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<p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>2</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>3</p><p>1ª FASE OAB | 42° EXAME</p><p>Direito Penal</p><p>Prof. Nidal Ahmad</p><p>Prof. Arnaldo Quaresma</p><p>Sumário</p><p>1. Aplicação da Lei Penal ............................................................................................................. 4</p><p>2. Do crime ................................................................................................................................. 10</p><p>3. Da Imputabilidade Penal ........................................................................................................ 26</p><p>4. Concurso de Pessoas (arts. 29, 30 e 31 do CP) .................................................................... 27</p><p>5. Aplicação da Pena ................................................................................................................. 29</p><p>6. Da Suspensão Condicional da Pena...................................................................................... 43</p><p>7. Do Livramento Condicional .................................................................................................... 47</p><p>8. Efeitos da Condenação .......................................................................................................... 50</p><p>9. Extinção da Punibilidade ........................................................................................................ 54</p><p>10. Crimes contra a vida ............................................................................................................ 67</p><p>11. Lesão Corporal (art. 129 do CP) .......................................................................................... 74</p><p>12. Crimes contra a honra .......................................................................................................... 77</p><p>13. Crimes Contra o Patrimônio ................................................................................................. 80</p><p>14. Crimes contra a Dignidade Sexual ....................................................................................... 94</p><p>15. Crimes contra a Fé Pública .................................................................................................. 98</p><p>16. Crimes contra a Administração Pública ............................................................................. 101</p><p>17. Dos crimes contra a Administração da Justiça .................................................................. 110</p><p>Olá, aluno(a). Este material de apoio foi organizado com base nas aulas do curso preparatório para</p><p>a 1ª Fase OAB e deve ser utilizado como um roteiro para as respectivas aulas. Além disso, reco-</p><p>menda-se que o aluno assista as aulas acompanhado da legislação pertinente.</p><p>Bons estudos, Equipe Ceisc.</p><p>Atualizado em agosto de 2024.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>4</p><p>1. Aplicação da Lei Penal</p><p>Prof. Nidal Ahmad</p><p>@prof.nidal</p><p>1.1. Da lei penal no tempo (art. 2o do CP)</p><p>Pelo princípio tempus regit actum (“o tempo rege o ato”), a lei aplicável a um crime é</p><p>aquela vigente ao tempo da execução deste crime.</p><p>Exceção:</p><p>a) A retroatividade da lei mais benéfica significa que a lei mais benigna prevalece</p><p>sobre a mais severa, prolongando-se além do instante de sua revogação ou retro-</p><p>agindo ao tempo em que não tinha vigência;</p><p>b) Ultratividade quer dizer que se a lei antiga for mais favorável, prevalecerá ao</p><p>tempo da vigência da lei nova, mesmo estando revogada.</p><p>1.1.1. Abolitio criminis (art. 2o, caput, do CP)</p><p>Ocorre a chamada abolitio criminis quando a lei nova deixa de considerar crime fato que</p><p>anteriormente era considerado ilícito penal.</p><p>A abolitio criminis apaga todos os efeitos penais da sentença condenatória, permane-</p><p>cendo, no entanto, íntegros os efeitos na esfera extrapenal (na esfera cível e administrativa, por</p><p>exemplo).</p><p>Assim, se o agente praticar novo crime depois do trânsito em julgado de uma sentença</p><p>condenatória por crime anterior que foi abolido, não será considerado reincidente, podendo, no</p><p>entanto, ser demandado na esfera cível, para reparar o dano causado à vítima.</p><p>Trata-se de causa de extinção da punibilidade, nos termos do artigo 107, III, do CP.</p><p>1.1.2. Novatio legis in mellius (art. 2º, par. ún., do CP)</p><p>Significa que a lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos</p><p>anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado (art. 2º, par.</p><p>ún., do CP).</p><p>Assim, se uma lei posterior deixar de prever uma circunstância de aumento de pena em</p><p>relação a determinado crime, retroagirá para beneficiar o réu.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>5</p><p>1.1.3. Novatio legis incriminadora</p><p>A novatio legis incriminadora, ao contrário da abolitio criminis, considera crime fato ante-</p><p>riormente não incriminado, e somente gerará efeitos para fatos praticados após a sua vigência.</p><p>Por conferir tratamento severo, a novatio legis incriminadora, por evidente, não retroage</p><p>para alcançar fatos praticados antes da sua vigência, tendo eficácia, portanto, somente em rela-</p><p>ção aos fatos praticados a partir da sua vigência.</p><p>1.1.4. Novatio legis in pejus</p><p>Significa que a lei nova conferiu tratamento mais severo do que a anterior, como, por</p><p>exemplo, lei nova aumentar a pena cominada anteriormente ao crime.</p><p>Incide, no caso, o princípio da irretroatividade da lei penal: “a lei penal não retroagirá, salvo</p><p>para beneficiar o réu” (art. 5º, XL, da CF/1988).</p><p>1.1.5. Crime permanente e crime continuado e a lei penal mais benéfica</p><p>Crime permanente é aquele cuja consumação se prolonga ou protrai no tempo, por von-</p><p>tade do sujeito ativo. Ex: extorsão mediante sequestro (art. 159 do CP).</p><p>Crime continuado ocorre quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pra-</p><p>tica dois ou mais crimes da mesma espécie, devendo os subsequentes, pelas condições de</p><p>tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, ser havidos como continuação do</p><p>primeiro, nos termos do artigo 71 do CP.</p><p>Nesses casos, aplica-se a lei nova durante a atividade executória do crime permanente</p><p>ou do crime continuado, ainda que seja prejudicial ao réu, já que a cada momento da atividade</p><p>criminosa está presente a vontade do agente. É o que se extrai da Súm. 711 do STF: “a lei penal</p><p>mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior</p><p>à cessação da continuidade ou da permanência.”</p><p>Ex: imaginemos o fato de o agente sequestrar a vítima no dia 5-10-2021, com a intenção</p><p>de exigir resgate, praticando o crime de extorsão mediante sequestro (CP, art. 159), que previa</p><p>pena de reclusão, de 8 a 15 anos. No dia 15-10-2021, enquanto a vítima estava no cativeiro,</p><p>sobrevém lei nova, elevando a pena do crime de extorsão mediante sequestro, para 10 a 20</p><p>anos, de reclusão. A vítima é resgatada no dia 20-10-2021, cessando, portanto, a permanência.</p><p>Nesse caso, aplica-se a lei nova, ainda que mais grave, já que entrou em vigor antes da cessação</p><p>da permanência, ou seja, enquanto o crime de extorsão mediante sequestro estava sendo</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>6</p><p>executado.</p><p>1.2. Lei temporária e lei excepcional (art. 3° do CP)</p><p>Leis excepcionais: são feitas para durar enquanto um estado anormal ocorrer. Cessa a</p><p>sua vigência ao mesmo tempo que a situação excepcional também terminar. Portanto, são aque-</p><p>las promulgadas em caso de calamidade pública, guerras, revoluções, cataclismos, epidemias</p><p>etc.</p><p>Leis temporárias: são as editadas com período determinado de duração, portanto, dota-</p><p>das de autorrevogação. É feita para vigorar em um período de tempo previamente fixado pelo</p><p>legislador. Traz em seu bojo a data do início e da cessação de sua vigência. É uma lei que, desde</p><p>a sua entrada em vigor, está marcada para morrer.</p><p>Reúnem duas características:</p><p>1) Autorrevogabilidade: em regra, uma lei somente pode ser revogada por outra lei</p><p>posterior. As leis de vigência</p><p>pena de multa</p><p>Conforme o ordenamento jurídico vigente, a inadimplência no pagamento da multa estatal</p><p>não conduz, em nenhuma hipótese, à aplicação da pena de prisão. Ninguém pode ser privado</p><p>da liberdade em razão do não pagamento de uma multa estatal.</p><p>Nos termos do art. 51 do CP, transitada em julgado a sentença condenatória, o valor da</p><p>multa deve ser inscrito como dívida ativa em favor da Fazenda Pública. A multa permanece com</p><p>sua natureza penal. A execução é que se procede em termos extrapenais. Em face disso, a</p><p>obrigação de seu pagamento não se transmite aos herdeiros do condenado.</p><p>A novidade introduzida pela Lei nº 13.964/2019 diz respeito à execução da pena de multa.</p><p>Nos termos da atual redação do art. 51 do CP, a legitimidade para a execução da pena de multa</p><p>passa a ser do Ministério Público, sendo executada perante o juiz da execução penal.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>34</p><p>5.4. Da aplicação da pena (art. 68 do CP)</p><p>Da leitura do art. 68 do CP verifica-se que, em relação à pena privativa de liberdade, a</p><p>legislação penal adotou o critério trifásico, segundo o qual se deve encontrar a pena-base aten-</p><p>dendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida, serão consideradas as circunstâncias</p><p>atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento.</p><p>Em relação à pena de multa, convém repetir, o Código Penal adotou o sistema bifásico,</p><p>conforme se extrai do art. 49 do CP.</p><p>5.4.1. Primeira fase da fixação da pena: pena-base e circunstâncias ju-</p><p>rídicas</p><p>Não há nenhum dispositivo legal norteando o juiz na fixação da pena-base, encarregando-</p><p>se a doutrina e a jurisprudência de estabelecer critérios basilares para o montante da pena-base,</p><p>sempre ressaltando a discricionariedade do juiz.</p><p>Todavia, em que pese o grau de discricionariedade, o juiz, nessa fase, está restrito à</p><p>cominação legal da pena, devendo observar o mínimo e o máximo da pena legalmente prevista.</p><p>Em outras palavras, ainda que todas as circunstâncias judiciais sejam favoráveis ao réu, a pena-</p><p>base não poderá ficar abaixo do mínimo legal. De outro lado, se as circunstâncias judiciais forem</p><p>desfavoráveis ao réu, não será possível ao juiz fixar a pena-base além do máximo da pena co-</p><p>minada ao delito. Assim, por exemplo, em relação ao crime de furto simples (art. 155, caput, do</p><p>CP), o juiz somente poderá fixar a pena-base dentro do limite de 1 (um) a 4 (quatro) anos.</p><p>De todo modo, se todas as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP forem favoráveis ao</p><p>réu, a pena-base, como regra óbvia, deverá ser fixada no mínimo legal. Se alguma circunstância</p><p>judicial for desfavorável ao réu, o juiz está autorizado a fixar a pena-base acima do mínimo legal.</p><p>5.4.2. Segunda fase da fixação da pena: circunstâncias agravantes e</p><p>atenuantes</p><p>Após a fixação da pena-base, adotando como parâmetro as circunstâncias judiciais, cum-</p><p>pre ao juiz passar para a segunda fase, fixando a pena, ainda provisória, levando em conta as</p><p>circunstâncias agravantes e atenuantes.</p><p>No caput do art. 61, o Código Penal emprega o advérbio “sempre”, indicando que, via de</p><p>regra, as agravantes são de aplicação obrigatória. Em razão disso, o juiz não pode deixar de</p><p>agravar a pena, ficando o quantum da pena a seu critério.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>35</p><p>Todavia, quando uma das circunstâncias agravantes funciona como elementar ou como</p><p>circunstância qualificadora, não se aplica a agravante, a fim de evitar o bis in idem.</p><p>Assim, se, por exemplo, o agente praticar homicídio por motivo fútil (art. 121, § 2º, II, do</p><p>CP), não incide a agravante do art. 61, II, a, 1ª figura (ter sido o crime cometido por motivo fútil),</p><p>pois a circunstância genérica funciona como “qualificadora” do homicídio.</p><p>A quantidade da pena a ser agravada ou atenuada fica a critério do juiz, uma vez que não</p><p>há nenhum dispositivo legal fixando os parâmetros.</p><p>As circunstâncias atenuantes são de aplicação em regra obrigatória, pois o caput do art.</p><p>65 reza que: “são circunstâncias que sempre atenuam a pena”.</p><p>Entretanto, quando a pena-base for fixada no mínimo legal, a incidência da circunstância</p><p>atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo da pena mínima cominada. É o que se</p><p>extrai da Súm. nº 231 do STJ: “A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à</p><p>redução da pena abaixo do mínimo legal”.</p><p>É possível que a atenuante do art. 65 funcione na Parte Especial do Código Penal como</p><p>causa da diminuição da pena. Nesse caso, não se aplica a atenuante genérica. Ex.: a circuns-</p><p>tância consistente em praticar crime por motivo de relevante valor moral ou social integra o ho-</p><p>micídio privilegiado (art. 121, § 1º, do CP); logo, não poderá ser considerada atenuante genérica.</p><p>Ao contrário das circunstâncias agravantes, que somente podem ser aplicadas se expressa-</p><p>mente previstas em lei, pode o Magistrado considerar, na segunda fase de fixação da pena,</p><p>atenuante não prevista em lei, levando em conta circunstância relevante, anterior ou posterior ao</p><p>crime. É o que se extrai do art. 66 do CP.</p><p>Assim, se, por exemplo, restar comprovado que o agente praticou o crime de furto em</p><p>razão de desemprego ou moléstia grave na família, poderá o Magistrado considerar essa cir-</p><p>cunstância para atenuar a pena, ainda que não expressamente prevista em lei.</p><p>5.4.3. Terceira fase da aplicação da pena: causas de aumento e de dimi-</p><p>nuição da pena</p><p>Na terceira e última fase de aplicação da pena, o juiz deve considerar as causas de au-</p><p>mento e de diminuição da pena presentes no caso concreto. Essas causas de aumento e de</p><p>diminuição da pena podem estar previstas tanto na Parte Geral do Código Penal quanto na Parte</p><p>Especial.</p><p>O cálculo decorrente da causa de aumento ou diminuição da pena deve incidir sobre a</p><p>pena provisória, encontrada na segunda fase, de forma cumulada.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>36</p><p>É importante salientar que, com o reconhecimento de causa de aumento ou de diminui-</p><p>ção de pena, o juiz pode aplicar pena acima da máxima ou inferior à mínima cominada em abs-</p><p>trato.</p><p>5.5. Da reincidência (art. 63 do CP)</p><p>A reincidência pressupõe uma sentença condenatória transitada em julgado por prática</p><p>de crime. Há reincidência somente quando o novo crime for cometido após a sentença condena-</p><p>tória de que não cabe mais recurso. É o que se extrai do art. 63 do CP.</p><p>Ex.: o agente pratica um crime, sendo processado e condenado. Não recorre, vindo a</p><p>sentença transitar em julgado. Meses depois, vem a praticar novo crime. É considerado reinci-</p><p>dente, uma vez que cometeu novo delito após o trânsito em julgado de sentença que o condenou</p><p>por prática de crime.</p><p>Se o agente praticar o novo crime exatamente no dia em que transitar em julgado a sen-</p><p>tença penal condenatória pelo crime anterior, não incide a agravante da reincidência, pois a lei é</p><p>expressa ao mencionar que o novo crime deve ser praticado “depois” do trânsito em julgado. No</p><p>dia do trânsito, portanto, não se encaixa na hipótese legal.</p><p>Além disso, complementando os pressupostos da reincidência, o art. 7º da Lei de Contra-</p><p>venções Penais (Decreto-lei nº 3.688/1941) dispõe que: “verifica-se a reincidência quando o</p><p>agente pratica uma contravenção depois de passar em julgado a sentença que o tenha conde-</p><p>nado, no Brasil ou no estrangeiro, por qualquer crime, ou, no Brasil, por motivo de contravenção”.</p><p>Assim, podem ocorrer várias hipóteses:</p><p>a) o agente, condenado irrecorrivelmente pela prática de um crime, vem a cometer</p><p>outro delito: é reincidente (art. 63 do CP);</p><p>b) o agente pratica um crime; condenado irrecorrivelmente, vem a cometer uma con-</p><p>travenção: é reincidente (art. 7º da LCP);</p><p>c) o sujeito pratica uma contravenção, vindo a ser condenado por sentença transitada</p><p>em julgado; comete outra contravenção: é considerado reincidente (art. 7º da LCP);</p><p>d) o sujeito comete uma contravenção; é condenado por sentença irrecorrível; pratica</p><p>um crime: não</p><p>é reincidente (art. 63 do CP).</p><p>Informativo 636 STF: condenações anteriores pelo delito do art. 28 da Lei nº 11.343/2006</p><p>não são aptas a gerar reincidência.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>37</p><p>5.5.1. Eficácia temporal da condenação anterior para efeito da reincidên-</p><p>cia</p><p>Nos termos do art. 64, I, do CP, não prevalece a condenação anterior se entre a data do</p><p>cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior</p><p>a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se</p><p>não ocorrer revogação.</p><p>Logo, o prazo de 5 (cinco) anos começa a correr a partir do cumprimento da pena ou a</p><p>sua extinção por outro modo, por exemplo, incidência de uma causa extintiva da punibilidade,</p><p>como a prescrição da pretensão executória, graça ou indulto.</p><p>O período de prova do livramento condicional e da suspensão condicional da pena será</p><p>computado para fins de cessar os efeitos da reincidência.</p><p>Assim, em tese, ao agente condenado a 6 (seis) anos de reclusão, cumprindo 1/3 (ou</p><p>seja, 2 anos), será concedido o livramento condicional (art. 83, I, do CP), restando outros 4 (qua-</p><p>tro) anos para o término da pena, que será o período de prova.</p><p>Consideremos a hipótese de o agente ter iniciado o cumprimento da pena no dia 10-8-</p><p>2010. Após cumprir 1/3 da pena, dois anos, portanto, obteve o livramento condicional em 10-8-</p><p>2012, cumprindo integralmente a pena no dia 10-8-2016.</p><p>Em 10-9-2017, o agente pratica novo crime. Nesse caso, não será considerado reinci-</p><p>dente, pois passaram-se mais de 5 (cinco) anos entre a data do cumprimento da pena e a prática</p><p>do novo crime, computando-se o período de prova do livramento condicional.</p><p>5.5.2. Crimes que não induzem reincidência</p><p>O art. 64, II, do CP dispõe que, para efeito de reincidência, não se consideram os crimes</p><p>militares próprios ou políticos.</p><p>Convém ressaltar que, conquanto não gere reincidência, o trânsito em julgado de uma</p><p>sentença penal condenatória por crime militar próprio ou crime político gera maus antecedentes,</p><p>já que o art. 64, II, do CP limita-se a afastar a reincidência, nada dispondo sobre maus antece-</p><p>dentes.</p><p>5.6. Concurso de crimes</p><p>5.6.1. Concurso material (art. 69 do CP)</p><p>Ocorre o concurso material, também chamado de real, quando o agente, mediante mais</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>38</p><p>de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não (art. 69, caput, do CP).</p><p>Há, pois, pluralidade de condutas e pluralidade de resultados.</p><p>Na hipótese de crimes conexos apurados na mesma ação penal, a soma das penas, pelo</p><p>concurso material, será realizada na própria sentença, após a adoção do critério trifásico para</p><p>cada um dos delitos. Ex.: o agente pratica o crime de estupro (art. 213 do CP) e, para assegurar</p><p>a sua impunidade, mata, na sequência, a vítima (art. 121, § 2º, V, do CP). Imaginemos que o juiz</p><p>fixe, em relação ao delito de estupro, a pena de 8 (oito) anos; e em relação ao crime de homicídio</p><p>qualificado, a pena de 20 (vinte) anos. Ao final, verificando-se tratar de concurso material de</p><p>crimes, o Magistrado aplicará o sistema do cúmulo material, somando as penas, alcançando a</p><p>pena definitiva de 28 anos.</p><p>De outro lado, na hipótese de não haver conexão entre os crimes, sendo, por isso, julga-</p><p>dos em processos distintos, a soma das penas será realizada perante o juízo da execução cri-</p><p>minal, por força do disposto no art. 66, III, a, da Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/1984).</p><p>Nos termos do art. 69, caput, do CP, quando o agente realiza o concurso real de crimes,</p><p>“aplicam-se cumulativamente as penas em que haja incorrido”. Portanto, no concurso material,</p><p>as penas são cumuladas, somadas.</p><p>Aplica-se, pois, o sistema do cúmulo material de fixação da pena.</p><p>5.6.2. Concurso formal (art. 70 do CP)</p><p>5.6.2.1. Conceito</p><p>Ocorre o concurso formal (ou ideal) quando o agente, mediante uma só ação ou omissão,</p><p>pratica dois ou mais crimes (art. 70, caput, do CP). Há unidade de conduta e pluralidade de</p><p>crimes.</p><p>A unidade de conduta concretiza-se quando os atos são realizados no mesmo contexto</p><p>espacial e temporal, não exigindo, necessariamente, ato único. De fato, pode haver unidade de</p><p>conduta mesmo quando fracionada em vários atos, por exemplo, agente que subtrai objetos per-</p><p>tencentes a pessoas distintas, no mesmo contexto fático.</p><p>O Superior Tribunal de Justiça tem entendido que, praticado o crime de roubo em um</p><p>mesmo contexto fático, mediante uma só ação, contra vítimas diferentes, tem-se configurado o</p><p>concurso formal de crimes.</p><p>5.6.2.2. Concurso formal perfeito e concurso formal imperfeito</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>39</p><p>a) concurso formal perfeito, ou próprio (primeira parte do art. 70 do CP): ocorre quando</p><p>o agente pratica duas ou mais infrações penais por meio de uma única conduta. Resulta de um</p><p>único desígnio. O agente, de um só impulso volitivo, dá causa a dois ou mais resultados, sem</p><p>desígnios autônomos em relação a cada um dos resultados.</p><p>Desígnio autônomo caracteriza-se pelo fato de o agente pretender, mediante uma única</p><p>conduta, atingir dois ou mais resultados. Ou seja, o agente, mediante uma ação ou omissão, age</p><p>com consciência e vontade em relação a cada um deles, considerados isoladamente.</p><p>Assim, se, por exemplo, o agente, na condução de veículo automotor, atropela e causa a</p><p>morte de uma pessoa e lesão corporal em outra, pratica crime de homicídio culposo na condução</p><p>de veículo automotor (art. 302 do CTB), em concurso formal perfeito, já que não tinha desígnios</p><p>autônomos em relação a cada um dos resultados.</p><p>b) concurso formal imperfeito, ou impróprio (segunda parte do art. 70 do CP): ocorre</p><p>quando o agente, mediante uma ação ou omissão, pretende, de forma consciente e voluntária,</p><p>o resultado em relação a cada um dos crimes.</p><p>Ex.: o agente provoca fogo em uma residência com a intenção de matar todos os mora-</p><p>dores. O agente tem desígnios autônomos (intenção de matar) em relação a cada um dos mora-</p><p>dores da residência.</p><p>A expressão “desígnios autônomos” abrange tanto o dolo direto quanto o dolo eventual.</p><p>Assim, haverá concurso formal imperfeito, por exemplo, entre o delito de homicídio doloso com</p><p>dolo direto e outro com dolo eventual.</p><p>5.6.2.3. Aplicação da pena no concurso formal</p><p>Em relação ao concurso formal perfeito, ou próprio, o Código Penal adotou o sistema de</p><p>exasperação da pena. Aplica-se a pena do crime mais grave ou, se iguais, somente uma delas,</p><p>mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade.</p><p>O critério adotado pela jurisprudência para a fixação do aumento da pena em decorrência</p><p>do concurso formal perfeito de crimes tem relação com o número de crimes cometidos pelo</p><p>agente.</p><p>Número de cri-</p><p>mes</p><p>2 crimes 3 crimes 4 crimes 5 crimes</p><p>5 ou mais</p><p>crimes</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>40</p><p>Aumento da</p><p>pena</p><p>1/6 de au-</p><p>mento</p><p>1/5 de au-</p><p>mento</p><p>1/4 de au-</p><p>mento</p><p>1/3 de au-</p><p>mento</p><p>1/2 de au-</p><p>mento</p><p>No concurso formal imperfeito, ou impróprio, por conta do maior grau de reprovabilidade</p><p>da conduta do agente, visando a não beneficiar agente que agiu com desígnios autônomos em</p><p>relação a cada resultado, as penas devem ser somadas, adotando-se o critério do cúmulo ma-</p><p>terial, nos termos do art. 70, caput, 2ª parte, do CP.</p><p>5.6.3. Concurso material benéfico (art. 70, par. ún., do CP)</p><p>Se da aplicação da regra da exasperação da pena, no concurso formal, a pena tornar-se</p><p>superior à que resultaria se somadas, deve-se adotar o critério do cúmulo material, porque, nesse</p><p>caso, será mais benéfico (art. 70, par. ún., do CP).</p><p>Ex.: suponha-se que o agente tenha praticado um homicídio simples (art. 121 do CP –</p><p>pena de 6 a 20 anos) e uma lesão corporal leve (art. 129, caput, do CP – pena de 3 meses a 1</p><p>ano), em concurso formal. Aplicado o critério da exasperação da pena, considerando-se a pena</p><p>do crime mais agrave, acrescido</p><p>de 1/6, resultaria na pena de 7 (sete) anos.</p><p>Se aplicada a pena considerando-se o critério do cúmulo material, considerando-se a</p><p>pena aplicada para crime de homicídio simples (6 anos) e lesão corporal leve (3 meses), a pena</p><p>definitiva ficaria em 6 (seis) anos e 3 (três) meses. Essa seria a pena a ser aplicada, já que a</p><p>aplicação do critério do concurso material é mais benéfica.</p><p>Em face disso, a pena a ser aplicada não pode ser superior à que seria cominada se fosse</p><p>caso de concurso material, aplicando-se, nesse caso, o disposto no art. 70, par. ún., do CP.</p><p>5.6.4. Crime continuado (art. 71 do CP)</p><p>5.6.4.1. Conceito</p><p>Ocorre o crime continuado quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão,</p><p>pratica dois ou mais crimes da mesma espécie, devendo os subsequentes, pelas condições de</p><p>tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, ser havidos como continuação do</p><p>primeiro.</p><p>5.6.4.2. Requisitos</p><p>Para a incidência das regras do crime continuado é preciso verificar a presença de</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>41</p><p>requisitos dispostos no art. 71 do CP, consistentes: a) na pluralidade de condutas; b) na plurali-</p><p>dade de crimes da mesma espécie; c) nas mesmas condições de tempo, lugar, maneira de exe-</p><p>cução e outras semelhantes.</p><p>a) Pluralidade de condutas: nos termos do art. 71 do CP, o crime continuado caracteriza-</p><p>se pelo fato de o agente praticar crimes mediante mais de uma ação ou omissão, exigindo, pois,</p><p>pluralidade de condutas.</p><p>Distingue-se do concurso material, que também exige pluralidade de condutas, por força</p><p>da incidência dos demais requisitos, ou seja, a prática de crimes de mesma espécie, nas mesmas</p><p>condições de tempo, lugar e maneira de execução.</p><p>b) Crimes da mesma espécie: crimes da mesma espécie são os que estiverem previstos</p><p>no mesmo tipo penal, considerando-se, inclusive, as figuras simples ou qualificadas, dolosas ou</p><p>culposas, tentadas ou consumadas.</p><p>De outro lado, a teor da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não há como re-</p><p>conhecer a continuidade delitiva entre os crimes de roubo e de latrocínio, porquanto são delitos</p><p>de espécies diversas, já que tutelam bens jurídicos diferentes.1</p><p>c) Condições de tempo: exige-se, para caracterizar crime continuado, conexão temporal</p><p>entre as condutas praticadas para que se configure a continuidade delitiva. Deve existir, em ou-</p><p>tros termos, certa periodicidade que permita se observar certo ritmo, certa uniformidade, entre</p><p>as ações sucessivas, embora não se possam fixar, a respeito, indicações precisas.</p><p>A jurisprudência tem admitido crime continuado quando entre as infrações penais não</p><p>houver decorrido período superior a 30 (trinta) dias.</p><p>d) Condições de lugar: deve existir entre os crimes da mesma espécie uma conexão</p><p>espacial para caracterizar o crime continuado.</p><p>A prática de crimes da mesma espécie em locais diversos não exclui a continuidade. As-</p><p>sim, crimes praticados em bairros diversos de uma mesma cidade, ou em cidades próximas,</p><p>podem ser entendidos como praticados em condições de lugar semelhantes.</p><p>e) Maneira de execução: a lei exige que a forma de execução das infrações continuadas</p><p>seja semelhante, traduzindo-se no modo, forma e meios empregados para a prática dos delitos.</p><p>Ex.: empregado de um estabelecimento comercial que subtrai, diariamente, objetos da empresa.</p><p>Todavia, um crime de furto qualificado pela escalada e outro furto qualificado pela des-</p><p>treza, conquanto crimes da mesma espécie, inviabilizam a incidência do crime continuado, já que</p><p>empregaram modos de execução distintos.</p><p>1 STJ – HC 384875/SP – rel. Min. Ribeiro Dantas – 5ª Turma – j. 20-3-2018.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>42</p><p>5.6.4.3. Crime continuado específico (art. 71, par. ún., do CP)</p><p>O crime continuado específico prevê a necessidade de três requisitos, que devem ocorrer</p><p>simultaneamente:</p><p>1) Contra vítimas diferentes: admite-se nexo de causalidade entre crimes que lesam</p><p>interesses jurídicos pessoais, ainda que praticados contra vítimas diversas.</p><p>Assim, admite o Código Penal nexo de continuidade entre homicídios, lesões corporais</p><p>ou roubos contra vítimas diversas, podendo o juiz, de acordo com as circunstâncias judiciais do</p><p>art. 59, caput, do CP, aumentar a pena de um dos delitos até o triplo, desde que a pena não seja</p><p>superior à que seria imposta se o caso fosse de concurso material.</p><p>2) Com violência ou grave ameaça à pessoa: mesmo que o crime seja contra vítimas</p><p>diferentes, se não houver violência – real ou ficta – contra a pessoa, não haverá a continuidade</p><p>específica, mesmo que haja violência contra a coisa.</p><p>3) Somente em crimes dolosos: se a ação criminosa for praticada contra vítimas dife-</p><p>rentes, com violência à pessoa, mas não for produto de uma conduta dolosa, não estará carac-</p><p>terizada a exceção.</p><p>5.6.4.4. Aplicação da pena</p><p>Tratando-se de crime continuado comum, aplica-se a pena do crime mais grave, aumen-</p><p>tada de 1/6 até 2/3.</p><p>O parâmetro para o aumento da pena entre 1/6 e 2/3 deve ser proporcional ao número de</p><p>infrações praticadas. É o que se extrai da Súmula 659 do STJ: "A fração de aumento em razão</p><p>da prática de crime continuado deve ser fixada de acordo com o número de delitos cometidos,</p><p>aplicando-se 1/6 pela prática de duas infrações, 1/5 para três, 1/4 para quatro, 1/3 para cinco,</p><p>1/2 para seis e 2/3 para sete ou mais infrações."</p><p>Número de</p><p>crimes</p><p>2 crimes 3 crimes 4 crimes 5 crimes 6 crimes</p><p>7 ou mais</p><p>crimes</p><p>Aumento de</p><p>pena</p><p>1/6 de au-</p><p>mento</p><p>1/5 de au-</p><p>mento</p><p>1/4 de au-</p><p>mento</p><p>1/3 de au-</p><p>mento</p><p>1/2 de au-</p><p>mento</p><p>2/3 de au-</p><p>mento</p><p>Com relação a crime continuado específico, previsto no art. 71, par. ún., do CP, aplica-se</p><p>a pena do crime mais grave aumentada até o triplo. Todavia, segundo o entendimento do Su-</p><p>premo Tribunal Federal, no crime continuado qualificado, a majoração da pena não está adstrita</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>43</p><p>ao número de infrações praticadas, haja vista que o art. 71, par. ún., do CP determina que poderá</p><p>o juiz, “considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do</p><p>agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se</p><p>idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo”. Logo, a fração de aumento de pena no crime</p><p>continuado qualificado lastreia-se nos vetores em questão, e não apenas no número de infrações</p><p>praticadas.</p><p>6. Da Suspensão Condicional da Pena</p><p>6.1. Conceito</p><p>Trata-se de um instituto de política criminal, tendo por fim a suspensão da execução da</p><p>pena privativa de liberdade, evitando o recolhimento ao cárcere do condenado não reincidente</p><p>condenado à pena não superior a 2 (dois) anos (ou a 4 anos, na hipótese de sursis etário ou</p><p>humanitário), mediante o cumprimento de determinadas condições, fixadas pelo juiz, durante o</p><p>período de prova.</p><p>Os requisitos da suspensão condicional da execução da pena estão previstos no art. 77</p><p>do CP.</p><p>6.1.1. Requisitos objetivos</p><p>a) Pena privativa de liberdade: quanto à qualidade da pena, somente a pena privativa</p><p>de liberdade, seja reclusão, seja detenção, admite a suspensão condicional da execução da</p><p>pena.</p><p>Não cabe sursis em relação à pena restritiva de direitos e à pena de multa. É o que se</p><p>extrai do art. 80 do CP, segundo o qual “a suspensão não se estende às penas restritivas de</p><p>direitos nem à multa”.</p><p>Não se aplica o sursis às medidas de segurança, uma vez que o instituto é voltado a</p><p>suspender a execução da pena. E medida de segurança não tem natureza jurídica de pena. Além</p><p>disso, verificada a inimputabilidade pela enfermidade mental, a sentença será absolutória impró-</p><p>pria, não havendo, pois, execução da pena a suspender.