduzindo não as proprieda- demonstrar que os mecanismos implicados por logo social ao tentar traduzir as representações na- outra solução: quando uma noção teórica provém des deste, mas idiossincrasias dos investigadores. um fenómeno naturalmente situado numa deter- turais em noções Os estudos sobre este do agrupamento de observações empíricas manifes- Como outros temas, a crítica da psicologia so- minada escala são idênticos aos implicados pelo tema, numerosos ao ponto de constituir durante tando a acção de determinações homogéneas, ainda cial tornou-se um domínio de especialistas, pas- fenómeno estudado experimentalmente situado alguns anos o principal conteúdo de alguns perió- que deste modo esta noção perca eventualmente o</p><p>65 64 seu referente natural imediato, cessa, no entanto, de As fronteiras entre a psicologia, a psicologia so- cada disciplina, sem que o psicólogo se improvise parte. As ligações entre variáveis independentes reflectir os processos ideológicos presentes na lin- cial e a sociologia são, em geral, pouco marcadas, sociólogo, antropólogo ou historiador. e dependentes, cuja existência ou forma não são guagem natural, e as realizações empíricas dessa e nem sempre é fácil determinar se um determi- conhecidas mas parecem plausíveis ao pesquisa- noção estão garantidas contra a facticidade que nado modo de abordar um problema, ou um deter- 2. Variáveis dependentes dor, constituirão o objecto das hipóteses que este ameaça as miniaturizações dos fenómenos naturais. minado problema, constitui ou não um procedi- e independentes, hipóteses porá posteriormente à prova das observações. mento próprio da psicologia social. Em princípio, A distinção entre variáveis dependentes e inde- 1.2. Problemas e teoria a distinção é fácil de levar a cabo: enquanto a Quer a questão à qual o psicólogo social pre- pendentes refere-se à posição das variáveis na psicologia tem por objecto a identificação e a tende responder por meio de uma pesquisa se si- economia da explicação de um determinado fenó- género de dificuldade que acabámos de evo- descrição dos mecanismos que intervêm no com- tue na prática social, quer ela provenha de exigên- meno proposta pelo pesquisador. Qualquer variá- car é porventura mais sensível no caso da psico- portamento dos indivíduos, qualquer que seja o cias internas ao processo de construção do saber, vel pode desempenhar um papel explicativo num logia social que noutros domínios da psicologia. contexto social em que estes são produzidos, a os critérios de validade em relação aos quais essa determinado modelo, e ser ela própria o objecto Com efeito, o psicólogo social dispõe frequente- psicologia social visa o comportamento dos indi- resposta será avaliada são idênticos. No entanto, que outro modelo se propõe explicar, desempe- mente de uma menor margem de liberdade na fi- víduos enquanto determinado pelo contexto social a abordagem de questões tendo por origem a prá- nhando nesse caso o papel de uma variável depen- xação da natureza das suas observações que o psi- próximo, independentemente da especificidade tica social pode levar a definir estratégias de pes- dente. Certas características sociológicas, como a cólogo do desenvolvimento ou o psicólogo das histórica e cultural do grupo social em que esse quisa que comportam objectivos intermediários idade ou o sexo dos indivíduos, as quais, por não funções. Isto deve-se, por um lado, ao facto de que, contexto está presente. Quanto à sociologia, o seu específicos, implicando opções metodológicas serem de manipulação experimental frequentemente, a actividade do psicólogo social domínio próprio seria justamente o das determi- diferentes das que é levado a fazer o pesquisador por parte do investigador serão mais propriamente intervém em resposta a problemas de ordem prá- nações exercidas pelos factores que constituem a confrontado com um problema proveniente de designadas factores de classificação, parecem, à tica postos por agentes sociais exteriores ao mundo especificidade histórica e cultural das sociedades. exigências internas da construção do saber. primeira vista possuir uma vocação exdusiva para científico: administrações, empresas, etc., os quais As dificuldades de aplicação desta repartição Para que estas opções possam ser tomadas com o papel de variáveis independentes: as respostas definem implicitamente o nível de abordagem da de competências, traduzidas na indecisão dos mo- conhecimento de causa, a primeira tarefa do pes- a um questionário ou a frequência de determinado questão; por outro lado, os fenómenos que inte- delos teóricos da psicologia social, traem o carác- quisador face a um problema oriundo da prática tipo de comportamento podem ser explicáveis, em ressam ao psicólogo social, quando a iniciativa da ter meramente convencional da distinção entre os social consiste em elaborar um modelo teórico certos casos, pela idade ou pelo sexo dos indiví- definição do objecto da pesquisa pertence a este, níveis individual, interindividual e social. Na me- deste. A partir do enunciado do problema deve o duos interrogados ou observados, enquanto estas dizem respeito a comportamentos ou a factores dida em que os dados empíricos ilustrando cada pesquisador escolher o comportamento ou com- características não parecem ser explicáveis por do comportamento que, pela sua natureza social, um destes níveis não são realmente distintos, e ra- portamentos sobre os quais deve incidir o estudo. qualquer tipo de observação à disposição do inves- comportam uma definição implícita de origem cul- ramente o são, a multiplicidade dos modelos teóri- Em certos casos, deve ainda decidir quais os as- tigador. Contudo, em estudos tendo por objectivo tural. Se, no primeiro caso, o estabelecimento dos cos aplicáveis, e portanto dos níveis de explicação pectos das situações nas quais esses comporta- avaliar, por exemplo, diferentes modos de cons- objectivos do estudo pode e deve passar por uma e dos domínios de generalização com os quais se mentos são observados que deverão ser encarados tituição de grupos sociais, a idade ou o sexo dos negociação em que compete ao psicólogo uma defronta o investigador, obrigam-no a uma decisão enquanto factores determinando variações quanti- indivíduos que constituem cada grupo podem ser função de diagnóstico em relação aos objectivos cujo fundamento não pode ser senão arbitrário. tativas desse ou desses comportamentos. O com- compreendidos em função dos diferentes modos práticos dos agentes sociais, os quais nem sempre Se, em geral, não compete ao psicólogo social portamento ou comportamentos sobre os quais de constituição desses grupos, desempenhando são melhor servidos por uma conceptualização do experimental estudar o conteúdo dos sistemas cul- incide o estudo constituem as variáveis dependen- neste caso o papel de variáveis dependentes. problema situado ao nível que estes entendem ser turais, mas sim as características operacionais dos tes, e os factores que determinam as variações des- o mais apropriado, no caso em que o psicólogo indivíduos, as quais são parcialmente determina- ses comportamentos constituem as variáveis inde- 2.1. Construção das variáveis tem uma total liberdade de definição da sua pro- das por elementos culturais, a acção destes últimos pendentes do modelo elaborado pelo experimenta- independentes blemática convém que este não perca de vista o é difícil de separar das condições da sua aquisição, dor. Em geral, as pesquisas que têm por objectivo facto de que o estudo dos sistemas sociais concre- ela própria controlada por parâmetros culturais. responder a questões levantadas pelo próprio pro- Sendo as variáveis independentes a instância tos, incluindo os mecanismos de determinação dos Os problemas do mundo social natural, dos quais cesso de construção do saber encontram-se em explicativa posta à prova pelo pesquisador, a rela- comportamentos que são próprios; consti- o psicólogo social parte na maior parte dos casos, terreno já parcialmente balizado, variáveis depen- ção entre estas e a noção teórica à qual a explica- tuem o objecto da sociologia e não são, as mais das supõem uma abordagem multidisciplinar, preser- dentes e independentes estão já parcialmente iden- ção proposta se refere condiciona a validade do vezes, de observação experimental. vando a particularidade dos métodos próprios de tificadas, e as suas relações são conhecidas em modelo proposto. Em primeiro lugar, a variável ou</p><p>66 67 variáveis independentes devem constituir uma re- tos abstractos criados a priori, discutimos alguns suposto pelo investigador, e que diferentes situa- podendo resultar do efeito de um determinado presentação válida do conceito teórico ao qual o dos problemas levantados por este tipo de proce- ções deste tipo afectam da maneira prevista outros factor numa dada situação e do efeito de um outro investigador se refere. Nalguns casos, esta exigên- dimento. Como se tomou claro no decorrer dessa indicadores desse factor numa outra situação. Por esta razão, ao con- cia não levanta problemas de maior na medida em discussão, a variável independente teórica é aqui, trário do que é frequente, a construção de um con- que a variável independente manipulada ou obser- de facto, uma variável dependente, comportando 2.2. Construção das variáveis ceito fundamental deve partir indutivamente da vada é o próprio fenómeno no qual o experimenta- como tal variações aleatórias que uma variável in- dependentes certeza da homogeneidade das determinações de dor está interessado. Incluem-se neste caso os fac- dependente não comporta geralmente, e o estudo um dado número de comportamentos concretos tores de classificação, tais como o sexo, a idade, ou deste tipo de observações exige o recurso a mode- Dada a natureza relativa da distinção entre va- para chegar à construção de um conceito global a espécie taxonómica, quando estas características los estatísticos que levem em conta este riáveis independentes e dependentes, muitas das abrangendo esses comportamentos. não são consideradas indicadores de outras variá- Toda a observação empírica, experimental ou considerações relativas às primeiras aplicam-se veis. Do mesmo modo, as características dos in- não, tendendo a pôr à prova relações entre um con- igualmente às segundas. 2.3. Comportamentos e condutas divíduos que correspondem a medidas ditas de ceito abstracto ou latente, representado por um de- A selecção do ou dos comportamentos a obser- potência: nível de inteligência, acuidade visual ou terminado acontecimento observável, à prova var deve respeitar simultaneamente exigências de Na grande variedade das observações que é pos- auditiva, etc., são válidas por si próprias, indepen- simultaneamente a relação que interessa ao experi- ordem teórica e metodológica. Em numerosos ca- sível realizar a partir do comportamento dos indi- dentemente do facto de o instrumento graças ao mentador e o critério de selecção do acontecimento um conceito fundamental único, por exemplo, víduos e dos grupos, convém distinguir dois níveis qual estas são aferidas ser mais ou menos válido. estudado. Na medida em que este critério for pro- conduta altruísta, comporta manifestações compor- de observação: comportamentos e condutas. Um Noutros casos, o conceito teórico ao qual o expe- a conclusão do investigador estará su- tamentais concretas extremamente diferentes em comportamento é uma modificação do estado de rimentador se refere designa uma noção abstracta, jeita a crítica. Verifica-se em muitos trabalhos publi- função das numerosas circunstâncias nas quais é um organismo, considerada do ponto de vista de comportando diferentes modalidades de realização cados que as duas fontes de incerteza quanto à observado. A par dessas diferenças, todas as mani- uma relação paramétrica com um estímulo apli- concreta: agressão, grau de credibilidade de uma validade das variáveis independentes estão simulta- festações concretas desse comportamento têm em cado a este. Uma conduta consiste em sequências determinada fonte de informação, pressão social, neamente presentes no mesmo estudo: a variável conjunto a propriedade que leva a considerá-las finalizadas de comportamentos. Entre estas, é usual etc. A validade de noções teóricas deste tipo pres- independente teórica é, ao mesmo tempo, uma cate- manifestações de um mesmo comportamento. Se, distinguir as que são encaradas pelo investigador supõe a homogeneidade das determinações dos goria abstracta e um estado não observável. A abun- em alguns casos, as características comuns às dife- enquanto condutas efectoras e as que são encaradas factos concretos aos quais estas noções se referem. dância de situações de inferência comportando um rentes manifestações de um mesmo comportamento enquanto comunicações ou condutas simbólicas. Uma situação aparentada com esta encontra-se tal nível de risco de erro será porventura uma das consistem em meras semelhanças, noutros casos Observações relativas a condutas constituem cada vez que a variável teórica visada pelo inves- explicações do carácter fracamente cumulativo do essas características correspondem à existência de tradicionalmente a matéria de base da psicologia tigador não pode ser directamente observada ou saber, num domínio caracterizado simultaneamente um mecanismo único de produção e de controlo social. Na grande maioria dos casos essas obser- experimentalmente manipulada, o que acontece por uma reprodutibilidade aceitável das obsevações. das diferentes manifestações do comportamento. vações são de carácter simbólico: o inquirido ou quando esta é, por exemplo, um estado interno dos problema consiste em demonstrar que o A utilidade de um conceito fundamental ba- sujeito experimental diz ou escreve uma men- indivíduos, como a culpabilidade, a cólera ou a estado não observável dos indivíduos, o qual cons- seado sobre meras semelhanças, sem correspon- sagem, aceita ou recusa determinada escolha pro- insatisfação profissional. Neste caso, o investigador titui de facto a variável independente teoricamente dência ao nível dos mecanismos de determinação posta pelo experimentador. Noutros casos são selecciona uma determinada situação observável definida, é de facto aquele que o investigador do comportamento, é limitada. Nem semelhanças observadas acções; o sujeito experimental envia ou experimentalmente realizável e infere o estado supõe. No caso de estudos observacionais, um mí- dos comportamentos, nem a existência de catego- a um outro um choque eléctrico ou uma determi- interno dos indivíduos colocados nesta situação. nimo de certeza requer a observação de vários rias naturais englobando diferentes comportamen- nada recompensa. Estas acções são consideradas investigador pode assim seleccionar um grupo de indicadores da variável não observável, paralela- tos concretos constituem garantias suficientes da como condutas, na medida em que constituem indivíduos aos quais foi recusada uma promoção mente ao comportamento que constitui a variável homogeneidade das determinações desses com- manifestações observáveis de uma decisão tomada profissional, um grupo de indivíduos insultados por dependente observada pelo investigador. A lógica portamentos. Com efeito, quando o comporta- pelo