Logo Passei Direto
Buscar
Material
páginas com resultados encontrados.
páginas com resultados encontrados.

Prévia do material em texto

<p>x Título</p><p>UNIDADE</p><p>7 Tempo de escravidão</p><p>UNIDADE</p><p>188</p><p>Fotografia de Marc Ferrez. Partida</p><p>para a colheita de café, c. 1885.</p><p>Hoje, no Brasil, ainda há um longo caminho a percorrer em busca da igualdade de oportuni-</p><p>dades e direitos entre negros e brancos. Para isso é necessário superar o preconceito racial, ou</p><p>racismo, que perpetua essa desigualdade em diversas áreas da sociedade, desde as interações</p><p>cotidianas até as estruturas de governo. Esse preconceito tem origem no período de escravidão</p><p>no Brasil, entre os séculos XVI e XIX, e deixou marcas profundas em nossa vida social.</p><p>1. Qual é a situação retratada na imagem e quem são as pessoas</p><p>que compõem a cena?</p><p>2. Você reconhece heranças da escravidão no seu cotidiano?</p><p>Compartilhe suas impressões.</p><p>3. O que podemos fazer para superar a escravidão?</p><p>189</p><p>M</p><p>ar</p><p>c</p><p>Fe</p><p>rr</p><p>ez</p><p>/A</p><p>ce</p><p>rv</p><p>o</p><p>In</p><p>st</p><p>itu</p><p>to</p><p>M</p><p>or</p><p>ei</p><p>ra</p><p>S</p><p>al</p><p>le</p><p>s</p><p>190</p><p>Nicolaes Visscher. Engenho</p><p>de açúcar, c. 1630.</p><p>Escravizados trabalham</p><p>em engenho de açúcar na</p><p>capitania de Pernambuco.</p><p>Reprodução/Coleção particular</p><p>Augustus Earle. Cena de negros</p><p>dançando o jongo. c. 1822.</p><p>Aquarela, 21 cm × 34 cm. Ao</p><p>preservar hábitos e costumes</p><p>trazidos de seus locais de origem,</p><p>os escravizados afirmavam sua</p><p>identidade e buscavam melhorar</p><p>suas condições de vida.</p><p>Reprodução/Biblioteca Nacional, Camberra, Austrália</p><p>Caminhos</p><p>Neste percurso, você vai colocar em prática</p><p>alguns procedimentos:</p><p>� Pesquisar em meios digitais ou impressos.</p><p>� Interpretar imagens e fontes históricas.</p><p>� Produzir textos com base no conteúdo estu-</p><p>dado.</p><p>� Responder a perguntas para mobilização de</p><p>conhecimentos prévios.</p><p>� Desenhar a planta de um quilombo.</p><p>� Elaborar uma história com base em palavras</p><p>de origem banto.</p><p>Os objetivos de aprendizagem para esta Unidade são:</p><p>� Conhecer o cotidiano dos escravizados na América</p><p>portuguesa.</p><p>� Compreender a formação da sociedade escravista na</p><p>América portuguesa.</p><p>� Reconhecer a presença de elementos africanos na</p><p>cultura brasileira e os conceitos de patrimônio material</p><p>e imaterial.</p><p>� Identificar as principais formas ou estratégias de re-</p><p>sistência escrava ao cativeiro (fuga, quilombos, revol-</p><p>tas e negociação).</p><p>� Analisar a escravidão africana e a indígena.</p><p>� Retomar a ação dos bandeirantes e seus conflitos com</p><p>jesuítas e indígenas na colônia.</p><p>Johann Moritz Rugendas.</p><p>Capitão do Mato. 1835.</p><p>Litografia colorida à</p><p>mão, 51,3 cm × 35,5cm.</p><p>Os capitães do mato</p><p>perseguiam escravizados</p><p>fugidos com o objetivo de</p><p>capturá-los e levá-los de</p><p>volta ao senhor.</p><p>Re</p><p>pr</p><p>od</p><p>uç</p><p>ão</p><p>/C</p><p>ol</p><p>eç</p><p>ão</p><p>p</p><p>ar</p><p>tic</p><p>ul</p><p>ar</p><p>Jean-Baptiste Debret.</p><p>Soldados índios de</p><p>Curitiba, c. 1835.</p><p>Litografia colorida à</p><p>mão, 49 cm × 34 cm.</p><p>Reprodução/Coleção particular</p><p>Você vai utilizar o livro didático,</p><p>seu caderno e um dicionário. Tam-</p><p>bém será necessário ter acesso a</p><p>materiais impressos e digitais para a</p><p>realização de pesquisas, como livros,</p><p>jornais, sites, vídeos etc. Para realizar</p><p>um desenho, você precisará de papel</p><p>e lápis ou caneta.</p><p>O conteúdo desta Unidade é importante para refletir</p><p>sobre o passado escravista, as identidades que se for-</p><p>maram na América portuguesa entre africanos e seus</p><p>descendentes e, sobretudo, conhecer os caminhos que</p><p>levaram à liberdade dos africanos e indígenas submeti-</p><p>dos ao cativeiro. Esse aprendizado também levará você a</p><p>problematizar a formação étnica da sociedade brasileira</p><p>com base na matriz africana.</p><p>191</p><p>192192</p><p>O cotidiano dos</p><p>escravizados1</p><p>Do século XVI ao século XIX, milhões de africanos escravi-</p><p>zados foram levados para a colônia portuguesa na América e se</p><p>tornaram a maioria da população colonial. Em algumas cidades,</p><p>como Rio de Janeiro e Salvador, por exemplo, a maioria da popu-</p><p>lação era negra.</p><p>A vida dos escravizados era marcada pelo trabalho obrigató-</p><p>rio, pelo castigo e pela violência. Mas eles não eram os únicos</p><p>trabalhadores. Indígenas também foram submetidos à escravi-</p><p>zação e, além deles, havia colonos livres em situação de pobre-</p><p>za. Cabia aos cativos, porém, realizar grande parte do trabalho</p><p>existente na colônia, tanto na cidade quanto no campo.</p><p>Os africanos escravizados na América eram chamados pelo</p><p>nome cristão recebido pouco antes do embarque nos navios ne-</p><p>greiros, sempre acompanhado pela referência a seu lugar de ori-</p><p>gem ou ao ponto de embarque na África, como vimos na Unidade</p><p>5. Assim, em cada fazenda, multiplicavam-se os Cabinda, Angola,</p><p>Congo, Benguela, Monjolo, Moçambique e muitos outros.</p><p>Eles vinham de diferentes regiões africanas e falavam diversas</p><p>línguas, apesar de manterem alguma semelhança entre si. Mui-</p><p>tas vezes, os traficantes ou senhores de escravizados utilizavam</p><p>essas diferenças culturais como estratégia para evitar rebeliões,</p><p>juntando num mesmo grupo pessoas de povos e regiões distintas,</p><p>que não falavam a mesma língua e que poderiam, inclusive, ter</p><p>alguma rivalidade em seus locais de origem.</p><p>Cativo: pessoa que perdeu a</p><p>liberdade; forçada à escravidão.</p><p>Johann Moritz Rugendas.</p><p>Benguela, Angola, Congo, Monjolo,</p><p>c. 1835. Litografia colorida à</p><p>mão, 47 cm × 57 cm. Na imagem,</p><p>o artista retrata africanos que</p><p>vieram escravizados para o Brasil,</p><p>registrando seu local de origem.</p><p>Atividades</p><p>� Faça uma pesquisa sobre os principais locais de onde</p><p>saía a maioria do escravizados africanos para a América</p><p>portuguesa. Lembre-se de registrar os sites e livros nos</p><p>quais você buscou as informações. Depois, escreva um</p><p>pequeno texto apontando quais eram esses locais e por</p><p>que os escravizados eram trazidos desses pontos.</p><p>Te</p><p>m</p><p>a</p><p>Co</p><p>nt</p><p>emporâneo Transversal</p><p>Educação para</p><p>Valorização do</p><p>Multiculturalismo</p><p>nas Matrizes</p><p>Históricas</p><p>e Culturais</p><p>Brasileiras</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>cadernoRe</p><p>pr</p><p>od</p><p>uç</p><p>ão</p><p>/C</p><p>ol</p><p>eç</p><p>ão</p><p>p</p><p>ar</p><p>tic</p><p>ul</p><p>ar</p><p>O trabalho duro</p><p>A vida em uma fazenda era difícil e começava bem antes do amanhecer. Lá, os</p><p>cativos geralmente acordavam com o som de sinos tocados por feitores e capata-</p><p>zes, sendo vários deles também cativos que, ao longo do tempo, ganharam a con-</p><p>fiança do senhor. O sinal ecoava pelos locais de habitação – as senzalas. As mo-</p><p>radias eram em sua maioria coletivas, com uma parte reservada para os homens e</p><p>outra para as mulheres. Apenas os casados tinham espaços individuais, na senzala</p><p>ou em alguma parte da fazenda.</p><p>Após o despertar, todos os trabalhadores deviam se concentrar rapidamente</p><p>no pátio da fazenda para receber as instruções do administrador e raramente do</p><p>proprietário. Somente após as ordens iniciais era servida a refeição: café ralo e ra-</p><p>padura; se tivessem sorte, recebiam um resto do angu do dia anterior.</p><p>A maior parte dos cativos seguia para as plantações, enquanto poucos perma-</p><p>neciam na sede para os afazeres domésticos ou os serviços de carpintaria, marce-</p><p>naria e pequenos reparos. O trabalho era quase sempre aprendido na relação com</p><p>os moradores mais antigos da fazenda.</p><p>Aqueles que partiam para a roça caminhavam em grupos, e o capataz os seguia</p><p>em uma carroça, na qual também eram transportados os alimentos e as panelas para</p><p>cozinhar as refeições em meio à lavoura. O trabalho começava por volta das 6 horas</p><p>da manhã, com o ritmo sempre compassado pelos cativos mais velozes.</p><p>Perto das 10 horas, havia a parada para o almoço, que geralmente consistia</p><p>de angu e feijão cozido com toicinho; por vezes legumes, abóbora e batata-doce.</p><p>Após uma hora de pausa, o trabalho seguia em ritmo acelerado até o intervalo</p><p>para um pequeno descanso, quando era servido café ou alguma bebida. No jantar,</p><p>em torno das 16 horas, eram consumidas as sobras do almoço. No verão, o dia de</p><p>trabalho terminava mais ou menos às 19 horas, quando o sol se punha. Acabava</p><p>como começou, com todos reunidos no pátio, de onde partiam para suas moradias.</p><p>Trabalhadores escravizados partindo para</p><p>o trabalho no campo, no Rio de Janeiro,</p><p>1858. Fotografia de Jean-Victor Frond</p><p>gravada por Frédéric Sorrieu.</p><p>Re</p><p>pr</p><p>od</p><p>uç</p><p>ão</p><p>/C</p><p>ol</p><p>eç</p><p>ão</p><p>p</p><p>ar</p><p>tic</p><p>ul</p><p>ar</p><p>193</p><p>194</p><p>Mas nem todos os cativos realizavam suas tarefas</p><p>na lavoura. Uma parcela deles,</p><p>os escravizados domésticos, trabalhavam dentro da casa-grande e realizavam</p><p>tarefas como cozinhar, limpar, lavar a roupa etc. Esses trabalhadores, muitas vezes,</p><p>acabavam construindo relações mais próximas com seus senhores brancos, já que</p><p>algumas escravizadas chegavam até a cuidar dos filhos de seus senhores, atuando</p><p>como amas de leite.