</p><p>b) Quantidade da pena privativa de liberdade: como regra, a quantidade da pena im-</p><p>posta na sentença não pode ser superior a 2 (dois) anos, ainda que resulte, no concurso de</p><p>crimes, de sanções inferiores a ela.</p><p>1ª</p><p>Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>44</p><p>Tratando-se, entretanto, de condenado maior de 70 anos de idade, ao tempo da sentença</p><p>ou do acórdão (sursis etário) ou em razão de saúde (sursis humanitário ou profilático), a pena</p><p>aplicada pode ser igual ou inferior a 4 (quatro) anos (art. 77, § 2º, do CP).</p><p>Em relação a concurso de crimes, em qualquer das suas espécies, a pena aplicada, con-</p><p>siderando os critérios da exasperação da pena ou cúmulo material, não pode ser superior a 2</p><p>(dois) anos (ou 4 anos, na hipótese de sursis etário ou humanitário).</p><p>c) Impossibilidade de substituição por pena restritiva de direitos: somente se aplica</p><p>o sursis quando incabível ou não recomendável a substituição da pena privativa de liberdade por</p><p>restritiva de direitos (art. 77, III, do CP).</p><p>6.1.2. Requisitos subjetivos</p><p>a) Condenado não reincidente em crime doloso: nem toda reincidência impede a con-</p><p>cessão do sursis, mas somente a reincidência em crime doloso. Isso quer dizer que a condena-</p><p>ção anterior, mesmo definitiva, por crime culposo ou por simples contravenção, por si só, não é</p><p>causa impeditiva da suspensão condicional da pena.</p><p>Todavia, a reincidência, ainda que em crime doloso, em decorrência de anterior condena-</p><p>ção a pena de multa, não impede a concessão do sursis (art. 77, § 1º, do CP).</p><p>b) Circunstâncias judiciais favoráveis ao agente: não é indispensável que todas as</p><p>circunstâncias sejam favoráveis, como ocorre com sursis especial. Basta que, no geral, não se-</p><p>jam desfavoráveis de modo a criar dúvidas fundadas sobre a possibilidade de o condenado voltar</p><p>a delinquir.</p><p>6.2. Condições</p><p>Durante o período do sursis, o condenado deve cumprir determinadas condições, sob</p><p>pena de ser revogada a medida e ter de cumprir a sanção privativa de liberdade. Essas condições</p><p>são: a) legais: impostas pela lei (arts. 78, § 1º, e 81 do CP); b) judiciais: impostas pelo juiz na</p><p>sentença (art. 79 do CP).</p><p>No sursis simples, a condição legal e obrigatória consiste na prestação de serviços à co-</p><p>munidade ou limitação de fim de semana, no primeiro ano do período de suspensão (art. 78,</p><p>§ 1º, 1ª parte, do CP).</p><p>Tratando-se de sursis especial, satisfeitos os seus requisitos, as condições alternativas</p><p>da prestação de serviços à comunidade e a limitação de fim de semana são substituídas por:</p><p>proibição de frequentar determinados lugares; proibição de o condenado ausentar-se da</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>45</p><p>comarca onde reside, sem autorização judicial; e comparecimento pessoal e obrigatório a juízo,</p><p>mensalmente, para informar e justificar suas atividades (art. 78, § 2º, a e c, do CP).</p><p>As condições legais do sursis especial, previstas no art. 78, § 2º, a, b e c, do CP, devem</p><p>ser impostas cumulativamente.</p><p>6.3. Período de prova</p><p>É o prazo em que a execução da pena privativa de liberdade imposta fica suspensa, me-</p><p>diante o cumprimento das condições estabelecidas.</p><p>Como regra, o período de prova varia entre 2 (dois) a 4 (quatro) anos (art. 77, caput, do</p><p>CP). Sendo o condenado maior de 70 anos de idade ou por razões de saúde, o prazo varia de 4</p><p>(quatro) a 6 (seis) anos (art. 77, § 2º, do CP). Tratando-se da contravenção, o período de prova</p><p>varia de 1 (um) a 3 (três) anos (art. 11 da LCP).</p><p>O período de prova deve ser fixado segundo a natureza do crime, personalidade do agente</p><p>e intensidade da pena, não podendo o juiz, senão em hipótese excepcional, estabelecê-lo no</p><p>prazo máximo.</p><p>6.3.1. Causas de revogação do sursis</p><p>Incidindo uma causa de revogação do sursis, deverá o condenado cumprir integralmente</p><p>a pena privativa de liberdade cuja execução se encontrava suspensa, desconsiderando o tempo</p><p>que permaneceu no período de prova, ainda que tenha cumprido as condições impostas.</p><p>Assim, se, por exemplo, no primeiro ano o agente cumpriu prestação de serviço à comu-</p><p>nidade, sobrevindo causa de revogação do sursis, esse período não será descontando/detraído</p><p>da pena privativa de liberdade que deverá ser executada.</p><p>a) Revogação obrigatória: a revogação obrigatória decorre de lei, não ficando a critério</p><p>do Magistrado decretá-la ou não. A margem de discricionariedade do Magistrado é limitada pela</p><p>lei, sendo seu dever revogar o benefício.</p><p>Nos termos do art. 81 do CP, a suspensão condicional da execução da pena será revo-</p><p>gada, no curso do prazo, ao beneficiário que:</p><p>1) é condenado, sem sentença irrecorrível, por crime doloso: a lei não faz ressalva</p><p>no sentido de que a condenação deva ser por crime praticado no curso da suspensão condicional</p><p>da pena. Logo, não se mostra relevante se o crime foi praticado antes ou depois do início da</p><p>suspensão condicional da pena. Basta que tenha havido sentença condenatória transitada em</p><p>julgado pela prática de crime doloso, independentemente de quando foi praticado.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>46</p><p>Todavia, se a nova condenação se referir somente à pena de multa, não haverá revoga-</p><p>ção do benefício. Com efeito, se a condenação anterior à pena de multa, mesmo por crime do-</p><p>loso, não impede a concessão do sursis (art. 77, § 1º, do CP), também não pode ser causa de</p><p>revogação do benefício.</p><p>2) frustra, embora solvente, a execução de pena de multa ou não efetua, sem motivo</p><p>justificado, a reparação do dano: trata-se da hipótese de o condenado solvente criar embara-</p><p>ços para frustrar a execução da pena de multa que obstem a cobrança da multa, não efetuando</p><p>o seu pagamento.</p><p>3) Também constitui causa obrigatória de revogação do sursis a ausência injustificada da</p><p>reparação do dano. Assim, se justificada a impossibilidade de reparação do dano, por exemplo,</p><p>a precária situação financeira do condenado, não incidirá a causa de revogação do benefício.</p><p>4) descumpre a condição do § 1º do art. 78 do CP: como ocorre na hipótese da repa-</p><p>ração do dano, somente o descumprimento injustificado da prestação de serviços à comunidade</p><p>ou da limitação de fim de semana ensejará a revogação do benefício.</p><p>b) Revogação facultativa: incidindo uma causa de revogação facultativa do sursis, ficará</p><p>a critério do juiz revogar ou não o benefício.</p><p>As hipóteses de revogação facultativa estão previstas no art. 81, § 1º, do CP. Nesse caso,</p><p>o juiz não está obrigado a revogar o benefício, podendo optar por advertir novamente o senten-</p><p>ciado, prorrogar o período de prova até o máximo ou exacerbar as condições impostas, conforme</p><p>dispõe o art. 81, § 3º, do CP.</p><p>São duas as hipóteses de revogação facultativa:</p><p>1) o condenado deixa de cumprir qualquer outra condição imposta: na hipótese de</p><p>revogação facultativa, a decisão fica sujeita à discricionariedade do juiz, que, em vez de revogar</p><p>a suspensão, poderá prorrogar o período de prova. Aqui, a lei refere-se às condições legais</p><p>previstas para o sursis especial (art. 78, § 2º, do CP) e às condições judiciais que foram deter-</p><p>minadas (art. 79 do CP).</p><p>2) condenação irrecorrível, por crime culposo ou contravenção, à pena privativa de</p><p>liberdade e restritiva de direitos: essa hipótese afasta a condenação à pena de multa, já que</p><p>se refere, especificamente, às outras duas modalidades de penas.</p><p>6.4. Extinção da pena</p><p>Se o período de prova termina sem que haja ocorrido motivo para a revogação, não mais</p><p>se executa a pena privativa de liberdade (art. 82 do CP).</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>47</p><p>Assim, expirado o prazo de suspensão ou de prorrogação sem que tenha havido motivo</p><p>para a revogação, o juiz deve declarar extinta a pena privativa de liberdade.</p><p>Trata-se de sentença declaratória. Em face disso, considera-se, para fins de extinção da</p><p>pena, a data do término do período de prova e não a data em que o juiz profere a decisão, ainda</p><p>que seja em período posterior.</p><p>7. Do Livramento Condicional</p><p>7.1. Conceito</p><p>Trata-se de um instituto de política criminal, destinado a antecipar o retorno do condenado</p><p>ao convívio social, mediante determinadas condições e de forma precária, desde que</p><p>preenchi-</p><p>dos os requisitos legais.</p><p>7.2. Requisitos</p><p>Os requisitos do livramento condicional, de ordem objetiva e subjetiva, encontram-se no</p><p>art. 83 do CP.</p><p>a) Natureza e quantidade da pena: assim como na suspensão condicional do processo,</p><p>o livramento condicional somente pode ser concedido em relação à pena privativa de liberdade.</p><p>Não cabe, pois, à pena restritiva de direitos e multa.</p><p>Além disso, o benefício somente poderá ser concedido à pena privativa de liberdade igual</p><p>ou superior a 2 (dois) anos (art. 83 do CP). A soma das penas é permitida para atingir esse limite</p><p>mínimo, mesmo que tenham sido aplicadas em processos distintos, nos termos do art. 84 do CP.</p><p>b) Cumprimento de parte da pena: nos termos do art. 83, I, do CP, se o criminoso não</p><p>for reincidente em crime doloso e ostentar bons antecedentes, deverá cumprir mais de 1/3 da</p><p>pena privativa de liberdade para obter o benefício. É a hipótese de livramento condicional sim-</p><p>ples.</p><p>Se o condenado for reincidente em crime doloso, deverá cumprir mais da metade da pena</p><p>privativa de liberdade, conforme dispõe o art. 83, II, do CP. Trata-se do livramento condicional</p><p>qualificado. Por conta da ausência de expressa previsão legal, deve-se conferir ao condenado o</p><p>tratamento mais benéfico. Ou seja, o condenado não reincidente em crime doloso, mas portador</p><p>de maus antecedentes, deverá cumprir mais de 1/3 da pena para obtenção do livramento condi-</p><p>cional.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>48</p><p>Tratando-se de condenado por prática de tortura, crime hediondo, tráfico ilícito de entor-</p><p>pecentes e drogas afins, terrorismo e tráfico de pessoas (introduzido pela Lei nº 13.344/2016),</p><p>desde que não seja reincidente específico em tais delitos, deve cumprir mais de 2/3 da pena (art.</p><p>83, V, do CP). Trata-se do livramento condicional específico.</p><p>Assim, sendo reincidente específico em crime hediondo ou equiparado, não é admissível</p><p>o livramento condicional. Há reincidência específica, para efeito desse dispositivo, quando o su-</p><p>jeito, já tendo sido condenado por qualquer dos delitos hediondos por sentença transitada em</p><p>julgado, vem novamente a cometer crime dessa mesma natureza. Ex.: após condenação defini-</p><p>tiva por crime de homicídio qualificado, o agente pratica e é condenado pelo crime de tráfico de</p><p>drogas. Nesse caso, não terá direito a livramento condicional, por ser reincidente específico por</p><p>crime de natureza hedionda e equiparado.</p><p>c) Reparação do dano, salvo efetiva impossibilidade: nos termos do art. 91, I, do CP,</p><p>a condenação torna certa a obrigação de indenizar o dano resultante do crime. Assim, o conde-</p><p>nado não pode obter o livramento condicional enquanto não reparar o dano causado, salvo</p><p>quando insolvente.</p><p>Na prática, esse requisito tem limitado alcance, uma vez que, via de regra, os condenados</p><p>são pessoas pobres, absolutamente insolventes, sem a menor possibilidade de reparar o dano</p><p>causado.</p><p>d) Bom comportamento durante a execução da pena: o bom comportamento carcerá-</p><p>rio, via de regra, é aferido com base no atestado emitido pelo diretor do estabelecimento carce-</p><p>rário, considerando-se a conduta do condenado ao longo da execução da pena. Em outras pa-</p><p>lavras, para a verificação do requisito subjetivo não se leva em conta o crime praticado pelo</p><p>condenado, mas seu comportamento durante o cumprimento da pena.</p><p>Convém sinalar, por pertinente, que a prática de falta grave não interrompe o prazo para</p><p>a concessão do livramento condicional. É o que se extrai da Súm. nº 441 do STJ, segundo a qual</p><p>“A falta grave não interrompe o prazo para obtenção de livramento condicional”.</p><p>De acordo com a Súm. nº 439/STJ, “admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades</p><p>do caso, desde que em decisão motivada”.</p><p>b) Não cometimento de falta grave nos últimos doze meses: a Lei nº 13.964/2019</p><p>acrescentou mais um requisito para a obtenção do livramento condicional, consistente no não</p><p>cometimento de falta grave nos últimos 12 meses de execução da pena.</p><p>As hipóteses de falta grave durante a execução da pena estão previstas no art. 50 da Lei</p><p>nº 7.210/1984.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>49</p><p>Se o condenado praticou falta grave ao longo dos últimos 12 meses, não terá direito à</p><p>obtenção do livramento condicional, ainda que preenchidos os demais requisitos.</p><p>c) Bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído: trata-se de uma exigência sa-</p><p>lutar para o retorno do condenado ao convívio social, mas, infelizmente, de pouca efetividade</p><p>prática, por conta da carência ou dificuldade de inserção do apenado no mercado de trabalho.</p><p>Ao referir-se a “trabalho que lhe foi atribuído”, fica claro que não se trata apenas das ati-</p><p>vidades laborais desenvolvidas no interior do cárcere, mas também se refere ao trabalho efetu-</p><p>ado fora da prisão, por exemplo, o serviço externo, tanto na iniciativa privada como na pública.</p><p>d) Aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto: a lei não</p><p>determina que o apenado deve ter emprego assegurado no momento da liberação. O que a lei</p><p>exige é a aptidão, isto é, a disposição, a habilidade, a inclinação do condenado para viver às</p><p>custas de seu próprio e honesto esforço.</p><p>e) Constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não vol-</p><p>tará a delinquir na hipótese de condenado por crime doloso, cometido com violência ou</p><p>grave ameaça: tratando-se de condenado por crime doloso cometido com violência ou grave</p><p>ameaça à pessoa, a concessão do livramento fica subordinada, além dos requisitos do art. 83</p><p>do CP, à constatação, mediante perícia, de condições pessoais que façam presumir que o libe-</p><p>rado não voltará a delinquir (art. 83, par. ún., do CP).</p><p>7.3. Livramento condicional vedado</p><p>A Lei nº 13.964/2019, que altera o art. 112 da Lei nº 7.210/1984 (LEP), passou a prever</p><p>vedação do livramento condicional a condenados pela prática de determinados crimes.</p><p>É vedado o livramento condicional:</p><p>• ao condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte</p><p>(art. 112, VI, a e c, da LEP);</p><p>• ao condenado expressamente em sentença, por integrar organização criminosa ou</p><p>por crime praticado por meio de organização criminosa, não será facultada a pro-</p><p>gressão de regime de cumprimento de pena ou a obtenção do livramento condici-</p><p>onal ou outros benefícios prisionais se houver elementos probatórios que indiquem</p><p>a manutenção do vínculo associativo (art. 2°, § 9º, da Lei nº 12.850/2013);</p><p>• ao reincidente em crime hediondo ou equiparado (art. 83, V, do CP).</p><p>7.4. As causas de revogação do livramento condicional</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>50</p><p>O livramento condicional, pela própria natureza do benefício, é passível de revogação a</p><p>qualquer momento, desde que presente alguma hipótese que a justifique.</p><p>As causas de revogação obrigatórias estão previstas no art. 86 do CP, ao passo que as</p><p>causas de revogação facultativa estão previstas no art. 87.</p><p>7.4.1. Causas de revogação obrigatória</p><p>Quando ocorre uma causa obrigatória, não fica a critério do juiz revogar o livramento con-</p><p>dicional ou não, a revogação decorre da própria lei.</p><p>A revogação obrigatória incide quando o liberado vem a ser condenado a pena privativa</p><p>de liberdade, em sentença irrecorrível, por crime praticado durante ou antes da concessão do</p><p>livramento condicional.</p><p>A condenação pela prática de contravenção penal ou por crime a pena que não seja pri-</p><p>vativa de liberdade constitui causa de revogação facultativa.</p><p>7.4.2. Causas de revogação facultativa</p><p>Nas hipóteses de revogação facultativa, cumpre ao juiz deliberar acerca da revogação ou</p><p>manutenção do livramento condicional. Trata-se, pois, de causas judiciais de revogação do livra-</p><p>mento condicional.</p><p>Se mantido o livramento condicional, na hipótese da revogação facultativa, o Juiz deverá</p><p>advertir o liberado ou agravar as condições (art. 140, par. ún., da LEP).</p><p>Nos termos do art. 87 do CP, duas são</p><p>as hipóteses de revogação facultativa:</p><p>a) se o liberado deixar de cumprir qualquer das obrigações constantes na sentença;</p><p>b) se o liberado for irrecorrivelmente condenado, por crime ou contravenção, a pena</p><p>que não seja privativa de liberdade.</p><p>8. Efeitos da Condenação</p><p>8.1. Efeitos principais</p><p>Como corolário lógico da sentença penal condenatória, o efeito principal consiste na apli-</p><p>cação de uma pena privativa de liberdade, restritiva de direitos e/ou multa, além de medida de</p><p>segurança, no caso de agente semi-imputável que revela periculosidade.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>51</p><p>8.2. Efeitos secundários</p><p>Além dos efeitos principais, a sentença condenatória gera efeitos secundários, também</p><p>denominados efeitos mediatos, acessórios, reflexos ou indiretos, de natureza penal e extrapenal.</p><p>8.2.1. Efeitos secundários de natureza penal</p><p>São inúmeros os efeitos secundários da sentença penal condenatória transitada em jul-</p><p>gado, entre os quais podem ser destacados os seguintes:</p><p>a) gerar a reincidência (art. 63 do CP);</p><p>b) configuração de maus antecedentes, se não utilizada para fins de reincidência;</p><p>c) fixação do regime inicial fechado na hipótese de prática de novo crime, ressalvada</p><p>a hipótese da Súm. nº 269 do STJ;</p><p>d) vedação da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos na</p><p>hipótese de prática de novo crime, ressalvada a hipótese do art. 44, § 3º, do CP;</p><p>e) vedação da concessão da suspensão condicional da pena em relação ao novo</p><p>crime (art. 77, I, do CP), e revogação do sursis (art. 81, I, e § 1º, do CP);</p><p>f) causa de revogação do livramento condicional (arts. 86 e 87 do CP);</p><p>g) aumento e interrupção do prazo da prescrição da pretensão executória, quando</p><p>reconhecida a reincidência pela prática de outro crime (arts. 110, caput, e 117, VI,</p><p>do CP);</p><p>h) vedação da concessão da transação penal e da suspensão condicional do pro-</p><p>cesso, em relação ao novo crime (arts. 76, § 2º, I, e 89, caput, da Lei nº 9.099/1995).</p><p>8.2.2. Efeitos secundários de natureza extrapenal</p><p>Além de gerar efeitos penais, a sentença penal condenatória transitada em julgado gera</p><p>efeitos extrapenais, ou seja, em outras áreas do direito, como na esfera cível, administrativa,</p><p>trabalhista, eleitoral etc. Esses efeitos se dividem em genéricos e específicos.</p><p>Os efeitos genéricos incidem sobre todos os crimes e estão previstos no art. 91 do CP,</p><p>consistentes em reparar o dano e confisco. Incidem de forma automática, não sendo necessário,</p><p>portanto, o juiz declarar na sentença. É o que se extrai, a contrario sensu, do disposto no art. 92,</p><p>par. ún., do CP.</p><p>Os efeitos específicos são aqueles previstos no art. 92 do CP. Nos termos do parágrafo</p><p>único do art. 92, esses efeitos não incidem de forma automática, devendo o juiz declará-los</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>52</p><p>motivadamente na sentença.</p><p>8.2.3. Efeitos genéricos</p><p>a) Tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime: nos termos do</p><p>art. 91, I, do CP, constitui efeito da sentença penal condenatória “tornar certa a obrigação de</p><p>indenizar o dano causado pelo crime”. Trata-se de efeito automático decorrente da sentença</p><p>penal condenatória, já que meramente declaratória no tocante à indenização civil, não sendo</p><p>necessário mandamento expresso no sentido de o réu reparar o dano resultante do crime.</p><p>A sentença penal condenatória transitada em julgado permite à vítima promover a ação</p><p>de execução ex delicto, nos termos do art. 63 do CPP, já que constitui título executivo judicial,</p><p>conforme prevê o art. 515, I, do CPC.</p><p>Assim, transitada em julgado a sentença penal condenatória, a sua execução no juízo</p><p>cível visa tão somente estabelecer o quantum da reparação do dano, não sendo, portanto, objeto</p><p>de discussão o mérito da causa.</p><p>b) A perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-</p><p>fé, dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação,</p><p>uso, porte ou detenção constitua fato ilícito: é a hipótese do confisco como efeito da conde-</p><p>nação, previsto no art. 91, II, do CP. Trata-se da perda em favor da União de bens de origem</p><p>ilícita, decorrente do delito praticado.</p><p>Constitui efeito automático da sentença penal condenatória transitada em julgado, não</p><p>sendo, pois, necessário que o juiz declare expressamente na sentença.</p><p>8.2.4. Efeitos específicos</p><p>1. Perda de cargo, função pública ou mandato eletivo: o art. 92, I, do CP prevê duas</p><p>hipóteses de perda de cargo, função ou mandato eletivo como efeito da sentença penal conde-</p><p>natória:</p><p>a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a 1 (um)</p><p>ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a</p><p>Administração Pública;</p><p>b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro)</p><p>anos nos demais casos.</p><p>A primeira hipótese, pode incidir quando o funcionário público praticar o delito no exercício</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>53</p><p>das suas funções ou em razão dela, e a pena privativa de liberdade seja aplicada por tempo igual</p><p>ou superior a 1 (um) ano.</p><p>Não se tratando de crime funcional, a perda do cargo, função pública ou mandato eletivo</p><p>poderá incidir quando a pena aplicada for igual ou superior a 4 (quatro) anos.</p><p>Esse efeito, no entanto, não é automático, ou seja, exige para sua incidência que o juiz</p><p>declare expressamente em decisão motivada (art. 92, par. ún., do CP).</p><p>2. Incapacidade para o exercício do pátrio poder (poder familiar), tutela ou curatela:</p><p>além do vínculo entre o autor do fato e a vítima, a incidência do efeito específico consistente na</p><p>incapacidade para o exercício do poder familiar, tutela ou curatela, depende de duas condições:</p><p>a) que o crime seja doloso; b) que seja cominada pena de reclusão.</p><p>Esse efeito não é automático, devendo ser declarado na sentença em decisão motivada,</p><p>conforme se extrai do art. 92, par. ún., do CP. Assim, cumpre ao Magistrado, no caso concreto,</p><p>avaliar a necessidade da imposição da incapacidade para o exercício do poder familiar, tutela ou</p><p>curatela. Exemplo: pai condenado pela prática do crime estupro de vulnerável (art. 217-A do CP)</p><p>contra filha de tenra idade.</p><p>3. Inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a prática de</p><p>crime doloso: a aplicação desse efeito específico depende de dois requisitos: a) que o crime</p><p>seja doloso; b) que o veículo tenha sido utilizado “como meio” para a sua prática. Logo, não</p><p>incide esse efeito no caso de crime culposo.</p><p>8.2.5. Confisco alargado</p><p>A Lei nº 13.964/2019 (“Pacote Anticrime”) introduziu mais um efeito da sentença penal</p><p>condenatória.</p><p>Nos termos do art. 91-A do CP, na hipótese de condenação por infrações às quais a lei</p><p>comine pena máxima superior a 6 (seis) anos de reclusão, poderá ser decretada a perda, como</p><p>produto ou proveito do crime, dos bens correspondentes à diferença entre o valor do patrimônio</p><p>do condenado e aquele que seja compatível com o seu rendimento lícito.</p><p>Para efeito da perda prevista no caput do referido artigo, entende-se por patrimônio do</p><p>condenado todos os bens:</p><p>Art. 91-A. (...)</p><p>I – de sua titularidade, ou em relação aos quais ele tenha o domínio e o benefício direto</p><p>ou indireto, na data da infração penal ou recebidos posteriormente; e</p><p>II – transferidos a terceiros a título gratuito ou mediante contraprestação irrisória, a partir</p><p>do início da atividade criminal.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>54</p><p>§ 2° O condenado poderá demonstrar a inexistência da incompatibilidade ou a procedência</p><p>lícita do patrimônio.</p><p>§ 3° A perda prevista neste artigo deverá ser requerida expressamente pelo Ministério</p><p>Público, por ocasião do oferecimento da denúncia, com indicação da diferença apurada.</p><p>§ 4° Na sentença condenatória, o juiz deve declarar o valor da diferença apurada e espe-</p><p>cificar os bens cuja perda for decretada.</p><p>§ 5° Os instrumentos utilizados para a prática de crimes por organizações criminosas e</p><p>milícias deverão ser declarados perdidos em favor da União ou do Estado, dependendo</p><p>da Justiça onde tramita a ação penal, ainda que não ponham em perigo a segurança das</p><p>pessoas, a moral ou a ordem pública, nem ofereçam sério risco de ser utilizados para o</p><p>cometimento de novos crimes.</p><p>9. Extinção da Punibilidade</p><p>9.1. Conceito</p><p>Com a prática da infração penal, surge para o Estado o direito de punir o responsável,</p><p>incidindo a possibilidade jurídica de o Estado impor uma sanção penal ao responsável pela prá-</p><p>tica do crime ou contravenção penal.</p><p>9.2. Efeitos da extinção da punibilidade</p><p>Em regra, as causas extintivas da punibilidade só alcançam o direito de punir do Estado,</p><p>subsistindo o crime em todos os seus requisitos e a sentença condenatória irrecorrível.</p><p>Excepcionalmente, a causa extintiva de punibilidade apaga o fato praticado pelo agente e</p><p>rescinde a sentença condenatória irrecorrível. É o que ocorre com a abolitio criminis e a anistia.</p><p>9.3. Causas de extinção de punibilidade (art. 107 do CP)</p><p>9.3.1. Morte do agente</p><p>A morte do agente constitui causa de extinção da punibilidade, por conta do princípio da</p><p>personalidade da pena, segundo a qual a pena não pode passar da pessoa do condenado (art.</p><p>5º, XLV, 1ª parte, da CF/1988).</p><p>Essa extinção da punibilidade incide sobre todas as espécies de penas, inclusive a pena</p><p>de multa. Assim, se, no curso da execução da pena de multa convertida em dívida ativa, o réu</p><p>vier a falecer, deve ser declarada extinta a punibilidade do agente pela sua morte, não sendo</p><p>possível, assim, direcionar a execução da pena de multa aos seus sucessores.</p><p>9.3.2. Da anistia, graça e indulto</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>55</p><p>A anistia, graça e indulto constituem espécies de indulgência, ensejando a renúncia do</p><p>Estado ao direito de punir.</p><p>São benefícios concedidos por órgãos diversos do Poder Judiciário, mas que somente</p><p>ensejam a extinção da punibilidade após decisão judicial.</p><p>9.3.2.1. Anistia</p><p>Trata-se de uma espécie de exclusão da incidência do Direito Penal sobre uma ou mais</p><p>infrações penais. Não exclui o crime, mas apenas a possibilidade de o Estado punir o agente que</p><p>o praticou, razão pela qual tem efeito retroativo.</p><p>A competência para a concessão de anistia é exclusiva da União e privativa do Congresso</p><p>Nacional (art. 48, VIII, da CF/1988), com a sanção do Presidente da República, só podendo ser</p><p>concedida por meio de lei federal.</p><p>Não se aplica aos delitos referentes à prática de tortura, ao tráfico ilícito de entorpecentes</p><p>e drogas afins, ao terrorismo e aos definidos como crimes hediondos (art. 5º, XLIII, da CF/1988;</p><p>art. 2º, I, da Lei nº 8.072/1990).</p><p>9.3.2.2. Graça</p><p>A graça, ao contrário do indulto, é um benefício concedido a pessoa determinada, conde-</p><p>nada definitivamente pela prática de crime comum, consistente na extinção ou comutação da</p><p>pena.</p><p>Nos termos do art. 5º, XLIII, da CF/1988, a graça não pode ser aplicada em relação a</p><p>delitos referentes à prática de tortura, ao tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, ao terro-</p><p>rismo e aos definidos como crimes hediondos.</p><p>A competência para conceder a graça é do Presidente da República, nos termos do art.</p><p>84, XII, da CF/1988, podendo, nos termos do parágrafo único desse artigo, delegar a atribuição</p><p>“aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União”.</p><p>9.3.2.3. Indulto</p><p>O indulto coletivo constitui modalidade de clemência concedida a todo condenado que</p><p>preencher os requisitos previstos no Decreto presidencial publicado geralmente no final de cada</p><p>ano. Como se vê, o indulto, ao contrário da graça, tem caráter coletivo e é concedido esponta-</p><p>neamente.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>56</p><p>Assim como a graça, a competência para conceder o indulto é do Presidente da Repú-</p><p>blica, nos termos do art. 84, XII, da CF/1988, podendo, nos termos do parágrafo único desse</p><p>artigo, delegar a atribuição “aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República ou ao</p><p>Advogado-Geral da União”.</p><p>Os requisitos para a concessão do indulto variam de acordo com cada decreto publicado,</p><p>considerando, invariavelmente, requisitos subjetivos (primariedade e bom comportamento car-</p><p>cerário, sem registro de falta grave ao longo do ano) e objetivos (tempo de cumprimento de</p><p>pena).</p><p>Nos termos do art. 2º, I, da Lei nº 8.072/1990, o indulto não pode ser aplicado em relação</p><p>a delitos referentes à prática de tortura, ao tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, ao</p><p>terrorismo e aos definidos como crimes hediondos. O art. 44 da Lei nº 11.343/2006 também veda</p><p>a concessão do indulto aos condenados pelo crime de tráfico de drogas.</p><p>O indulto também extingue somente a punibilidade, subsistindo o crime, a condenação</p><p>irrecorrível e seus efeitos secundários. Assim, se o agente beneficiado com o indulto praticar</p><p>novo crime, será considerado reincidente.</p><p>9.3.3. Lei posterior que deixa de considerar o fato criminoso (abolitio</p><p>criminis)</p><p>A lei penal retroage, atingindo fatos ocorridos antes de sua entrada em vigor, sempre que</p><p>beneficiar o agente de qualquer modo (art. 5º, XL, da CF/1988).</p><p>Se a lei posterior deixar de considerar o fato como criminoso, excluir da seara penal a</p><p>conduta como sendo delituosa, retroagirá para alcançar os fatos praticados antes da sua vigên-</p><p>cia, com a consequente extinção da punibilidade dos responsáveis.</p><p>Nos termos do art. 2º do CP, a abolitio criminis gera o efeito de fazer cessar a execução</p><p>e os efeitos penais da sentença condenatória, por exemplo, a reincidência, maus antecedentes,</p><p>lançamento do nome do réu no rol dos culpados.</p><p>Todavia, não apaga os efeitos civis da prática delituosa, já que a lei fala em cessação dos</p><p>efeitos “penais” da sentença.</p><p>9.3.4. Prescrição, decadência e perempção</p><p>O art. 107, IV, do CP prevê como causas de extinção da punibilidade a prescrição, a de-</p><p>cadência e a perempção.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>57</p><p>A prescrição será analisada em capítulo próprio, diante da abrangência do tema.</p><p>9.3.4.1. Decadência</p><p>A decadência é a perda do direito do ofendido e dos demais legitimados de oferecer re-</p><p>presentação, no caso de ação penal pública condicionada à representação, e de ajuizar a queixa-</p><p>crime, na hipótese de ação penal privada, em face do decurso do tempo.</p><p>Os legitimados para apresentar representação ou queixa-crime têm o prazo de 6 (seis)</p><p>meses, a contar da inequívoca ciência da autoria do fato, para exercer esse direito. Escoado</p><p>esse prazo sem iniciativa do ofendido ou do seu representante legal, incide a decadência, e a</p><p>consequente extinção da punibilidade do agente ofensor.</p><p>Com efeito, nos termos do art. 103 do CP e do art. 38 do CPP, o ofendido ou seu repre-</p><p>sentante legal decai do direito de queixa ou de representação se não o exerce dentro do prazo</p><p>de 6 (seis) meses, contados a partir do dia em que veio a saber quem é o autor do crime, ou, no</p><p>caso da ação penal privada subsidiária da pública, do dia em que se esgotou o prazo para o</p><p>oferecimento da denúncia.</p><p>Como se trata de prazo penal, a contagem segue as regras do art. 10 do CP, incluindo-se</p><p>o dia do começo, excluindo-se o último dia, considerando o calendário comum. Assim, se, por</p><p>exemplo, o ofendido tomou ciência da autoria do fato no dia 3-3-2018, terá até o dia 2-9-2018</p><p>para oferecer a representação ou ajuizar a queixa-crime. A partir do dia 3-9-2018 já incidirá a</p><p>decadência e a causa de extinção da punibilidade.