Prévia do material em texto
<p>4 os MECANISMOS DE PROFISSIONALIZAÇÃO DOS ATORES E DAS ATRIZES No trecho anterior, discutimos os tensionamentos entre os fatores que definiram as produções teatrais do início e meados do século XX. Nesse momento, abordaremos panorama da produção teatral da época que permitiu a profissionalização de atores e atrizes ou de toda um coletivo de artistas da cena, ou seja, os mecanismos que definiram o panorama da produção teatral da época. De uma tendência a direcionar espectador a rin de situações em que espelham ironicamente a figura ridícula do próprio espectador. Esses aspectos nos direcionam a pensar acerca das competências e habilidades necessárias para executar com maestria os espetáculos, seja no teatro musicado, operetas, burletas, nos gêneros cômicos ou revistas de ano. Os dramas também eram encenados e exigiam dos profissionais habilidades necessárias para levar para a cena a profundidade dramática da trama e dos personagens. A época em que começaram a surgir os grandes ícones do teatro profissional brasileiro, como Procópio Ferreira (que estreou em 1919). Essa produção chamava-se Simpático Jeremias e protagonista foi interpretado pelo lator Leopoldo Fróes, esse papel ator manteve em seu repertório toda sua trajetória. Nessa trama, Jeremias é um criado que ópera solucionando os conflitos que permeiam as relações das personagens. Essas características compuseram estilo que foi nomeada de Comédia Nova. FIGURA 26 - ATOR PROCÓPIO FERREIRA FONTE: <https://bit.ly/39pLZ6> Acesso em: 21 nov. 2021. O fato de um criado operar a solução de problemas assemelha-se a um personagem conectado com a Commedia dell'Arte, Arlequin. A arquitetura cômica desse texto estava alinhada a peças clássicas do dramaturgo Molière desse autor, personagem Scapin. Outro texto que apresentava um panorama dos costumes da época foi texto Eu Arranjo Tudo, de Cláudio de Souza (1876-1954). Esse texto traz em 136</p><p>sua narrativa as traquinagens de um personagem chamado Bernardo que é responsável por todas as tarefas de seu local de trabalho e passa a confundir as tarefas e acaba solucionando as confissões que surgem. Essa comédia estreou em 22 de novembro de 1915, no Teatro Trianon. protagonista desta comédia também conecta a tradição cômica brasileira com a Commédia dell'Arte nessa espécie de trapalhão inteligente. Diversos costumes da época eram postos em cena nessa trama. Teatro Profissional dos anos de 1920 aos anos de 1950 foi marcado pela maestria de profissionais que conseguiram grande prestígio e competições por atuações de destaque. Os astros e estrelas surgiram nessa época com suas atuações espetaculares que arrastavam multidões. A fama e idolatria de atores da época permeava as condições da profissionalização de atores e atrizes. Astro era uma palavra utilizada com frequência e possui vários significados, dependendo seus usos e contextos. Os atores e atrizes considerados astros ou estrelas de teatro ocupavam lugares de prestígio, com destaque para as figuras masculinas e as figuras femininas ainda eram associadas a objetos de desejo ou objetos sexuais de uma sociedade estruturalmente preconceituosa e machista. De um local de destaque, grandeza, ou tirania a uma acepção de figura pejorativa. Em astronomia astro é todo corpo celeste que possui luz própria. Nesse sentido, o astro estava associado a aquele ator ou atriz que obtivesse enorme destaque em suas atuações artísticas. Os astros e estrelas orbitavam em rotas de enorme fama e geralmente, buscavam manter seu sucesso em carreiras longas. A corrida para chegar ao destaque ou manter-se no foco da cena modernista com todas as pompas que um astro ou estrela idealizavam talvez fosse uma tarefa difícil e um preço alto a pagar. Essas duas palavras, estrela e astro, são importantes para pensar a profissionalização de artista da cena. Uma constituição de atores e atrizes que reunissem habilidades múltiplas, com capacidade de atuar, dançar, cantar e com capacidade para atuar em comédias e dramas com versatilidade. Há uma certa subordinação a toda essa iluminação atribuída a um profissional da cena. Um artista da cena busca relacionar- se com seu público de maneira a cativar popularidade e influenciar gostos. Um astro poderia ser associado ao elemento sol, no sistema solar, anuncia metaforicamente que o ou atriz carrega em sua aura segredo mágico da atuação e da cena, sua personalidade estaria a habilidade de comunicação com seu público, de modo que deveria deter importantes elementos geradores de influência. A qualificação de um profissional da cena deveria abarcar domínio técnico e maestria em sua arte. ator e atriz dependia ainda de outros profissionais para que sua arte pudesse ser realizada. Escolas de arte dramática ofereciam cursos com apurado técnico, mas a maior escola de formação de profissionais da cena era a prática cotidiana, palco habitado pela cena teatral e os processos criativos ou produzir a apresentação de determinado espetáculo em determinado espaço. Neste sentido, a prática teatral seria ainda uma escola ou espaço para a formação e qualificação dos profissionais da cena. Assim, o astro e a estrela eram suportados por uma equipe preparada para que a encenação pudesse ocorrer com sucesso. astro e a estela de teatro "[...] além de 137</p><p>sujeito da cena e em cena, senhor de uma forma de expressão encantadora que a plateia adorava acompanhar, o astro era líder de sua categoria, artífice de sua companhia, mago da bilheteria, empresário e forjador do próprio ofício" (BRANDÃO, 2012, p. 459). astro e a estrela eram considerados artistas que construíam uma promissora carreira e conseguiam viver de sua arte estabelecendo relações entre as obras de arte teatrais e seu público. Os principais grandes astros e estrelas desse período foram João Caetano, Estela Sezefreda, Gabriela da Cunha, Eugênia Câmara, Adelaide do Amaral, Furtado Coelho, Lucinda Simões, Ismênia dos Santos, Vasques, Dias Braga, Martins, Rosa Villiot. Estes intérpretes buscavam par o palco toda vivacidade de seus personagens e no encontro com a plateia, concretizar o fenômeno teatral. Outros expoentes desse período foram Itália Fausta (1880-1951), Leopoldo Fróes Procópio Ferreira (1898-1979), Jaime Costa (1897-1967) e Dulcina de Moraes (1908-1996). Os artistas da cena profissionalizaram-se nos processos de criação teatral e na necessidade de aperfeiçoamento das práticas ligadas "[...] ao teatro de revista ou ligeiro, quer dizer, ao palco da opereta, da burleta, da farsa; subgêneros cómicos designados como menores por certa tradição". Nesse período de florescimento de um teatro rico em personagens tipo, músicas originais, figurinos carnavalescos destacaram-se outros nomes da cena brasileira modernista como "[...] Cinira Polónio, Iracema de Alencar, Abigail Maia, Machado Careca, Colás, Lucília Peres, Apolónia Pinto, Alda Garrido, Margarida Max, Otília Amorim, Aracy Cortes, Oscarito, Dercy Gonçalves, Grande Otelo e Eva Todor" (BRANDÃO, 2012, p. 459). capítulo a seguir, apresentará encenadores modernistas que se destacaram no cenário teatral brasileiro e seus feitos para pensarmos em um teatro que passou por evoluções específicas e apelos para os gostos das plateias. 5 ENSAIADORES E ENCENADORES MODERNISTAS BRASILEIROS A época do modernismo e décadas posteriores, o gênero que predominava era a comédia. Outros gêneros eram encenados, porém com menor ênfase. Algumas encenações mostravam temas como o vício no com cenários de cassino, com jogadores que buscavam recuperar os valores que perderam em jogo. Em 1913 dois espetáculos destacaram-se contendo enredo citado acima: Deu Pavão, de João Pinho e Bicheiro, de A. Elias da Silva, encenados no Bijou Salão, casa de espetáculos e cinema inaugurada em São Paulo em 1915. Armando Gonzaga foi um comediógrafo que escreveu inúmeras peças, dentre elas Ministro do Supremo que estrou no Teatro Trianon em 1921, e A Flor dos Maridos que estrou em 1922 no Teatro Recreio. As comédias de Gastão Tojeiro ou as de Armando Gonzaga eram estruturadas com um jogo de rapidez entre os diálogos, fluência e intimidade com a artesania do teatro ou com que chamamos de padrão cômico para a época. 138</p><p>FIGURA 9 CAPA DE DISCO COM MÚSICAS LANCADAS PELO CPC centro popular de cultura o povo canta o povo canta povo canta o povo canta FONTE: Acesso em: 21 jan. 2022. Nos anos de existência, o CPC um legado que influenciou outros grupos teatrais a resistirem aos duros golpes desferidos pelo governo ditatorial durante o regime que se instaurou na década de 1960. Em linhas gerais, CPC deixou iniciativas que contribuíram para desenvolvimento de práticas ligadas ao do teatro de rua que pudesse causar agitação e transformação social e da experimentação de possibilidades inovadoras quanto a um teatro que estava ligado aos movimentos políticos. Desse período surgiria a movimentação para desenvolvimento de um teatro produzido de forma coletiva, em todas as instâncias criativas. teatro resistiu aos tempos de repressão implementado pelo regime militar e com 4 TEATRO DE AUGUSTO BOAL Augusto Boal (1931-2009) foi um importante diretor, pesquisador, estudiosos e artista da cena que propôs abordagens tanto metodológicas de pensar teatro, quanto nos modos de acessar a arte teatral. Boal foi um dos dramaturgos que se dedicou para desenvolvimento de um teatro com características brasileiras. Sua carreira iniciou no Teatro Arena até evoluir para a criação do Teatro do Oprimido, abordagem teórico-prática que tornou Boal conhecido mundialmente. A principal intenção de Boal era desenvolver um teatro que ao mesmo tempo que traduzisse a realidade brasileira, pudesse mobilizar noções da opressão que as classes sociais estão submetidas diariamente. Teatro do Oprimido abarcava uma dimensão social e política ao propor que os espectadores pudessem ser ao mesmo tempo, observadores e atuantes, em suas propostas teatrais. Conectado com o Teatro Épico de Brecht ou Teatro Didático, a Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire e princípios marxistas e até comunistas, Boal 173</p><p>buscou formular um modo de pensar o teatro que oferecesse aos participantes, sejam eles artistas ou público, instrumentos para transformar sua própria realidade. teatro deveria estar à serviço das questões sociais, como meio de apresentar situações problema buscando soluções no âmbito coletivo para tais discussões. DICA Conheça a cronologia e a biografia de Augusto Boal e sua trajetória de artista da cena. Boal é considerado um dos mais importantes pesquisadores de teatro do Brasil. Acesse: http://augustoboal.com.br/vida-e-obra/ trabalho de Boal no teatro brasileiro é importante para entendermos a constituição cultural, e os modos de manifestações teatrais de uma época que os movimentos sociais marcaram um período de lutas por direitos de classes vulneráveis, intensificando a resistência dos grupos de artistas diante do regime repressor em que o Brasil foi mergulhado com a implantação da ditadura militar. Seus livros foram publicados em diversas línguas e países e seu trabalho recebeu ao longo de sua vida, inúmeros prêmios. FIGURA 10 - RETRATO DE AUGUSTO BOAL FONTE: Acesso em: 11 jan. 2022. Quando Boal retorna de seus estudos nos Estados Unidos, no Actors Studio, em Nova York, foi indicado por Sábato Magaldi a integrar Teatro de Arena. Arena estava estruturando suas propostas para que pudessem atingir seus objetivos. dirigente José Renato sentia que estava sobrecarregado e desejava fazer parcerias para que pudesse dividir as atividades que desempenhava na direção de espetáculos, questões administrativas e atividades ligadas a antiga TV Tupi de São Paulo (BETTI, 2013a). 