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Direito_das_Coisas

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Direito das Coisas (1º semestre, 2008-2009, aulas da Dra. Margarida Costa 
Andrade) 
 
Os direitos reais, ao contrário das obrigações, vêm dizer-nos de que forma se 
estabelece uma “relação” entre os sujeitos e as coisas, como é que a lei 
autoriza a sua utilização sem intervenção de qualquer terceiro, como é que os 
sujeitos se apropriam das coisas. Qual a natureza jurídica dos direitos reais? 
Há 4 teorias distintas nesta matéria: - 
1ª teoria: teoria clássica ou realista – é, cronologicamente, a primeira teoria 
sobre os direitos reais. Funda-se no direito romano, mas só foi coligida com as 
escolas dos glosadores e dos comentadores. Segundo esta teoria, os Direitos 
reais eram poderes directos e imediatos sobre coisas, diferentemente dos 
direitos de crédito, em que havia a atribuição a um sujeito do poder de exigir 
de outrem um determinado comportamento positivo e negativo, ou seja, em 
que o objecto só acede ao titular por mediação de outro indivíduo, o devedor. 
Ou seja, a teoria clássica analisa os direitos reais numa perspectiva 
eminentemente fenomenológica – tem em conta a situação de facto e diz-nos 
o que vê, sendo que vê um sujeito e uma coisa, dizendo portanto que um 
direito real é um direito do seu titular sobre uma coisa. Na verdade, mesmo 
quando o objecto do direito de crédito é a prestação de coisa (direito a uma 
coisa), o que está em causa é a entrega da coisa, ié, a tal mediação. A 
relação entre sujeito e a coisa é de não intersubjectividade (direito sobre uma 
coisa), enquanto nos direitos de crédito há uma relação de 
intersubjectividade. Em que é que se traduz este poder directo e imediato 
sobre uma coisa? Traduz-se, precisamente, “no poder jurídico e material de 
retirar directamente todas ou parte das utilidades económicas de uma coisa” 
(Dr. Mota Pinto). 
Uma das críticas que se aponta à doutrina clássica é a concepção que esta 
evidencia quanto aos direitos de crédito: não é certo que o objecto dos 
direitos de crédito seja a prestação (de coisa ou facto), pois o que subjaz ao 
interesse do credor é o “bem” que a prestação lhe irá proporcionar. 
2ª teoria: teoria personalista ou obrigacional – formulada durante o século 
XIX (PLANIOL), tem por base a filosofia Kantiana. Para esta, o direito é um 
fenómeno social que pressupõe relações entre pessoas, conflitos 
intersubjectivos, logo, não há relações entre pessoas e coisas. A ideia de uma 
relação pessoa-coisa é, na verdade, uma boa alegoria, mas não está correcta. 
Ora, em segundo lugar, nos direitos reais, frente ao titular do direito real está 
um sujeito e não uma coisa, melhor, não está um sujeito mas sim toda a 
comunidade jurídica, ié, todos aqueles que convivem com o direito real e que 
estão obrigados a não actuar contra esse direito. É a chamada obrigação 
passiva universal ou o dever geral de abstenção. Trata-se de uma obrigação 
passiva porque se traduz num dever de não ingerência e universal porque 
recai ou incide sobre toda a comunidade jurídica. De facto, para os 
personalistas, o poder directo e imediato sobre uma coisa é consequência 
jurídica do poder de impor aos outros uma abstenção. Noutros termos: é 
porque do outro lado da relação jurídica existe um dever geral de abstenção, 
que há, para o titular do direito real, “um monopólio de uso exclusivo da 
coisa” e, em consequência, o tal poder directo e imediato sobre ela (Dr. Mota 
Pinto). Tal teoria, diga-se, faz muito sentido: só se coloca esta necessidade 
de regular os direitos das pessoas sobre as coisas porque há mais que uma 
pessoa a querer a mesma coisa: se só houvesse uma pessoa, não havia um 
direito real. Mais uma vez se percepcionam as diferenças relativamente aos 
direitos de crédito, em que há apenas um sujeito – o devedor - obrigado a um 
determinado comportamento, ou seja, nestes o dever recai apenas sobre uma 
pessoa determinada. 
As concepções atrás expedidas pela doutrina personalista foram continuadas 
por DEMOGUE, com o “monismo personalista”: este autor defende a chamada 
“eficácia externa” (ou erga omnes) dos direitos de crédito. Trata-se de uma 
doutrina que defende que os direitos de crédito, apesar de terem uma 
eficácia primordial para a contraparte, são susceptíveis de, em certas 
situações, os seus efeitos se estenderem relativamente a terceiros. A 
diferença entre direitos reais e direitos de crédito seria, assim, meramente 
quantitativa, na medida em que obrigados a respeitar o conteúdo de um 
direito real estão todos os sujeitos, enquanto obrigado à realização de uma 
prestação – à realização do dever de prestar – está apenas o sujeito passivo da 
relação obrigacional, o devedor. Assim sendo, teria o credor o direito de 
exigir uma indemnização de todos aqueles que obstassem ao cumprimento da 
obrigação pelo devedor. Porém, vários argumentos podem ser contrapostos a 
esta posição, desde logo argumento de iure condito, como é o art. 406º/2, 
que fixa o pp da relatividade contratual. 
Mas, a tentativa de unificar direitos de crédito e direitos reais teve outros 
desenvolvimentos, com outros autores (GAUDEMET e o monismo realista) a 
afirmarem que o que caracterizava aqueles primeiros era constituirem um 
“direito sobre o património do devedor”, à semelhança do que sucedia com 
os direitos sobre coisas (mas estes seriam direitos sobre coisas determinadas). 
Sustentam estes autores estes argumentos na figura da impugnação pauliana, 
na qual o direito de crédito gozaria da sequela, uma das notas associadas aos 
direitos reais. Vários obstáculos podem ser aditados a esta doutrina, uma vez 
que faltam aos direitos de crédito notas típicas dos direitos reais – como são a 
sequela e a prevalência, ié, um direito de crédito não prevalece sobre outros 
direitos de crédito anteriormente constituídos. Além disso, fácil é de ver que 
a impugnação pauliana não se confunde com o direito de sequela que 
caracteriza os direitos reais: a impugnação pauliana (art. 610º e ss) traduz-se 
no poder do credor de impugnar os actos do seu devedor que envolvam 
diminuição de garantia patrimonial. Já, por exemplo, a reivindicação é o 
direito que tem o proprietário de ir buscar a coisa ao património de quem 
abusivamente se apoderou dela, tendo somente de provar a titularidade do 
direito real. Ora, o mesmo não sucede com a impugnação pauliana, pois nesta 
o credor tem de provar a titularidade do crédito, estando a impugnação 
dependente de vários requisitos, designadamente de um prazo (5 anos), ao 
contrário da acção de reivindicação que goza de imprescritibilidade. Para 
além disto, como explica o Dr. Mota Pinto, a impugnação pauliana não 
permite ao credor fazer seus os bens entretanto alienados pelo devedor, mas 
apenas fazer com que esses bens voltem ao património inicial, com a anulação 
do acto de transmissão da coisa para terceiro adquirente (art. 616º/4), muito 
embora o art. 616º/4 afirme expressamente que a impugnação pauliana só 
aproveita ao credor que a tiver exercido. 
Como afirma, então, o Dr. Menezes Cordeiro, “só os direitos reais têm 
sequela”, o que pode ser perspectivado, por exemplo, no caso de um 
contrato-promessa de comodato: A celebra com B um contrato promessa, pelo 
qual este último se comprometia a emprestar o automóvel a A. Chegado o 
momento da celebração do comodato, B alienara o automóvel a C. Ora, ao 
contrário do que acontece com os direitos reais – veja-se o usufruto – o direito 
de crédito de que A é titular – direito a exigir uma declaração negocial por 
parte de B – não segue a coisa, pelo que C não tem de facultar a A a utilização 
do veículo. 
Mas expliquemos melhor o direito de sequela: este traduz-se no facto de o 
direito real seguir a coisa que constitui o seu objecto, ié, de se poder fazer 
valer seja qual for a situação em que a coisa se encontre e é um corolário da 
eficácia absoluta dos direitos reais. Concretizando, o titular do direito real 
pode sempre exercer os poderesinerentes ao seu direito, ainda que a coisa 
que é objecto do mesmo ingresse no domínio material ou na esfera jurídica de 
outrem. Sobre o direito de sequela, várias notas há a deixar: primeiro, 
cumpre ver aquelas situações em que a coisa se encontra numa situação 
incompatível com o direito real; segundo, aquelas situações em que essa 
incompatibilidade não existe; terceiro, as excepções à sequela. 
1) Assim, a acção de reivindicação é o meio processual que assume o 
direito de sequela na hipótese de haver incompatibilidade entre a 
situação da coisa e o direito: A, locatário, vende, sem a autorização do 
proprietário, ou seja, sem legitimidade, a coisa a C. Nestes casos, pode 
o proprietário intentar uma acção de reivindicação para recuperar a 
coisa. 
2) Outras vezes, estaremos apenas perante uma situação jurídica 
susceptível de perturbar o exercício do direito: é o caso do usufrutuário 
e do credor hipotecário. Imaginemos a seguinte hipótese: A é titular de 
um direito de usufruto (direito real de gozo) sobre coisa pertencente a 
B. B aliena a coisa a C. Onde é que aqui se manifesta a sequela? 
Precisamente no facto do direito real (usufruto) poder ser oposto ao 
terceiro adquirente para quem a coisa se transmitiu, ou melhor, no 
facto do usufruto poder ser exercido contra o novo 
adquirente/proprietário. Para o efeito, basta, processualmente, uma 
acção de simples apreciação. Imaginemos outra hipótese: A é titular de 
um direito real de garantia, concretamente de uma hipoteca, sobre 
coisa de que é proprietário B. Este, entretanto, aliena o imóvel a D. 
Aqui a sequela traduz-se no facto de A poder fazer valer o seu direito 
independentemente da transmissão da propriedade. 
3) Em primeiro lugar, cumpre ver o que não é excepção à sequela: aqui 
releva a boa-fé de terceiro adquirente de bens móveis. Isto porque não 
vigora entre nós, ao contrário do que sucede nos direitos francês e 
anglossaxónico, o pp do “en fait de meubles possession vaut titre” ou o 
pp da “posse vale título”. Em que é que se traduz um tal princípio? 
Significa que um adquirente de bem móvel, que esteja de boa-fé – 
desconheça os vícios de legitimidade da pessoa que lhe alienou esse 
bem – o adquire definitivamente, estando protegido contra posterior 
acção de reivindicação do verdadeiro proprietário. Um regime como 
este justifica-se pelas necessidades do tráfego. No nosso OJ, o 
preceito que contraria este pp é o art. 1301º. Diz este que “o que 
exigir de terceiro coisa por este comprada, de boa-fé, a comerciante 
que negoceie em coisa do mesmo ou semelhante género é obrigado a 
restituir o preço que o adquirente tiver dado por ela, mas goza do 
direito de regresso contra aquele que culposamente deu causa ao 
prejuízo”. Daqui se deduz que o terceiro adquirente de boa fé corre o 
risco de a coisa lhe ser exigida pelo legítimo proprietário. 
Ora, as excepções à sequela situam-se, por maioria de razão, no campo 
dos bens imóveis e muito por força do instituto do registo, já que, de 
acordo com o art. 5º CRP, “Os factos sujeitos a registo só produzem 
efeitos contra terceiros depois da data do respectivo registo”. Por 
exemplo: A vende invalidamente a B, que vende a C, que regista e está 
de boa –fé. Admite-se – no chamado “efeito lateral do registo” – que C 
não veja o seu direito prejudicado, verificados certos requisitos (art. 
291º), pela posterior acção de reivindicação intentada por A. Outro 
exemplo: A vende a B, que não regista, e depois a C, que regista. 
Trata-se, a segunda alienação, de uma venda “a non domino”, mas, 
não obstante, B não pode invocar a propriedade adquirida contra 
aquele que adquiriu de um autor comum direito incompatível, pelo que 
o imóvel pertence a C. Justifica-se uma tal solução pela prioridade do 
registo: “prior in tempore, potior in jure”. 
 