</p><p>9.3.4.2. Perempção</p><p>A perempção é uma causa de extinção da punibilidade que incide por conta da inércia</p><p>processual do querelante.</p><p>A perempção só é possível na ação penal exclusivamente privada, não sendo aplicável à</p><p>ação penal privada subsidiária da pública, já que, diante da negligência do querelante, o Minis-</p><p>tério Público retoma a ação</p><p>penal (art. 29, parte final, do CPP).</p><p>As hipóteses de perempção estão elencadas no art. 60 do CPP. E, segundo se extrai</p><p>desse dispositivo, a perempção somente é possível após o ajuizamento da ação penal privada.</p><p>9.3.5. Da renúncia ao direito de queixa ou perdão aceito nos crimes de</p><p>ação penal privada</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>58</p><p>1) Renúncia ao direito de queixa: é a abdicação do ofendido ou de seu representante</p><p>legal do direito de promover a ação penal privada. Trata-se de ato unilateral pelo qual o ofendido</p><p>delibera por não ajuizar a queixa-crime contra o suposto ofensor.</p><p>Nos termos do art. 104, caput, do CP: “o direito de queixa não pode ser exercido quando</p><p>renunciado expressa ou tacitamente”.</p><p>A renúncia ao direito de queixa somente pode ser exercida na ação penal exclusivamente</p><p>privada, não sendo possível na ação penal privada subsidiária da pública, uma vez que, se o</p><p>ofendido não oferecer a queixa-crime, o Ministério Público poderá oferecer a denúncia enquanto</p><p>não incidir causa de extinção da punibilidade do agente, por exemplo, pela prescrição.</p><p>2) Perdão do ofendido: o perdão do ofendido ou do seu representante legal consiste na</p><p>manifestação, expressa ou tácita, de desistir do prosseguimento da ação penal privada. É a de-</p><p>sistência manifestada após o oferecimento da queixa, que obsta o prosseguimento da ação penal</p><p>privada, conforme prevê o art. 105 do CP.</p><p>O perdão aceito do ofendido é causa extintiva de punibilidade que incide somente na ação</p><p>penal exclusivamente privada.</p><p>Tratando-se de ação penal privada subsidiária da pública (art. 100, § 3º, do CP), a desis-</p><p>tência do ofendido de prosseguir com o processo não determina a extinção da punibilidade,</p><p>mesmo que o réu aceite o perdão, pois se trata de ação penal pública, devendo o Ministério</p><p>Público assumi-la como parte principal (art. 29 do CPP).</p><p>Depois de iniciada a ação penal privada, o perdão do ofendido pode ser manifestado até</p><p>o trânsito em julgado da sentença penal condenatória (art. 106, § 2º, do CPP).</p><p>9.3.6. Da retratação do agente</p><p>A retratação significa desdizer-se, retirar o que foi dito, confessar que errou.</p><p>Em regra, a retratação do agente não tem relevância jurídica, funcionando somente como</p><p>circunstância judicial na aplicação da pena. Excepcionalmente, o estatuto penal empresta-lhe</p><p>força extintiva da punibilidade (art. 107, VI, do CP).</p><p>A retratação, como causa de extinção da punibilidade, somente incide nos casos expres-</p><p>samente previstos em lei, por exemplo, nos crimes contra a honra, conforme prevê o art. 143 do</p><p>CP.</p><p>Nos crimes contra a honra, a retratação só é cabível na calúnia e na difamação, sendo</p><p>inadmissível na injúria. Nos dois primeiros casos, importa à vítima que o ofensor se retrate ne-</p><p>gando que ela praticou o fato imputado. Na injúria, porém, não há imputação de fato, mas</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>59</p><p>atribuição ao ofendido de qualidade negativa, não importando a esta a retratação.</p><p>Também incide na hipótese prevista no art. 342, § 2º, do CP, que trata do crime de falso</p><p>testemunho ou falsa perícia, segundo o qual o fato deixa de ser punível, se, antes da sentença,</p><p>o agente se retrata ou declara a verdade. Essa retratação só é possível até a sentença final do</p><p>procedimento em que foi praticado o falso testemunho.</p><p>9.3.7. Perdão judicial</p><p>Perdão judicial é o instituto pelo qual o juiz, não obstante a incidência da infração penal</p><p>praticada por agente culpável, deixa de aplicar a pena nos casos expressamente previstos em</p><p>lei.</p><p>O perdão judicial constitui causa extintiva da punibilidade de aplicação restrita. Significa</p><p>que não é aplicável a todas as infrações penais, mas somente àquelas especialmente indicadas</p><p>pelo legislador.</p><p>A sentença que concede o perdão judicial é meramente declaratória da extinção da puni-</p><p>bilidade, não surtindo nenhum efeito penal ou extrapenal. É o que se extrai da Súm. nº 18 do</p><p>STJ, segundo a qual “A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da</p><p>punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório”.</p><p>9.4. Prescrição</p><p>9.4.1. Introdução</p><p>Quando um indivíduo pratica, em tese, um fato típico e ilícito, surge para o Estado o poder</p><p>e o dever de buscar a punição do responsável. E essa punição é concretizada com a sentença</p><p>penal condenatória transitada em julgado, com a imposição de uma pena, surgindo, a partir de</p><p>então, a pretensão do Estado de executar essa pena.</p><p>Todavia, a pretensão punitiva e executória do Estado é limitada, não perdurando, via de</p><p>regra, por tempo indeterminado. Com efeito, o direito de punir e de executar a pena imposta ao</p><p>apenado encontra limites temporais, que, se não observados, podem levar à extinção da punibi-</p><p>lidade do agente pela incidência de prescrição da pretensão punitiva ou prescrição da pretensão</p><p>executória.</p><p>A prescrição penal, pois, é a perda da pretensão punitiva ou executória do Estado pelo</p><p>decurso do tempo sem o seu exercício.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>60</p><p>9.4.2. Imprescritibilidade</p><p>Em regra, a prescrição alcança todas as infrações penais, inclusive os crimes hediondos</p><p>e equiparados.</p><p>Todavia, nos termos da Constituição Federal, alguns crimes são imprescritíveis, viabili-</p><p>zando, assim, o exercício da pretensão punitiva e executória a qualquer tempo.</p><p>São imprescritíveis os crimes de racismo (art. 5º, XLII, da CF/1988; Lei nº 7.716/1989) e</p><p>os referentes à ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o</p><p>Estado Democrático (art. 5º, XLIV, da CF/1988). Os Tribunais Superiores passaram a considerar</p><p>imprescritível também o crime de injúria racial (art. 140, § 3º, do CP).</p><p>9.4.3. Prazos para o cálculo da prescrição (art. 109 do CP)</p><p>A prescrição é regulada pelos prazos previstos no art. 109 do CP. Ou seja, os prazos</p><p>previstos nesse artigo servem de parâmetro para o cálculo da prescrição da pretensão punitiva</p><p>e executória:</p><p>I – em vinte anos, se o máximo da pena é superior a doze;</p><p>II – em dezesseis anos, se o máximo da pena é superior a oito anos e não excede a doze;</p><p>III – em doze anos, se o máximo da pena é superior a quatro anos e não excede a oito;</p><p>IV – em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro;</p><p>V – em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede</p><p>a dois;</p><p>VI – em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.</p><p>Convém destacar que as penas restritivas de direitos, que substituem a pena privativa de</p><p>liberdade, prescrevem no mesmo prazo das penas substituídas, nos termos do art. 109, par. ún.,</p><p>do CP.</p><p>Ex.: suponha-se que o agente tenha sido condenado a 1 (um) ano pela prática do crime</p><p>de furto, sendo a pena privativa de liberdade substituída por uma de prestação de serviços à</p><p>comunidade. Essa pena prescreverá em 4 (quatro) anos.</p><p>9.4.4. Redução dos prazos de prescrição em face da idade do sujeito</p><p>(art. 115 do CP)</p><p>O art. 115 determina que são reduzidos de metade os prazos da prescrição quando o</p><p>criminoso era, ao tempo do crime, menor de 21 anos ou maior de 70 anos na data da sentença.</p><p>9.4.5. Prescrição da pretensão punitiva</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>61</p><p>9.4.5.1. Prescrição da pretensão punitiva em abstrato (art. 109, caput, do</p><p>CP)</p><p>a) Contagem do prazo da prescrição da pretensão punitiva em abstrato: na prescri-</p><p>ção da pretensão punitiva, o decurso do tempo faz com que o Estado perca o direito de punir no</p><p>tocante à pretensão de o Poder Judiciário julgar a lide e aplicar a sanção penal.</p><p>A prescrição da pretensão punitiva ocorre antes de a sentença final transitar em julgado.</p><p>Para saber qual o prazo de prescrição da pretensão abstrata punitiva devemos verificar o</p><p>limite máximo da pena imposta em abstrato no preceito sancionador e enquadrá-lo em um dos</p><p>incisos do art. 109 do CP.</p><p>Ex.: suponha-se que um sujeito cometa um crime de lesão corporal</p><p>leve (pena de 3 meses</p><p>a 1 ano), não se descobrindo a autoria. Se o Estado, dentro de 4 (quatro) anos, não exercer o</p><p>direito de punir, opera-se a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva.</p><p>Aplica-se o disposto no art. 109.</p><p>No concurso de crimes (concurso material, formal e continuado), a prescrição atinge a</p><p>pretensão punitiva em relação a cada infração considerada isoladamente (art. 119 do CP).</p><p>b) Termos iniciais da prescrição da pretensão punitiva (art. 111 do CP): o primeiro</p><p>termo inicial é a data da consumação do delito (I).</p><p>No caso da tentativa (II), o termo a quo da prescrição da pretensão punitiva é o dia da</p><p>cessação da atividade criminosa.</p><p>No crime permanente (III), a prescrição começa a correr do dia em que cessou a perma-</p><p>nência (art. 111, III, 1ª figura, do CP). Ex.: suponha-se que a vítima de sequestro permaneça</p><p>presa durante 30 dias. A prescrição começa a correr a partir do dia em que conseguiu a liberdade.</p><p>No crime continuado, a prescrição deve ser considerada em relação a cada crime, isola-</p><p>damente (art. 119).</p><p>Nos crimes de bigamia e de falsificação ou alteração de assentamento de registro civil</p><p>(arts. 235 e 299, par. ún.), a prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhe-</p><p>cido de qualquer autoridade pública (art. 111, IV).</p><p>Com o advento da Lei nº 14.344, de 24-5-2022, o legislador alterou a redação do art. 111,</p><p>V, do CP. Agora, além de crimes contra a dignidade sexual contra crianças e adolescentes, o</p><p>termo inicial do prazo prescricional a partir do momento em que a vítima completar 18 anos</p><p>também contempla qualquer crime que envolva violência contra crianças e adolescentes. Eis a</p><p>nova redação do inciso V do art. 111 do CP: “V – nos crimes contra a dignidade sexual ou que</p><p>envolvam violência contra a criança e adolescente, previstos neste Código ou em legislação</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>62</p><p>especial, da data em que a vítima completar 18 (dezoito) anos, salvo se a esse tempo já houver</p><p>sido proposta a ação penal”.</p><p>Nesse sentido, se uma criança de 10 anos for vítima de crime de estupro de vulnerável,</p><p>por exemplo, ou qualquer outro crime praticado com violência, e a ação ainda não tiver sido</p><p>instaurada, o prazo prescricional passará a correr a partir da data em que ela completar 18 anos.</p><p>9.4.5.2. Prescrição da pretensão punitiva retroativa (art. 110, § 1º, parte</p><p>final, do CP)</p><p>A prescrição retroativa tem por pressuposto o trânsito em julgado da sentença penal con-</p><p>denatória para a acusação. Com o trânsito em julgado da sentença penal condenatória para a</p><p>acusação, a base para calcular a prescrição se altera, passando a ser considerada a pena apli-</p><p>cada na sentença. Nesse caso, deve-se considerar a pena aplicada na sentença e enquadrá-la</p><p>num dos incisos do art. 109 do CP para verificar o prazo prescricional.</p><p>Verificado o prazo prescricional com base na pena aplicada na sentença, a prescrição</p><p>retroativa deve ser considerada a partir da publicação da sentença ou acórdão condenatório para</p><p>trás. Por isso o nome retroativo, porque sua incidência é verificada entre os marcos interruptivos</p><p>existentes antes da sentença condenatória.</p><p>Nos crimes em geral, a prescrição da pretensão retroativa pode ocorrer entre a publicação</p><p>da sentença ou acórdão condenatório e o recebimento da denúncia ou queixa.</p><p>No contexto dos crimes de competência do Tribunal do Júri, a prescrição retroativa pode</p><p>incidir: a) entre a data da publicação da sentença condenatória e decisão confirmatória da pro-</p><p>núncia; b) entre a decisão confirmatória da pronúncia até a decisão de pronúncia; c) entre a</p><p>pronúncia e o recebimento da denúncia.</p><p>9.4.5.3. Prescrição da pretensão punitiva intercorrente ou superveniente</p><p>à sentença condenatória (art. 110, § 1º, do CP)</p><p>Sendo espécie de prescrição da pretensão punitiva, a prescrição da pretensão punitiva</p><p>intercorrente incide somente antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória para</p><p>todos.</p><p>Como visto, nos termos do que dispõe o art. 109, caput, do CP, a prescrição da pretensão</p><p>punitiva, salvo a exceção do § 1º do art. 110, é regulada pelo máximo da sanção privativa de</p><p>liberdade.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>63</p><p>Há, porém, no art. 110, § 1º, uma primeira exceção: caso em que, não obstante se tratar</p><p>de prescrição da pretensão punitiva, transitando em julgado a sentença condenatória para a acu-</p><p>sação, ou sendo improvido o seu recurso, a partir da sua publicação começa a correr o prazo</p><p>prescricional regulado pela pena concreta.</p><p>Ex.: suponha-se que o réu venha a ser condenado a 2 (dois) anos de detenção, tendo</p><p>transitado em julgado a sentença para a acusação. Sendo a pena aplicada de 2 (dois) anos, o</p><p>prazo prescricional é de 4 (quatro) anos (art. 109, V, do CP). O réu interpôs recurso de apelação,</p><p>que, passados quatro anos, ainda não havia sido julgado pelo Tribunal. No caso, passados qua-</p><p>tro anos da data da publicação da sentença sem que o recurso interposto pela defesa tenha sido</p><p>apreciado, ocorrerá a prescrição da pretensão punitiva superveniente ou intercorrente, prevista</p><p>no art. 110, § 1º, do CP.</p><p>9.4.6. Prescrição da pretensão executória (art. 110, caput, do CP)</p><p>9.4.6.1. Conceito</p><p>Na prescrição da pretensão executória, o decurso do tempo sem o seu exercício faz com</p><p>que o Estado perca o direito de executar a sanção imposta na sentença condenatória.</p><p>A prescrição da pretensão executória incide após o trânsito em julgado da sentença con-</p><p>denatória.</p><p>Nos termos do caput do art. 110, a prescrição, depois de transitar em julgado a sentença</p><p>condenatória, regula-se pela pena imposta na sentença e verifica-se nos prazos fixados no art.</p><p>109, os quais aumentam de 1/3 se o condenado é reincidente.</p><p>Ex.: suponha-se que o agente tenha sido condenado irrecorrivelmente a 4 (quatro) anos</p><p>de reclusão pela prática do delito de roubo simples (art. 157 do CP). O prazo prescricional, con-</p><p>siderando a pena aplicada, será de 8 (oito) anos (art. 109, IV, do CP). Nesse caso, se o Estado</p><p>não iniciar a execução da pena dentro de 8 (oito) anos, opera-se a extinção da punibilidade pela</p><p>prescrição da pretensão executória. Aplica-se o disposto no art. 110 do CP.</p><p>Ex.: réu condenado a 1 (um) ano de reclusão: prazo da prescrição executória: 4 (quatro)</p><p>anos (art. 109, V).</p><p>Tratando-se de reincidente, o prazo da prescrição da pretensão executória da pena priva-</p><p>tiva de liberdade é aumentado de 1/3 (art. 110, caput, in fine). Para tanto, é necessário que a</p><p>sentença condenatória tenha reconhecido a reincidência.</p><p>No concurso material e formal, cada delito tem seu prazo prescricional isolado, ainda que</p><p>as penas tenham sido impostas na mesma sentença (art. 119 do CP).</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>64</p><p>9.4.6.2. Termos iniciais da prescrição da pretensão executória (art. 112</p><p>do CP)</p><p>a) do dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a acusação, ou</p><p>a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional: em que pese</p><p>o teor do artigo 112, I, do CP, o STF e o STJ consideram que o termo inicial seria a data do</p><p>trânsito em julgado para todos.</p><p>b) do dia em que se interrompe a execução, salvo quando o tempo da interrupção</p><p>deva computar-se na pena: interrompida a execução da pena pela fuga do condenado, inicia-</p><p>se a contagem do prazo prescricional da prescrição executória (art. 112, II, 1ª parte, do CP).</p><p>Nos casos dos arts. 41 e 42 do CP (superveniência de doença mental ou internação em</p><p>hospital), em que se aplica o princípio da detração penal, embora interrompida a efetiva execu-</p><p>ção da pena, não corre a prescrição (art. 112, II, 2ª parte).</p><p>9.4.6.3. Prescrição no caso de evasão do condenado ou de revogação</p><p>do livramento condicional (art. 113 do CP)</p><p>Ex.: suponha-se que o detento fuja faltando 2 (dois) anos para o cumprimento da pena. A</p><p>partir da data da fuga começa a correr a prescrição da pretensão executória</p><p>(art. 112, II, 1ª parte),</p><p>ocorrendo em 4 (quatro) anos (art. 109, V, do CP). Ou seja, se nesse período de quatro anos o</p><p>apenado não for localizado para dar continuidade ao cumprimento da pena, ocorrerá a prescrição</p><p>da pretensão executória.</p><p>9.4.7. Causas suspensivas da prescrição</p><p>O Código Penal prevê causas impeditivas ou suspensivas da prescrição (art. 116), distin-</p><p>tas das causas interruptivas (art. 117). Na suspensão da prescrição, o tempo decorrido antes da</p><p>causa é computado no prazo; na interrupção, o tempo decorrido antes da causa não é computado</p><p>no prazo, que recomeça a correr por inteiro.</p><p>9.4.7.1. Causas suspensivas da prescrição punitiva</p><p>a) Enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que dependa o reconhe-</p><p>cimento da existência do crime: nos termos do art. 116, I, do CP, a prescrição não corre en-</p><p>quanto não resolvida, em outro processo, questão de que depende o reconhecimento da exis-</p><p>tência do crime (questão prejudicial, tratada nos arts. 92 a 94 do CPP).</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>65</p><p>b) Enquanto o agente cumpre pena no exterior: a segunda causa suspensiva é prevista</p><p>no art. 116, II, do CP: antes de passar em julgado a sentença final, a prescrição não corre en-</p><p>quanto o agente cumprir pena no estrangeiro. Não impede o decurso do prazo prescricional,</p><p>entretanto, estar o sujeito cumprindo pena, em razão de outro processo, no Brasil.</p><p>c) Na pendência de embargos de declaração ou de recursos aos Tribunais Superio-</p><p>res, quando inadmissíveis: a Lei nº 13.964/2019 introduziu mais uma causa suspensiva da</p><p>prescrição, visando a dificultar a incidência da prescrição da pretensão punitiva na pendência de</p><p>recursos interpostos perante os Tribunais Superiores.</p><p>Assim, enquanto tramitam os embargos de declaração ou recursos aos Tribunais Superi-</p><p>ores, o prazo prescricional ficará suspenso, aguardando julgamento inadmissível, sendo consi-</p><p>derado o período de suspensão do prazo prescricional, se inadmissíveis os recursos.</p><p>d) Enquanto não cumprido ou não rescindido o acordo de não persecução penal.</p><p>9.4.7.2. Causas suspensivas da prescrição da pretensão executória (art.</p><p>116, par. ún., do CP)</p><p>Depois de passada em julgado a sentença condenatória, a prescrição não corre durante</p><p>o tempo em que o condenado está preso por outro motivo.</p><p>Ex.: suponha-se que o sujeito seja condenado em duas comarcas, iniciando o cumpri-</p><p>mento da pena imposta na ação penal de uma delas. Enquanto está cumprindo a pena, não corre</p><p>a prescrição da pretensão executória em relação à outra condenação.</p><p>9.4.8. Causas interruptivas da prescrição (art. 117 do CP)</p><p>Ocorrendo uma causa interruptiva, o curso da prescrição interrompe-se, desaparecendo</p><p>o lapso temporal já decorrido, recomeçando sua contagem desde o início.</p><p>A incidência das causas do art. 117, salvo a do inciso V, faz com que seja extinto o prazo</p><p>decorrido antes da interrupção, recomeçando a correr a prescrição por inteiro (§ 2º).</p><p>9.4.8.1. Pelo recebimento da denúncia ou da queixa</p><p>O recebimento da denúncia interrompe o prazo prescricional, recomeçando a correr a</p><p>prescrição da pretensão punitiva por inteiro, não se levando em conta o tempo já decorrido antes</p><p>da interrupção.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>66</p><p>9.4.8.2. Pela pronúncia</p><p>A pronúncia também interrompe a prescrição (art. 117, II). A decisão do juiz tem força de</p><p>interromper a prescrição, ainda que o réu venha a ser absolvido no Júri.</p><p>9.4.8.3. Pela decisão confirmatória da pronúncia</p><p>Se o réu recorre da pronúncia e o Tribunal confirma, o Acórdão também interrompe a</p><p>prescrição (art. 117, III, do CP), o mesmo ocorrendo quando é impronunciado ou absolvido su-</p><p>mariamente e o tribunal o pronuncia.</p><p>9.4.8.4. Pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorrí-</p><p>veis</p><p>O art. 117, IV, do CP determina que a prescrição se interrompe pela sentença condena-</p><p>tória recorrível. A interrupção ocorre na data da publicação da sentença, i.e., no dia em que o</p><p>escrivão recebe a sentença do juiz e a junta aos autos, independentemente do registro e de</p><p>outras diligências.</p><p>O acórdão condenatório, ainda que não unânime, e por isso sujeito a embargos infringen-</p><p>tes, também interrompe o prazo prescricional da pretensão punitiva. Isso ocorre quando, tendo</p><p>sido absolvido em primeiro grau, o réu vem a ser condenado pelo acórdão do tribunal. Trata-se</p><p>de acórdão recorrível.</p><p>9.4.8.5. Pelo início ou continuação do cumprimento da pena</p><p>Iniciando-se o prazo da prescrição da pretensão executória com o trânsito em julgado da</p><p>sentença condenatória, interrompe-se pelo começo do cumprimento da pena. Fugindo o conde-</p><p>nado, a prescrição começa a correr da data da fuga (art. 112, II, 1ª parte), regulando-se pelo</p><p>tempo que resta da pena (art. 113). Recapturado, interrompe-se a prescrição.</p><p>9.4.8.6. Pela reincidência</p><p>A reincidência somente interrompe o prazo da prescrição da pretensão executória, sendo</p><p>inaplicável à prescrição da pretensão punitiva (art. 109). Nesse sentido, a Súm. nº 220 do STJ:</p><p>“A reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão punitiva”.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>67</p><p>10. Crimes contra a vida</p><p>Prof. Arnaldo Quaresma</p><p>@profarnaldoquaresma</p><p>10.1. Homicídio</p><p>O homicídio consiste na eliminação da vida humana extrauterina provocada por outra pes-</p><p>soa. A eliminação da vida intrauterina (feto) caracteriza o delito de aborto.</p><p>10.1.1. Homicídio privilegiado (art. 121, § 1º, do CP)</p><p>O art. 121, § 1º, do CP descreve o homicídio privilegiado como o fato de o sujeito cometer</p><p>o delito impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta</p><p>emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima. Neste caso, o juiz pode reduzir a pena</p><p>de 1/6 a 1/3.</p><p>Motivo de relevante valor social: ocorre quando a causa do delito diz respeito a um</p><p>interesse coletivo. A conduta, então, é ditada em face de um interesse que diz respeito a todos</p><p>os cidadãos de uma coletividade. Ex.: pai desesperado pelo vício que impregna seu filho e vários</p><p>outros alunos, mata um traficante que distribui drogas num colégio, sem qualquer ação eficaz da</p><p>polícia para contê-lo.</p><p>Motivo de relevante valor moral: diz respeito a um interesse particular, de ordem pes-</p><p>soal. Será motivo de relevante valor moral aquele que, em si mesmo, é aprovado pela ordem</p><p>moral, pela moral prática, por exemplo, a compaixão ou piedade diante do irremediável sofri-</p><p>mento da vítima.</p><p>Sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima:</p><p>o texto legal exige, ainda, que o impulso emocional e o ato dele resultante se sigam imediata-</p><p>mente à provocação da vítima, ou seja, tem de haver a imediatidade entre a provocação injusta</p><p>e a conduta do sujeito.</p><p>10.1.2. Homicídio qualificado (art. 121, § 2º, do CP)</p><p>O art. 121, § 2º, do CP prevê circunstâncias que qualificam o crime de homicídio, quando</p><p>é cometido: a) mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe; b) motivo</p><p>fútil; c) com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel,</p><p>ou de que possa resultar perigo comum; d) à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>68</p><p>ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido; e) para assegurar a</p><p>execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime; f) feminicídio; g) contra agente</p><p>de segurança pública; h) com emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido.</p><p>Merece especial destaque a qualificadora do feminicídio. Não basta a vítima ser mulher</p><p>para incidir a qualificadora do feminicídio, é preciso que o crime tenha sido praticado no contexto</p><p>de violência doméstica e familiar ou por menosprezo ou discriminação à condição de mulher.</p><p>Assim, se, por exemplo, o agente matar uma mulher apenas porque é torcedora do Sport Clube</p><p>Internacional, não incide</p><p>temporária e excepcional constituem exceção a essa</p><p>regra, uma vez que a lei temporária se autorrevoga com o término da sua vigência</p><p>e a lei excepcional com a cessação da situação excepcional.</p><p>2) Ultratividade: significa que uma lei revogada continua gerando efeitos. É o caso</p><p>da lei temporária e da lei excepcional, que continuarão gerando efeitos em relação</p><p>aos fatos praticados durante sua vigência, mesmo após revogadas.</p><p>1.3. Do tempo do crime (art. 4° do CP)</p><p>O Código Penal adotou a teoria da atividade, segundo a qual se reputa praticado o delito</p><p>no momento da conduta, não importando o instante do resultado.</p><p>Assim, se um adolescente com 17 anos, 11 meses e 29 dias efetuar disparo de arma de</p><p>fogo contra a vítima, que vem a falecer cinco dias depois (quando já terá adquirido a maioridade),</p><p>responderá conforme as normas do ECA, diante da teoria da atividade que rege o tempo do</p><p>crime.</p><p>1.4. Territorialidade (art. 5° do CP)</p><p>Aplicam-se as leis brasileiras aos delitos cometidos dentro do território nacional.</p><p>Nos termos do art. 5°, § 1°, do CP, há duas situações de território brasileiro por equipara-</p><p>ção:</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>7</p><p>a) embarcações e aeronaves brasileiras de natureza pública ou a serviço do governo</p><p>brasileiro onde estiverem;</p><p>b) embarcações e aeronaves brasileiras, de propriedade privada, que estiverem na-</p><p>vegando em alto-mar ou sobrevoando águas internacionais.</p><p>Os navios estrangeiros em águas territoriais brasileiras, desde que públicos, não são con-</p><p>siderados parte do nosso território. Em face disso, os crimes neles cometidos devem ser julgados</p><p>de acordo com a lei da bandeira que ostentam. Se, entretanto, são de natureza privada, aplica-</p><p>se a lei brasileira (art. 5°, § 2°, do CP).</p><p>1.5. Do lugar do crime (art. 6° do CP)</p><p>O Código Penal adotou a teoria da ubiquidade ou mista, segundo a qual é lugar do</p><p>crime tanto onde houve a conduta quanto o local onde se deu o resultado.</p><p>Assim, na hipótese de o agente, que se encontra na cidade brasileira de Santana do Li-</p><p>vramento-RS, efetuar disparos contra a vítima que se encontra na cidade de Rivera, em solo</p><p>uruguaio, separada por uma rua do Município brasileiro, vindo este a falecer, aplica-se a lei penal</p><p>brasileira, já que os atos executórios do crime foram praticados em território brasileiro, embora o</p><p>resultado tenha sido produzido em país estrangeiro.</p><p>1.6. Extraterritorialidade (art. 7° do CP)</p><p>Mesmo que o crime seja cometido fora do Brasil, os agentes sujeitam-se à lei brasileira,</p><p>nas hipóteses mencionadas no art. 7° do CP, quais sejam:</p><p>EXTRATERRITORIALI-</p><p>DADE INCONDICIONADA</p><p>(INCISO I)</p><p>a) contra a vida ou a liberdade do</p><p>Presidente da República;</p><p>b) contra o patrimônio ou a fé pública</p><p>da União, do Distrito Federal, de Es-</p><p>tado, de Território, de Município, de</p><p>empresa pública, sociedade de eco-</p><p>nomia mista, autarquia ou fundação</p><p>instituída pelo Poder Público;</p><p>c) contra a administração pública, por</p><p>quem está a seu serviço;</p><p>d) de genocídio, quando o agente for</p><p>brasileiro ou domiciliado no Brasil;</p><p>Nestes casos, o agente é punido</p><p>segundo a lei brasileira, ainda</p><p>que absolvido ou condenado no</p><p>estrangeiro.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>8</p><p>EXTRATERRITORIALI-</p><p>DADE CONDICIONADA</p><p>(INCISO II)</p><p>a) que, por tratado ou convenção, o</p><p>Brasil se obrigou a reprimir;</p><p>b) praticados por brasileiro;</p><p>c) praticados em aeronaves ou em-</p><p>barcações brasileiras, mercantes ou</p><p>de propriedade privada, quando em</p><p>território estrangeiro e aí não sejam</p><p>julgados.</p><p>Nestes casos, a aplicação da lei</p><p>brasileira depende do concurso</p><p>das seguintes condições (§ 2º):</p><p>a) entrar o agente no território</p><p>nacional;</p><p>b) ser o fato punível também no</p><p>país em que foi praticado;</p><p>c) estar o crime incluído entre</p><p>aqueles pelos quais a lei brasi-</p><p>leira autoriza a extradição;</p><p>d) não ter sido o agente absol-</p><p>vido no estrangeiro ou não ter aí</p><p>cumprido a pena;</p><p>e) não ter sido o agente perdo-</p><p>ado no estrangeiro ou, por outro</p><p>motivo, não estar extinta a puni-</p><p>bilidade, segundo a lei mais fa-</p><p>vorável.</p><p>EXTRATERRITORIALI-</p><p>DADE CONDICIONADA</p><p>(INCISO II)</p><p>a) que, por tratado ou convenção, o</p><p>Brasil se obrigou a reprimir;</p><p>Nestes casos, a aplicação da lei</p><p>brasileira depende do concurso</p><p>das seguintes condições (§ 2º):</p><p>1.7. Conflito aparente de normas</p><p>Ocorre o conflito quando aparentemente duas ou mais normas podem ser aplicadas ao</p><p>mesmo fato. É aparente, porque apenas uma delas acaba sendo aplicada à hipótese.</p><p>1.7.1. Princípio da especialidade</p><p>A norma especial prevalece sobre a norma geral. A norma penal especial é aquela que</p><p>reúne todos os elementos típicos da lei geral, mas reveste-se de outros elementos que a tornam</p><p>especial, que a particularizam, chamados especializantes.</p><p>Ex.: tomemos como exemplo o caso de uma mãe matar, sob influência do estado puerpe-</p><p>ral, o próprio filho, logo após o parto. Nesse caso, o crime de infanticídio, previsto no artigo 123</p><p>do CP, por ser especial, prevalece sobre a norma geral do homicídio, previsto no artigo 121 do</p><p>CP, prevalecendo, no caso, a norma penal que define o crime de infanticídio, já que as elemen-</p><p>tares contidas nesse crime a tornam especial em relação à norma geral que define o homicídio.</p><p>1.7.2. Princípio da subsidiariedade</p><p>Ocorre quando a infração penal de maior gravidade absorve a menor de gravidade. Ou</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>9</p><p>seja, a infração menos grave somente incide se o fato não constituir crime mais grave.</p><p>A subsidiariedade pode ser expressa ou tácita:</p><p>a) A subsidiariedade expressa ou explícita ocorre quando o seu próprio texto, subor-</p><p>dina a sua aplicação à não aplicação de outra, de maior gravidade punitiva. Ex.: o crime de</p><p>importunação sexual, previsto no art. 215-A do CP, incluído pela Lei nº 13.718/2018, incidirá “se</p><p>o ato não constitui crime mais grave”, conforme expressamente prevê o referido dispositivo legal.</p><p>Logo, o delito de importunação sexual somente incidirá se a conduta do agente não caracterizar</p><p>crime mais grave, por exemplo, estupro (art. 213 do CP) ou estupro de vulnerável (art. 217-A do</p><p>CP).</p><p>b) A subsidiariedade tácita ou implícita ocorre quando a norma penal não ressalva, de</p><p>modo expresso, a sua incidência na hipótese de outra norma de maior gravidade punitiva não</p><p>ser aplicável ao caso concreto. Ex.: o crime de constrangimento ilegal (art. 146 do CP) é tacita-</p><p>mente subsidiário em relação ao crime de estupro (art. 213 do CP). Assim, se, no caso concreto,</p><p>o crime mais grave (art. 213 do CP) não restar caracterizado, ou seja, não ficar demonstrado que</p><p>o constrangimento não teve por finalidade violar a dignidade sexual da vítima, pode-se aventar</p><p>a incidência do crime de constrangimento ilegal (art. 146 do CP).</p><p>1.7.3. Princípio da consunção</p><p>O princípio da consunção é aplicado para dirimir conflito aparente de normas decorrente</p><p>de uma sequência de fatos delituosos, que, isoladamente, constituem crime, mas que, ao final,</p><p>devem ser subsumidos a um único tipo penal.</p><p>Tomemos como exemplo o agente que pretende desde o início produzir a morte da vítima.</p><p>Para tanto, utiliza-se de uma faca, golpeando a vítima em várias partes do corpo, vindo, ao final,</p><p>a aplicar o golpe fatal, causando-lhe a morte. Há um único elemento subjetivo, sendo a conduta</p><p>composta por vários atos praticados de forma progressiva até atingir o resultado mais grave.