174</p><p>O primeiro trabalho de Boal no Teatro de Arena foi uma novela intitulada Ratos e Homens, do dramaturgo John Steinbeck. Boal propôs uma abordagem de atuação que partia dos princípios de Constantin (1863-1938), com isso, o diretor ofereceu ao espetáculo certa naturalidade no que se refere a interpretação, apoiada em expressar psicologicamente as características dos personagens e a memória emotiva como fonte de criação deles. A proposta foi aceita de maneira satisfatória pelos espectadores e pelos críticos da época, mas Boal buscou dramaturgias brasileiras que não fossem repertório tradicional repleto de comédias de costumes, dramas específicos ou produções coactadas com os musicais. A opção foi buscar contos de autores brasileiros e adaptá-los para serem encenados. FIGURA 11 RETRATO CONSTANTIN STANISLAVSKI FONTE: Acesso em: 11 jan. 2022. Diante deste desafio, Boal encontrou alguns contos e tentou adaptá-los para o teatro, mas o sucesso esperado não ocorreu. Permanecia a necessidade de criar textos dramatúrgicos e de oferecer formação para atores e atrizes que pudesse atender aos ideais que Boal estava elaborando. Para isso o estudioso buscou em sua experiência de estágio no Actors Studio para elaborar um Curso Prático de Dramaturgia que teve início em 1956. Esse curso foi decisivo para que a renovação dramatúrgica ocorresse. Depois de implementar esse curso para que novos dramaturgos pudessem escrever textos para um teatro em desenvolvimento, Boal implementou o Laboratório de Interpretação. Nessa iniciativa o pesquisador aplicou técnicas originadas nas pesquisas de Stanislavski que experimentou no Actors Studio. Essa proposta buscava experimentar o desenvolvimento do trabalho de atuação baseado em caracterização psicológica das personagens (BETTI, 2013a). Curso de Dramaturgia mostrou a carência em criar outras iniciativas formativas na área teatral. Boal criou, então, o Curso Prático de Teatro oferecido para todos que tivessem interesse em estudar teatro. Nesse curso atuaram Décio de Almeida Prado, com aulas de Estética, e Sábato Magaldi, convidado para ministrar aulas de História do 175</p><p>Teatro. Dentro das atividades de formação oferecidas, Boal implementou seminários temáticos, discussões, aprofundamentos e laboratórios específicos para aprofundar temas ou teorias teatrais. Neste contexto de formação artística e discussão de novas estéticas teatrais, o TPE encontrou território repleto de possibilidades para a politização teatral e as modificações que o Teatro de Arena implementou. Nesse período, antes da década de 1960, o Teatro de Arena passou por dificuldades financeiras para manter suas atividades. Para tentar recuperar, José Renato buscou montar espetáculos leves e com certa elaboração das cenas para que pudesse atrair o maior público possível. Os espetáculos montados nesse período conseguiram bons resultados artísticos, mas não resolveram as crises que se instauravam no Arena. Para poderem se recuperar tentaram encenar textos de dramaturgos que colaboravam com o Teatro de Arena. Em 1957 estrearam Marido Magro, Mulher Chata com texto de Boal e, no ano seguinte, a adaptação do texto de Gianfrancesco Guarnieri, Eles Não Usam Black-Tie, estreou com enorme sucesso permanecendo em cartaz por dez meses. sucesso desse espetáculo foi decisivo para as montagens e a direção artística que o Arena tomaria. texto do dramaturgo Guarnieri retratava problemas sociais envolvendo classe proletária em uma comunidade periférica e sua realidade de vulnerabilidade social. espetáculo trazia conexões diretas com os contextos sociais de instabilidade política, greves e mobilizações por direitos trabalhistas. A estrutura de diálogos era coloquial, incomum para a época, a encenação atendeu às expectativas do TPE, bem como as expectativas dos demais artistas da cena que faziam parte do Teatro de Arena. A montagem impulsionou o fomento da criação de textos originais por parte dos integrantes do Teatro de Arena 2013a). Neste sentido, em 1958, os Seminários de Dramaturgia propunham a leitura e discussão de trabalhos dramatúrgicos produzidos no Arena. Neste sentido todos os integrantes apresentaram suas propostas de textos que posteriormente foram discutidos coletivamente. maior feito de Guarnieri na época, que atraiu olhares de Boal, foi a inserção de questões sociais, políticas e apresentar a realidade do ponto de vista do proletariado. Questões como lutas de classes, greves e lutas por direitos sociais até então não eram assuntos presentes nas encenações (BETTI, 2013b). FIGURA 12 CENA DO ESPETÁCULO CHAPETUBA FUTEBOL CLUBE FONTE: Acesso em: 11 jan. 2022. 176</p><p>Nos dez meses que a peça Black-tie permaneceu sendo exibida ao público, as tentativas de buscar um texto que pudesse suceder a produção de enorme sucesso frutificaram. Os Seminários produziram consensos e divergências de modo que escolheram Chapetuba Futebol Clube, textos de Oduvaldo Vianna Filho (1936-1974), dirigida por Augusto Boal (1931-2009). A tendência de discutir questões sociais e de refletir em torno das realidades das classes periféricas parecia uma abordagem de sucesso. A peça como fruto das discussões dos Seminários "[...] procurou trazer ao palco problemas sociais e coletivos envolvendo os setores majoritários da população, e para isso empenhou-se em aprofundar a pesquisa dos novos padrões de dramaturgia estabelecidos a partir da peça de Guarnieri" (BETTI, 2013a, p. 180). Essas inciativas definiram as formas dramatúrgicas e cênicas apresentadas no palco pelos diretores como Boal e seus parceiros. A intensificação dos debates, politização e os estudos críticos dos modos de encenação permitiram que uma nova abordagem na dramaturgia brasileira voltada para a representação de temas relacionados aos problemas sociais e políticos. Os universos das classes populares e suas questões sociais seriam bases para desenvolvimento das propostas teatrais e pedagógicas de Boal. teatro de Boal buscava maneiras de enfrentar, por meio de cenas teatrais, as dificuldades das classes exploradas pelo sistema capitalista e que certa mobilização política poderia ser a força que moveria os coletivos a se organizarem politicamente para operarem transformações. teatro de Augusto Boal passa a se desenvolver nos anos seguintes ao período de implementação da ditadura militar, ele sofre perseguições intensas tendo que, na década de 1970, pedir exílio, inicialmente na Argentina e posteriormente em Portugal. Nesse período ele desenvolveu sua proposta teatral que Boal intitulou de Teatro do Oprimido (TO). Alguns princípios são importantes para entender a proposta de Boal: um deles é a solidariedade, outro é a transformação social por meio do teatro. Teatro do Oprimido buscava envolver os participantes em ações teatrais que permitissem questionar os papéis sociais, as sujeições aos mecanismos capitalistas e traçar novas propostas de realidades. A liberdade fundamental como exercício da cidadania estava na base do TO e consistem em uma metodologia de trabalho que aborda dimensões políticas, sociais e artísticas. Boal creditava que todas as pessoas eram capazes de atuar e propunha exercícios teatrais que permitiam aos participantes interagirem assumindo os papéis que eram propostos para a resolução de conflitos. Com essa abordagem e outras propostas, Boal buscava estabelecer um processo teatral que dissolvia os limites entre os atores que executavam a peça, e os espectadores. Portanto: espectador não delega poderes ao personagem para que atue em seu lugar: ao contrário, ele mesmo assume um papel protagonizo, transforma a ação dramática inicialmente proposta, ensaia soluções possíveis, debate projetos modificadores: em resumo, o espectador ensaia preparando-se para a vida real (BOAL, 1975, p. 126). 177</p><p>Em "200 exercícios e jogos para o e não com vontade de dizer algo através do teatro", Augusto Boal sistematiza práticas teatrais para que sua proposta seja efetivamente praticada. O autor propõe ainda rompimento com a noção de quarta parede que, de certa forma, mantinha o espectador como um observador da obra teatral, para fazer do teatro um acontecimento coletivo que todos os envolvidos nesse ritual podem agir para revolucionar a realidade. FIGURA 13 AUGUSTO BOAL MINISTRANDO AULA FONTE: Acesso em: 21 jan. 2022. Noções como autonomia, papéis sociais, coletividade, bem comum estão presentes em sua proposta. Os jogos propostos pelo teatrólogo buscam a emancipação dos participantes de modo que a ação mecanizada dos corpos é posta em questão e as imposições sociais que formatam comportamento ou a obediência ao sistema de exploração é questionada. Logo: nenhuma oficina, encontro, ensaio ou qualquer atividade do Teatro do Oprimido deve terminar quando acaba: pelo contrário, deve projetar-se no futuro e produzir consequências individuais e por menores que sejam reais. Todo e qualquer evento do Teatro do Oprimido deve objetivar as ações sociais concretas e continuadas (BOAL, 2009, p. 186). Vale destacar que a criatividade e um corpo disponível para identificar os mecanismos que suprimem a liberdade dos corpos, que nos tornam reprodutores de um sistema de exploração que desumaniza e expõe os indivíduos a uma organização social desprovida de sensibilidade. O teatro de Boal dialoga com bases estéticas originadas do marxismo, das vertentes que pregam o bem comum e podemos ainda, conectar com os princípios da Pedagogia do Oprimido desenvolvida por Paulo Freire. Teatro Épico de Bertold Brecht também influenciou amplamente as abordagens de Boal. 178</p><p>INTERESSANTE O Teatro do Oprimido além de uma abordagem teórico-metodológica para ensino-aprendizagem de teatro, é um tema que gera pesquisas em diversas partes do mundo. No Brasil, Festival Internacional de Teatro do Oprimido, ocorre periodicamente para partilhar produções teatrais baseadas na Pedagogia e da produção do TO. Assista ao documentário Augusto Boal e Teatro do Oprimido, disponível em: https://bit.ly/3CLuD4h. Depois, faça buscas no YouTube e selecione vídeos ou entrevistas em que Boal apresenta suas ideias. 