O Direito de preferência ou prevalência: 
 Em que é que se traduz este direito? Traduz-se na prioridade dos 
direitos reais sobre os direitos de crédito e sobre os direitos reais 
constituídos posteriormente quando total ou parcialmente 
incompatíveis com o anterior. Constitui, à semelhança da sequela, uma 
emanação da eficácia erga omnes dos direitos reais. Existe uma 
divergência doutrinal sobre se a preferência é uma característica 
inerente a todos os direitos reais ou apenas aos direitos reais de 
garantia (Oliveira Ascensão). É o que sucede com a hipoteca, ou 
melhor, quando se constituem sucessivamente duas hipotecas sobre o 
mesmo imóvel: aqui a preferência afere-se claramente pois o titular da 
segunda hipoteca só pode vir a pagar-se depois do titular da primeira 
ter satifeito o seu crédito. Já quanto aos direitos reais de gozo, a 
preferência genuina não se faria notar: de facto, se o proprietário dum 
bem o aliena sucessivamente a duas pessoas, o que há é um direito e 
um não-direito, ié, uma venda a non domino, nula nos termos do art. 
892º. Dr. Mota Pinto considera que mesmo nestas hipóteses não 
devemos deixar de falar em preferência, que nos diz que prevalece o 
direito primariamente constituído. Obviamente que, explica ainda o 
autor, se a prioridade, nos direitos reais de garantia, é a prioridade no 
exercício do direito, a prioridade, nos direitos reais de gozo vai aferir 
da própria existência ou inexistência do direito. 
 
 O direito de preferência, juntamente com a sequela, confere aos 
direitos reais uma tutela particularmente forte. Inerente a esta tutela 
reforçada estão hoje os instrumentos que permitem ao credor, para 
garantir o pagamento da dívida por parte do devedor, adquirir ou 
reservar para si a titularidade de um direito real. É o que sucede com a 
venda com reserva de propriedade (art. 409º): trata-se de uma 
cláusula, usual na compra e venda a prestações, que visa colocar o 
credor em posição privilegiada, na medida em que este conserva a 
propriedade do objecto da venda até ao pagamento, pelo devedor, da 
última prestação. Tem vantagens para o credor porque evita que este, 
em caso de incumprimento da obrigação, intente acção no sentido de 
executar o património do devedor, em concorrência com os demais 
credores. Tem vantagens para o devedor, por outro lado, porque, ao 
contrário do penhor, não envolve o desapossamento da coisa, pelo que 
o comprador pode usá-la. É também o caso da alienação fiduciária para 
um fim de garantia e do leasing: neste último, uma empresa, 
geralmente um banco, ao invés de emprestar dinheiro ao particular, 
compra ela mesma o bem, cedendo o uso àquele, e dando-lhe a 
possibilidade de, pagas certas prestações, a propriedade se transferir 
directamente para ele. 
 Excepções à preferência: 1) a prioridade do registo; 2) privilégios 
creditórios imobiliários (art. 750º), independentemente de registo, 
prevalecem sobre a consignação de rendimentos, a hipoteca e o direito 
de retenção anteriormente constituídos. O mesmo já não sucede com 
os privilégios mobiliários especiais, em que se mantém a preferência; 
3) direito de retenção (art. 759º/2). 
 Também nos direitos de crédito existe direito de preferência: veja-se o 
art. 407º. Este preceito determina que “quando, por contratos 
sucessivos, se constituírem, a favor de pessoas diferentes, mas sobre a 
mesma coisa, direitos pessoais de gozo entre si, prevalece o direito 
mais antigo em data”. Por exemplo, veja-se a locação. Se o locador 
aluga duas vezes a mesma casa a pessoas diferentes para o mesmo 
período, detém preferência o locatário cujo contrato foi celebrado 
primeiro. O direito de crédito deste prevalece sobre o direito de 
crédito do outro. Outra das situações de prevalência nos direitos de 
crédito são os privilégios mobiliários gerais: trata-se de privilégios 
creditórios que incidem sobre todos os bens móveis do devedor (art. 
736º) – veja-se, por exemplo, os créditos emergentes do contrato de 
trabalho; não constituem direitos reais de garantia, pois estes têm 
necessariamente deincidir sobre coisa certa e determinada (princípio 
da especialidade ou da individualização), mas são uma garantia 
especial das obrigações. Quem é titular de um privilégio mobiliário 
geral paga-se preferentemente aos credores comuns, e, na hipótese do 
titular do crédito e do privilégio ser o Estado e as autarquias locais, 
prevalece sobre os privilégios mobiliários especiais, que são direitos 
reais. 
 
Inerência 
A inerência é a síntese dos direitos de sequela e prevalência e traduz-se na 
ligação íntima da coisa com o seu titular. Por outras palavras, a coisa adere ao 
seu titular porque não é possível manter um direito real se o seu objecto 
mudar. Expliquemos com um exemplo: A constitui a favor de B um usufruto 
sobre o prédio X. Se A e B pretendem transferir o usufruto constituído para o 
prédio W, a inerência consiste aqui na extinção do usufruto constituído sobre 
o primeiro prédio e a constituição de um novo usufruto sobre o prédio W. 
Esta característica de o direito real envolver um poder directo e imediato 
sobre a coisa para o respectivo titular contrapõe-se à obrigação de todas as 
pessoas o respeitarem, ou seja, à eficácia absoluta ou erga omnes dos direitos 
reais /poder do titular exercer o seu direito face a todos os outros. Mas os 
personalistas vieram dizer que há direitos reais que não são poderes directos e 
imediatos sobre coisas. Para isso, cumpre ver que tipos de direitos reais 
existem. Ora, de acordo com o pp da tipicidade ou do numerus clausus, só 
são direitos reais aqueles que estão previsto na lei (art. 1306º). Ou seja, não é 
possível constituir direitos reais diferentes dos tipificados na lei nem 
modificar ou modelar o respectivo conteúdo, salvo nos casos em que a lei 
excepcionalmente o permita (Propriedade horizontal, usufruto e servidões). 
Dr. Mota Pinto: o pp do numerus clausus “resulta da impossibilidade em que 
se encontram os particulares de criar direitos reais de um tipo ou com um 
conteúdo que não correspondem aos tipos e conteúdos desenhados na lei; não 
há, assim, liberdade de conformação interna dos direitos reais diversamente 
do que sucede nos direitos de crédito”. Note-se que, de acordo com este 
autor, não existe nenhum pp da tipicidade para os negócios com eficácia real 
- ou seja, os direitos reais podem constituir-se por negócios atípicos ou 
inominados -; o que existe é uma tipicidade dos modos de constituição dos 
direitos reais. 
 