</p><p>Essa proximidade, no entanto, não significava que as violências da escravidão</p><p>eram menores para os escravizados domésticos. Eles continuavam sendo conside-</p><p>rados propriedades e estavam, portanto, sujeitos a todo tipo de punição por parte</p><p>dos senhores.</p><p>Ao final do dia de trabalho, exaustos, todos os escravizados se reuniam no in-</p><p>terior das senzalas em torno de uma pequena fogueira, sempre acesa. No sábado,</p><p>muitos recebiam autorização para cultivar uma pequena horta, direito adquirido ao</p><p>longo do tempo.</p><p>O roçado servia para complementar a alimentação e trazer um pequeno rendi-</p><p>mento com a venda do excedente, isto é, o que sobrava a mais de seu consumo para</p><p>sobrevivência. Além de diminuir as despesas do senhor com a alimentação dos ca-</p><p>tivos, esse recurso era importante para manter, entre os escravizados, a esperança</p><p>de comprar a liberdade.</p><p>Deixar fluir</p><p>O trabalho no engenho</p><p>Praticamente todos os tra-</p><p>balhos na fabricação do açúcar</p><p>eram realizados por africanos</p><p>escravizados. Por isso, eles</p><p>eram considerados “as mãos</p><p>e os pés do senhor de enge-</p><p>nho”. Na imagem, é possível</p><p>observar os escravizados em</p><p>diversas funções que envol-</p><p>vem a produção açucareira.</p><p>Nicolaes Visscher. Engenho</p><p>de açúcar (detalhe), c. 1630.</p><p>Escravizados trabalham</p><p>em engenho de açúcar na</p><p>capitania de Pernambuco.</p><p>1. O que você sente ao observar a gravura? Compartilhe suas primeiras impressões.</p><p>2. Descreva as pessoas, os objetos, o lugar e a atividade realizada na cena.</p><p>3. Com base na imagem, explique o processo de produção de açúcar no engenho pelo</p><p>trabalho dos escravizados.</p><p>Ama de leite:</p><p>mulher que</p><p>amamenta</p><p>criança alheia.</p><p>Reprodução/Coleção particular</p><p>195</p><p>Nosso mundo</p><p>Trabalho escravo na atualidade</p><p>Ainda hoje existe no mundo todo o trabalho forçado, chamado atualmente trabalho análogo à escra-</p><p>vidão, ou seja, em condições parecidas com aquelas vivenciadas pelos escravizados nas colônias euro-</p><p>peias entre os séculos XVI e XIX. Esse tipo de trabalho é proibido e acontece de maneira clandestina, e</p><p>o seu combate é um desafio para os governos.</p><p>Leia os textos a seguir retirados do site da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre os</p><p>dados no Brasil:</p><p>No Brasil, o artigo 149 do Código Penal prevê a criminalização do trabalho escravo [...]. Confira:</p><p>Art. 149. Reduzir alguém à condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos for-</p><p>çados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer res-</p><p>tringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador [...].</p><p>Pena – reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa, além da pena correspondente à violência.</p><p>O TRABALHO forçado no Brasil. Organização Internacional do Trabalho. Disponível em: www.ilo.org/brasilia/temas/</p><p>trabalho-escravo/WCMS_393066/lang--pt/index.htm. Acesso em: 25 abr. 2022.</p><p>Entre 1995 e 2020, mais de 55 mil pessoas foram libertadas de condições de trabalho análogas à escravidão</p><p>no Brasil, segundo o Radar da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), vinculada à Secretaria Especial de</p><p>Previdência e Trabalho (SEPRT) do Ministério da Economia.</p><p>TRABALHO forçado. Organização Internacional do Trabalho. Disponível em: www.ilo.org/brasilia/temas/trabalho-</p><p>escravo/lang--pt/index.htm. Acesso em: 25 abr. 2022.</p><p>Trabalhador colhe cana</p><p>em fazenda sob inspeção</p><p>da Justiça do Trabalho.</p><p>A fiscalização, realizada</p><p>por auditores,</p><p>procuradores e</p><p>pela Polícia Rodoviária</p><p>Federal, visava coibir</p><p>a prática de trabalho</p><p>análogo à escravidão.</p><p>Teixeira de Freitas</p><p>(BA), 2017.</p><p>1. De acordo com o artigo 149 do Código Penal brasileiro, explique com as</p><p>suas palavras o que é trabalho análogo à escravidão.</p><p>2. Sobre o trabalho análogo à escravidão no Brasil atual, faça um levan-</p><p>tamento dos seguintes dados:</p><p>a) perfil de idade e gênero desses trabalhadores;</p><p>b) regiões do Brasil com o maior número de casos registrados de trabalho análogo à</p><p>escravidão;</p><p>c) setores que mais utilizam esse tipo de mão de obra.</p><p>Te</p><p>m</p><p>a</p><p>Co</p><p>nt</p><p>emporâneo Transversal</p><p>Trabalho</p><p>Degradante: indigno;</p><p>que provoca degradação.</p><p>Reclusão: neste caso,</p><p>prisão.</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>K</p><p>ar</p><p>im</p><p>e</p><p>X</p><p>av</p><p>ie</p><p>r/</p><p>Fo</p><p>lh</p><p>ap</p><p>re</p><p>ss</p><p>http://www.ilo.org/brasilia/temas/trabalho-escravo/WCMS_393066/lang--pt/index.htm</p><p>http://www.ilo.org/brasilia/temas/trabalho-escravo/WCMS_393066/lang--pt/index.htm</p><p>http://www.ilo.org/brasilia/temas/trabalho-escravo/lang--pt/index.htm</p><p>http://www.ilo.org/brasilia/temas/trabalho-escravo/lang--pt/index.htm</p><p>196</p><p>A ordem escravocrata</p><p>O sistema escravocrata era mantido ativamente pelo governo português, que</p><p>garantia a chegada de africanos para manter o funcionamento das atividades eco-</p><p>nômicas. Na colônia, a escravidão se sustentava por uma complexa cadeia de as-</p><p>pectos sociais e morais. Qualquer ação contrária à ordem era duramente reprimida</p><p>pelos senhores ou pelos representantes do governo.</p><p>Era uma sociedade de rígida hierarquia, na qual a maioria das pessoas perma-</p><p>necia nas mesmas condições sociais por toda a vida. Formou-se assim uma popu-</p><p>lação dividida entre livres e cativos, negros e brancos.</p><p>A relação entre senhores e cativos era baseada no castigo, ato que mantinha a</p><p>ordem, a disciplina e a obediência. Essa punição, porém, deveria ter um limite para</p><p>não despertar no escravizado um sentimento de revolta e também para preservar</p><p>a vida do cativo, de modo que pudesse seguir trabalhando.</p><p>Para o senhor, o castigo muitas vezes deveria ser de-</p><p>monstrado publicamente, para que todas as pessoas pre-</p><p>senciassem e tomassem como exemplo. Dessa forma, o sis-</p><p>tema escravista anunciava quais seriam as consequências</p><p>previstas para aqueles que desafiavam as ordens impostas.</p><p>Portanto, o que os senhores pretendiam era manter o</p><p>medo e o respeito por sua autoridade. Além de empregar</p><p>a violência, impunham o ritmo do serviço e a organização</p><p>das tarefas. Não por acaso o feitor era responsável tanto</p><p>pelas ordens do dia quanto pelas punições.</p><p>O castigo aos escravizados</p><p>Um dos importantes cronistas da colonização portuguesa na América foi o padre jesuíta Antonil, que</p><p>nasceu na península Itálica em 1649 e, logo após se formar, mudou-se para Salvador, onde permaneceu</p><p>até sua morte. Leia um trecho a seguir.</p><p>No Brasil, costumam dizer que para o escravo são necessários três PPP, a saber, pau, pão e pano. E, posto</p><p>que comecem mal, principiando pelo castigo que é o pau, contudo, prouvera a Deus que tão abundante fosse o</p><p>comer e o vestir como muitas vezes é o castigo, dado por qualquer causa pouco provada, ou levantada; e com</p><p>instrumentos de muito rigor [...].</p><p>ANTONIL, Padre. André João. Cultura e opulência do Brasil por suas drogas e minas. Disponível em:</p><p>www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=1737. Acesso em: 14 abr. 2022.</p><p>1. Com base na leitura e no que estudou até aqui, explique o que você</p><p>entendeu do texto de Antonil.</p><p>2. Caracterize as condições dos escravizados com base na afirmação: “para o</p><p>escravo são necessários três PPP, a saber, pau, pão e pano”.</p><p>Múltiplas leituras</p><p>Augustus Earle. Punição de escravo no calabouço. c. 1820.</p><p>Aquarela 23,6 cm × 26,3 cm. Para sustentar um clima de</p><p>medo entre os escravizados, era comum que eles fossem</p><p>punidos publicamente.</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>Reprodução/Biblioteca Nacional, Camberra, Austrália</p><p>http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=1737</p><p>197</p><p>Vida de cativo</p><p>Nas grandes fazendas, a maior parte das pessoas escravizadas era africana ou</p><p>filhos de africanos. Chamamos de afrodescendentes os filhos e netos de africanos,</p><p>muitos nascidos</p><p>na colônia e também mantidos como escravizados. Eles traziam</p><p>vivas na memória as referências da África.</p><p>Entre os bantos, por exemplo, um dos povos africanos que foram mais escravi-</p><p>zados na América, a família assumia grande importância e se constituía de um jeito</p><p>bem diferente daquele existente entre os europeus. As pessoas se uniam pela ideia</p><p>de um ancestral comum, isto é, um antepassado considerado importante para to-</p><p>dos que pertenciam àquele grupo. Todas as gerações que mantinham a memória</p><p>daquele antepassado, seus parentes e outros que se uniam a eles, formavam o que</p><p>chamamos de linhagem.</p><p>Acostumados a migrar para lugares distantes, cada banto era responsável por</p><p>reconstruir sua família no novo local de moradia. É por isso que a palavra senzala</p><p>tem origem no idioma banto: na época do tráfico, significava “povoado”. Em terras</p><p>americanas, a senzala foi local de reconstrução de antigos povoados, famílias e há-</p><p>bitos africanos, como veremos mais adiante.</p><p>Entre as maneiras de enfrentar a escravidão e tentar criar um espaço de liberdade</p><p>na América, havia o caminho da revolta e da fuga. O mais comum, porém, eram as</p><p>práticas cotidianas, como a forma-</p><p>ção de família, as crenças religio-</p><p>sas e os pequenos rendimentos que</p><p>alimentavam a esperança da alfor-</p><p>ria – perspectiva remota, mas ain-</p><p>da assim possível. Nas cidades, por</p><p>exemplo, os escravizados de ga-</p><p>nho, aqueles que saíam para reali-</p><p>zar serviços fora da residência do</p><p>senhor, poderiam economizar se ar-</p><p>recadassem um valor excedente ao</p><p>combinado e, eventualmente, com-</p><p>prar sua própria liberdade.