5 PENSAMENTO CRÍTICO E ESTÉTICO NO TEATRO BRASILEIRO A busca por autonomia de pensamento sem faz necessária frente aos desafios da contemporaneidade. Em tempos de crises sociais que ocorreram nas décadas de 1960, 1970 e 1980, propiciaram o desenvolvimento de iniciativas que estimulavam o pensamento crítico para o exercício da liberdade e da luta por direitos humanos ameaçados pelos regimes ditatoriais. Nesse contexto o teatro representava importante instrumento para que os espectadores pudessem assumir postura ativa diante das questões coletivas PATRIOTA, 2013). A arte possui a potência de provocar os corpos dos observadores e, por meio das experiências estéticas, elaborar o pensamento e as noções de si mesmo, dos contextos sociais e das camadas de realidade que o mundo oferece. teatro de Augusto Boal desafiava as estruturas sociais da época e por motivos do regime da ditadura militar, sofreu represálias ao ponto de ter que exilar-se em outros países para sobreviver. pensamento crítico pode ser desenvolvido por meio da ampliação de experiências reflexivas de pensamento, ampliação do repertório cultural e construção de saberes sobre si e sobre os contextos que o ser humano está inserido. A habilidade de refletir criticamente diante das situações sociais e individuais requer um pensar objetivo, ampliado, com múltiplas conexões e que possa tecer paralelos com conceitos teóricos e práticos. Ao apreciarmos uma obra de arte teatral, ou outra obra de arte, nosso corpo está exposto a situação de observador, apreciador e que estabelece conexões que podem estimular o corpo como um todo. Para esta experiência podemos atribuir o nome de experiência estética, aquela que é capaz de mobilizar as estruturas sensíveis do corpo e por meio dessas sensações mover um pensar global. Esse pensar pode dissolver as noções fragmentadas de corpo e instaurar dinâmicas de pensamento sensíveis e que valorizem produtos da cultura humana. Neste sentido, o teatro pode ser a manifestação 179</p><p>teatro contemporâneo dialoga com as áreas da arte como a dança, as artes visuais e o cinema para buscar compor obras que operam no plano da experiencia estética, das sensações ou das intensidades. Experimentos fluídos, borramento das fronteiras e embaralhamento de referenciais que permitem ampliar as possibilidades criativas do corpo em cena. Com a Performance Arte em jogo, numa produção teatral, as noções de personagem e de interpretação teatral são postas em xeque. A representação passa a dar espaço para uma apresentação das ações dos atores em cena. Os personagens passam a deixar de estar presentes, na noção do como se fosse, para ser o que é. que a cena exige de ação corporal para acontecer em intensidades, provocações cênicas e sensações (FERNANDES, 2008). A ação cênica modifica-se para dar espaço aos processos híbridos que subvertem os princípios do drama para construir uma teatralidade que busca estar conectada com a elaboração de sentidos enquanto ocorre. A obra de arte teatral rompendo com limites entre a vida e arte, ficção e realidade instaurando o momento fruitivo como experimentação estética. Nesta perspectiva, as produções com bases na Performance Arte podem apresentar esquemas de cenas inusitadas, provocadoras e que mesclam elementos da arte contemporânea e das áreas da arte. Estas produções conectam com as noções de teatralidade e de performatividade dos processos criativos e das experiências estéticas. A Performance Arte contribuiu para que o teatro pudesse avançar em termos de aproximar a arte e a vida, de provocar experiências teatrais inovadoras e intensas. No Brasil, o Teatro Oficina e o Teatro da Vertigem, que estudaremos adiante, são exemplos de coletivos que buscaram na performance arte inspiração para suas criações. Na medida em que os experimentos exploram possibilidades expressivas baseadas na Performance Arte, os universos da arte ou do teatro contemporâneo trazem para a discussão a teatralidade e a performatividade, é comum ocorrer a dissolução dos limites entre trabalho em progresso, entre dimensões ficcionais e reais, entre espaço da cena e do espectador, do ator e do performer (FERNANDES, 2008). A seguir discutiremos sobre a formação do ator em períodos pós ditadura e as perspectivas de retomada do teatro e da construção de uma identidade nacional. 4 TEATRO, CORPO E A FORMAÇÃO DO ATOR Pensar em formação de atores e atrizes ou de artistas da cena é abordar os modos que a própria atividade artística exige em cada contexto criativo de cada período da história do teatro. As necessidades de um contexto artístico e possibilidades de pesquisa de um corpo artístico presente, capaz de estar pronto ao exercício da arte teatral e preparado para fazer nascer um personagem, seja ele qual for a natureza. 200</p><p>Os modos de conceber as cenas e propostas teatrais pode influenciar nos processos formativos de atores. Um consenso na arte teatral é de que o corpo de atores e atrizes são elementos fundamentais para compor espetáculos de teatro. Mesmo no teatro de bonecos ou de formas animadas, o corpo é fundamental para que o teatro possa existir FUSER, 2013). Neste sentido, a formação do ator deveria iniciar pelo conhecimento de sua estrutura física, sensível e psíquica, para que possa dominar sua natureza e disponibilizá- la para a arte teatral. Em tempos antigos, quando a arte teatral ainda estava em seu início, as companhias precisavam ter um repertório diversificado, forçando os artistas a terem que dispor os recursos que estavam disponíveis para que as obras pudessem acontecer e manter o maior número possível de espectadores. Isso no século XIX e meados do século XX, em que as dificuldades de formação dos atores e atrizes era presente e as habilidades eram desenvolvidas na prática de ensaios e nas próprias temporadas de apresentações. Entretanto, os atores e atrizes eram formados pela prática e dedicação individual em buscar conhecimentos. elenco recebia suas falas, as separadamente conforme as orientações de diretores e as deixas, preparando dessa forma somente suas falas para no momento de o ensaio estabelecer a composição do jogo cênico necessário para que as cenas possam funcionar. Esse sistema ocorria no chamado "velho teatro" e por escassez de cursos profissionalizantes ou de programas de formação de atores e atrizes eficazes, a formação ocorria por duas vias: uma pela prática na própria atuação, aprender na ação e na imitação dos intérpretes mais experientes (ARAÚJO: FUSER, 2013). Nesta época existiam modelos que deveriam ser seguidos, os tipos físicos para cada papel e gestos, modos de entonar e outros recursos utilizados por atores de sucesso que que deveriam ser para que se pudesse adquirir o que era chamado do 'jeito Durante muitas décadas esse sistema esteve em vigor até surgirem iniciativas do ator brasileiro João Caetano a partir de 1861, de implementar cursos, palestras e trocas de conhecimentos tal como os artistas da cena europeus. Seus objetivos não foram alcançados, durante sua vida, sendo que faleceu em 1963. Somente três décadas depois desse fato que surgiu a primeira escola de teatro constituída pela iniciativa privada, fundada por Gomes Cardim em 1906 e chamava-se Conservatório Dramático e Musical de São Paulo FUSER, 2013). Somente em 1911 foi criada no Rio de Janeiro Escola Dramática Municipal, que hoje chama-se Escola de Teatro Martins Penna. A escola resistiu com crises e interrupções de suas atividades. Entre as décadas de 1920 e 1940 Renato Vianna apoia incansavelmente na criação de cursos de formação para atores e atrizes em diversas cidades, e uma delas foi Porto Alegre. Mesmo assim, a necessidade de formar artistas da cena era importante para que a qualidade da arte produzida pudesse ser aumentada. SNT (Serviço Nacional de Teatro) contribuiu para a criação do Curso Prático de Teatro (CPT), no Rio de Janeiro, em 1939. Décadas mais tarde viria a se transformar Conservatório Nacional de Teatro (1953-1969), hoje UNIRIO. 201</p><p>Na cidade de São Paulo, em 1948, o Dr. Alfredo Mesquita criou a EAD (Escola de Arte Dramática) que buscava formar artistas da cena para trabalharem no TBC (Teatro Brasileira de Comédia). diretor buscou os princípios de Copeau para desenvolver os percursos de formação da EAD. A escola permaneceu privada e trouxe outros profissionais além dos franceses, os diretores italianos, para que pudessem contribuir para a formação de atores e atrizes com certa qualidade. Essa ação permitiu que as propostas de formação que eram ofertadas na EAD tivessem qualidade conectadas com a arte teatral na modernidade. Em 1968, a USP passa a absorver a EAD, seus cursos teóricos transformam-se no departamento de Artes Cênicas da ECA-USP e curso que artes da EAD foi transformada em Escola Técnica de Formação de Atores anexada à Escola de Comunicação e Artes FUSER, 2013). No Rio de Janeiro, em 1951, Maria Clara Machado criou Tablado, um centro de formação de atores que permanece até os dias de hoje oferecendo formação de qualidade para artistas da cena. A necessidade de expandir para outros locais propostas de formação de atores, que iniciativas surgiram em cidades como Porto Alegre, Belo Horizonte, Campinas, Brasília, Salvador e Santa Maria (RS). Em 1978 o Ministério do Trabalho reconheceu a profissão de desencadeando o reconhecimento dos cursos de formação de atores pelo Ministério da Educação. Esse fato expandiu a criação de cursos de formação de artistas da cena em Universidades do Brasil. Na atualidade, ainda temos situações precarizadas no que se refere a formação de qualidade para artistas da cena, porém podemos considerar que a formação de atores e atrizes está consolidada. Esse panorama foi possível pela implementação de cursos de graduação, de pós-graduação mestrado e doutorado que permita o campo da pesquisa em artes da cena seja frutífero. Professores, artistas e pesquisadores podem conectar-se com as possibilidades contemporâneas internacionais ou com raízes brasileiras. FIGURA 23 RETRATO DE MARIA CLARA MACHADO FONTE: Acesso em: 11 jan. 2022. 202</p><p>Ao tratarmos de corpo como princípio para a formação de atores e atrizes há de se pensar no desenvolvimento, além de resistência, condicionamento a construção de um corpo flexível, apto a fazer nascer personagens diversificados ou estar preparado para estabelecer conexões com outros corpos. Pensar em um corpo conectado com outros corpos implica em escolher um percurso formativo que permita o ator e a atriz seja instrumento para que a obra de arte teatral possa acontecer. Inicialmente a preparação corporal de atores e atrizes era baseada na prática da dança, precisamente o balé clássico e a esgrima. Tempo depois, optou-se por introduzir a expressão corporal baseada em pesquisadores europeus como Dalcroze, Decroux, Laban, Mary Wygman, Martha Graham, entre outros. Esse fato trouxe a mudança de perspectiva para o trabalho do ator, alterando a tendência em reproduzir padrões de atuação para dar enfoque nas potencialidades expressivas do corpo. A pesquisa de um corpo expressivo partindo do próprio corpo considera corpo como instrumento essencial para a arte teatral FUSER, 2013). A década de 1960 foi importante para trabalho de atuação pois novas perspectivas foram lançadas e experimentadas. Novas pesquisas sobre processos interpretativos chegaram em terras brasileiras, modificando profundamente as abordagens formativas de atores e atrizes. Pesquisas de teatrólogos como Antonin Artaud, Grotowski, Peter Brook, Jaques Lecoq e institutos como Living Theater ofereceram instrumentos para que a formação dos artistas da cena pudesse seguir novos rumos. Na década de 1970, os cursos entenderam a importância do corpo nos processos criativos e na formação do profissional voltado para a cena teatral. Para intensificar essa busca por um corpo expressivo, as escolas buscam em técnicas como Improvisação Teatral, método Laban, os procedimentos de Grotowski quando busca testar os limites psicofísicos de seus aprendizes, de Eugênio Barba e sua antropologia teatral, bebeu em fontes orientais, de Meierhold que apropriou-se da Comédia Dell' Arte e da máscara neutra. Estas perspectivas ofereceram para a formação de atores e atrizes abordagens que instigavam o participante, por meio de estímulos psicofísicos, uma presença ativa, no aqui e agora, um corpo vivo, integrando estrutura física com a cognitiva e disponível para criar teatralidades. FIGURA 24 RETRATOS DE PETER BROOK E JERZY GROTOWSKY FONTES: Acesso em: 11 jan. 2022. 203</p><p>Esse corpo cênico foi intensificado com os novos estudos de Stanislávski, Grotowski, Barba e Peter Brook, Yoshi Oida e Jaques Lecoq e as pesquisas acadêmicas em torno do trabalho do ator. Estas novas perspectivas trouxeram para o trabalho de atuação a compreensão de que o lator está em cena com um fazedor de afetos, que apresenta seu trabalho, em contraponto com a representação de outros tempos. 