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<p>Copyright © 2019 by Michael J. Kruger</p><p>Publicado originalmente sob o título: The Ten Commandments of Progressive Christianity.</p><p>Published by arrangement with Cruciform Press. Translated and printed by permission. All</p><p>rights reserved.</p><p>1ª edição 2021</p><p>ISBN: 978-65-89129-10-3</p><p>Impresso no Brasil</p><p>Tradução: Elmer Pires</p><p>Revisão: Cesare Turazzi</p><p>Capa: Júlio Araújo</p><p>Diagramação: Marcos Jundurian</p><p>Versão ebook: Tiago Dias</p><p>-----------------------</p><p>PIRATARIA É PECADO E TAMBÉM UM CRIME</p><p>RESPEITE O DIREITO AUTORAL</p><p>O uso e a distribuição de livros digitais piratas ou cópias não autorizadas prejudicam o</p><p>financiamento da produção de novas obras como esta.</p><p>Respeite o trabalho de ministérios como a Editora Trinitas.</p><p>-----------------------</p><p>K94d</p><p>Kruger, Michael J.</p><p>Os 10 mandamentos da esquerda cristã / Michael J. Kruger ; [tradução: Elmer Pires]. – São Paulo:</p><p>Trinitas, 2021.</p><p>75 p. ; 21cm</p><p>Tradução de: The ten commandments of progressive</p><p>christianity</p><p>Inclui referências bibliográficas.</p><p>ISBN 978-65-89129-10-3</p><p>1. Pós-modernismo – Aspectos religiosos – Cristianismo.</p><p>2. Liberalismo (Religião). I. Título.</p><p>CDD: 230.046</p><p>-----------------------</p><p>Catalogação na publicação: Mariana C. de Melo Pedrosa – CRB07/6477</p><p>Editora Trinitas LTDA</p><p>São Paulo, SP</p><p>www.editoratrinitas.com.br</p><p>“É impressionante como muitos desses novos ‘10 Mandamentos’ tornaram-se o padrão em nossa</p><p>cultura e estão na ponta da língua de tantos círculos ditos cristãos. Como um cirurgião de ponta,</p><p>Michael Kruger se recusa a oferecer um diagnóstico leve ou uma cura superficial. Seu livro é uma</p><p>análise convincente e oportuna que todos precisamos ouvir.”</p><p>— Michael Horton, Westminster Seminary California</p><p>“Não permita que a brevidade desse livro o engane. Michael Kruger escreveu uma crítica incisiva da</p><p>ruína intelectual e do desvio teológico do cristianismo progressista. Igrejas, pastores, alunos, grupos</p><p>de jovens, escolas e universidades cristãs fariam bem em se apropriar da sabedoria deste livro</p><p>pequeno, porém devastador.”</p><p>— Kevin DeYoung, Pastor na Christ Covenant Church (Matthews, NC); Professor de Teologia</p><p>Sistemática no Reformed Theological Seminary (Charlotte, NC)</p><p>“Cresci em denominações protestantes genéricas e conheço muitas igrejas da atualidade, portanto</p><p>posso atestar: consigo, de longe, identificar nelas esses ‘10 Mandamentos do cristianismo</p><p>progressista’. Não há nada novo na mensagem dessas congregações, nem mesmo o fato de</p><p>retratarem-se a si mesmas como salvadoras da sociedade. Michael Kruger ajuda-nos a enxergar as</p><p>inconsistências internas que permeiam esse ensino, uma delas sendo desacreditar a certeza e o</p><p>absolutismo agindo com… bom, certezas e absolutismos. Devemos estar preparados para entender</p><p>por qual razão tentativas como essas de reinterpretar o cristianismo jamais transtornarão o mundo,</p><p>como fizeram os apóstolos pela pregação das boas novas de que Jesus Cristo é o Senhor.