</p><p>Surge, assim, o conflito aparente de normas: o agente responderá pelos delitos de lesão corporal</p><p>(art. 129 do CP) e homicídio (art. 121 do CP) ou apenas pelo crime de homicídio? Nesse caso,</p><p>aplicando-se o princípio da consunção, o agente responderá apenas pelo crime de homicídio</p><p>(art. 121 do CP), pois as várias lesões corporais produzidas pelos golpes de faca constituíram</p><p>meio necessário para a execução do delito pretendido, sendo, por isso, absorvidas pelo crime</p><p>de homicídio.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito</p><p>a qualificadora do feminicídio, já que o crime não foi praticado em razão</p><p>de a vítima ser do sexo feminino, podendo incidir outra qualificadora, como a do motivo fútil.</p><p>Trata-se, nesse caso, de femicídio e não de feminicídio.</p><p>Também merece destaque a qualificadora do homicídio funcional (art. 121, § 2º, VII, do</p><p>CP). A qualificadora alcança integrantes dos órgãos de segurança pública, bem como seus pa-</p><p>rentes consanguíneos até terceiro grau, desde que o homicídio tenha sido praticado no exercício</p><p>da função ou em decorrência dela. Ou seja, para incidir a qualificadora, o homicídio deve estar</p><p>necessariamente vinculado à função desempenhada pelo agente de segurança pública.</p><p>A Lei nº 14.344/2022 introduziu mais uma qualificadora ao crime de homicídio, quando se</p><p>tratar de vítima menor de 14 anos de idade (art. 121, § 2º, IX). Com isso, encontra-se tacitamente</p><p>revogada a segunda parte do art. 121, § 4º, do CP, no que se refere à majorante em face de a</p><p>vítima ser menor de 14 anos de idade. Além disso, passou a prever novas causas de aumento</p><p>de pena. Nos termos do art. 121, § 2º-B, do CP, a pena do homicídio contra menor de 14 anos é</p><p>aumentada de:</p><p>I – 1/3 (um terço) até a metade se a vítima é pessoa com deficiência ou com doença que</p><p>implique o aumento de sua vulnerabilidade; II – 2/3 (dois terços) se o autor é ascendente,</p><p>padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou em-</p><p>pregador da vítima ou por qualquer outro título tiver autoridade sobre ela.</p><p>Vale destacar que a Lei nº 14.811/2024 introduziu mais uma causa de aumento de pena</p><p>para o homicídio cometido contra menor de 14 anos (art. 121, §2º, inciso III): “2/3 (dois terços)</p><p>se o crime for praticado em instituição de educação básica pública ou privada.”.</p><p>10.1.3. Homicídio privilegiado-qualificado</p><p>Perfeitamente possível a coexistência do homicídio privilegiado e as qualificadoras de na-</p><p>tureza objetiva, já que relacionadas ao fato praticado, por exemplo, o meio e o modo de execu-</p><p>ção.</p><p>As qualificadoras relacionadas ao motivo torpe (inciso I) ou fútil (inciso II), bem como à</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>69</p><p>conexão com outro crime (inciso V) ou ao fato de a vítima integrar órgão de segurança pública</p><p>(VII), são consideradas de natureza subjetiva. Isso porque não estão vinculadas diretamente ao</p><p>fato praticado, mas a condições ou características subjetivas ou pessoais, como a motivação, ou</p><p>em relação à pessoa da vítima. Até mesmo o crime de homicídio por conexão é de natureza</p><p>subjetiva, pois guarda relação com o motivo do crime, ou seja, o agente desenvolve a conduta</p><p>homicida para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime.</p><p>As qualificadoras relacionadas aos meios (inciso III) ou modos (IV) de execução, bem</p><p>como a do feminicídio (VII), são consideradas de natureza objetiva. As duas primeiras, porque</p><p>relacionadas diretamente ao fato praticado, não havendo qualquer vinculação com característi-</p><p>cas ou condições pessoais da vítima.</p><p>10.1.4. Homicídio culposo (art. 121, § 3º, do CP)</p><p>É um tipo penal aberto, que depende, pois, da interpretação do juiz para poder ser apli-</p><p>cado. A culpa, conforme o art. 18, II, do CP, é constituída de “imprudência, negligência ou impe-</p><p>rícia”. Portanto, matar alguém por imprudência, negligência ou imperícia concretiza o tipo penal</p><p>incriminador do homicídio culposo. Ex.: ao manejar arma carregada para limpá-la, o agente aci-</p><p>ona, imprudentemente, o gatilho e mata uma pessoa que está ao seu lado.</p><p>10.1.5. Perdão judicial (art. 121, § 5º, do CP)</p><p>É a clemência do Estado, que deixa de aplicar a pena prevista para determinados delitos,</p><p>em hipóteses expressamente previstas em lei.</p><p>Somente ao autor do homicídio culposo pode-se aplicar a clemência, desde que ele tenha</p><p>sofrido com o crime praticado uma consequência tão séria e grave que a sanção penal se torne</p><p>desnecessária.</p><p>Ex.: o pai que provoca a morte do próprio filho, num acidente fruto de sua imprudência, já</p><p>teve punição mais do que severa. A dor por ele experimentada é mais forte do que qualquer pena</p><p>que se lhe pudesse aplicar. Por isso, surge a hipótese do perdão. O crime existiu, mas a punibi-</p><p>lidade é afastada.</p><p>10.2. Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou a automutilação</p><p>10.2.1. Conceito de suicídio e automutilação</p><p>O suicídio decorre da conduta voluntária e consciente da própria vítima, que, por ato</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>70</p><p>positivo ou negativo, busca eliminar a sua vida. É o chamado autocídio ou autoquíria.</p><p>A automutilação decorre da conduta voluntária e consciente da própria vítima, que, por</p><p>ato positivo ou negativo, busca provocar lesão em si própria. Nesse caso, a vítima não tem a</p><p>intenção de eliminar a sua própria vida, mas de provocar autolesão, por exemplo, produzir cortes</p><p>na pele, amputar alguma parte do corpo, bater com a cabeça na parede, utilizar fogo para quei-</p><p>mar parte da pele.</p><p>Portanto, o crime consiste no fato de o agente induzir, instigar ou prestar auxílio a suicídio</p><p>ou automutilação. Em outras palavras, constitui crime a conduta voltada a fazer com que a vítima</p><p>pratique atos executórios para eliminar sua própria vida ou provocar lesões em si mesma. Trata-</p><p>se, em síntese, do crime de participação em suicídio ou automutilação.</p><p>10.2.2. Consumação</p><p>Com as alterações introduzidas pela Lei nº 13.968/2019, o delito de participação em sui-</p><p>cídio ou automutilação passou a ser crime formal, não mais exigindo para a sua consumação a</p><p>produção do resultado naturalístico morte ou lesão corporal de natureza grave.</p><p>Agora, para a consumação do delito, basta a conduta de induzir, instigar ou prestar auxílio</p><p>ao suicídio ou à automutilação, ainda que resulte lesão corporal de natureza leve ou não resulte</p><p>qualquer lesão. Nesse caso, o agente responderá pelo crime de participação em suicídio ou</p><p>automutilação na sua modalidade simples, nos termos do art. 122, caput, do CP.</p><p>A participação em suicídio ou automutilação com resultado lesão grave ou gravíssima,</p><p>bem como com resultado morte configuram o crime na modalidade qualificada (art. 122, §§ 1° e</p><p>2º, do CP).</p><p>10.2.3. Figuras qualificadoras</p><p>A Lei nº 13.968/2019 introduziu no ordenamento jurídico duas qualificadoras do crime de</p><p>participação em suicídio ou automutilação: a) se resultar lesão corporal de natureza grave ou</p><p>gravíssima; b) se resultar morte.</p><p>Nos termos do art. 122, § 1º, do CP, se da automutilação ou da tentativa de suicídio resulta</p><p>lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena será de 1 (um) a 3 (três) anos.</p><p>Se da indução, instigação ou auxílio ao suicídio ou automutilação resultar qualquer um</p><p>dos resultados previstos no art. 129, §§ 1º e 2º, do CP, incidirá a qualificadora do crime de parti-</p><p>cipação em suicídio ou automutilação (art. 122, § 1º, do CP); ausente qualquer circunstância que</p><p>qualifica a lesão corporal, o crime será de participação em suicídio ou automutilação, na sua</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>71</p><p>modalidade simples (art. 122, caput).</p><p>Nos termos do art. 122, § 2º, do CP, se o suicídio se consuma ou se da automutilação</p><p>resulta morte, a pena será de 2 (dois) a 6 (seis) anos.</p><p>Se o agente, de forma dolosa, induzir, instigar ou auxiliar a vítima a eliminar a sua própria</p><p>vida, o que efetivamente vem a ocorrer, responderá pelo crime de participação em suicídio na</p><p>sua forma qualificada.</p><p>O crime de participação em automutilação com resultado morte necessariamente é pre-</p><p>terdoloso. Isso porque estará presente o dolo na conduta de induzir, instigar ou auxiliar a auto-</p><p>mutilação, ao passo que o resultado morte decorre de culpa. Se o agente desejasse ou assu-</p><p>misse o risco em relação ao resultado morte, o crime seria de participação em suicídio e não em</p><p>automutilação.</p><p>10.2.4. Causas de aumento de pena</p><p>O art. 122, §§§ 3º, 4º e 5º, do CP prevê circunstâncias que elevam</p><p>a pena do crime de</p><p>participação em suicídio. A pena será duplicada se o crime é praticado por motivo egoístico,</p><p>torpe ou fútil, ou se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de</p><p>resistência (art. 122, § 3º, I e II). A pena é aumentada até o dobro se a conduta é realizada por</p><p>meio da rede de computadores, de rede social ou transmitida em tempo real (art. 122, § 4º). Au-</p><p>menta-se a pena em dobro se o agente é líder, coordenador ou administrador de grupo ou de</p><p>rede virtual, ou por estes é responsável (art. 122, § 5º).</p><p>10.2.5. Vítima menor de 14 anos ou contra quem não tem discernimento</p><p>para a prática do ato</p><p>Nos termos do art. 122, § 6º, do CP:</p><p>Se o crime de que trata o § 1º deste artigo resulta em lesão corporal de natureza gravís-</p><p>sima e é cometido contra menor de 14 (quatorze) anos ou contra quem, por enfermidade</p><p>ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que,</p><p>por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência, responde o agente pelo crime</p><p>descrito no § 2º do art. 129 deste Código.</p><p>Logo, se a vítima for menor de 14 anos de idade, e se resultar lesão corporal gravíssima,</p><p>o agente responderá pelo crime descrito no art. 129, § 2º, do CP (art. 122, § 6º, in fine, do CP).</p><p>Também responderá pelo crime de lesão corporal gravíssima se a vítima for acometida</p><p>de enfermidade ou deficiência mental, e, por essa razão, não tem o necessário discernimento</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>72</p><p>para a prática do ato. Não basta, pois, que a vítima seja portadora de enfermidade ou deficiência</p><p>mental, sendo necessário que, em razão disso, não tenha qualquer discernimento para o ato.</p><p>Se a enfermidade ou deficiência mental não tem a potencialidade de retirar a plena capa-</p><p>cidade de discernimento da vítima, o agente responderá pelo crime de participação em automuti-</p><p>lação, se resultar lesão grave ou gravíssima, nos termos do art. 122, § 1º, do CP.</p><p>O art. 122, § 6º, faz expressa remissão somente ao art. 129, § 2º, do CP. Nesse contexto,</p><p>se da tentativa de suicídio ou da automutilação resultar lesão corporal grave em vítima menor de</p><p>14 anos de idade, portadora de enfermidade ou deficiência mental sem o necessário discerni-</p><p>mento ou sem qualquer capacidade de resistência, forçoso concluir que o agente responderá</p><p>pelo crime de induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio ou automutilação qualificado, com a</p><p>pena aumentada em dobro (art. 122, §§ 1º e 3º, II, do CP).</p><p>Conforme o art. 122, § 7º, do CP, se o suicídio se consuma ou se da automutilação resulta</p><p>morte, e o crime tiver sido praticado contra vítima menor de 14 anos ou contra quem não tem o</p><p>necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode</p><p>oferecer resistência, responde o agente pelo crime de homicídio, nos termos do art. 121 do CP.</p><p>10.3. Infanticídio (art. 123 do CP)</p><p>10.3.1. Conceito</p><p>Trata-se de homicídio cometido pela mãe contra seu filho, nascente ou recém-nascido,</p><p>sob a influência do estado puerperal.</p><p>Estado puerperal é o estado que envolve a mulher durante o parto. Há profundas altera-</p><p>ções psíquicas e físicas, que chegam a transtornar a mãe, deixando-a sem plenas condições de</p><p>entender o que está fazendo.</p><p>10.3.2. Sujeitos do delito</p><p>A autora do infanticídio só pode ser a mãe. Cuida-se de crime próprio, uma vez que não</p><p>pode ser cometido por qualquer autor.</p><p>O tipo penal exige qualidade especial do sujeito ativo. Entretanto, isso não impede que</p><p>terceiro responda por infanticídio diante do concurso de agentes.</p><p>Sujeito passivo é o neonato ou nascente, de acordo com a ocasião da prática do fato:</p><p>durante o parto ou logo após.</p><p>Antes do parto, o sujeito passivo será o feto, caracterizando, portanto, o delito de aborto.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>73</p><p>Segundo boa parte da doutrina, estando a mulher sob influência do estado puerperal,</p><p>responde ela por infanticídio, delito que também será atribuído aos eventuais concorrentes do</p><p>fato, uma vez que se trata de circunstância de caráter pessoal que constitui elementar do crime.</p><p>Logo, comunica-se aos coautores ou partícipes, nos termos do art. 30 do CP.</p><p>10.4. Aborto (arts. 124 a 128 do CP)</p><p>10.4.1. Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento (art.</p><p>124)</p><p>Trata-se de crime de mão própria, pois somente a gestante pode realizá-lo; contudo, isso</p><p>não afasta a possibilidade de participação no crime em questão.</p><p>Na primeira figura, é a própria mulher quem executa a ação material do crime, ou seja, ela</p><p>própria emprega os meios ou manobras abortivas em si mesma. Se um terceiro executar ato de</p><p>provocação do aborto, não será partícipe do crime do art. 124 do CP, mas, sim, autor do fato</p><p>descrito no art. 126 (provocação do aborto com consentimento da gestante).</p><p>Na segunda figura, a mulher apenas consente na prática abortiva, mas a execução mate-</p><p>rial do crime é realizada por terceira pessoa. Em tese, a gestante e o terceiro deveriam responder</p><p>pelo delito do art. 124. Contudo, o Código Penal prevê uma modalidade especial de crime para</p><p>aquele que provoca o aborto com o consentimento da gestante (art. 126).</p><p>10.4.2. Aborto provocado por terceiro sem o consentimento da gestante</p><p>(art. 125 do CP)</p><p>Trata-se de forma mais gravosa do delito de aborto.</p><p>Ao contrário da figura típica do art. 126, não há o consentimento da gestante no emprego</p><p>dos meios ou manobras abortivas por terceiro. Aliás, a ausência de consentimento constitui ele-</p><p>mentar do tipo penal.</p><p>As formas de dissentimento estão retratadas no parágrafo único do art. 126:</p><p>a) dissentimento presumido: é necessário que a gestante tenha capacidade para con-</p><p>sentir, não se tratando de capacidade civil. Para o Código Penal, quando a vítima</p><p>não é maior de 14 anos ou é alienada mental, não possui consentimento válido,</p><p>levando à consideração de que o aborto se deu contra a sua vontade;</p><p>b) dissentimento real: quando o agente emprega violência, grave ameaça ou mesmo</p><p>fraude, é natural supor que extraiu o consentimento da vítima à força, de modo que</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>74</p><p>o aborto necessita se encaixar na figura do art. 125.</p><p>10.4.3. Aborto consensual (art. 126)</p><p>Para que se caracterize a figura do aborto consentido (art. 126), é necessário que o con-</p><p>sentimento da gestante seja válido, isto é, que ela tenha capacidade para consentir. Ausente</p><p>essa capacidade, o delito poderá ser outro (art. 125).</p><p>Trata-se de uma exceção à teoria monista. O legislador, para punir mais severamente o</p><p>terceiro que provoca o aborto, criou o art. 126, aplicando a teoria pluralista do concurso de pes-</p><p>soas.</p><p>10.4.4. Aborto legal (art. 128)</p><p>a) Aborto necessário ou terapêutico: é a interrupção da gravidez realizada pelo médico</p><p>quando a gestante estiver correndo perigo de vida e inexistir outro meio para salvá-lo.</p><p>A excludente da ilicitude em estudo do crime de aborto somente abrange a conduta do</p><p>médico. Não obstante isso, a enfermeira, ou parteira, não responderá pelo delito em questão se</p><p>praticar o aborto por força do art. 24 do CP (estado de necessidade, no caso, de terceiro).</p><p>b) Aborto humanitário, sentimental ou piedoso: o aborto humanitário, também deno-</p><p>minado ético ou sentimental, é autorizado quando a gravidez é consequência do crime de estupro</p><p>e a gestante consente na sua realização. A lei não exige autorização judicial, processo judicial</p><p>ou sentença condenatória contra o autor do crime de estupro para a prática do aborto sentimen-</p><p>tal. Basta prova idônea do atentado sexual.</p><p>11. Lesão Corporal (art. 129 do CP)</p><p>11.1. Lesão corporal leve ou simples (art. 129, caput)</p><p>A definição de lesão corporal leve é formulada por exclusão, ou seja, configura-se quando</p><p>não ocorre nenhum dos resultados previstos nos §§ 1º, 2º e 3º do art. 129.</p><p>11.2. Lesão corporal grave (art. 129, § 1º)</p><p>A lesão corporal de natureza grave (ou mesmo a gravíssima)</p><p>é uma ofensa à integridade</p><p>física ou à saúde da pessoa humana, considerada muito mais séria e importante do que a lesão</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>75</p><p>simples ou leve.</p><p>a) Incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias: deve-se com-</p><p>preender como tal toda e qualquer atividade regularmente desempenhada pela vítima, e não</p><p>apenas a sua ocupação laborativa, enquadrando-se, inclusive, as atividades de lazer.</p><p>b) Perigo de vida: é a concreta possibilidade de a vítima morrer em face das lesões</p><p>sofridas.</p><p>A doutrina e a jurisprudência majoritária consideram que, neste caso, somente pode haver</p><p>dolo na conduta antecedente (lesão corporal) e culpa no tocante ao resultado mais grave (perigo</p><p>de vida), pois, havendo dolo em ambas as fases, haverá tentativa de homicídio.</p><p>Portanto, o tipo só admite o preterdolo, uma vez que, se houver dolo quanto ao perigo de</p><p>vida, o agente responderá por tentativa de homicídio.</p><p>c) Debilidade permanente de membro, sentido ou função: não se exige que seja uma</p><p>debilidade perpétua, bastando que tenha longa duração.</p><p>Ex.: perda de um dos dedos (membro); perda da visão de um dos olhos (sentido); perda</p><p>de um dos rins é debilidade permanente e não perda de função, pois se trata de órgão duplo.</p><p>d) Aceleração de parto: significa antecipar o nascimento da criança antes do prazo nor-</p><p>mal previsto pela medicina. Nesse caso, é indispensável o conhecimento da gravidez pelo</p><p>agente.</p><p>Se, em virtude da lesão corporal praticada contra a mãe, a criança nascer morta, terá</p><p>havido lesão corporal gravíssima (art. 129, § 2º, V, do CP).</p><p>11.3. Lesão corporal gravíssima (art. 129, § 2º)</p><p>Todas as circunstâncias qualificadoras elencadas neste parágrafo são tanto dolosas</p><p>quanto preterdolosas, com exceção da circunstância contida no inciso V (aborto), que é neces-</p><p>sariamente preterdolosa.</p><p>a) Incapacidade permanente para o trabalho: trata-se de inaptidão duradoura para</p><p>exercer qualquer atividade laborativa lícita. A permanência não significa perpetuidade.</p><p>Nesse contexto, diferentemente da incapacidade para as ocupações habituais, exige-se</p><p>atividade remunerada, que implique sustento, portanto, acarrete prejuízo financeiro para o ofen-</p><p>dido.</p><p>b) Enfermidade incurável: é a doença irremediável, de acordo com os recursos da me-</p><p>dicina na época do resultado, causada na vítima.</p><p>c) Perda ou inutilização do membro, sentido ou função: perda implica destruição ou</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>76</p><p>privação de algum membro (ex.: corte de um braço), sentido (ex.: aniquilamento dos olhos) ou</p><p>função (ex.: ablação da bolsa escrotal, impedindo a função reprodutora).</p><p>No tocante a órgãos duplos, ter-se-á a perda quando houver a supressão de ambos, por</p><p>exemplo, cegueira ou surdez total. Nessa hipótese, há a perda total da visão ou audição. Quando</p><p>se der a supressão de apenas um órgão, estaremos diante da hipótese de debilidade (art. 129,</p><p>§ 1º, III, do CP), pois a função não foi totalmente abolida, por exemplo, surdez em apenas um</p><p>dos ouvidos.</p><p>d) Deformidade permanente: deformidade é o dano estético de certa monta. Perma-</p><p>nente é a deformidade indelével, irreparável. Entende-se por irreparável a deformidade que não</p><p>é passível de ser corrigida pelo transcurso do tempo. Ex.: perda de orelhas, mutilação grave do</p><p>nariz, entre outros.</p><p>e) Aborto: nesta hipótese, o agente, ao lesionar a vítima, não quer nem mesmo assumir</p><p>o risco do advento do resultado agravador aborto.</p><p>Portanto, para que possa se caracterizar a qualificadora da lesão corporal gravíssima, não</p><p>pode ter sido objeto de dolo do agente, pois, nesse caso, terá de responder pelos dois crimes,</p><p>lesão corporal e aborto, em concurso formal impróprio, ou, ainda, por aborto qualificado, se a</p><p>lesão em si mesma for grave.</p><p>11.4. Lesão corporal seguida de morte (art. 129, § 3°)</p><p>O evento morte não deve ser desejado, nem ter o agente assumido o risco de causá-lo,</p><p>sob pena de responder pelo crime de homicídio. Em outras palavras, trata-se de típico crime</p><p>preterdoloso, em que o agente desenvolve conduta com dolo em relação a determinado resul-</p><p>tado, mas, por culpa, acaba produzindo resultado mais grave.</p><p>No caso, o agente age com dolo em relação à lesão corporal, mas acaba produzindo,</p><p>involuntariamente, a morte da vítima.</p><p>A tentativa é inadmissível, pois o crime preterdoloso envolve a forma culposa e esta é</p><p>totalmente incompatível com a figura da tentativa.</p><p>11.5. Violência doméstica (art. 129, § 9º)</p><p>Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro,</p><p>ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações</p><p>domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, a pena será de 3 (três) meses a 3 (três) anos.</p><p>Diversamente do que possa parecer, a qualificadora prevista no art. 129, § 9º, do CP não</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>77</p><p>se limita a alcançar apenas vítima mulher, incidindo ainda que a vítima seja homem, por exemplo,</p><p>a agressão praticada pelo agente contra o irmão.</p><p>O art. 129, § 9º, do CP incide se a lesão corporal for de natureza leve. Se for grave, gra-</p><p>víssima ou seguida de morte, incidirá, ainda, causa de aumento de pena em 1/3, nos termos do</p><p>art. 129, § 10.</p><p>11.6. Lesão corporal contra a agente de segurança pública (art. 129,</p><p>§ 12, do CP)</p><p>Se a lesão for praticada contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da</p><p>CF/1988, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercí-</p><p>cio da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consan-</p><p>guíneo até terceiro grau, em razão dessa condição, a pena é aumentada de um a dois terços.</p><p>Trata-se de crime hediondo, conforme se extrai do art. 1º, I-A, da Lei nº 8.072/1990.</p><p>11.7. Lesão corporal no contexto de violência doméstica e familiar con-</p><p>tra a mulher (art. 129, §13, do CP)</p><p>Se a lesão for praticada contra a mulher, por razões da condição do sexo feminino, nos</p><p>termos do §2º-A do art. 121 do CP, a pena será de 1 (um) a 4 (quatro) anos.</p><p>12. Crimes contra a honra</p><p>12.1. Calúnia (art. 138 do CP)</p><p>Calúnia é o fato de atribuir a outrem, falsamente, a prática de fato definido como crime. O</p><p>Código Penal tutela a honra objetiva (reputação).</p><p>A lei exige, expressamente, que o fato atribuído seja definido como crime. O fato criminoso</p><p>deve ser determinado, ou seja, um caso concreto. É fundamental, para a existência de calúnia,</p><p>que a imputação de fato definido como crime seja falsa. Se o fato for verdadeiro, não há que se</p><p>falar em crime de calúnia.</p><p>O momento consumativo da calúnia ocorre no instante em que a imputação chega ao</p><p>conhecimento de um terceiro que não a vítima.</p><p>A calúnia verbal não admite a figura da tentativa. Ou o sujeito diz a imputação, e o fato</p><p>http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>78</p><p>está consumado, ou não diz, e não há conduta relevante para o Direito Penal.</p><p>Já a calúnia escrita admite a tentativa. Ex.: o sujeito remete uma carta caluniosa e ela se</p><p>extravia. O crime não atinge a consumação, por intermédio do conhecimento do destinatário, por</p><p>circunstâncias alheias à vontade do sujeito.</p><p>12.2. Difamação (art. 139 do CP)</p><p>Difamar significa desacreditar publicamente uma pessoa, ofendendo sua reputação.</p><p>O legislador protege a honra objetiva (reputação). A exemplo do crime de calúnia, o bem</p><p>jurídico protegido é a honra, isto é, a reputação do indivíduo, a sua boa fama, o conceito que a</p><p>sociedade lhe atribui.</p><p>Dizer que uma pessoa é caloteira configura uma injúria, ao passo que espalhar o fato de</p><p>que ela não pagou aos credores “A”, “B” e “C”, quando as dívidas X, Y e Z venceram, configura</p><p>a difamação.</p><p>Considerando que não se enquadra no tipo penal que define a calúnia, já que exige im-</p><p>putação falsa de fato definido como crime, se o agente imputar falsamente</p><p>fato definido como</p><p>contravenção, responderá pelo crime de difamação.</p><p>A difamação atinge o momento consumativo quando um terceiro, que não o ofendido,</p><p>toma conhecimento da imputação ofensiva à reputação.</p><p>Quanto à tentativa, é inadmissível, quando se trata de fato cometido por intermédio da</p><p>palavra oral. Tratando-se, entretanto, de difamação praticada por meio escrito, é admissível.</p><p>12.3. Injúria (art. 140 do CP)</p><p>Injúria é a ofensa à dignidade ou ao decoro de outrem.</p><p>Ao contrário dos delitos de calúnia e difamação, que tutelam a honra objetiva, o bem pro-</p><p>tegido por essa norma penal é a honra subjetiva, que é constituída pelo sentimento próprio de</p><p>cada pessoa acerca de seus atributos morais (chamados de honra-dignidade), intelectuais e fí-</p><p>sicos (chamados de honra-decoro).</p><p>Trata-se de crime formal. O crime consuma-se quando o sujeito passivo toma ciência da</p><p>imputação ofensiva, independentemente de o ofendido sentir-se ou não atingido em sua honra</p><p>subjetiva, sendo suficiente, tão só, que o ato seja revestido de idoneidade ofensiva.</p><p>A injúria, quando cometida por escrito, admite a tentativa; quando por meio verbal, não.</p><p>Nos termos do artigo 140, parágrafo 2 do CP se a injúria consiste em violência ou vias de</p><p>fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes haverá a injúria</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>79</p><p>real com pena de detenção de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à</p><p>violência.</p><p>Por sua vez, nos termos do artigo 140, parágrafo 3º CP (já com a redação atualizada pela</p><p>Lei nº 14.532 de 2023) se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a religião ou à</p><p>condição de pessoa idosa ou com deficiência haverá a injúria qualificada com pena de reclusão,</p><p>de 1 a 3 anos e multa.</p><p>Quando o agente se dirige a uma pessoa de determinada raça, insultando-a com argu-</p><p>mentos ou palavras de conteúdo pejorativo, responderá por injúria racial, nos termos do artigo</p><p>2º A da Lei nº 7.716 de 1989, com pena de reclusão de 2 a 5 anos e multa não podendo alegar</p><p>que houve uma injúria simples, tampouco uma mera exposição do pensamento (como dizer que</p><p>todo “judeu é corrupto” ou que “negros são desonestos”), uma vez que não há limite para tal</p><p>liberdade.</p><p>Assim, quem simplesmente dirigir a terceiro palavras referentes à “raça”, “cor”, “etnia” ou</p><p>“procedência nacional”, com o intuito de ofender, responderá por injúria racial nos termos do</p><p>dispositivo legal citado. Ademais, vale destacar que, nos termos do parágrafo único do artigo 2º</p><p>A da Lei nº 7.716 de 1989 a pena será aumentada de metade se o crime for praticado mediante</p><p>o concurso de duas ou mais pessoas</p><p>12.4. Ação penal</p><p>Conforme se extrai do art. 145 do CP, nos crimes contra a honra, a regra é a de ação</p><p>penal privada da vítima ou do seu representante legal. Todavia, resultando lesão física na vítima</p><p>(injúria real com lesão corporal), apura-se o crime mediante ação penal pública incondicionada.</p><p>No entanto, com o advento da Lei nº 9.099/1995, alguns autores entendem que se trata de ação</p><p>penal pública condicionada à representação, já que é a prevista para os crimes de lesão corporal</p><p>leve.</p><p>Será penal pública condicionada à representação no caso de o delito ser cometido contra</p><p>funcionário público, no exercício das funções (art. 141, II), e condicionada à requisição do Minis-</p><p>tro da Justiça no caso do inciso I do art. 141 (contra o Presidente da República ou Chefe de</p><p>Governo Estrangeiro).</p><p>Convém ressaltar:</p><p>Súm. nº 714 do STF: É concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do</p><p>Ministério Público, condicionada à representação do ofendido, para a ação penal por crime</p><p>contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>80</p><p>Além das causas de aumento de pena já previstas no art. 141 do CP, o legislador acres-</p><p>centou, por meio da Lei nº 14.344/2022, mais uma majorante, aumentando-se de um terço, se</p><p>qualquer dos crimes contra a honra forem praticados contra criança, adolescente, pessoa maior</p><p>de 60 anos ou pessoa com deficiência (inciso IV), exceto na hipótese prevista no § 3º do art. 140</p><p>deste Código.</p><p>Por último, vale destacar que a injúria qualificada do parágrafo 3º do artigo 140 será de</p><p>ação penal pública condicionada à representação enquanto a injúria racial (art. 2º A da Lei nº</p><p>7.716 de 1989) será de ação penal pública incondicionada.</p><p>13. Crimes Contra o Patrimônio</p><p>13.1. Furto (art. 155 do CP)</p><p>13.1.1. Conceito</p><p>O crime de furto consubstancia-se no verbo subtrair, que significa tirar, retirar de outrem</p><p>bem móvel, sem a sua permissão, com o fim de assenhoramento definitivo. A subtração implica</p><p>sempre a retirada do bem sem o consentimento do possuidor ou proprietário.</p><p>É indispensável que o agente tenha a intenção de possuir a coisa alheia móvel, subme-</p><p>tendo-a ao seu poder, isto é, de não devolver o bem, de forma alguma. Assim, se ele o subtrai</p><p>apenas para uso transitório e depois o devolve no mesmo estado, não haverá a configuração do</p><p>tipo penal. Cuida-se, na hipótese, de mero furto de uso, que não constitui crime, pela ausência</p><p>do ânimo de assenhoramento definitivo do bem.</p><p>13.1.2. Consumação e tentativa</p><p>O furto atinge a consumação no momento em que o objeto material é retirado da esfera</p><p>de posse e disponibilidade do sujeito passivo, ingressando na livre disponibilidade do autor, ainda</p><p>que este não obtenha a posse tranquila. A subtração opera-se no exato instante em que o pos-</p><p>suidor perde o poder e o controle sobre a coisa, tendo de retomá-la porque já não está mais</p><p>consigo.</p><p>Pode-se usar, por analogia, o teor da Súm. nº 582 do STJ, relativa ao roubo: consuma-se</p><p>o crime de roubo com a inversão da posse do bem mediante emprego de violência ou grave</p><p>ameaça, ainda que por breve tempo e em seguida à perseguição imediata ao agente e recupe-</p><p>ração da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>81</p><p>A tentativa é admissível. Ocorre sempre que o sujeito ativo não consegue, por circunstân-</p><p>cias alheias à sua vontade, retirar o objeto material da esfera de proteção e vigilância da vítima,</p><p>submetendo-a à sua própria disponibilidade.</p><p>13.1.3. Furto noturno (art. 155, § 1º, do CP)</p><p>A causa de aumento de pena do repouso noturno só é aplicável ao furto simples, previsto</p><p>no caput do art. 155, tendo em vista a sua posição sistemática na construção do tipo penal. Não</p><p>se aplica, portanto, ao furto qualificado do § 4º.</p><p>13.1.4. Furto privilegiado (art. 155, § 2º, do CP)</p><p>A corrente majoritária sustenta ser de pequeno valor a coisa que não ultrapassa quantia</p><p>equivalente a um salário mínimo vigente à época do fato.</p><p>13.1.5. Furto qualificado (art. 155, § 4º, do CP)</p><p>13.1.5.1. Com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da</p><p>coisa</p><p>É necessário que o sujeito pratique violência contra “obstáculo” à subtração do objeto</p><p>material. A violência contra a coisa subtraída não qualifica o furto.</p><p>13.1.5.2. Com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou des-</p><p>treza</p><p>a) Abuso de confiança: é a confiança que decorre de certas relações (que pode ser a</p><p>empregatícia, a decorrente de amizade ou parentesco) estabelecidas entre o agente e o propri-</p><p>etário do objeto. O agente, dessa forma, aproveita-se da confiança nele depositada para praticar</p><p>o furto, pois há menor vigilância do proprietário sobre os seus bens.