0 contemporâneo está conectado com contextos criativos que exigem apresentar um corpo potente fisicamente e vocalmente vivos. A como instrumento de comunicação também se apresenta como recurso importante para que artista da cena possa desempenhar seu papel. Explorar os recursos vocais e possibilidades ressonantes da representa importante caminho para prepara o corpo e estar inteiramente preparado para os desafios que a arte teatral apresenta. A VOZ, assim como o corpo como um todo, oferece aos espectadores possibilidade de experimentar sensações, experiências estéticas de acordo com cada obra de arte teatral. A seguir adentraremos ao tema dramaturgia contemporânea. INTERESSANTE Para aprofundar seus estudos dos aspectos do trabalho do na contemporaneidade, sugerimos a leitura do livro "Um ator errante" do pesquisador e artista da cena Yoshi Oida. O livro contém princípios do trabalho para a construção de um corpo disponível para a criação teatral. Pode ser encontrado facilmente em plataformas virtuais ou em bibliotecas públicas. Referência do livro: OIDA, Yoshi. Colaboração de Lorna Marshall. Prefácio de Peter Brook. Trad. Marcelo Gomes. São Paulo: Beca Produções Culturais, 1999. 5 DRAMATURGIA E A CENA teatro contemporâneo mostra-se fértil para a implementação de infinitas possibilidades. Princípios dos estudos da performance, do teatro pós-dramático e dos temas que atravessam os processos de criação de teatralidades. Outros temas que atravessam o corpo de artistas da cena nos contextos contemporâneos são as questões de gênero, sexualidade, violências à mulher, preconceito racial e a pessoas que se identificam LGBTQIA+ ou questões relacionadas às hegemonias culturais. teatro contemporâneo e os corpos que escolhem construir obras de arte teatral são afetadas por estes atravessamentos e consequentemente influenciam a cena contemporânea. Neste sentido, outro assunto que requer destaque é a performatividade da cena teatral, as abordagens processuais que oferecem para as obras teatrais um caráter contínuo, inacabado, em progresso, o que podemos denominar work in progress. Assim, as obras de arte estão em constate modificação de acordo com os afetos que causam e deixam-se afetar. 204</p><p>núcleo do trabalho criativo, nessa perspectiva, está o performer e seu corpo capaz de afetar e ser afetado. performer e seu corpo vivo, busca fundir princípios de diferentes vertentes contemporâneas de atuação que tornam as produções intensas, com certa metamorfose no que se refere a recursos interpretativos, sem abandonar aspectos que remetem aos artifícios do teatro (FERNANDES, 2013). Outro aspecto que destacamos nesta discussão é a construção coletiva de cenas e de dramaturgias compondo um trabalho de arte teatral que ultrapassa os limites de dramaturgias tradicionais para estabelecer uma dramaturgia do corpo ou uma dramaturgia autônoma e original. O trabalho do diretor ou do encenador passa a ser criador na medida que faz certa fusão entre direção, roteiro, percurso criativo em um equilíbrio de forças específico. encenador assume o papel de condutor de processos que são únicos de cada coletivo e de cada obra de arte a ser criada. Esta proposta traz para os processos criativos certa semelhança com os processos colaborativos dos anos 1990 e produz conexões criativas e criadoras em que um encenador-ator e atores-criadores interagem para compor uma linguagem própria que pode apresentar certa qualidade performativa, híbrida em prismas de atravessamentos múltiplos. Nesta perspectiva, que ocorrem a apresentação de obras de arte teatral que buscam compor certa visualidade, iluminação como elemento dramatúrgico, sonoridades diversas, múltiplas presenças dos corpos que criam os afetos cênicos que se relacionam com o espectador também de forma inovadora. Recursos de multimídia trazem a tecnologia para a cena de modo que se funde com os corpos de atores e atrizes (FERNANDES, 2013). Essas novas possibilidades de criar obras de arte teatral não implica em seguir princípios aleatórios ou interpretar que o teatro contemporâneo busca construir um teatro para contrapor o que já foi desenvolvido. O teatro contemporâneo busca conhecer a fundo os princípios do teatro tradicional, seus pensadores, teatrólogos e encenadores, estudar os princípios da performance arte e propostas atuais para posteriormente propor percursos criativos que sejam provocadores. Fazendo assim, que as propostas artísticas necessitem do espectador para que possam afetar e serem afetados. Textos clássicos ou dramaturgias modernas podem ser fontes de criação de espetáculos teatrais contemporâneos na medida que servem de estímulo criativo. Poemas cênicos, corpos encarnados, a fisicalidade do ator, rompimento de tempo, espaço e andamento de cenas que supõem um ato inacabado. Estas características podemos encontrar em relatos da montagem de A Morta (1992) com texto original de Oswald de Andrade, encenada pela Companhia dos Atores, no Rio de Janeiro. Nesse 205</p><p>espetáculo há um modo peculiar de estabelecer os diálogos que rompem com a linguagem teatral tradicionalmente conhecida. Este feito mostra certa dinâmica, ritmo e musicalidade construída especificamente para atender a proposta de encenação. FIGURA 25 CENA DO ESPETÁCULO 0 REI DA VELA FONTE: < Acesso em: 11 jan. 2022. A mesma companhia encena Melodrama (1995) que busca reverter as estruturas do próprio gênero que dá nome ao trabalho, para ressaltar pontos de vista, trechos narrados, elaboração de efeitos de distanciamento que causavam estranheza e reflexão sobre a proposta apresentada. No ao de 2000, essa mesma companhia faz uma releitura do texto O Rei da Vela, também de Oswald de Andrade. Nessa proposta, marcos históricos de cena brasileira que são espetáculo encenado em 1933 e a proposta de encenação de José Celso Martinez Corrêa, em 1967 com Teatro Oficina (FERNANDES, 2013). A proposta de trazer para o palco elementos das duas produções em um processo que buscou criar uma terceira proposta mantendo as camadas de significado que a dramaturgia de Oswald propunha e que já fazia parte do repertório cultural brasileiro. Essa proposta dialogava com certa hiperteatralidade, síntese de áreas artísticas e mídias, na busca por mostrar uma realidade social como ela se apresenta, sem rodeios ou camuflagens. A seguir, apresentaremos alguns coletivos de teatro que marcaram presença e alteraram significativamente o cenário da pesquisa e produção teatral na contemporaneidade brasileira. 6 GRUPO LUME, GALPÃO E COLETIVOS TEATRAIS Os anos 1990 e 2000 foram decisivos para desenvolvimento do teatro nacional devido aos experimentos de coletivos teatrais que desafiaram as tradições teatrais ao assumirem os processos de criação teatral como uma posição política frente aos desafios sociais. 206</p><p>INTERESSANTE Na capital do estado de Santa Catarina um grupo teatral se destaca na pesquisa de possibilidades teatrais. O grupo possui nome de Experiência Subterrânea e periodicamente propõe ações performáticas e exibição de espetáculos teatrais com uma estética Acesse website e conheça trabalho artístico do grupo Experiência Subterrânea. Endereço eletrônico: https://www. facebook.com/grupoexperienciasubterranea. 7 OUTRAS POSSIBILIDADES Neste momento discutiremos outras possibilidades do teatro contemporâneo brasileiro que merecem destaque para pensarmos as características cênicas atuais. Dramaturgo e escritor que merece destaque no cenário nacional é Nelson Falcão Rodrigues (1912-1980), ou somente Nelson Rodrigues. Natural de Recife, mudou-se para o Rio de Janeiro aos cinco anos e ali cresceu torando-se escritor, amante das artes e dramaturgo. Seus textos são famosos por apresentar uma visão peculiar da realidade brasileira, principalmente dos universos familiares. Suas tramas carregadas de trágicas situações, exploravam situações inusitadas que postas em cena causavam estranhamento nos espectadores da época. Por ser repórter policial, estava diariamente em contato com fatos trágicos que alimentavam as tramas de seus textos teatrais e crônicas com destaque para A vida como ela é... Com direção de Ziembinski, os textos de Nelson Rodrigues apresentaram inovação por apresentar planos de atuação na mesma cena, mesclando realidade cênica e sonho, o chamado metateatro: teatro dentro do teatro e certo expressionismo teatral. Nelson escreveu romances, contos, crônicas e 17 peças teatrais que elevam a um dos maiores dramaturgos do teatro brasileiro e universal. FIGURA 30 - RETRATO DE NELSON RODRIGUES FONTE: Acesso em: 11 jan. 2022. 212</p><p>Teatro da Vertigem foi um coletivo teatral criado em 1992 pelo encenador Antônio Araújo em São Paulo. grupo formado por egressos da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo, ECA/USP, propôs a montagem de espetáculos teatrais que pudessem ser exibidos em espaços não convencionais. O trabalho de destaque do coletivo foi a Trilogia Bíblica formada por Paraíso Perdido, 1992, de Sérgio de Carvalho; Livro de Jó, 1995, de Luís Alberto de Abreu; e Apocalipse 1,11, 2000, de Fernando Bonassi. FIGURA 31 CENA NO ESPETÁCULO PARAÍSO PERDIDO FONTE: <https://bit.ly/BMOUQnf> Acesso em: 11 jan. 2022. O espetáculo Paraíso Perdido de 1992, foi encenado em uma igreja no centro de São Paulo, Igreja de Santa Ifigênia. Houve resistências por parte da comunidade religiosa, porém depois de cederem, espetáculo foi aclamado pelo público, pois apresentava uma trama que estabelecia diálogos entre personagens humanos no caminho de uma suposta essência divina. espetáculo Livro de Jó, com dramaturgia de Luís Alberto de Abreu foi encenado no Hospital Humberto I. A montagem baseada no livro bíblico, explora dificuldades sociais de um final de século que podem ser conectadas com as mazelas da época. Depois desse espetáculo, Antônio Araújo retorna de um período de estudos em Nova lorque, decide montar Apocalipse 1, 11, inspirado no Apocalipse, de São João. Fernando Bonassi compõe a dramaturgia e o processo criativo segue a abordagem colaborativa e apresenta certa miséria social, personagem João é posto como um migrante da região nordeste e está vagando por espaços e situações de vulnerabilidade até encontrar personagem Jesus Cristo. Os processos criativos incluíam mergulhar no espaço selecionado para ser palco da encenação. O trabalho de atuação é intenso e rigoroso o que oferece aos espetáculos do Teatro da Vertigem a mais alta qualidade estética. As dramaturgias são elaboradas com certa inovação para inserir os espaços escolhidos para a encenação. Estes aspectos fizeram com que o coletivo obtivesse enorme sucesso e recebesse premiações diversas em sua trajetória (FERNANDES, 2013). 