</p><p>Alforria: carta</p><p>ou documento</p><p>que concede</p><p>liberdade</p><p>à pessoa</p><p>escravizada.</p><p>Augustus Earle. Cena de negros dançando</p><p>o jongo (detalhe). c. 1822. Aquarela,</p><p>21 cm × 34 cm. Ao preservar hábitos e</p><p>costumes trazidos de seus locais de origem,</p><p>os escravizados afirmavam sua identidade e</p><p>buscavam melhorar suas condições de vida.</p><p>Te</p><p>m</p><p>a</p><p>Co</p><p>nt</p><p>emporâneo Transversal</p><p>Educação para</p><p>Valorização do</p><p>Multiculturalismo</p><p>nas Matrizes</p><p>Históricas</p><p>e Culturais</p><p>Brasileiras</p><p>Atividades</p><p>1. Como a instituição da escravidão era mantida na América portuguesa?</p><p>2. Explique as diferenças entre a constituição familiar dos bantos e a dos</p><p>europeus.</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>Reprodução/Biblioteca Nacional, Camberra, Austrália</p><p>198</p><p>Capoeira e jongo</p><p>Importante parte da cultura afro-brasileira, a roda de capoeira e o jongo são expressões consideradas</p><p>patrimônio imaterial do Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). A roda</p><p>de capoeira também é reconhecida como patrimônio da humanidade pela Unesco.</p><p>A Roda de Capoeira [...] é um elemento [...] onde se expressam simultaneamente o canto, o toque dos ins-</p><p>trumentos, a dança, os golpes, o jogo, a brincadeira, os símbolos e rituais de herança africana – notadamente</p><p>banto – recriados no Brasil.</p><p>RODA de Capoeira. Iphan. Disponível em: http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/66#:~:text=Patrim%C3%B4nio%20</p><p>Cultural%20Imaterial%20da%20Humanidade,Patrim%C3%B4nio%20Cultural%20Imaterial%20da%20Humanidade.</p><p>O Jongo no Sudeste é uma forma de expressão afro-brasileira que integra percussão de tambores, dança</p><p>coletiva e elementos de espiritualidade. É praticado nos quintais das periferias urbanas e em algumas comuni-</p><p>dades rurais do sudeste brasileiro.</p><p>[...]</p><p>O jongo consolidou-se entre os escravos que</p><p>trabalhavam nas lavouras de café e cana-de-</p><p>-açúcar, no sudeste brasileiro, principalmente no</p><p>vale do Rio Paraíba. Trata-se de uma forma de</p><p>comunicação desenvolvida no contexto da es-</p><p>cravidão e que serviu também como estratégia</p><p>de sobrevivência e de circulação de informações</p><p>codificadas sobre fatos acontecidos entre os an-</p><p>tigos escravos por meio de pontos que os capa-</p><p>tazes e senhores não conseguiam compreender.</p><p>JONGO no Sudeste. Iphan. Disponível em:</p><p>http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/59/.</p><p>Múltiplas leituras</p><p>O jongo ainda é praticado</p><p>por diferentes grupos de</p><p>afrodescendentes no Sudeste.</p><p>Foto em Campos dos</p><p>Goytacazes (RJ), 2019.</p><p>1. Você conhece alguma dessas manifestações culturais? Compartilhe suas impressões.</p><p>2. De acordo com o texto, qual era a importância do jongo na época da escravidão?</p><p>3. Em grupo, faça uma pesquisa em fontes impressas ou digitais para definir o que é o</p><p>patrimônio material e imaterial, apontando as diferenças entre as duas categorias e</p><p>exemplificando com bens culturais materiais e imateriais brasileiros.</p><p>4. Com base nas atividades anteriores, respondam: Qual é a importância da capoeira e do</p><p>jongo como patrimônios imateriais do Brasil?</p><p>� História e cultura africana e afro-brasileira. Nei Lopes. São Paulo: Barsa-Planeta, 2008.</p><p>Reconhecido pelo Prêmio Jabuti na categoria de didáticos e paradidáticos, este livro traça</p><p>um panorama histórico da presença africana no Brasil e busca evidenciar a importância</p><p>dos africanos e dos afro-brasileiros na formação da cultura brasileira.</p><p>Te</p><p>m</p><p>a</p><p>Co</p><p>nt</p><p>emporâneo Transversal</p><p>Educação para</p><p>Valorização do</p><p>Multiculturalismo</p><p>nas Matrizes</p><p>Históricas</p><p>e Culturais</p><p>Brasileiras</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>Chico Ferreira/Pulsar Imagens</p><p>http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/66#:~:text=Patrim%C3%B4nio%20Cultural%20Imaterial%20da%20Humanidade,Patrim%C3%B4nio%20Cultural%20Imaterial%20da%20Humanidade</p><p>http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/66#:~:text=Patrim%C3%B4nio%20Cultural%20Imaterial%20da%20Humanidade,Patrim%C3%B4nio%20Cultural%20Imaterial%20da%20Humanidade</p><p>http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/59/</p><p>199</p><p>Em família</p><p>Para todos os grupos sociais na América portuguesa, inclusive para os escra-</p><p>vizados, a família representava o principal ponto de apoio. Dados do século XIX</p><p>apontam que na região de Campinas (SP), por exemplo, 67% das mulheres escra-</p><p>vizadas eram casadas, e 80% das crianças cativas viviam com seus pais. Assim,</p><p>pode-se dizer que essa união familiar fazia parte do cotidiano da sociedade es-</p><p>cravocrata.</p><p>A formação de família entre os escravizados era permitida, e até mesmo incen-</p><p>tivada, pelos senhores. Com o nascimento de crianças na condição de cativas, o</p><p>senhor conseguia mais pessoas para trabalhar em sua propriedade. A família era</p><p>também uma forma de garantir mais controle sobre os escravizados, que passavam</p><p>a construir vínculos afetivos com o local e, por esse motivo, evitavam fugir e aban-</p><p>donar os parentes. Além disso, para impedir contestações e revoltas, os senhores</p><p>muitas vezes ameaçavam separar as famílias dos escravizados.</p><p>Entre os cativos, também, a formação de família trazia vantagens. Os paren-</p><p>tes se ajudavam e se apoiavam em momentos difíceis, quando, por exemplo, eram</p><p>castigados e precisavam de auxílio para curar suas feridas. A família trazia ainda</p><p>a possibilidade de unir recursos materiais, ampliar o controle sobre as atividades</p><p>realizadas nas casas e melhorar as condições de moradia.</p><p>O casamento, em geral, não era sacramentado pela Igreja católica e devia seguir</p><p>as regras do senhor, que normalmente só permitia a união entre homens de sua</p><p>confiança e mulheres que trabalhavam dentro de casa.</p><p>Jean-Baptiste Debret. Casamento de negros escravos de uma casa rica. 1834-1839. Litografia colorida à mão,</p><p>34 cm × 49 cm. O casamento de escravizados retratado por Debret é realizado por um clérigo, o que era incomum.</p><p>Re</p><p>pr</p><p>od</p><p>uç</p><p>ão</p><p>/C</p><p>ol</p><p>eç</p><p>ão</p><p>p</p><p>ar</p><p>tic</p><p>ul</p><p>ar</p><p>200</p><p>A moradia</p><p>O casamento entre escravizados era também uma maneira de conseguir um</p><p>espaço mais amplo de moradia do que aquele que se tinha normalmente nas sen-</p><p>zalas. Era comum que o senhor cedesse ao casal um espaço reservado na senzala</p><p>ou oferecesse um terreno em sua propriedade, onde era possível construir uma pe-</p><p>quena casa, muitas vezes feita à semelhança das existentes em algumas regiões da</p><p>África. Naquelas regiões, guerras e conflitos constantes tornavam necessário que</p><p>as habitações fossem muito simples, para que fosse fácil desmontá-las e remontá-</p><p>-las em locais mais seguros quando fosse preciso.</p><p>Apesar do tamanho reduzido</p><p>dessas casas, os moradores podiam estender a</p><p>ocupação pelas áreas próximas, onde realizavam pequenos trabalhos manuais e</p><p>tarefas domésticas, entre elas o cuidado com as crianças. Os amigos podiam ain-</p><p>da se reunir ali e descansar. Era comum que as danças e festas de origem africana</p><p>fossem realizadas nas proximidades das moradias dos casados.</p><p>Na habitação comum das senzalas, cada recinto era semelhante a uma cela,</p><p>com trancas e grades fechando as aberturas e, geralmente, compartilhado por</p><p>quatro indivíduos. Não havia privacidade. Com isso, o objetivo do senhor era redu-</p><p>zir a circulação interna, promover a intimidação e evitar não só os planos de fuga</p><p>dos escravizados, mas também reuniões, festas ou atividades noturnas que os dei-</p><p>xassem sem energias para o trabalho no dia seguinte.</p><p>Johann Moritz</p><p>Rugendas. Habitação</p><p>de negros (detalhe).</p><p>c. 1830. Litografia</p><p>colorida à mão,</p><p>51,3 cm × 35,5 cm.</p><p>Nessa representação,</p><p>é possível observar</p><p>escravizados em</p><p>momento de</p><p>descanso e convívio.</p><p>Recinto:</p><p>cômodo; espaço</p><p>fechado.</p><p>Atividades</p><p>1. Explique a importância do casamento entre escravizados:</p><p>a) para os senhores; b) para os cativos.</p><p>2. Como a formação familiar afetava a vida dos escravizados?</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>Re</p><p>pr</p><p>od</p><p>uç</p><p>ão</p><p>/C</p><p>ol</p><p>eç</p><p>ão</p><p>p</p><p>ar</p><p>tic</p><p>ul</p><p>ar</p><p>201</p><p>No interior da senzala, o fogo era sempre mantido aceso. Suas chamas assu-</p><p>miam significado especial: para vários povos da África Central, representavam a</p><p>principal ligação com o mundo dos espíritos e com os ancestrais da família. Acredi-</p><p>tava-se que a sua fumaça aprisionava o espírito dos ancestrais, protegendo e man-</p><p>tendo unido o lar e as pessoas de seu interior. O fogo seria, portanto, responsável</p><p>pela manutenção da linhagem.</p><p>O fogo trazia vantagens práticas, ao garantir maior conforto material. Na mora-</p><p>dia dos casais, por exemplo, não havia janelas ou chaminés, seguindo os moldes</p><p>africanos. A única ligação com a área externa era a porta de entrada. As paredes,</p><p>em pau a pique, permitiam circular correntes de ar e a água da chuva. Diante</p><p>dessas condições, o fogo ajudava a controlar a temperatura e a umidade interna:</p><p>bastava aumentar ou diminuir as chamas conforme as condições climáticas.