Nestes casos de excepção, os chamados “tipos abertos”, permite-se ao 
respectivo titular alguma liberdade na modelação do conteúdo do direito, 
desde que claro essa liberdade de modelação não desfigure ou descaracterize 
a tipo de direito real. Podem ser apontadas várias vantagens, mas também 
várias desvantagens a este sistema de taxatividade (p. 36-37). Há, porém, um 
argumento que deve ser expressamente expedido: é o facto dos direitos reais 
terem eficácia erga omnes – deverem ser respeitados por todos - que justifica 
o pp do numerus clausus, pois a não ser assim, ié, se não se permitisse a sua 
cognoscibilidade através da tipicidade, cada um poderia estar a violar direitos 
reais de outrem sem o saber. Isto por um lado. Por outro lado, a eficácia 
absoluta dos direitos reais impõe restrições à liberdade de acção de todos, e 
daí que não se permita a livre criação de direitos reais e a livre fixação do seu 
conteúdo. Ou seja, parece irrazoável que dois particulares, celebrando um 
contrato a que atribuissem eficácia real, possam limitar a liberdade de todos 
os restantes membros da comunidade. O problema dos direitos reais, além 
disso, é uma questão ligada a interesses de ordem pública, sendo por isso 
necessário que sejam regulados de forma imperativa pela lei. Por último, o 
Dr. Mota Pinto refere ainda dois argumentos contra um possível pp do 
numerus apertus: i) o facto dele conduzir a uma proliferação de direitos reais, 
proliferação essa que seria economicamente desvantajosa por entravar a 
exploração dos prédios; ii) a comunhão de direitos reais limitados sobre a 
mesma coisa é fonte de discórdias. 
Vários autores, mesmo na nossa doutrina – veja-se o Dr. Oliveira de Ascensão – 
advogavam, não obstante, que deveria valer o pp do numerus apertus de 
direitos reais, e isto para não haver, como explica o Dr. Mota Pinto, um 
“desfasamento entre os esquemas legais e vida prática”. 
Atentamos melhor à formulação do art. 1306º: “Não é permitida a 
constituição, com carácter real, de restrições ao direito de propriedade ou de 
figuras parcelares desse direito senão nos casos previstos na lei: toda a 
restrição resultante de negócio jurídico, que não esteja nestas condições, tem 
natureza obrigacional”. 
Bem, quanto a isto, há que distinguir a posição do Dr. Oliveira Ascensão, por 
um lado, da do Dr. Pires de Lima e Dr. Antunes Varela, por outro. O primeiro 
autor entende que quando o legislador se refere a “toda a restrição” engloba 
quer as restrições ao direito de propriedade, quer as restrições a figuras 
parcelares desse direito e que, por isso, umas e outras são convertíveis num 
direito de crédito, desde que o direito real que as partes visaram seja 
compatível com uma estrutura obrigacional. O Dr. Oliveira Ascensão defende, 
não obstante, que esta é uma solução que, apesar de vigorar de iure 
constituto, é de lamentar de iure constituendo porque não outorga às partes o 
benefício da demonstração de que não teriam querido ficar com um mero 
direito de crédito se tivessem previsto que o negócio não poderia valer como 
constitutivo de direito real. Já a posição dos segundos Autores é a de atribuir 
uma consequência jurídica distinta consoante a restrição não legalmente 
prevista opere sobre o direito de propriedade ou sobre figuras parcelares 
desse direito: assim, no que toca ao primeiro, a lei presume que as restrições 
têm natureza obrigacional, salvo se as partes a não quiserem. Estes autores 
consideram, portanto, que há, no que toca às restrições do direito de 
propriedade, uma presunção legal e não uma conversão legal; no que toca às 
segundas, o negócio jurídico é nulo mas não se arreda a possibilidade de o 
mesmo se converter num direito real legalmente previsto. Face a isto, 
argumenta o Dr. Justo que o mais razoável seria pensar que, na 
impossibilidade de as restrições ou figuras parcelares do direito de 
propriedade se converterem em figuras reais, os negócios em que forem 
criadas produzirão efeitos obrigacionais, se as partes os não recusarem (Dr. 
Santos Justo). 
 
- Direitos reais de gozo: de acordo com o Dr. Mesquita, “conferem ao titular, 
sobre a coisa, um direito de uso ou fruição”. De acordo com o Dr. Justo, “os 
direitos reais conferem ao seu titular o poder ou faculdade de utilizar, total 
ou parcialmente, a coisa que têm por objecto (uso e habitação) e, por vezes, 
também de se apropriar (total ou parcialmente) dos frutos produzidos” 
(usufruto). São direitos que satisfazem a função económica do “ius utendi, ius 
fruendi et ius abutendi”. Quais são eles? Direito de propriedade (art. 1305º), 
usufruto (art. 1439º), direito de superfície (art. 1524º), servidões reais (art. 
1543º), direito de uso e habitação (art. 1484º), propriedade horizontal (pelo 
menos para a parte da doutrina que considera que a propriedade horizontal é 
um direito diferente do direito de propriedade, art. 1414º), direito real de 
habitação periódica ou time-sharing (DL n.º 275/93, de 5 de Agosto). 
A generalidade dos direitos reais de gozo – com excepção da propriedade – são 
direitos reais limitados (“jura in re aliena”), pois oneram e restringem a 
propriedade e o seu conteúdo não abarca a totalidade dos poderes daquela. O 
pp da elasticidade traduz-se, assim, no facto de, extintos os direitos reais 
limitados sobre a coisa, restituir-se a propriedade na totalidade dos seus 
poderes. 
 
 
 
 
 
- Direitos reais de garantia: estão no livro das obrigações porque são 
acessóriosdestas. A sua função económica está conexionada com os direitos 
de crédito, ao ponto de, desaparecendo este direito, extinguir-se 
Direito de 
propriedade 
Direitos reais limitados 
Direito de propriedade Extinção dos 
direitos reais 
limitados 
automaticamente o direito real de garantia. Mas tais direitos não são direitos 
de crédito. Conferem ao credor o direito de se pagar à custa do valor (ou dos 
rendimentos) de certos bens, com preferência sobre os demais credores do 
devedor. É o caso do penhor (art. 666º), hipoteca (686º), privilégios 
creditórios mobiliários especiais e imobiliários (art. 738º e ss) – apenas os 
privilégios creditórios especiais constituem direitos reais, pois os privilégios 
gerais incidem sobre todo o património do devedor; como os direitos reais 
incidem sempre sobre uma coisa certa e determinada (pp da especialidade ou 
individualização) os PCG não são direitos reais - direito de retenção (art. 
754º), consignação de rendimentos (art. 656º). 
Uma importante diferença existe entre estes dois tipos de direitos: só os 
direitos reais de gozo e a propriedade podem ser adquiridos por usucapião 
(art. 1287º). 
Quanto ao pp da especialidade ou da individualização, este traduz-se no 
facto de o objecto dos direitos reais dever ser uma coisa certa e determinada, 
o que, aliás, já resultaria da própria eficácia absoluta dos direitos reais que se 
traduz num dever geral de abstenção por parte da comunidade jurídica. Por 
isso, entende-se que não há direitos reais sobre coisas genéricas, ié, definidas 
apenas por género e quantidade, sendo necessária a especificação dessas 
coisas. Coisa diversa sucede com os direitos de crédito, pois é possível – veja-
se a modalidade das obrigações genéricas – constituir uma obrigação sem que 
o respectivo objecto esteja determinado. 
 Uma tal circunstância – a de os direitos reais só poderem recair sobre coisa 
certa e determinada - permite-nos três conclusões: 1)o direito real que incide 
sobre uma coisa não é o mesmo que tem por objecto outra igual; 2) se a 
transferência do direito real se reportar a coisa futura ou indeterminada, o 
direito só se transfere quando for adquirida pelo adquirente ou determinada 
com conhecimento das partes. Ou seja, não há direito real sobre coisas 
futuras, até porque não há coisas enquanto elas não existem. 3) se respeitar a 
frutos naturais ou partes componentes ou integrantes, a transferência só se 
verifica no momento da colheita ou separação. É o que nos diz o art. 408º. 
Ainda no que toca ao pp da especialidade, cumpre dizer que não obsta a este 
princípio o facto de se poderem constituir direitos reais sobre coisas 
colectivas, pois estas constituem, elas mesmas, uma forma de determinação 
ou de individualização do objecto. Veja-se o que determina o art. 206º/1: “É 
havida como coisa composta, ou universalidade de facto, a pluralidade de 
coisas móveis que, pertencendo à mesma pessoa, têm um destino unitário”. 
Ou seja, essa pluralidade de coisas móveis é tratada pelo direito como se 
fosse uma coisa única. O Dr. Mota Pinto, muito embora a lei não faça qualquer 
destrinça entre elas, distingue entre universalidade de facto e coisa 
composta. A universalidade de facto é, por exemplo, um rebanho de ovelhas: 
o tratamento do rebanho como universalidade justifica-se por razões de 
comodidade, pois assim, por exemplo, para efeitos de acção de reivindicação, 
poderá ser intentada apenas uma acção relativamente a todo o rebanho e não 
várias acções de reivindicação relativas a cada animal que o constitua. Outra 
das características da universalidade reside no carácter homogéneo das coisas 
que o compõem – todas elas se encontram no mesmo plano - , de tal forma 
que o valor da universalidade corresponderá ao somatório dos valores de 
todas as coisas que o compõem. Uma coisa composta é, por exemplo, um 
estabelecimento comercial. Para muitos efeitos – trespasse, acção de 
reivindicação ... – a lei toma o estabelecimento como uma coisa única. A coisa 
composta é, pois, uma coisa unificada pelo direito, distinguindo-se da sua 
congénere universalidade de facto por as coisas que a compõem serem 
heterogéneas e pelo seu valor global exceder o somatório do valor dos 
elementos singulares. 
A respeito das universalidades (enquanto resultado da união de várias coisas 
simples que têm um destino unitário não obstante a individualidade 
económica, ou seja, uma função e valor próprios no comércio, 
independentemente da agregação em que se encontram) levantaram-se duas 
teorias – a teoria unitária e a teoria atomista. 
O art. 408º/1 consagra o pp da consensualidade, ié, diz-nos que podem 
constituir-se ou transferir-se direitos reais sobre coisa certa e determinada 
por mero efeito do contrato, sem necessidade de qualquer acto posterior que 
venha acrescer ao negócio jurídico. Esta é a regra no nosso ordenamento 
jurídico: os negócios jurídicos que seguem esta regra designam-se, pois, 
negócios consensuais, contrapondo-se aos negócios reais quanto à 
constituição, que são aqueles que não se bastam com o consenso entre as 
partes e cuja perfeição depende, portanto, de um acto material de entrega 
da coisa (ver nota de rodapé 108, p. 35, SJ). De facto, o nosso sistema está 
em aberta contradição com o sistema alemão (o sistema do modo), no qual 
um contrato de compra e venda só tem eficácia obrigacional – o credor tem o 
direito de exigir do devedor a entrega da coisa – só havendo transferência da 
propriedade quando haja inscrição do negócio no registo. Note-se que falamos 
aqui de pp da consensualidade num determinado sentido – no sentido de 
oposição ao pp da causalidade – e não no sentido do art. 219º, ié, de que por 
regra a validade dos negócios jurídicos não depende da observância de forma 
especial, salvo quando a lei o exigir. Neste sentido, opõem-se aos negócios 
consensuais os negócios formais, ié, aqueles em que a lei exige que a 
declaração negocial se realize mediante um determinado comportamento 
declarativo. 
Mas vejamos as excepções ao pp da consensualidade: o que significam estas 
excepções? Significa que há situações em que não basta o acordo das partes 
para haver transferência do direito real. Por exemplo, o comodato é, para a 
maioria da doutrina, um contrato com eficácia real quanto à constituição, 
mas não já quanto aos efeitos, pois o comodato não produz efeitos reais mas 
meramente obrigacionais. Defende, porém, o Dr. Paulo Mota Pinto – na esteira 
do Dr. Carlos Mota Pinto - que, estando as partes de acordo, o comodato pode 
constituir-se por mero acordo, independentemente de haver ou não entrega 
da coisa. Por isso, não havendo cláusula das partes no sentido da eficácia real 
deste contrato quanto à constituição, ele deve ter-se por vinculativo logo que 
se verifique o acordo. 
São excepções ao pp da consensualidade o penhor de coisas (art. 669º), o 
penhor de créditos (art. 682º) – é necessário, em algumas circunstâncias, a 
notificação do devedor- a doação de bens móveis (art. 947º/2) – quando não 
seja feita por escrito, é necessário a entrega da coisa. 
O registo 
 