sujeito quanto aos resultados da sua acção. um comparsa do experimentador, etc., e considerar global da prova, aplicável tanto no caso de estudos mento estudado num certo número de situações Para além da frequência, outros aspectos das que o estado interno correspondente à situação em experimentais como no de estudos observacionais, pode provir da acção de diferentes mecanismos, condutas são, muitas vezes, avaliados no decorrer questão está presente nos indivíduos observados. consiste em demonstrar que a variação registada as variações do comportamento registadas entre de uma experiência ou de uma observação: inten- No subcapítulo anterior, a propósito das dificul- pelo investigador é observada em mais de uma as diferentes situações não podem ser atribuídas sidade ou amplitude, duração, etc. A escolha do dades de interpretação de dados relativos a concei- situação capaz de gerar o estado não observável com segurança às diferenças entre as situações, aspecto a registar deverá ser, em geral, ditada por</p><p>68 69 2.4. A descrição das condutas: uma nota obtida a partir da soma das cotações atri- COMPORTAMENTOS E CONDUTAS escalas e medidas buídas às diferentes respostas. Outras vezes, estas o estudo do comportamento motor tem uma vasta história que, em larga medida, se confunde com a da psi- são tratadas pela técnica estatística chamada aná- cologia experimental: o estudo dos tempos de reacção, ou investigação cronométrica dos comportamentos, recebeu Tem sido proposto um grande número de méto- lise factorial, a qual constitui um meio de represen- um fundamento teórico nos trabalhos de Donders (1868) e constitui desde essa data um dos principais meios de dos cujo objectivo é fornecer um fundamento teó- tação das cotações atribuídas a um grande número investigação no domínio da percepção e do tratamento da informação. No estudo cronométrico do comportamento, rico e um procedimento prático para este exame. de respostas num número reduzido de coordenadas. o tempo de é considerado como resultado da soma das durações de diferentes processos de aquisição e trata- mento da informação. Estes processos podem desenrolar-se em série, em paralelo, ou segundo diferentes configu- Alguns desses métodos são especialmente con- rações cronológicas de tratamentos em série e em paralelo. o estudo dos tempos de reacção a determinados estímu- cebidos para uso com material simbólico, outros 2.5. Validade e fidelidade das medidas los em condições especialmente concebidas pelo experimentador para alongar ou reduzir certos processos permite podem ser utilizados tanto com material simbólico pôr à prova hipóteses relativas à organização das diferentes etapas do tratamento dos estímulos. Podem deste modo como com acções. O princípio de todos estes Os procedimentos graças aos quais o pesquisador ser experimentados modelos de tratamento da informação em que o resultado de uma dada operação constitui o ponto métodos é que a variável ou variáveis teóricas ultrapassa as dificuldades de tradução da sua va- de partida da operação seguinte, e modelos em que as duas operações se desenrolam paralelamente. As intervenções experimentais nestes processos revestem a forma de tarefas a realizar pelos sujeitos durante o tratamento dos estí- correspondem a uma ou várias grandezas latentes riável teórica em observações constituem medidas. mulos, sendo essas tarefas escolhidas de modo tal que a sua execução contraria determinada operação de tratamen- ou genotípicas, as quais determinam a probabili- Este passo da pesquisa constitui a pedra angular de to dos estímulos, ou, pelo contrário, a facilita. o estudo cronométrico pode incidir tanto sobre o tempo decorrido dade da ocorrência de uma determinada resposta todo o trabalho explicativo, pois é ele o elo de liga- entre a apresentação ao sujeito de um estímulo e o início da sua resposta, tempo de como sobre parâmetros que constitui a observação manifesta ou fenotípica. ção entre o modelo teórico, do qual constitui por- temporais caracterizando a execução desta: velocidade do movimento; por exemplo. Alguns métodos preconizam formatos de recolha ventura o aspecto mais importante, e as proprieda- o estudo do comportamento motor não se limita à perspectiva cronométrica. Variáveis de carácter qualitativo podem também ser observadas, como acontece com a observação de posturas corporais ou expressões faciais, cujo das observações que impõem a estas uma relativa des do real que esse modelo se propõe representar. estudo constitui um aspecto importante da pesquisa sobre o comportamento social. o estatuto destas observações é, unidimensionalidade, escalas de Thurstone (Thurs- Medir consiste em estabelecer uma correspon- no entanto, distinto do das respostas recolhidas na perspectiva cronométrica: enquanto nestas a forma específica da tone, 1931), e Likert (Likert,1932), outros consti- dência entre um conjunto de símbolos e um con- resposta é independente da função efectora desta, as posturas e expressões faciais não são independentes das suas tuem algoritmos destinados a recuperar essa uni- junto de acontecimentos discrimináveis traduzindo funções efectoras. Na perspectiva cronométrica, o experimentador escolhe arbitrariamente uma reacção a ser pro- dimensionalidade latente a partir de respostas e propriedades do real, de tal modo que as operações duzida pelo sujeito em resposta ao estímulo: carregar num botão ou levantar uma chave telegráfica. No estudo das posturas corporais e das expressões faciais, estas são escolhidas pelo sujeito no conjunto de outras que poderiam ser comportamentos manifestos eventualmente hete- realizadas sobre os símbolos correspondam a ope- produzidas em resposta a determinadas condições de estimulação. Assim, por exemplo, a emissão do sorriso particular rogéneos: escalas de Guttman (Guttman, 1950), rações sobre essas propriedades. Os conjuntos de designado por sorriso de Duchenne (Ekman, Davidson e Friesen, 1990) em resposta à aparição de determinada pes- análise de estrutura latente (Lazarsfeld, 1950), símbolos podem ser simples nomes corresponden- soa, será conceptualizada em relação à emissão de outros tipos de sorriso ou à apresentação de outros Deste escalonamento multidimensional (Shepard, Rom- tes a classes de equivalência, como sucede quando ponto de vista, estas observações não constituem comportamentos mas sim condutas, na medida em que a forma que revestem é determinada pela sua função efectora ou pelo papel que desempenham na comunicação ney e Nerlove, 1972). Enquanto os métodos de as respostas dadas por um determinado grupo de construção de escalas estão essencialmente voca- indivíduos a uma pergunta formulada pelo experi- cionados para a recolha de material simbólico, os mentador são contabilizadas segundo o número de considerações de ordem teórica. Uma tradição que balhos empíricos demonstram ser falsa: a frequên- métodos de análise tanto podem ser aplicados a respostas de cada tipo, vem dos tempos do domínio absoluto das teorias cia e a duração dos choques emitidos por um su- comportamentos como a respostas simbólicas. ou podem ser ainda conjuntos da aprendizagem leva a interpretar muitos destes jeito são determinados por mecanismos distintos, Na prática, sobretudo em trabalhos experimen- de números dotados de determinadas proprieda- aspectos enquanto indicadores diferentes da ten- identificados por certos autores (Donnerstein e tais, os pesquisadores contentam-se com uma uni- des, inteiros, reais positivos, etc., como os obtidos dência dos indivíduos a executar um determinado Donnerstein, 1973) como constituindo formas res- dimensionalidade aparente, obtida através de res- quando o experimentador mede, por exemplo, acto. Assim, em experiências cujo objectivo con- pectivamente directas e indirectas de agressão, e postas a perguntas muito simples escolhidas de tal o tempo de a um estímulo ou a amplitude siste em avaliar as condutas agressivas de um indi- por outros autores (Baron e Bell, 1974; Berkowitz, modo que a sua interpretação pelos sujeitos seja o de um movimento efectuado pelo sujeito. víduo que crê administrar choques eléctricos a um 1974) como sendo formas respectivamente preme- menos variável possível. Esta formulação é obtida, Concretamente, efectuar uma medição consiste outro são por vezes simultaneamente a ditadas e impulsivas de agressão. A multiplicidade em geral, por repetidos de diferentes for- em realizar um certo número de operações físicas duração, o número e a intensidade dos choques de interpretações denota, ao mesmo tempo, a insu- mulações junto de amostras da mesma população, ou simbólicas no decurso das quais uma certa escolhidos, sendo todas estas grandezas conside- ficiência do quadro teórico sobre o qual assenta a da qual será extraída a população experimental. margem de variabilidade vem juntar-se à grandeza radas como manifestações concretas de uma variá- escolha das observações e anecessidade de exami- Quando é usado este tipo de medida, chamado efectivamente medida. Assim, a execução repe- vel única, para a Trata-se de nar a estrutura das inter-relações entre os diferen- escala de cotação, o pesquisador contenta-se fre- tida de operações de medida de uma mesma uma suposição sem fundamento teórico, que tra- tes parâmetros caracterizando os comportamentos. quentemente com o facto de atribuir aos sujeitos grandeza dá origem a uma distribuição de valores</p><p>70 71 dessa grandeza oscilando à volta de um determi- protocolos de medida diferentes, mas que se supõe altruísta, será obtida quando uma nova experiência no caso da experimentação, o pesquisador aplica nado valor, chamado por vezes o valor verda- que avaliam uma mesma grandeza; b) com um vem que um outro comportamento, que um determinado tratamento experimental, con- deiro. Uma medida será considerada superior a mesmo protocolo e o mesmo instrumento de me- parece também ilustrar a conduta altruísta, por sistindo numa acção física ou simbólica sobre cer- uma outra, dizendo-se então mais fiel ou de fide- dida repetidas vezes; c) entre medidas aleatoria- exemplo, ajudar um indivíduo na execução de uma tos aspectos da situação, em seguida lidade superior, quando se aproxima de mais perto mente escolhidas num conjunto de medidas de uma determinada tarefa, é identicamente afectado pelos os efeitos resultantes desta acção. Em ambos os do valor verdadeiro. mesma grandeza, efectuadas com um mesmo pro- mesmos factores postos em evidência no caso em casos, o objectivo do investigador consiste em Um segundo aspecto importante para a avalia- tocolo e o mesmo Estas três opções que a conduta estudada consiste em dar esmolas. pôr em evidência determinadas relações entre as ção da qualidade das medidas é o da validade des- correspondem a concepções ligeiramente dife- Este tipo de validação foi sistematizado no procedi- observações, as quais deverão manifestar-se caso tas. Esta noção refere-se genericamente ao facto rentes da noção de fidelidade. Para a noção de fide- mento de validação cruzada proposto por Campbell modelo proposto para o fenómeno seja válido. de um conjunto de operações de medida de uma lidade que considera que a homogeneidade fun- e Fiske (1959), e recorre a uma lógica análoga à Observações e dados experimentais têm em co- determinada grandeza avaliar efectivamente essa cional das observações constitui, ao mesmo tempo, precedentemente exposta a propósito da medida mum muito mais do que o que se poderia pensar grandeza. Para além da mera validade aparente, uma condição de validade e de fidelidade, a terceira dos estados não observáveis. Um conceito teórico à luz da acalorada discussão a que tem dado azo consistindo em que uma determinada medição pa- destas opções constitui a pedra-de-toque da fideli- é válido se diferentes comportamentos reflectindo a escolha entre estes dois tipos de procedimento. rece reflectir razoavelmente as propriedades de dade. Na realidade, se um conjunto de medidas esse conceito teórico, avaliados graças a protocolos A interpretação causal dos dados da observação real às quais ela supostamente se refere, é usual representa o efeito de um único factor ou conjunto e instrumentos distintos, manifestam entre si uma exige que sejam aceites certos postulados porven- distinguir a validade externa, preditiva ou concor- de factores, sendo o erro de medida independente dependência mais forte que a observada entre esses tura de mais difícil aceitação que os exigidos no rente, da validade interna ou heurística. Os dois das grandezas medidas, a correlação observada comportamentos e as variáveis externas considera- caso de dados experimentais, mas também estes tipos de validade externa referem-se ao facto de entre duas amostras aleatórias da população de das pelo experimentador como factores afectando últimos não são interpretáveis, enquanto validação que uma determinada medida permite efectiva- medidas só difere da correlação perfeita por uma o comportamento visado pelo conceito teórico. de modelos causais, na ausência de suposições em- mente prever o efeito dos diferentes valores por quantidade correspondente ao erro de medida. piricamente Mau grado a argumen- ela tomados sobre outras variáveis medidas con- Das diferentes técnicas de avaliação da fideli- 3. Validação dos modelos: tação apresentada por opositores e defensores da correntemente ou futuramente. A noção de vali- dade que têm sido propostas convém mencionar observação e experimentação abordagem experimental na psicologia obser- dade interna refere-se ao facto de as variações de a análise de variância, pela sua importância prá- vação e experimentação constituem instrumentos determinados factores, que, em certas condições, tica no caso da utilização de juízes aos quais são Uma vez formulada a questão à qual se pre- de conhecimento válidos e produtivos, quando devi- devem afectar o valor da grandeza medida, se tra- pedidos julgamentos de vários objectos ou pessoas tende responder, identificadas as variáveis perti- damente empregues, no respeito das condições de duzirem realmente por variações dessa grandeza. e pelo papel que este modelo desempenha nas teo- nentes e elaborado um modelo das relações entre validade próprias a cada procedimento. No entanto, Convém notar que fidelidade.e validade corres- rias modernas da medida psicofísica. processo estas, encontra-se o pesquisador perante a neces- cada um destes métodos corresponde a condições pondem a noções muito próximas, cuja indepen- de avaliação da fidelidade das medidas baseado sidade de recolher informações que lhe permitam distintas de elaboração do saber. A escolha entre dência só se manifesta em certos tipos de estratégia nos modelos de análise da variância autoriza uma avaliar a verosimilhança desse modelo. eles deve, pois, resultar de uma análise dessas de conhecimento: uma medida fiel é uma medida avaliação comparativa das diferentes fontes de Em geral, uma pesquisa tem por objectivo va- condições e não de posições filosóficas que pouco do conceito global representando o comportamento erro de uma medida e permite uma investigação lidar um modelo causal de um determinado fenó- têm a ver com a actividade real do pesquisador. ou os comportamentos que a compõem, quer este da natureza destas. meno, ou