</p><p>— Collin Hansen, Editor-chefe da The Gospel Coalition; Autor de Blind Spots: Becoming a</p><p>Courageous, Compassionate, and Commissioned Church</p><p>SUMÁRIO</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>Uma Aula Magistral sobre Meias Verdades</p><p>CAPITULO 1</p><p>Jesus é mais um Modelo de Vida do que um Objeto de Adoração</p><p>CAPITULO 2</p><p>Afirmar o Potencial das Pessoas é mais Importante do que Lembrá-las da sua Pecaminosidade</p><p>CAPITULO 3</p><p>O Ministério de Reconciliação deve ser Valorizado acima de Julgamentos</p><p>CAPITULO 4</p><p>O Comportamento Gracioso é mais Importante do que Crer na Verdade</p><p>CAPITULO 5</p><p>Questionamentos Atraentes são mais Valiosos do que Respostas Sólidas</p><p>CAPITULO 6</p><p>Encorajar a Busca Pessoal é mais Importante do que a Unidade de Grupo</p><p>CAPITULO 7</p><p>Suprir Necessidades Reais é mais Importante do que Manter Instituições</p><p>CAPITULO 8</p><p>A Paz é mais Importante do que o Poder</p><p>CAPITULO 9</p><p>Deveríamos nos Preocupar mais com Amor e menos com Sexo</p><p>CAPITULO 10</p><p>A Vida neste Mundo é mais Importante do que a Vida no Mundo Vindouro</p><p>SOBRE O AUTOR</p><p>NOTAS</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>Uma Aula Magistral sobre Meias Verdades</p><p>Em 1923, J. Gresham Machen, então professor no Seminário Teológico</p><p>de Princeton, escreveu seu clássico, Cristianismo e Liberalismo.1 O livro</p><p>foi uma resposta ao crescimento do progressismo nas principais</p><p>denominações de sua época. Machen defendia que, na verdade, a</p><p>compreensão liberal e progressista do cristianismo não é uma mera versão</p><p>variante da fé, nem uma simples representação de uma perspectiva</p><p>denominacional diferente, mas sim uma religião completamente distinta.</p><p>Em poucas palavras, o cristianismo liberal e progressista não é cristianismo.</p><p>O que é mais notável no livro de Machen é a sua predição. Sua descrição</p><p>do cristianismo progressista — uma versão terapêutica da fé que valoriza as</p><p>problematizações em detrimento das soluções e exalta o ser “bom” à custa</p><p>do “verdadeiro” — permanece, hoje, basicamente, da mesma forma. Só por</p><p>esses elementos já deveria ser leitura obrigatória e garantida para todos os</p><p>seminaristas e líderes cristãos.</p><p>Embora os defensores modernos dessa visão apresentem o cristianismo</p><p>progressista como algo novo e revolucionário, suas doutrinas não são nada</p><p>inovadoras. Sim, podem até ter novos nomes (por exemplo, cristianismo</p><p>“emergente”) e surgir com novas roupagens, mas não passam de uma</p><p>releitura de sistemas de pensamento que já existem há gerações.</p><p>Há pouco tempo que a presença permanente do cristianismo progressista</p><p>chamou minha atenção, quando me deparei com um devocional diário de</p><p>Richard Rohr, em cujas páginas o autor lista os dez princípios que julga</p><p>necessários ao cristianismo moderno. Esses dez princípios foram, na</p><p>verdade, extraídos do livro If The Church Were Christian: Rediscovering</p><p>the Values of Jesus [“Se a Igreja Fosse Cristã: Redescobrindo os Valores de</p><p>Jesus”], de Philip Gulley.2</p><p>Nesta coleção de devocionais, ironicamente intitulada “De Volta à</p><p>Essência”,3 Rohr estabelece seus dez princípios como uma espécie de</p><p>confissão de fé do liberalismo teológico moderno (isso tudo depois de</p><p>difamar as confissões de fé). Esses dez princípios são, de fato, os “Dez</p><p>Mandamentos do cristianismo progressista”.</p><p>Uma diferença, no entanto, é que ao invés de serem apresentados no alto</p><p>do monte, encontram guarida na sala de aula da universidade. Esses</p><p>princípios tratam muito mais dos nossos próprios desejos humanos do que</p><p>da verdade revelada de Deus — menos Moisés, mais Oprah.