</p><p>b) Mediante fraude: é o ardil, artifício, meio enganoso empregado pelo agente para dimi-</p><p>nuir, iludir a vigilância da vítima e realizar a subtração. São exemplos de fraude: agente que se</p><p>disfarça de empregado de empresa telefônica e logra entrar em residência alheia para furtar, ou</p><p>agente que, a pretexto de realizar compras em uma loja, distrai a vendedora, de modo a lograr</p><p>apoderar-se dos objetos.</p><p>c) Mediante escalada: escalada, que em direito penal tem</p><p>sentido próprio, é a penetração</p><p>no local do furto por meio anormal, artificial ou impróprio, que demanda esforço incomum.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>82</p><p>Escalada não implica, necessariamente, subida, pois tanto é escalada galgar alturas quanto sal-</p><p>tar fossos, rampas ou mesmo subterrâneos, desde que o faça para vencer obstáculos.</p><p>d) Mediante destreza: consiste na habilidade física ou manual do agente que lhe permite</p><p>o apoderamento do bem sem que a vítima perceba. É a chamada punga. Tal ocorre com a sub-</p><p>tração de objetos que se encontrem junto à vítima, por exemplo, carteira, dinheiro no bolso ou</p><p>na bolsa, colar etc., que são retirados sem que ela note.</p><p>Importa dizer que se a vítima perceber a subtração no momento em que ela se realiza,</p><p>considera-se o furto tentado na forma simples, pois não há que se falar no caso em destreza do</p><p>agente (ex.: a vítima sente a mão do agente em seu bolso).</p><p>13.1.5.3. Com emprego de chave falsa</p><p>Chave falsa é qualquer instrumento de que se sirva o agente para abrir fechaduras, tendo</p><p>ou não formato de chave. Ex.: grampo, alfinete, prego, fenda, gazua etc.</p><p>13.1.5.4. Mediante concurso de duas ou mais pessoas</p><p>Se for praticado em concurso de pessoas, seja na condição de coautoria ou participação</p><p>e autoria, o furto será qualificado pelo concurso de pessoas.</p><p>13.1.5.5. Furto de veículo automotor (art. 155, § 5º, do CP)</p><p>Esta qualificadora diz respeito, especificamente, à subtração de veículo automotor. Con-</p><p>sideram-se como tal os automóveis, ônibus, caminhões, motocicletas, aeronaves, lanchas, jet-</p><p>skis. Para caracterizar essa qualificadora, afigura-se necessário que o veículo seja efetivamente</p><p>transportado para outro Estado ou exterior. Se não ultrapassar a fronteira do Estado ou do País,</p><p>essa qualificadora não incide, sendo o crime de furto simples, salvo se presente outra qualifica-</p><p>dora.</p><p>13.1.5.6. Emprego de explosivo que cause perigo comum</p><p>A Lei nº 13.654/2018 acrescentou o § 4º-A do art. 155 do CP prevendo outra qualifica-</p><p>dora para o crime de furto, quando praticado com emprego de explosivo ou de artefato análogo</p><p>que causa perigo comum.</p><p>A partir da edição do Pacote Anticrime (Lei nº 13.964/2019), o crime de furto com emprego</p><p>de explosivo ou de artefato análogo que causa perigo comum passou a ser considerado hediondo</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>83</p><p>(art. 1º, IX, da Lei nº 8.072/1990).</p><p>13.1.5.7. Utilização de substâncias explosivas</p><p>A Lei nº 13.654/2018 acrescentou também o § 7º do art. 155 do CP prevendo outra qua-</p><p>lificadora para o crime de furto, segundo o qual a pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez)</p><p>anos e multa se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou</p><p>isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego.</p><p>13.1.5.8. Alterações promovidas pela Lei nº 14.155/2021</p><p>Cumpre ressaltar que a Lei nº 14.155/2021, que entrou em vigor em 27-5-2021, acrescen-</p><p>tou os §§ 4º-B e 4º-C ao art. 155 do CP:</p><p>§ 4º-B. A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa, se o furto mediante</p><p>fraude é cometido por meio de dispositivo eletrônico ou informático, conectado ou não à</p><p>rede de computadores, com ou sem a violação de mecanismo de segurança ou a utilização</p><p>de programa malicioso, ou por qualquer outro meio fraudulento análogo.</p><p>§ 4º-C. A pena prevista no § 4º-B deste artigo, considerada a relevância do resultado gra-</p><p>voso:</p><p>I – aumenta-se de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado mediante a</p><p>utilização de servidor mantido fora do território nacional;</p><p>II – aumenta-se de 1/3 (um terço) ao dobro, se o crime é praticado contra idoso ou vulne-</p><p>rável.</p><p>13.2. Roubo (art. 157 do CP)</p><p>13.2.1. Conduta típica</p><p>A ação nuclear do tipo consubstancia-se no verbo subtrair, que significa tirar, retirar, de</p><p>outrem, no caso bem móvel. Agora, contudo, estamos diante de um crime mais grave que o furto,</p><p>na medida em que a subtração é realizada mediante o emprego de grave ameaça ou violência</p><p>contra a pessoa, ou por qualquer outro meio que reduza a capacidade de resistência da vítima.</p><p>Esta última hipótese constitui violência imprópria, consistente em outro meio que não constitua</p><p>violência física ou grave ameaça, por exemplo, fazer a vítima ingerir bebida alcoólica, narcóticos,</p><p>soníferos ou hipnotizá-la.</p><p>13.2.2. Roubo próprio e roubo impróprio</p><p>No roubo próprio, a violência ou a grave ameaça (ou a redução da impossibilidade de</p><p>defesa) são praticadas contra a pessoa para a subtração da coisa. Os meios violentos são em-</p><p>pregados antes ou durante a execução da subtração.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>84</p><p>O roubo impróprio ocorre quando o sujeito, logo depois de subtraída a coisa, emprega</p><p>violência contra a pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a</p><p>detenção da coisa para ele ou para terceiro (art. 157, § 1º, do CP).</p><p>São exemplos típicos de roubo impróprio aquele em que o sujeito ativo, já se retirando do</p><p>portão com a res furtiva, alcançado pela vítima, abate-a (assegurando a detenção), ou, então, já</p><p>na rua, constata que deixou um documento no local, que o identificará, e, retornando para apa-</p><p>nhá-lo, agride o morador que o estava apanhando (garantindo a impunidade).</p><p>13.2.3. Consumação e tentativa</p><p>Nos termos da Súm. nº 582 do STJ, “Consuma-se o crime de roubo com a inversão da</p><p>posse do bem mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e</p><p>em seguida à perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo prescin-</p><p>dível a posse mansa e pacífica ou desvigiada”.</p><p>13.2.4. Causas especiais de aumento de pena: roubo majorado (circuns-</p><p>tanciado) - art. 157, § 2º</p><p>a) Se há o concurso de duas ou mais pessoas: pode haver concurso material entre</p><p>roubo majorado e quadrilha armada, pois os bens jurídicos são diversos. Enquanto o tipo penal</p><p>de roubo protege o patrimônio, o tipo da quadrilha ou bando guarnece a paz pública.</p><p>b) Se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal cir-</p><p>cunstância: a pena é agravada se a vítima, por dever de ofício (caixeiro viajante, empresa de</p><p>segurança especialmente contratada para o transporte de valores), realiza serviço de transporte</p><p>de valores (dinheiro, joia etc.).</p><p>c) Se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro</p><p>estado ou para o exterior: assim como no furto, esta majorante diz respeito, especificamente,</p><p>à subtração de veículo automotor. Consideram-se como tal os automóveis, ônibus, caminhões,</p><p>motocicletas, aeronaves, lanchas, jet-skis.</p><p>d) Se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade: ocorre</p><p>quando o agente restringe a liberdade da vítima por tempo superior ao necessário ou valendo-</p><p>se de forma anormal para garantir a subtração planejada. Ex.: subjugando a vítima, o agente,</p><p>pretendendo levar-lhe o veículo, manda que entre no porta-malas, rodando algum tempo pela</p><p>cidade, até permitir que seja libertada ou o carro seja abandonado.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>85</p><p>Trata-se de crime hediondo (art. 1º, II, a, da Lei nº 8.072/1990, com a redação dada pela</p><p>Lei nº 13.964/2019).</p><p>e) Se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma branca: essa</p><p>qualificadora foi introduzida pela Lei nº 13.964/2019, e só terá incidência para fatos praticados a</p><p>partir da sua vigência, ou seja, fatos praticados a partir do dia 23-1-2020.</p><p>Arma branca é aquela em que o instrumento ou objeto é dotado de ponta ou gume, apto</p><p>a matar ou ferir uma pessoa, por exemplo, punhal e espada.</p><p>f) Se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou</p><p>isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego.</p><p>13.2.5. Roubo com emprego de arma de fogo (art. 157, § 2º-A, do CP)</p><p>Importante alteração trazida pela Lei nº 13.654/2018, na qual o roubo “com emprego de</p><p>arma” deixou de</p><p>ser uma hipótese de roubo circunstanciado no art. 157, § 2º. Já o roubo com</p><p>emprego de arma de fogo continua sendo punido como roubo circunstanciado no art. 157, § 2º-</p><p>A, I, do CP.</p><p>Ou seja, o emprego de arma branca majora o crime de roubo de 1/3 até a metade, ao</p><p>passo que o emprego de arma de fogo majora o crime de roubo em 2/3.</p><p>A arma de brinquedo não serve para majorar a pena, uma vez que não causa à vítima</p><p>maior potencialidade lesiva. Pode, no entanto, gerar grave ameaça e, justamente por isso, servir</p><p>para configurar o tipo penal do roubo, na figura simples.</p><p>Trata-se de crime hediondo (art. 1º, II, b, da Lei nº 8.072/1990, com a redação dada pela</p><p>Lei nº 13.964/2019).</p><p>13.2.6. Roubo com emprego de explosivo ou de artefato análogo que</p><p>cause perigo comum</p><p>Para caracterizar essa qualificadora, deve restar demonstrada a capacidade de o artefato</p><p>causar perigo comum, apto a causar risco a um número indeterminado de pessoas.</p><p>Curiosamente, o legislador considerou hediondo o crime de furto qualificado pelo emprego</p><p>de explosivo ou artefato análogo, mas não considera hediondo o crime de roubo com emprego</p><p>de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum. Como, à evidência, não existe</p><p>analogia in malam partem no Direito Penal, essa omissão do legislador significa que não será</p><p>possível considerar esse tipo de roubo como hediondo.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>86</p><p>13.2.7. Roubo qualificado pelo resultado (art. 157, § 3º, do CP)</p><p>Prevalece o entendimento doutrinário, que passou a admitir a possibilidade, indistinta-</p><p>mente, de o resultado agravador poder decorrer tanto de culpa quanto de dolo, direto ou eventual.</p><p>a) Crime qualificado pelo resultado lesões graves: é uma das hipóteses de delito qua-</p><p>lificado pelo resultado, que se configura pela presença de dolo na conduta antecedente (roubo)</p><p>e dolo ou culpa na conduta subsequente (lesões corporais graves).</p><p>Trata-se de crime hediondo (art. 1º, II, c, da Lei nº 8.072/1990, com a redação dada pela</p><p>Lei nº 13.964/2019).</p><p>b) Crime qualificado pelo resultado morte (latrocínio): o crime de latrocínio ocorre</p><p>quando do emprego da violência física contra a pessoa com o fim de subtrair o bem, ou para</p><p>assegurar a sua posse ou a impunidade do crime, decorre a morte da vítima. Tratando-se de</p><p>crime qualificado pelo resultado, a morte da vítima ou de terceiro tanto pode resultar de dolo (o</p><p>assaltante atira na cabeça da vítima e a mata) quanto de culpa (o agente desfere um golpe contra</p><p>o rosto do ofendido para feri-lo, vindo, no entanto, a matá-lo).</p><p>Trata-se de crime hediondo (art. 1º, II, c, da Lei nº 8.072/1990, com a redação dada pela</p><p>Lei nº 13.964/2019).</p><p>Súm. nº 610 do STF: Há crime de latrocínio, quando o homicídio se consuma, ainda que</p><p>não realize o agente a subtração de bens da vítima.</p><p>Súm. nº 603 do STF: A competência para o processo e julgamento de latrocínio é do juiz</p><p>singular e não do Tribunal do Júri.</p><p>13.3. Extorsão (art. 158 do CP)</p><p>13.3.1. Conduta típica</p><p>Extorsão é o fato de o sujeito constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça,</p><p>e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar</p><p>que se faça ou deixar de fazer alguma coisa.</p><p>A diferença em relação ao roubo concentra-se no fato de a extorsão exigir a participação</p><p>ativa da vítima fazendo alguma coisa, tolerando que se faça ou deixando de fazer algo em virtude</p><p>da ameaça ou da violência sofrida.</p><p>A ação nuclear do tipo consubstancia-se no verbo constranger, que significa coagir, com-</p><p>pelir, forçar, obrigar alguém a fazer (ex.: quitar uma dívida não paga), tolerar que se faça (ex.:</p><p>permitir que rasgue um contrato) ou deixar de fazer alguma coisa (ex.: obrigar a vítima a não</p><p>propor ação judicial contra o agente).</p><p>O constrangimento pode ser exercido mediante o emprego de violência ou grave ameaça,</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>87</p><p>os quais podem atingir tanto o titular do patrimônio quanto pessoa ligada a ele (filhos, pai, mãe</p><p>etc.).</p><p>13.3.2. Consumação e tentativa</p><p>A extorsão atinge a consumação com a conduta típica imediatamente anterior à produção</p><p>do resultado visado pelo sujeito.</p><p>Para a consumação, portanto, o agente deve atingir o segundo estágio, isto é, a consu-</p><p>mação ocorre quando a vítima cede ao constrangimento imposto e faz ou deixa de fazer algo.</p><p>Esse é o entendimento que prevalece na doutrina. Nesse sentido, a Súm. nº 96 do STJ: “O crime</p><p>de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem indevida”.</p><p>A tentativa é admissível. Ocorre quando o sujeito passivo, não obstante constrangido pelo</p><p>autor por meio da violência física ou moral, não realiza a conduta positiva ou negativa pretendida,</p><p>por circunstâncias alheias à sua vontade.</p><p>13.3.3. Extorsão qualificada (art. 158, §§ 2º e 3º)</p><p>As duas hipóteses (lesão corporal grave ou morte) elencadas, como no roubo, caracteri-</p><p>zam condições de exasperação da punibilidade em razão da maior gravidade do resultado.</p><p>Inusitadamente, o legislador deixou de considerar hediondo o crime de extorsão qualifi-</p><p>cada pelo resultado morte, ao dar nova redação ao art. 1º, III, da Lei nº 8.072/1990, que passou</p><p>a prever como crime hediondo somente a extorsão qualificada pela restrição da liberdade da</p><p>vítima, ocorrência de lesão corporal ou morte (art. 158, § 3º).</p><p>13.3.4. Extorsão qualificada pela privação da liberdade (art. 158, § 3º)</p><p>Trata-se da hipótese em que a privação da liberdade da vítima é condição indispensável</p><p>para obtenção da vantagem indevida. É o chamado sequestro-relâmpago.</p><p>Ex.: ladrão constrange a vítima a entregar-lhe o cartão magnético e a fornecer-lhe a se-</p><p>nha, acompanhando-a até caixas eletrônicos de bancos para sacar dinheiro. Nesse caso, ocorre</p><p>o crime de extorsão qualificada, uma vez que é imprescindível a atuação do sujeito passivo do</p><p>ataque patrimonial para a obtenção da vantagem indevida por parte do autor. Difere do roubo</p><p>majorado pela restrição da liberdade da vítima, porque, neste caso, a restrição da liberdade é</p><p>irrelevante para obtenção da vantagem indevida. Imaginemos o agente subtrair objetos da vítima,</p><p>prendendo-a no banheiro. Trata-se de roubo majorado pela restrição da liberdade da vítima, pois</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>88</p><p>trancá-la no banheiro não é condição indispensável para a subtração.</p><p>A extorsão qualificada pela privação da liberdade da vítima com resultado lesão grave ou</p><p>morte passou a ser considerada crime hediondo (art. 1º, III, da Lei nº 8.072/1990).</p><p>13.4. Extorsão mediante sequestro (art. 159 do CP)</p><p>13.4.1. Conduta típica</p><p>O crime consubstancia-se no verbo sequestrar, que significa privar a vítima de sua liber-</p><p>dade de locomoção, ainda que por breve espaço de tempo.</p><p>Exige a presença de um elemento subjetivo específico, consistente na finalidade de ob-</p><p>tenção, para si ou para outrem, de qualquer vantagem como condição ou preço de resgate.</p><p>É crime hediondo.</p><p>13.4.2. Consumação</p><p>A consumação ocorre com a privação de liberdade de locomoção da vítima, exigindo-se</p><p>tempo juridicamente relevante.</p><p>Trata-se de crime permanente, cuja consumação se prolonga no tempo. Assim, enquanto</p><p>a vítima estiver submetida à privação de sua liberdade de locomoção, o crime estará em fase de</p><p>consumação.</p><p>Tratando-se de crime formal, pune-se a mera atividade de sequestrar pessoa, tendo a</p><p>finalidade de obter vantagem. Assim, embora o agente não consiga a vantagem almejada, o</p><p>delito está consumado quando a liberdade da vítima é cerceada.</p><p>13.4.3. Formas qualificadas (art. 159, § 1º, do CP)</p><p>São formas qualificadas:</p><p>a) sequestro por mais de 24 horas;</p><p>b) sequestro de menor de 18 ou maior de 60 anos;</p><p>c) sequestro praticado por bando ou quadrilha.</p><p>d) É possível responsabilizar-se o agente pelo crime autônomo de associação crimi-</p><p>nosa (art. 288) em concurso material com a forma qualificada em estudo. Não há</p><p>falar em bis in idem,</p><p>uma vez que os momentos consumativos e a objetividade</p><p>jurídica entre tais crimes são totalmente diversos, além do que a figura prevista no</p><p>art. 288 do CP existe independentemente de algum crime vir a ser praticado pela</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>89</p><p>quadrilha ou bando.</p><p>13.4.4. Extorsão mediante sequestro qualificada pelo resultado: lesão</p><p>grave ou morte (art. 159, §§ 2º e 3º, do CP)</p><p>A regra, repetindo, é que, nesses crimes, o resultado agravador seja sempre produto de</p><p>culpa. Contudo, na hipótese em apreço, a extrema gravidade das sanções cominadas uniu o</p><p>entendimento doutrinário que passou a admitir a possibilidade, indistintamente, de o resultado</p><p>agravador poder decorrer tanto de culpa quanto de dolo, direto ou eventual:</p><p>a) se resulta em lesão corporal grave;</p><p>b) se resulta em morte.</p><p>13.4.5. Delação premiada (art. 159, § 4º, do CP)</p><p>A Lei nº 8.072/1990, que instituiu os crimes hediondos, houve por bem criar, no Brasil, a</p><p>delação premiada, que significa a possibilidade de se reduzir a pena do criminoso que entregar</p><p>o(s) comparsa(s) a qualquer autoridade capaz de levar o caso à solução almejada, causando a</p><p>liberação da vítima (delegado, juiz, promotor, entre outros).</p><p>13.5. Dano (art. 163 do CP)</p><p>13.5.1. Conduta típica</p><p>Destruir quer dizer arruinar, extinguir ou eliminar. Inutilizar significa tornar inútil ou impres-</p><p>tável alguma coisa aos fins para os quais se destina. Deteriorar é a conduta de quem estraga ou</p><p>corrompe alguma coisa parcialmente.</p><p>É o dolo. Não há a forma culposa.</p><p>Em que pese o art. 163 CP não exija expressamente um fim especial de agir, a jurispru-</p><p>dência tem entendido pela necessidade do animus nocendi, que é a vontade específica de cau-</p><p>sar um prejuízo patrimonial ao dono da coisa.</p><p>Neste sentido, vem se entendendo que a conduta do apenado que rompe a tornozeleira</p><p>eletrônica é atípica, justamente pela ausência de tal animus (RHC 151173-RS).</p><p>13.5.2. Dano qualificado (art. 163, par. ún., do CP)</p><p>I – Violência à pessoa ou grave ameaça a pessoa;</p><p>II – Com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não constitui crime mais</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>90</p><p>grave;</p><p>III – Contra o patrimônio da União, de Estado, do Distrito Federal, de Município ou de</p><p>autarquia, fundação pública, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa</p><p>concessionária de serviços públicos;</p><p>IV – Motivo egoístico e prejuízo considerável.</p><p>13.5.3. Ação penal (art. 167 do CP)</p><p>De acordo com o art. 167, a ação penal privada é cabível no crime de dano simples (art.</p><p>163, caput, do CP) e qualificado somente na hipótese do inciso IV do parágrafo único. A ação</p><p>penal pública incondicionada é cabível nas demais hipóteses.</p><p>13.6. Apropriação indébita (art. 168 do CP)</p><p>13.6.1. Conduta típica</p><p>O núcleo do tipo é o verbo “apropriar-se”, que significa fazer sua a coisa alheia. Tendo o</p><p>sujeito a posse ou a detenção do objeto material, em dado momento faz mudar o título da posse</p><p>ou da detenção, comportando-se como se dono fosse. O pressuposto do crime de apropriação</p><p>indébita é a anterior posse lícita da coisa alheia, da qual o agente se apropria indevidamente. A</p><p>posse, que deve preexistir ao crime, deve ser exercida pelo agente em nome alheio, isto é, em</p><p>nome de outrem.</p><p>A apropriação indébita propriamente dita ocorre quando o sujeito realiza ato demonstrativo</p><p>de que inverteu o título da posse, como a venda, doação, consumo, penhor, ocultação etc. Na</p><p>negativa de restituição, o sujeito afirma claramente ao ofendido que não devolverá o objeto ma-</p><p>terial.</p><p>O art. 168, § 1º, do CP prevê causas de aumento de pena, consistentes em ter recebido</p><p>a coisa: a) em depósito necessário; b) na qualidade de tutor, curador, síndico, liquidatário, inven-</p><p>tariante, testamenteiro ou depositário judicial; c) em razão de ofício, emprego ou profissão.</p><p>13.7. Estelionato (art. 171 do CP)</p><p>13.7.1. Conduta típica</p><p>Consiste em induzir ou manter alguém em erro, mediante o emprego de artifício, ardil, ou</p><p>qualquer meio fraudulento, a fim de obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita em prejuízo</p><p>alheio.</p><p>A característica primordial do estelionato é a fraude: engodo empregado pelo sujeito para</p><p>induzir ou manter a vítima em erro, com o fim de obter um indevido proveito patrimonial.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>91</p><p>O meio de execução deve ser apto a enganar a vítima. Tratando-se de meio grotesco, que</p><p>facilmente demonstra a intenção fraudulenta, não há nem tentativa, por atipicidade do fato.</p><p>13.7.2. Consumação e tentativa</p><p>Trata-se de crime material. Consuma-se com a obtenção da vantagem ilícita indevida, em</p><p>prejuízo alheio, ou seja, quando o agente aufere o proveito econômico, causando dano à vítima.</p><p>Via de regra, esses resultados ocorrem simultaneamente. Há, assim, ao mesmo tempo, a obten-</p><p>ção de proveito pelo estelionatário e o prejuízo da vítima.</p><p>13.7.3. Fraude no pagamento por meio de cheque (art. 171, § 2º, VI, do</p><p>CP)</p><p>Se o indivíduo emite um cheque na certeza de que tem fundos disponíveis para o devido</p><p>pagamento pelo banco, quando na realidade não há qualquer numerário depositado na agência</p><p>bancária, não se pode falar em ilícito criminal, diante da ausência de má-fé.</p><p>O que a lei penal pune é o pagamento fraudulento. Nesse sentido é o teor da Súm. nº 246</p><p>do STF: “Comprovado não ter havido fraude, não se configura o crime de emissão de cheque</p><p>sem fundos”.</p><p>Emitir cheque significa pôr em circulação o título de crédito; frustrar o pagamento quer</p><p>dizer iludir ou enganar o credor, evitando a sua remuneração.</p><p>a) Emitir cheque sem provisão de fundos: o agente preenche, assina e coloca o cheque</p><p>em circulação sem ter numerário suficiente na instituição bancária (banco sacado) para cobrir o</p><p>valor quando da apresentação do título pelo tomador. No momento da emissão do cheque – que</p><p>não significa simplesmente o seu preenchimento, mas a entrega a terceiro –, é preciso que o</p><p>estabelecimento bancário, encarregado da compensação, já não possua fundo suficiente para</p><p>cobrir o pagamento.</p><p>b) Frustrar o pagamento de cheque: neste caso, o agente possui fundos suficientes na</p><p>instituição bancária quando da emissão do cheque, contudo, antes de o beneficiário apresentar</p><p>o título ao banco, aquele retira todo o numerário depositado ou apresenta uma contraordem de</p><p>pagamento.</p><p>c) Competência: conforme o art. 70, § 4º, do CPP, incluído pela Lei nº 14.155/2021, nos</p><p>crimes previstos no art. 171 do CP, quando praticados mediante depósito, mediante emissão de</p><p>cheques sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>92</p><p>ou mediante transferência de valores, a competência será definida pelo local do domicílio da</p><p>vítima, e, em caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela prevenção.</p><p>d) Reparação do dano: arrependendo-se o agente antes da apresentação do título pelo</p><p>beneficiário no banco sacado, e depositando o numerário necessário para cobrir a quantia cons-</p><p>tante do cheque, haverá arrependimento eficaz, não respondendo ele por crime algum.</p><p>Se, por outro lado, o agente arrepender-se somente após a consumação do crime, ou</p><p>seja, após a recusa do pagamento pelo banco sacado, incidirá a Súm. nº 554 do STF: “O paga-</p><p>mento de cheque emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta</p><p>ao prosseguimento da ação penal”.</p><p>Assim, o pagamento do cheque antes do recebimento da denúncia extingue a punibilidade</p><p>do agente.</p><p>13.7.4. Ação penal (art. 171, § 5º, do CP)</p><p>A Lei nº 13.964/2019, ao incluir o § 5º ao art. 171 do CP, passou a considerar que o crime</p><p>de estelionato será, via de regra, de ação penal pública condicionada à representação. Logo, a</p><p>vítima terá o prazo de 6 (seis) meses a contar da ciência da autoria do fato para manifestar sua</p><p>vontade acerca da persecução penal, sob pena de,</p><p>extrapolado esse prazo, ocorrer a extinção</p><p>da punibilidade, com base no art. 107, IV, do CP.</p><p>Excepcionalmente, será, no entanto, de ação penal pública incondicionada se o crime de</p><p>estelionato for praticado contra: a) a Administração Pública, direta ou indireta; b) criança ou ado-</p><p>lescente; c) pessoa com deficiência mental; d) maior de 70 anos de idade ou incapaz.</p><p>13.7.5. Alterações promovidas pela Lei nº 14.155/2021</p><p>Cumpre ressaltar que a Lei nº 14.155/2021, que entrou em vigor em 27-5-2021, acrescen-</p><p>tou os §§ 2º-A e 2º-B ao art. 171:</p><p>§ 2º-A. A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa, se a fraude é cometida</p><p>com a utilização de informações fornecidas pela vítima ou por terceiro induzido a erro por</p><p>meio de redes sociais, contatos telefônicos ou envio de correio eletrônico fraudulento, ou</p><p>por qualquer outro meio fraudulento análogo. (Incluído pela Lei nº 14.155/2021)</p><p>§ 2º-B. A pena prevista no § 2º-A deste artigo, considerada a relevância do resultado gra-</p><p>voso, aumenta-se de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado mediante a</p><p>utilização de servidor mantido fora do território nacional. (Incluído pela Lei nº 14.155/2021)</p><p>13.8. Receptação (art. 180 do CP)</p><p>13.8.1. Conduta típica</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>93</p><p>Nos termos do art. 180, caput, do CP, a receptação é o fato de adquirir, receber, transpor-</p><p>tar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou</p><p>influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte.</p><p>É pressuposto do crime de receptação a existência de crime anterior. Trata-se de delito</p><p>acessório, em que o objeto material deve ser produto de crime antecedente, chamado de delito</p><p>pressuposto.</p><p>A receptação culposa constitui o fato de o sujeito adquirir ou receber coisa que, por sua</p><p>natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem a oferece,</p><p>deve presumir-se obtida por meio criminoso (art. 180, § 3º).</p><p>13.8.2. Receptação qualificada (art. 180, § 1º, do CP)</p><p>Forma qualificada: tem como elemento subjetivo o dolo, seja direto ou eventual.</p><p>13.8.3. Receptação punível autonomamente (art. 180, § 4º, do CP)</p><p>Para a concretização do crime de receptação não importa se houve a condenação do</p><p>autor do crime anterior. Porém, é necessário evidenciar-se a existência do crime anterior.</p><p>13.8.4. Perdão judicial (art. 180, § 5º, do CP)</p><p>Nos termos do art. 180, § 5º, 1ª parte, do CP, na hipótese da receptação culposa, se o</p><p>criminoso é primário, deve o juiz, tendo em consideração determinadas circunstâncias, deixar de</p><p>aplicar a pena. No caso, fixaram a doutrina e a jurisprudência que, além da primariedade, deve-</p><p>se exigir o seguinte: a) diminuto valor da coisa objeto da receptação; b) bons antecedentes; c)</p><p>ter o agente atuado com culpa levíssima.</p><p>13.8.5. Tipo qualificado (art. 180, § 6º, do CP)</p><p>Outra forma qualificada: quando o produto de crime pertencer à União, Estado, Município,</p><p>empresa de serviços públicos ou sociedade de economia mista. Exige-se que o agente tenha</p><p>conhecimento disso.</p><p>13.9. Escusas absolutórias (arts. 181 a 183 do CP)</p><p>13.9.1. Imunidade absoluta (art. 181)</p><p>Trata-se da chamada imunidade penal absoluta, também conhecida como escusa</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>94</p><p>absolutória, incidente sobre os crimes contra o patrimônio, nas seguintes hipóteses:</p><p>I – do cônjuge, na constância da sociedade conjugal;</p><p>II – de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou</p><p>natural.</p><p>13.9.2. Imunidade relativa (art. 182, I, II e III, do CP)</p><p>Consubstancia-se em imunidade penal relativa ou processual, que não extingue a punibi-</p><p>lidade, mas tão somente impõe uma condição objetiva de procedibilidade.</p><p>Neste caso, ao contrário da imunidade absoluta, o autor do crime não é isento de pena,</p><p>mas os crimes de ação penal pública incondicionada passam a ser condicionados à representa-</p><p>ção do ofendido.</p><p>13.9.3. Exclusão de imunidade ou privilégio (art. 183 do CP)</p><p>Dá-se nas seguintes hipóteses:</p><p>I – se o crime é de roubo ou de extorsão, ou, em geral, quando haja emprego de grave</p><p>ameaça ou violência à pessoa;</p><p>II – ao estranho que participa do crime;</p><p>III – se o crime é praticado contra pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta)</p><p>anos.</p><p>14. Crimes contra a Dignidade Sexual</p><p>14.1. Estupro (art. 213 do CP)</p><p>14.1.1. Conduta típica</p><p>Constranger significa tolher a liberdade, forçar ou coagir. Nesse caso, o cerceamento des-</p><p>tina-se a obter a conjunção carnal. Ato libidinoso é aquele destinado a satisfazer a lascívia, o</p><p>apetite sexual do agente. Considerando que a conjunção carnal é a cópula vagínica, todos os</p><p>demais atos que servem à satisfação do prazer sexual são considerados libidinosos, tais como</p><p>o sexo oral ou anal, o toque em partes íntimas, a masturbação, o beijo lascivo, a introdução dos</p><p>dedos na vagina.</p><p>14.1.2. Sujeito ativo e passivo</p><p>Antes da alteração introduzida no art. 213 do CP, o sujeito passivo do crime de estupro</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>95</p><p>era apenas a mulher. Atualmente, o estupro poderá ter como sujeito passivo homens ou mulhe-</p><p>res, quando constrangidos à prática de atos libidinosos de qualquer natureza.</p><p>Atinente ao sujeito ativo, por sua vez, este pode ser homem ou mulher, indistintamente.</p><p>14.1.3. Consumação e tentativa</p><p>O delito consuma-se com a prática do ato de libidinagem (gênero que abrange conjunção</p><p>carnal e vasta enumeração de atos libidinosos ofensivos à dignidade sexual da vítima), sendo</p><p>perfeitamente possível a tentativa, quando, iniciada a execução, o ato sexual visado não se con-</p><p>suma por circunstâncias alheias à vontade do agente.</p><p>Antes da Lei nova, se ocorresse conjunção carnal e atos libidinosos substanciais contra a</p><p>mesma mulher, tínhamos estupro e atentado violento ao pudor. Discutia-se, apenas, se deveria</p><p>incidir a continuidade delitiva ou se se tratava de concurso material de crimes.</p><p>Agora, tendo o legislador unificado os tipos penais do estupro e do atentado violento ao</p><p>pudor, passando a existir apenas o estupro e o estupro contra vulnerável, haverá crime único, se</p><p>praticado no mesmo contexto fático.</p><p>14.1.4. Formas qualificadas (art. 213, §§ 1º e 2º, do CP)</p><p>Duas são as hipóteses: 1ª) ocorrência de lesões graves (que abrangem as lesões gravís-</p><p>simas) decorrentes da conduta do agente; 2ª) vítima maior de 14 anos e menor de 18 anos na</p><p>data do fato.</p><p>Quanto às lesões graves (ou gravíssimas), devem ocorrer da conduta. Com isso, deixou</p><p>claro o legislador que tais resultados devem decorrer da conduta, portanto, da violência ou grave</p><p>ameaça empregadas contra a vítima.</p><p>O § 2º do art. 213, por sua vez, prevê o resultado qualificador morte, também decorrente</p><p>da conduta. Neste particular, houve redução da pena máxima, que anteriormente era de 25 anos,</p><p>passando para 20 anos de reclusão.</p><p>Em ambos os casos, os resultados lesões graves (ou gravíssimas) e morte devem ocorrer</p><p>a título de culpa do agente.</p><p>14.2. Violação sexual mediante fraude (art. 215 do CP)</p><p>14.2.1. Conduta típica</p><p>O crime do art. 215 do CP abarca a prática de conjunção carnal ou a prática de ato</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>96</p><p>libidinoso diverso contra homens ou mulheres, mediante fraude ou outro meio que impeça ou</p><p>dificulte a livre manifestação de vontade da vítima.</p><p>Exemplo que se tem visto é a prática de simulações por médico no sentido de sugestionar</p><p>estar examinando o(a) paciente para obter aludidos atos libidinosos, ou mesmo rituais de cura</p><p>fraudulentamente praticados com o mesmo fim.