descrever características tanto operatórias À primeira vista poderá parecer que experi- corresponda ou não à noção que o investigador tem Em numerosos casos, sobretudo quando se trata como estruturais de certos objectos: indivíduos, mentação e observação estão cada uma calibradas desse conceito global, quer aquele possua ou não de trabalhos experimentais, o investigador consi- grupos ou instituições. Em função do objectivo que para a validação de modelos teóricos distintos: um valor heurístico ultrapassando o âmbito das ob- dera que as observações de um determinado com- se propõe atingir, o pesquisador concebe uma estra- enquanto a experimentação constituiria o método servações que parecem ilustrá-lo. Mais ainda, um portamento são válidas porque o comportamento tégia de pesquisa, combinando eventualmente dife- apropriado de pôr à prova relações de carácter conceito global só pode ser válido, isto é, só pode em questão lhe parece intuitivamente ilustrar o rentes procedimentos e técnicas de investigação. causal entre as variáveis tomadas em consideração revelar correlações estáveis com medidas de outros conceito teórico que a ele interessa. Por exemplo, Dois tipos de procedimento podem ser utiliza- pelo investigador, a observação seria particular- conceitos, na medida em que for fielmente medido. o facto de dar esmolas poderá parecer em muitos dos para a colheita de dados: no caso da observa- mente indicada quando este deseja obter uma des- Os processos clássicos de avaliação da fideli- casos um comportamento apropriado para medir ção, o pesquisador limita-se a manter um crição estrutural ou funcional dos objectos que dade consistem em estudar o grau de correlação a conduta altruísta. A validação da suposição feita dos acontecimentos ou dos aspectos pertinentes se propõe investigar. No entanto, não só modelos entre medidas efectuadas: a) com instrumentos e pelo investigador, a qual diz respeito à conduta destes que ocorrem numa determinada situação; causais de fenómenos que por diferentes razões</p><p>72 73 escapam a uma abordagem experimental são por gências quer se trate de pesquisas observacionais como os impropriamente chamados planos quase será aplicado o tratamento, decisão essa que de- vezes validados por meio de estudos observa- quer de pesquisas experimentais. experimentais propostos por Campbell e Stanley terminará a interpretação feita por aquele dos cionais, como também modelos que pouco têm de Duas características dos estudos experimentais (1966). A lógica global dos planos propostos por resultados da experiência. causal, como os da psicofísica, exigem a interven- diferenciam estes dos estudos observacionais: por estes autores consiste em obter séries temporais Com efeito, se, após a aplicação do tratamento ção de tratamentos experimentais para que sejam um lado, a intervenção efectiva do experimentador de observações dos mesmos indivíduos ou grupos experimental, o experimentador regista uma dife- reveladas as características funcionais do processo por via da aplicação do tratamento experimental, antes e depois da intervenção do acontecimento rença entre as duas unidades que constituem a ex- sobre o qual incide a investigação. por outro, a independência entre os valores da va- que realiza a variável independente. As séries periência, antes de poder concluir que essa dife- Com bastante frequência, o modelo causal riável independente e os objectos sobre os quais assim-obtidas são comparadas às conseguidas com rença provém realmente do tratamento aplicado a constitui a meta final do pesquisador, sendo a des- aqueles são realizados. Do ponto de vista da eco- outros grupos seleccionados de modo a excluir uma delas, deve assegurar-se de que essa diferença crição apenas um primeiro passo. Assim, a fase nomia da explicação, a primeira destas caracterís- interpretações alternativas das variações observa- não existia já antes da aplicação do tratamento. inicial do estudo de um terreno inexplorado pode ticas tem por consequência garantir a precedência das da variável dependente. A solução desta dificuldade encontra-se na apli- visar uma descrição de um comportamento ou dos temporal da causa em relação ao efeito, enquanto a cação da técnica de aleatorização, a qual constitui comportamentos que se numa ou várias segunda assegura ao experimentador que as varia- 3.2. Experimentação: noções gerais o aspecto mais saliente da concepção contempo- situações recorrentes. Esta fase constitui já o pri- ções da variável dependente registadas são devidas rânea da experimentação. Se o tratamento tiver sido meiro passo de uma pesquisa que posteriormente aos valores tomados pela variável independente e Aleatorização e erro experimental atribuído aleatoriamente às duas unidades experi- terá como objectivo a identificação dos factores não a características dos objectos sobre os quais Na sua forma mais elementar, uma experiência mentais, isto é, se cada unidade experimental tiver e dos mecanismos que intervêm na produção do são registadas essas variações. Do ponto de vista consiste na aplicação de um tratamento experi- igual probabilidade de receber o outro tratamento, ou dos comportamentos observados. As variações do modelo estatístico, a independência dos trata- mental a uma de duas unidades experimentais, as supondo que, à partida, o experimentador não dis- de comportamentos registadas entre as diferentes mentos e dos objectos aos quais estes são admi- quais são em seguida comparadas, a fim de avaliar de qualquer informação a respeito das caracte- situações em que estes são observados à partida nistrados assegura que a experiência efectivamente a diferença introduzida entre elas pela aplicação rísticas de cada unidade experimental, a probabili- constituem frequentemente uma fonte de infor- realizada pôde ser considerada como uma amostra desse tratamento. A essa diferença chama-se o dade de este atribuir erroneamente ao tratamento mação capaz de conduzir o pesquisador à formu- de uma população de experiências, o que constitui efeito do tratamento. Um tratamento experimental experimental diferenças existentes entre estas an- lação de hipóteses respeitantes à intervenção de uma condição indispensável para um cálculo ade- consiste numa acção ou um conjunto de acções tes da aplicação do tratamento será tão pequena determinados factores na produção do ou dos quado do erro afectando o conjunto das observa- deliberadamente exercidas pelo experimentador quanto possível. É claro que esta garantia relativa comportamentos a estudar. Por seu turno, estas ções. Ora, graças a um planeamento apropriado da sobre as unidades experimentais ou sobre as con- é insuficiente para servir de base a conclusões por hipóteses levarão à realização de estudos experi- colheita dos dados, não só é possível, em muitos dições da experiência. Por razões que mais adiante parte do experimentador. A este interessa, antes de mentais tendo por objectivo, numa primeira fase, casos, medir num estudo observacional as variá- serão expostas, nem diferenças entre as unidades mais, avaliar o grau de certeza das suas conclu- confirmar papel desempenhado pelos factores veis independentes de tal modo que a precedência experimentais que não resultam da intervenção A atribuição aleatória das unidades experi- considerados e, numa fase posterior, medir os temporal dos valores destas em relação aos da va- do experimentador, como o sexo ou a idade dos mentais aos diferentes tratamentos cria justamente efeitos destes a fim de chegar a um modelo pre- riável dependente seja assegurada, o que acontece indivíduos, nem as que resultam de acções invo- as condições necessárias para que não só o grau de ciso das determinações do comportamento origi- quando se efectuam observações diacrónicas, luntariamente exercidas por este, constituem tra- certeza das conclusões extraídas pelo experimenta- nariamente considerado. como também é possível organizar a recolha destas tamentos experimentais, mesmo quando essas dor seja o mais elevado possível, como também de tal maneira que o erro que as afecta possa ser diferenças são explicitamente consideradas pelo torna viável avaliar esse grau de certeza. 3.1. Estudos observacionais estimado sobre a base dos mesmos modelos esta- experimentador enquanto factores susceptíveis de Graças à aleatorização, as observações efec- tísticos que os aplicáveis a observações experimen- afectar o resultado de uma experiência. A aplica- tuadas estarão protegidas contra distorções sis- Convém desde já excluir a ideia segundo a qual tais não independentes. ção de um tratamento experimental a uma unidade temáticas ligadas às características intrínsecas a observação constituiria uma forma menos rigo- É precisamente a aplicação da teoria dos planos constitui um ensaio e a realização de um ensaio da das unidades experimentais, e poderão constituir rosa da experimentação. Observar não consiste experimentais a situações de recolha de dados totalidade dos tratamentos estudados numa expe- a base para inferências estatísticas tendo por em registar sem hipóteses e sem regras aquilo que observacionais que, submetendo os dois procedi- riência constitui uma réplica desta. objectivo medir o grau de confiança que mere- se passa numa determinada situação. A constru- mentos a exigências de validade análogas, permite A experiência elementar acima descrita im- cem as conclusões extraídas dessas observações. ção das variáveis dependentes obedece aos mes- a elaboração de planos de colheita de dados obser- plica uma decisão da parte do experimentador Se na experiência anteriormente considerada mos princípios e deve satisfazer as mesmas exi- vacionais autorizando uma interpretação causal, quanto à escolha da unidade experimental à qual tínhamos uma probabilidade de 0,50 para que a</p><p>74 75 unidade experimental favorecendo eventualmente casuais, como a ordem de chegada dos sujeitos ao antes da aplicação dos tratamentos e o erro experi- Em numerosas situações práticas, a duração o efeito da aplicação de um dado tratamento fosse laboratório ou a posição destes numa lista cuja mental; a outra técnica consiste em agrupar as uni- da aplicação dos tratamentos experimentais ou o efectivamente atribuída a esse tratamento, se reali- ordem não foi aleatorizada previamente. Uma tira- dades experimentais antes da aplicação dos trata- grande número destes torna impossível a realização zarmos uma réplica da experiência com novas gem aleatória implica a realização de uma opera- mentos em blocos de unidades semelhantes, de tal de uma réplica completa da experiência num pe- unidades experimentais a probabilidade para que ção física garantindo uma igual probabilidade de modo que cada réplica seja efectuada sobre unida- ríodo de tempo suficientemente curto para que seja esse facto se produza nas duas réplicas baixa para ocorrência dos acontecimentos possíveis, procedi- des experimentais menos heterogéneas, limitando mantida uma normalização suficiente das condi- 0,25, e, se realizarmos cinco réplicas, ela é apenas mento difícil de pôr em prática excepto nos casos deste modo a contribuição das diferenças entre as ções de aplicação dos tratamentos. A solução desta de 0,03. Por isso, quando as unidades experimen- mais simples, e cujos resultados estão justamente unidades experimentais para o erro experimental. dificuldade reside na constituição de blocos com- tais são atribuídas aleatoriamente aos tratamentos, registados nas tabelas. Muitos planos experimen- o agrupamento das unidades experimentais em postos por uma parte do número total de tratamen- um dos meios de aumentarmos a certeza das nos- tais complexos requerem a realização de mais de blocos relativamente homogéneos constitui uma tos, escolhidos de tal modo que as diferenças entre sas conclusões relativas ao resultado de uma expe- uma tiragem, de acordo com determinadas regras solução utilizável em todos os casos em que dife- os tratamentos que constituem o centro de interes- riência consiste na realização de número crescente precisas. Antes de utilizar este tipo de plano, deve renças importantes entre as unidades experimen- ses da experiência sejam calculadas no interior dos de réplicas. À medida que formos realizando no- o experimentador estudar cuidadosamente estas tais ou entre as condições de administração dos blocos, e as diferenças menos importantes sejam vas réplicas, a diferença observada entre as unida- regras, que poderá encontrar, por exemplo, no clás- tratamentos, cujo efeito é pertinente para os objec- confundidas com as diferenças entre os blocos. Esta des experimentais que recebem o tratamento e as sico Experimental Designs (Cochran e Cox, 1952). tivos da experiência, podem ser determinadas. técnica, chamada confusão (confusão de efeitos outras vai tender para um dado valor, em torno do Assim, por exemplo, um dado método de ensino experimentais e de diferenças entre blocos de uni- qual se distribuem os valores observados. A varia- Técnicas de redução do erro experimental deve ser comparado com um outro, utilizando dades experimentais), é relativamente pouco usada ção das observações em torno desse valor constitui A única fonte de erro experimental que encará- para isso efectivos escolares disponíveis em esta- na experimentação em psicologia social, apesar das o erro experimental. mos até aqui reside na heterogeneidade das unida- belecimentos diferentes. agrupamento em blo- suas vantagens evidentes num terreno caracterizado O objecto dos métodos de inferência estatística des experimentais. Deste modo, o único método de cos dos alunos provenientes de um mesmo esta- pela complexidade dos tratamentos experimentais e consiste precisamente em obter estimativas do va- redução do erro experimental que fomos levados a belecimento eliminará do erro experimental os pela heterogeneidade das unidades experimentais lor do erro experimental e, dada essa estimativa, mencionar consiste na realização de um maior nú- efeitos de diferenças de nível escolar, motivação, (indivíduos ou grupos de indivíduos) estudadas. determinar a probabilidade de ocorrência de uma mero de réplicas. Se as unidades experimentais são ou hábitos de aprendizagem entre os alunos dos O agrupamento das unidades experimentais em diferença entre unidades experimentais tão grande fortemente heterógeneas, como é geralmente o caso diferentes estabelecimentos. agrupamento é par- blocos homogéneos quanto a uma característica como a que foi observada quando o tratamento na psicologia, o ganho de precisão obtido pela mul- ticularmente útil num caso que se apresenta com destas constitui uma técnica que pode ser gene- aplicado não exerce qualquer efeito. tiplicação das réplicas tende a ser pequeno, e um frequência na prática em experiências nas quais ralizada a duas ou mais características. Assim, A importância crucial da aleatorização é frequen- grau de precisão suficiente para fornecer uma ga- um comportamento elaborado do comparsa cons- os indivíduos chamados a participar numa expe- temente subestimada pelos autores de textos de rantia suficiente a conclusões por parte do experi- titui o tratamento experimental. Neste tipo de riência podem ser caracterizados simultaneamente metodologia destinados aos psicólogos e ignorada