</p><p>Perceba, no entanto, que cada um desses novos mandamentos é, no</p><p>máximo, parcialmente verdadeiro. De fato, essa realidade é o que torna essa</p><p>lista e mesmo o cristianismo de esquerda tão desafiadores. Meias verdades</p><p>podem parecer excessivamente atraentes, até que reconhecidos os seus</p><p>fundamentos e implicações. Benjamin Franklin estava certo quando disse:</p><p>“Uma meia verdade costuma ser uma mentira completa”.</p><p>Ao longo dos próximos dez capítulos, diagnostico e critico cada um</p><p>destes princípios, oferecendo-lhes uma resposta bíblica e teológica, e</p><p>ocasionalmente mergulhando no clássico de Machen. Se a igreja quer</p><p>batalhar diligentemente pela “fé que uma vez por todas foi entregue aos</p><p>santos” (Jd 3), então precisamos ser capazes de distinguir a verdadeira fé</p><p>dos ensinos que se mascaram de fé verdadeira.</p><p>Minha esperança (e oração) é que este livro torne a vital tarefa de</p><p>separar a verdade da mentira um pouco mais fácil.</p><p>CAPÍTULO 1</p><p>Jesus é mais um Modelo de Vida do que um</p><p>Objeto de Adoração</p><p>Analisemos o primeiro mandamento do cristianismo de esquerda: Jesus</p><p>é mais um modelo de vida do que um objeto de adoração.</p><p>De muitas maneiras, esse princípio liberal equivale perfeitamente ao</p><p>primeiro mandamento do cristianismo progressista. Tendo a opção entre</p><p>adorar a Jesus (o que pressupõe sua divindade) e meramente considerá-lo</p><p>um bom guia moral, os progressistas sempre favorecem a última opção.</p><p>É claro, um de seus defensores vê isso e protesta dizendo que esse</p><p>primeiro mandamento não rejeita a divindade de Jesus, tendo em vista as</p><p>partes “mais um… do que”. Acaso o cristianismo progressista afirma a</p><p>divindade de Jesus,</p><p>progressista. Este é um verdadeiro clássico: A vida neste mundo é mais</p><p>importante do que a vida no mundo vindouro.</p><p>É difícil imaginar uma única declaração que capture o ethos do</p><p>cristianismo progressista com mais maestria do que o seu décimo</p><p>mandamento. Na verdade, este princípio revela o pivô mais basilar dos</p><p>progressistas, que se voltam deliberadamente contra assuntos eternos e</p><p>enfatizam questões terrenas. Seus defensores pregam que o ser humano não</p><p>precisa se preocupar com o que acontece depois da morte, pois ninguém</p><p>realmente sabe o que acontece. Tudo o que importa é ajudar o pobre,</p><p>alimentar o faminto e aliviar o sofrimento humano.</p><p>Esse mandamento marca um final apropriado e condizente nessa</p><p>pequena obra, pois incorpora concisamente muitos dos princípios do</p><p>cristianismo progressista citados por Machen há muitos anos. A seguir, eis</p><p>alguns deles, ecoando os conceitos mais gritantes apresentados nos</p><p>capítulos anteriores.</p><p>Preferir o Horizontal e Preterir o Vertical</p><p>Para os cristãos progressistas, o ser humano sofre de um problema real.</p><p>Não se trata, porém, de crer que a humanidade pecou e se rebelou em</p><p>ofensas contra um Deus santo. Pelo contrário, o problema da humanidade é</p><p>que existe sofrimento, guerra, pobreza, doença e fome.</p><p>Em outras palavras, os progressistas definem os problemas da</p><p>humanidade somente em conceitos horizontais (ou seja, a forma como o ser</p><p>humano se relaciona com o próximo e com o mundo ao seu redor), e não</p><p>em conceitos verticais (o relacionamento entre Deus e a humanidade).</p><p>Como resultado, o ideal mais alto do cristianismo progressista não pode ser</p><p>outro senão consertar o presente e ater-se a problemas temporais.