É também apontada como excepção ao pp da consensualidade o art. 5º do 
CRPredial. Na verdade, este deverá ser visto, não tanto como uma excepção, 
mas mais como um desvio à regra da consensualidade. Diz aquele preceito, no 
n.º 1, que “Os factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros 
depois da data do respectivo registo”. Ou seja, se A vende o imóvel X a B, que 
não regista, e depois vende a C, que regista, atentando somente ao art. 
408º/1 CC, o imóvel pertenceria a B, pois a venda de A a C é uma venda a non 
domino, e como tal, nula, nos termos do art. 892ºCC. A propósito desta 
questão, é proveitoso falar do registo. O registo visa dar publicidade à 
situação jurídica dos prédios, tendo em vista a segurança do comércio jurídico 
imobiliário. De facto, por regra, as coisas móveisnão estão sujeitas a registo, 
muito embora existam excepções (automóveis, aeronaves e navios). Antes 
facultativo, o registo é hoje obrigatório, mas esta obrigatoriedade em nada 
altera o disposto no art. 408º CC, ou seja, o registo continua a não ser 
constitutivo – não é condição de validade do negócio jurídico que inscreve – 
mas sim meramente declarativo. 
Ora, o registo respeita a prédios e às aquisições e mutações quando à 
titularidade destes e não a pessoas. Pode ter vários tipos de eficácia: pode ser 
um registo definitivo (satisfaz os requisitos legais e é plenamente eficaz) ou 
provisório, podendo ser provisório por dúvidas – quando algum motivo, que 
não pode ser fundamento de recusa, impede o conservador de lavrar o 
registo, convertendo-se este registo em definitivo logo que as dúvidas sejam 
removidas – ou por natureza – assenta em diversas razões legalmente 
consideradas, e a sua provisoriedade só pode ser afastada caso ocorra um 
novo facto. 
Quais os pp subjacentes ao registo? 
- PP da instância: o registo efectua-se a pedido dos interessados, salvo casos 
de registo oficioso; 
- PP da legalidade (ver p. 59 SJ) 
- PP da legitimação (art. 9º/1 CRP); 
- PP do trato sucessivo: só é possível efectuar-se o registo, se a pessoa de 
quem se adquiriu o direito for a última inscrita no registo. Ver art. 116º CRP 
(justificação); 
- PP da prioridade: “prior in tempore potior in jure” – prevalece o direito 
primeiramente inscrito (art. 6º/1 CRP), exceptuando-se o disposto no n.º 2 
sobre as inscrições hipotecárias. O art. 6º/3 diz-nos ainda que o registo 
convertido em definitivo conserva a prioridade que tinha enquanto provisório. 
Ver ainda art. 6º/4 CRP. 
Quais os efeitos do registo? 
O registo funda a confiança dos particulares de que o que está registado 
corresponde à realidade substancial da situação jurídica dos prédios. Nesse 
sentido, o registo oferece duas presunções ilidíveis: por um lado, a de que o 
direito existe; por outro, a de que pertence a quem está inscrito como seu 
titular. 
Assim, o registo tem um efeito: 
 Enunciativo: é a função do registo que se limita a publicitar a situação 
jurídica dos bens; apesar de, de um modo geral, ser inóquo quanto a 
consequências jurídicas, pode relevar, pelo registo da mera posse (art. 
2º/1/e), para a aquisição por usucapião. 
 Consolidativo: Se A vende o imóvel W a B, que não regista, e 
posteriormente o vende a D, que regista, o imóvel pertence a D e não a 
B. Mas, se B registar, não corre esse risco e daí dizer-se que, nestas 
hipóteses, o registo tem um efeito consolidativo, porque vem 
estabilizar ou consolidar a posição de B que assim deixa de poder ser 
perturbada pelos terceiros para efeitos de registo (art. 5º/4 CRP). 
Sobre esta questão, levantam-se dois problemas: 
1º Problema -Quanto ao conceito de terceiros para efeitos de registo, 
existe uma querela entre os autores da escola de Lisboa (mas também 
o Dr. Santos Justo parece aproximar-se desta posição...), que exigem, 
para que D (adquirente a non domino) possa ficar titular do direito 
sobre o imóvel, que este tenha adquirido a título oneroso e esteja de 
boa fé, e a escola de Coimbra, que dispensa aqueles requisitos. O art. 
5º/4 do CRP consagra este último entendimento, adoptando um 
conceito “restrito” (ao nível dos requisitos) de terceiros para efeitos de 
registo. A par destas posições, alguns autores (HENRIQUE MESQUITA, 
ANTUNES VARELA, MÓNICA JARDIM) defendem o seguinte conceito: “terceiros 
não são só aqueles que adquiram do mesmo alienante direitos 
incompatíveis, mas também aqueles cujos direitos, adquiridos ao 
abrigo da lei, tenham esse alienante como sujeito passivo, ainda que 
ele não haja intervindo nos actos jurídicos (penhora, arresto, hipoteca 
judicial) de que tais direitos resultam”. Que situações querem estes 
autores abarcar? 
 
 
 
 
 
 
Como explica a Dra. Mónica Jardim, o credor que regista a penhora passa a 
ser titular de direito real que visa assegurar a satisfação privilegiada do 
direito de crédito, direito este que pode ser, portanto, equiparado a uma 
hipoteca. O conflito a solucionar não será portanto entre o direito de crédito 
do credor B e o direito real não registado do terceiro, mas entre o direito real 
de garantia gerado pela penhora e o direito real não registado do terceiro. 
2º Problema: como conciliar o disposto no art. 5º/1 do CRP (“os factos 
sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros depois da data do 
registo”) e o art. 408º/1 CC, que consagra o pp da consensualidade? O 
problema reside no facto de, aplicando o art. 408º/1, a propriedade (ou outro 
Devedor executado: penhora 
de um prédio 
Credor B 
Devedor executado 
aliena o imóvel antes 
do registo da penhora 
3º Adquirente não regista 
a aquisição ou regista 
posteriormente 
direito real) se transferir por mero acordo entre as partes, pelo que o direito 
adquirido deveria ter, a partir deste momento e como qualquer outro direito 
real, eficácia erga omnes. Por isso, alguns autores concluem pela teoria da 
eficácia relativa, no sentido de que, antes do registo, o direito real adquirido 
não teria eficácia erga omnes. Fácil é de ver, no entanto, que esta teoria é de 
recusar por contrariar tudo o que temos dito sobre os direitos reais. A par 
desta teoria, podemos ainda salientar outras, como a teoria da eficácia 
processual do registo, a teoria da reserva de legitimidade para dispor por 
parte do alienante e a teoria da condição suspensiva (pp. 74 SJ). Aceite entre 
nós é a teoria da condição resolutiva ex nunc: para esta, o primeiro 
adquirente adquire um direito real, oponível erga omnes, mas existe uma 
condição legal do contrato que determina a cessação da produção dos seus 
efeitos jurídicos se um evento futuro e incerto – o registo por um adquirente 
posterior – se verificar. Ex nunc (sem efeitos retroactivos) porque o terceiro 
que adquire a non domino só é titular do direito real a partir do momento em 
que regista, os efeitos do registo não retroagem à data da alienação. Por isso, 
quando o art. 5º/1 dispõe que “os factos sujeitos a registo só produzem 
efeitos contra terceiros depois da data do respectivo registo”, estes terceiros 
não são todos os sujeitos da comunidade jurídica – e nessa medida não surge 
comprometida a eficácia real do direito adquirido pelo 1º adquirente – mas 
apenas os sujeitos para efeitos de registo, definidos no art. 5º/4 daquele 
código. O direito real inicialmente transferido é oponível a toda a comunidade 
jurídica e só se torna inoponível aos terceiros para efeitos de registo a partir 
do momento em que estes desencadeiam o evento fututo de cuja não 
ocorrência está dependente a continuidade do direito do primeiro adquirente. 
A questão poderia ser mais facilmente resolvida se tomássemos em conta, 
como preconizam PIRES DE LIMA E ANTUNES VARELA, as excepções ao pp da 
consensualidade a que se refere o art. 408º: aí teríamos que os direitos reais 
se transferem por mero efeito do contrato, salvo no que toca aos imóveis e 
móveis sujeitos a registo, pois nestes o direito real adquirido só produz efeitos 
relativamente a terceiros a partir do registo. 
 