mentador pode exigir a realização de um número experiência, dados os efeitos de prática que se pela sua ordem de nascimento na fratria e pela sua por estes no seu trabalho. Convém sublinhar que os proibitivo destas. Um outro meio para melhorar a exercem sobre o comparsa, uma diferença entre as idade. Se a experiência comporta, por exemplo, modelos de inferência estatística utilizados na aná- precisão da experiência torna-se neste caso neces- primeiras unidades tratadas e as tratadas posterior- três tratamentos experimentais, podemos estrati- lise dos dados experimentais exigem estritamente sário. Esse meio consiste na exploração de conhe- mente torna-se muito provável. Para além de uma ficar os indivíduos segundo a sua ordem de nasci- um tal procedimento enquanto condição de vali- cimentos do experimentador relativos às unidades escrupulosa normalização da técnica de adminis- mento: primeiro, segundo, terceiro e posterior ao dade das conclusões tiradas. Com efeito, é a alea- experimentais obtidos antes da aplicação dos trata- tração dos tratamentos experimentais, o experimen- terceiro nascimento, e, de novo, estratificar cada torização que pode garantir não só a independência mentos. Este princípio constitui o fundamento de tador pode obter ganhos de precisão substanciais um destes três grupos segundo a idade dos indiví- das observações como também a homogeneidade duas técnicas cujo objectivo consiste em aumentar por meio do agrupamento das réplicas em função duos, por exemplo, menos de trinta anos, mais de do erro experimental, isto é, a comparabilidade das a precisão de uma experiência sem multiplicar o nú- da ordem de administração. Deste modo as dife- trinta e menos de sessenta anos, mais de sessenta diferentes condições experimentais. Do ponto de mero de réplicas. Uma dessas técnicas, a análise de renças entre as réplicas realizadas em períodos di- anos. Os tratamentos serão aplicados aos nove vista prático, a atribuição aleatória das unidades co-variância, utiliza um processo de ajustamento ferentes serão adicionadas às diferenças entre os grupos assim constituídos, de tal modo que cada experimentais deverá ser feita por meio de tabelas efeitos dos tratamentos experimentais por meio blocos em que foram agrupadas as réplicas, em vez tratamento seja aplicado uma só vez a cada grupo de números ou de permutações aleatórias, e, em de coeficientes que traduzem a relação entre certas de contribuírem para aumentar o erro experimen- de indivíduos caracterizados por uma dada ordem caso algum, por meio de decisões aparentemente características das unidades experimentais medidas tal, o qual condiciona a precisão da experiência. de nascimento e uma dada idade.</p><p>76 77 Este tipo de agrupamento é chamado um qua- ou a compreensão dos objectivos do experimen- experimentador, deve afectar a manifestação de um Num grande número de casos, porém, ele está drado latino, e a sua generalização a um agrupa- tador pelos sujeitos. determinado Quando a teoria à qual o interessado em avaliar os efeitos de mais de um mento segundo três características das unidades Por vezes, a normalização das condições objec- experimentador se refere constitui uma descrição factor. Nesse caso, o experimentador pode esco- experimentais constitui um quadro tivas pode opor-se à normalização das condições do real em termos quantitativos, os diferentes trata- lher entre a realização de experiências diferentes Estes tipos de agrupamento são, por vezes, utiliza- subjectivas: instruções idênticas para todos os su- mentos experimentais podem corresponder, por para avaliar efeito de cada factor, ou encarar dos na experimentação em psicologia, a fim de eli- jeitos, fornecidas, por exemplo, por meio de grava- exemplo, a doses variáveis de um determinado in- a possibilidade de aplicar a cada unidade experi- minar distorções sistemáticas ligadas à ordem de ções, não garantem, e podem por vezes impedir, grediente administrado às unidades experimentais, mental mais de um tratamento, reunindo numa só aplicação dos tratamentos experimentais em expe- uma idêntica compreensão dessas instruções por ou, mais frequentemente, a aspectos das condições experiência os diferentes factores experimentais riências nas quais mais de um tratamento experi- parte de cada um destes. Neste caso, convém, em da experiência que variam quantitativamente nas cujos efeitos lhe parecem dever ser elucidados. mental é aplicado a cada unidade experimental. geral, tentar a normalização das condições subjec- diferentes situações experimentais, como o grau As experiências nas quais mais de que um trata- Paralelamente à heterogeneidade das unidades tivas, tendo, no entanto, presente que, quando isto de intensidade com que um determinado estímulo mento experimental é aplicado a cada unidade são experimentais, duas outras fontes contribuem é feito, o plano experimental deve comportar meios é apresentado aos sujeitos, ou o nível de comple- chamadas multifactoriais. Este tipo de experiência significativamente para a grandeza do erro experi- que permitam avaliar o grau de validade da ma- xidade de uma mensagem que lhes é dirigida. permite avaliar, paralelamente aos efeitos de cada mental: o erro de medida presente nas observa- nipulação experimental dos factores subjectivos. Noutros casos, a teoria refere-se a aspectos factor, os que resultam da combinação de dois ou ções efectuadas e as variações involuntariamente De um modo geral, esta opção implica a realização qualitativos do real, e cada situação experimental mais factores. O efeito específico da combinação de introduzidas pelo experimentador na aplicação de tratamentos experimentais especificamente con- realiza uma determinada modalidade de uma mais de um factor experimental é chamado efeito dos tratamentos. cebidos para este fim. simples questionário pós- noção teórica que comporta aspectos qualitati- de enquanto o efeito diferencial da apli- Como já tivemos ocasião de ver anteriormente, -experimental, muitas vezes usado para avaliar do vamente diferenciados. Assim, uma mensagem cação dos diferentes níveis de um factor, quaisquer o processo de medição contribui com uma certa grau de sucesso deste tipo de intervenção, está su- pode ser proposta a um grupo de sujeitos como que sejam os de outros factores presentes na expe- dose de variabilidade na avaliação das grandezas, jeito a distorções importantes ligadas à necessidade reflectindo a posição de um grupo maioritário em riência, é chamado efeito principal desse factor. a qual é tanto menor quanto a medida utilizada de coerência da parte dos sujeitos, os quais tendem relação a determinada questão e ser proposta a um Um efeito de interacção de dois factores é re- possuir um grau de fidelidade mais elevado. a dar ao questionário respostas inspiradas da sua outro grupo de indivíduos como reflectindo uma gistado cada vez que o efeito de um determinado Assim, um dos modos de aumentar a precisão de representação normativa da experiência e do papel posição minoritária. factor não é idêntico em cada nível de um outro fac- uma experiência consiste em aperfeiçoar as ope- que julgam desempenhar nesta. conjunto dos tratamentos experimentais que, tor aplicado em combinação com aquele. Se, por rações de medição, de maneira a melhorar a fide- de acordo com a hipótese formulada pelo expe- exemplo, numa determinada experiência, diferen- lidade das medidas estudadas. Tratamentos e factores experimentais rimentador, exercem efeitos discriminavelmente tes recompensas forem oferecidas pelo experi- Por maior que seja o cuidado com que o expe- No caso mais elementar, a teoria posta à prova diferentes sobre as unidades experimentais através mentador quando os sujeitos executam uma dada rimentador procede à realização dos ensaios, di- pelo experimentador limita-se a postular que um de um mecanismo único, quantitativamente ou resposta, e essas recompensas oferecerem valores ferenças na aplicação dos tratamentos de uma ré- determinado tratamento experimental exerce um qualitativamente caracterizado, é chamado um diferentes para os sujeitos de sexo masculino e fe- plica para outra tendem a produzir-se. No caso da efeito. Nestas condições, o experimentador limi- factor e os diferentes tratamentos experimentais minino, a probabilidade de execução dessa resposta experimentação em psicologia social, em que um tar-se-á a aplicar o tratamento em questão a um que o constituem são chamados os níveis desse dependerá não só das recompensas oferecidas, e grande número de unidades experimentais são grupo de sujeitos, abstendo-se de o aplicar a um factor, quer eles sejam quantitativa ou qualitativa- eventualmente do sexo dos sujeitos, mas também tratadas sucessivamente por um mesmo experi- outro grupo. Este último grupo, chamado por vezes mente distintos. efeito de um factor corresponde, da combinação de uma determinada recompensa mentador e nas quais comparsas deste têm papéis grupo controlo, servirá de termo de comparação pois, às diferenças criadas entre as unidades expe- e do sexo dos sujeitos aos quais esta é oferecida. predeterminados a desempenhar no contexto destinado a pôr em evidência a diferença introdu- rimentais às quais foram aplicados os tratamentos Assim, quando experimentador detecta um efei- experimental, é necessário um cuidado extremo zida pelo tratamento experimental. No entanto, no que constituem os diferentes níveis desse factor. to de interacção de dois ou mais factores, é levado a na normalização das condições de aplicação dos caso mais comum, os tratamentos experimentais concluir que a acção exercida por cada um deles não tratamentos. Estes cuidados devem incidir não só cujo efeito se pretende avaliar numa dada pesquisa Experiências multifactoriais: é independente da exercida pelos outros, não po- sobre os factores objectivos de heterogeneidade têm entre si uma relação lógica mais ou menos efeitos aditivos e dendo o efeito total dos diferentes factores ser obti- instruções, material, intervenções dos compar- explícita, a qual deriva do facto de que cada trata- Na experiência elementar que considerámos do pela simples adição dos efeitos de cada um deles. sas mas também sobre os factores subjectivos, mento experimental realiza concretamente uma das até este ponto, o objectivo do experimentador con- Interessa neste caso considerar o efeito exercido como o clima social da aplicação dos tratamentos condições que, segundo a teoria posta à prova pelo siste em avaliar o efeito de um dado factor. por um determinado factor a cada um dos níveis</p><p>78 79 dos outros factores presentes na experiência. interessado no estudo simultaneo de dois ou mais diferenças entre grupos de tratamentos que levam ção com coeficientes polinominais ortogonais e A este efeito é dado o nome de efeito simples do factores, técnicas de análise de dados discutíveis e a definir comparações ou contrastes que não cor- aplicação à variável dependente de transformações factor. É possível, em geral, calcular os efeitos interpretações erróneas de resultados experimen- respondem a efeitos de interacção tal como estes matemáticas constitui, em geral, um auxílio inter- simples, tanto principais como de cha- tais são extremamente frequentes em trabalhos pu- são habitualmente definidos. As comparações a pretativo precioso. As transformações da escala de mados respectivamente efeitos simples principais blicados. A fim de evitar estas dificuldades é indis- efectuar são evidentemente as que correspondem a medida das observações têm sido largamente apli- e efeitos simples de interação. Quando um factor pensável uma boa compreensão do significado dos diferenças teoricamente pertinentes e não as que cadas na solução deste tipo de problema no quadro estudado numa experiência exerce o seu efeito in- diferentes valores que caracterizam os resultados dizem respeito a um modelo estatístico escolhido dos trabalhos sobre a percepção. Convenciona-se, dependentemente dos valores tomados pelos res- obtidos quando da aplicação de planos multifacto- sobre.a base de um procedimento rotineiro. neste terreno, que, se um efeito de interacção per- tantes factores, a soma dos efeitos simples desse riais. procedimento frequentemente observado Os problemas de interpretação dos efeitos de siste para além da aplicação à variável dependente factor, calculados no interior de cada nível dos em artigos publicados, consistindo em efectuar interacção são particularmente complexos em ra- de transformações monótonas, este reflecte uma outros factores, é igual ao efeito principal desse comparações de médias de tratamentos quando zão da variedade das situações nas quais estes se não linearidade da relação entre variáveis depen- factor. Não sendo esse o caso, aos efeitos simples uma interacção é detectada a fim de identificar as manifestam e das causas que lhes dão origem. dentes e independentes não imputável à escolha da principais de um dado factor será necessário juntar de denota uma interpretação Uma interacção tanto pode provir das característi- medida da variável dependente. Se um dos facto- todos os efeitos simples de interacção associados inexacta da noção estatística de interacção e con- cas métricas da variável observada como da não res implicados num efeito de interacção é quanti- a esse factor para obter o seu efeito principal. duz frequentemente a inferências infundadas. Um linearidade da relação entre essa variável e a va- tativo e o outro é qualitativo, o exame do perfil dos As considerações precedentes permitem indicar efeito de interacção é medido por parâmetros que riável independente. Certos efeitos de interacção resultados do factor quantitativo a cada um dos quais as condições mais apropriadas para um re- provêm não de diferenças entre tratamentos mas implicam apenas dois factores não comportando níveis do factor ou dos factores qualitativos por curso aos planos multifactoriais: as fases iniciais da de diferenças entre diferenças entre tratamentos, mais que dois níveis cada um, outras implicam um meio de contrastes polinominais ortogonais faci- elaboração de uma questão, no decurso das quais caracterizando assim relações entre factores e não maior número de factores comportando, por ve- lita em geral a compreensão do fenómeno estu- numerosas variáveis dependentes e independentes relações entre tratamentos, podendo perfeitamente zes, factores com mais de dois níveis. Em certos dado, sendo, no entanto, utilizadas, por vezes, téc- de contornos indecisos são encaradas enquanto existir sem que para isso seja necessário que exis- casos, os níveis de um ou mais factores têm entre nicas de ajustamento mais rigorosas. M. Cox alternativas de formulação, constituem o domínio tam diferenças entre tratamentos. si relações claras, constituindo, por exemplo, uma (1952) indica sumariamente soluções aplicáveis privilegiado da utilização deste procedimento. Os efeitos de juntamente com os classificação ordinal, noutros casos as relações a este género de problema. Ao contrário do que é frequentemente praticado, outros, especificam um determinado modelo da entre os níveis são insuficientemente explícitas Interacções entre factores qualitativos com as experiências multifactoriais devem comportar repartição da variância dos