</p><p>Considerar a eternidade, na melhor das hipóteses, é perda de tempo. Na</p><p>verdade, Gulley lamenta a “preocupação” da igreja com uma “ênfase</p><p>exagerada” sobre o que acontece depois da morte e reclama das “fortunas</p><p>que são gastas salvando pessoas de perigos e lugares imaginários”.38</p><p>Pregando o Moralismo, e não a Salvação</p><p>Se não há eternidade com a qual se preocupar, então para onde a</p><p>humanidade deve voltar a sua atenção? Às boas obras, é claro. Sua atenção</p><p>deve se voltar à ajuda ao necessitado. A marca do cristianismo progressista</p><p>é um compromisso pleno com a postura de ser “bom” e fazer coisas “boas”.</p><p>Gulley usa as seguintes palavras: “Se a Igreja fosse cristã, faríamos o que</p><p>Jesus fez — cada um ajudaria o seu próximo a viver neste mundo e pararia</p><p>de se preocupar com o mundo vindouro”.39</p><p>É claro que qualquer um que esteja familiarizado com o ensino de Jesus</p><p>há de considerar essa declaração genuinamente chocante. Cristo dava</p><p>especial ênfase ao mundo vindouro e dele falava com frequência. Considere</p><p>apenas um exemplo: “Não temais os que matam o corpo e não podem matar</p><p>a alma; temei, antes, aquele que pode fazer perecer no inferno tanto a alma</p><p>como o corpo” (Mt 10.28).</p><p>Sem inferno, sem pecado e sem julgamento, o cristianismo progressista</p><p>não tem outra opção senão se tornar uma religião moralista.</p><p>Reivindicar Incerteza Abraçando a Certeza</p><p>No cerne do argumento de Gulley está a crença de que o inferno não é</p><p>real. “Decidi não investir esforço em salvar almas de um inferno no qual</p><p>não acredito”.40 Na verdade, ao longo desse mesmo capítulo, Gulley</p><p>declara, repetidas vezes, que o inferno não existe. O autor aposta seu</p><p>destino eterno (bem como o destino eterno de muitas outras pessoas) em</p><p>sua convicção pessoal.</p><p>Mas como ele sabe que o inferno não existe? O que falta no argumento</p><p>de Gulley é uma forma de saber o que é ou não verdade. Ele nada mais faz</p><p>que declarar sua crença sem qualquer base.</p><p>A ironia das palavras de Gulley é que ele, na verdade, se posiciona como</p><p>um humilde inquiridor, incerto de suas crenças. “Ainda não cheguei a uma</p><p>compreensão definitiva de Deus, e penso que jamais a alcançarei”.41</p><p>Essa inconsistência realça uma das técnicas mais notáveis e perniciosas</p><p>da esquerda cristã: alegar incertezas absolutistas, mas depois introduzir,</p><p>sorrateiramente, suas próprias convicções, esperando que ninguém perceba</p><p>a hipocrisia e a incoerência tão pungentes dessa posição.</p><p>Conclusão</p><p>Percebe-se, portanto, que o último mandamento de Gulley contém, com</p><p>formidável astúcia, três marcas do cristianismo progressista. Seu décimo</p><p>princípio enfatiza o ser humano, e não Deus; enfraquece e rebaixa a</p><p>doutrina da moralidade; e, por fim, afirma incertezas para os outros, mas</p><p>certezas para si mesmo.</p><p>Tragicamente, a posição progressista faz uma cortina de fumaça diante</p><p>da real mensagem do cristianismo — a verdadeira mensagem de Jesus. De</p><p>fato, Cristo se preocupava com o sofrimento da humanidade e, sem dúvida,</p><p>chamou todo crente a ter a mesma preocupação. Nós, porém, não tratamos o</p><p>sofrimento humano como um ato de moralismo, mas como uma resposta à</p><p>graça da cruz.</p><p>Além disso, não lidamos exclusivamente com o sofrimento temporal,</p><p>pois, mesmo que pudéssemos aliviar toda a aflição da humanidade, esse</p><p>alívio não resolveria a maior das nossas necessidades. Nas palavras de Jesus</p><p>Cristo: “Pois que aproveitará o homem se ganhar o mundo inteiro e perder a</p><p>sua alma? Ou que dará o homem em troca da sua alma?” (Mt 16.26).