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não a exaurem; garantem, em vez disso, um conteúdo mínimo ao contrato de trabalho, em atenção à dignidade do trabalhador. A cláusula contratual pode assegurar mais, nunca menos, que a previsão legal. Fontes de produção profissional são as convenções coletivas de trabalho, os acordos coletivos de trabalho e os regulamentos de empresa. A tentativa de incluir, nesse rol, os contratos coletivos, fora encetada mediante a alusão dessa nova figura – que teria âmbito nacional e estimularia a negociação contínua das condições de trabalho – na Lei 8542/92, por gestões do laboralista João de Lima Teixeira Filho. Mas malogrou, sendo finalmente derrogados os dispositivos, que tratavam do citado contrato coletivo, pela Medida Provisória 1540-31/97. A nosso pensamento e não obstante o papel secundário que lhes é atribuído por alguns doutrinadores de reputação merecidaciii, as fontes de produção profissional ou autônomaciv se apresentam como o mecanismo atualmente mais apto a tornar efetiva a proteção ao trabalho e ao mercado de trabalho, pela possibilidade que dão aos próprios atores sociais de adaptar a regra jurídica, sem prejuízo da garantia mínima já referida, a novas realidades ou condições de trabalho, surgidas como corolário das mutações econômicas ou inovações tecnológicas que movimentam o nosso cotidiano. É pena que se desvirtue, por vezes, essa função das normas coletivas, preconizando-se o seu uso como um instrumento de redução de direitos trabalhistas indisponíveis. A convenção coletiva de trabalho nasceu como forma de os trabalhadores, organizados em torno do sindicato que defendia os seus interesses, obterem condições de trabalho que o Estado, por inércia, não lhes estava a assegurar, mediante lei. O acordo coletivo de trabalho surgiu posteriormente, distinguindo-se da convenção pelo fato de apenas o sindicato obreiro participar de sua elaboração, do outro lado se apresentando o(s) empregador(es). Na convenção coletiva de trabalho, também o empregador está representado pelo sindicato da categoria econômica, de que é membro. Voltaremos ao assunto quando tratarmos, no próximo capítulo, do princípio da autodeterminação coletiva. O regulamento de empresa é, da empresa, o estatuto. No uso de seu poder de organização, em que está investido por ser o titular da empresa, o empregador estrutura a sua unidade produtiva, instituindo a divisão de trabalho que lhe apraz. O poder de dirigir a empresa é inerente ao capitalismo, em qualquer de suas formas, não se podendo olvidar, neste passo, o prestígio que o direito burguês confere ao direito de propriedade - ocorre, porém, de os trabalhadores também participarem da elaboração do regulamento de empresa. São exemplos deste os planos de cargos e salários e os quadros de carreira que disciplinam as relações trabalhistas em inúmeras organizações empresariais. Fonte de produção mista é a sentença normativa, que ultima os processos coletivos (a Constituição e a CLT os denominam dissídios coletivos) instaurados quando é malsucedida a negociação direta entre sindicato profissional e o empregador ou sua representação sindical. Também aqui se diferencia o direito laboral, em vista do poder normativo assegurado à Justiça do Trabalho pelo artigo 114, §2o, da Constituição. Contudo, após a edição da Emenda Constitucional n. 45/2004 o citado dispositivo passou a exigir, para a instauração do dissídio coletivo que resultaria em uma sentença normativa, a existência de “comum acordo”. Vale dizer, o dissídio coletivo somente pode iniciar-se nos casos em que a Justiça do Trabalho for provocada por ambos os polos da relação conflituosa: empregados (necessariamente pelo sindicato respectivo) e empregador(es). Ressalvou-se apenas a hipótese de “greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público”, quando o Ministério Público pode ajuizar o dissídio coletivo (art. 114, §3o da Constituição). Na prática, a exigência de comum acordo entre as partes desavindas tem propiciado a agonia do dissídio coletivo e, por extensão, da sentença normativa que nele sobreviria. Decerto porque é de nossa tradição que se ajuízem processos judiciais apenas quando o esforço da negociação já fora levada ao extremo, acirrando-se o conflito e assim se inviabilizando que os contendores elejam, como cavalheiros medievais, o palco do duelo que gostariam de protagonizar. Em verdade, o Tribunal Superior do Trabalho tem contemporizado o rigor da nova regra, ao afirmar que o comum acordo é exigível para a instauração do dissídio coletivo de natureza econômica (em que as condições de trabalho e salário são revistas), não se o exigindo para dissídios coletivos de natureza jurídica (nos quais se questiona a interpretação de normas coletivas). Fontes de produção internacional são sobretudo os tratados referidos pelo art. 5o, §2o, da Constituição. Esses tratados internacionais podem se inserir na nossa ordem jurídica, converter-se em norma, especialmente as Convenções Internacionais da OIT, que ganham força normativa quando ratificadas pela autoridade competente do Estado-membro - no Brasil, pelo Congresso Nacional, sendo questionada, pela doutrina especializada e em face do que dispõem os artigos 49, I, e 84, VIII, da Constituição, a necessidade de ato de promulgação posterior, pelo Presidente da República. Sob a regência da relação individual de trabalho por normas gerais, protege-se o empregado, mas, com igual efeito, impõe-se o mesmo ônus financeiro a todos os empresários e assegura-se, assim, a cada um deles melhor ou mais equânime condição de competir. Também o Direito Internacional do Trabalho tem como objetivos, como ensina Arnaldo Süssekindcv: I - por meio de convenções internacionais: a) universalizar as normas de proteção ao trabalho, esteadas nos princípios da justiça social e da dignificação do trabalho humano; b) estabelecer o bem-estar social geral como condição precípua à felicidade humana e à paz mundial; c) evitar que razões de natureza econômica, decorrentes do ônus da proteção ao trabalho, impeçam que todas as nações adotem e apliquem as normas tutelares consubstanciadas nos diplomas internacionais. Sobre ser atual essa preocupação, vejamos o que retrata reportagem do jornalista Jaime Spitzcovsku, para a Folha de São Paulo, de 14.04.98cvi: Turnos de mais de 12 horas diárias de trabalho para conseguir alcançar a produtividade exigida. Trabalhar em pé. Cortar, durante o dia e parte da noite, veludo, um tecido grosso, com tesouras e sem usar luvas. O esforço deixa marcas nas mãos. Esse cenário despontava numa fábrica de brinquedos de Xangai, um dos corações industriais da China neocapitalista. O milagre asiático, agora desafiado pela crise financeira, usou como um de seus combustíveis na decolagem a exploração da mão-de-obra. As principais vítimas são mulheres e crianças. O trabalho infantil também municiou a economia paquistanesa, indiana e de alguns países árabes. Mãos pequenas tecem tapetes com mais destreza, argumentam os fabricantes. Na China, a opção por mão-de-obra feminina também busca argumentos para sobreviver. As mulheres seriam mais habilidosas para cortar o veludo. Na Tailândia e no Sri Lanka, vi mulheres e crianças vítimas de exploração sexual. São exemplos asiáticos de um problema global. O órgão da OIT que elabora a regulamentação internacional do trabalho é a Conferência Internacional do Trabalho, composta de quatro delegados de cada Estado-membro, sendo dois deles designados pelos respectivos governos, um pelos empregadores e um pelos trabalhadores cviii cvii. Existem várias convenções internacionais ratificadas pelo Brasil, entre estas sobressaindo aquelas que cuidam da igualdade de tratamento entre estrangeiros e nacionais quando vítimas de acidentes do trabalho (Convenção n. 19/25), do trabalho forçado (n. 29/30), da indenização