valores observados para autorizarem um raciocínio em termos de fac- mais de dois níveis podem sempre ser reduzidas numerosos factores, eventualmente relacionados numa experiência, e é esse modelo, o qual inclui tores, como é tipicamente o caso de factores cujos a um conjunto de comparações ortogonais de por interacções de primeiro ou segundo grau, cujos os postulados necessários para que o cálculo dos níveis são classificações naturais, como a idade ou diferenças entre tratamentos, procedimento par- efeitos sobre um número limitado de réplicas são, estimadores dos diferentes parâmetros possa ser o sexo dos indivíduos. Algumas vezes o compor- ticularmente útil no caso de interacções desor- deste modo, submetidos a um primeiro exame. realizado, que é posto à prova. Se o efeito de in- tamento observado pelo experimentador é directa- denadas entre factores comportando numerosos Numa fase posterior, os mesmos factores, suficien- teracção observado numa experiência não satisfaz mente aquele a cuja teoria se refere, noutros casos, níveis. Este tipo de procedimento deve ser uti- temente isolados por meio de uma selecção das as exigências do modelo teórico ao qual o experi- porventura os mais frequentes, o comportamento lizado com o maior cuidado no que respeita à unidades experimentais, ou reformulados de modo mentador se refere, compete a este transformar os observado é um mero indicador da variável teórica inferência estatística, na medida em que, sendo a não implicarem relações não aditivas, serão sub- seus dados a fim de neutralizar o, efeito de interac- visada pelo experimentador e pode ou não estar particularmente vulnerável à heterogeneidade do metidos a um exame mais detalhado tendo em vista ção e, correlativamente, modificar o seu modelo linearmente relacionado com esta. erro experimental, supõe um controlo rigoroso de uma elucidação mais completa das relações entre a teórico para nele acomodar a transformação efec- A enorme variedade de casos concretamente todos os factores susceptíveis de afectar este em variável ou variáveis dependentes e os factores hi- tuada. Não sendo isso possível, convirá abandonar encontrados impede de fornecer mais que indi- determinados tratamentos experimentais. poteticamente implicados na determinação destas. o modelo estatístico comportando o efeito de in- cações gerais aplicáveis em muitos desses casos. teracção e analisar os dados a partir de um modelo verificadas entre factores quantita- Medições repetidas das mesmas Interpretação dos efeitos de interacção estatístico apropriado ao modelo teórico que se tivos devem levar o experimentador a encarar a unidades experimentais Apesar da existência de uma literatura estatís- deseja pôr à prova. Em muitos casos, este novo possibilidade de relações não lineares entre as va- Do ponto de vista do plano experimental, tica vastíssima consagrada aos procedimentos a modelo conduz a hipóteses relativas a diferenças riáveis teóricas ou entre estas e as observações experiências em que cada unidade experimental é empregar no caso em que o experimentador está entre tratamentos considerados dois a dois, ou a delas efectuadas. o recurso a contrastes de interac- observada mais que uma vez, contrariando o prin-</p><p>80 81 bidas para evitar distorções sistemáticas provoca- Controlo experimental no caso PLANOS MULTIFACTORIAIS das por este tipo de dependência. Estas medidas de medições repetidas das mesmas traduzem-se, em geral, pela necessidade de incluir unidades experimentais A introdução dos planos multifactoriais no arsenal metodológico posto à disposição dos psicólogos foi sau- dada em seu tempo como um progresso capital. Com efeito, uso de planos multifactoriais leva não só a uma econo- no plano experimental factores técnicos suple- mia considerável de material experimental um mesmo número de unidades experimentais permitindo pôr à prova mentares, tais como a ordem de administração de meio mais simples, e, por vezes, o único apli- várias hipóteses em vez de uma mas também amplifica consideravelmente o valor heurístico da experimentação. determinado tratamento, anulando deste modo a cável, consiste em aleatorizar, independentemente Com efeito, quando os factores experimentais pelos quais o experimentador se interessa não têm efeitos aditivos, aparente vantagem do uso repetido das mesmas para cada unidade experimental, a ordem de apli- experiências distintas, estudando cada uma um só factor, forneceriam informações aparentemente contraditórias, unidades experimentais. cação dos diferentes tratamentos aos quais esta a partir das quais seria impossível, ou, em todo o caso extremamente difícil, deduzir a natureza da relação entre os factores A realização de experiências estudando simultaneamente vários factores facilita a identificação Convém distinguir dois tipos de experiência é submetida. Um exemplo deste procedimento, dos mecanismos implicados na interdependência entre os factores estudados, autorizando a reformulação da teoria que dão origem a medições repetidas das mesmas o qual deveria constituir prática constante, reside original em termos tais que os factores cuja não dependência foi experimentalmente posta em evidência venham unidades experimentais: em certos casos, um na aleatorização independente para cada inquirido a ser representados por novas variáveis, conduzindo à consideração de factores independentes. mesmo tratamento é aplicado repetidamente ou da ordem das perguntas que comporta um ques- o paradoxo implicado por esta afirmação, segundo a qual convém identificar as entre factores para melhor se desembaraçar destas, é apenas aparente. Com efeito, quando isso é possível, uma formulação teórica não permanentemente durante um certo período de tionário. Nestas condições, os efeitos eventuais comportando efeitos de interacção é de longe preferível a uma formulação que admite numerosas excepções ou casos tempo às mesmas unidades experimentais, sendo da ordem em que cada pergunta é colocada aos particulares, correspondentes a combinações específicas de factores. A existência de relações aditivas entre as o seu efeito repetidamente avaliado; noutros inquiridos são adicionados ao erro experimental. variáveis primitivas de uma teoria é uma condição importante para que os elementos de conhecimento fornecidos casos, diferentes tratamentos experimentais são Na eventualidade mais desfavorável, o aumento por cada experiência se adicionem, permitindo deste modo obter o resultado esperado da aplicação do método cien- sucessivamente aplicados a uma mesma unidade. do erro experimental pode anular os ganhos em tífico saber cumulativo. De um modo geral, uma teoria comportando relações não aditivas entre as variáveis que primeiro caso encontra-se, em geral, quando o precisão ligados à utilização repetida das mesmas a constituem pode ser transformada numa teoria expressa por relações aditivas, ou por meio de transformações da escala de medida das variáveis, ou graças a uma conceptualização apropriada da variável ou variáveis implicadas. experimentador à prova hipóteses relativas à unidades experimentais. Um segundo meio, utili- distribuição de um dado fenómeno no tempo, o zável quando o número de tratamentos é reduzido, cípio da independência das observações, não dife- mais de uma medição de cada unidade experimen- segundo caso quando a razão principal do recurso consiste em construir todas as sequências pos- rem das experiências em que cada unidade con- tal existe indiscutivelmente quando o mecanismo a medições repetidas das mesmas unidades reside síveis da ordem de aplicação dos tratamentos ou tribui para o resultado com uma só observação: os que interessa ao experimentador só pode ser estu- no desejo do experimentador de reduzir o erro uma amostra representativa destas, e aleatorizar planos de recolha das observações são idênticos dado através deste tipo de observações. Um outra experimental, eliminando deste as eventuais dife- a atribuição das unidades experimentais às dife- em ambos os casos. No entanto, do ponto de vista boa razão para efectuar mais de uma observação renças entre unidades experimentais. No primeiro rentes ordens de administração dos tratamentos. da análise dos resultados, as experiências em que sobre cada unidade experimental pode por vezes caso, o experimentador está em geral interessado Neste caso, os efeitos ligados às diferentes ordens cada unidade é observada mais do que uma vez ser a necessidade de abordar processos em que em fenómenos de prática, fadiga, aprendizagem de aplicação não vêm adicionar-se ao erro experi- obrigam a ajustamentos, a fim de eliminar o efeito a variabilidade interindividual dos resultados em ou extinção de um determinado comportamento, mental. A ordem de aplicação constituirá um fac- da não independência das observações por meio relação à grandeza dos efeitos experimentais que é e a dependência estocástica das medições suces- tor suplementar, o qual terá tantos níveis quantas da co-variância, a qual constitui uma medida da possível obter nas melhores condições realizáveis sivas constitui justamente o objecto que ele se as ordens em que são aplicados os tratamentos, ligação entre as diferentes séries de observações é tão importante que esta opção se torna propõe elucidar. Técnicas de análise análogas às sendo os efeitos deste factor avaliados separada- feitas sobre as mesmas unidades. Como todos os No entanto, a razão porventura mais frequente para apropriadas ao estudo de factores experimentais mente. A criação deste novo factor poderá ter, no métodos que implicam ajustamentos das observa- recorrer a observações repetidas das mesmas uni- quantitativos serão neste caso empregues para entanto, consequências adversas no que respeita ções, a análise de dados experimentais não inde- dades diminuir o número de unidades experi- descrever e medir essa dependência. No segundo à precisão da estimativa do erro experimental, pendentes baseia-se sobre postulados restritivos mentais necessário para pôr à prova as hipóteses caso, a dependência estocástica das diferentes a qual pode eventualmente perder em precisão quanto à natureza do erro experimental e à forma que interessam ao experimentador não é, na séries de observações constitui um obstáculo ao o que foi ganho pela inclusão na experiência da ligação entre as séries de observações. Mau maior parte dos casos, uma boa razão. O uso repe- desejo do experimentador de avaliar os efeitos dos do tratamento suplementar. Assim, se o efeito da grado a existência de modelos de análise impli- tido de unidades experimentais dotadas de memó- diferentes tratamentos, e torna-se necessário um ordem de aplicação dos tratamentos for impor- cando postulados menos difíceis de satisfazer que ria, fazendo com que o resultado de um determi- planeamento adequado da experiência, tendo em tante, esta solução será preferível à aleatorização; os utilizados num passado recente, este tipo de pro- nado tratamento experimental dependa do ou dos vista o controlo experimental dos efeitos da apli- se, pelo contrário, este for pouco importante, esta cedimento não deve ser utilizado sem que para isso tratamentos anteriormente aplicados a essa mesma cação de um determinado tratamento sobre os tra- técnica poderá constituir uma solução menos existam boas razões. Uma boa razão para realizar unidade, obriga a medidas especificamente conce- tamentos posteriormente aplicados. vantajosa que a aleatorização. Convém, neste</p><p>82 83 ponto, estabelecer uma distinção entre dois tipos Dada a sua frequente utilização na experimen- numa argumentação por vezes pouco clara, proble- parte um dia do corpo dos conhecimentos cientí- de dependência entre as séries de medições efec- tação no terreno da psicologia, convém mencionar mas de ordem epistemológica e de ordem ética. ficos mas um modo específico de elaboração tuadas sucessivamente: na maior parte das expe- um procedimento que tem por consequência trans- Tentaremos assim clarificar as relações entre estes do saber. Os inquéritos de opinião, mesmo sendo riências deste tipo encontra-se presente um efeito formar uma experiência comportando medições dois domínios de julgamento e esboçar uma pros- afectados pelas fontes de erro que se lhes conhe- da ordem de aplicação dos tratamentos: primeiro, repetidas de uma mesma unidade experimental pectiva das direcções da evolução em cada um cem, são preferíveis, do ponto de vista científico, segundo, terceiro, etc., e, simultaneamente, em numa outra produzindo observações independen- destes campos. Com efeito, não só as críticas diri- aos relatórios de polícia, por vezes mais verídicos, efeito de sequência destes, um determinado tra- tes. Sendo um mesmo tratamento repetidamente gidas à psicologia social tocam muitas vezes aque- porque os primeiros autorizam comparações de tamento pode ser precedido por uma determinada aplicado às unidades experimentais e o resultado les pontos que constituem as dificuldades mais dados normalizados em lugares e épocas distintas, sequência de outros tratamentos; enquanto a medido após cada aplicação, o experimentador cal- importantes com as quais se defrontam as opções que os segundos não permitem. aleatorização adiciona ao erro experimental estas cula a frequência com a qual determinado compor- metodológicas, mas também as decisões tomadas duas fontes de variação dos resultados, a técnica tamento foi observado, ou valor médio de deter- pelo investigador no que respeita à metodologia 4.1. Banalidade e facticidade de constituição do conjunto das ordens de admi- minada grandeza medida após cada aplicação do constituem uma escolha implícita entre orientações nistração possíveis permite avaliar separada- tratamento, submetendo, em seguida, à análise epistemológicas globais. As objecções mais frequentemente dirigidas mente os efeitos de ordem e os efeitos ligados estatística os valores assim obtidos. Em geral, este Ao longo deste capítulo esforçámo-nos por real- contra a psicologia social dizem respeito ao carác- à sequência. procedimento tem por objectivo aumentar a fideli- çar a unidade da elaboração teórica e metodoló- ter banal das hipóteses elaboradas neste campo e Na maior parte das situações práticas, o número dade das observações, partindo do princípio de que gica. Os obstáculos de natureza metodológica mais à facticidade das observações que são efectuadas de tratamentos torna impossível a administração perturbações fortuitas que afectam a medida efec- importantes a pelo investigador reflectem, com o fim de as validar. Certos críticos, porven- destes em todas as sequências possíveis. Três trata- tuada em determinados ensaios são anuladas por muitas vezes, insuficiências ou deficiências dos tura mais acertadamente, notam que o processo de mentos podem ser aplicados em seis ordens dife- outras perturbações fortuitas de sinal oposto afec- modelos teóricos e talvez não seja infundado pen- elaboração do conhecimento é, neste campo, par- rentes, quatro tratamentos em vinte e quatro ordens tando outros ensaios. Na medida em que este pos- sar que algumas das objecções éticas à experimen- ticularmente pouco cumulativo, parecendo a evo- e cinco em cento e vinte ordens. Assim, o experi- tulado é satisfeito pelas condições