213</p><p>Outro tema pertinente que se relaciona com esta ideia é Teatro e Cidade, uma vertente que busca estabelecer criações teatrais buscando relações, ocupações e presenças dos espaços urbanos. Essa iniciativa de pesquisa busca ocupar espaços, ramificar processos criativos de modos que corpo dos envolvidos possam criar teatralidades partindo dos estímulos cotidianos dos espaços urbanos. Esse fato implica na ocupação de espaços públicos por coletivos teatrais, interferindo na organização social e pode gerar discussões em torno da cultura de massa, da democratização dos códigos da arte e discutir temas como violência, direitos humanos, desigualdade social e ao direito à cidadania. FIGURA 32 RETRATO DE ANTUNES FILHO (1929-2019) FONTE: Acesso em: 11 jan. 2022. Exportar espaços da cidade conecta-se com tendências contemporâneas de expandir a cena teatral para fora das salas luxuosas ou dos espaços de teatro que exigem pagamento de entrada para acesso. Neste sentido, três nomes são fundamentais para pensar a cena contemporânea brasileira: Antunes Filho, José Celso Martinez Corrêa e Gerald Thomas. Estes encenadores buscaram referenciais que mesclam teorias de Grotowski, Artaud e outros pressupostos que fundamentaram as produções dirigidas pelos artistas da cena citados. Livro de Jó (1995), dirigido por Antonio Araújo, com coletivo Teatro da Vertigem, trazia para a cena Mateus Nachtergale, interpretando Jó, um personagem mergulhado em sangue o que causava estranhamento no espectador na possibilidade de contaminação fazendo alusão ao teatro da crueldade de Antonin Artaud. cenário do Hospital Humberto era organizado de modo que público se sentava nas laterais da cena e ao centro encontrava uma mesa de cirurgia. Os sentidos eram aguçados pelo forte cheiro de formol e os espectadores não conseguiam olhar para a cena ou para os atores sem ter no campo de visão as pessoas que compõem o público. Essa configuração estabelece olhar de cumplicidade para o ato de comungar teatro e de estabelecer no espaço da cena certa metáfora para a cura ou morte. 214</p><p>FIGURA 33 CENA DO APOCALIPSE 1, 11 FONTE: Acesso em: 11 jan. 2022. Em Apocalipse 1, 11 (2000) ocorreu partindo dos relatos de dois fatos trágicos ocorridos em território brasileiro: um a queima de um índio pataxó, na cidade de Brasília; e outro fato, massacre ocorrido no presídio do Carandiru, em São Paulo, quando 111 detentos foram brutalmente assassinados. O processo de montagem contou com laboratórios criativos em espaços de vulnerabilidade social como boates, locais de vendas de drogas, rodoviárias, hotéis de periferia e buscaram ouvir testemunhas que vivenciaram a violência do universo urbano. estudo do livro do Apocalipse foi ação inicial do coletivo para processo de montagem e com essa base buscou criar teatralidades em espaços visitados. Os textos foram desenvolvidos partindo de improvisações dos atores e outros recursos. As cenas foram desenvolvidas em um presídio desativado aproveitando corredores, pátios, grades, muros envolvidos por uma sonoplastia aterrorizante e agressiva, deslocando espectador de sua zona de conforto (FERNANDES, 2013). Estas experimentações e criações teatrais remetem a um teatro conectado com a vivência, com a experiência estética, com envolvimento do espectador de modo que deslocamento dos padrões tradicionais para estabelecer certo borramento dos limites entra a obra de arte e espectador. Um modo de questionar processos criativos, de recepção e de fluidez que a arte pode oferecer. teatro denominado Teatro de Rua também opera nos limites entre a vida e arte, entre a ficção e realidade ao buscar espaços públicos para apresentar o trabalho artístico. Recursos populares como máscaras, bonecos gigantes e sonoridades criadas para espetáculo. Outros movimentos culturais podem ser fonte de criação teatral como rap, o funk e o hip-hop, grafites, aparatos tecnológicos e outras possibilidades (FERNANDES, 2013). Criações com bases performáticas são comuns na contemporaneidade, com ênfase para hibridismo de linguagens e códigos de áreas distintas da arte para provocar experiências estéticas que de alguma maneira interferem no cotidiano em que espetáculo foi exibido. A seguir abordaremos brevemente alguns apontamentos da cenografia e aspectos visuais da contemporaneidade. 215</p><p>3 A Performance Arte surge em movimentos artístico culturais do período pós-guerra e buscava fazer do corpo o principal instrumento de criação. A ação do corpo em contextos cotidianos e os rituais que os seres humanos executam diariamente pode ser material para a criação de performances. De acordo com essa reflexão, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as Falsas: ) A Performance Arte estabeleceu-se como linguagem artística na medida que busca no corpo sua materialidade para a criação. ( ) Esse campo de estudo é amplo e ao focarmos no teatro, a performance pode ser campo para pensar em dissolver as noções de representação e de personagem. ( ) A Performance Arte preocupa-se somente com o desempenho de artistas em cena ou com a qualidade física de esportistas diante dos altos níveis de exigência em competições esportivas. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) b) c) d) 4 A abordagem de criação teatral baseada nos princípios colaborativos e democráticos buscam trilhar um percurso criativo que possa ser coeso, harmonioso e que expresse os valores ou escolhas do coletivo. Neste sentido, disserte sobre os processos colaborativos em teatro e os aspectos que essa abordagem pode apresentar. 5 papel do diretor modificou-se ao longo dos fatos históricos que ocorreram na história do brasil e do teatro brasileiro. Culturalmente, o diretor era o profissional responsável por dirigir atores, conceber aspectos da obra teatral e fazer escolhas para que a obra pudesse obter sucesso. diretor poderia ter uma postura autoritária diante das decisões e não discutir com a equipe as propostas de encenação. Na contemporaneidade e com percursos de criação coletiva a função do diretor passa a ser definida como encenador ou propositor de processos criativos. Disserte sobre o papel do encenador no teatro contemporâneo. 222</p><p>UNIDADE 3 TÓPICO 3 TEATRO E A EDUCAÇÃO 1 INTRODUÇÃO Neste tópico, trataremos do teatro conectado com a educação de modo a discutir propostas para o da História do Teatro Brasileiro. A inserção da Arte como componente curricular no contexto escolar é exigência do Ministério da Educação e é resultado de lutas pela inserção dos estudos das linguagens artísticas no currículo. A tradição escolar brasileira priorizou o ensino de Artes Visuais e foi necessário um projeto de lei para que as quatro principais linguagens da arte pudessem ser inseridas no currículo escolar. A lei que garante as quatro linguagens da arte no currículo da educação básica. A Lei n° 13.278/2016, prevê a inclusão das artes visuais, da dança, da música e do teatro nos currículos dos diversos níveis da educação básica (AGÊNCIA 2016). prazo para essa implementação seria de cinco anos depois da lei sancionada. As dificuldades desde a criação dessa lei estão na dimensão da formação e de manejo dos recursos para a contratação de profissionais das quatro áreas para a atuarem nas unidades de ensino. Carência de profissionais para cada área e os cursos de formação de professores focando em uma única área podem ser fatores que dificultam o acesso as linguagens da arte. Isso não significa retomarmos a formação polivalente de professores, mas destinar recursos para remunerar e contratar professores, bem como expandir a oferta de cursos de licenciatura em Artes Visuais, Música, Teatro e Dança, para quem estiver disposto a estudar processos de ensino-aprendizagem nessa área. Levando em conta que as Artes Visuais ainda é uma área que apresenta maior número de profissionais formados. Deixando de lado essa temática, a presença do teatro em contextos escolares ainda é tímida e o ensino de História do Teatro Brasileiro escasso. Neste tópico abordaremos algumas abordagens metodológicas voltadas para o ensino do teatro e sua história no Brasil. A pedagogia do teatro, como área do ensino em teatro, busca desenvolver proposições teóricas e práticas que permitem levar a linguagem teatral para os contextos escolares ou em outros espaços de ensino-aprendizagem em teatro. principal foco deste tópico é expandir as possibilidades, teóricas, metodológicas e práticas para o ensino de arte teatral para contextos escolares. Na parte final do tópico uma leitura complementar poderá conectar os temas abordados com outras reflexões em torno do fenômeno teatral, seja ele na escola ou fora dela. As diferenças entre a produção de espetáculos e o ensino de arte teatral está na experiência dos corpos envolvidos. Enquanto o teatro profissional os atores buscam criar teatralidades 223</p><p>para serem editadas e postas em cena, na composição de espetáculos, nos contextos escolares, os corpos estão em construção de saberes e desenvolvimento de capacidades comunicativas e expressivas. teatro possui a potência de estimular o desenvolvimento de saberes sobre si, em processos de experimentação de criação ou exercícios que envolvam a linguagem teatral. teatro na escola possui importância para desafiar os estudantes a conhecerem seu corpo e as possibilidades de expressão que ele pode ter, desenvolver e estabelecer melhores conexões com outros corpos em diversos contextos sociais. 2 PEDAGOGIAS DO TEATRO tema Pedagogias do Teatro permeia os contextos da pesquisa e levantamentos de abordagens teórico-práticas para o ensino-aprendizagem de teatro, sejam em universos escolares ou em cursos diversos. termo usado pedagogias traz para essa discussão os mais diversos modos de abordar percursos de aprendizagem na área do teatro. Cabral (2006) afirma que há características distintas entre as pedagogias do teatro e o teatro como pedagogia, em contextos da educação formal ou fora dela. Dentre as aproximações e distanciamentos entre essas duas dimensões, uma primeira distinção está conectada com a direção que o docente toma para sua prática. A segunda definição está conectada com os saberes que a prática teatral traz para o estudante ao estar mergulhado em um processo de ensino-aprendizagem ou processo criativo de espetáculos. Enquanto a pedagogia do teatro preocupa-se em desenvolver maneiras de propor processos de ensino-aprendizagem em teatro, o teatro como pedagogia está preocupado em entender o que os percursos de ensino-aprendizagem podem ensinar ou que saberes podem desenvolver (CABRAL, 2006). FIGURA 36 ILUSTRATIVA QUE SUGERE EXERCÍCIO DE EXPRESSÃO CORPORAL FONTE: Acesso em: 12 jan. 2022. Em tratando-se da contemporaneidade, as duas dimensões estão intensamente conectadas na medida que percursos de ensino-aprendizagem podem conter bases desenvolvidas na pedagogia do teatro e no teatro como pedagogia. A pedagogia do teatro 224</p><p>e teatro como pedagogia podem partir de reflexões de experiências e de teorizações em torno dos temas selecionados. Esses temas são desenvolvidos por pesquisadores em contextos universitários para que as abordagens de ensino-aprendizagem em teatro possam acontecer. Neste contexto de ensino, pesquisa e extensão que a Universidade opera, há a necessidade e aproximar as práticas pedagógicas encontradas em coletivos teatrais. As práticas de composição de espetáculos em moldes colaborativos podem conter propostas que podem ser adaptadas para ensino-aprendizagem do teatro. intercâmbio de saberes pode ocorrer na medida que grupos teatrais possam colaborar para que uma pesquisa em nível de graduação ou pós-graduação possa acontecer. "É possível que intercâmbio produtivo entre cena e aula tenha fundamento nas novas metodologias de ensino das artes cênicas, cada vez mais próximas dos processos de criação teatrais" (FERNANDES, 213, p. 366). Para Desgranges (2018), professor de Teatro da Universidade do Estado de Santa Catarina, as manifestações teatrais na contemporaneidade apresentam múltiplas possibilidades e as codificações no cenário da produção de arte cênica é intensa nos séculos XX e XXI. Neste sentido, professor afirma que na atualidade, as maneiras de ensinar e aprender teatro também necessitam de outros modos de ensino-aprendizagem ou de partir dos contextos escolares coletivos para propor percursos formativos. Os temas contemporâneos são importantes para que possam ser base na proposição educativa em teatro. Questões raciais, éticas, políticas, de gênero, orientação sexual podem ser temas abordados em processo de ensino-aprendizagem em teatro. Outra importante discussão no ensino-aprendizagem em teatro é que modo abordar os temas de acordo com a idade do grupo ou turma. A proposta que pode ser desenvolvida com crianças talvez não possa funcionar com adolescentes e as propostas que são desenvolvidas com estudantes de Ensino Médio, certamente não podem ser desenvolvidas com crianças em anos iniciais. professor necessita ter abordagens diferenciadas observando a faixa de idade temática e dinâmica do grupo de estudantes. Materiais como contos, literatura (infantil, juvenil e outros textos), crônicas ou textos dramatúrgicos, relatos dos estudantes ou textos criados no próprio percurso de ensino-aprendizagem. As estéticas contemporâneas podem ser recursos para a investigação de possibilidades de ensino-aprendizagem em teatro. Processos que partem de fatos históricos, das obras de arte clássicas, modernas ou dramaturgias clássicas, de catequese, do Brasil colônia, do modernismo e da contemporaneidade. Partindo de estímulos específicos ou de provocações estéticas, por meio de diversos recursos, os professores de Arte ou de Teatro, podem propor múltiplos percursos de ensino-aprendizagem em Teatro (DESGRANGES, 2018). 