</p><p>A fumaça, por sua vez, funcionava como uma espécie de verniz que protegia</p><p>os materiais utilizados na construção, além de ajudar a conservar alimentos, afastar</p><p>insetos e facilitar o preparo da comida.</p><p>Manter acesa a sua chama era bem mais fácil para aqueles que constituíam</p><p>família e conseguiam ter a própria casa em uma parte isolada da propriedade,</p><p>distante dos olhares do senhor.</p><p>É importante notar que, apesar dessa importante função como local de conví-</p><p>vio, as senzalas eram também um ambiente hostil e demonstravam a violência do</p><p>sistema escravista. Trata-se de um dos aspectos da sociedade desigual que seria</p><p>construída com base nessa organização.</p><p>Pau a pique:</p><p>técnica de</p><p>construção</p><p>feita de varas</p><p>entrecruzadas</p><p>de madeira</p><p>(ripas) e barro.</p><p>Verniz:</p><p>substância</p><p>utilizada para</p><p>recobrir metais,</p><p>madeiras,</p><p>couros e outros</p><p>materiais.</p><p>Senzala</p><p>preservada na</p><p>comunidade</p><p>quilombola de</p><p>Machadinha, no</p><p>município de</p><p>Quissamã (RJ).</p><p>Foto de 2019.</p><p>Atividades</p><p>1. Explique a importância do fogo aceso pelos escravizados em suas moradias.</p><p>2. Qual era a função da senzala dentro do sistema escravista?</p><p>3. Com base no que estudou até aqui, aponte as diferentes maneiras pelas quais os senhores</p><p>buscavam exercer controle sobre os escravizados.</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>C</p><p>es</p><p>ar</p><p>D</p><p>in</p><p>iz</p><p>/P</p><p>ul</p><p>sa</p><p>r</p><p>Im</p><p>ag</p><p>en</p><p>s</p><p>202</p><p>Nosso mundo</p><p>Os retornados</p><p>Alguns africanos escravizados que foram trazidos para a América portuguesa, depois de libertos,</p><p>conseguiram retornar à sua terra natal.</p><p>Atualmente, no litoral de Gana, antiga Costa do Ouro, na África, encontra-se uma comunidade conhe-</p><p>cida por tabons, nome que tem origem na expressão “está bom?”. São cerca de 2 mil pessoas com um</p><p>passado comum: descendem de sete famílias de africanos escravizados que retornaram do Brasil, em</p><p>1836. Hoje, seus descendentes fazem parte de um grupo conhecido por brasileiros de Gana, mesmo</p><p>sem falar o português, tampouco conhecer o outro lado do Atlântico.</p><p>Assim como eles, na África existem outras comunidades de retornados do Brasil. Alguns foram expul-</p><p>sos pelo governo português em contexto de revoltas, como veremos na Unidade 5 do 8º ano, e outros</p><p>resolveram retornar à África por conta própria. Alforriados, buscavam uma nova perspectiva próximo à</p><p>terra de origem, muitas vezes com uma pequena porção de ouro para iniciar pequenos ou grandes ne-</p><p>gócios, inclusive relacionados ao tráfico de escravizados. Esse é o caso de Joaquim d’Almeida, alforriado</p><p>que ajudou a fundar uma pequena cidade,</p><p>Agoué, no litoral do atual Benim.</p><p>Na África, vários desses retornados</p><p>eram chamados de brasileiros, identidade</p><p>mantida até os dias de hoje. Alguns deles,</p><p>enriquecidos, assumiram papel de destaque</p><p>em suas comunidades. Francisco Olympio,</p><p>outro traficante de escravizados retornado</p><p>do Brasil, por exemplo, estabeleceu-se em</p><p>Agoué no final dos anos 1860. Formou, en-</p><p>tão, uma extensa família com sete mulheres</p><p>e vinte e três filhos.</p><p>� Há uma outra comunidade no Benin, antigo Reino do Daomé, chamada de Agudás. Essa</p><p>comunidade também é formada por africanos que retornaram da Bahia e voltaram a viver</p><p>na África, sendo hoje também reconhecidos como “baianos do Benin”.</p><p>Em grupo, pesquise em fontes impressas e digitais sobre a origem dos Agudás, con-</p><p>siderando as seguintes informações: quando foram escravizados; como viveram nessa</p><p>condição no Brasil; e como conseguiram retornar à África. Busquem descobrir também a</p><p>cultura e o modo de vida atual desses africanos que se reconhecem como descendentes</p><p>de brasileiros.</p><p>Francis Zaqueu Santiago Peregrino</p><p>(c. 1851-1919), jornalista e editor na</p><p>África do Sul, em foto de 1903. Santiago</p><p>Peregrino era afro-brasileiro, da primeira</p><p>geração dos nascidos em Accra, África,</p><p>filho de Zaqueu Francisco, um dos</p><p>retornados em 1836.</p><p>Reprodução/Coleção particular</p><p>203</p><p>Resistência à</p><p>escravidão</p><p>Entre os trabalhadores escravizados, foram inúmeras as formas de resistir à</p><p>escravidão. Muitos africanos, assim que desembarcavam em portos da América</p><p>portuguesa e eram vendidos a algum proprietário nos mercados de escravizados,</p><p>começavam a planejar ações para escapar daquela situação.</p><p>Entre essas formas, destacaram-se a fuga, a negociação por melhores condi-</p><p>ções de vida e trabalho, o conflito direto com feitores e senhores e a formação</p><p>de quilombos.</p><p>Pelo caminho da fuga, em grupos ou</p><p>sozinhos, os escravizados abandonavam as</p><p>fazendas e as casas de seus senhores. Pro-</p><p>curavam ir a lugares distantes, embrenhan-</p><p>do-se nas matas ou se escondendo nas</p><p>imediações das cidades e em lugares de</p><p>difícil acesso para não serem encontrados.</p><p>No entanto, a fuga nem sempre era bem-</p><p>-sucedida. Muitas vezes, eles eram recaptu-</p><p>rados por capitães do mato, como eram</p><p>chamados os capatazes do senhor, que ti-</p><p>nham a função de perseguir os que fugiam</p><p>e trazê-los de volta à fazenda ou à cida-</p><p>de. Quando isso ocorria, os escravizados</p><p>eram duramente castigados e até marcados</p><p>na pele com ferro quente, indicando que se</p><p>tratava de um escravizado que havia fugido.</p><p>Além disso, viver em fuga, escondendo-</p><p>-se pelos matos, era uma tarefa muito difícil.</p><p>Os fugitivos precisavam encontrar comida e</p><p>locais seguros para sua sobrevivência, vi-</p><p>vendo afastados das pessoas com as quais</p><p>tinham relações de trabalho e afeto.</p><p>2</p><p>Johann Moritz Rugendas. Capitão do Mato. 1835. Litografia</p><p>colorida à mão, 51,3 cm × 35,5cm. Os capitães do mato</p><p>perseguiam escravizados fugidos com o objetivo de capturá-los</p><p>e levá-los de volta ao senhor.</p><p>Atividades</p><p>� Quem eram os capitães do mato e qual era a sua função?</p><p>Re</p><p>pr</p><p>od</p><p>uç</p><p>ão</p><p>/C</p><p>ol</p><p>eç</p><p>ão</p><p>p</p><p>ar</p><p>tic</p><p>ul</p><p>ar</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>204</p><p>Procuram-se escravizados fugidos</p><p>No século XIX, os jornais publicavam notícias, trechos de novelas literárias</p><p>e anúncios variados de</p><p>serviços, produtos e também de pessoas escravizadas. Além disso, os jornais eram um canal em que os</p><p>proprietários de escravizados anunciavam a busca pelos fugitivos, oferecendo recompensa em dinheiro</p><p>para quem os trouxesse de volta ou, ao menos, indicasse seu paradeiro.</p><p>Múltiplas leituras</p><p>Além de anúncios em</p><p>jornais, era comum</p><p>que os proprietários</p><p>de escravizados</p><p>espalhassem cartazes</p><p>como o da imagem,</p><p>impresso no Rio de</p><p>Janeiro em 1854.</p><p>Veja a seguir um dos anúncios publicados, possivelmente na década de 1850, que hoje é importante</p><p>documento histórico.</p><p>50$00 de gratificação</p><p>Fugiu de Francisco Antônio Ribeiro, de sua chácara do rio Cumprido na vila da Serra</p><p>uma sua escrava de nome Benedita, altura baixa, cor de formiga com dois dentes tirados da</p><p>frente, com uma cicatriz debaixo do queixo, muito civilizada, e com um dedo da mão direita</p><p>aleijado por ter sofrido de uma paranisço, desconfia-se andar pelos sertões da mesma vila</p><p>ou por essa cidade procurando essas pessoas que costumam dar asilo a escravos fugidos</p><p>para os comprar por força e a troca do barato: quem dela der notícia pegá-la, metê-la na</p><p>cadeia, ou entregá-la nesta cidade ao Sr. Antonio Francisco Ribeiro, ou na vila da Serra a seu</p><p>Sr. será gratificado com a quantia acima, e protesta-se com todo rigor das leis contra quem</p><p>a tiver acoitado.</p><p>DEL PRIORE, Mary. Documentos de História do Brasil: de Cabral aos anos 90.</p><p>São Paulo: Scipione, 1997. p. 17.</p><p>1. Com base na leitura, identifique:</p><p>a) o tema tratado no texto;</p><p>b) o período em que foi escrito;</p><p>c) sua finalidade.</p><p>2. Sobre a mulher escravizada a que o anúncio se refere, responda às questões.</p><p>a) Quais são suas características?</p><p>b) O que o texto quer dizer com “civilizada” ao se referir a essa mulher?</p><p>3. Analise o seguinte trecho: “pessoas que costumam dar asilo a escravos fugidos para os com-</p><p>prar por força e a troca do barato”. Em sua opinião, qual é o significado dessa passagem?</p><p>Panarisço</p><p>ou panariz:</p><p>inflamação</p><p>dos dedos,</p><p>geralmente</p><p>junto à raiz das</p><p>unhas.</p><p>A troca do</p><p>barato: por</p><p>preço inferior.</p><p>Acoitado:</p><p>escondido.</p><p>Re</p><p>pr</p><p>od</p><p>uç</p><p>ão</p><p>/F</p><p>un</p><p>da</p><p>çã</p><p>o</p><p>B</p><p>ib</p><p>lio</p><p>te</p><p>ca</p><p>N</p><p>ac</p><p>io</p><p>na</p><p>l,</p><p>Ri</p><p>o</p><p>de</p><p>Ja</p><p>ne</p><p>iro</p><p>, R</p><p>J</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>205</p><p>Os quilombos</p><p>Os agrupamentos dos escravizados que fugiam, o lugar onde se fixavam e as</p><p>comunidades que formavam eram chamados de quilombos, uma importante forma</p><p>de resistência desses grupos. Durante séculos, quilombos foram criados em diver-</p><p>sas partes do Brasil, construindo comunidades de africanos e seus descendentes</p><p>que se opunham à escravidão.