</p><p>Atentar para que não se configure a hipótese prevista no novel § 1º do art. 217-A, que</p><p>prevê o tipo penal de estupro contra vulnerável, isto é, quando a vítima, além das demais hipó-</p><p>teses lá elencadas (vítima menor de 14 anos, pessoa que, por enfermidade ou deficiência mental,</p><p>não tiver o necessário discernimento para a prática do ato), por qualquer outra causa, não possa</p><p>oferecer resistência. Se a vítima, por exemplo, estiver absolutamente embriagada, absoluta-</p><p>mente narcotizada, dormindo, em estados de inconsciência, elevada senilidade, deficiência física</p><p>que a incapacite de resistir etc., teremos estupro contra vulnerável.</p><p>O sujeito ativo e passivo da aludida infração penal pode ser homem e mulher, indistinta-</p><p>mente. Trata-se, pois, de crime comum. No entanto, no caso de menor de 14 anos, o crime será</p><p>o do art. 217-A do CP (estupro de vulnerável).</p><p>14.2.2. Consumação e tentativa</p><p>Tal como ocorre no estupro, consuma-se o delito com a prática do ato de libidinagem,</p><p>sendo perfeitamente possível a tentativa quando, iniciada a execução, o ato sexual visado não</p><p>se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.</p><p>14.3. Importunação sexual (art. 215-A do CP)</p><p>14.3.1. Conduta típica</p><p>A conduta do agente consiste em praticar ato libidinoso, com o propósito de satisfazer sua</p><p>lascívia ou a de terceiro. A partir da introdução do art. 215-A do CP, o art. 61 do Decreto-lei nº</p><p>3.688/1941 está revogado. Deve o ato libidinoso ser praticado contra alguém, ou seja, contra</p><p>pessoa determinada. Assim, pratica o crime de importunação sexual o agente que se masturba</p><p>diante de uma pessoa para satisfazer a sua lascívia. Agora, se o agente se masturbar em praça</p><p>pública, sem visar a uma pessoa determinada, praticará o crime de ato obsceno (art. 233 do CP).</p><p>Trata-se de crime que contém subsidiariedade expressa, ou seja, aplicam-se as penas da</p><p>importunação sexual se a conduta não caracteriza crime mais grave. Assim, se, por exemplo, o</p><p>agente empregar violência na prática do ato libidinoso, incidirá o crime de estupro (art. 213 do</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>97</p><p>CP).</p><p>É tipificado também como crime comum, não se exigindo, portanto, qualidade especial da</p><p>vítima. Pode, assim, ser praticado por qualquer pessoa. Da mesma forma, qualquer pessoa pode</p><p>figurar como vítima.</p><p>O agente desenvolve conduta com a consciência de praticar o ato libidinoso contra al-</p><p>guém. Eis o dolo. Além disso, o tipo prevê um elemento subjetivo específico, consistente no</p><p>agente atuar com a finalidade de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro.</p><p>14.3.2. Consumação e tentativa</p><p>A consumação ocorre com a prática do ato libidinoso. Embora seja de difícil incidência, já</p><p>que, se o agente inicia o ato libidinoso, estará consumado o crime, é possível a tentativa.</p><p>14.4. Estupro de vulnerável (art. 217-A do CP)</p><p>14.4.1. Conduta típica</p><p>O crime de estupro de vulnerável consiste na conduta de ter conjunção carnal ou praticar</p><p>outro ato libidinoso com menor de 14 anos, bem como com pessoa portadora de enfermidade ou</p><p>deficiência mental ou incapaz de discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra</p><p>causa, não apresenta condições de oferecer resistência (§ 1º).</p><p>O crime é punido a título de dolo, devendo o agente ter ciência de que age em face de</p><p>pessoa vulnerável. Se o agente não sabia que a vítima era menor de 14 anos de idade, pode</p><p>incidir o erro de tipo (art. 20, caput, do CP).</p><p>Nos termos do art. 217-A, § 5º, do CP, incide o crime de estupro de vulnerável indepen-</p><p>dentemente do consentimento da vítima ou do fato de ela ter mantido relações sexuais anterior-</p><p>mente ao crime.</p><p>14.4.2. Consumação ou tentativa</p><p>Tratando-se de crime material, a consumação ocorrerá com o resultado naturalístico, ou</p><p>seja, com a conjunção carnal ou ato libidinoso diverso da conjunção carnal.</p><p>14.4.3. Formas qualificadas (art. 217-A, §§ 3º e 4º, do CP)</p><p>Os §§ 3° e 4° qualificam o delito de estupro contra vulnerável se da conduta ocorrer o</p><p>resultado lesão grave (por consequência, gravíssima também) ou morte da vítima.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>98</p><p>14.4.4. Ação penal (art. 225 do CP)</p><p>Em relação aos crimes contra a dignidade sexual, a ação penal será sempre pública in-</p><p>condicionada.</p><p>15. Crimes contra a Fé Pública</p><p>15.1. Moeda falsa (art. 289 do CP)</p><p>15.1.1. Conduta típica</p><p>O tipo básico (caput) pune aquele que falsificar, fabricando ou alterando, moeda metálica</p><p>ou papel-moeda de curso legal no País ou no estrangeiro.</p><p>Falsificar significa conferir aparência enganadora, recaindo a conduta sobre moeda me-</p><p>tálica ou papel-moeda (nacional ou estrangeira).</p><p>É essencial que a falsificação seja convincente, isto é, capaz de iludir os destinatários da</p><p>moeda.</p><p>15.1.2. Consumação e tentativa</p><p>O crime consuma-se no momento da fabricação ou da alteração da moeda, desde que</p><p>idônea a iludir. A tentativa é perfeitamente possível.</p><p>15.1.3. Formas equiparadas (art. 289, § 1º, do CP)</p><p>Nas mesmas penas incorre quem, por conta própria ou alheia, importa ou exporta, ad-</p><p>quire, vende, troca, cede, empresta, guarda ou introduz na circulação moeda falsa.</p><p>15.1.4. Privilégio (art. 289, § 2º, do CP)</p><p>Quem, tendo recebido de boa-fé, como verdadeira, moeda falsa ou alterada, a restitui à</p><p>circulação, depois de conhecer a falsidade, é punido com detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois)</p><p>anos, e multa.</p><p>15.1.5. Falsificação funcional (art. 289, § 3º, do CP)</p><p>É punido com reclusão, de 3 (três) a 15 (quinze) anos, e multa, o funcionário público ou</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>99</p><p>diretor, gerente, ou fiscal de banco de emissão que fabrica, emite ou autoriza a fabricação ou</p><p>emissão:</p><p>I – de moeda com título ou peso inferior ao determinado em lei;</p><p>II – de papel-moeda em quantidade superior à autorizada.</p><p>15.2. Falsificação de documento público (art. 297 do CP)</p><p>15.2.1. Conduta típica</p><p>O art. 297 do CP trata da falsidade material, ou seja, aquela que diz respeito à forma do</p><p>documento.</p><p>As ações nucleares consubstanciam-se nos verbos falsificar, que significa formar, criar</p><p>um documento; e alterar, que significa modificar o documento. Na hipótese, o documento é ver-</p><p>dadeiro, e o agente substitui seu conteúdo, isto é, frases, palavras que alterem sua essência,</p><p>incidindo, portanto, sobre aspectos relevantes do documento.</p><p>15.2.2. Consumação e tentativa</p><p>O crime consuma-se com a falsificação ou alteração do documento, sendo prescindível o</p><p>uso efetivo deste.</p><p>A tentativa é possível, pois há um iter criminis que pode ser fracionado. A tentativa ocor-</p><p>rerá se, por exemplo, o agente, estando no início do processo de formação da escritura pública</p><p>falsa, tendo preenchido apenas algumas linhas, é surpreendido por terceiro. Nessa hipótese, não</p><p>ocorreu ainda a contrafação total do documento, portanto, o crime reputa-se tentado.</p><p>Aplica-se a Súm. nº 17 do STJ: “Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais po-</p><p>tencialidade lesiva, é por este absorvido”. Trata-se da aplicação da regra de que o crime-fim</p><p>absorve o crime-meio.</p><p>15.3. Falsificação de documento particular (art. 298 do CP)</p><p>15.3.1. Conduta típica</p><p>Também se trata de falsidade material, ou seja, aquela que diz respeito à forma do docu-</p><p>mento.</p><p>Falsificar: significa formar, criar um documento. Ex.: o agente aproveitou-se do espaço</p><p>em branco existente entre o conteúdo da carta e a assinatura do missivista para inserir aí uma</p><p>confissão de dívida, cortando a parte do conteúdo da carta, e criando, dessarte, parcialmente o</p><p>documento.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>100</p><p>Alterar: significa modificar o documento. Na hipótese, o documento é verdadeiro, e o</p><p>agente substitui seu conteúdo, isto é, frases, palavras que alterem sua essência, incidindo, por-</p><p>tanto, sobre aspectos relevantes do documento.</p><p>15.3.2. Consumação e tentativa</p><p>O crime consuma-se com a falsificação ou alteração do documento, sendo prescindível o</p><p>uso efetivo deste.</p><p>A tentativa é possível, pois há um iter criminis que pode ser fracionado. A tentativa ocor-</p><p>rerá quando, por exemplo, o agente, estando no início do processo de forjamento de um instru-</p><p>mento de cessão</p><p>de direitos, em que ele figura como beneficiário, é interrompido por terceiros</p><p>antes de sua finalização.</p><p>15.4. Falsidade ideológica (art. 299 do CP)</p><p>15.4.1. Conduta típica</p><p>Na falsidade ideológica, o documento é formalmente perfeito, sendo, no entanto, falsa a</p><p>ideia nele contida.</p><p>O sujeito tem legitimidade para emitir o documento, mas acaba por lhe inserir um conteúdo</p><p>sem correspondência com a realidade dos fatos.</p><p>Ex.: assim, uma escritura lavrada pelo funcionário do Cartório de Registro de Imóveis é</p><p>formalmente perfeita, pois a ele incumbe formar o instrumento público. Entretanto, se essa es-</p><p>crita encerrar declarações falsas prestadas pelo particular, haverá o crime de falsidade ideoló-</p><p>gica.</p><p>Trata-se de crime de ação múltipla. Diversas são as ações nucleares típicas previstas:</p><p>1) Omitir – deixar de inserir ou não mencionar.</p><p>2) Inserir – colocar ou introduzir.</p><p>3) Fazer inserir – proporcionar que se introduza.</p><p>15.4.2. Consumação e tentativa</p><p>Consuma-se com a omissão ou a inserção da declaração falsa ou diversa da que deveria</p><p>constar.</p><p>Trata-se de crime formal; prescinde-se, portanto, da ocorrência efetiva do dano, bastando</p><p>a capacidade de lesar terceiro. Assim, o prejuízo a direito, a criação da obrigação ou a alteração</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>101</p><p>da verdade sobre fato juridicamente relevante não são necessários à consumação do crime.</p><p>16. Crimes contra a Administração Pública</p><p>16.1. Dos crimes praticados por funcionário público contra a Adminis-</p><p>tração em geral</p><p>16.1.1. Peculato (art. 312 do CP)</p><p>16.1.1.1. Conduta típica</p><p>O peculato próprio, na realidade, constitui uma apropriação indébita, só que praticada por</p><p>funcionário público com violação do dever funcional. Antes de ser uma ação lesiva aos interesses</p><p>patrimoniais da Administração Pública, é principalmente uma ação que fere a moralidade admi-</p><p>nistrativa, em virtude de quebra do dever funcional.</p><p>O peculato próprio é formado pelo peculato-apropriação e peculato-desvio.</p><p>No peculato-apropriação, a ação nuclear típica consubstancia-se no verbo apropriar. As-</p><p>sim como no crime de apropriação indébita, o agente tem a posse (ou detenção) lícita do bem</p><p>móvel, público ou particular, e inverte esse título, pois passa a comportar-se como se dono fosse,</p><p>isto é, alienando, doando, consumindo com o bem.</p><p>O peculato-desvio está previsto na segunda parte do caput do art. 312: “ou desviá-lo, em</p><p>proveito próprio ou alheio”.</p><p>O agente tem a posse da coisa e lhe dá destinação diversa da exigida por lei, agindo em</p><p>proveito próprio ou de terceiro.</p><p>Por exemplo, o funcionário empresta o dinheiro público para perceber os juros.</p><p>O peculato-furto é o denominado peculato impróprio, e está previsto no art. 312, § 1º, do</p><p>CP. Trata-se de um crime de furto, só que praticado por funcionário público, o qual se vale dessa</p><p>qualidade para cometê-lo. Aqui o agente não tem a posse ou detenção do bem como no peculato-</p><p>apropriação ou desvio, mas se vale da facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário</p><p>público para realizar a subtração.</p><p>16.1.1.2. Sujeitos do delito</p><p>Trata-se de crime próprio. Somente o funcionário público (art. 327, caput) e as pessoas a</p><p>ele equiparadas legalmente (art. 327, §§ 1º e 2º) podem praticar o delito de peculato.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>102</p><p>A condição especial funcionário público, como elementar do crime de peculato, comunica-</p><p>se ao particular que eventualmente concorra, na condição de coautor ou partícipe, para a prática</p><p>do crime, nos termos do art. 30 do CP. Portanto, é perfeitamente possível o concurso de pessoas,</p><p>dada a comunicabilidade da elementar do crime (art. 30).</p><p>16.1.1.3. Peculato culposo (art. 312, § 2º, do CP)</p><p>Pune-se aqui o funcionário público que, por negligência, imprudência ou imperícia, con-</p><p>corre para a prática de crime de outrem.</p><p>O funcionário, para ser punido, insere-se na figura do garante, prevista no art. 13, § 2º.</p><p>Assim, tem ele o dever de agir, impedindo o resultado de ação delituosa de outrem. Não o fa-</p><p>zendo, responde por peculato culposo.</p><p>Ex.: se um vigia de prédio público se desvia de sua função de guarda, por negligência,</p><p>permitindo, pois, que terceiros invadam o lugar e de lá subtraiam bens, responde por peculato</p><p>culposo.</p><p>Nos termos do art. 312, § 3º, do CP, a reparação do dano, para dar causa à extinção da</p><p>punibilidade, deve ser anterior ao trânsito em julgado da sentença criminal.</p><p>Deve ser completa e não exclui eventual sanção administrativa contra o funcionário. A</p><p>extinção da punibilidade somente aproveita o funcionário, autor do peculato culposo.</p><p>Consoante a segunda parte do § 3º, no crime culposo, se a reparação do dano é posterior</p><p>à sentença irrecorrível, isto é, transitada em julgado, haverá a redução de metade da pena im-</p><p>posta.</p><p>16.1.2. Concussão (art. 316 do CP)</p><p>16.1.2.1. Conduta típica</p><p>A ação nuclear consubstancia-se no verbo exigir, isto é, ordenar, reivindicar, impor como</p><p>obrigação.</p><p>A vítima cede às exigências formuladas pelo agente diante do temor de represálias rela-</p><p>cionadas ao exercício da função pública por ele exercida.</p><p>Assim, não é necessária a promessa da causação de um mal determinado; basta o temor</p><p>que a autoridade inspira.</p><p>Ex.: carcereiro que exige dinheiro dos presos sob sua custódia. Na hipótese, o simples</p><p>fato de os presos encontrarem-se sob a guarda daquele gera neles o temor de eventuais</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>103</p><p>represálias.</p><p>Contudo, não pratica esse delito, mas o de extorsão ou roubo, por exemplo, o policial</p><p>militar que exige vantagem indevida da vítima utilizando-se de violência, ou ameaçando-a gra-</p><p>vemente de sequestrar seu filho.</p><p>16.1.2.2. Consumação e tentativa</p><p>Trata-se de crime formal. A consumação ocorre com a mera exigência da vantagem inde-</p><p>vida, independentemente de sua efetiva obtenção. Se esta sobrevém, há mero exaurimento do</p><p>crime.</p><p>É possível a tentativa, na hipótese em que o crime é plurissubsistente.</p><p>16.1.3. Excesso de exação (art. 316, § 1º, do CP)</p><p>16.1.3.1. Conduta típica</p><p>Há duas formas de incidir o crime de excesso de exação: a primeira, quando se trata de</p><p>exigência de tributo ou contribuição social indevido; a segunda, o tributo ou contribuição social é</p><p>devido, mas o agente emprega meio gravoso ou vexatório para o devedor, o qual não é autori-</p><p>zado por lei.</p><p>16.1.3.2. Consumação e tentativa</p><p>a) Exigência indevida: aqui o delito se consuma no momento em que é feita a exigência</p><p>do tributo ou contribuição social.</p><p>Trata-se de crime formal, portanto, a consumação independe do efetivo pagamento do</p><p>tributo ou contribuição social pela vítima.</p><p>A tentativa é possível. Ex.: carta contendo a exigência de vantagem, a qual é interceptada</p><p>antes de chegar ao conhecimento da vítima.</p><p>b) Cobrança vexatória ou gravosa: consuma-se com o emprego do meio vexatório ou</p><p>gravoso na cobrança do tributo ou contribuição social, independentemente de seu efetivo rece-</p><p>bimento.</p><p>A tentativa é possível. Ex.: com o devido aparato já se acha na casa ou estabelecimento</p><p>do ofendido, mas é obstado antes que inicie a cobrança.</p><p>16.1.3.3. Excesso de exação qualificado (art. 316, § 2º, do CP)</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>104</p><p>Nessa modalidade mais gravosa do crime de excesso de exação, pune-se o funcionário</p><p>público que, em vez de recolher o tributo ou contribuição social, indevidamente exigido (§ 1º),</p><p>para os cofres públicos, desvia-o em proveito próprio ou alheio.</p><p>16.1.4. Corrupção passiva (art. 317 do CP)</p><p>16.1.4.1. Conduta típica</p><p>Trata-se de crime de ação múltipla. Três são as condutas típicas previstas:</p><p>a) Solicitar: pedir, manifestar que deseja algo. Não há o emprego de qualquer ameaça</p><p>explícita ou implícita. O funcionário solicita vantagem, e a vítima cede por deliberada vontade.</p><p>b) Receber: aceitar, entrar na posse. Significa obter, direta ou indiretamente, para</p><p>Penal</p><p>10</p><p>2. Do crime</p><p>2.1. Relação de causalidade ou nexo causal (art. 13 do CP)</p><p>Via de regra, a conduta do agente produz o resultado criminoso de forma direta. Trata-se</p><p>de relação de causa (conduta) e efeito (resultado): nexo de causalidade.</p><p>Todavia, pode ocorrer de, aliada à conduta do agente, outra causa contribuir para o resul-</p><p>tado. É a chamada concausa.</p><p>Esta “concausa” pode ser absolutamente independente ou relativamente independente,</p><p>dependendo se teve ou não origem na conduta do agente.</p><p>2.1.1. Causas absolutamente independentes</p><p>A expressão “absolutamente” serve para designar que a outra causa independente por si</p><p>só produziu o resultado. São causas que não se inserem na linha do desdobramento natural da</p><p>conduta do agente, ou seja, causas inusitadas, desvinculadas da ação do agente, surgindo de</p><p>fonte distinta. Há, na verdade, uma quebra do nexo causal.</p><p>São três as espécies de causas absolutamente independentes:</p><p>a) Preexistentes: trata-se de causa que existia antes da conduta do agente e produz o</p><p>resultado independentemente da sua atuação. Ex.: o agente desfere um disparo de arma de fogo</p><p>contra a vítima, que, no entanto, vem a falecer pouco depois, não em consequência dos ferimen-</p><p>tos recebidos, mas porque antes ingerirá veneno com a intenção de se suicidar.</p><p>b) Concomitantes: são as causas que não têm nenhuma relação com a conduta e pro-</p><p>duzem o resultado independentemente desta, no entanto, por coincidência, atuam exatamente</p><p>no instante em que a ação é realizada. Ex.: “A” desfere golpe de faca contra “B” no exato mo-</p><p>mento em que este vem a falecer exclusivamente por força da queda da marquise de um prédio</p><p>em sua cabeça.</p><p>c) Supervenientes: são causas que atuam após a conduta. Ou seja, que surgem depois</p><p>da conduta desenvolvida pelo agente. Ex.: “A” ministra veneno na alimentação de “B”. Antes de</p><p>o veneno produzir efeitos, há um desabamento ou incêndio na casa da vítima, que morre exclu-</p><p>sivamente por conta dos escombros que caíram sobre sua cabeça ou queimada pelo fogo.</p><p>*Consequência: quando a causa é absolutamente independente da conduta do sujeito,</p><p>o problema é resolvido pelo caput do art. 13: o agente responde somente por aquilo que deu</p><p>causa. Nos exemplos, a causa da morte não tem ligação alguma com o comportamento do</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>11</p><p>agente. Em face disso, ele não responde pelo resultado morte, mas, sim, pelos atos praticados</p><p>antes de sua produção. Isso porque ocorreu quebra do nexo causal. Assim, se o dolo era de</p><p>matar, o agente responderia por tentativa de homicídio.</p><p>Cuidado! Se o enunciado apontar dolo de lesão corporal, por exemplo, o agente respon-</p><p>derá por aquilo que deu causa: lesão corporal (leve, grave ou gravíssima).</p><p>2.1.2. Causas relativamente independentes</p><p>Como são causas independentes, produzem por si sós o resultado, não se situando</p><p>dentro da linha de desdobramento causal da conduta. Por serem, no entanto, apenas relativa-</p><p>mente independentes, encontram sua origem na própria conduta praticada pelo agente.</p><p>Aqui não há, de regra, uma quebra do nexo causal, mas uma soma entre as causas, que,</p><p>ao final, conduzem ao resultado lesivo.</p><p>Também são três as espécies de causas relativamente independentes:</p><p>a) Preexistentes: a causa que efetivamente gerou o resultado já existia ao tempo da</p><p>conduta do agente, que concorreu para a sua produção. Nesse caso, como há uma soma de</p><p>causas e não quebra do nexo causal, o agente responde pelo resultado pretendido. No caso,</p><p>homicídio consumado, a menos que não tenha concorrido para ele com dolo ou culpa.</p><p>Cuidado: se o agente não sabia do estado de saúde da vítima ou não lhe era previsível,</p><p>não poderia lhe ser atribuído o resultado morte. Assim, se pretendia ferir a vítima, agredindo-a</p><p>com um soco e esta, em razão da hemofilia, desconhecida pelo agente, vem a falecer em razão</p><p>da eclosão de uma hemorragia, o agente somente será responsabilizado pelo delito de lesão</p><p>corporal (leve, grave ou gravíssima, conforme constar no enunciado).</p><p>b) Concomitantes: a causa que efetivamente produziu o resultado surge no exato mo-</p><p>mento da conduta do agente. Ex.: considera-se o ataque à vítima, por meio de faca, que, no</p><p>exato momento da agressão, tentando desviar dos golpes, a vítima se desequilibra e cai de um</p><p>penhasco, sofre ataque cardíaco, vindo a falecer, apurando-se que a soma desses fatores (cau-</p><p>sas) produziu a morte, já que a agressão e o ataque cardíaco, considerados isoladamente, não</p><p>teriam o condão do produzir o resultado morte.</p><p>c) Supervenientes (art. 13, § 1°, do CP): a causa que efetivamente produziu o resultado</p><p>ocorre depois da conduta praticada pelo agente. Ex.: o agente desfere um golpe de faca contra</p><p>a vítima, com a intenção de matá-la. Ferida, a vítima é levada ao hospital e sofre acidente no</p><p>trajeto, vindo, por este motivo, a falecer. A causa é independente, porque a morte foi provocada</p><p>pelo acidente e não pela facada, mas essa independência é relativa, já que, se não fosse o</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>12</p><p>ataque, a vítima não estaria na ambulância acidentada e não morreria. Tendo atuado posterior-</p><p>mente à conduta, denomina-se causa superveniente.</p><p>Na hipótese das causas supervenientes, embora exista nexo físico-naturalístico, a lei, por</p><p>expressa disposição do art. 13, § 1°, do CP, que excepcionou a regra geral, exclui a imputação</p><p>do resultado ao agente, devendo, no entanto, responder pelos atos anteriores efetivamente pra-</p><p>ticados. Assim, o agente não responde pelo resultado ocorrido, mas somente pelos atos anteri-</p><p>ores, que, no caso, foi tentativa de homicídio.</p><p>Cuidado! Se o enunciado apontar dolo de lesão corporal, por exemplo, o agente respon-</p><p>derá pelos atos anteriores praticados, no caso, lesão corporal (leve, grave ou gravíssima).</p><p>2.2. Relevância da omissão: crimes omissivos (art. 13, § 2°, do CP)</p><p>O crime omissivo configura-se quando o agente deixa de fazer aquilo que poderia e deve-</p><p>ria fazer, que estaria obrigado em virtude de lei.</p><p>Os crimes omissivos podem ser próprios ou impróprios (ou comissivos por omissão).</p><p>2.2.1. Crimes omissivos próprios</p><p>O verbo nuclear do tipo descreve uma conduta omissiva. Nesse caso, o crime consiste</p><p>em o sujeito amoldar a sua conduta ao tipo legal que descreve uma conduta omissiva. Em sín-</p><p>tese, o agente será responsabilizado por não cumprir o dever de agir contido implicitamente na</p><p>norma incriminadora.</p><p>Exemplo: crime de omissão de socorro:</p><p>Art. 135. Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à</p><p>criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em</p><p>grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública:</p><p>Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.</p><p>Parágrafo único. A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de</p><p>natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.</p><p>2.2.2. Crimes omissivos impróprios ou comissivos por omissão (art. 13,</p><p>§ 2°, do CP)</p><p>Para que alguém responda por crime comissivo por omissão é preciso que tenha o dever</p><p>jurídico de impedir o resultado, previsto no art. 13, § 2°, do CP:</p><p>a) Ter por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância: nesse caso, por expressa</p><p>imposição da lei, o agente estará obrigado a agir para evitar o resultado, como, por exemplo,</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>13</p><p>entre pais e filhos, entre cônjuges. Assim, se o agente se omitir, ou seja, deixar de agir, quando</p><p>lhe era possível, responderá pelo resultado gerado. Ex.: mãe que deixa de alimentar o filho, que,</p><p>por conta da sua negligência, acaba morrendo por inanição. Essa mãe deverá responder pelo</p><p>resultado gerado, qual seja, homicídio culposo. Se, de outro lado, a mãe desejou a morte do filho</p><p>ou assumiu o risco de produzi-la, responderá por homicídio doloso.</p><p>b) De outra forma, assumir a responsabilidade de impedir o resultado: aqui a obriga-</p><p>si ou</p><p>para outrem, vantagem indevida.</p><p>Aqui a proposta parte de terceiros e a ela adere o funcionário, ou seja, o agente não só</p><p>aceita a proposta como recebe a vantagem indevida.</p><p>Ao contrário da primeira modalidade, é condição essencial para sua existência que haja a</p><p>anterior configuração do crime de corrupção ativa, isto é, o oferecimento de vantagem indevida</p><p>(art. 333). Sem essa oferta pelo particular, não há como falar em recebimento de vantagem.</p><p>c) Aceitar a promessa de recebê-la: nessa modalidade típica, basta que o funcionário</p><p>concorde com o recebimento da vantagem. Não há o efetivo recebimento dela. Deve haver, ne-</p><p>cessariamente, uma proposta formulada por terceiros, à qual adere o funcionário, mediante a</p><p>aceitação de receber a vantagem.</p><p>Na corrupção passiva, o funcionário, em troca de alguma vantagem, pratica ou deixa de</p><p>praticar ato de ofício para beneficiar alguém. O ato a ser praticado pode ser ilegítimo, ilícito ou</p><p>injusto. É a chamada corrupção própria.</p><p>Ex.: o funcionário do cartório criminal solicita indevida vantagem econômica para suprimir</p><p>documentos do processo judicial.</p><p>Também configura o crime a prática de ato legítimo, lícito, justo. É a chamada corrupção</p><p>passiva imprópria.</p><p>Ex.: oficial de justiça solicita vantagem econômica ao advogado, a fim de dar prioridade</p><p>ao cumprimento do mandado judicial expedido em processo em que aquele atua.</p><p>16.1.4.2. Consumação e tentativa</p><p>Trata-se de crime formal. Portanto, a consumação ocorre com o ato de solicitar, receber</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>105</p><p>ou aceitar a promessa de vantagem indevida.</p><p>A corrupção passiva consuma-se instantaneamente, isto é, com a simples solicitação da</p><p>vantagem indevida, o recebimento desta ou com a aceitação da mera promessa daquela.</p><p>O tipo penal não exige que o funcionário pratique ou se abstenha da prática do ato funci-</p><p>onal. Se isso suceder, haverá mero exaurimento do crime, o qual constitui condição de maior</p><p>punibilidade (causa de aumento de pena prevista no § 1º do art. 317).</p><p>A tentativa é de difícil ocorrência, mas não é impossível. Basta que haja um iter criminis a</p><p>ser cindido. Ex.: solicitação feita por carta, a qual é interceptada pelo chefe de repartição.</p><p>16.1.4.3. Causa de aumento de pena (art. 317, § 1º)</p><p>Eleva-se em 1/3 a pena do agente que, em razão da vantagem recebida ou prometida,</p><p>efetivamente retarda (atrasa ou procrastina) ou deixa de praticar (não leva a efeito) ato de ofício</p><p>que lhe competia desempenhar ou termina praticando o ato, mas desrespeitando o dever funci-</p><p>onal. É o que a doutrina classifica de corrupção exaurida.</p><p>16.1.4.4. Figura privilegiada (art. 317, § 2º)</p><p>Trata-se de conduta de menor gravidade, na medida em que o agente pratica, deixa de</p><p>praticar ou retarda o ato de ofício, não em virtude do recebimento de vantagem indevida, mas</p><p>cedendo a pedido ou influência de outrem, isto é, para satisfazer interesse de terceiros ou para</p><p>agradar ou bajular pessoas influentes.</p><p>16.1.5. Prevaricação (art. 319 do CP)</p><p>16.1.5.1. Conduta típica</p><p>O crime de prevaricação caracteriza-se pela conduta do funcionário público em retardar</p><p>ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de</p><p>lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal.</p><p>a) Retardar: é atrasar, adiar, protelar, procrastinar, não praticar o ato de ofício dentro do</p><p>prazo estabelecido (crime omissivo).</p><p>Ex.: atendente de cartório judicial que, devendo expedir alvará de soltura, por não simpa-</p><p>tizar com o advogado, deixa de fazê-lo com a brevidade que a medida exige.</p><p>b) Deixar de praticar: trata-se de mais uma modalidade omissiva do crime em estudo.</p><p>Aqui, no entanto, ao contrário da conduta precedente, há o ânimo definitivo de não praticar o ato</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>106</p><p>de ofício.</p><p>c) Praticar (contra disposição expressa de lei): cuida-se aqui de conduta comissiva, em</p><p>que o agente efetivamente executa o ato, só que de forma contrária à lei.</p><p>O interesse pessoal é qualquer proveito, vantagem, podendo ser patrimonial ou moral.</p><p>Quanto ao interesse patrimonial, importa distinguir algumas situações:</p><p>1) se o ato praticado, retardado ou omitido tiver sido objeto de acordo anterior entre o</p><p>funcionário e o particular, visando aquele indevida vantagem, o crime passará a ser</p><p>outro: corrupção passiva;</p><p>2) se houver, anteriormente à prática ou omissão do ato, a exigência de vantagem</p><p>indevida pelo funcionário público, haverá o crime de concussão.</p><p>Sentimento pessoal: reflete um estado afetivo ou emocional do próprio agente, que pode</p><p>manifestar-se em suas mais variadas formas, tais como amor, paixão, emoção, ódio.</p><p>16.2. Dos crimes praticados por particular contra a Administração em</p><p>geral</p><p>16.2.1. Resistência (art. 329 do CP)</p><p>16.2.1.1. Conduta típica</p><p>A conduta típica consiste em opor-se o particular à execução de ato legal mediante o</p><p>emprego de violência ou ameaça.</p><p>Para grande parte da doutrina, a violência e a ameaça devem ser dirigidas à pessoa do</p><p>funcionário, e não contra coisas, por exemplo, quebrar os vidros da viatura policial. Poderá o</p><p>agente, nesse caso, responder pelo crime de dano qualificado.</p><p>A oposição pode também se dar mediante o emprego de ameaça, a qual pode ser real,</p><p>por exemplo, apontar uma faca para o funcionário público ou uma arma de fogo, ainda que des-</p><p>municiada; ou verbal, por exemplo, indivíduo que promete ao policial, que, se ele for preso, man-</p><p>dará seus comparsas eliminá-lo.</p><p>16.2.1.2. Consumação e tentativa</p><p>Consuma-se com o emprego da violência ou ameaça contra o funcionário.</p><p>Tratando-se de crime formal, não se exige que o agente efetivamente impeça a execução</p><p>do ato legal.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>107</p><p>É perfeitamente possível a tentativa. Por exemplo: agente é impedido por terceiros de</p><p>desferir uma paulada no funcionário público. Ressalve-se que, no caso de ameaça, somente</p><p>haverá a tentativa se ela for realizada por escrito.</p><p>16.2.2. Desobediência (art. 330 do CP)</p><p>16.2.2.1. Conduta típica</p><p>O delito de desobediência em muito se parece com o de resistência, uma vez que em</p><p>ambos o sujeito ativo pretende subtrair-se à execução de ato legal; contudo, no crime de deso-</p><p>bediência, não ocorre o emprego de violência ou ameaça contra funcionário público.</p><p>O núcleo do tipo está consubstanciado no verbo desobedecer, desatender, não aceitar,</p><p>não se submeter, no caso, à ordem legal de funcionário público.</p><p>Para que exista o crime de desobediência é necessário que haja ordem legal emanada</p><p>de funcionário público competente. Não se cuida aqui de pedido ou solicitação, por exemplo, de</p><p>promotor de justiça que, mediante ofício, solicita documentos.</p><p>16.2.2.2. Consumação e tentativa</p><p>Trata-se de delito formal (aquele que não exige resultado naturalístico, consistente na</p><p>ocorrência de algum prejuízo efetivo para a administração por conta do não cumprimento da</p><p>ordem).</p><p>A tentativa somente é possível na forma comissiva do descumprimento da ordem legal.</p><p>16.2.3. Desacato (art. 331 do CP)</p><p>16.2.3.1. Conduta típica</p><p>O desacato consiste na prática de qualquer ato ou emprego de palavras que causem ve-</p><p>xame, humilhação, falta de respeito ao funcionário público.</p><p>Pode implicar qualquer tipo de palavra grosseira ou ato ofensivo contra a pessoa que</p><p>exerce função pública, incluindo ameaças e agressões físicas.</p><p>Ex.: cuspir no rosto do oficial de justiça, atirar papéis no promotor de justiça, rogar praga</p><p>contra o funcionário.