225</p><p>Outra possibilidade para ensino-aprendizagem em Teatro é partir das conexões com a própria cidade, comunidade ou contextos sociais. Nesta perspectiva, a geração de textos, improvisações e criação de teatralidades pode ser um percurso que se conecta com questões existenciais que o coletivo traz como proposta. Cada professor pode propor e estudo da história do teatro Brasileiro, tecer conexões com teatro contemporâneo. Apresentar estéticas teatrais de cada período da história do teatro Brasileiro e analisar figura e até mesmo filmagens de peças teatrais de cada período pode ser estímulo para criar cenas e materiais cênicos para socializar com os demais estudantes da escola A relação entre os coletivos teatrais e os espaços da cidade, a presença de apresentações teatrais nos espaços escolares e a exploração destas possibilidades podem ser alternativas para o desenvolvimento de propostas para o ensino- aprendizagem em Teatro. A tríade apreciação, análise e produção teatral representa uma proposta para fundamentar planejamento de ações culturais, criativas e teatrais nos contextos escolares. A ampliação do repertório cultural dos estudantes também necessita de atenção para que possam compreender as dramaturgias, as diversificadas escolhas estéticas da cena brasileira e as possíveis adaptações de textos de dramaturgos brasileiros para o contexto escolar. Quanto aos níveis de ensino que abarcam as séries iniciais, as abordagens podem seguir dinâmicas que se aproximam com a literatura infantil, com o contar, olhar e ouvir histórias infantis e depois inserir dramaturgias destinadas para público infantil. Teatro de formas animadas, de bonecos e de sombras podem ser possibilidades práticas que permitem a conexão das crianças com os universos do teatro. A seguir, descobriremos uma abordagem metodológica para ensino-aprendizagem do teatro que ainda é novidade para diversos contextos escolares. 3 DRAMA COMO MÉTODO DE ENSINO Uma das possibilidades para o ensino-aprendizagem do teatro ainda pouco explorada no Brasil é Drama como Método. Drama in Education foi criado pela professora de teatro inglesa Dorothy Heathcote (1926-2011). Aprofessora de teatro desenvolveu uma abordagem para o Densino-aprendizagem de Teatro denominada Drama for Learnig ou Drama in Education no final da década de 1960. Drama como ou o Drama na educação ou somente Drama como método trás para a discussão a adoção de elementos essenciais do próprio drama para provocar situações e vivências coletivas. 226</p><p>FIGURA 37 A PROFESSORA DOROTHY HEATHCOTE (1926-2011) FOTE: <https://bit.ly/36hYzsB> Acesso em: 7 jan. 2022. drama sugere um modo de agir diante de alguns estímulos como propor situações dramatizadas em que os envolvidos possam envolver-se como um participante da situação. A interação pode fazer com que os participantes explorem a sua capacidade de imaginar estar vivendo como se fosse personagem. A capacidade do ser humano de imaginar ser outro e agir como tal é amplamente explorada por meio de situações disparadoras em que participante pode estar na situação, agir conforme sua livre e espontânea vontade. professor condutor da situação deve participar e buscar maneiras de interagir ou provocar grupo a fim de continuar a cena a partir do pré-textos e dos episódios organizados previamente. A ideia de Teacher in role ou de professor-personagem foi desenvolvida pela pesquisadora para que, além de propositor, professor possa estar na dramatização como peça que move a proposta. A proposta pode usar como provocação os signos da linguagem visual (cartões, posters, figura diversas, rótulos, notícias etc.) para propor uma situação dramática. Os estímulos podem partir destes artefatos ou de outros como "[...] objetos, fotografias, cartas, cartas e documentos em uma embalagem apropriada. A história que se desenvolve a partir deles ganha significância através do cruzamento de seu conteúdo - e como os detalhes de cada um sugerem ações e motivações humanas" (CABRAL, 2006, p. 36). 227</p><p>FIGURA 38 ILUSTRATIVA QUE SUGERE ABORDAGEM DE DRAMA COMO MÉTODO DE ENSINO DE TEATRO FONTE: <https://bit.ly/BlgeLrE>. Acesso em: 12 jan. 2022. Assim, o corpo é provocado a interagir com outros corpos e a trocar de papéis de acordo com a situação ou com os comandos do professor propositor. professor e os estudantes se colocam em um jogo que permite sair da situação quando sentir necessidade ou permanecer nela de modo que possa definir ou conduzir a resolução de situações problema (CABRAL, 2006). Unidades como espaço, tempo, personagens e situação podem ser estímulos para gerar um percurso de experimentação dramática. Onde, quem e como são elementos que podem ser importantes para essa abordagem. Um dos disparadores da ação dramatizada é o termo "como se" para que o participante possa mobilizar sua capacidade imaginativa e passe a agir como se fosse tal personagem. Essa proposta explora questões existenciais do ser humano e provoca os participantes a tomarem posições ativas diante dos desafios. Essa proposta mobiliza estruturas sensíveis e O potencial estético do teatro pode ampliar as possibilidades de conhecer ou se sentir a si mesmo como um produtor de ações em coletividade (CABRAL, 2006). O Drama como possibilidade para o ensino-aprendizagem de teatro provoca os participantes a entrar em uma situação imaginária, que podemos localizar no contexto da ficção e "[...] a aprendizagem decorrente emerge desta situação e do fato de termos de responder a ela, realizar ações e assumir atitudes nem sempre presentes em nosso cotidiano" (CABRAL, 2006, p. 12). A situação ficcional permite que os participantes possam agir conforme suas vontades sem estar presos a padrões socialmente impostos, emergindo atitudes imprevisíveis para que grupo possa interagir ou tomar outra decisão, dependendo do que está em jogo. Essa abordagem permite que as provocações podem trazer contextos ficcionais selecionados com foco nos seres humanos "[...] seus relacionamentos e contexto de existir se aquele fato fosse real. A ênfase no contexto da ficção traz à tona questões referentes à história de vida e memórias, ambas usualmente privilegiadas no fazer teatral em escolas e comunidades" (CABRAL, 2006, p. 13). 228</p><p>FIGURA 39 ILUSTRATIVA QUE SUGERE A PROFESSORA PROPOSITORA OU PROFESSORA COMO PERSONAGEM FONTE: Acesso em: 12 jan. 2022. O desenrolar da situação pode ser imprevisível na medida que a proposta pode conectar o contar histórias, a coleta de memórias e fazer artístico. "A investigação das memórias fica dessa forma situada entre intenções e reconstruções; é isto que situa o processo artístico" (CABRAL, 2006, p. 15). Em muitas situações os professores de teatro encontram dificuldades de encontrar textos dramatúrgicos que possam atender as necessidades de abordar uma temática específica que se origina no coletivo de estudantes. Um caráter improvisacional da proposta é recorrente na medida que os participantes dramatizam, teatralizam e finalizam a situação assim que professor- personagem indicar ou a situação ser resolvida. professor-personagem também faz uma breve análise avaliativa com coletivo apontando possíveis abordagens e permitindo que os estudantes possam expor as impressões do percurso. professor pode ainda interagir com os estudantes estimulando a aquisição de códigos linguísticos para que a mudança de posições, ações e posturas diante do percurso de ensino- aprendizagem (CABRAL, 2006). Nessa proposta, o estudante segue um caminho investigativo, com o material levantado pelo coletivo, com autonomia e produtor de seus saberes, sendo agente das mudanças necessárias para a resolução das proposições. O estudante como agente de seus conhecimentos e que pode produzir ações em dimensão coletiva. A seguir, seguiremos discutindo as possibilidades do teatro de bonecos na História do Brasil. 229</p><p>DICA Para conhecer mais da proposta de ensino-aprendizagem, faça a leitura do livro da professora Dra. Beatriz Vieira Cabral intitulado "Drama como método de ensino", da editora Hucitec, de 2006. Ainda recomendamos pesquisar O teatro na escola desenvolvido pela professora e artista da cena Olga Reverbel (1997-2008). Seus livros focam em práticas voltadas para universo escolar. Outra pesquisadora que merece ser estudada é escritora, tradutora, encenadora e professora universitária brasileira Ingrid Dormien Koudela (73 anos). É uma das figuras centrais no estudo da pedagogia e didática do teatro no Brasil e Viola Spolin (1996-1994), que desenvolveu a abordagem de ensino- aprendizagem de teatro baseada na improvisação e no jogo teatral. 4 TEATRO DE RUA E DE BONECOS Falar em teatro de rua é pensar em acessibilidade da arte teatral e que está presente na história do teatro brasileiro desde a vinda dos jesuítas e do teatro de catequese. As procissões religiosas e cortejos festivos eram as manifestações teatrais de rua até final do século XIX. As festas populares ocorriam em locais público, ruas e outros espaços. Algumas companhias teatrais denominadas mambembes percorriam país com suas apresentações de pequeno porte, que poderiam ser espetáculos declamados, e de mágica, cômicos ou números circenses. No século XX, movimentos populares com a presença de imigrantes, em sua maioria, organizavam encontros em que montavam apresentações teatrais com cunho formativo (CARREIRA, 2013). FIGURA 40 ILUSTRATIVA DE APRESENTAÇÃO TEATRAL EM ESPAÇO PÚBLICO OU EXEMPLO DE TEATRO DE RUA FONTE: Acesso em: 12 jan. 2022. Na segunda década do século XX, operários e a classe popular passou a ocupar espaços públicos com apresentações teatrais. teatro de rua foi fomentado na década de 1960, pelo Centro Popular de Cultura (CPC) com objetivos político-militantes quando 230</p><p>5 TEATRO PARA A INFÂNCIA E JUVENTIDE Outro tema que abordaremos neste material de estudo é teatro desenvolvido para o público denominado infantil ou juvenil. As duas dimensões exigem procedimentos e abordagens específicas para que os processos de criação cênica possam gerar espetáculos indicados para a faixa etária pretendida. mito de que uma peça de teatro com qualidade estética pode ser apreciada por espectadores de qualquer idade é desconstruído diante de desafios específicos como criar trabalhos teatrais para crianças de até cinco anos de idade. No século XX e XXI, os espetáculos para crianças buscaram se renovar quanto sua visualidade e aprimoramento da elaboração de propostas