</p><p>Os primeiros quilombos surgiram ainda no século XVI em locais distantes das</p><p>fazendas, escondidos nas matas. Surgiam em áreas de intensa atividade econômica,</p><p>como nos atuais territórios da região Nordeste, onde havia produção açucareira, e</p><p>de Minas Gerais e Goiás, que se destacaram na mineração ao longo do século XVIII,</p><p>como veremos na próxima Unidade. No século XIX, com o início da industrialização</p><p>e da urbanização, surgiram também quilombos próximos às cidades.</p><p>Era comum que esses grupos estivessem preparados para o confronto armado,</p><p>no caso de serem descobertos. Alguns quilombos chegavam a reunir centenas ou</p><p>milhares de pessoas, chamadas de quilombolas. Ainda hoje existem no Brasil</p><p>quilombos com comunidades remanescentes, que buscam preservar as tradições e</p><p>os costumes dos povos africanos e afrodescendentes.</p><p>Kalunga (1790-1888)</p><p>Trombetas (1866-1888)</p><p>Maracanã e Macajaúba (século XIX)</p><p>Turiaçu (século XVIII)</p><p>Preto Cosme (1838)</p><p>Cumbe (1831)</p><p>Palmares (1630-1895)</p><p>Jacuípe e Jaguaribe (1705-1706)</p><p>Maragojipe e Muritiba (1713)</p><p>Campos de Cachoeira (1714)</p><p>Orobó, Tupim e Andaraí (1796-1797)</p><p>Camisão (1726)</p><p>Taperoá, Canavieiras (1733)</p><p>Nazaré e Santo Amaro (1734)</p><p>Jacobina e Rio das Contas (1735-1736)</p><p>Jacobina e Xique-Xique (1801)</p><p>e</p><p>Otizeiro (1807)</p><p>Buraco do Tatu (1744-1765)</p><p>Nossa Senhora dos Males</p><p>e Cabula (1807)</p><p>Urubu (1826)</p><p>Brasil:</p><p>Fronteiras atuais</p><p>Pindaituba, Motuca e</p><p>Joaquim Teles (1795)</p><p>Carlota (ou Piolho) (1770-1795)</p><p>Campo Grande, Isidoro,</p><p>Rio das Mortes e Rio das Velhas,</p><p>Ambrósio, imediações de Sabará</p><p>e Ouro Preto (século XVIII)</p><p>Manuel Congo (1838)</p><p>Luanda (1880)</p><p>Iguaçu (ou Bomba), Estrela,</p><p>Gabriel (século XIX)</p><p>Jabaquara (sem data)</p><p>Negro Lucas, Arroio Quilombo</p><p>e Rio Pardo (sem data)</p><p>Alagoa e Enseada</p><p>do Brito (sem data)</p><p>OCEANO</p><p>PACÍFICO</p><p>OCEANO</p><p>ATLÂNTICO</p><p>Equador</p><p>0°</p><p>Trópico de Capricórnio</p><p>50º O</p><p>0 180 360 km</p><p>Atividades</p><p>1. Com base no mapa, responda:</p><p>a) Você já ouviu falar de algum desses quilombos? Compartilhe com a turma o que sabe</p><p>sobre eles.</p><p>b) Em que região está concentrado o maior número de quilombos? Explique como isso se</p><p>relaciona com as atividades realizadas naquele local.</p><p>2. Observe o mapa e anote os quilombos que existiam na região onde você mora. Depois,</p><p>pesquise se hoje existem comunidades remanescentes em um desses locais e busque</p><p>informações sobre sua situação atual.</p><p>Principais quilombos (séculos XVII-XIX)</p><p>Fonte: SCHWARCZ, Lilia Moritz;</p><p>REIS, Letícia Vidor de Souza (org.).</p><p>Negras Imagens: ensaios sobre</p><p>cultura e escravidão no Brasil.</p><p>São Paulo: Edusp, 1996.</p><p>Te</p><p>m</p><p>a</p><p>Co</p><p>nt</p><p>emporâneo Transversal</p><p>Educação para</p><p>Valorização do</p><p>Multiculturalismo</p><p>nas Matrizes</p><p>Históricas</p><p>e Culturais</p><p>Brasileiras</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>A</p><p>llm</p><p>ap</p><p>s</p><p>206</p><p>Quilombo dos Palmares</p><p>Um dos quilombos que se destacaram ao longo da história do Brasil, por ter</p><p>sido o maior e que por mais tempo durou, foi o Quilombo dos Palmares. Formado</p><p>ao final do século XVI por africanos escravizados fugidos dos engenhos da capita-</p><p>nia de Pernambuco, ele estava localizado na Serra da Barriga, uma região de difícil</p><p>acesso onde, hoje, fica o município de União dos Palmares, no estado de Alagoas.</p><p>Grande parte dos moradores de Palmares eram bantos que vinham de Angola, na</p><p>África. Construíram o quilombo, assim, inspirados em sua cultura, buscando recriar,</p><p>de certa forma, o modo de vida e a organização política que tinham em suas terras.</p><p>O quilombo era constituído por um conjunto de núcleos populacionais chama-</p><p>dos mocambos e cercado por paliçadas – uma espécie de cerca de madeira fei-</p><p>ta com estacas apontadas e fincadas</p><p>na terra, além de fossos cheios de es-</p><p>trepes, espinhos espalhados no fundo</p><p>da vala. Todo esse arsenal de defesa</p><p>se fazia necessário porque, em diver-</p><p>sas ocasiões, Palmares sofreu ataques</p><p>orquestrados pelas autoridades colo-</p><p>niais, que não podiam admitir a exis-</p><p>tência de um local que representava</p><p>abrigo garantido aos cativos fugitivos.</p><p>No local onde era o Quilombo dos</p><p>Palmares, há hoje um parque memorial,</p><p>que busca reconstituir o cenário em que</p><p>viveram os quilombolas. Parque Memorial</p><p>Quilombo dos Palmares, União dos</p><p>Palmares (AL), 2019.</p><p>Atividades</p><p>1. Observe a foto do Parque Memorial Quilombo dos Palmares, leia a legenda e responda:</p><p>a) As construções do parque são da época em que o Quilombo dos Palmares existiu? Como</p><p>você chegou a essa conclusão?</p><p>b) É possível observar a presença de pessoas na foto. O que você acha que elas estão</p><p>fazendo?</p><p>c) Em sua opinião, qual é a função de um local como esse?</p><p>� Quilombo (1984). Direção: Cacá Diegues. 127 min.</p><p>A história narrada no filme tem início em 1650, quando um grupo de escravizados</p><p>se rebela e ruma para o Quilombo dos Palmares, onde uma nação de ex-escravizados</p><p>fugidos resiste ao cerco colonial. Entre eles está Ganga Zumba, um dos pioneiros na</p><p>resistência contra a escravidão e que se tornaria líder de Palmares.</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>Marcelino Luis/Fotoarena</p><p>207</p><p>Em Palmares, além de africanos e seus descendentes, viviam indígenas e ho-</p><p>mens brancos, ainda que em minoria, sob o comando dos bantos. Eram comuns as</p><p>investidas que faziam em fazendas próximas para resgatar escravizados e pegar</p><p>armas e mantimentos, e mesmo os ataques a viajantes que circulavam pela região.</p><p>Durante as invasões holandesas no Brasil no século XVII, muitos engenhos fo-</p><p>ram desarticulados</p><p>durante as guerras entre portugueses e flamengos, criando</p><p>uma possibilidade para que muitos escravizados fugissem e se refugiassem em</p><p>Palmares. Importante ressaltar que Palmares se constituía de vários mocambos,</p><p>sendo um dos mais importantes o mocambo de Macacos, que contava com mais</p><p>de 5 mil habitantes.</p><p>Em Palmares, o conjunto de mocambos ficava subordinado a um núcleo onde</p><p>morava o chefe ou líder do quilombo. Zumbi foi o líder guerreiro mais conhecido e</p><p>que, hoje, se tornou símbolo de liber-</p><p>dade. Cada mocambo tinha seu che-</p><p>fe, que fazia parte de um conselho</p><p>que governava todos os quilombolas.</p><p>Seus moradores viviam do cultivo da</p><p>terra, produzindo seu próprio alimen-</p><p>to, além da caça e da pesca. Faziam</p><p>também seus tecidos, seus potes e</p><p>cestas para armazenar grãos e bebi-</p><p>das, e também seus instrumentos de</p><p>trabalho e armas.</p><p>Palmares foi completamente des-</p><p>truído em 1694 pelas expedições</p><p>militares organizadas pelas autorida-</p><p>des coloniais. No entanto, enquanto</p><p>a escravidão perdurou, novos quilom-</p><p>bos foram criados por todo o Brasil.</p><p>Atividades</p><p>1. A planta anterior foi desenhada por expedicionários contratados por portugueses com a</p><p>finalidade de conhecer o quilombo para, assim, poder invadi-lo e destruí-lo. Os portugueses</p><p>não toleravam a existência dessas comunidades de negros livres.</p><p>Tomando como referência a imagem, desenhe em seu caderno a planta de um quilombo,</p><p>considerando que ele poderia ter:</p><p>� casas para moradia;</p><p>� torres de vigilância;</p><p>� oficina de metalurgia para a fabricação de ferramentas e armas;</p><p>� oficina de tear para produção de tecidos;</p><p>� horta e pomar;</p><p>� paliçadas para a proteção e defesa do quilombo.</p><p>Planta do Quilombo Buraco do Tatu, feita em 1764. O quilombo</p><p>ficava na Bahia, nas proximidades de Salvador.</p><p>Re</p><p>pr</p><p>od</p><p>uç</p><p>ão</p><p>/A</p><p>rq</p><p>ui</p><p>vo</p><p>H</p><p>is</p><p>tó</p><p>ric</p><p>o</p><p>U</p><p>ltr</p><p>am</p><p>ar</p><p>in</p><p>o,</p><p>L</p><p>is</p><p>bo</p><p>a,</p><p>P</p><p>or</p><p>tu</p><p>ga</p><p>l</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>208</p><p>Cartas a autoridades</p><p>As cartas destinadas a autoridades são evidências históricas muito importantes, porque dão pistas</p><p>não só de fatos relatados por elas, mas também da visão de mundo de quem as escreveu e das relações</p><p>sociais do período em questão.</p><p>A carta a seguir, escrita pelo governador de Pernambuco, é endereçada ao rei de Portugal.</p><p>Há alguns anos que, dos negros de Angola fugidos ao rigor do cativeiro e fábricas dos engenhos desta</p><p>capitania, se formaram povoações numerosas pela terra entre os Palmares e matos, cujas asperezas e faltas de</p><p>caminhos os têm mais fortificados por natureza do que pudera ser por arte e, crescendo cada dia em número, se</p><p>adiantam tanto no atrevimento que com contínuos roubos e assaltos fazem despejar muita parte dos moradores</p><p>desta capitania mais vizinhos aos seus mocambos, cujo exemplo e conservação vai convidando cada dia aos</p><p>mais que fogem, por se livrar do rigoroso cativeiro que padecem, e se verem com a liberdade lograda no fértil das</p><p>terras e segurança de suas habitações.</p><p>COUTINHO, Fernão de Souza. Carta ao rei de Portugal. 1º de junho de 1671. In: INÁCIO, C. Inês e LUCA, Tânia Regina de.</p><p>Documentos do Brasil Colonial. São Paulo: Ática, 1993. p. 77-78. (Série Fundamentos).</p><p>Múltiplas leituras</p><p>Leia agora uma carta escrita por Esperança Garcia,</p><p>escravizada que trabalhava numa fazenda do Maranhão,</p><p>no atual Nordeste do Brasil, junto a seu marido e seus</p><p>filhos. Certo dia, seu senhor resolveu vendê-la a outro</p><p>senhor chamado capitão Antonio Vieira de Couto.