 Constitutivo: já vimos que, em regra, o registo é meramente 
declarativo, ié, não é condição de validade dos negócios pelos quais se 
transmitem os direitos reais sobre imóveis. Não obstante, existem 
excepções a esta regra, que são, necessariamente, também excepções 
ao pp da consensualidade. É o que sucede com a hipoteca, na qual o 
registo é constitutivo, ou seja, na ausência deste a hipoteca é 
inexistente (art. 4º/2 CRP e art. 687º CC). 
 Aquisitivo ou atributivo: corresponde àquelas hipóteses em que o 
registo é atributivo de direitos. Elas são duas: o já referido efeito 
central do registo – A vende a B, que não regista, A vende a C, que 
regista; no art. 291º protege-se a posição de um terceiro adquirente anon domino. Por exemplo, A (menor) vende a C um imóvel, que depois 
o vende a F. Este F, se estiver de boa-fé, se a aquisição for a título 
oneroso e respeitar a bens imóveis ou móveis sujeitos a registo, se 
houver registado a sua aquisição e a acção de anulação (ou de 
declaração de nulidade) do acto de A não for intentada dentro dos três 
anos subsequentes à conclusão do negócio, vai ver a sua posição 
protegida. Ora, esta hipótese é uma excepção ao art. 289º, que 
determina que a declaração de nulidade e a anulação produzem efeitos 
retroactivos, pelo que, a não haver aquela excepção, o imóvel 
retornaria à esfera jurídica de A. Há quem não veja aqui uma situação 
de atribuição de direitos pelo registo; pelo contrário, estaríamos, para 
alguns autores, perante uma situação de efeito lateral do registo: F não 
é protegido porque registou, mas ele só será protegido se registar. 
Também o art. 291º está em aparente contradição com o art. 17º/2 
CRP, que determina que “a declaração de nulidade do registo não 
prejudica os direitos adquiridos a título oneroso por terceiro de boa fé, 
se o registo dos correspondentes factos for anterior ao registo da acção 
de nulidade”, ou seja, exige apenas, para que a posição do terceiro 
seja protegida, que este tenha registado a aquisição antes do registo da 
acção de anulação ou declaração de nulidade, ié, mesmo que esta seja 
intentada e registada dentro do prazo de três anos, se o terceiro 
registar primeiro, é ele o titular do direito real sobre o imóvel. Fácil é 
de ver – e este é um ponto consensual – que o regime do registo é bem 
mais vantajoso para a posição do terceiro adquirente. Naturalmente, 
há quem dê prevalência à lei substantiva (OLIVEIRA ASCENSÃO, SANTOS 
JUSTO) – defendendo a aplicação analógica do prazo do art. 291º ao art. 
17º/2 – e quem dê preferência ao regime registal, no sentido de 
proteger os interesses de certeza do tráfego. Outros autores, por outro 
lado, argumentam que a nulidade a que se refere o art. 17º/2 é uma 
nulidade autónoma, que se prende com o próprio registo e não com os 
vícios substantivos do negócio, pelo que o art. 291º nada teria a ver 
com aquele preceito, estando restrito aos casos de invalidade do 
próprio facto registável. Como explica PINTO DUARTE, o art. 17º/2 não 
abrange os casos em que o vício do registo resulta da invalidade do 
negócio. Contra esta posição pode argumentar-se que no art. 16º CRP 
estão englobadas causas de nulidade do registo que derivam da 
nulidade do próprio negócio. 
 
O PP da publicidade 
 
Relacionado com o princípio da consensualidade, está o pp da publicidade: 
este traduz-se no facto da constituição e transferência de qualquer direito 
real revestir notoriedade, ser acessível ao conhecimento geral. Subjaz a este 
princípio um interesse da comunidade, muito por força do pp da eficácia 
absoluta dos direitos reais. Como se consegue essa publicidade? Através do 
formalismo negocial – muito embora o principal interesse deste formalismo 
seja proteger as partes e não dar a conhecer a situação jurídica dos bens -, da 
posse – visível, não só nos contratos para cuja perfeição é necessária a 
entrega da coisa, como porque o possuidor goza da presunção de titularidade 
do direito – e no registo predial. O registo – que vale tanto para os bens 
imóveis como para os bens móveis sujeitos a registo – visa dar-nos a situação 
jurídica dos bens. 
 
Direitos reais de aquisição: E quanto aos direitos reais de aquisição? De 
acordo com o Dr. Mesquita, seriam tão poucos os direitos reais de aquisição 
que nem sequer valeria a pena integrá-los numa categoria autónoma. Estes 
conferem ao respectivo titular a faculdade de adquirir, em certos termos, um 
direito real de gozo sobre uma coisa. Noutros termos, são direitos que 
garantem, através da atribuição de um direito potestativo, a aquisição futura 
de um outro direito real. É o caso do direito que o promitente-comprador 
adquire em caso de contrato promessa com eficácia real ou na hipótese de 
direito de preferência. O direito real de preferência pode traduzir-se num 
direito legal de preferência – art. 1091º, 1112º/4, 1409º,1535º, 1555º, 2130º - 
ou num direito convencional de preferência ao qual as partes hajam atribuído 
eficácia real (art. 422º). Há quem defenda que, nestes dois casos, o que 
existe é um direito potestativo que permite ao seu titular substituir-se ao 
terceiro com quem o obrigado à preferência haja contratado, fazendo seu o 
respectivo negócio. Veja-se, aliás, que não há nenhum poder directo e 
imediato sobre a coisa (Dr. Mota Pinto). A posição deste autor é, aliás, esta 
mesma: não podemos falar verdadeiramente de um direito real de 
preferência, mas sim de uma “relação obrigacional complexa, integrada por 
um direito de crédito em relação ao proprietário e por um direito potestativo 
de aquisição ou constituição de uma relação de proprietário sobre a coisa. 
 
No caso do contrato promessa com eficácia real (art. 413º), na eventualidade 
do promitente vendedor não querer vender o imóvel por o já ter alienado 
validamente a favor de um terceiro, o promissário tem, para muitos autores, 
um direito real de aquisição, com eficácia erga omnes, razão pela qual a 
alienação posterior não afecta a posição do promissário ou promitente-fiel. 
Esta é a posição do Dr. Almeida Costa, do Dr. Menezes Cordeiro, do Dr. Rui 
Alarcão e do Dr. Antunes Varela. Mas também aqui há dissidentes: para o Dr. 
Mesquita, trata-se de um direito de crédito a obter por intermédio do tribunal 
- o direito à execução específica não pode considerar-se real só porque o 
negócio, uma vez concluído, opera a transferência ou a constituição de um ius 
in re – e para o Dr. Calvão da Silva, um direito de crédito com eficácia 
ampliada por força do registo. 
 
Esta é a sistematização seguida pelo Dr. Santos Justo e que, a par das 
reservas quanto aos direitos reais de aquisição, é também seguida pelo Dr. 
Mesquita. A sistematização proposta pelo Dr. Mota Pinto é, porém, diversa. 
Esquematicamente pode exemplificar-se da seguinte forma: 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Posto isto, qual é então o direito real que, na óptica dos personalistas, não 
envolve um poder directo e imediato sobre uma coisa? Não se tratando do 
penhor – que, enquanto contrato com eficácia real quanto à sua constituição 
envolve sempre a entrega da coisa pelo devedor ao credor, ficando este 
investido, nessa medida, de um poder directo e imediato sobre ela – trata-se, 
na verdade, da hipoteca, pois nesta o credor hipotecário não tem um poder 
directo e imediato sobre a coisa. Mas, note-se, que isto apenas se encararmos 
estes poderes como poderes materiais ou de facto, pois se os perspectivarmos 
como poderes jurídicos, então o credor hipotecário tem efectivamente um 
poder directo e imediato sobre a coisa. Que poder é esse? Precisamente o 
poder de, na eventualidade de incumprimento pelo devedor, o credor 
(normalmente um banco) poder intentar uma acção executiva para venda 
Direitos reais 
(MP) 
Posse: para o Dr. Mota Pinto, a posse é um direito real provisório; 
Propriedade 
 De coisas móveis; 
 De coisas imóveis 
 De águas 
 Compropriedade 
 Propriedade 
horhorizontal 
Direitos reais 
limitados 
 Direitos reais de gozo 
 Direitos reais de garantia 
 Direitos reais de aquisição 
judicial do bem imóvel, ficando a dívida liquidada com o produto dessa venda. 
Isto para mostrar que estão totalmente proibidos os pactos comissórios (art. 
694º), ou seja, “é nula a convenção pela qual o credor fará sua a coisa 
onerada no caso de o devedor não cumprir”. 
A última das críticas dirigidas pela teoria personalista à teoria realista 
consiste no facto de existirem direitos reais que concedem poderes directos e 
imediatos sobre a coisa, não sendo, porém, este poder directo e imediato o 
meio de satisfação dos interesses do titular do direito real. É o caso dosdireitos reais de garantia, mas não de todos: por exemplo, já vimos que na 
hipoteca o titular do direito real não exerce, materialmente, um poder 
directo e imediato sobre a coisa. Falamos, pois, do penhor (art. 669º), para 
cuja perfeição, como de resto em todos os contratos reais quanto à 
constituição, é necessária a entrega da coisa. Esta entrega visa obviamente 
satisfazer o interesse do credor, mas também dar publicidade ao penhor, na 
medida em que todos os restantes credores ficam a saber que a coisa foi 
entregue ao credor pignoratício. Na verdade, o credor pignoratício não vai 
usar a coisa, mas sim conservá-la e, na eventualidade da dívida não ser paga, 
fazer vendê-la. Concretizando, o interesse do credor pignoratício só vai ser 
satisfeito quando este fizer vender a coisa, através do tribunal, ou seja, o 
exercício de um poder directo e imediato sobre a coisa não satisfaz o 
interesse do credor. 
Mas também existem críticas quanto à teoria personalista: i) a de que esta 
sobrevaloriza o momento sancionatório, deixando sem resposta o problema de 
saber em que consiste o direito real, ié, qual o conteúdo deste, ii) para além 
de cair no absurdo de postular uma relação jurídica entre o titular de um 
direito e a generalidade dos homens; iii) a obrigação passiva universal não 
tem natureza patrimonial e por isso não pode ser contrapartida de um direito 
real, que é, por natureza, um direito patrimonial; iv) a teoria personalista 
ignora que o núcleo de qualquer direito real se compõe de poderes sobre 
coisas. 
 