de encenação. Dentre os grupos que buscaram desenvolver essa modalidade de teatro, está grupo Caixa do Elefante, de Porto Alegre, que produz diversos espetáculos para esse público. Dentre as produções estão os espetáculos Histórias da Carrocinha (1996) e Cavaleiro da Mão-de-Fogo (2003) com textos de Javier Villafafie, natural da Argentina, e outros espetáculos que podem ser conferidos no endereço eletrônico apontado ao final desta discussão (PUPO, 2013). Esses espetáculos apresentavam uma dinâmica criada com a manipulação de bonecos de luva especialmente criados para os espetáculos e os atores manipuladores desenvolviam a manipulação precisa e seleção de gestos para que as ações dos bonecos pudessem comunicar a história. Outro destaque para estes espetáculos é para personagem Cachorro Abelardo que era manipulado pelo lator manipulador Mário de Ballenti. Esse personagem criado com sotaque gaúcho, passou a fazer parte de ações publicitárias, eventos e até conectar cenas de outros trabalhos do grupo (PUPO, 2013). FIGURA 43 CENAS DO ESPETÁCULO 0 CAVALEIRO DA MÃO-DE-FOGO FONTE: Acesso em: 12 jan. 2022. Outro destaque para o teatro voltado para crianças e adolescentes está trabalho da dramaturga e escritora de literatura Maria Clara Machado (1921-2001). Foi a mais importante dramaturga para o público infantil da história do teatro brasileiro. Ela 234</p><p>foi, além de dramaturga, atriz e diretora de teatro. Fundou um dos principais grupos teatrais do país na cidade do Rio de Janeiro: Tablado. Depois do grande sucesso da encenação de seu texto Pluft, Fantasminha, a artista da cena passou a escrever inúmeras peças teatrais acumulando mais de 25 textos para teatro voltadas para público infantil (PUPO, 2013). FIGURA 44 CENA DO ESPETÁCULO PLUFT, 0 FANTASMINHA DA COPAS PRODUÇÕES ARTÍSTICAS (MG). DIREÇÃO: DIEGO BENICÁ (2014). FOTO DE GUTO MUNIZ FONTE: <https://tinyurl.com/bdh2j6ya> Acesso em: 12 jan. 2022. Outro importante artista da cena que trabalhou incansavelmente para desenvolvimento do teatro para crianças e jovens foi Elias Kruglianski (1930-2019) ou conhecido somente por llo Krugli. Ele nasceu em Buenos Aires na Argentina, veio para o Brasil em 1961, no ano em que Jânio Quadros (1917-1992) assume a Presidência. Foi ator, dramaturgo, artista plástico, diretor e escritor. Recebe influências do poeta espanhol Federico García Lorca (1898-1936) e do teatro de bonecos desenvolvido pelo artista da cena e poeta argentino Javier Villafañe (1909-1996). Desenvolveu seus trabalhos conectados com teatro de bonecos e com universo infanto-juvenil escrevendo cerca de 40 textos voltados para o público citado. Fundou no ano de 1975, o grupo Ventoforte, um dos mais importantes coletivos teatrais voltado para a produção teatral para o público infanto-juvenil (ILO, 2022). Em São Paulo, a Companhia Truks, comandada pelo encenador Henrique Schichtin, estrou a peça A Bruxinha (1991), uma adaptação do texto de Eva Furnari que conferiu grande sucesso ao coletivo, permitindo ser conhecido nacionalmente. O grupo utilizava bonecos para contar suas histórias e com humor inovou ao bordar a realidade das grandes cidades e as situações precárias que os personagens viviam. Outra companhia na cidade de São Paulo é destaque no cenário do teatro para a infância e juventude. Estamos falando da Companhia Cidade Muda que no ano de 2000 encenou espetáculo Circus explorou gesto, movimentos e sons para propor uma atmosfera teatral em que público pudesse participar do fenômeno teatral criando um enredo individual. 235</p><p>FIGURA 45 CENA DO ESPETÁCULO HISTÓRIAS DE LENÇOS E VENTOS COM DRAMATURGO ILO KRUGLI EM CENA FONTE: < https://tinyurl.com/yc5z3r2z> Acesso em: 12 jan. 2022. A Companhia Articularte, em São Paulo chama a atenção nos anos 2000, com o comando do encenador Dario Uzan, propuseram a criação de espetáculos que contavam a biografia de artistas brasileiros como espetáculo A Cuca Fresca de Tarsila (2000), sobre a vida da pintora modernista que dá nome ao espetáculo, Trenzinho Villa-Lobos (2001), sobre a vida do musicista Villa-Lobos e Portinari Pé de Mulato (2003) sobre a vida do pintor Cândido Portinari. Em Curitiba o destaque vai para a Companhia Manoel Kobachuck, que se especializou no teatro de marionetes, uma espécie de bonecos sustentados por fios. Produziram o espetáculo Teatro do Dr. Botica que se mantém cartaz desde ano de 2001 em espaço de apresentação viabilizado pelo Shopping Estação em Curitiba, que hoje conta com um Instituto Grupo Boticário e um Espaço Teatral que mantém em cartaz espetáculos para a infância BELTRAME, Na cidade de Belo Horizonte, em Minas Gerais, a Companhia Zero de Bonecos, comandada pela encenadora Wilma Rodrigues, mergulhando no universo de textos para a infância e a juventude optando por adaptar o texto de Lygia Bojunga Nunes chamado A Bolsa Amarela (1998). Na cidade de Belo Horizonte ainda se destaca coletivo Giramundo, que além de produzir espetáculos para crianças, adultos e jovens, coletivo atua intensamente para manter o fomento de cultura na cidade com o gerenciamento de museu, escola de teatro e o próprio teatro (espaço para espetáculos) BELTRAME, 2013). O período de redemocratização do Brasil incentivou a retomada das produções culturais e a pesquisa de propostas cênicas que pudessem expressar os desejos dos coletivos. A busca por originalidade e um teatro que pudesse ser desenvolvido para público infantil e juvenil utilizando bonecos, fantoches, marionetes e formas animadas se expandiu e características híbridas passaram a aparecer BELTRAME, 2013). O teatro que ganhou espaço em diferentes cidades brasileiras buscou voltar suas produções para as jovens gerações e com uma abordagem que unificou as esferas infantil e juvenil, passou a se nomearteatro infantojuvenil. Os modos de produzir, acessare democratizar a arte teatral para público infantojuvenil, sejam produções com bonecos, 236</p><p>com formas animadas ou com atores e performers, passaram a ser de enorme qualidade estética que eram apresentadas em teatros, espaços públicos, escolas e espaços que possam receber as peças teatrais. Coletivos teatrais ainda atuantes no cenário cultural teatral nacional produzem espetáculos que são destinados ao público infantojuvenil. Outros coletivos passaram a pesquisar dramaturgias voltadas para bebês, crianças e adolescentes. A inovação atual está em desenvolver trabalhos cênicos voltados para bebês por meio de formas animadas, elementos cênicos, estímulos sonoros, gestuais para contar histórias. A companhia Caixa do Elefante, o Grupo Sobrevento, ambos de São Paulo, e a Cia La Casa Incierta de Brasília, pesquisam propostas em teatro para bebês (PUPO, 2013). Há no Brasil hoje um circuito de Festival de Teatro para Bebês, que pensa a apresentação espetacular e a formação de grupos e coletivos para montagens e pesquisa cênica para essa faixa etária. A seguir, abordaremos possibilidades para o ensino-aprendizagem de teatro em espaços escolares. INTERESSANTE Para conhecer os projetos da Companhia Caixa do Elefante acesse o endereço eletrônico a seguir e navegue pela página do grupo, visualize as figuras e amplie seu repertório cultural sobre teatro de bonecos. Acesse o link a seguir: http://www.caixadoelefante.com.br/ 6 TEATRO NA ESCOLA E SUAS POSSIBILIDADES A presença do ensino-aprendizagem de Teatro na educação básica é uma conquista recente e rompeu, com o ensino-aprendizagem de Música, a hegemonia das Artes Visuais. Mesmo com as dificuldades em encontrar profissionais habilitados a serem professores de arte, a presença da arte teatral está nos espaços da escola pelo componente curricular Arte ou pela presença de espetáculos teatrais que buscam as escolas para realizar apresentações teatrais. Instituições públicas e privadas também são importantes para a implementação de projetos que possam acessar arte teatral para crianças e adolescentes. Secretarias de Cultura lançam editais para incentivo a projetos de teatro e outras áreas da arte. 237</p><p>FIGURA 46 - ILUSTRATIVA DE FANTOCHES PARA ABORDAR ENSINO DE TEATRO COM CRIANÇAS FONTE: <https://bit.ly/BuHDiRM> Acesso em: 12 jan. 2022. Iniciativas privadas como o SESC e outras instituições lançam periodicamente editais ou concursos para incentivar a produção de espetáculos teatrais ou para fazer os espetáculos teatrais circularem por cidades brasileiras. A nível nacional temos a FUNARTE, Fundação Nacional de Artes que destina recursos para a produção de espetáculos teatrais. Leis de incentivo como a Lei Rouanet ou a Lei Aldir Blanc (implementada durante a crise causada pela pandemia de COVID-19). Editais lançados pelas secretarias de cultura de cada cidade buscam premiar projetos inscritos que possam ser oferecidos a comunidade, bem como os espaços escolares. Outra proposta que é importante mencionar, são os festivais de teatro que buscam democratizar acesso ao teatro levando espetáculos teatrais para os ambientes escolares SANTANA, 2013). Estas oportunidades podem ser importantes recursos para ensino- aprendizagem do teatro na escola. Quando uma peça teatral vai até a escola, contato com o grupo teatral e seu trabalho pode ser importante para abordar temas como processos criativos em teatro, dificuldades e prazeres da profissão e as possíveis abordagens para a montagem de peças teatrais nas diferentes faixas de ensino. professor de arte deve fazer uma mediação antes do momento de apreciação sobre que observar, como estar aberto para receber uma obra de arte teatral ou direcionar a atenção dos estudantes para que o momento de estudo posterior à apresentação possa ser rico e até inspirar um percurso criativo (KOUDELA; SANTANA, 2013). 238</p><p>FIGURA 47 ILUSTRATIVA DE MARIONETES FONTE: Acesso em: 12 jan. 2022. professor necessita ter cuidado ao orientar os estudantes sobre o momento de apreciação para que não ocorra certo aborto da apreciação e a própria experiência estética. professor pode instrumentalizar os estudantes para que a experiência estética possa ser potencializada. Temas que o professor pode abordar depois de uma apresentação teatral podem ser relacionados ao enredo da peça, que tema aborda a história, que gênero teatral pertence, como eram os figurinos e cenário, como eram os aspectos sonoros e texto. Gerar discussões em torno do que os estudantes apreciaram e relatar as experiências individuas pode ser um primeiro passo depois de uma apreciação teatral. Estruturar questões geradoras para a aula de arte pode ser um bom recuso para iniciar uma discussão SANTANA, 2013). Um passo seguinte que pode ser posto em prática é a escrita de pequenos textos sobre a experiência com teatro e provocar uma leitura dos textos com uma dinâmica de ler corporalmente. Uma espécie de leitura dramatizada dos textos que cada um escreveu. Propor exercícios corporais em torno de temas que a turma propõe. Os temas podem surgir na dinâmica de estudo da própria turma. Por isso, professor necessita estar atento para perceber a dinâmica da turma e os temas que coletivo traz para a discussão. Diante disso, promover a escolha democrática dos temas consiste em uma ação que professor pode comandar e com O coletivo, propor percursos de criação teatral que possam ser significativos e válidos para o coletivo envolvido. Além dos temas que podem surgir no grupo de estudantes, outras provocações podem ser implementadas para gerar percursos de aprendizagem. Abordar possibilidades de expressão corpora, articulação entre fala e corpo, modos de comunicação oral, corporal, sonoro e apresentar os diversos estilos de encenação, de cenografia, de textos dramatúrgicos e outros recursos utilizados para a criação de arte teatral. Produção de máscaras, performances e produção de vídeos instrutivos pode ser recurso que funcione com crianças e adolescentes. Inserir recursos tecnológicos, como aparelhos de telefones celulares que permitem a utilização de aplicativos de edição de vídeos e figuras, pode facilitar o aprendizado em teatro. 