</p><p>No exercício da função: diz com a ofensa praticada contra funcionário público que esteja</p><p>no desempenho de sua função, isto é, praticando atos de ofício.</p><p>Em razão do exercício da função: nessa hipótese, o funcionário está fora do exercício de</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>108</p><p>sua função, mas a ofensa contra ele irrogada diz respeito a ela.</p><p>16.2.3.2. Consumação e tentativa</p><p>Trata-se</p><p>de crime formal (delito que não exige o resultado naturalístico, consistente no</p><p>efetivo desprestígio da função pública). Consuma-se, portanto, no momento em que os atos</p><p>ofensivos são praticados (vias de fato, lesão corporal, gestos, gritos etc.) ou as palavras ultra-</p><p>jantes irrogadas (calúnia, difamação, injúria) são proferidas contra o funcionário público.</p><p>Como se trata de crime formal, não se exige que o funcionário público se sinta ofendido</p><p>com os atos praticados.</p><p>16.2.4. Corrupção ativa (art. 333 do CP)</p><p>16.2.4.1. Conduta típica</p><p>As ações nucleares do tipo estão consubstanciadas nos verbos:</p><p>Oferecer vantagem indevida, ou seja, propor ou apresentar para que seja aceita.</p><p>Prometer vantagem indevida, isto é, comprometer-se, fazer promessa, garantir a entrega</p><p>de algo ao funcionário.</p><p>Por não se tratar de crime bilateral, prescinde-se da aceitação da vantagem pelo funcio-</p><p>nário público. Caso aceite, o funcionário deverá responder pelo delito de corrupção passiva.</p><p>16.2.4.2. Consumação e tentativa</p><p>Trata-se de crime formal, uma vez que a consumação se dá com a simples oferta ou</p><p>promessa de vantagem indevida por parte do agente ao funcionário público, isto é, independen-</p><p>temente de ele aceitá-la ou recusá-la. Também não é necessário que o funcionário pratique,</p><p>retarde ou omita o ato de ofício de sua competência.</p><p>A tentativa é possível. Ex.: suponha-se a hipótese de que a correspondência contendo a</p><p>oferta de dinheiro não chegue às mãos do funcionário destinatário por ter sido apreendida pela</p><p>polícia.</p><p>16.2.4.3. Causa de aumento de pena (art. 333, par. ún.)</p><p>Eleva-se a pena em 1/3 quando, em razão da promessa ou da vantagem, o funcionário</p><p>público efetivamente atrasa ou não faz o que deveria, ou mesmo pratica o ato, infringindo dever</p><p>funcional. Nessa hipótese, o crime é material, isto é, exige resultado naturalístico.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>109</p><p>16.2.5. Descaminho (art. 334 do CP)</p><p>16.2.5.1. Conduta típica</p><p>Descaminho é a fraude voltada a frustrar, total ou parcialmente, o pagamento de direitos</p><p>de importação ou exportação ou do imposto de consumo sobre mercadorias.</p><p>Em síntese, no descaminho, o agente busca iludir, mediante o emprego de fraude, o pa-</p><p>gamento de direito ou imposto devido em face de entrada e saída de mercadoria não proibida.</p><p>Princípio da insignificância: O STF, baseado no art. 20 da Lei nº 10.522/2002 e na</p><p>Portaria MF nº 75/2012, estabeleceu que o valor que dispensa a cobrança fiscal em juízo é de</p><p>R$ 20.000,00, incidindo, em relação a esse valor, o princípio da insignificância.</p><p>16.2.5.2. Consumação e tentativa</p><p>O descaminho consuma-se com a liberação pela alfândega, sem o pagamento dos im-</p><p>postos inerentes. Consuma-se, ainda, com a entrada e saída da mercadoria do território nacional.</p><p>A tentativa é possível. No caso de exportação, o crime é tentado se a mercadoria não</p><p>chega a sair do País. No caso de importação, se o agente entrar com a mercadoria no País, mas</p><p>for preso na alfândega, o crime já estará consumado.</p><p>16.2.5.3. Figuras equiparadas (art. 334, § 1º)</p><p>Incorre na pena do caput do art. 334 (reclusão, de 1 a 4 anos) quem:</p><p>I – pratica navegação de cabotagem, fora dos casos permitidos em lei;</p><p>II – pratica fato assimilado, em lei especial, a descaminho;</p><p>III – vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito</p><p>próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de proce-</p><p>dência estrangeira que introduziu clandestinamente no País ou importou fraudulentamente</p><p>ou que sabe ser produto de introdução clandestina no território nacional ou de importação</p><p>fraudulenta por parte de outrem;</p><p>IV – adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade</p><p>comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira, desacompanhada de do-</p><p>cumentação legal ou acompanhada de documentos que sabe serem falsos.</p><p>16.2.5.4. Causa de aumento de pena (art. 334, § 3º)</p><p>A pena aplica-se em dobro se o crime de descaminho é praticado em transporte aéreo,</p><p>marítimo ou fluvial.</p><p>16.2.6. Contrabando (art. 334-A do CP)</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>110</p><p>16.2.6.1. Conduta típica</p><p>Contrabando é a clandestina importação ou exportação de mercadorias cuja entrada no</p><p>País, ou saída dele, é absoluta ou relativamente proibida.</p><p>16.2.6.2. Consumação e tentativa</p><p>Na importação ou exportação de mercadorias proibidas com passagem pelos órgãos al-</p><p>fandegários, o crime consuma-se quando transposta a barreira fiscal, mesmo que a mercadoria</p><p>não chegue ao seu destino.</p><p>A tentativa é possível. No caso de exportação, o crime é tentado se a mercadoria não</p><p>chega a sair do País. No caso de importação, se o agente entrar com a mercadoria no País, mas</p><p>for preso na alfândega, o crime já estará consumado.</p><p>16.2.6.3. Figuras equiparadas (art. 334-A, § 1º)</p><p>§1º Incorre na mesma pena quem:</p><p>I – pratica fato assimilado, em lei especial, a contrabando;</p><p>II – importa ou exporta clandestinamente mercadoria que dependa de registro, análise ou</p><p>autorização de órgão público competente;</p><p>III – reinsere no território nacional mercadoria brasileira destinada à exportação;</p><p>IV – vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito</p><p>próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria proibida</p><p>pela lei brasileira;</p><p>V – adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade</p><p>comercial ou industrial, mercadoria proibida pela lei brasileira.</p><p>16.2.6.4. Causa de aumento de pena (art. 334-A, § 3º)</p><p>A pena aplica-se em dobro se o crime de descaminho é praticado em transporte aéreo,</p><p>marítimo ou fluvial.</p><p>17. Dos crimes contra a Administração da Justiça</p><p>17.1. Denunciação caluniosa (art. 339 do CP)</p><p>17.1.1. Conduta típica</p><p>Trata-se da conduta do agente que dá causa à instauração de inquérito policial, de proce-</p><p>dimento investigatório criminal, de processo judicial, de processo administrativo disciplinar, de</p><p>inquérito civil ou de ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime,</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>111</p><p>infração ético-disciplinar ou ato ímprobo de que o sabe inocente.</p><p>O elemento do tipo “alguém” indica, nitidamente, tratar-se de pessoa certa, não se po-</p><p>dendo cometer o delito ao indicar para a autoridade policial apenas a materialidade do crime e</p><p>as várias possibilidades de suspeitos.</p><p>17.1.2. Elemento subjetivo</p><p>É o dolo, consistente na vontade livre e consciente de dar causa à instauração de inves-</p><p>tigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa contra alguém,</p><p>imputando-lhe crime.</p><p>É imprescindível que o denunciante saiba (dolo direto) que o denunciado é inocente, con-</p><p>forme expressa exigência legal contida na expressão “de que o sabe inocente”. Sem ele, não há</p><p>crime. A dúvida (dolo eventual) afasta a tipicidade do delito.</p><p>17.1.3. Consumação</p><p>Trata-se de crime formal, ou seja, delito que não exige, para sua consumação, resultado</p><p>naturalístico, consistente no efetivo prejuízo para a administração da justiça.</p><p>Consuma-se, portanto, com a instauração de investigação policial, de processo judicial,</p><p>de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra al-</p><p>guém.</p><p>Não se exige que a autoridade policial, formalmente, instaure o inquérito policial para que</p><p>se consume o crime. Basta que inicie investigação policial no sentido de coletar dados que apu-</p><p>rem a veracidade da denúncia.</p><p>17.2. Comunicação falsa de crime ou de contravenção (art. 340 do CP)</p><p>17.2.1. Conduta típica</p><p>Consubstancia-se no verbo provocar, isto é, dar causa à ação da autoridade pública (de-</p><p>legado de polícia, juiz, promotor de justiça, bem como todas as autoridades administrativas que</p><p>tenham atribuição legal para iniciar investigações).</p><p>Na hipótese, o agente comunica</p><p>à autoridade a prática de crime ou contravenção penal</p><p>que não se verificou.</p><p>Ao contrário do que ocorre no crime de denunciação caluniosa, não há no delito em estudo</p><p>a imputação a uma pessoa determinada da prática de crime. Se assim suceder, estará</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>112</p><p>caracterizado o crime de denunciação caluniosa.</p><p>17.2.2. Consumação e tentativa</p><p>É crime formal, que não exige, para sua consumação, resultado naturalístico.</p><p>Consuma-se, portanto, o crime no momento em que a autoridade pratica alguma ação no</p><p>sentido de elucidar o fato criminoso. Semelhantemente ao crime de denunciação caluniosa, não</p><p>se exige a efetiva instauração de inquérito policial.</p><p>É possível a tentativa. Desse modo, se o agente fizer a comunicação falsa à autoridade,</p><p>e esta não iniciar as investigações por circunstâncias alheias à vontade dele, haverá tentativa.</p><p>17.3. Falso testemunho ou falsa perícia (art. 342 do CP)</p><p>17.3.1. Conduta típica</p><p>Trata-se de crime de ação múltipla, pois três são as ações típicas:</p><p>1) “Fazer afirmação falsa”. Segundo a doutrina, cuida-se aqui da falsidade positiva,</p><p>pois o agente declara a ocorrência de fato inverídico.</p><p>Ex.: testemunha que, para forjar um álibi em favor do acusado, afirma falsamente</p><p>que, no momento do crime, ele estava em sua companhia.</p><p>2) “Negar a verdade”. Essa modalidade constitui a chamada falsidade negativa, pois</p><p>o agente tem ciência da verdade, mas nega o que sabe.</p><p>Ex.: testemunha de acusação que nega falsamente que a vítima de homicídio tenha</p><p>anteriormente tentado estuprar a filha do acusado.</p><p>3) “Calar a verdade”. É, segundo a doutrina, a chamada reticência. Aqui há o silêncio</p><p>a respeito do que se sabe ou se recusa em manifestar a ciência que se tem dos</p><p>fatos. Há, assim, resistência por parte do agente em declarar a verdade. Não há,</p><p>ao contrário das demais modalidades, qualquer afirmação falsa ou negativa.</p><p>Ex.: perito que omite dados relevantes ao elaborar o laudo pericial, de forma a criar</p><p>prova benéfica ao acusado.</p><p>17.3.2. Sujeitos do delito</p><p>Trata-se de crime de mão própria (de atuação pessoal ou de conduta infungível). Nesse</p><p>passo, somente pode ser cometido pelo sujeito em pessoa.</p><p>São sujeitos ativos desse delito a testemunha, o perito, o tradutor ou o intérprete. A Lei nº</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>113</p><p>10.268/2001 acrescentou um novo sujeito ativo, não previsto na antiga redação do dispositivo,</p><p>qual seja, o contador que atue em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial ou em</p><p>juízo arbitral.</p><p>Se a testemunha não assina o compromisso de dizer a verdade, não pode praticar o delito</p><p>em tela. Portanto, é indispensável que seja reconhecida como testemunha, e não como simples</p><p>declarante ou informante, pessoas estas que não narram seu entendimento sobre algo sem o</p><p>compromisso de dizer a verdade.</p><p>17.3.3. Consumação e tentativa</p><p>É crime formal, não exigindo, portanto, para a sua consumação, resultado naturalístico.</p><p>Consuma-se o falso testemunho com o encerramento do depoimento. Em tese, o crime</p><p>consuma-se no momento em que é proferido o falso; contudo, como o depoente pode retificar o</p><p>que foi declarado até o encerramento do depoimento, entende-se consumado o crime nesse</p><p>exato instante.</p><p>17.3.4. Retratação (art. 342, § 2º)</p><p>No caso, o agente, antes da sentença no processo em que ocorreu o falso testemunho,</p><p>declara a verdade.</p><p>Na realidade, o crime já se consumou no momento em que o depoimento foi encerrado,</p><p>contudo, a lei faculta ao agente o direito de arrepender-se antes da prolação da sentença de</p><p>primeiro grau, possibilitando com isso o esclarecimento da verdade dos fatos e, consequente-</p><p>mente, a extinção da punibilidade.</p><p>Trata-se, portanto, de condição resolutiva da punibilidade. Embora já consumado o crime,</p><p>a punição depende, ainda, de o agente não se retratar ou declarar a verdade, oportunamente.</p><p>17.4. Favorecimento pessoal (art. 348 do CP)</p><p>17.4.1. Conduta típica</p><p>Comete este delito o agente que presta auxílio, de qualquer natureza, a quem acaba de</p><p>cometer um crime, com a finalidade de subtraí-lo à ação da autoridade, prejudicando a ação de</p><p>autoridade pública (policiais civis ou militares, membros do Judiciário).</p><p>O favorecimento pessoal é delito acessório, ficando sua tipificação na dependência da</p><p>existência de um crime antecedente, que pode ser de qualquer natureza (doloso, culposo,</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>114</p><p>tentado ou consumado etc.).</p><p>Não incidirá o crime de favorecimento pessoal quando em relação ao fato anterior: a)</p><p>houver causa excludente de ilicitude; b) já estiver extinta a punibilidade; c) houver escusa abso-</p><p>lutória.</p><p>Se o agente autor do crime antecedente vier a ser absolvido por qualquer motivo (salvo</p><p>na hipótese de absolvição imprópria, em que é aplicada medida de segurança), o sujeito que o</p><p>auxiliou não poderá ser condenado pelo crime de favorecimento pessoal.</p><p>17.4.2. Consumação e tentativa</p><p>O crime consuma-se no momento em que, prestado o efetivo auxílio, o agente favorecido</p><p>obtém êxito em sua ocultação, ainda que momentaneamente. Trata-se, pois, de crime material.</p><p>É possível a tentativa, por exemplo, quando o auxílio chega a ser prestado, mas o agente</p><p>beneficiário não se livra da autoridade.</p><p>17.4.3. Escusa absolutória (art. 348, § 2º)</p><p>Se quem presta o auxílio é ascendente, descendente, cônjuge ou irmão do criminoso, fica</p><p>isento de pena.</p><p>17.5. Favorecimento real (art. 349 do CP)</p><p>17.5.1. Conduta típica</p><p>O presente dispositivo visa a tutelar a administração da justiça, no sentido de punir o com-</p><p>portamento daquele que auxilia o criminoso a tornar seguro o proveito do crime.</p><p>Comete este delito o agente que prestar a criminoso, fora dos casos de coautoria ou de</p><p>receptação, auxílio destinado a tornar seguro o proveito do crime.</p><p>Assim como o delito anterior, o favorecimento real também é delito acessório, ficando sua</p><p>tipificação na dependência da existência de um crime antecedente, que pode ser de qualquer</p><p>natureza (doloso, culposo, tentado ou consumado etc.).</p><p>Para a incidência deste delito, o auxílio deve ser destinado a tornar seguro o proveito do</p><p>crime, referindo-se a qualquer vantagem alcançada com a prática do delito principal, podendo</p><p>abranger:</p><p>a) o objeto material do crime, como o próprio bem subtraído;</p><p>b) o preço do crime, por exemplo, dinheiro que o homicida ganhou para matar alguém.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>115</p><p>Não incide o delito se o agente desconhece a procedência criminosa do bem.</p><p>Se autor do crime antecedente for menor de idade ou já estiver extinta a sua punibilidade,</p><p>pela prescrição, por exemplo, continua sendo possível o favorecimento real, pois o objeto conti-</p><p>nua sendo produto de crime. A menoridade e a extinção da punibilidade apenas impedem a</p><p>aplicação de sanção penal ao autor do crime antecedente.</p><p>Somente haverá o crime de favorecimento real se o agente não estava previamente ajus-</p><p>tado com os autores do delito antecedente. Se houve prévio ajuste, o agente responderá pelo</p><p>mesmo delito, em concurso de pessoas.</p><p>17.5.2. Consumação e tentativa</p><p>O crime consuma-se no momento em que o agente presta auxílio, independentemente de</p><p>saber se o agente conseguiu ou não tornar seguro o proveito do crime anterior. Trata-se, pois,</p><p>de crime formal.</p><p>É possível a tentativa.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>116</p><p>ção de agir para evitar o resultado não decorre de lei, mas do fato de o agente ter assumido a</p><p>responsabilidade de impedi-lo. Ex.: babá que, por negligência, deixa de cumprir corretamente</p><p>sua obrigação de cuidar da criança, que acaba caindo na piscina e, por isso, morre afogada.</p><p>Nesse caso, responderá pelo resultado gerado, qual seja, homicídio culposo. Se, de outro lado,</p><p>desejou a morte da criança ou assumiu o risco de produzi-la, responderá por homicídio doloso.</p><p>c) Com o comportamento anterior, criar o risco da ocorrência do resultado: nesta</p><p>hipótese, o sujeito, com o comportamento anterior, cria situação de perigo para bens jurídicos</p><p>alheios penalmente tutelados, de sorte que, tendo criado o risco, fica obrigado a evitar que ele</p><p>se degenere ou desenvolva para o dano ou lesão. Ex.: aluno veterano, por ocasião de um trote</p><p>acadêmico, sabendo que a vítima não sabe nadar, joga o incauto calouro na piscina. Nesse caso,</p><p>contrai o dever jurídico de agir para evitar o resultado, sob pena de responder por homicídio.</p><p>2.3. Iter criminis e tentativa (art. 14 do CP)</p><p>2.3.1. Iter criminis</p><p>O primeiro momento do iter criminis é a cogitação. O agente idealiza, internamente, a</p><p>atividade criminosa. É exatamente por isso que a fase da cogitação não é punível.</p><p>Nos atos preparatórios, é a partir dos atos preparatórios que o agente começa a materi-</p><p>alizar, ou seja, exteriorizar sua busca pela consumação da infração penal. A aquisição de uma</p><p>arma, por exemplo, para a prática do homicídio constitui ato preparatório. Da mesma forma, o</p><p>estudo do local do crime, buscando identificar a melhor hora e forma de ingressar no ambiente,</p><p>constitui ato preparatório do crime de furto.</p><p>Os atos preparatórios, via de regra, não são puníveis, nem na forma tentada, uma vez</p><p>que, nos termos do art. 14, II, do CP, afigura-se necessário o início da execução do delito, com</p><p>a realização da conduta nuclear descrita no tipo penal.</p><p>Todavia, em casos excepcionais, o legislador descreve atos que na sua concepção seriam</p><p>preparatórios como delitos autônomos, por exemplo, os crimes de associação criminosa (art. 288</p><p>do CP) e petrechos para falsificação de moedas (art. 291 do CP).</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>14</p><p>Nos atos executórios, o agente passa a desenvolver conduta voltada a realizar o verbo</p><p>nuclear do tipo. A partir dos atos executórios, o fato passa a ser punível, ao menos na forma</p><p>tentada. Isso porque o próprio art. 14, II, do CP atrelou a tentativa ao início da execução do crime,</p><p>condicionando, pois, sua punibilidade ao início da prática de atos executórios.</p><p>A consumação é o momento de conclusão do delito, reunindo todos os elementos do tipo</p><p>penal.</p><p>Atenção: o exaurimento não integra o iter criminis, que encerra com a consumação. O</p><p>crime exaurido, também chamado de esgotado, é aquele no qual, após ser alcançada a consu-</p><p>mação, continua produzindo efeitos decorrentes da conduta lesiva do agente. Ex.: a consumação</p><p>do crime de corrupção passiva (art. 317 do CP) ocorre com a solicitação da vantagem indevida.</p><p>O efetivo proveito ulterior com o recebimento dessa vantagem não integra o iter criminis, consti-</p><p>tuindo-se no exaurimento do crime.</p><p>2.3.2. Tentativa (art. 14, II, do CP)</p><p>Nos termos do art. 14, II, do CP, para caracterizar ao menos crime tentado, deve o agente</p><p>passar pelos atos preparatórios e dar início à execução do delito, que, por razões alheias à</p><p>sua vontade, não alcance a consumação.</p><p>Algumas infrações que não admitem a tentativa:</p><p>a) Crimes culposos: no crime culposo, o agente não deseja nem assume o risco na</p><p>produção do resultado. Na tentativa, o agente deseja ou assume o risco na produção do resul-</p><p>tado, que, no entanto, não ocorre por circunstâncias alheias à sua vontade. Logo, verifica-se a</p><p>absoluta incompatibilidade entre o crime culposo e a tentativa.</p><p>Há, no entanto, uma classe de crimes culposos que admitem a tentativa: culpa imprópria.</p><p>b) Crimes preterdolosos: nos crimes preterdolosos, a conduta é desenvolvida de forma</p><p>dolosa, mas o resultado agravador é culposo. Assim, como no crime preterdoloso o resultado</p><p>agravador não é desejado pelo agente, não há que se falar em tentativa, que pressupõe a não</p><p>consumação do delito por circunstâncias alheias à sua vontade.</p><p>c) Contravenções penais: nos termos do art. 4° do Decreto-lei nº 3.688/1941, “não é</p><p>punível a tentativa de contravenção”.</p><p>d) Crimes omissivos próprios: os crimes omissivos próprios não admitem tentativa, por-</p><p>que não se afigura possível fracionar a conduta omissiva do agente. Isso porque ou o agente</p><p>observa o seu dever de agir implícito no tipo penal, e o crime se consuma; ou pratica a conduta,</p><p>e não há crime.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>15</p><p>Os crimes omissivos impróprios admitem tentativa.</p><p>e) Crimes unissubsistentes: os crimes unissubsistentes ou de ato único não admitem</p><p>tentativa, diante da impossibilidade de fracionamento dos atos de execução. Ou seja, não é pos-</p><p>sível dar início à execução do delito e não atingir a consumação por circunstâncias alheias à</p><p>vontade do agente.</p><p>2.4. Desistência voluntária e arrependimento eficaz (art. 15 do CP)</p><p>Na desistência voluntária e no arrependimento eficaz, o agente dá início à execução do</p><p>delito, mas não consuma por vontade própria, ou porque desistiu de prosseguir nos atos execu-</p><p>tórios, ou porque se arrependeu eficazmente.</p><p>2.4.1. Desistência voluntária</p><p>A desistência voluntária caracteriza-se por um comportamento negativo do agente, que,</p><p>após dar início à execução do delito, adota uma postura de abstenção, ou seja, cessa o seu</p><p>comportamento delitivo, não leva adiante a atividade executória; mesmo podendo prosse-</p><p>guir, desiste da realização típica.</p><p>Tomemos como exemplo a conduta do agente que, com a intenção homicida, desfere um</p><p>disparo de arma de fogo contra a vítima, acertando-a em região não letal. Podendo prosseguir,</p><p>já que tinha mais cinco balas no revólver, o agente resolve, por vontade própria, não efetuar mais</p><p>disparos, deixando a vítima sobreviver.</p><p>2.4.2. Arrependimento eficaz</p><p>No arrependimento eficaz, o agente, após ter esgotado todos os meios à sua disposição</p><p>para a consumação do delito, arrepende-se e, adotando uma postura ativa, impede que o resul-</p><p>tado se produza.</p><p>Exemplo: agente que, com a intenção homicida, após efetuar disparos de arma de fogo</p><p>contra a vítima, utilizando todas as balas do revólver, arrepende-se e, adotando postura ativa,</p><p>leva a vítima até o hospital, que, submetida a intervenção cirúrgica exitosa, acaba sobrevivendo.</p><p>2.4.3. Consequência</p><p>Nos termos da parte final do art. 15 do CP, verificada hipótese de desistência voluntária</p><p>ou arrependimento eficaz, o agente jamais responderá pelo crime na modalidade tentada, já que,</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>16</p><p>como visto, trata-se de causa excludente da tipicidade da tentativa, mas pelos atos até então</p><p>praticados, se típicos.</p><p>Assim, o agente que ingressa numa residência e, por ato voluntário, desiste de consumar</p><p>a subtração, não responderá por tentativa de furto, mas pelos atos até então praticados, quais</p><p>sejam, violação de domicílio (art. 150 do CP).</p><p>2.5. Arrependimento posterior (art. 16 do CP)</p><p>Trata-se de causa obrigatória de diminuição da pena que incide quando o agente, res-</p><p>ponsável pelo crime praticado sem violência ou grave ameaça à pessoa, repara o dano provo-</p><p>cado ou restitui a coisa, desde que de forma voluntária, até o recebimento da denúncia ou da</p><p>queixa.</p><p>Assim, se o agente subtraiu uma TV do seu local de trabalho e, ao chegar em casa com</p><p>a coisa subtraída, é convencido pela esposa a devolvê-la, o que efetivamente vem a fazer no dia</p><p>seguinte, mesmo quando o fato já havia sido registrado na delegacia, haverá arrependimento</p><p>posterior, com reflexo na dosimetria da pena.</p><p>2.6. Crime impossível (art. 17 do CP)</p><p>O crime impossível por ineficácia absoluta do meio guarda relação com</p><p>o meio de</p><p>execução ou instrumento utilizado pelo agente, que, por sua natureza, será incapaz de produzir</p><p>qualquer resultado, ou seja, jamais alcançará a consumação do delito. É o caso do agente que,</p><p>pretendendo matar a vítima, usa como meio executório arma completamente defeituosa, que</p><p>jamais efetuaria qualquer disparo.</p><p>O crime impossível pela impropriedade absoluta do objeto guarda relação com o ob-</p><p>jeto material, compreendendo a pessoa ou coisa sobre o qual recai a conduta do agente. Tome-</p><p>mos como exemplo a conduta do agente que, pretendendo matar a vítima, desfere vários dispa-</p><p>ros de arma de fogo contra o seu corpo, verificando-se, após, que, ao receber os disparos, já se</p><p>encontrava morta, em decorrência de ter sofrido, momentos antes, fulminante ataque cardíaco.</p><p>Evidente, neste caso, a impropriedade absoluta do objeto, diante da impossibilidade de ceifar a</p><p>vida de pessoa que já estava morta.</p><p>2.7. Crime doloso e culposo (art. 18 do CP)</p><p>2.7.1. Crime doloso</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>17</p><p>Com o sistema finalista, o dolo passou a integrar a conduta, elemento do fato típico. Trata-</p><p>se de um elemento psicológico introduzido no tipo penal, característico do crime doloso.</p><p>a) Dolo direto: também chamado dolo determinado, intencional, imediato ou incondicio-</p><p>nado, é aquele que se caracteriza pela vontade do agente estar dirigida especificamente à pro-</p><p>dução do resultado típico, abrangendo os meios utilizados para tanto. No dolo direto, o agente</p><p>quer o resultado por ele anteriormente representado. Adota-se a teoria da vontade.</p><p>b) Dolo eventual: em relação ao dolo eventual, adota-se a teoria do consentimento ou</p><p>assentimento, inserta na expressão “assumiu o risco de produzi-lo”, encartada no art. 18, I, do</p><p>CP. Tomemos como exemplo a conduta do agente que pretende atirar contra o seu desafeto,</p><p>que se encontra conversando com outra pessoa. O agente prevê que também pode atingir a</p><p>outra pessoa, mas segue em diante na sua conduta, assumindo o risco de errar o disparo contra</p><p>o seu desafeto e atingir a outra pessoa, sendo-lhe indiferente quanto ao resultado que possa a</p><p>vir a ser produzido em relação ao terceiro. Se efetuar disparos matando o seu desafeto e também</p><p>a outra pessoa, o agente responderá por dois crimes de homicídio: o primeiro, a título de dolo</p><p>direto; o segundo, a título de dolo eventual.</p><p>2.7.2. Teoria do crime culposo</p><p>É a conduta humana voluntária desenvolvida sem observar o dever de cuidado objetivo,</p><p>que, por imprudência, negligência ou imperícia, produz um resultado involuntário, objetivamente</p><p>previsível, que poderia ter sido evitado.</p><p>A inobservância do dever objetivo de cuidado, que é a quebra do dever de cuidado im-</p><p>posto a todos, é manifestada por meio de três modalidades de culpa, todas previstas no art. 18,</p><p>II, do CP: imprudência, negligência e imperícia.</p><p>1) Imprudência: a conduta imprudente caracteriza-se por um agir positivo, sem a ob-</p><p>servância do dever de cuidado objetivo. Ocorre quando o agente pratica fato peri-</p><p>goso, de forma intempestiva e precipitada. Tomemos como exemplo condutor de</p><p>veículo automotor que, imprimindo excessiva velocidade, atropela e mata um pe-</p><p>destre.</p><p>2) Negligência: trata-se de modalidade negativa de culpa, em que a inobservância</p><p>do dever de cuidado do agente é retratada pela ausência de cautela e precaução.</p><p>É a culpa na forma de deixar de adotar as cautelas. Tomemos como exemplo o</p><p>condutor de veículo que, antes de sair de viagem, deixa de reparar os pneus e</p><p>verificar os freios.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>18</p><p>3) Imperícia: a imperícia caracteriza-se pela falta de capacidade, preparo ou de co-</p><p>nhecimentos técnicos suficientes de agente autorizado a desempenhar determi-</p><p>nada arte, profissão ou ofício. Assim, se um médico cirurgião, que não domina de-</p><p>terminada técnica inerente à certa intervenção cirúrgica, causar a morte do paci-</p><p>ente, responderá por homicídio culposo (art. 121, § 3°, do CP), já que agiu com</p><p>imperícia no exercício da sua profissão.</p><p>Na culpa consciente há a previsão do resultado, mas o agente realiza a conduta consi-</p><p>derando, sinceramente, que nenhum resultado se produzirá ou, ainda, que reúne habilidade su-</p><p>ficiente para evitá-lo. É a chamada culpa com previsão. Ex.: Leonardo conduz seu veículo por</p><p>uma avenida. No banco do carona está sua namorada, Célia. Durante o percurso, Leonardo</p><p>imprime velocidade excessiva no veículo, gerando protestos por parte de Célia, que lhe pedia</p><p>para reduzir a velocidade. Leonardo responde dizendo que nada aconteceria, até porque era um</p><p>excelente motorista. Todavia, ao fazer uma curva, Leonardo perde o controle do veículo e atro-</p><p>pela uma pessoa, causando-lhe a morte. Diante disso, Leonardo responderá pelo crime de ho-</p><p>micídio culposo na condução de veículo automotor (art. 302 da Lei nº 9.503/1997). Note-se que,</p><p>no caso, havia por parte do motorista a previsibilidade do resultado, que não era aceito nem</p><p>esperado e, ainda, a leviana percepção de que sua habilidade como condutor impediria a produ-</p><p>ção de qualquer evento lesivo.</p><p>2.8. Erro de tipo essencial e erro de proibição</p><p>2.8.1. Erro de tipo essencial</p><p>O erro de tipo essencial pode ser:</p><p>a) Invencível, inevitável, escusável: é aquele erro em que qualquer pessoa, nas mes-</p><p>mas circunstâncias, incorreria. É o erro inevitável, desculpável ou escusável, que não poderia</p><p>ser evitado, mesmo por uma pessoa cautelosa e prudente.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>19</p><p>Tomemos como exemplo a conduta de uma estudante que deixa seu celular carregando</p><p>na tomada da sala de aula e sai para comprar café na cantina do local. Quando retorna, retira</p><p>um celular da tomada que, na verdade, não era o seu aparelho, mas de sua colega, que havia</p><p>colocado um celular idêntico para carregar em substituição ao da estudante. Nesse caso, há</p><p>evidente erro de tipo, pois a estudante, por conta da falsa percepção da realidade (supôs ser seu</p><p>o celular, já que idêntico), errou em relação ao elemento “alheio” do tipo que define o crime de</p><p>furto. E, trata-se de erro de tipo invencível, porque qualquer pessoa, nas circunstâncias, consi-</p><p>deraria que era o seu telefone celular que estava carregando na tomada em que havia deixado.</p><p>O erro de tipo invencível, inevitável ou escusável exclui o dolo e a culpa. Sendo a conduta</p><p>elemento do fato típico, a ausência de dolo ou culpa leva à atipicidade da conduta.</p><p>b) Vencível, evitável ou inescusável: é aquele erro em que uma pessoa mais cautelosa</p><p>e prudente, nas mesmas circunstâncias, não incorreria. É o erro evitável, indesculpável ou ines-</p><p>cusável, que uma pessoa cautelosa e prudente teria evitado. Assim, se o fato for punido sob a</p><p>forma culposa, o agente responderá por crime culposo. Quando o tipo, entretanto, não admitir</p><p>essa modalidade, a consequência será inexoravelmente a exclusão do crime, já que configurará</p><p>fato atípico.</p><p>No exemplo do caçador que praticava a caça em mata próxima à zona urbana, onde havia</p><p>circulação de pessoas, o agente responderá pelo crime de homicídio culposo, já que se trata de</p><p>erro de tipo vencível.</p><p>2.8.2. Do erro de proibição (art. 21 do CP)</p><p>O erro de proibição é o erro que incide sobre a ilicitude do fato. Encontra-se discipli-</p><p>nado no art. 21 do CP.</p><p>No erro de proibição, o agente tem consciência da conduta praticada, mas lhe falta poten-</p><p>cial consciência da ilicitude do fato.</p><p>O erro de proibição pode ser:</p><p>a) erro de proibição escusável, inevitável ou invencível: ocorre quando o erro sobre a</p><p>ilicitude do fato é impossível de ser evitado, valendo-se o ser humano da sua diligência ordinária.</p><p>Ex.: um telejornal de alcance nacional informa, de forma equivocada, a aprovação da lei que</p><p>autoriza a eutanásia de doentes em estágio terminal. Não havendo nenhuma razão para duvidar</p><p>da veracidade da notícia, o agente dirige-se até o hospital e desliga os aparelhos que mantinham</p><p>vivo um ente querido, que se</p><p>encontrava sofrendo com a doença que o acometia e em estágio</p><p>terminal, causando-lhe a morte. Praticou fato típico e ilícito, mas lhe faltou potencial consciência</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>20</p><p>da ilicitude, incidindo o erro de proibição inevitável, cuja consequência será a exclusão da culpa-</p><p>bilidade.