3ª teoria: a posição eclética. É a posição perfilhada pelo Dr. Mota Pinto – 
com a qual o Dr. Santos Justo não concorda – e que consiste numa conciliação 
das teorias clássica e da personalista, mas que, note-se, parte desta, sendo 
depois delimitada pela primeira. Expliquemos melhor: o direito real tem um 
lado externo, que é a ligação intersubjectiva ou a eficácia do direito, ié, a 
obrigação que recai sobre todos os membros de uma comunidade no sentido 
de respeitarem o exercício de determinados poderes sobre uma coisa. Se não 
perspectivássemos a estrutura do direito real desta forma, dificilmente 
conseguiríamos explicar o direito de reivindicar a coisa; mas um tal “lado” 
não nos dá a esfera de acção que deve ser respeitada, ou seja, os poderes que 
podem ser exercidos pelo titular do direito sobre uma concreta coisa. Como 
explica aquele Autor, “não é pela ligação inter-subjectiva que distinguimos a 
propriedade do usufruto, da servidão ou do direito de superfície. Ora, é o lado 
interno que nos dá o contéudo específico de poderes que se podem exercer 
sobre a coisa, que varia de direito real para direito real, os quais, como 
sabemos, respeitam o pp do numerus clausus. Assim, de acordo com a teoria 
eclética ou mista, podemos apontar várias diferenças entre direitos de crédito 
e direitos reais: 
 Direitos reais Direitos de crédito 
Eficácia Erga omnes/absoluta Relativa/inter partes 
Tipo Direitos de exclusão Direitos de colaboração 
Objecto Coisas (certas e 
determinadas) 
Prestações (facto ou coisa) 
Violação Comportamento positivo Comportamento negativo ou 
omissão 
 
De facto, é no campo da violação que nos apercebemos de outra diferença 
entre os direitos de crédito e os direitos reais. Os direitos reais impõem um 
dever geral de abstenção por parte de toda a comunidade, pelo que, por 
conseguinte, a sua violação envolve um comportamento positivo do sujeito; os 
direitos de crédito, por seu turno, impõem deveres de prestar 
(tendencialmente positivos), pelo que a sua violação far-se-á, normalmente, 
por intermédio de uma omissão. Logo que se verifique a violação de um 
direito real, o seu titular beneficia de um direito à indemnização, nos termos 
do art. 483º, e, se for caso disso, do direito à restituição da coisa através de 
acção de reivindicação (art. 1277º, 1311º). A estes dois mecanismos costuma 
chamar-se “pretensões reais”: são direitos de crédito como quaisquer outros, 
mas estão sujeitos a um regime distinto do comum àqueles direitos. Por 
exemplo, enquanto o lesado, cujo direito absoluto foi violado, goza de um 
prazo de 3 anos para exercer o seu direito de indemnização; o titular do 
direito real que se viu privado da coisa pode intentar a acção de reivindicação 
independentemente de prazo, pois trata-se de um direito imprescritível. Nos 
direitos reais não há prescrição extintiva. 
 
Posição do Dr. Henrique Mesquita: é uma posição sui generis. Para este 
autor, o direito real é uma relação jurídica entre um sujeito e uma coisa: esta 
relação jurídica é governada por um estatuto do qual fazem parte tanto 
poderes como deveres de conteúdo positivo e negativo. Assim, defende este 
autor que i) o direito real envolve uma relação jurídica entre o sujeito e uma 
coisa (influência realista); ii) através da ideia do estatuto, o autor chama a 
atenção para o facto do Direito Real implicar a concessão de poderes, mas 
também a assunção de deveres, de conteúdo positivo e negativo. Quais as 
críticas apontadas à tese deste autor? A noção de relação jurídica que este 
autor acolhe; o facto de incluir obrigações na definição do direito real; para a 
teoria eclética, os deveres a que está sujeito o titular do DR não fazem parte 
do conteúdo deste, ou seja, são obrigações como quaisquer outras. 
 
Hipóteses de qualificação duvidosa 
 
Direito do locatário/arrendatário: de acordo com o Dr. Santos Justo, os 
direitos reais de gozo têm um traço em comum com os direitos pessoais de 
gozo, razão pela qual a classificação de alguns destes direitos – 
concretamente do direito do arrendatário – não é pacífica. Têm em comum 
um poder que se exerce de modo directo e imediato sobre uma coisa 
determinada.Veja-se, aliás, o que dispõe o art. 407º sobre a 
incompatibilidade entre direitos pessoais de gozo – “quando, por contratos 
sucessivos, se constituírem, a favor de pessoas diferentes, mas sobre a mesma 
coisa, direitos pessoais de gozo incompatíveis entre si, prevalece o direito 
mais antigo em data, sem prejuízo das regras próprias do registo”. No 
entanto, para a generalidade da doutrina, a qualificação do direito do 
arrendatário oscila entre a doutrina personalista – que antevê o direito do 
arrendatário como um direito de crédito, o direito de exigir do locador que 
lhe proporcione o gozo da coisa, ou seja, para esta doutrina as possibilidades 
de gozo do locatário passariam necessariamente pela cooperação do senhorio 
– e a doutrina realista – que perspectiva o direito do arrendatário como um 
direito real de gozo limitado, sustentando a sua posição nas fortíssimas notas 
típicas de “realidade” manifestadas por este direito. 
 
Vejamos os principais argumentos de uma e outra doutrina. 
 
Doutrina realista: (MOTA PINTO, OLIVEIRA ASCENSÃO, MENEZES CORDEIRO) 
Quais são, para esta doutrina, aquelas notas típicas de “realidade” que o 
direito do arrendatário possuiria? 1) desde logo, o direito de sequela está 
presente no direito do arrendatário, ou seja, mesmo que a coisa seja alienada 
pelo proprietário a terceiro, o arrendatário pode continuar a exercer os seus 
poderes sobre a coisa, o que significa que o seu direito ou posição jurídica 
tem eficácia relativamente ao novo adquirente (art. 1057º CC). Não vale a 
pena argumentar contra a existência de sequela, explica o Dr. Mota Pinto, 
invocando que o que existe é uma cessão da posição contratual (art. 424º) – 
ou seja, de que a transmissão do direito de propriedade implicaria, da parte 
do proprietário, a transmissão da posição de locador – pois o novo adquirente 
torna-se locador independentemente da sua vontade e sem a contribuição da 
vontade do locatário (devedor). Explica aquele autor que esta subrogação ex 
lege na posição de locador pelo novo adquirente é expressão do direito de 
sequela do locatário. 2) Além disso, nos termos do art. 1037º/2 CC, o 
locatário pode defender a coisalocada contra qualquer terceiro que impeça, 
perturbe ou ameace o seu exercício, sem necessidade de cooperação do 
locador, contra quem pode, para além disso, socorrer-se dos meios da tutela 
possessória. 3) Não há razão para afastar a possibilidade do direito do 
arrendatário ser adquirido por usucapião (Dr. Mota Pinto, Dr. Henrique 
Mesquita e Dr. Dias Marques): a jurisprudência (acórdão do STJ, de 1966) 
está, no entanto, contra esta possibilidade. Vejamos o que diz o art. 1287º 
CC: “ A posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, 
mantida por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em 
contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua 
actuação:é o que se chama usucapião”. Argumenta o Dr. Mota Pinto que a 
usucapião serve um interesse social de clarificação das situações, ié, de 
harmonização da situação de facto com a situação de direito; além disso, se 
um usufrutuário há mais de 20 anos pode adquirir por usucapião, porque não 
sucederá o mesmo com o arrendatário? Por último, não parece de repugnar 
que o arrendatário possa invocar a situação da posse (da posse da qualidade 
de arrendatário) para que adquira a posição correspondente. 4) Os defensores 
da doutrina realista defendem que, após a entrega da coisa ao locatário, o 
locador só fica obrigado a não impedir ou perturbar o exercício do direito de 
gozo que lhe atribui, à semelhança do que sucede com os outros direitos 
reais, e o locatário exerce o seu direito de gozo directamente sobre a coisa 
locada, sem necessidade da cooperação do locador. Pode argumentar-se 
contra isto que também no comodato o comodatário tem contacto com a 
coisa e exerce poderes sobre ela, mas neste contrato a sequela e a inerência 
não se manifestam, ou seja, o comodatário não acompanha a coisa nas suas 
sucessivas transmissões. 5) O Dr. Mota Pinto não concorda com a 
argumentação de que o facto de nascerem do contrato de arrendamento 
deveres positivos especiais do senhorio obsta à sua natureza real, pois no 
usufruto, ao qual ninguém nega a sua natureza de direito real, também há 
obrigações a cargo do proprietário; tão pouco o facto de o arrendatário pagar 
uma renda obsta à sua natureza real, pois também no direito de superfície, 
que é um direito real, proprietário e superficiário podem haver convencionado 
uma importância periódica (art. 1530º). 6) do elemento sistemático, 
concretamente, do facto do contrato de arrendamento vir previsto no livro 
das obrigações nada pode induzir-se, pois outros direitos reais, 
designadamente os direitos reais de garantia e aquisição, também constam 
deste livro e o carácter real, pelo menos dos primeiros, não é posto em causa. 
 