</p><p>Sobre o autor</p><p>Michael J. Kruger é o presidente do Seminário Teológico Reformado em</p><p>Charlotte, NC, nos EUA, além de dispor da cátedra Samuel C. Patterson de</p><p>Novo Testamento e Cristianismo Primitivo na mesma instituição.</p><p>Notas</p><p>1 J. Gresham Machen. Cristianismo e Liberalismo (Recife: Os Puritanos, 2013).</p><p>2 Philip Gulley. If the Church Were Christian: Rediscovering the Values of Jesus (San Francisco, CA:</p><p>HarperOne, 2010).</p><p>3 Disponível em: https://cac.org/returning-to-essentials -2017-11-30/.</p><p>4 Gulley, p. 16–17.</p><p>5 J. Gresham Machen. Cristianismo e Liberalismo (Recife: Os Puritanos, 2013), posição 1444</p><p>(Kindle).</p><p>6 Michael F. Bird. Jesus the Eternal Son: Answering Adoptionist Christology (Grand Rapids, MI:</p><p>Eerdmans, 2017).</p><p>7 C. S. Lewis. Cristianismo Puro e Simples (São Paulo: Martins Fontes, 2005).</p><p>8 Para mais acerca do assunto, veja Larry Hurtado, One God One Lord: Early Christian Devotion</p><p>and Ancient Christian Monotheism, 2. ed. (London: T&T Clark, 2000).</p><p>9 J. Gresham Machen. Cristianismo e Liberalismo (Recife: Os Puritanos, 2013), posição 771</p><p>(Kindle).</p><p>10 J. Gresham Machen. Cristianismo e Liberalismo (Recife: Os Puritanos, 2013), posição 1018</p><p>(Kindle).</p><p>11 Independentemente de como os progressistas definam ou entendam o termo “pecaminosidade”, os</p><p>cristãos evangélicos reconhecem, com justiça, que todo pecado, em todos os sentidos, é</p><p>consequência direta da Queda: vivemos num mundo caído, somos uma humanidade caída, em que</p><p>todos são pecadores.</p><p>12 Gulley, p. 40, 30.</p><p>13 Ibid., p. 33.</p><p>14 Ibid., p. 37–40.</p><p>15 Ibid., p. 44, 43.</p><p>16 Ibid., p. 44.</p><p>17 Ibid., p. 54, 57, 61.</p><p>18 Ibid., p. 67.</p><p>19 Ibid.</p><p>20 J. Gresham Machen. Cristianismo e Liberalismo (Recife: Os Puritanos, 2013), posição 785</p><p>(Kindle).</p><p>21 Gulley, p. 93.</p><p>22 Ibid., p. 116, 118.</p><p>23 Os cristãos não creem que todo ensino da Bíblia é igualmente claro ou evidente, porquanto</p><p>algumas doutrinas são difíceis de entender. No entanto, os crentes em Jesus Cristo creem, de fato,</p><p>que são claras e evidentes a todos “as coisas que precisam ser obedecidas, cridas e observadas</p><p>para a salvação” (CFW, cap. I, VII).</p><p>24 Dan Kimball. Eles Gostam de Jesus, mas não da Igreja (São Paulo: Vida, 2011).</p><p>25 Gulley, p. 123.</p><p>26 Ibid., p. 125.</p><p>27 Ibid., p. 137.</p><p>28 Ibid., p. 126.</p><p>29 Ibid., p. 146.</p><p>30 Ibid., p. 144.</p><p>31 Ibid., p. 145.</p><p>32 Ibid., p. 157–159.</p><p>33 Ibid., p. 160.</p><p>34 Ibid., p. 158.</p><p>35 Ibid.</p><p>36 Ibid., p. 159.</p><p>37 Ibid., p. 166.</p><p>38 Ibid., p. 175, 176, 184.</p><p>39 Ibid., p. 184.</p><p>40 Ibid., p. 181.</p><p>41 Ibid., p. 18.</p><p>Créditos e Direitos</p><p>Recomendações</p><p>Sumário</p><p>Introdução</p><p>Capítulo 1</p><p>Capítulo 2</p><p>Capítulo 3</p><p>Capítulo 4</p><p>Capítulo 5</p><p>Capítulo 6</p><p>Capítulo 7</p><p>Capítulo 8</p><p>Capítulo 9</p><p>Capítulo 10</p><p>Sobre o Autor</p><p>Notas</p><p>mas simplesmente prioriza o seu exemplo moral?