</p><p>b) erro de proibição inescusável ou evitável: ocorre quando o erro sobre a ilicitude do</p><p>fato que não se justifica, pois, se tivesse havido um mínimo de empenho em se informar, o agente</p><p>poderia ter tido conhecimento da realidade. O critério de aferição do erro de proibição inescusá-</p><p>vel, vencível ou evitável encontra-se no parágrafo único do art. 21 do CP, segundo o qual “con-</p><p>sidera-se evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato,</p><p>quando lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa consciência”. Tratando-se de erro</p><p>de proibição evitável, permanece hígida a culpabilidade do agente, sendo, no entanto, causa</p><p>de diminuição da pena de um sexto a um terço.</p><p>2.9. Erro de tipo acidental</p><p>2.9.1. Erro quanto à pessoa (art. 20, § 3°, do CP)</p><p>O erro sobre pessoa, previsto no art. 20, § 3°, do CP, incide quando o agente desenvolve</p><p>conduta voltada a atingir a pessoa pretendida, mas, confundindo-se em relação à sua identidade,</p><p>atinge pessoa diversa.</p><p>Consideremos, por exemplo, a hipótese do filho desalmado que, pretendendo matar seu</p><p>pai, realiza disparos de arma de fogo contra o homem que estava na varanda da residência do</p><p>genitor, causando a morte deste. O filho, então, deixa o local satisfeito, por acreditar ter concluído</p><p>seu intento delitivo, mas vem a descobrir que matara um amigo de seu pai, que contava com 65</p><p>anos de idade, que, de costas, era com ele parecido.</p><p>Nesse caso, nos termos do art. 20, § 3°, do CP, consideram-se as condições e qualidades</p><p>da vítima pretendida. Logo, o filho desalmado responderá pelo crime de homicídio, com a inci-</p><p>dência da agravante de ter praticado crime contra ascendente, prevista no art. 61, II, e, 1ª parte,</p><p>do CP.</p><p>2.9.2. Erro na execução ou aberratio ictus (art. 73 do CP)</p><p>A aberratio ictus pode ocorrer quando, por acidente, o agente, em vez de atingir a pessoa</p><p>pretendida, atinge pessoa diversa. Suponhamos, nesse caso, que o agente pretende matar Wil-</p><p>son, deixando na sua mesa de trabalho uma xícara de café contendo veneno. Todavia, quem</p><p>toma o café é Pedro, que acaba falecendo.</p><p>Pode ocorrer também quando, por erro nos meios de execução, o agente, em vez de</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>21</p><p>atingir a pessoa pretendida, atinge pessoa diversa. Ex.: agente pretendendo matar Wilson, visu-</p><p>aliza a vítima, tendo-a como certa, faz a mira e efetua o disparo, mas, no entanto, erra o alvo</p><p>pretendido, atingindo pessoa diversa, que se encontrava próxima ao local.</p><p>A consequência jurídica da conduta do agente encontra-se retratada no art. 73, 1ª parte,</p><p>do CP, que faz expressa remissão ao art. 20, § 3°, do CP. Ou seja, na hipótese de erro na exe-</p><p>cução, deve-se observar o disposto no art. 20, § 3°, segundo o qual, embora tenha atingido pes-</p><p>soa diversa, o agente deve receber tratamento penal considerando-se as condições ou qualida-</p><p>des da pessoa pretendida (vítima virtual), desprezando-se as condições pessoais da vítima efe-</p><p>tivamente atingida.</p><p>Na aberratio ictus com resultado duplo, o agente, além de atingir a vítima pretendida,</p><p>atinge também pessoa diversa. Nesse caso, com uma única ação, o agente produz mais de um</p><p>resultado: atinge a pessoa pretendida e também pessoa diversa. Por essa razão, o art. 73, 2ª</p><p>parte, do CP faz expressa remissão ao art. 70 do CP, devendo ser aplicada a regra do concurso</p><p>formal de crimes.</p><p>2.9.3. Resultado diverso do pretendido ou aberratio criminis (art. 74 do</p><p>CP)</p><p>Na aberratio criminis, o agente pretende ofender determinado bem jurídico, mas, por aci-</p><p>dente ou erro na execução, acaba produzindo resultado diverso do pretendido. Na verdade, o</p><p>agente pretendia praticar um crime, mas acaba praticando crime diverso do pretendido.</p><p>Na aberratio criminis com unidade simples, o agente somente atinge o bem jurídico di-</p><p>verso do pretendido. Ou seja, o agente quer atingir uma coisa e atinge uma pessoa. Nesse caso,</p><p>o agente responde pelo resultado produzido a título de culpa, se o fato é previsto como crime</p><p>culposo.</p><p>Assim, se o agente, pretendendo atingir o veículo do desafeto, com o intuito de praticar o</p><p>crime dano, por erro na execução, não atingir o objeto, mas somente uma pessoa que se encon-</p><p>trava próxima ao local, responderá por lesão corporal culposa (art. 129, § 6°, do CP), se resultar</p><p>lesão corporal; ou por homicídio culposo (art. 121, § 3º, do CP), se resultar morte.</p><p>Na aberratio criminis com resultado duplo, o agente, além de praticar o crime pretendido,</p><p>também acaba produzindo um resultado diverso do pretendido. Ou seja, com uma ação ou omis-</p><p>são, acaba provocando dois resultados. Nesse caso, como expressamente prevê a parte final do</p><p>art. 74 do CP, aplica-se a regra do concurso formal de crimes (art. 70 do CP), considerando-se</p><p>a pena do crime mais grave aumentada de um sexto até metade, de acordo com o número de</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>22</p><p>resultados diversos produzidos.</p><p>2.10. Descriminante putativa</p><p>2.10.1. Conceito</p><p>É a causa excludente da ilicitude erroneamente imaginada pelo agente. Só existe, por-</p><p>tanto, na mente, na imaginação do agente. Por essa razão, é também conhecida como descri-</p><p>minante imaginária ou erroneamente suposta.</p><p>Logo, o sujeito, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias do caso concreto,</p><p>supõe estar diante de uma situação de estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumpri-</p><p>mento do dever legal ou em exercício regular do direito. Quando isso ocorre, aplica-se o disposto</p><p>no art. 20, § 1º, 1ª parte do CP.</p><p>2.10.2. Espécies</p><p>a) Descriminante putativa por erro de tipo: trata-se, na verdade, de erro de tipo permis-</p><p>sivo, uma vez que o agente, erroneamente, imagina estar diante de uma situação de perigo</p><p>inexistente, ou de uma agressão injusta inexistente, mas que, se existisse, tornaria sua ação</p><p>legítima.</p><p>Assim, por exemplo, se o agente praticar uma conduta supondo estar diante de uma</p><p>agressão injusta, mas que, na verdade, não existe, trata-se de legítima defesa putativa. Se o</p><p>agente pratica uma conduta supondo estar numa situação de perigo, que, na verdade, não existe,</p><p>trata-se de estado de necessidade putativo.</p><p>Os efeitos são os mesmos do erro de tipo, já que a descriminante putativa por erro de</p><p>tipo não é outra coisa senão erro de tipo essencial incidente sobre tipo permissivo.</p><p>Assim, cuidando-se de erro invencível, há exclusão do dolo e culpa. Tratando-se de erro</p><p>vencível, responde o sujeito por crime culposo, se prevista a modalidade culposa. Provando-se</p><p>que o sujeito não foi diligente ao se verificar as circunstâncias do fato, responde por crime de</p><p>homicídio culposo (art. 20, § 1°, do CP).</p><p>b) Descriminante putativa por erro de proibição: o agente tem perfeita noção de tudo</p><p>o que está ocorrendo. Não há qualquer engano acerca da realidade. Não há erro sobre a situação</p><p>de fato. Ele supõe que está diante da causa que exclui o crime, porque avalia equivocadamente</p><p>a norma: pensa que esta permite, quando, na verdade, ela proíbe; imagina que age certo, quando</p><p>está errado; supõe que o injusto é justo.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>23</p><p>O sujeito imagina estar em legítima defesa, estado de necessidade etc., porque supõe</p><p>estar autorizado e legitimado pela norma a agir em determinada situação.</p><p>Ex.: uma pessoa de idade avançada recebe um violento tapa em seu rosto, desferido por</p><p>um jovem atrevido. O idoso tem perfeita noção do que está acontecendo, sabe que seu agressor</p><p>está desarmado e que o ataque cessou. Não existe, portanto, qualquer equívoco sobre a reali-</p><p>dade concreta. Nessa situação, no entanto, imagina-se equivocadamente</p><p>autorizado pelo orde-</p><p>namento jurídico a matar aquele que o humilhou, atuando, assim, em legítima defesa de sua</p><p>honra.</p><p>As consequências dessa descriminante putativa encontram-se no art. 21 do CP e são as</p><p>mesmas do erro de proibição direto ou propriamente dito.</p><p>O dolo não pode ser excluído, porque o engano incide sobre a culpabilidade e não sobre</p><p>a conduta (por isso, erro de proibição). Se o erro for inevitável, o agente terá cometido um crime</p><p>doloso, mas não responderá por ele; se evitável, responderá pelo crime doloso, com pena dimi-</p><p>nuída de um sexto a um terço.</p><p>2.11. Coação moral irresistível e obediência hierárquica (art. 22 do CP)</p><p>2.11.1. Coação moral irresistível</p><p>Na coação moral, o agente coator, para alcançar o resultado desejado, emprega grave</p><p>ameaça contra o coagido, que, por medo de suportar um mal grave contra si ou contra outrem,</p><p>acaba realizando a conduta criminosa exigida. Nesse caso, em relação ao coagido, incide a</p><p>causa de exclusão da culpabilidade decorrente da inexigibilidade de conduta diversa.</p><p>Ex.: se o sujeito é coagido a assinar um documento falso, responde pelo crime de falsi-</p><p>dade o autor da coação. O coato não responde pelo crime, uma vez que sobre o fato incide a</p><p>causa de exclusão da culpabilidade. Assim, quando o sujeito comete o fato típico e antijurídico</p><p>sob coação moral irresistível, não há culpabilidade em face da inexigibilidade de outra conduta</p><p>(não é reprovável o comportamento). A culpabilidade desloca-se da figura do coato para a do</p><p>coator.</p><p>Convém sinalar que, se o sujeito pratica o fato sob coação física irresistível, não praticará</p><p>crime por ausência de conduta. Trata-se de causa excludente da tipicidade.</p><p>2.11.2. Obediência hierárquica</p><p>A ordem não manifestamente ilegal é aquela que revela aparente legalidade, mas que, na</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>24</p><p>realidade, é contrária ao direito. O subordinado, por força da ordem emanada do superior hierár-</p><p>quico, realiza a conduta que lhe foi ordenada, considerando-a lícita, quando, na realidade, cons-</p><p>titui fato típico e ilícito.</p><p>Tomemos como exemplo a hipótese de um Delegado de Polícia que determina a um ins-</p><p>petor de polícia recém-empossado na instituição que conduza um desafeto até a Delegacia, sem</p><p>nenhuma razão plausível para isso. Desconhecendo os motivos do superior hierárquico, o su-</p><p>bordinado cumpre estritamente a ordem. Nesse caso, o subordinado não será responsabilizado</p><p>criminalmente, já que incide em seu favor a causa excludente de culpabilidade. O crime de abuso</p><p>de autoridade deve ser atribuído exclusivamente ao autor da ordem.</p><p>Se a ordem for manifestamente ilegal, tanto o superior hierárquico quanto o subordinado</p><p>responderão pelo delito praticado. Nesse caso, para o superior hierárquico incide a agravante</p><p>genérica descrita no art. 62, III, 1ª parte, do CP. E em relação ao subordinado, aplica-se a ate-</p><p>nuante prevista no art. 65, III, c, do CP.</p><p>2.12. Excludentes de ilicitude (art. 23 do CP)</p><p>As causas legais de exclusão de ilicitude estão previstas no art. 23 do CP: estado de</p><p>necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular do direito.</p><p>2.12.1. Estado de necessidade (art. 24 do CP)</p><p>Tem como fundamento um estado de perigo para certo interesse jurídico, que somente</p><p>pode ser resguardado mediante a lesão de outro.</p><p>Ex.: um pedestre joga-se na frente de um motorista, que, para preservar a vida humana,</p><p>opta por desviar e colidir com outro que se encontrava estacionado nas proximidades. Entre</p><p>sacrificar uma vida e um bem material, o agente fez a opção claramente mais razoável. Não</p><p>pratica crime de dano, pois o fato, apesar de típico, não é ilícito.</p><p>2.12.2. Legítima defesa (art. 25 do CP)</p><p>A legítima defesa, nos termos em que é proposta pelo nosso Código Penal, exige a pre-</p><p>sença simultânea dos seguintes requisitos: a) agressão injusta; b) atual ou iminente; c) contra</p><p>direito próprio ou alheio; d) reação com os meios necessários; e) moderação no uso dos meios</p><p>necessários; f) elemento subjetivo: consciência de que está reagindo a injusta agressão.</p><p>A agressão injusta deve decorrer de ação ou omissão humana. Não há legítima defesa</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>25</p><p>contra ataque instintivo e espontâneo de um animal, porque ausente consciência e vontade ine-</p><p>rente à agressão. Nesse caso, como vimos, o agente estará diante de uma situação de perigo,</p><p>ensejando a incidência do estado de necessidade.</p><p>Convém registrar, no entanto, que, se o agente atiça um animal, cão feroz, por exemplo,</p><p>a atacar a vítima, estaremos diante de uma agressão injusta, não em decorrência do comporta-</p><p>mento do animal, mas pela conduta do agente instigador, que usou o cão como verdadeira arma</p><p>ou instrumento de ataque. Nesse caso, tratando-se de agressão injusta humana (agente que</p><p>atiçou o animal a atacar), a vítima poderá praticar um fato típico, que não será ilícito, porque</p><p>estará amparada pela legítima defesa.</p><p>A Lei nº 13.964/2019 introduziu o parágrafo único ao art. 25 do CP, segundo o qual “Ob-</p><p>servados os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa</p><p>o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém</p><p>durante a prática de crimes”. É o caso, por exemplo, de o agente de segurança efetuar disparos</p><p>contra o sujeito que, durante a prática de roubo a banco, mantém vítima refém.</p><p>2.12.3. Estrito cumprimento do dever legal</p><p>Estará ao abrigo do estrito cumprimento do dever legal o agente que praticar um fato típico</p><p>em face do cumprimento de um dever observando rigorosamente os limites impostos pela lei, de</p><p>natureza penal ou não. Ex.: policial que prende o agente em flagrante ou mediante cumprimento</p><p>de mandado de prisão, embora atinja o seu direito de liberdade, não comete crime algum, porque</p><p>amparado pelo estrito cumprimento do dever legal.</p><p>2.12.4. Exercício regular de direito</p><p>A Constituição Federal dispõe que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer al-</p><p>guma coisa senão em virtude de lei (art. 5°, II). Logo, se a lei autoriza o agente a praticar deter-</p><p>minada conduta, não poderá, à evidência, considerá-la ilícita.</p><p>Qualquer pessoa pode exercitar um direito subjetivo ou uma faculdade prevista em lei</p><p>(penal ou extrapenal). Exemplo clássico é do particular que realiza a prisão em flagrante, con-</p><p>forme prevê o art. 301 do CPP. A prática de determinadas atividades esportivas produz, invaria-</p><p>velmente, lesões corporais, tais como o futebol, o boxe e a luta livre.</p><p>2.12.5. Consentimento do ofendido</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>26</p><p>O consentimento do ofendido, como causa excludente de ilicitude, incide nos crimes em</p><p>que é o único titular do bem ou interesse penalmente tutelado, e que pode dele livremente dispor,</p><p>ou seja, somente em relação a bens disponíveis.</p><p>As infrações penais que geralmente admitem a possibilidade do consentimento do ofen-</p><p>dido, por tutelarem, em regra, bens disponíveis, envolvem: a) crimes contra o patrimônio, prati-</p><p>cados sem violência ou grave ameaça; b) crimes contra a integridade física; c) crimes contra a</p><p>honra; d) crimes contra a liberdade individual.</p><p>Ex.: imaginemos que o agente está praticando a subtração de um celular, momento em</p><p>que é avistado pela vítima, que consente com o desapossamento, por considerar que as funções</p><p>do aparelho já estão superadas. O fato é típico, pois se enquadra na descrição do modelo de</p><p>conduta proibida prevista no art. 155 do CP; não será, contudo, ilícito, por força do consentimento</p><p>da vítima, já que se trata de bem disponível.</p><p>3. Da Imputabilidade Penal</p><p>3.1. Inimputabilidade por doença mental, desenvolvimento mental in-</p><p>completo ou desenvolvimento mental retardado (art. 26, caput, do CP)</p><p>A inimputabilidade pela enfermidade mental é aferida pelo critério biopsicológico. Isso sig-</p><p>nifica que, além de o agente estar acometido da</p><p>enfermidade, é necessário que, em consequên-</p><p>cia desse estado biológico, o agente seja, no momento da conduta, inteiramente incapaz de</p><p>entender o caráter ilícito do fato ou de determinar- se de acordo com esse entendimento.</p><p>A natureza jurídica da sentença que reconhece a inimputabilidade pela enfermidade men-</p><p>tal é absolutória imprópria, pois o juiz aplicará medida de segurança, consistente em internação</p><p>em hospital de custódia ou tratamento ambulatorial, nos termos do art. 386, par. ún., III, do CPP.</p><p>O período de duração da medida de segurança, segundo o Código Penal, é por tempo</p><p>indeterminado, perdurando enquanto não ficar constada a cessação da periculosidade do agente</p><p>(art. 97, § 1º, do CP). Como forma de evitar a aplicação de uma sanção de caráter perpétuo, o</p><p>STJ estabeleceu um limite para o prazo de duração da medida de segurança, que seria o cor-</p><p>respondente à pena máxima cominada ao delito pelo qual o agente foi acusado, conforme se</p><p>extrai da Súmula 527 do STJ.</p><p>A semi-imputabilidade ou imputabilidade diminuída ou restrita encontra previsão no art.</p><p>26, par. ún., do CP. Trata-se, na verdade, de uma causa de diminuição da pena.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>27</p><p>3.2. Da inimputabilidade por embriaguez completa proveniente de caso</p><p>fortuito ou força maior (art. 28, § 1°, do CP)</p><p>Quando a embriaguez acidental, proveniente de caso fortuito ou força maior, for completa,</p><p>ou seja, apta a deixar o agente, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de en-</p><p>tender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, há exclu-</p><p>são da imputabilidade, nos termos do que dispõe o art. 28, § 1°, do CP.</p><p>Quando a embriaguez acidental, proveniente de caso fortuito ou força maior, é incompleta,</p><p>não há exclusão da imputabilidade. O sujeito responde pelo crime com a pena atenuada, desde</p><p>que haja redução de sua capacidade intelectiva ou volitiva. A sentença é condenatória. Aplica-</p><p>se o disposto no art. 28, § 2º, do CP.</p><p>A embriaguez voluntária ou culposa não excluem a imputabilidade (art. 28, II, do CP).</p><p>4. Concurso de Pessoas (arts. 29, 30 e 31 do CP)</p><p>4.1. Conceito</p><p>Ocorre quando duas ou mais pessoas, em conjugação de esforços e comunhão de von-</p><p>tades, reúnem-se para a prática de um ou mais delitos.</p><p>4.2. Requisitos</p><p>4.2.1. Pluralidade de condutas</p><p>Para que haja concurso de pessoas, exige-se que cada um dos agentes tenha realizado</p><p>ao menos uma conduta relevante. Pode ser em coautoria, em que há duas condutas principais;</p><p>ou autoria e participação, em que há uma conduta principal e outra acessória, praticadas, res-</p><p>pectivamente, por autor e partícipe.</p><p>4.2.2. Relevância causal das condutas</p><p>Para justificar a punição de duas ou mais pessoas em concurso, afigura-se necessário</p><p>que a conduta do agente tenha efetivamente contribuído, ainda que minimamente, para a produ-</p><p>ção do resultado. Em outras palavras, se a conduta não tem relevância causal, isto é, se não</p><p>contribuiu em nada para a produção do resultado, não pode ser considerada integrante do con-</p><p>curso de pessoas.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>28</p><p>Ex: empregada doméstica, desejando se vingar da patroa, após verificar a presença de</p><p>um cidadão com atitude de quem pretendia ingressar na residência para praticar subtração, deixa</p><p>a porta da frente aberta. Contudo, o cidadão ingressa na residência pela porta dos fundos. Nesse</p><p>caso, como a conduta da empregada doméstica foi absolutamente irrelevante para a subtração,</p><p>ela não será responsabilizada criminalmente.</p><p>4.2.3. Do liame subjetivo e normativo (vínculo subjetivo e normativo en-</p><p>tre os participantes)</p><p>Os agentes devem atuar conscientes de que participam de crime comum, ainda que não</p><p>tenha havido acordo prévio de vontades. Ou seja, devem agir em busca da produção de um</p><p>mesmo resultado.</p><p>Ex.: uma empregada doméstica, percebendo a presença de um ladrão, para vingar-se do</p><p>patrão, deliberadamente deixa a porta aberta, facilitando a prática do furto. O agente ingressa</p><p>pela porta da frente e pratica a subtração. Embora não tenha ocorrido ajuste prévio, há vínculo</p><p>subjetivo entre a conduta da empregada doméstica e do ladrão, já que ambos pretendiam a</p><p>subtração de objetos na residência. Por isso, a empregada responderá pelo crime de furto qua-</p><p>lificado pelo concurso de pessoas (art. 155, § 4º, IV, do CP), ao passo que o outro agente pelo</p><p>crime de furto simples, já que não sabia que estava sendo auxiliado, ou seja, não sabia que outra</p><p>pessoa concorreu para a prática do furto.</p><p>4.2.4. Identidade de infração para todos os participantes</p><p>Nos termos do art. 29 do CP, todos que concorrem para o crime respondem pelo mesmo</p><p>delito, na medida de sua culpabilidade.</p><p>4.3. Participação de menor importância (art. 29, § 1º, do CP)</p><p>Essa causa de diminuição da pena alcança somente o partícipe.</p><p>Imaginemos que o agente apenas deu carona para o comparsa até o local onde ele iria</p><p>praticar a subtração e foi embora. Nesse caso, concorreu para o crime de furto, já que, se não</p><p>tivesse dado carona ao comparsa, o furto não teria ocorrido da forma como ocorreu. Todavia, a</p><p>participação foi de menor importância, podendo o agente que deu carona responder pelo crime</p><p>de furto qualificado pelo concurso de pessoas, com a pena diminuída em 1/6 a 1/3.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>29</p><p>4.4. Da cooperação dolosamente distinta ou desvio subjetivo entre os</p><p>participantes (art. 29, § 2º, do CP)</p><p>O agente que desejava praticar um delito, sem a condição de prever a concretização de</p><p>crime mais grave, deve responder pelo que pretendeu fazer, não se podendo a ele imputar outra</p><p>conduta indesejada, sob pena de se estar tratando de responsabilidade objetiva.</p><p>Ex.: “A” determina a “B” que espanque “C”. “B” mata “C”. Segundo o art. 29, § 2º, “A”</p><p>responde por crime de lesão corporal, cuja pena deve ser aumentada até metade se a morte da</p><p>vítima lhe era previsível.</p><p>4.5. Comunicabilidade dos elementares e circunstâncias do crime (art.</p><p>30 do CP)</p><p>Via de regra, as circunstâncias e condições pessoais relacionadas a um dos agentes não</p><p>se comunica aos outros que contribuíram para a prática delituosa.</p><p>Todavia, há determinadas circunstâncias ou condições pessoais que compõem, integram</p><p>o tipo penal, figurando, no caso, como verdadeira elementar no tipo penal. Nesse caso, quando</p><p>também constituem o tipo penal, ou seja, figuram como elementares do tipo penal, as circuns-</p><p>tâncias ou condições pessoais relacionadas a um dos sujeitos se comunicam aos demais coau-</p><p>tores ou partícipes.</p><p>Ex.: “A”, funcionário público, comete um crime de peculato (art. 312), com a participação</p><p>de “B”, não funcionário público. A condição pessoal (funcionário público) é elementar do crime</p><p>de peculato, comunicando-se, portanto, ao agente que não é funcionário público. Logo, os dois</p><p>respondem por crime de peculato.</p><p>De outro lado, as circunstâncias objetivas alcançam o partícipe ou coautor se, sem haver</p><p>praticado o fato que as constitui, integraram o dolo ou culpa.</p><p>Ex.: “A” instiga “B” a praticar homicídio contra “C”. “B”, para a execução do crime, emprega</p><p>asfixia. O partícipe não responde por homicídio qualificado (art. 121, § 2º, III, 4ª figura), a não ser</p><p>que o meio de execução empregado pelo autor principal tenha ingressado na esfera de seu</p><p>conhecimento.</p><p>5. Aplicação da Pena</p><p>5.1. Regime inicial de cumprimento de pena (art. 33 do CP)</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>30</p><p>Após estabelecer a quantidade da pena imposta da sentença, cumpre ao juiz fixar o re-</p><p>gime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade, levando em conta: a) a quantidade</p><p>da pena imposta; b) a reincidência; c) as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP.</p><p>Nos termos do art. 33, caput, do CP, nos crimes apenados com reclusão, o juiz poderá</p><p>fixar o regime inicial fechado, semiaberto ou aberto. Aos crimes apenados com detenção, o juiz</p><p>poderá fixar</p><p>o regime inicial semiaberto ou aberto.</p><p>Logo, nos crimes apenados com detenção, não é possível ao juiz fixar o regime inicial</p><p>fechado, podendo, no entanto, haver regressão para o regime fechado, no caso, por exemplo,</p><p>de falta grave.</p><p>O início do cumprimento da pena para os crimes apenados com reclusão dar-se-á da</p><p>seguinte forma, nos termos do art. 33, § 2º, do CP:</p><p>a) o condenado a pena superior a oito anos deverá começar a cumprir a pena privativa</p><p>de liberdade no regime fechado;</p><p>b) o primário, cuja pena seja superior a quatro anos e não exceda a oito, poderá,</p><p>desde o princípio, cumpri-la em regime semiaberto;</p><p>c) o primário, cuja pena seja igual ou inferior a quatro anos, poderá, desde o início,</p><p>cumpri-la em regime aberto.</p><p>Cuidado:</p><p>Súm. nº 269 do STJ: É admissível a adoção do regime prisional semi-aberto aos reinci-</p><p>dentes condenados à pena igual ou inferior a 4 anos se favoráveis as circunstâncias judi-</p><p>ciais.</p><p>Nos crimes apenados com detenção, os critérios para a definição do regime inicial são os</p><p>seguintes:</p><p>a) se a pena for superior a quatro anos, o juiz fixará o regime inicial semiaberto;</p><p>b) se a pena for igual ou inferior a quatro anos, o regime inicial será o aberto;</p><p>c) se o condenado for reincidente, o regime inicial será o semiaberto, independente-</p><p>mente da quantidade da pena.</p><p>Além disso, a imposição de regime inicial mais severo depende de fundamentação ade-</p><p>quada, não se revestindo a gravidade em abstrato do delito motivação idônea para a fixação do</p><p>regime de cumprimento de pena mais severo do que a pena aplicada exigir. É o que se extrai</p><p>das Súm. nº 718 e 719 do STF, e Súm. nº 440 do STJ.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>31</p><p>5.2. Penas restritivas de direitos (art. 44 do CP)</p><p>5.2.1. Conceito</p><p>Nos termos do art. 43 do CP, as penas restritivas de direitos são: a) prestação pecuniária;</p><p>b) perda de bens e valores; c) prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas; d)</p><p>interdição temporária de direitos; e) limitação de fim de semana.</p><p>As penas restritivas de direitos são substitutivas, uma vez que o juiz, depois de fixar a</p><p>pena privativa de liberdade, verificando a presença dos requisitos, efetua a substituição por uma</p><p>ou mais penas restritivas de direitos, conforme o caso. Isso porque não há, no preceito secun-</p><p>dário dos tipos penais incriminadores, previsão direta de pena restritiva de direitos, mas tão so-</p><p>mente pena privativa de liberdade.</p><p>5.2.2. Requisitos objetivos</p><p>a) Quantidade da pena aplicada: o legislador estabeleceu como parâmetro para a con-</p><p>cessão da pena restritiva de direitos a pena aplicada na sentença, independentemente da pena</p><p>abstratamente cominada no preceito secundário do tipo penal.</p><p>Nos crimes dolosos, praticados sem violência ou grave ameaça, apenados com reclusão</p><p>ou detenção, o limite estabelecido pelo legislador é de 4 (quatro) anos.</p><p>No caso de condenação por crime culposo, a substituição será possível, independente-</p><p>mente da quantidade da pena imposta, não existindo tal requisito, ainda que resulte violência</p><p>contra a pessoa, por exemplo, no homicídio culposo do Código Penal (art. 121, § 3º) e no homi-</p><p>cídio culposo na condução de veículo automotor (art. 302 do CTB).</p><p>Cuidado: nos termos do art. 312-B do CTB, se o agente for condenado pela prática do</p><p>crime de homicídio culposo na condução de veículo automotor qualificado por estar sob efeito</p><p>de álcool (art. 302, § 3º, do CTB), ou pelo crime de lesão corporal culposa na condução de veículo</p><p>automotor sob o efeito de álcool, resultando em lesão corporal gravíssima, não terá direito ao</p><p>benefício da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos (art. 303, § 2º,</p><p>CTB).</p><p>b) Natureza do crime cometido: em relação aos crimes dolosos, as penas restritivas de</p><p>direitos são aplicáveis aos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa. Nos cri-</p><p>mes culposos, será possível a aplicação do benefício, ainda que tenha decorrido crime a partir</p><p>de resultado violento (homicídio culposo, por exemplo), já que não havia dolo de violência ou</p><p>grave ameaça na conduta do agente.</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>32</p><p>5.2.3. Requisitos subjetivos</p><p>Os requisitos subjetivos levam em conta as características pessoais do sentenciado.</p><p>a) Réu não reincidente em crime doloso: nos termos do art. 44, II, do CP, para conces-</p><p>são do benefício, é necessário que o sujeito não seja reincidente em crime doloso. O texto não</p><p>trata de qualquer reincidente. Refere-se ao não reincidente em crime “doloso”, de modo que não</p><p>há impedimento à aplicação da pena alternativa quando: a) os dois delitos são culposos; b) o</p><p>anterior é culposo e o posterior é doloso; c) o anterior é doloso e o posterior culposo.</p><p>Ainda que o réu seja reincidente em crime doloso, o Código Penal, no seu art. 44, § 3º,</p><p>prevê uma exceção. Se, em face de condenação anterior, a medida for socialmente recomendá-</p><p>vel e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime, será possível</p><p>aplicar a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.</p><p>b) A culpabilidade, os antecedentes, a conduta ou a personalidade ou ainda os mo-</p><p>tivos e circunstâncias recomendarem a substituição: conforme o art. 44, III, do CP, “a culpa-</p><p>bilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os mo-</p><p>tivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente”.</p><p>Convém notar que esses requisitos praticamente reproduzem as circunstâncias judiciais</p><p>previstas no art. 59, caput, do CP, com exceção de duas: comportamento da vítima e conse-</p><p>quências do crime, coincidentemente as únicas de natureza objetiva. Logo, verifica-se que o art.</p><p>44, III, do CP somente levou em conta as circunstâncias subjetivas.</p><p>5.2.4. Penas restritivas de direitos e violência doméstica ou familiar con-</p><p>tra a mulher</p><p>Nos termos do art. 17 da Lei nº 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, “É</p><p>vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de</p><p>cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique</p><p>o pagamento isolado de multa”.</p><p>Conforme a Súm. nº 588 do STJ, a prática de crime ou contravenção penal contra a mulher</p><p>com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico impossibilita a substituição de pena pri-</p><p>vativa de liberdade por restritiva de direitos.</p><p>5.3. Da pena de multa (arts. 49, 50, 51 e 60 do CP)</p><p>5.3.1. Conceito</p><p>1ª Fase | 42° Exame da OAB</p><p>Direito Penal</p><p>33</p><p>Trata-se de uma sanção penal, de natureza patrimonial, consistente no pagamento de</p><p>determinada quantia em pecúnia, previamente fixada em lei, em favor do Fundo Penitenciário</p><p>Nacional.</p><p>5.3.2. Critério de fixação da pena de multa</p><p>Diversamente da pena privativa de liberdade, cujo sistema é o trifásico, a aplicação da</p><p>pena de multa observa um sistema bifásico, comportando, pois, duas fases distintas e sucessi-</p><p>vas.</p><p>Para o cálculo da pena de multa, o Código Penal adotou o sistema do dia-multa.</p><p>Na 1ª fase, o juiz deverá estabelecer o número de dias-multa, que varia de, no mínimo,</p><p>10 (dez) dias-multa a, no máximo, 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. É o que se extrai do</p><p>art. 49 do CP.</p><p>Para chegar ao número de dias-multa, o Magistrado considera as circunstâncias judiciais</p><p>do art. 59, caput, do CP, bem como eventuais atenuantes e agravantes, além de causas de</p><p>diminuição e aumento de pena.</p><p>Na 2ª fase, o juiz deverá fixar o valor do dia-multa, não podendo ser inferior a um trigésimo</p><p>do salário mínimo mensal de referência vigente ao tempo do fato, nem superior a cinco vezes</p><p>esse salário (art. 49, § 1º, do CP).</p><p>Para aferir o valor do dia-multa, o juiz deverá considerar a situação econômica do réu,</p><p>podendo chegar ao triplo, se considerada insuficiente e ineficaz diante da situação financeira do</p><p>réu, conforme dispõe o art. 60 do CP.</p><p>5.3.3. Execução da</p>

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