experimentais, tação neste terreno estão também enraizadas em lução da temática vogar mais ao sabor de modas mentador é obrigado, na prática, a utilizar uma será de facto este o resultado obtido. Assim, antes suposições teóricas discutíveis. A metodologia da que navegar com um rumo claramente traçado. amostra do conjunto das sequências possíveis. Se de tomar a decisão de tratar este tipo de dados em psicologia social não pode constituir apenas uma Note-se, em primeiro lugar, que hipóteses ba- bem que esta amostra possa ser constituída por vez das observações originais, torna-se necessário caixa de ferramentas onde cada um vem buscar o nais e conhecimento não cumulativo são duas faces meio de tiragem aleatória, o método geralmente examinar estas últimas a fim de determinar se estão instrumento que lhe parece próprio para resolver de uma mesma medalha. Sendo o saber prático utilizado consiste em escolher propositadamente as ou não livres de variações sistemáticas no tempo, um problema teórico formulado em termos quantas pouco cumulativo e de difícil generalização, a par sequências que têm como propriedade o facto de, denotando uma heterogeneidade dos mecanismos vezes irredutíveis a qualquer espécie de validação deste desenvolve-se uma indagação norteada por no conjunto das réplicas efectuadas, um determi- que intervêm na produção do comportamento empírica. Do mesmo modo que as hipóteses expli- princípios diferentes daqueles em que ele se funda- nado tratamento ser aplicado em cada ordem um observado. Os procedimentos aplicáveis a este tipo citamente formuladas pelo investigador, as técnicas menta. Esta indagação leva a conhecimentos que, mesmo número de vezes e ser precedido por cada de exame são análogos aos indicados para pôr à utilizadas e os modelos que lhes servem de justi- permitindo uma descrição cada vez mais fina e um dos outros tratamentos um mesmo número de prova a existência de variações sistemáticas asso- ficação, incluindo as suposições implicitamente mais parcimoniosa do real, conduzem, por seu vezes. Este tipo de procedimento, chamado qua- ciadas aos níveis de factores quantitativos. implicadas por estes, são postos à prova dos factos, turno, a um afastamento progressivo das concep- drado latino, permite avaliar, paralelamente aos experimentais ou não. Não existem escolhas meto- ções naturais relativas a este e levam, portanto, a efeitos dos tratamentos, o efeito da sua ordem de 4. Problemas específicos dológicas absolutamente preferíveis a outras, mas formular hipóteses cada vez menos banais. Que, na aplicação e as diferenças entre as sequências em tão-somente escolhas melhores que outras dentro psicologia social, tal não suceda com a frequência da experimentação que estes foram aplicados. Se estes dois efeitos são de um determinado quadro global, o qual não é desejável, significa, portanto, que devemos inter- em seres humanos importantes relativamente à diminuição de precisão nem mais nem menos válido que um outro, mas rogar-nos quanto às razões que tornam difícil a da estimativa do erro experimental que a introdu- Não será, sem dúvida, este o quadro mais apro- simplesmente preferível por conter em germe pos- acumulação de conhecimentos nesta área. Contra- ção do quadrado latino acarreta, este procedimento priado para uma discussão aprofundada dos méri- sibilidades de desenvolvimento superiores às deste. riamente a uma opinião por vezes expressa, a expli- permite a realização de uma experiência mais efi- tos e dos resultados da psicologia social experi- Não é o carácter verídico dos conhecimentos que cação do carácter fracamente cumulativo do co- caz do que a que seria obtida pela simples alea- mental. Convém, no entanto, pelo menos, esboçar confere a estes o estatuto de conhecimento cientí- psicossocial não reside na dificuldade torização da ordem de aplicação dos tratamento. as grandes linhas de uma problemática que abarca, fico as hipóteses rejeitadas pela ciência fizeram em reproduzir resultados anteriormente obtidos.</p><p>84 85 Réplicas exactas de experiências são relativa- ximações entre modelos correspondentes a fenó- situações experimentais básicas para o estudo de geral sobre dissimulações ou enganos, constituem mente raras, mas, quando efectuadas, são geral- menos diferentes. cada fenómeno, constituindo por assim dizer o fundamento da maior parte das objecções de mente coroadas de sucesso. O mesmo não pode Esta dificuldade, por vezes reconhecida na lite- tendo por objecto a sua produção em carácter ético à psicologia social. dizer-se das chamadas réplicas conceptuais, nas ratura (Carlsmith, Ellsworth e Aronson, 1976), condições normalizadas, parece constituir uma A objecção de facticidade comporta sentidos quais realizações concretas diferentes dos mesmos ilustra o paradoxo do pensamento científico, deba- exigência inevitável. No entanto, é também indis- múltiplos e tanto pode visar os estudos experi- conceitos teóricos são experimentalmente postas tendo-se com problemas análogos aos que con- pensável reconhecer que os mecanismos implica- mentais como os observacionais, se bem que essa à prova. Neste caso, não só as tentativas se tornam frontam o pensamento natural, e revela o carácter dos por um determinado comportamento devem objecção tenha sido sobretudo avançada em rela- mais frequentes como, por vezes, não reproduzem intuitivo da reflexão teórica dominante na psicolo- ser conceptualizados no interior desse contexto e ção a investigações experimentais. Num primeiro os resultados originalmente observados. gia social. Ultrapassar este nível de reflexão obriga implicam níveis de explicação diferentes dos for- sentido, está em causa a possibilidade de observar, A razão pela qual as réplicas conceptuais são, a distinguir as variáveis dependentes e indepen- necidos pelas manipulações experimentais do con- experimentalmente ou não, seres humanos sem no entanto, relativamente raras é a mesma que as dentes susceptíveis de serem estudadas fora de um texto em que são observados. As manipulações que os seus comportamentos que constituem o condena, por vezes, ao fracasso. As realizações contexto global das que exigem a consideração experimentais levadas a cabo num determinado objecto da observação sejam afectados pelo facto concretas das variáveis dependentes e indepen- deste, e obriga também a reconhecer que o con- contexto são necessariamente limitadas em exten- de estes se saberem objectos de observação. Esta dentes estudadas numa determinada experiência texto global, geralmente normativo, faz parte da são e em interpretabilidade. Com efeito, por um preocupação incide sobre vários aspectos, que vão encontram-se embebidas num contexto global, o definição das variáveis, devendo ser como estas lado, são limitadas em muitos casos por exigências desde a possibilidade de um efeito global da situa- qual condiciona a representação da situação expe- objecto da reflexão teórica e de variações experi- práticas ou por razões de ética, por outro lado, a ção de observação o comportamento do sujeito rimental que o sujeito é levado a elaborar a partir mentais ou de observações diferenciais. Noções sua interpretabilidade é comprometida pela am- observado seria específico de qualquer situação de das informações e indícios fornecidos pelo expe- como conduta agressiva ou altruísta são insepará- biguidade que afecta a interpretação de um dado observação e não generalizável a situações nas rimentador. Outras realizações concretas dos veis de um contexto que constitui determinados comportamento enquanto resultado de obrigações quais o sujeito não se sente observado à possi- conceitos teóricos que a este interessam exigem actos de determinados agentes enquanto realiza- normativas para o sujeito, ímplicita ou explicita- bilidade de efeitos de suposições específicas do uma mudança completa da situação experimental ções concretas destas noções. Pelo menos tão mente contidas na situação experimental ou sujeito quanto aos factores pelos quais o investi- global, a qual vem alterar os processos de repre- importante como o estudo dos factores que contro- enquanto produto de um mecanismo psicológico gador se interessa. Num segundo sentido, está em sentação da situação utilizados pelos sujeitos. lam estes actos no interior de determinado contexto constitutivo do sujeito. Ora, estes dois níveis de causa a possibilidade de produzir no quadro expe- Assim, na réplica conceptual, são ao mesmo é a delimitação da extensão do contexto que cons- explicação não devem ser confundidos: enquanto rimental condições capazes de determinar varia- tempo manipuladas as realizações concretas das titui o domínio de aplicação do modelo posto à a explicação da ocorrência de um dado compor- ções de natureza idêntica às observadas natural- variáveis que interessam ao experimentador e a prova. Um passo tão importante como identificar tamento por uma norma presente no guião expe- mente. Este último ponto foi já examinado em interpretação destas pelos sujeitos. Deste modo, as os factores que fazem com que, num determinado rimental significa simplesmente que o sujeito pormenor nas páginas anteriores, tendo sido esbo- diferentes realizações concretas das variáveis contexto global, a recepção de estimulação aver- adquiriu, no decorrer da sua socialização, os meca- çados os contornos do espaço teórico capaz de independentes não podem constituir variações siva dê ou não lugar a uma resposta agressiva por nismos de resposta correspondentes a essa norma, expressão experimental válida. primeiro ponto experimentais facilmente individualizáveis. As parte da vítima será identificar os contextos globais a sua explicação psicológica leva-nos a interrogar- exige um exame mais aprofundado. discrepâncias eventualmente observadas entre os que afectam a produção desta resposta. A compara- mo-nos sobre os mecanismos de tratamento da resultados da experiência original e os das suas ção das reacções da vítima de uma rasteira num informação e de controlo da actividade implicados 4.2. A influência do quadro réplicas não podem, portanto, ser atribuídas com jogo de râguebi, num jogo de futebol, ou na entrada pelas variações da conduta do indivíduo num con- experimental certeza a uma variação teoricamente interpretável do metropolitano, explica sem dúvida uma parte texto normativo constante. entre as experiências, podendo resultar de qual- mais importante das variações destas do que as li- A concepção intuitiva dos determinismos psi- O efeito global do processo de observação quer diferença entre os guiões experimentais. mitadas manipulações de variáveis intra-situacio- cossociais, ignorando a distinção entre os dois ní- tanto pode afectar os sujeitos experimentais como Dado o carácter global da diferença entre as situa- nais realizáveis no estudo das condutas agressivas. veis de explicação esboçados, dá origem a algu- indivíduos observados sem intervenção do inves- ções experimentais, observações discrepantes ten- Não pretende esta argumentação negar que o mas das dificuldades metodológicas com que se tigador, desde que estes saibam que estão a ser dem a surgir frequentemente, constituindo então estudo dos factores e dos mecanismos implicados debate o psicólogo social: facticidade, indução de objecto de observação. Na situação experimental, obstáculos intransponíveis a uma integração teó- por um determinado comportamento num deter- respostas, desconfiança dos sujeitos. Por sua vez, como na de observação, o indivíduo assume um rica das duas séries de observações, tornando im- minado contexto constitui um objecto de conhe- algumas das soluções correntemente utilizadas papel global, o qual define as condutas apropria- possível a inferência teórica que permitiria apro- cimento válido. Antes pelo contrário, a criação de para ultrapassar estas dificuldades, baseadas em das à execução de uma determinada estratégia</p><p>86 87 comportamental que parece ao indivíduo adaptada frequente quando a concepção teórica leva a cons- borados no quadro da psicologia sensorial, trans- tratamentos experimentais de tal modo que, du- às circunstâncias. Esse papel não só contém truir uma situação experimental como uma minia- forma um terreno caracterizado por medidas de rante os períodos de interacção social não norma- implicitamente prescrições e proscrições como tura de uma situação Na maior parte das escolha num terreno balizado por investigações lizada, o experimentador ignora a que condição também confere significação às condutas próprias situações naturais o comportamento do sujeito cronométricas ou medidas de processos de memó- experimental pertence o sujeito. Praticamente, a e dos outros agentes e aos diferentes aspectos da consiste, do ponto de vista dos agentes, em toma- ria, muito menos sujeitas a acusações de factici- primeira técnica consiste em comunicar ao sujeito situação. Do mesmo modo que a pessoa que res- das de decisões e, dentro da perspectiva miniatu- dade. A doutrina aqui proposta, não só constitui as instruções por meio de documentos escritos ponde a um questionário pode modular a resposta rista da experimentação, é natural que o interesse uma protecção contra a facticidade das observa- ou não, limitando o contacto do sujeito com o a cada nova pergunta em função de uma con- do investigador incida sobre os aspectos da tomada ções como também reduz algumas das fontes de experimentador à recepção e instalação daquele. cepção global do objecto visado pelo investigador de decisão, os quais constituem as suas dimensões distorção frequentemente apontadas à psicologia A segunda técnica implica que a determinação do construída passo a passo a partir das perguntas subjectivamente salientes na situação natural. social. Do mesmo modo, o recurso a algumas téc- tratamento experimental a aplicar ao sujeito seja já conhecidas, o sujeito experimental controla o Se a facticidade escapa às provas de validade nicas experimentais de estatuto ético discutível, feita depois da recepção e instalação deste. Em seu comportamento de modo a fornecer uma ima- interna da medida, o processo de validação externa tornado necessário pela natureza do processo de certos casos, o experimentador intervém na apli- gem coerente de si próprio, apropriada à represen- mencionado num subcapítulo precedente acabará medida, perde a sua razão de ser, tornando-se cação dos tratamentos e não pode, portanto, igno- tação da situação experimental elaborada a partir por detectar, ao preço de numerosos ensaios e supérfluo. rar que tratamento será aplicado a estes. Quando dos indícios e informações fornecidas por esta e erros, essa fraqueza de uma medida. A fim de evi- Das duas fontes de distorção habitualmente esta situação, potencialmente geradora de distor- pelo investigador. Este tipo de distorção é tanto tar este processo oneroso de validação, convém, consideradas na experimentação psicossocial, in- ções, não pode ser evitada, torna-se indispensável mais de recear quanto, contrariamente a distor- pois, à partida, assentar a construção teórica sobre fluência involuntária do experimentador (Rosen- recorrer a procedimentos rigorosamente norma- ções provenientes de outras fontes, o seu efeito é alicerces sólidos. A discussão precedente mostra thal, 1966, 1969) e condições