</p><p>De acordo com o livro de Gulley, a resposta é um sonoro não. Sem</p><p>meias palavras e com total descaramento, Gulley rejeita o nascimento</p><p>virginal, nega a impecabilidade de Jesus e considera seus milagres como</p><p>mitos criados para elevar Cristo à “posição de divindade”. De fato, Gulley</p><p>insiste que “a adoração a Jesus por parte da igreja é uma prática que ele não</p><p>incentivaria”.4</p><p>Logo, fica claro que os progressistas não simplesmente enfatizam o</p><p>exemplo moral de Jesus. Ao invés disso, os liberais rejeitam</p><p>deliberadamente a divindade de Cristo. Essa negação não é nenhuma</p><p>novidade. Na época de Machen, os liberais agiam da mesma forma:</p><p>O liberalismo o considera [Cristo] como um exemplo e guia; o cristianismo, como Salvador; o</p><p>liberalismo faz dele um exemplo de fé; o cristianismo, objeto da fé.5</p><p>Aprofundemo-nos, porém, nesse ponto. O cristianismo seria válido se</p><p>Jesus nada mais fosse que um exemplo moral? Vários problemas surgem</p><p>em decorrência dessa crença.</p><p>O Próprio Jesus Afirmou ser mais que um Exemplo Moral</p><p>Comecemos reconhecendo que Jesus era, evidentemente, um exemplo</p><p>moral aos seus seguidores. Na verdade, ele chamava os discípulos a imitá-lo</p><p>(veja João 13.15).</p><p>Jesus, contudo, é somente um exemplo moral? Ou, em outras palavras,</p><p>os evangelhos apresentam Jesus como um mero homem sábio? Alguém</p><p>como Gandhi, dando dicas para a vida prática?</p><p>Uma leitura honesta dos evangelhos demonstra que a resposta a essa</p><p>pergunta é um retumbante não. Na verdade, de Mateus a João, Jesus é</p><p>apresentado não apenas como um bom mestre, mas como o Senhor Deus</p><p>dos céus e da terra. Além das passagens mais óbvias de João que dão prova</p><p>da divindade de Cristo (veja João 1.1, 1.18, 8.58, 10.30), estudiosos</p><p>defendem que a divindade de Jesus também é evidente nos Evangelhos</p><p>Sinópticos de Mateus, Marcos e Lucas.</p><p>Para dar um exemplo, Michael Bird defende em sua obra recente, Jesus</p><p>the Eternal Son [“Jesus: o Filho Eterno”],6 que mesmo Marcos —</p><p>normalmente considerado como o Evangelho que apresenta o Jesus mais</p><p>“humano” — oferece uma cristologia decididamente elevada. Jesus é o</p><p>“Senhor”, YAHWEH se achegando ao seu povo, aquele que perdoa</p><p>pecados, o senhor do vento e dos mares, o juiz do universo. Essa realidade</p><p>levou C. S. Lewis a oferecer sua tão conhecida citação sobre Jesus como</p><p>“apenas” um bom mestre moral:</p><p>Estou tentando impedir que alguém repita a rematada tolice dita por muitos a seu respeito: “Estou</p><p>disposto a aceitar Jesus como um grande mestre da moral, mas não aceito a sua afirmação de ser</p><p>Deus”. Essa é a única coisa que não devemos dizer. Um homem que fosse somente um homem e</p><p>dissesse as coisas que Jesus disse não seria um grande mestre da moral. Seria um lunático — no</p><p>mesmo grau de alguém que pretendesse ser um ovo cozido — ou então o diabo em pessoa. Faça a</p><p>sua escolha.7</p><p>Os Discípulos de Jesus o Adoravam como Senhor</p><p>Embora o primeiro mandamento do cristianismo progressista hesite</p><p>diante do culto a Jesus, os cristãos primitivos seguiam o caminho inverso.</p><p>E, visto que exaltavam a Cristo como Senhor, os discípulos da igreja</p><p>primitiva entregavam-se ao seu senhorio e o adoravam sem reservas.</p><p>E eis a surpresa: os cristãos primitivos adoravam a Cristo mesmo sendo</p><p>absolutamente monoteístas. Mesmo sendo composta de judeus, a igreja</p><p>primitiva adorava a Jesus precisamente porque cria nele como o único Deus</p><p>de Israel.</p><p>Também devemos notar que Jesus nunca rejeitou essa adoração;</p><p>tampouco se sentiu intimidado, desconfortável ou receoso diante do culto</p><p>que as pessoas lhe prestavam. Cristo recebia essa adoração sem restrições.