239</p><p>FIGURA 48 - ILUSTRATIVA DE FANTOCHES PARA ABORDAR 0 ENSINO DE TEATRO COM CRIANÇAS FONTE: <https://tinyurl.com/2p95br5f> Acesso em: 12 jan. 2022. Ainda é possível abordar o teatro de bonecos, de formas animadas, de fantoches ou de marionetes provocando a criação dos bonecos com pequenas cenas para serem socializadas e posteriormente ampliadas e gerarem a elaboração de um roteiro maior para ser apresentado em momento específico, pode ser um bom recurso pedagógico. Enfim, garimpar possibilidades pedagógicas é função do professor de teatro, bem como o propositor de percursos criativos em um coletivo de artistas. Seja em grupos profissionais, em escolas que oferecem cursos livres ou na educação básica, o envolvimento do coletivo pode resultar no aprendizado do próprio grupo e dos que poderão ter a oportunidade de apreciar a produção teatral (KOUDELA; SANTANA, 2013). Há contextos na educação básica que o professor conseguirá desenvolver percursos enriquecedores e que podem ampliar o repertório expressivo, cultural e artístico dos estudantes. Há contextos em que os professores conseguirão desenvolver somente alguns aspectos que o planejamento contempla. professor quando pensa uma proposta de ensino-aprendizagem em teatro está desenhando uma abordagem específica para atingir os objetivos de aprendizagem, objetivos esses que necessitam ser mensuráveis ao final do percurso, que considera uma prática coletiva, um percurso de construção de saberes em teatro que dificilmente se concretizará sem o envolvimento do coletivo. A arte teatral pressupõe considerar uma dimensão coletiva quando é composta pela própria ação relacional de interação entre corpos. fenômeno teatral passa a existir quando corpos que estabelecem relações em cena (atores e atrizes), contam uma história para outros corpos apreciarem (espectadores) (KOUDELA; SANTANA, 2013). A seguir apresentaremos possibilidades no ensino-aprendizagem do tema principal deste material de estudo que é a história do teatro brasileiro. 240</p><p>6.1 ENSINO DE HISTÓRIA DO TEATRO NO BRASIL ensino de arte em espaços da educação básica no Brasil se deu, inicialmente, com a nomenclatura de Educação Artística com a Lei n° 5692, de 1971.(BRASIL, 1971). A ideia de ensino de teatro estava conectada a uma abordagem a uma tradição de cada local em um contexto de escassez de profissionais habilitados a ensinar teatro. ensino de arte era uma mescla de linguagens artísticas que tornavam a disciplina uma abordagem que não aprofundava propostas em arte devido a formação polivalente dos professores. Essa prática foi reconhecida como inviável para o ensino de arte na educação básica diante da necessidade de ensino de arte com qualidade nas quatro principais linguagens adotadas para a disciplina de arte na escola: teatro, artes visuais, dança e música. As décadas de 1970 e 1980 foram marcados por uma responsabilização dos professores de Arte para ensinar abordando um pouco de cada linguagem da arte. Essa abordagem dificultava o ensino-aprendizagem das linguagens artísticas tendo em vista que os professores também recebiam formação profissional em cursos que traziam a polivalência como proposta curricular. Essa combinação entre artes visuais, música, teatro e dança geravam proposições sem aprofundamentos conceituais e que dificultava a construção de saberes em cada uma das linguagens. As consequências desse período foram um ensino de arte baseado no improviso, enfoques equivocados e técnicas sem o devido conhecimento de procedimentos ou desenvolvimento de saberes com a devida qualidade necessária para os contextos escolares. Esse aspecto exigiu que os cursos de formação docente em Artes buscassem reformular suas matrizes curriculares para atender a necessidade de aprofundamento em uma área específica da arte. Os cursos passaram a oferecer parte da formação nas quatro principais linguagens e em determinado momento do curso os estudantes deveriam escolher uma linguagem específica. Este modelo híbrido permitiu melhorar a formação de professores e aprofundar saberes específicos em arte. Neste período a orientação do Conselho Nacional de Educação não reconhecia a autonomia e os saberes de cada área da arte, com intencionalidade de facilitar a disponibilidade de profissionais para o ensino de arte. A matriz curricular dos cursos de Licenciatura em Educação Artística apresentava, em sua maioria, as seguintes disciplinas: no período de estudo comum: "Fundamentos da Expressão e Comunicação Humanas, Estética e História da Arte, Folclore Brasileiro, Formas de Expressão e Comunicação Artística. Parte diversificada/habilitação artes cénicas Evolução do Teatro e da Dança, Expressão Corporal e Vocal, Encenação, Cenografia, Técnicas de Teatro e Dança (KOUDELA; SANTANA, 2013). 241</p><p>Com as modificações implementadas nas décadas de 1990 e 2000, ensino de arte modificou-se e a necessidade de formação específica foi reconhecida pelos órgãos oficiais da educação. A Lei n° 13.278, de 2016, prevê a obrigatoriedade de ensino das quatro principais áreas da arte: as artes visuais, a dança, a música e teatro na educação básica do Brasil. A transformação dos cursos de formação em arte para exercício da docência passou por modificações desde os anos 2000 e deixaram de ter matrizes com núcleos comuns para ser de formação específica. As Universidades passaram a implementar cursos de Licenciatura em Artes Visuais, Música, Teatro e Dança. A Dança ainda permaneceu com poucos cursos e expandindo as propostas de cursos somente décadas depois da extinção dos cursos com núcleo comum. Atualmente, o ensino de teatro no Brasil ainda possui pouca representatividade nos espaços da Educação Básica, frente a professores majoritariamente da área de artes visuais. A música expandiu consideravelmente sua presença com a implementação de projetos como de bandas e Fanfarras, musicalização para crianças e outras iniciativas secretarias municipais para oferecer ampliação do repertório cultural de crianças e adolescentes (KOUDELA; SANTANA, 2013). A seguir, abordaremos algumas sugestões práticas para ensino de história do teatro brasileiro. 6.2 POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS Para abordar ensino de teatro brasileiro para crianças e adolescente é importante conhecer os principais fatos e personagens que protagonizaram desenrolar da história. Uma abordagem de ensino-aprendizagem pode ser planejada partindo de inúmeras possibilidades e sequências pedagógicas. A importância de proporcionar momentos de estudo contextualizado dos períodos, apreciação de obras teatrais, sejam elas em vídeos, textos dramatúrgicos ou em apresentações teatrais presenciais a experiência de criação de cenas pode ser uma abordagem que ofereça recursos para a construção de saberes e ampliação de repertório cultural. Há ainda procedimentos que podem envolver discussão, análise de obras, de cenas, vídeos e experimentações com exercícios teatrais. FIGURA 49 ILUSTRATIVA DE AVENTAL POSSIBILIDADE PARA ABORDAR ENSINO DE TEATRO FONTE: <https://tinyurl.com/mrav93k8> Acesso em: 12 jan. 2022. 242</p><p>A dinâmica de abordagem, os materiais e temas abordados é tarefa do professor. Essa seleção, escolha e organização sequencial pode definir a aprendizagem dos estudantes. Outro parâmetro que é importante considerar é a faixa de idade dos estudantes. Sabemos que a escola divide os estudantes por idade em seus respectivos anos desde os 6 anos até os 14 anos, que definem o período que um estudante permaneceria na educação básica, caso o estudante obtivesse aprovação em todos os anos. Os espaços da escola são importantes para que o ensino de teatro ocorra. Algumas escolas possuem auditório multiuso que possibilita fazer uso compartilhado para atividades que envolvam exercícios de criação cênica. Introduzir o tema com pequenos textos e fazer leituras coletivas. Buscar organizar a sala de aula com outras configurações para a dinâmica da aula e ao final do percurso fazer um fechamento do assunto buscando conectar os pontos abordados e exaltar as possíveis criações que obtiveram destaque. professor ainda necessita desenvolver instrumentos que permitam verificar a aprendizagem dos estudantes e por meio deste recurso projetar as próximas aulas e apontar avanços e fragilidades que os estudantes apresentam. Neste sentido, é importante desenvolver objetivos para a aprendizagem de acordo com os temas e que ao final, possam ser avaliados o seu alcance ou, o não alcance. Os objetivos de aprendizagem conectam-se com os instrumentos de avaliação na medida que são base para o desenvolvimento de critérios para avaliar a aprendizagem. É comum ainda encontrarmos instrumentos de avaliação com abordagem punitiva, usado como moeda de troca para conseguir atenção ou envolvimento da turma e com pouca eficácia para detectar fragilidades ou apontar avanços para ser parâmetro para planejar novas propostas. A avaliação necessita ter uma abordagem verificativa, para detectar o que os estudantes conseguiram desenvolver, ter uma dimensão formativa, para propor uma abordagem avaliativa que permita fixar e reforçar saberes e diagnosticar os temas que precisam ser abordados com novas propostas. Os modos de avaliar podem ser inúmeros e cabe ao professor desenvolver instrumentos que melhor atendem as necessidades do coletivo. Ainda sobre propostas de ensino-aprendizagem de história do teatro brasileiro é importante observar características do grupo de estudantes para propor as atividades. Nos anos iniciais as crianças geralmente estão dispostas a interagir ludicamente. Neste sentido que atividades que envolvam contação de histórias, de personagens, exercícios de expressão corporal, de sonoridade e movimento ou de expressão facial. Utilizar músicas e estímulos diversos para abordar as temáticas relacionadas a história do teatro brasileiro. ensino de teatro para adolescentes pode ter outras abordagens que estas citadas previamente. A faixa etária que vai do quinto (5°) ano até nono ano (9°), pode exigir abordagens específicas para o ensino-aprendizagem de história do teatro. Selecionar textos dramatúrgicos desse período, apresentar por meio de vídeos elementos desse período ou propor dinâmicas de estudo que possam ter o desenvolvimento de teatralidades para socializar os conhecimentos. Separar os períodos da história do teatro 243</p><p>e por partes, abordar os fatos que construíram o teatro brasileiro. Teatro de bonecos, de formas animadas e de fantoches pode ser recurso eficiente para todas as faixas da educação básica. Rastrear as características do teatro brasileiro e comparar com a história do teatro mundial pode ser uma proposta significativa. Estimular a compreender e identificar a teatralidade ritualística presente no cotidiano social e elaborar cenas inspiradas na história do Teatro Brasileiro ou nos princípios da arte teatral pode ser caminho de rica aprendizagem. conhecimento é desenvolvido com dedicação, leitura e práticas que possam construir saberes e teatro. Estudar teatro é lançar olhares para a capacidade de dramatizar, de fazer de conta e se colocar na posição de determinado personagem. Teatro é tentar ser outro, mesmo que essa ação ocorra por alguns momentos. 244</p>