</p><p>Como havia sido alfabetizada por padres jesuítas (a</p><p>maioria dos escravizados não sabia escrever), ela resol-</p><p>veu então escrever a seguinte carta – que podemos cha-</p><p>mar também de petição – ao governador da capitania:</p><p>Eu sou uma escrava de Vossa Senhoria da administra-</p><p>ção de capitão Antonio Vieira de Couto, casada. Desde que</p><p>o capitão lá foi administrador, que me tirou da Fazenda dos</p><p>Algodões, onde vivia com meu marido, para ser cozinheira</p><p>de sua casa, passo muito mal. A primeira é que há grandes</p><p>trovoadas de pancadas em um filho, uma criança, que lhe</p><p>fez extrair sangue pela boca; em mim não posso explicar</p><p>que sou um colchão de pancadas, tanto que caí uma vez do</p><p>sobrado abaixo apeada; por misericórdia de Deus escapei.</p><p>A segunda estou eu e mais minhas parceiras por confessar</p><p>há três anos. E uma criança minha e duas mais por batizar. Pelo que peço a Vossa Senhoria</p><p>pelo amor de Deus e do Seu valimento ponha os olhos em mim ordenando, digo, mandar o</p><p>Procurador que me mande para a fazenda onde ele me tirou, para eu viver com meu marido</p><p>e batizar minha filha.</p><p>GARCIA, Esperança. In: ROSA, Sônia e HESS, Luciana (ilustr.). Quando a escrava Esperança Garcia</p><p>escreveu uma carta. Rio de Janeiro: Pallas, 2012.</p><p>1. Em um dicionário, busque o significado das palavras que você desconhece nos textos.</p><p>2. Com base na leitura das cartas, indique:</p><p>a) a autoria, o período e o local onde cada uma foi escrita;</p><p>b) as situações relatadas;</p><p>c) seus objetivos;</p><p>d) sua importância como fonte histórica.</p><p>3. Levando em conta as informações identificadas na atividade anterior, responda: Qual des-</p><p>sas cartas você imagina que era mais comum à sua época? Explique sua resposta.</p><p>Petição:</p><p>solicitação</p><p>escrita;</p><p>requerimento.</p><p>Cópia da carta escrita por Esperança Garcia,</p><p>preservada no Arquivo Público do Piauí, em</p><p>Teresina (PI).</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>Re</p><p>pr</p><p>od</p><p>uç</p><p>ão</p><p>/A</p><p>rq</p><p>ui</p><p>vo</p><p>P</p><p>úb</p><p>lic</p><p>o</p><p>do</p><p>E</p><p>st</p><p>ad</p><p>o</p><p>do</p><p>P</p><p>ia</p><p>uí</p><p>, T</p><p>er</p><p>es</p><p>in</p><p>a,</p><p>P</p><p>I</p><p>209</p><p>A negociação</p><p>Nem todos os escravizados que fugiam das fazendas ou das vilas e cidades</p><p>se refugiavam em um quilombo. Muitos passavam a viver em um lugar distante e se</p><p>apresentavam como pessoas livres. Assim, procuravam recomeçar uma nova vida</p><p>tentando trabalhar em troca de pagamento.</p><p>Outras vezes, para negociar melhores condições de vida, os africanos escravi-</p><p>zados podiam, por exemplo, sabotar a produção ou destruir as safras, envenenar os</p><p>senhores e sua família, promover fugas individuais ou coletivas, planejar rebeliões</p><p>que muitas vezes se espalhavam por diversas fazendas e pelos núcleos urbanos.</p><p>Os fugitivos podiam, ainda, se abrigar em uma fazenda próxima e pedir ao</p><p>proprietário que conversasse com o seu senhor e negociasse os termos do seu</p><p>retorno ao trabalho. Muitas vezes isso ocorria quando o motivo da fuga estava</p><p>relacionado aos duros castigos que o escravizado recebia e à exploração máxima</p><p>de sua força de trabalho, em jornadas longas e condições precárias de existên-</p><p>cia. Dessa forma, ele concordava em voltar ao trabalho quando as reivindicações</p><p>eram aceitas pelo seu senhor.</p><p>Dessa maneira, apesar de a</p><p>pessoa escravizada não ter ne-</p><p>nhum direito, podendo ser punida</p><p>ou vendida quando o proprietário</p><p>assim o quisesse, os cativos foram</p><p>adotando estratégias para resistir</p><p>à opressão dos seus senhores. Em</p><p>alguns casos, conseguiam reduzir</p><p>seus castigos, evitar a separação</p><p>das famílias, montar uma roça e</p><p>manter algumas práticas culturais</p><p>de sua origem.</p><p>Não era incomum também a</p><p>adoção de outras estratégias de</p><p>resistência no dia a dia, algumas</p><p>pela dissimulação, ou seja, fingin-</p><p>do que estavam doentes, ou pela</p><p>redução do ritmo de trabalho sem</p><p>que o feitor percebesse. Alguns</p><p>até mesmo quebravam suas fer-</p><p>ramentas de trabalho no campo,</p><p>como as enxadas e as foices.</p><p>Paul Harro-Harring. Brasileiro</p><p>acreditando ter reconhecido escrava</p><p>fugitiva. c. 1840. Nanquim, aquarela e</p><p>guache sobre papel, 32 cm × 20,9 cm.</p><p>Re</p><p>pr</p><p>od</p><p>uç</p><p>ão</p><p>/I</p><p>ns</p><p>tit</p><p>ut</p><p>o</p><p>M</p><p>or</p><p>ei</p><p>ra</p><p>S</p><p>al</p><p>le</p><p>s</p><p>210</p><p>Outros buscavam uma proximidade com o</p><p>senhor ou seus feitores e capatazes, mostran-</p><p>do-se dóceis e obedientes para conseguir um</p><p>tratamento menos cruel. Eram os chamados la-</p><p>dinos, escravizados conhecedores das regras</p><p>da sociedade escravista, que dominavam bem</p><p>a língua do senhor e eram mais familiarizados</p><p>com o trabalho imposto a eles. Diferentes dos</p><p>chamados boçais, a maioria recém-chegados</p><p>da África, desconhecedores das regras da es-</p><p>cravidão e não falantes do português.</p><p>Jean-Baptiste Debret. O jantar no Brasil,</p><p>c. 1830.</p><p>Litografia colorida à mão, 16 cm × 13 cm.</p><p>Na representação de Debret, é possível observar</p><p>escravizados que trabalhavam na casa dos senhores.</p><p>Organização e reivindicação</p><p>O documento abaixo foi escrito por trabalhadores escravizados de um engenho de</p><p>açúcar na Bahia em 1789, no fim do século XVIII. Ele é um tratado, isto é, uma propos-</p><p>ta de acordo com o senhor do engenho chamado Manuel da Silva Ferreira. O tratado foi</p><p>escrito no momento em que eles se negaram a trabalhar e interromperam a produção</p><p>de açúcar do engenho. Leia a seguir alguns trechos.</p><p>[...] queremos paz e não queremos guerra; se meu se-</p><p>nhor também quiser nossa paz há de ser nessa conformida-</p><p>de [...] nos há de dar os dias de sexta-feira e de sábado para</p><p>trabalharmos para nós [...]. Para podermos viver, nos há de</p><p>dar rede, tarrafa e canoas [...] quando quiser fazer camboas</p><p>e mariscar mande os seus Pretos Minas [...]. Na planta de</p><p>mandioca, nós homens queremos que só tenham tarefa</p><p>de duas mãos e meia e as mulheres de duas mãos [...]. Os</p><p>atuais feitores não os queremos, faça eleição de outros com</p><p>a nossa aprovação [...] além da camisa de baeta que se lhe</p><p>dá, hão de ter gibão de baeta e todo vestiário necessário</p><p>[...]. Poderemos plantar nosso arroz onde quisermos, e em</p><p>qualquer brejo, sem que para isso peçamos licença, e po-</p><p>deremos cada um tirar jacarandás ou qualquer pau sem</p><p>darmos parte para isso. [...] A estar por todos os artigos aci-</p><p>ma, e conceder-nos estar sempre de posse da ferramenta,</p><p>estamos prontos para o servirmos como dantes, porque não</p><p>queremos seguir os maus costumes dos mais Engenhos [...]. Podemos brincar, folgar, cantar</p><p>em todos os tempos que quisermos sem que nos empeça e nem seja preciso licença.</p><p>In: REIS, João José; SILVA, Eduardo. Negociação e conflito. A resistência negra no Brasil escravista.</p><p>São Paulo: Companhia das Letras, 1979. p. 123-124.</p><p>1. Com base na leitura do documento, responda:</p><p>a) Qual é a situação descrita pelo autor?</p><p>b) Qual é a sua finalidade?</p><p>c) Por que podemos considerá-lo uma resistência por meio da negociação?</p><p>Múltiplas leituras</p><p>Camboa: lago artificial à beira-</p><p>-mar cavado para aprisionar</p><p>peixes quando a maré sobe.</p><p>Esteiro que só tem água</p><p>durante a maré cheia.</p><p>Pretos Minas: africanos que</p><p>têm origem na Costa da Mina,</p><p>região do litoral africano em</p><p>cujos portos eram embarcadas</p><p>as pessoas escravizadas.</p><p>Tarefa: quantidade de cana</p><p>cortada; porção.</p><p>Baeta: tecido felpudo, de lã.</p><p>Gibão: casaco de couro.</p><p>Jacarandá: árvore utilizada</p><p>para extração da madeira.</p><p>Reprodução/Museus Castro Maya, Rio de Janeiro, RJ</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>211</p><p>As rebeliões</p><p>Além das estratégias de resistência do dia a dia, da fuga e da negociação, os</p><p>escravizados também adotavam outros recursos contra a escravidão, mais radicais:</p><p>eram as revoltas ou as rebeliões.</p><p>Nas senzalas, eles formulavam planos para matar seus senhores e feitores, in-</p><p>cendiar as fazendas, plantações, engenhos ou casas-grandes, muitas vezes mobi-</p><p>lizando escravizados de outras fazendas.</p><p>As rebeliões ocorreram em diferentes tempos e lugares na América portuguesa.</p><p>Na região das Minas, ao longo do século XVIII, muitos escravizados se rebelaram,</p><p>armando-se e atacando seus senhores. Na Bahia, no início do século XIX, levantes</p><p>de negros promoveram ataques aos seus proprietários e às forças policiais que pro-</p><p>curavam reprimir as revoltas.</p><p>Uma das revoltas mais importantes desse período ocorreu no ano de 1835 na</p><p>cidade de Salvador e ficou conhecida como Revolta dos Malês. Ela foi liderada por</p><p>africanos libertos, seguidores da religião muçulmana, que planejaram um levante</p><p>armado, mobilizando pessoas escravizadas e libertas, além de colonos livres.</p><p>De acordo com os documentos da épo-</p><p>ca, particularmente os processos judiciais</p><p>que procuraram incriminar os participantes</p><p>da revolta, o propósito dos Malês era exter-</p><p>minar a população branca da cidade, extin-</p><p>guir a escravidão, atacar igrejas e órgãos do</p><p>governo da província da Bahia.</p><p>Porém, antes de iniciar a revolta, os ma-</p><p>lês foram denunciados e acabaram domina-</p><p>dos pelas forças policiais. Depois de presos,</p><p>os revoltosos e seus líderes foram condena-</p><p>dos a penas que variaram de açoites a de-</p><p>portações, prisões e condenações à morte.