</p><p>Eis alguns exemplos:</p><p>• Os magos adoram a Jesus (Mt 2.11).</p><p>• Os discípulos adoram a Jesus no barco (Mt 14.33).</p><p>• Os discípulos adoram a Jesus após sua ressurreição (Mt 28.9; Lc</p><p>24.52).</p><p>• O cego de nascença adora a Jesus (Jo 9.38).</p><p>• Todo joelho se dobrará em adoração ao Senhor Jesus Cristo (Fp 2.10).</p><p>• Os anjos adoram a Jesus (Hb 1.6).</p><p>• Basicamente, o livro inteiro de Apocalipse trata acerca da adoração a</p><p>Cristo.</p><p>Aliás, esses poucos exemplos não consideram as inúmeras declarações</p><p>doxológicas prestadas a Jesus, nem consideram as práticas de adoração dos</p><p>cristãos primitivos entregando a Cristo uma devoção reservada somente a</p><p>Deus.8</p><p>O Exemplo Moral de Jesus somente é Válido se Jesus for Senhor</p><p>Embora os cristãos progressistas levem muito em consideração o</p><p>exemplo moral de Jesus, o que estranhamente falta em seu sistema é por</p><p>que alguém deveria se preocupar com isso. Afinal, se Jesus não passa de um</p><p>homem comum, por que seu código moral em particular seria melhor do</p><p>que o de qualquer outra pessoa? Por que acreditar que o código de conduta</p><p>apresentado por Jesus importa?</p><p>Por falar nisso, não é o sistema cristão progressista que está sempre</p><p>lutando contra pessoas que fazem declarações morais absolutistas? Os</p><p>bastiões do esquerdismo não nos dizem que a moralidade é relativa? Que a</p><p>moralidade passa por constante mudança e é condicionada pela cultura?</p><p>Afinal, não existe um sistema moral mais verdadeiro que outro; não force a</p><p>sua moralidade sobre mim!</p><p>Então, por que Jesus deveria ter esse tratamento diferenciado? Por que</p><p>essas críticas não se aplicam ao seu caso, se ele não passa de um ser</p><p>humano como nós?</p><p>Suponho que alguém possa defender que a autoridade moral de Jesus</p><p>não advém de sua divindade, mas de sua posição como profeta de Deus.</p><p>Mas como alguém pode mesmo saber que Cristo é um profeta de Deus? As</p><p>Escrituras são o único meio suficiente que conhecemos acerca de Jesus para</p><p>concluirmos sua divindade.</p><p>Evidentemente, essas declarações liberais revelam o que os progressistas</p><p>pensam acerca das Escrituras. Muitos deles não confiam na Bíblia e</p><p>rejeitam abertamente a sua inspiração divina. Agora, se as Escrituras não</p><p>são confiáveis e não são inspiradas por Deus, como os liberais conseguem</p><p>saber que Jesus foi um profeta?</p><p>Alguns progressistas talvez afirmem aceitar a inspiração das Escrituras.</p><p>Ora, mas se realmente aceitam que a Bíblia vem da parte de Deus, por que</p><p>então não aceitam o claro ensino das Escrituras de que Jesus não é um</p><p>simples profeta? Por que não aceitam as passagens já citadas neste capítulo</p><p>provando cabalmente que Jesus é totalmente digno de toda adoração?</p><p>Seja como for, a abordagem progressista de que “Jesus é apenas um</p><p>mestre moral” simplesmente não funciona.</p><p>E, além de tudo isso, não me impressiona a confusão causada pelo apelo</p><p>progressista de Jesus ser um guia da moralidade, visto que muitos</p><p>progressistas não querem nem mesmo seguir o ensino moral de Jesus! Por</p><p>exemplo, os progressistas estão dispostos a apoiar o claro ensino de Jesus</p><p>de que o casamento é exclusivamente entre um homem e uma mulher (veja</p><p>Mateus 19.5–6)? Ou de que Cristo é o único caminho para a salvação (Jo</p><p>14.6)?</p><p>Se não estiverem dispostos a crer nesses pontos, então por que a ânsia de</p><p>apelar para Jesus como um mestre moral?