indutoras de res- lizados na interacção com os sujeitos, utilizando, de aumentar a fidelidade das observações e não de que para isso é necessário ultrapassar a concepção postas (Orne, 1962, 1969), a doutrina proposta na medida do possível, experimentadores que des- a diminuir, podendo assim não ser detectada pelos intuitiva dos modelos teóricos e a perspectiva tende a reduzir a primeira e a facilitar o emprego conhecem as hipóteses em estudo e que, sendo métodos usuais de avaliação da fidelidade das da experimentação enquanto miniatura do mundo dos controlos experimentais destinados a elimi- mantidos na ignorância dos restantes tratamentos medidas. social natural. Uma das soluções, de limitada apli- nar a segunda. aplicados na experiência, dificilmente podem infe- de notar que o problema da facticidade se cabilidade, consiste na escolha de variáveis depen- Toda a experiência com seres humanos com- estas. Em alguns casos, este procedimento po- de modo por assim dizer exclusivo no estudo de dentes fisiológicas ou comportamentais escapando porta possibilidades de influências involuntárias derá exigir mais de que um experimentador. respostas implicando uma escolha baseada em cri- ao controlo dos sujeitos. A outra, mais geralmente por parte do experimentador, capazes de afectar térios subjectivos. Medidas de potência, como os aplicável, consiste em formular os problemas teó- as observações a realizar. Este tipo de influência é 4.3. Indução de respostas testes de inteligência ou de motricidade, não são ricos sobre uma base não intuitiva, eliminando ou tanto mais provável quanto o contacto pessoal do em geral criticáveis por factícias. Medidas que, se reduzindo assim o recurso a medidas de critérios experimentador com os sujeitos é mais extenso. A indução de respostas resulta essencialmente bem que não constituam testes das aptidões dos subjectivos de decisão a favor de medidas de po- Nas experiências de psicologia social, a comple- da elaboração pelo sujeito de uma estratégia de sujeitos, são interpretadas enquanto medidas de tência. Pode parecer, à primeira vista, que a mar- xidade do guião, fazendo muitas vezes intervir, a comportamento tendo por objecto controlar por potência, caso dos tempos de reacção numa pers- gem de liberdade deixada ao investigador na ela- par do experimentador, comparsas deste, e impli- via do seu comportamento na situação experi- pectiva de abordagem cronométrica dos processos boração dos seus modelos teóricos será deste modo cando sociais complexas com ambos, mental a interacção social com o experimentador. mentais, estão igualmente isentas da acusação de severamente reduzida. Não é, no entanto, esse o cria condições em que este tipo de distorção é Essa estratégia pode ter por objectivo satisfazer facticidade. Do mesmo modo, medidas de proces- caso e, ainda que assim fosse, o preço a pagar não particularmente de recear. Uma experiência bem ou contrariar hipóteses que o sujeito crê serem SOS escapando ao controlo dos sujeitos normais, seria tão elevado como o que é correntemente conduzida deverá, portanto, comportar procedi- as formuladas pelo experimentador, ou comunicar como os diferentes indicadores fisiológicos de pago pela criação de um corpo de conhecimentos mentos apropriados para evitar as influências in- a este uma impressão favorável de si mesmo. actividade neurovegetativa, também não são sus- desconexos e de validade duvidosa. Para escolher voluntárias do experimentador ou dos comparsas Diferentes medidas são em geral tomadas pelo peitas de facticidade. Parece, pois, que as acusa- um exemplo num terreno dos mais propícios à deste, susceptíveis de afectar os resultados. Duas experimentador para neutralizar estas estratégias ções de facticidade incidem sobre medidas que se colheita de dados factícios, a representação pró- técnicas permitem em geral obter este resultado: dos sujeitos. Estas incluem a dissimulação da baseiam na significação diferencial para os sujei- pria dos indivíduos Markus (1977) ilustra a minimizar a interacção social não normalizada situação experimental como tal, a da hipótese vi- tos das opções possíveis de uma tomada de de- elaboração de um modelo teórico que, apoiando-se entre o sujeito e o experimentador ou entre o sada pelo investigador ou a da medida da variável cisão. Ora este tipo de medida é particularmente sobre modelos de tratamento da informação ela- sujeito e os colaboradores daquele, e aplicar os dependente. Em alguns casos, o experimentador</p><p>88 vai até à criação deliberada de representações fal- de avaliação aplicáveis à experimentação sobre CAPÍTULO V sas da situação ou das hipóteses por parte dos o homem actualmente em curso. Estas críticas sujeitos. A introdução no experimental de incidem com especial acuidade sobre procedimentos tendo por objectivo enganar os cias que comportam enganos ou dissimulações. sujeitos, além de aspectos eticamente discutíveis, Se é certo que, por vezes, parece difícil con- Formação de impressões pode ter consequências negativas no que respeita ceber experiências sobre o comportamento social à qualidade das observações, suscitando uma ati- escapando totalmente à necessidade de dissimu- tude de suspeita generalizada ou específica por lação e de engano, no entanto, esta opção não parte dos sujeitos, a qual introduz, por seu turno, deve ser tomada sem uma avaliação cuidadosa distorções idênticas às que o experimentador pro- das suas vantagens e dos seus inconvenientes António Caetano curava evitar. As soluções geralmente preconiza- tanto éticos como científicos. Por um lado, o uso das para esta dificuldade consistem em revelar ao de enganos e de dissimulação pode ser contrário sujeito que a experiência comporta enganos, indi- a prescrições legais relativas à experimentação cando, por exemplo, que um falso sujeito, com- existentes em certos países (em muitos casos, parsa do experimentador, intervém na experiência, estas exigem a obtenção por parte do experimen- e que será esse o papel do sujeito, quando, na ver- tador de consentimento informado escrito dos 1. Introdução Quando se trata de primeiras impressões, dade, o verdadeiro comparsa do experimentador indivíduos participantes em experiências, o qual uma componente fundamental dessa organi- é um outro indivíduo que o sujeito é levado a deve ser precedido de informação completa por Para criarmos uma impressão acerca de outra zação é a categoria avaliativa. Embora a ava- tomar por um verdadeiro sujeito não informado. parte do experimentador quanto às modalidades pessoa, não necessitamos, em geral, de muita liação possa ser de tipo afectivo (gostar / não Se este procedimento indica uma engenhosidade da experiência). Por outro lado, a necessidade informação. A informação pode obter-se de gostar), moral (bom / mau) e instrumental notável por parte dos investigadores, mais não faz de recorrer à simulação e à dissimulação mais forma directa, através da interacção, observando (competente / incompetente), a generalidade da que elevar ao quadrado os inconvenientes éticos não faz, em numerosos casos, que traduzir uma o comportamento verbal e não e de forma pesquisa sobre formação de impressões tem e científicos dos guiões experimentais, compor- teorização superficial, conduzindo a uma expe- indirecta, como, por exemplo, através do incidido essencialmente sobre o primeiro e o tando largas doses de enganos e dissimulação. rimentação cuja validade puramente local con- Contudo, frequentemente, basta-nos segundo tipo. No entanto, a primeira impressão dena à partida toda a possibilidade de desenvol- percepcionar pequenos indícios do seu comporta- é mais vasta do que essa primeira 4.4. Aspectos éticos vimento posterior. Quer isto dizer que o critério mento para rapidamente nos sentirmos em avaliativa. Efectivamente, a partir do momento de avaliação principal do procedimento expe- condições de podermos fazer juízos acerca de em que fica estabelecida a avaliação positiva ou No plano ético, a observação de seres huma- rimental comportando enganos e dissimulação uma série de atributos que, carac- negativa, e sem mais informação, sentimo-nos nos, durante longos anos praticada em psicologia deve ser não o interesse que o investigador ou terizam essa pessoa. O facto de não termos obser- capazes de fazer inferências acerca da geral experimental sem levantar objecções de os seus comanditários possam ter em verificar vado realmente qualquer desses atributos em inteligência, da integridade, da do maior, tornou-se em tempos mais recentes um uma dada hipótese, mas a contribuição para o nada abala a nossa convicção. E, apesar de uma sucesso profissional, etc., da pessoa em causa. motivo de críticas do domínio da psicologia processo de acumulação do saber que a verifica- pessoa poder revelar características diferentes, ou A facilidade com que se tende a ir além da social, antes mesmo da revisão geral de critérios ção dessa hipótese mesmo contraditórias, não hesitamos em criar informação específica de que se dispõe revela dela uma impressão unificada (Asch, 1946). que esta não é processada no vácuo e que as pes- Formar uma impressão significa orga- soas utilizam as suas estruturas cognitivas, ou nizar a informação disponível acerca de uma esquemas, para a completarem e tornarem coe- pessoa de modo a podermos integrá-la numa rente (Hamilton et al., 1980). De facto, o per- categoria significativa para nós. cepcionador social apenas consegue decifrar e Cognitivamente, a de é, de facto, um processo de organização da informação, sendo mais adequada a expressão de No entanto, por referência ao artigo pioneiro de Asch (1946), intitu- lado impressions of a literatura consagrou aquela designação.</p><p>90 91 interpretar os estímulos verbais e não verbais mais recentes adoptam, na sua maioria, uma pers- 2. Abordagens da formação de pares de adjectivos opostos e pedir-lhes que, relativos à outra pessoa, e ao contexto em que se pectiva mista, assumindo que o processamento de impressões a partir da descrição inicial, assinalassem nessa encontram, com base nas estruturas de conheci- pode realizar-se dos dois modos (e. g., Brewer, lista os adjectivos que, em cada par, melhor mento que já possui e que incluem represen- 1988; Fiske e Neuberg, 1989; Hastie et al., 1980; 2.1. Abordagem configuracional caracterizariam, em seu entender, a pessoa tações de traços, de comportamentos, de este- Zebrowitz, 1990). descrita. reótipos e de situações sociais assim como das Do ponto de vista histórico, podem identifi- Com base em alguns princípios da psico- Assim, numa primeira experiência, dois gru- suas inter-relações. car-se três grandes períodos na pesquisa sobre a logia da Gestalt, Asch (1946) considerou que o pos de sujeitos (A e B) ouviram uma lista de As primeiras impressões tornam-se impor- informação de impressões: um primeiro período processo de formação de impressões teria um características, constituída por sete traços, que tantes porque constituem como que uma grelha entre 1946 e fins dos anos 50, inteiramente carácter holístico, ou seja, os traços que carac- supostamente descrevia uma pessoa particular. que permite ao percepcionador filtrar a variabi- dominado pela abordagem ou confi- terizam uma pessoa organizar-se-iam de tal modo A tarefa dos sujeitos consistia em procurar lidade imensa do comportamento da outra pes- guracional de Asch; um segundo período entre que o todo seria diferente da simples soma formar uma impressão da pessoa descrita depois soa e fixar determinados traços assumidos como princípio dos anos 60 e meados dos anos 70, das partes. de ouvirem a lista, a qual era igual para os dois estáveis. Esta estabilidade atribuída permite, basicamente influenciado pela abordagem Dado que a simples observação empírica grupos, excepto num traço, que foi objecto de por sua vez, percepcionar a coerência e a conti- ou de integração da informação desen- sugere que nem todas as características conhe- manipulação experimental. nuidade da pessoa, assim como predizer inclu- volvida por Anderson; e, desde os fins dos anos cidas sobre uma pessoa contribuem com o Lista A: inteligente hábil industrioso sivamente o seu comportamento futuro (e. 70, entrou-se num novo período em que grande mesmo peso para a formação de impressões, caloroso determinado prático cauteloso; Schneider et al., 1979). parte das pesquisas se insere no quadro da abor- Asch (1946) colocou a hipótese de que algumas Lista B: inteligente hábil industrioso Do ponto de vista teórico, o processo de dagem da memória de pessoas ou cognição características serão mais centrais enquanto frio determinado prático formação de impressões tem sido analisado social Hastie et 1980). outras serão secundárias. Para testar essa Como se vê, a diferença está apenas no facto essencialmente a partir de duas perspectivas dis- A abordagem supõe que, na for- hipótese, realizou um conjunto de experiências de ao grupo A se descrever o indivíduo como tintas relativas ao processamento humano da mação de impressões, as pessoas integram os com estudantes universitários. e, ao grupo B, como informação: uma construtivista ou de vários elementos informacionais, reinterpretan- Antes de estudarmos algumas dessas ex- Depois de ouvir a lista respectiva, cada mento conceptualmente e outra associa- do-os, se necessário, de modo a constituírem um periências, vejamos qual a metodologia geral sujeito realizava duas tarefas: a) escrevia um cionista ou de guiado pelos todo coerente. significado de cada elemento é utilizada por Asch (1946) no estudo da for- breve comentário sobre a pessoa descrita e b) Do ponto de vista construtivista, supõe- construído em função das suas relações contex- mação de impressões. Depois de apresentar aos seleccionava, numa lista constituída por dezoito -se que a formação de impressões é basicamente tuais com os restantes. sujeitos um conjunto de atributos que suposta- pares de traços, na maioria opostos, o adjectivo determinada pelas estruturas e pelos processos A abordagem da integração da informação mente caracterizariam uma determinada pessoa, que em cada par mais se ajustava à dimensão cognitivos e afectivos do percepcionador. É esta a sustenta que cada elemento de informação tem Asch (1946) utilizou três métodos distintos para que tinha formado. orientação predominante nas primeiras um valor próprio, contribuindo independen- estudar o processo de formação de impressões. Os resultados foram muito claros. As impres- cias sobre formação de impressões realizadas por temente, à medida que é conhecido, para a im- Um desses métodos consistia em pedir aos sões provocadas pela lista A foram, em geral, Solomon Asch (1946). Segundo a perspectiva do pressão geral. A impressão será o resultado da sujeitos que escrevessem algumas apreciações muito mais positivas do que as impressões face processamento guiado pelos dados, são funda- combinação dos valores de cada item, sem acerca da pessoa descrita. A análise do conteúdo à lista B, ou seja, característica caloroso-frio mentalmente as características físicas e compor- subordinação ao contexto. desses comentários permitia extrair temas produziu diferenças de impressão notáveis e tamentais da pessoa-alvo que determinam a pro- A abordagem baseada na memória de pessoas específicos, que depois eram comparados com a (Asch, 1946, Vejamos, a dução de uma impressão específica. No estudo procura analisar os processos relativos à aqui- lista-estímulo inicial. Um outro método, idên- título de exemplo, duas descrições represen- da formação de impressões, esta abordagem, sição, armazenamento e recuperação da infor- tico a este, consistia em solicitar aos sujeitos que tativas de cada grupo. designada por ou integração da infor- mação. Formar uma impressão aparece, assim, fizessem uma lista de palavras que lhes ocor- Descrição feita por um sujeito que ouviu a mação, foi sobretudo desenvolvida por N. H. como um actividade estreitamente dependente ressem a partir dos atributos inicialmente lista A Anderson (e. 1965, 1974). As abordagens destes processos de memória. analisados, com o objectivo de se encontra- rem temas consistentes conforme o grupo dos É uma pessoa que acredita que certas coisas estão bem, quer que os outros vejam como ele pensa, é sin- 2 Na literatura anglófona, estas perspectivas são geralmente designadas, respectivamente, como theory-driven, ou sujeitos. Um terceiro método consistia em apre- cero na argumentação e gosta de ver as suas ideias top-down, e data-driven, ou bottom-up. sentar aos sujeitos uma lista com um conjunto vencerem (p. 263).