</p><p>Jean-Baptiste Debret. Negra da Bahia,</p><p>c. 1830. Litografia colorida à mão,</p><p>24 cm × 32 cm. Acredita-se que o acessório que</p><p>a mulher está usando é um amuleto muçulmano,</p><p>indicando que, assim como muitos africanos</p><p>escravizados que foram levados para</p><p>a Bahia, ela seguia essa religião.</p><p>O termo "malê" vem de imale, que significa</p><p>muçulmano na língua iorubá.</p><p>Atividades</p><p>� Elabore um quadro-resumo com as principais formas de resistência dos</p><p>escravizados no Brasil.</p><p>Reprodução/Museus Castro Maya, Rio de Janeiro, RJ</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>212212</p><p>3 Bandeirantes, jesuítas</p><p>e escravidão indígena</p><p>Na América portuguesa, a maioria dos cativos era de origem africana, mas isso</p><p>não significa que os povos indígenas foram deixados de lado. A relação entre euro-</p><p>peus e nativos começou de forma amistosa, quase sem pretensões, e os estrangei-</p><p>ros procuravam estabelecer comércio com os povos locais. Em troca das especia-</p><p>rias da terra, davam-lhes pequenos objetos, como ferramentas de ferro e espelhos.</p><p>Coube aos nativos garantir a sobrevivência daqueles que vinham de longe e</p><p>nada sabiam sobre a região local. Ensinaram os estranhos a comer, a se abrigar</p><p>e até a se divertir. Essa relação, porém, mudou radicalmente quando o interesse</p><p>pela terra se transformou e os estrangeiros passaram a transferir para cá enor-</p><p>mes recursos capazes de gerar riqueza. Nesse novo contexto, os indígenas torna-</p><p>ram-se cativos, mas por um caminho bem diferente daquele imposto aos africanos.</p><p>O comércio de indígenas escravizados impunha uma série de dificuldades.</p><p>Faltava uma estrutura local voltada para esse tipo de negócio, como a existente</p><p>na África. A comunicação entre as várias partes do território ainda era difícil, pela</p><p>ausência de caminhos internos e, principalmente, pelas dificuldades para navegar</p><p>pela costa. Os nativos conheciam também o local e resistiam ao trabalho forçado.</p><p>Na imagem a seguir, uma litogravura do artista francês Jean-Baptiste Debret,</p><p>que veio ao Brasil no início do século XIX, podemos identificar soldados indígenas</p><p>conduzindo indígenas capturados. Embora a gravura tenha sido feita muito tem-</p><p>po depois do fato representado – o</p><p>apresamento indígena pelos paulis-</p><p>tas (bandeirantes) no século XVII –,</p><p>ela nos revela que alguns grupos</p><p>indígenas foram recrutados nas</p><p>iniciativas de captura (apresamen-</p><p>to) do chamado gentio. Dessa for-</p><p>ma, podemos notar como eles se</p><p>aliavam aos bandeirantes nas ex-</p><p>pedições realizadas pelo sertão</p><p>paulista naquele período.</p><p>Jean-Baptiste Debret. Soldados índios</p><p>de Curitiba (detalhe), c. 1835. Litografia</p><p>colorida à mão, 49 cm × 34 cm.</p><p>Gentio: como</p><p>os indígenas</p><p>eram chamados.</p><p>Reprodução/Coleção particular</p><p>213</p><p>Violência permanente</p><p>Muitos indígenas morreram no contato com os conquistadores, vítimas de</p><p>doenças como a varíola. Além de uma drástica redução populacional, a mortalidade</p><p>provocou forte impacto em suas comunidades e ocasionou a fuga de diversos</p><p>povos para o interior do continente. A situação abriu espaço inclusive para a Coroa</p><p>portuguesa proibir a escravização dos indígenas, cedendo às pressões da Igreja.</p><p>Segundo a instituição, os nativos eram seres que desconheciam a palavra de</p><p>Deus e deviam, por isso, ser catequizados. Muitos foram reunidos em missões e</p><p>reduções organizadas por ordens religiosas como a dos jesuítas. Nesses lugares,</p><p>tiveram sua cultura transformada, aprendendo o trabalho sistemático que a produ-</p><p>ção do açúcar, por exemplo, requeria.</p><p>Na busca por mão de obra para seus negócios, muitos colonos atacavam as</p><p>missões ou reduções para escravizar os nativos. Os portugueses criaram leis que</p><p>permitiam a escravização dos indígenas pelos colonos em certas ocasiões. Pela</p><p>chamada guerra justa, a escravização</p><p>indígena era autorizada como forma de se</p><p>defender dos ataques dos povos que resistiam ao avanço da colonização. Diver-</p><p>sos povos nativos foram dizimados dessa maneira por sertanistas, bandeirantes e</p><p>aventureiros.</p><p>Por seu conhecimento do território, muitos indígenas eram incluídos em expe-</p><p>dições exploratórias pelo interior do continente. Ajudavam na busca, por exemplo,</p><p>de metais preciosos ou na captura de outros cativos, inclusive africanos fugidos.</p><p>Nesse cenário, um número significativo de indígenas se incorporou espontanea-</p><p>mente à empreitada colonial portuguesa, misturando-se aos colonos, formando fa-</p><p>mília, trocando hábitos e costumes.</p><p>No entanto, ainda que muitos indígenas tenham se incorporado à lógica co-</p><p>lonial, até mesmo por meio da miscigenação, não podemos esquecer que as</p><p>populações nativas foram dizimadas durante o processo de invasão e coloniza-</p><p>ção europeia no Brasil.</p><p>Aimé-Adrien</p><p>Taunay. Alguns</p><p>Bororos visitam</p><p>o senhor Riedel</p><p>e Taunay na</p><p>casa que eles</p><p>ocupavam perto</p><p>de seu vilarejo</p><p>(detalhe), 1827.</p><p>Alguns indígenas</p><p>se integraram</p><p>espontaneamente</p><p>no projeto colonial</p><p>da nova sociedade</p><p>que começava a</p><p>se formar.</p><p>Re</p><p>pr</p><p>od</p><p>uç</p><p>ão</p><p>/A</p><p>rq</p><p>ui</p><p>vo</p><p>d</p><p>a</p><p>A</p><p>ca</p><p>de</p><p>m</p><p>ia</p><p>214</p><p>Nosso mundo</p><p>Os indígenas hoje</p><p>Muitos povos indígenas foram extintos, alguns conseguiram sobreviver e outros</p><p>inventaram novas formas para existir. Os sobreviventes mantêm até hoje um rico</p><p>patrimônio cultural e linguístico. No Brasil de hoje existem mais de 250 povos indí-</p><p>genas identificados, com língua e costumes próprios.</p><p>Segundo dados do Censo de 2010, eles somam uma população de cerca de 897 mil</p><p>pessoas, espalhadas pelo território brasileiro. Boa parte dessa população está situada</p><p>nas regiões Norte e Centro-Oeste.</p><p>Indígenas Kuikuri no ritual do</p><p>Kuarup, no Parque Indígena do</p><p>Xingu. Querência (MT), 2021.</p><p>� Com um grupo de colegas, faça uma pesquisa a respeito de um dos</p><p>atuais povos indígenas do Brasil. Sobre o povo escolhido, identifiquem:</p><p>a) a região que habita;</p><p>b) a população;</p><p>c) suas principais características culturais;</p><p>d) principais problemas enfrentados e o encaminhamento das soluções.</p><p>Te</p><p>m</p><p>a</p><p>Co</p><p>nt</p><p>emporâneo Transversal</p><p>Educação para</p><p>Valorização do</p><p>Multiculturalismo</p><p>nas Matrizes</p><p>Históricas</p><p>e Culturais</p><p>Brasileiras</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>� Povos indígenas no Brasil. Disponível em: https://pib.socioambiental.org/pt/Página_</p><p>principal. Acesso em: 6 maio 2022.</p><p>Uma das principais referências sobre o tema, o site reúne diversas informações sobre</p><p>os povos indígenas que habitam o território brasileiro.</p><p>Ri</p><p>ca</p><p>rd</p><p>o</p><p>Te</p><p>le</p><p>s/</p><p>Pu</p><p>ls</p><p>ar</p><p>Im</p><p>ag</p><p>en</p><p>s</p><p>https://pib.socioambiental.org/pt/Página_principal</p><p>https://pib.socioambiental.org/pt/Página_principal</p><p>As bandeiras</p><p>Como vimos em Unidades anteriores, as bandeiras eram expedições organiza-</p><p>das pelos paulistas, também chamados de bandeirantes, que partiam para o inte-</p><p>rior no século XVII.</p><p>Do planalto paulista, afastado do litoral e dos engenhos de açúcar na capitania</p><p>de São Vicente, os bandeirantes procuraram diferentes caminhos que os levassem</p><p>às regiões dos atuais estados de Mato Grosso, Goiás e Minas Gerais, e também em</p><p>direção ao rio da Prata, para acessar territórios sob controle dos espanhóis e dos</p><p>povos Guarani. Algumas expedições, ainda, foram beneficiadas pelos peabirus,</p><p>caminhos abertos por diferentes povos indígenas em território americano.</p><p>Entre os principais objetivos dos bandeirantes estavam o apresamento de in-</p><p>dígenas e a busca de metais preciosos – seriam eles a descobrir ouro na região</p><p>de Minas Gerais no fim desse século, como veremos na próxima Unidade. Havia</p><p>também bandeirantes contratados para capturar escravizados fugidos ou atacar</p><p>quilombos, no chamado sertanismo de contrato.</p><p>Outro propósito das bandeiras era abastecer o interior e estabelecer comuni-</p><p>cação entre diferentes vilas e cidades, por meio das monções. Essas expedições</p><p>percorriam o curso de rios, como o rio Tietê, que então se apresentava como um</p><p>caminho natural para o interior, no atual estado de São Paulo.</p><p>Naquele período, a lavoura paulista era bastante modesta: plantava-se trigo,</p><p>mandioca, feijão e milho, o que obrigava os habitantes a buscar novas fontes de</p><p>alimento e outros recursos. As famílias paulistas eram mamelucas, isto é, pessoas</p><p>que nasceram da união entre portugueses e mulheres indígenas. Os mamelucos</p><p>tinham uma cultura mestiça, incorporando muitas características do saber e viver</p><p>indígena e sua cultura.</p><p>215</p><p>Monumento às Bandeiras, em São Paulo</p><p>(SP), 2022. Atualmente, muitas pessoas</p><p>questionam homenagens como essa,</p><p>já que os bandeirantes tiveram papel</p><p>importante na escravização dos indígenas.</p><p>Ju</p><p>lio</p><p>R</p><p>ic</p><p>co</p><p>/</p><p>Sh</p><p>ut</p><p>te</p><p>rs</p><p>to</p><p>ck</p><p>Atividades</p><p>1. Sobre os bandeirantes, explique:</p><p>a) o contexto em que surgiram; b) seus objetivos.