A doutrina personalista (HENRIQUE MESQUITA, SANTOS JUSTO, CARVALHO 
FERNANDES, jurisprudência) 
 
1) O locatário adquire apenas um direito de crédito em relação ao locador 
– o direito de lhe exigir a entrega da coisa. Mas, note-se, que os 
poderes atribuídos ao locatário no art. 1037º/ 1 e 2 pressupõem que 
este já se encontre no uso e fruição da coisa (Dr. Henrique Mesquita). 
Na eventualidade disto não suceder, e encontrando-se a coisa na posse 
de um terceiro, o locatário, para obter a respectiva entrega, só terá 
acção contra o locador e não contra o terceiro; 2) é certo que o 
caracteriza os direitos reais de gozo é o facto destes, uma vez 
constituídos, se desligarem da sua matriz e conferirem ao respectivo 
titular uma posição jurídica que não depende de ninguém. Ora, vários 
preceitos legais evidenciam que a posição jurídica do locatário está 
permanentemente ligada ao contrato de locação (arts. 1057º a 1059º, 
1047º a 1050º, 1054º a 1056º, 1051º a 1052º). 3) Por outro lado, o 
locatário não pode proporcionar a outrem o gozo total ou parcial da 
coisa, salvo se a lei permitir ou o locador autorizar; 4) o argumento 
sistemático: de facto, se o legislador houvesse perspectivado o direito 
do arrendatário como um verdadeiro direito real, as estipulações dos 
arts. 1037º e 1057º seriam inócuas, pois constituíriam a confirmação da 
regra geral nos direitos reais. É precisamente porque aquele direito é 
um direito de crédito, ainda que protegido, em alguns aspectos, pela 
tutela forte dos direitos reais, que o legislador sentiu necessidade de os 
reconhecer expressamente. 
Ou seja, para o Dr. Mesquita, o direito do arrendatário é um direito de 
natureza mista ou dualista, sendo o locatário, para determinados 
efeitos, titular de uma posição de soberania sobre a coisa, e, para 
outros, mera contraparte, devedor e credor de obrigações. De facto, 
considera aquele autor que o legislador dá mais relevo ao carácter 
obrigacional da locação; 5) Por último, o facto de C, arrendatário, 
poder exigir uma indemnização de B, terceiro que destruiu a coisa 
arrendada, não implica necessariamente o carácter real do direito do 
arrendatário (cuja violação daria origem a responsabilidade civil 
extracontratual), pois também o comodatário em caso de destruição da 
coisa pode exigir esta indemnização, e é unânine que não é titular de 
nenhum direito real. 
Caso prático 1 
 
 Em 30-02-08, A celebrou contrato com B nos termos do qual este 
poderia colher todas as uvas do terreno daquele. Em 30/04/08, A 
vendeu esse mesmo prédio a C através de documento particular 
autenticado. C não permite agora que B recolha as uvas. Pode fazê-lo? 
 
a) Entretanto D, dono de uma sucateira, decidiu depositar no terreno 
comprado por C três toneladas de sucata, facto contra do qual este 
pretende reagir. Pode fazê-lo? 
b) Imagine agora que A vendeu o mesmo prédio a E em Maio de 2008, 
tendo E registado o seu direito. Um mês depois E constituiu uma 
hipoteca a favor de F para garantir um crédito de 100.000 euros. 
Pretende hoje constituir uma segunda hipoteca sobre o mesmo 
prédio a favor do credor G, no valor de 250 000 euros. Tendo em 
conta que o prédio vale 350 000 euros, que já foi celebrado com H 
um contrato promessa de compra e venda sobre o imóvel, que este 
entregou um sinal de 5000 euros e que já nele iniciou uma 
actividade agrícola, aconselha G a aceitar aquela garantia? 
 
Quanto à primeira questão, cumpre deixar várias notas: 
 
1) É necessário aferir da natureza do direito de B para com A, ié, saber se 
se trata de um direito real ou de um direito de crédito. Para o efeito, 
sabemos que vigora quanto aos direitos reais o pp da taxatividade (art. 
1306º), pelo que urge percorrer o leque de direitos reais de gozo – 
pressupondo, naturalmente, que se trata de um desses direitos – e 
perceber se o conteúdo do direito de B é coincidente com o conteúdo 
de algum daqueles direitos. Concluimos negativamente, pelo que há 
que reconhecer a natureza obrigacional do direito de B, ié, concluimos 
que este é titular de um direito de crédito. Face a isto, aplica-se a 
regra da preferência ou prevalência, que é um corolário da eficácia 
absoluta dos direitos reais: esta traduz-se na prioridade dos direitos 
reais sobre os direitos de crédito e sobre os direitos reais constituídos 
posteriormente quando total ou parcialmente incompatíveis com o 
anterior (“prior in tempore, potior in jure”. Note-se que, de acordo 
com o art. 1306º, se as partes pretendiam celebrar um contrato com 
eficácia real, o mesmo é nulo, mas por força da conversão legal é 
convertido num negócio com natureza obrigacional. 
2) Mas a mesma hipótese prática poderia ainda ser solucionada por via do 
pp da totalidade, que se traduz na capacidade que a propriedade tem 
de absorver tudo o que nela há, ou, noutros termos, no facto de os 
direitos reais incidirem sobre a totalidade das coisas que constituem o 
seu objecto. De facto, as uvas ainda não têm existência autónoma, ou 
seja, ainda pertencem à vinha (imóvel), pelo que quanto muito B tem 
um direito de entrar no terreno de A para recolher as uvas, mas nunca 
um direito real sobre elas, pois até à colheita, sobrea vinha existe 
apenas um direito real, que pertence a A. É o que nos diz o art. 408º/2, 
in fine. 
O princípio da totalidade, válido no que toca à propriedade e ao 
usufruto (Dr. Mota Pinto), diz-nos que as partes integrantes ou 
componentes de uma coisa – ié, os elementos que estão materialmente 
ligados à coisa com carácter de permanência (art. 204º/3) – não podem 
ser separados desta sem envolver a destruição da própria coisa, e que, 
portanto, não podem ser objecto de direitos particulares reais – 
excepto nos termos em que a lei permita a propriedade horizontal (art. 
1414º), seguindo um destino unitário. É o caso, por exemplo, das 
pedras, tijolos, janelas de um prédio, ou da instalação eléctrica ou de 
gás, o aquecimento central... Note-se, ainda, que aquilo que acresceu, 
por acessão natural ou industrial (art. 1325º), à coisa, passa a estar 
contido no direito real que existia sobre esta. Por último, o pp da 
totalidade repercute-se ainda num aspecto: na nulidade de um 
“pactum reservati dominii” sobre coisas que se vão tornar partes 
constituintes de outra coisa. A doutrina por vezes distingue entre 
partes integrantes (antena parabólicas, os pinheiros, as uvas...) e 
partes componentes (tijolos, azulejos, pedras...) : as partes 
componente seriam “coisas que pertencem à estrutura de um prédio 
que, por isso, não se pode considerar completo sem elas ou é impróprio 
para o uso a que se destina” ; já as partes integrantes não se ligam à 
estrutura do prédio, ou seja, este não deixa de estar completo sem 
elas, mas aumentam a sua utilidade (por exemplo, engenhos de tirar 
água). Trata-se de uma distinção teórica que, na prática, é muito difícil 
de sustentar, para além da sua importância ser escassa, uma vez que, a 
nível da transmissão da propriedade, aplica-se a ambas o art. 408º/2, 
ou seja, só após a separação é possível a transmissão do direito real 
sobre as partes componente /integrantes, havendo até lá apenas um 
direito de crédito, ou, se preferirmos, o direito de exigir a entrega 
dessas coisas. 
Coisa distinta dos elementos componentes ou integrantes de uma coisa, 
são as coisas acessórias ou pertenças (art. 210º). Estas são coisas 
móveis que, não constituindo partes integrantes, estão afectadas ao 
serviço ou ornamentação de outra, e que, nessa medida, não estão a 
ela ligadas materialmente mas apenas funcional ou economicamente. É 
o caso das alfaias agrícolas e animais afectados à exploração de certo 
prédio rústico, móveis, adornos e utensílios de um prédio urbano... 
Estas coisas acessórias, atento o n.º 2 do art. 210º, gozam de 
autonomia relativamente à coisa que servem (“ os negócios jurídicos 
que têm por objecto a coisa principal não abrangem, salvo declaração 
em contrário, as coisas acessórias”), não valendo, relativamente a elas, 
a proibição do “pactum reservati dominii”. 
Outro dos princípios fundamentais subjacente aos Direitos reais é o pp 
da transmissibilidade: na verdade, sendo os direitos reais direitos de 
carácter patrimonial, detêm, por regra, as características da 
alienabilidade e da hereditariedade, ou seja, a ligação entre o titular 
da coisa e a própria coisa é incindível. Tal só não acontece em 4 
espécies de direitos reais: 
A. Direito de usufruto: conforme expõe o art. 1443º, o usufruto 
não pode exceder a vida do usufrutuário, daí a sua tendencial 
incindibilidade. Não obstante, o usufruto é alienável inter vivos 
(art. 1444º), mas o direito do adquirente extingue-se pela morte 
do transmitente ou pelo decurso do prazo pelo qual foi 
constituído inicialmente. 
B. Direito de uso e habitação (art. 1484º): pelas características 
deste direito – o facto de se tratar de um direito real 
funcionalizado, pois o seu conteúdo é limitado pela medida das 
necessidades do titular ou da sua família e pelo facto do titular 
do direito ter apenas a faculdade de morar na casa – trata-se 
forçosamente de um direito real instransmissível. 
C. Servidões: como define o art. 1543º, a servidão predial é o 
“encargo imposto num prédio em proveito exclusivamente de 
outro prédio pertencente a dono diferente”, ou seja, as 
servidões recaem sobre prédios e não sobre pessoas. Estão, 
portanto, vedadas – pelo próprio pp da tipicidade – as servidões 
pessoais. Se, por exemplo, A autoriza B a passear no seu terreno 
a uma certa hora, B tem apenas um direito de crédito que, como 
tal, não produz efeitos em relação a terceiros. Isso significa que 
se A, posteriormente, vender o prédio a C, este não tem de 
respeitar o direito de crédito de B. Na verdade, a 
instransmissibilidade das servidões é apenas relativa: traduz-se 
no facto de elas não serem separáveis dos prédios a cujo 
proveito se destinam e não serem transmissíveis sem a 
transmissão do prédio a que respeitam. Não há, no direito de 
servidão, uma ligação directa com o seu titular – só se tem uma 
servidão em virtude de se ser dono de um certo prédio (quid 
intermédio). É o que diz o art. 1545º. 
D. Direitos legais de preferência (arts. 1410º, 1117º): o 
comproprietário de um prédio tem um direito legal de 
preferência sobre a quota de propriedade do outro. Mas os 
direitos legais de preferência não podem ser transmitidos 
isoladamente, pois também aqui não há relação directa entre o 
direito e o seu titular. Daí constituirem uma outra excepção – do 
mesmo tipo das servidões – ao pp da transmissibilidade dos 
direitos reais: é o que o direito de preferência só pode 
transmitir-se com a transmissão do direito relativamente ao qual 
a preferência existe. 
 
 
Valor das cláusulas de inalienabilidade: são cláusulas pelas quais se 
convenciona a intransmissibilidade da propriedade. Se tiverem carácter 
perpétuo, são inadmissíveis por violarem o estatuto da propriedade; se 
tiverem carácter temporário, são admitidas, mas não produzem efeitos 
reais. Isto é assim com excepção das substituições fideicomissárias e da 
doação com reserva do direito de dispor da coisa. 
 