</p><p>92 93 Descrição feita por um sujeito que ouviu a Asch (1946) realizou uma outra experiência, 2. Tanto o conteúdo cognitivo de um traço como o lista B QUADRO I com o mesmo padrão, mas, desta vez, a palavra seu valor funcional são determinados pela relação com aparecia integrada numa sequência o seu contexto; É uma pessoa com talento e muito ambiciosa que 3. Alguns traços determinam o conteúdo e a função Características inferidas (percentagens) de qualidades diferentes das anteriores. não admite que ninguém se atravesse no seu caminho de outros traços. Aos primeiros chamamos centrais e (Adaptado de Asch, 1946) A lista A era constituída pelos termos para atingir o objectivo que pretende. Quer as coisas à aos segundos periféricos (p. 270). sua maneira, está determinada a não ceder, aconteça o diente fraco superficial caloroso não Experiência 1 Experiência 3 que acontecer (idem). ambicioso As experiências realizadas por Asch influen- A lista B era constituída por astuto Caloroso Frio Polido Rude ciaram de tal modo o primeiro período da As respostas à lista de traços revelaram igual- sem escrúpulos caloroso superficial inve- pesquisa sobre a formação de impressões que, N=90 mente muitas diferenças entre os grupos A e B N 26 até finais dos anos 50, os estudos efectuados por (ver Quadro I). Para alguns traços, as diferenças Os resultados mostram que, tanto na situação outros autores (e. g., Kelley, 1950; Luchins, entre o grupo A e o grupo B são extremas. Por Generoso 91 8 56 58 A como, sobretudo, na situação B, 1957) se caracterizam por serem fundamental- exemplo, na condição 91 por cento Ponderado 65 25 30 50 foi classificado como uma qualidade completa- mente réplicas ou extensões de algumas dessas dos sujeitos escolheram e apenas mente secundária (ou periférica), subordinan- Feliz 90 34 75 65 experiências. Kelley (1950), por exemplo, adap- nove por cento escolheram generoso>>, do-se totalmente ao conteúdo de outras quali- tou uma das experiências de Asch (1946), na Sociável 91 38 83 68 enquanto na condição apenas oito por cento dades consideradas como mais centrais. qual, em vez de utilizar como estímulo uma pes- escolheram e 92 por cento escolheram Popular 84 28 94 56 Deste modo, pode concluir-se que soa fictícia, apresentou aos sujeitos uma pessoa o oposto. Diferenças idênticas, e no mesmo sen- Importante 88 99 94 96 qualidade, quando central, tem um conteúdo e real. Kelley informou os alunos que, em virtude tido, verificaram-se também com os traços Sério 100 99 100 100 um peso diferente do que quando é de o seu professor estar ausente, a aula seria feliz, afável, bem-humorado, sociá- (p. 268) e determina o conteúdo e o valor orientada por um outro professor convidado Forte 98 95 100 100 vel, popular, humano, altruísta e funcional dos traços periféricos na impressão para o efeito. Antes de este entrar na sala, foi Contudo, relativamente a outros traços não Honesto 98 94 87 100 total. Asch sublinha que não se trata de uma fornecida aos estudantes uma curta nota bio- houve diferenças entre os dois grupos. Estão neste influência meramente quantitativa, mas, sobre- gráfica acerca do professor. Entre outros aspec- caso os traços confiança, importante, atraente, tudo, de um processo qualitativo de mútua tos, a nota biográfica referia o seguinte: persistente, sério, calado, forte e Numa outra experiência, concebida com o influência dos vários traços (Asch, 1946). Isto 26 anos, é veterano e casado. As pessoas que o Assim, Asch (1946) descobriu que, por um objectivo de analisar a influência de caracterís- quer dizer que um traço não tem sempre um conhecem consideram-no um indivíduo frio, lado, características predominantemente ticas secundárias ou periféricas na formação de sentido fixo que entra na formação da im- industrioso, crítico e 43). atribuídas à pessoa enquanto os seus impressões, Asch (1946) substituiu na lista a pressão. Pelo contrário, o seu conteúdo pode ser A manipulação experimental consistia exac- opostos são atribuídos à pessoa e, por ser ouvida os termos e por central numa impressão e tornar-se periférico tamente nessa nota biográfica. Sem os sujeitos o outro lado, há um conjunto de qualidades que e Os dois grupos deram res- noutra (Asch, 1946). saberem, foram distribuídas não uma, mas duas não é afectado pela transição de para postas muito semelhantes. Perante estes resul- Os traços não teriam, pois, um valor indepen- notas biográficas em tudo iguais excepto na ou apenas o é tados, Asch (1946) concluiu que a de dente do contexto onde se inserem, estando, por- palavra que numa delas fora substituída Confrontando estes resultados com as hipó- um traço periférico produz um efeito mais fraco tanto, segundo Asch, sujeitos a uma mudança de por Depois da leitura desta infor- teses inicialmente enunciadas, verifica-se que na impressão total do que a mudança de um significado. mação prévia, a pessoa-estímulo entrou na sala a mudança de um traço provocou uma trans- traço (p. 266). A partir das várias experiências realizadas, e conduziu um debate com os alunos durante formação das outras características, alterando Na opinião de Asch, estas experiências Asch (1946) tirou as seguintes conclusões: vinte minutos, após o que assim a impressão global. Segundo Asch provam que há qualidades que são tomadas Pediu-se então aos estudantes que exprimis- (1946), isto sugere que as como centrais e outras como periféricas. Colo- 1. Há um processo de discriminação entre traços sem a sua impressão fazendo uma descrição dadas não têm todas o mesmo peso para o ca-se então a questão de saber se um traço é cen- centrais e periféricos. Nem todos os traços ocupam o livre do e classificando-o numa lista mesmo valor na impressão final. A mudança de um 264), sendo necessário considerar a tral (ou periférico) por si próprio ou se a sua traço central pode alterar completamente a impressão, com quinze escalas. existência de qualidades centrais e de quali- centralidade depende das suas relações contex- enquanto a mudança de um traço periférico tem um Os resultados foram idênticos aos obtidos por dades periféricas. tuais com os outros traços. efeito mais fraco; Asch (1946), sendo as descrições muito dife-</p><p>94 95 rentes consoante os sujeitos tivessem recebido a rosa e eram capazes de con- relativas a domínios que estão fora do seu dade revelam também um carácter normativo informação ou A pessoa foi cluir que essa pessoa possuía também uma campo perceptivo no momento. Assim, as (Paicheler, 1984), pois, uma vez estabelecida a descrita de uma maneira mais favorável na série de outras características como, por exem- rias implícitas da personalidade constituem ligação de que, por exemplo, é inteli- condição do que na condição plo, etc.? Ou seja, como como que um mapa cognitivo interno que, de gente é fica delimitado o domínio Mas, mais curioso e importante ainda, é o é que os sujeitos estavam em condições de certo modo, orienta a interacção entre as pessoas dessa regra, ou seja, é assim que facto de o próprio comportamento dos sujeitos realizar tais inferências a partir de informação na vida quotidiana. Além disso, ao estruturarem mesmo, ou principalmente, quando não se têm durante o debate ter sido bastante diferente, pois tão limitada? o conjunto de relações possíveis de uns traços outros dados informativos específicos sobre a 56 por cento dos sujeitos da situação Segundo Asch, isso era possível porque, como com as implícitas da personali- pessoa. participaram na discussão com o vimos, com base nos traços-estímulo iniciais, os enquanto apenas 32 por cento daqueles que sujeitos criavam uma impressão geral da pessoa tinham recebido a informação o fizeram. e era a partir dessa impressão geral que, poste- ASCH REVISITADO Segundo Kelley (1950), estes resultados suge- riormente, efectuavam inferências particulares rem que a mudança de para para cada um dos outros traços. No entanto, esta A generalidade das experiências sobre a formação de impressões, realizadas por Asch e por outros autores, utilizam, quer como variáveis independentes quer como variáveis dependentes, adjectivos ou traços que têm uma não provoca apenas mudanças ao nível percep- perspectiva sugere que os sujeitos tomariam con- referência abstracta a pessoas completamente descontextualizadas. Assim, alguns autores (e. g., Sémin, 1989) colo- tivo, mas também ao nível comportamental. Na tacto com os traços-estímulo num vácuo, como se cam a questão de saber até que ponto as inferências que os efectuam das listas-estímulo para as listas de realidade, tanto ao nível perceptivo como com- não tivessem quaisquer pré-concepções acerca resposta serão resultado de processos efectivamente psicológicos ou simplesmente de convenções linguísticas, dado portamental, os sujeitos foram consistentes com desses traços-estímulo nem do modo como estes que as palavras que se utilizam para descrever os atributos têm relações abstractas, lógicas e semânticas entre si. as expectativas criadas a partir da nota biográ- se relacionam com muitos outros traços. Estas relações são expressões de convenções socioculturais e estão formalizadas, por exemplo, nos dicionários. Ou fica que terá induzido uma primeira impressão Bruner e Tagiuri (1954) propuseram uma con- seja, o traço num dicionário escolar, por exemplo, remete para e independentemente de se referir a quem quer que seja. É usual distinguir-se entre o significado pragmático de um acerca do professor. cepção diferente. Segundo estes autores, as pes- termo, dependente do contexto em que é utilizado, e o seu significado semântico, independente do contexto. Para além desta experiência, a hipótese da soas estão em condições de efectuar inferências Naturalmente, é para este que os dicionários remetem, indicando relações possíveis de uma determinada palavra. mudança de significado atrás referida recebeu como aquelas que aparecem nas experiências de Ora, o paradigma metodológico acima referido utiliza os traços o que pode implicar que apoio experimental de vários autores (Asch e Asch porque possuem implícitas da per- os sujeitos das experiências tenham de se socorrer do significado semântico dos adjectivos que lhes são apresenta- Zuckier, 1984; Hamilton e Zanna, 1974; Zanna Este conceito foi introduzido na psi- dos, significado esse culturalmente partilhado por eles. Se for esse o caso, então, as meras convenções linguísticas, e Hamilton, 1977; Wyer, 1974). No entanto, foi que socioculturalmente estabelecem associações entre os termos dos traços, podem, eventualmente, contribuir para cologia social por aqueles autores quer para refe- a explicação da variância das inferências efectuadas pelos sujeitos. Nesse sentido, Sémin (1989), replicando duas igualmente contestada por outros investigadores categorias usadas pelas pessoas comuns na experiências de Asch, realizou um estudo em que procurou testar a hipótese de que respostas em tarefas de infe- (Anderson, 1974, 1981), que sustentam que há vida quotidiana para descreverem outras pes- rência de atributos, como as que se encontram nas tarefas experimentais tipo Asch, são mediatizadas por referências uma constância de significado, como veremos em termos das suas capacidades, atitudes e intensionais (i. é, sobreposição de significado), abstraídas entre os estímulos e cada item na lista da variável depen- ao analisar os modelos lineares. características, quer para referir as sobre dente, por outras palavras [são mediatizadas] por um valor de associação de dicionário geral entre o significado do Pesquisas posteriores Rosenberg et al., as relações entre atributos de estímulo e cada medida (p. 89). Sémin (1989), por um lado, reproduziu as experiências 1 e 3 de Asch e, por outro, recorreu a uma nova 1968; Sémin, 1989; Wishner, 1960) vieram pre- (pag. 649). São consideradas porque metodologia, criando um índice de associação de traços a partir de sinónimos, análogos, contrários e antónimos dos cisar a concepção da centralidade dos traços. consistem num conjunto estruturado de catego- traços tal como surgem no dicionário. Por exemplo, para o traço teríamos, entre outros, o sinónimo rias e de crenças sobre as suas inter-relações, e análogo o contrário e antónimo Centralidade dos traços e teorias são ou porque as pes- Relativamente à reprodução das experiências 1 e 3, os resultados foram muito idênticos aos obtidos por Asch implícitas da personalidade soas não as apresentam formalmente nem forne- quarenta anos antes, verificando-se correlações entre os dois estudos de 0,90 e 0,93 para e respec- cem critérios objectivos da sua validade. tivamente, e de 0,68 quer para quer para Contudo, ao analisar a relação entre as respostas dos sujeitos, tanto do seu estudo como do de Asch, e o índice linguístico que construíra, Sémin detectou que o Na base dos estudos realizados por Asch As implícitas da da associação entre termos-traços derivados de um dicionário explica uma proporção substancial da variância que (1946) está um outro problema fundamental que desempenham um papel importante na vida quo- está envolvida nos processos de mediação responsáveis pelas (p. 94), concretamente a variância expli- só depois veio a ser explicitamente conceptua- tidiana porque permitem aos indivíduos não só cada para cada uma das quatro listas das experiências 1 e 3 vai de 79 por cento a 92 por cento. lizado: como é que os sujeitos das suas expe- seleccionar e codificar a informação relativa às Estes resultados sugerem, pois, que na análise da formação de impressões e da cognição social se torna riências, conhecendo apenas alguns traços outras pessoas, mas, também, a partir de poucos necessário dar também atenção aos factores linguísticos, de modo a poder destrinçar-se a contribuição dos proces- respeitantes a uma pessoa, por exemplo elementos informativos, realizar inferências psicológicos da contribuição das convenções linguísticas.</p>

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