</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>216</p><p>Durante as bandeiras, muitos exploradores invadiram aldeias indígenas e cap-</p><p>turaram nativos para escravizá-los, mesmo com restrições impostas pela Coroa</p><p>portuguesa a essa prática, como estudamos. Eles eram depois vendidos para</p><p>trabalhar em engenhos no litoral ou nas casas de paulistas. Em reação a esses</p><p>ataques, em algumas ocasiões os indígenas chegaram a liquidar as bandeiras.</p><p>Foi também comum o conflito entre bandeirantes e colonos, especialmente os</p><p>jesuítas que estavam envolvidos com a cataquese dos indígenas. Algumas missões</p><p>foram atacadas por bandeirantes, que sabiam da concentração de mão de obra in-</p><p>dígena nesses locais.</p><p>O declínio e o desaparecimento das bandeiras ocorreram no século XVIII, parti-</p><p>cularmente em razão da decadência da atividade mineradora e pela abertura de vias</p><p>terrestres a caminho de Goiás. Embora tenham desbravado o território americano,</p><p>expandindo as fronteiras inicialmente definidas pelo Tratado de Tordesilhas, contri-</p><p>buíram para o extermínio de povos indígenas e o despovoamento de muitas áreas.</p><p>Aurélio</p><p>Zimmermann.</p><p>Pouso de Monção</p><p>no Sertão Bruto,</p><p>1920. Óleo</p><p>sobre tela,</p><p>103 cm × 135 cm.</p><p>Os bandeirantes</p><p>iniciavam pelo rio</p><p>Tietê, no atual</p><p>estado de São</p><p>Paulo, as viagens</p><p>em direção ao</p><p>interior do Brasil.</p><p>Atividades</p><p>1. Observe a imagem e responda:</p><p>a) Qual é a situação representada?</p><p>b) Quem são as pessoas que participam do fato retratado? Quais são suas características?</p><p>c) Por que os bandeirantes estão disfarçados de jesuítas? Qual você imagina que era o pro-</p><p>pósito desse disfarce?</p><p>2. Utilize o banco de palavras a seguir e escreva no caderno um texto de 5 a 10 linhas</p><p>sobre a relação entre bandeirantes, jesuítas e indígenas, destacando os conflitos entre</p><p>os grupos.</p><p>bandeirantes – bandeiras – captura – escravização – jesuítas – catequese – reduções – indígenas</p><p>Re</p><p>pr</p><p>od</p><p>uç</p><p>ão</p><p>/M</p><p>us</p><p>eu</p><p>P</p><p>au</p><p>lis</p><p>ta</p><p>d</p><p>a</p><p>U</p><p>SP</p><p>, S</p><p>ão</p><p>P</p><p>au</p><p>lo</p><p>, S</p><p>P</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>217</p><p>Diálogos com Literatura</p><p>A saga dos curumins</p><p>O escritor pernambucano Marconi Leal, em sua obra de ficção infantojuvenil Os es-</p><p>trangeiros, narra a saga de três meninos indígenas que veem sua aldeia invadida por</p><p>bandeirantes durante a colonização portuguesa na América.</p><p>Na história, os acontecimentos são narrados na perspectiva dos meninos indíge-</p><p>nas, os curumins Anhana, Saru e Nauru, do povo Eçaraia. Leia o trecho a seguir, que</p><p>relata o momento do ataque dos bandeirantes a sua aldeia.</p><p>Quem primeiro viu a aproximação foi Anhana, que correu para o centro da aldeia com</p><p>seus passos atabalhoados, gritando e acenando com os braços, em desespero. Mas não</p><p>dava para ouvir o que dizia. Só quando chegou aos poucos passos da tribo é que puderam</p><p>escutar seus berros:</p><p>— Eles estão chegando!</p><p>— Eles quem?</p><p>Mas não pôde ouvir a resposta, porque em seguida “eles” apareceram. Eram uns homens</p><p>brancos, barbudos, cabeludos, sujos, cheios de roupas coloridas e, principalmente, carregan-</p><p>do nos braços umas armas de pedra que cuspiam fogo. Alguns montavam uns bichos gran-</p><p>des de quatro patas, terríveis. Pareciam deuses.</p><p>— Socorro! – gritou a</p><p>mãe.</p><p>Num instante, todos os Eçaraias saíram de suas ocas e se reuniram naquele ponto cen-</p><p>tral, empunhando lanças, arcos e flechas. Mas foi impossível se defender. No momento mes-</p><p>mo em que Anhana chegou a um passo de Nauru, os homens brancos fizeram surgir o fogo</p><p>mágico de suas armas, que se espalhou pelos ares.</p><p>Eles gritavam palavras numa língua estranha e tinham os olhos vermelhos de raiva.</p><p>Nauru viu tios, primos, amigos e parentes caírem no chão, atingidos por aquela chuva de</p><p>chispas e raios. O desespero foi geral.</p><p>[...]</p><p>Na verdade, os Eçaraias sabiam que aquele dia chegaria e tinham se preparado para</p><p>o confronto. Notícias vindas de tribos vizinhas davam conta de uns certos homens de cor</p><p>branca, estranhos, parecidos com deuses, montados em onças gigantes e que tinham o po-</p><p>der do raio.</p><p>Vinham destruindo aldeias por onde passavam e levavam aprisionados os índios.</p><p>Alguns acreditavam que eles eram deuses mesmo. Ou seres da floresta. O certo é que</p><p>nenhum dos Eçaraias havia visto aquela gente de perto. Muitos nem mesmo acreditavam</p><p>que existissem de verdade.</p><p>LEAL, Marconi; SANTANA, Dave (ilustr.). Os estrangeiros.</p><p>São Paulo: Editora 34, 2012. p. 9-10.</p><p>1. Qual é a situação narrada no texto?</p><p>2. Como são descritos os “homens brancos” que atacaram a aldeia?</p><p>3. O que são as “armas de pedra que cuspiam fogo” e os “bichos grandes</p><p>de quatro patas” descritos pelos curumins?</p><p>4. Por que os curumins afirmam que os homens brancos pareciam “deuses”?</p><p>Atabalhoado: às pressas; atrapalhado.</p><p>Chispa: lampejo; faísca.</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>Para concluir</p><p>218</p><p>Retomar e avançar</p><p>1. No Brasil, a língua portuguesa sofreu forte influência indígena e africana. Do povo</p><p>africano Banto, originário da região central da África, herdamos muitas palavras e</p><p>expressões. Sobre o assunto, leia o poema e, depois, faça o que se pede.</p><p>A quitanda tem moganga,</p><p>coco, quiabo e dendê,</p><p>tem fubá, farofa e guando</p><p>maxixe, inhame e jiló</p><p>manjericão, mocotó</p><p>A quituteira foi lá.</p><p>Fez tareco e quibabá</p><p>tutu, curau e pirão</p><p>sarapatel, pururuca.</p><p>angu, quibebe e quindim</p><p>fez moqueca e mungunzá</p><p>Tem cachaça na moringa.</p><p>Tem cocada na cabaça</p><p>A cambada, enpanzinada,</p><p>zonza, bambeia e babau</p><p>GASPAR, Eneida Duarte; TAVARES, Victor (ilustr.). Falando banto. Rio de Janeiro: Pallas, 2007.</p><p>a) Procure no dicionário as palavras do texto que você desconhece e, depois,</p><p>escreva o significado delas no caderno.</p><p>b) Qual é o tema tratado no texto?</p><p>c) O que as palavras usadas pela autora em seu texto têm de semelhante entre si?</p><p>d) Com as palavras de origem banto destacadas a seguir, elabore uma pequena</p><p>história de ficção, de 5 a 10 linhas.</p><p>bagunça – cachimbo – cochilo – calombo – macaco – quitanda – moleque – zangar</p><p>2. Quais são as características das famílias de escravizados? Explique como elas</p><p>se formaram no Brasil.</p><p>3. Sobre a resistência dos escravizados submetidos ao cativeiro no Brasil, escreva</p><p>no caderno um texto de 5 a 10 linhas usando as palavras destacadas abaixo:</p><p>liberdade – negociação – resistência – fuga – quilombo – cativeiro</p><p>4. Quais foram as disputas entre os bandeirantes e os jesuítas na América</p><p>portuguesa? De que maneira esses grupos interagiam com os indígenas?</p><p>Não escreva</p><p>neste livro</p><p>Use seu</p><p>caderno</p><p>Te</p><p>m</p><p>a</p><p>Co</p><p>nt</p><p>emporâneo Transversal</p><p>Diversidade</p><p>Cultural</p><p>219</p><p>Produção final: etapa 7</p><p>Chegamos à última parte de pesquisa para elaboração do almanaque. Antes</p><p>de realizá-la é importante que você e seu grupo tenham chegado até aqui com as</p><p>outras etapas finalizadas e com as páginas do almanaque produzidas para a com-</p><p>posição final. Lembre-se, na próxima etapa teremos a apresentação e a entrega do</p><p>almanaque para a turma.</p><p>Os temas finais do almanaque estão relacionados à escravidão e exemplificam</p><p>a resistência praticada pelos africanos escravizados e seus descendentes no Bra-</p><p>sil: os quilombos e as rebeliões.</p><p>Ao longo desta Unidade, vocês estudaram dois grandes exemplos da resistên-</p><p>cia no Brasil: o Quilombo dos Palmares e a Revolta dos Malês. Baseando-se no</p><p>conhecimento sobre esses dois casos, busquem por outras experiências parecidas</p><p>que aconteceram no Brasil para compor o almanaque.</p><p>Sigam as orientações:</p><p>1. Aguardem a indicação do professor para saber qual tema deverá ser ela-</p><p>borado pelo grupo. Para o tema dos quilombos, busquem por diferentes</p><p>experiências que existiram no Brasil e escolham uma delas. Se for o tema</p><p>das revoltas e rebeliões, pesquisem aquelas pouco conhecidas pelo grupo</p><p>e selecionem um exemplo.</p><p>2. Definido o tema, busquem informações em fontes confiáveis. Deem preferên-</p><p>cia para informações ligadas a jornais, revistas de História e portais acadê-</p><p>micos. Anote as fontes consultadas para serem acrescentadas, posterior-</p><p>mente, à bibliografia do almanaque.</p><p>3. Para elaborar o texto, atentem-se à estrutura do almanaque: texto introdutó-</p><p>rio; curiosidades; indicações de livros, sites ou vídeos sobre o tema; citação</p><p>relacionada ao assunto; e uma data importante.</p><p>4. Busquem imagens que possam ilustrar o almanaque e coloquem-as com</p><p>as informações coletadas. Caso não consigam imprimi-las ou recortá-las,</p><p>experimentem fazer desenhos inspirados nessas imagens. Lembrem-se de</p><p>desenvolver com seu grupo um estilo único e criativo para as páginas do</p><p>almanaque.</p><p>Ainda nesta etapa, dediquem-se a unir todas as páginas produzidas, compor</p><p>a bibliografia com as fontes consultadas e elaborar a capa e o sumário do</p><p>almanaque.</p><p>A capa deve despertar a atenção do leitor e sintetizar os temas trabalhados,</p><p>podendo trazer uma ou mais imagens significativas. Neste ponto, lembrem-se também</p><p>de definir um título para o almanaque.</p><p>Por fim, numerem as páginas e construam um sumário, indicando onde se</p><p>encontra cada tema e a bibliografia consultada por vocês ao longo desta produção.</p>

Mais conteúdos dessa disciplina