 
Quanto à questão da alínea a): 
 
C é titular de um direito real, direito com eficácia erga omes; um tal 
direito impõe-se a todos os membros da comunidade jurídica, que 
estão, portanto, submetidos a um dever geral de abstenção. Ou seja, 
todos estão obrigados a respeitar o direito de propriedade de C. Desta 
violação vai resultar uma relação jurídica entre o titular do direito real 
e o sujeito que o violou, a que se dá o nome de pretensão real. A 
pretensão real resulta, em regra, da violação de um direito real, mas 
não tem necessariamente de ser assim. Também estaríamos perante 
uma pretensão real se, por exemplo, A possuisse ou detivesse 
ilegitimamente um automóvel pertence a B, se E passasse 
abusivamente no prédio de F e afirmasse que continuaria a passar... 
C tem o direito de exigir de D que retire a sucata da sua propriedade e 
ainda o direito de exigir uma indemnização em sede de 
responsabilidade civil extracontratual, caso haja danos. Noutros 
termos, a pretensão real atribui ao titular do direito real o poder de 
exigir uma determinada prestação (positiva ou negativa), razão pela 
qual alguns autores defendam a natureza obrigacional destas acções. 
 Em termos judiciais, aquela pretensão assume-se como uma acção 
negatória, que é aplicada em situações de actos de interferência ou 
intromissão na coisa, e é imprescritível. Apesar de não vir 
expressamente referida no CC, o Dr. Henrique Mesquita considera que a 
mesma decorre da necessidade de tornar efectivo o poder de exclusão 
inerente à propriedade (art. 1305º). Esta designação justifica-se porque 
C vai pedir ao tribunal que negue o direito de D em interferir no seu 
direito. A acção negatória desdobra-se, pois, em quatro pedidos e 
cumpre três funções: num pedido de declaração de inexistência do 
direito de D (declarativa), num pedido de que o réu seja condenado a 
eliminar a situação material que criou (reparadora), num pedido de que 
D sejacondenado a abster-se de, no futuro, voltar a praticar um tal 
acto de interferência (preventiva) e num pedido de indemnização pelos 
danos causados. 
Note-se, porém, que a pretensão real também poderia realizar-se 
através da acção de reivindicação, caso estivéssemos perante o 
primeiro daqueles exemplos mencionados. 
 
Quanto à alínea b): 
 
Se E houver registado a sua aquisição, que é uma aquisição a non 
domino, passa a ser o legítimo proprietário do imóvel, de acordo com o 
efeito aquisitivo do registo que assim actua. Por outro lado, nada 
impede que sejam constituídas duas hipotecas sobre o mesmo prédio: 
os credores hipotecários far-se-ão pagar de acordo com a ordem 
cronológica por que foram constituídas as hipotecas. É isso que 
determina o pp da preferência. Por sua vez, se E não vender o imóvel a 
H, este ou recorre à execução específica, nos termos do art. 830º, ou 
exige o sinal em dobro (art. 442º/2), sendo que nesta última hipótese 
goza do direito de retenção (art. 754º/1/f) da coisa da qual já houve 
traditio rei. À partida, de acordo com a regra da prevalência, seríamos 
levados a aconselhar G no sentido da constituição de hipoteca, pois 
sendo o segundo credor de E, e valendo o crédito de F apenas 100 000 
euros, G garantiria a totalidade do seu crédito na hipótese de ter de 
fazer vender o imóvel em tribunal. Porém, o art. 759º/2 dispõe que o 
direito de retenção prevalece neste caso sobre a hipoteca ainda que 
anteriormente constituída. Trata-se de uma excepção à regra da 
prevalência. A ser assim, G só poderia fazer pagar o seu crédito depois 
de H e F, pelo que deveria exigir outras garantias de E ou certificar-se 
de que é um bom pagador. 
 
 
Caso prático II (classificação das coisas) 
 
Em Julho de 2008, A vendeu a B uma quinta para nela realizar 
casamentos e baptizados. Nesse mesmo dia, B vendeu a C uma parte 
dos pinheiros plantados num dos terrenos pertencentes à quinta, 
ficando, porém, combinado que apenas os recolheria em Novembro 
dado que os queria vender como árvores de Natal. 
Em Agosto de 2008, B doou a D o conjunto das alfaias agrícolas que 
tinha encontrado no estábulo. No mês seguinte, alienou a favor de E 
uma antena parabólica por considerar que ela não se coadunava com o 
estilo rústico que pretendia conservar. Pronuncie-se sobre os negócios 
celebrados por B, preocupando-se particularmente com a classificação 
das casas transferidas e com o momento de transmissão do direito de 
propriedade. 
 
Em primeiro lugar, cumpre ver em que consiste uma coisa. Ora, sobre 
isto, diz-nos o art. 202º que “coisa é tudo aquilo que pode ser objecto 
de relações jurídicas. A doutrina sempre considerou este conceito 
excessivamente amplo, até porque podem ser também objecto de 
relações jurídicas direitos e pessoas. Daí a doutrina propor uma tríade 
de características para estreitar o conceito de coisa. Assim, as coisas 
têm autonomia (ou seja, existem em separado), exclusividade (ié, são 
susceptíveis de apropriação exclusiva) e utilidade (ié, satisfazem 
necessidades humanas). Trata-se de um critério relativo. Note-se que, 
nos termos do art. 202º/2, estão fora do comércio as coisas que se 
encontram no domínio público. 
A quinta de que nos fala o caso prático é uma coisa em sentido jurídico, 
concretamente de uma coisa imóvel. O art. 204º contém um elenco 
taxativo de coisas imóveis. O legislador não adoptou um critério físico 
de coisas imóveis. Por exemplo, as águas – que, de acordo com esse 
critério físico, seriam coisas móveis – são, por força do art. 204º/1/b, 
coisas imóveis. Note-se que as águas só são coisas imóveis se 
desintegradas por lei ou negócio jurídico dos respectivos prédios, caso 
contrário são partes integrantes do prédio. O art. 204º/2 diz-nos o que 
são prédios rústicos e prédios urbanos. Os prédios rústicos são “partes 
delimitadas do solo e as construções nele existentes que não tenham 
autonomia económica” e os prédios urbanos são “ edifícios 
incorporados no solo, com os terrenos que lhe sirvam de logradouro”. 
Portanto, o edifício é elemento essencial do prédio urbano. 
Concluimos, pela descrição inclusa nesse preceito, que a quinta é um 
prédio urbano. 
Já as coisas móveis são definidas pelo legislador em termos negativos 
(art. 205º): “são móveis todas as coisas não compreendidas no artigo 
anterior”, ou seja, são móveis todas as coisas que o legislador, no art. 
204º, não haja considerado como imóveis. 
A respeito da distinção entre coisas fungíveis e infungíveis veja-se o 
que diz a parte final do art. 207º: a fungibilidade ou infungibilidade da 
coisa depende da posição que ocupa na relação jurídica, ou seja, trata-
se de um conceito relativo. O Dr. Justo considera que é possível aplicar 
esta classificação também aos bens imóveis. 
Distinção coisas consumíveis/ não consumíveis (p. 134-135). 
Coisas divisíveis são coisas corpóreas que se podem seccionar em partes 
distintas sem alteração da sua substância ou diminuição do seu valor. 
Já a indivisibilidade de uma coisa pode ser: natural ou real, legal ou 
negocial. 
A propósito destas classificações, podemos salientar um outro pp 
estruturante dos direitos reais – o pp da coisificação: este diz-nos que 
o direito real deve versar sobre coisas e não sobre pessoas ou bens não 
coisificáveis. A julgar pelo art. 1302º CC, devemos interpretar este 
princípio no sentido de abarcar apenas as coisas corpóreas. 
Nos termos do art. 408º/1, a propriedade da quinta transfere-se por 
mero efeito do contrato, ié, por mero efeito do acordo entre as partes. 
O facto de a compra e venda de bens imóveis estar sujeita a uma forma 
específica – o documento particular autenticado – significa somente 
que, neste caso, o legislador exige que o acordo entre as partes 
respeite a forma legalmente prescrita, ou seja, que não seja 
manifestado de uma qualquer forma. 
Os pinheiros são coisas imóveis enquanto se mantiverem ligados ao solo 
(art. 204º/1/c); na verdade, quando uma pessoa vende o terreno onde 
se encontram os pinheiros, vende também os pinheiros, a não ser que 
as partes expressamente afastem esta situação mediante a constituição 
de um direito de superfície. Ou seja, se preferirmos, se as árvores 
forem vendidas para permanecerem ligadas ao solo (mas sem que este 
seja também vendido), há que constituir um direito de superfície. Não 
tendo isso sido previsto, os pinheiros pertencem a B. B e C celebraram 
um contrato sobre coisa móvel futura – art. 211º- (os pinheiros 
cortados), pelo que C, enquanto os pinheiros não forem cortados e por 
força do pp da coisificação, especialidade e totalidade, apenas é titular 
de um direito de crédito – o direito de ir buscar as árvores. De facto, 
dizem-nos aqueles princípios que as coisas objecto de direitos reais têm 
de ser certas e determinadas, o que só acontece, no nosso, caso, no 
momento da especificação ou da separação das árvores do solo. Assim, 
C só se tornará proprietário a partir do momento em que as árvores 
forem cortadas, ou seja, em que haja uma separação física entre as 
árvores e o terreno (art. 408º/2). Diz-se, por vezes, que o art. 408º/2 é 
uma excepção ao pp da consensualidade. Diz-nos aquele preceito que “ 
se a tranferência respeitar a coisa futura ou indeterminada, o direito 
transmite-se quando a coisa for adquirida pelo alienante ou 
determinada com conhecimento das partes (...); se, porém, respeitar a 
frutos naturais ou a partes componentes ou integrantes, a transferência 
só se verifica no momento da colheita ou da separação”. Na verdade, a 
regra da transmissão ou constituição de direitos reais por mero efeito 
do contrato refere-se, fácil é de ver, a coisas certas e determinadas, 
pois só estas podem ser objecto de direitos reais. Esta regra não é 
infirmada pelo n.º 2 que determina que, logo que a coisa se torne certa 
e determinada, há transferência automática do direito real.

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