</p><p>O Cristianismo não é Moralismo</p><p>Eis aqui o problema mais fundamental com esse primeiro princípio. Ao</p><p>remover a pessoa de Cristo da equação como objeto de adoração, o</p><p>cristianismo torna-se, basicamente, uma religião moralista. O liberalismo</p><p>prega que doutrina e teologia não importam, mas sim o comportamento.</p><p>Obras acima de credos.</p><p>Crer nessas ideias, no entanto, vai diretamente contra o cristianismo</p><p>histórico, que é uma religião por graça, e não por méritos. Não se trata</p><p>primeiramente do que nós fazemos, mas do que Deus fez por nós. Ou, nas</p><p>palavras de João: “Nisto consiste o amor: não em que nós tenhamos amado</p><p>a Deus, mas em que ele nos amou e enviou o seu Filho como propiciação</p><p>pelos nossos pecados” (1Jo 4.10). O próprio Machen absorveu esse</p><p>conceito muito bem:</p><p>Aqui se encontra a diferença fundamental entre o liberalismo e o cristianismo — o progressismo</p><p>está, no geral, no modo imperativo, enquanto o cristianismo começa com um indicativo</p><p>triunfante; o liberalismo apela para a vontade do homem, enquanto o cristianismo anuncia,</p><p>primeiramente, um ato gracioso de Deus.9</p><p>O que Deus Uniu</p><p>O primeiro mandamento do cristianismo progressista reflete</p><p>precisamente o cenário do mundo ocidental há mais de um século. Esse</p><p>princípio representa ainda outra vã tentativa de preservar a moralidade de</p><p>Jesus, enquanto se livra de sua identidade divina.</p><p>No final de tudo, essa mescla simplesmente não funciona. O ensino</p><p>moral de Jesus só tem autoridade se retida sua identidade como Senhor.</p><p>Ambas as realidades não podem, nem devem ser separadas: “De modo que</p><p>já não são mais dois, porém uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou não</p><p>o separe o homem” (Mt 19.6).</p><p>CAPÍTULO 2</p><p>Afirmar o Potencial das Pessoas é mais</p><p>Importante do que Lembrá-las da sua</p><p>Pecaminosidade</p><p>Poucos assuntos dividem mais o cristianismo progressista do</p><p>cristianismo histórico do que o problema do pecado. De fato, é a</p><p>desconsideração, o menosprezo ou mesmo a rejeição por completo da</p><p>doutrina do pecado que define a essência do cristianismo progressista.</p><p>Décadas atrás, Machen comentou o mesmo: “A perda da consciência do</p><p>pecado está na própria raiz do movimento liberal moderno”.10 Chegamos</p><p>então ao segundo mandamento do cristianismo progressista: Afirmar o</p><p>potencial das pessoas é mais importante do que lembrá-las da sua</p><p>pecaminosidade.</p><p>A raiz desse princípio é o problema do pecado.11 O ser humano é</p><p>pecador? Se sim, qual a importância dessa verdade? Mais que isso, qual a</p><p>importância de que as pessoas saibam que são pecadoras? Devemos pregar</p><p>contra o pecado dessas pessoas? Como ponderar entre a pecaminosidade</p><p>das pessoas e o seu potencial enquanto portadoras da imagem de Deus?</p><p>Pesando o Pecado e o Potencial Humano</p><p>É óbvio que, antes de tudo, devemos reconhecer que esse segundo</p><p>princípio é parcialmente verdadeiro. A mensagem cristã não trata apenas do</p><p>pecado e do arrependimento. “Você é um pecador” não é tudo que pode ou</p><p>deve ser dito. Cristo nos salva do nosso pecado, sim, mas, a partir daí, ele</p><p>inicia uma obra regeneradora no íntimo de cada cristão. E, claro, esse</p><p>trabalho começa a restaurar a beleza da imagem de Deus em nós.</p><p>Nesse sentido, podemos afirmar, com justiça, que o ser humano tem</p><p>potencial e que este deve ser reconhecido e celebrado. Não nos esqueçamos,</p><p>porém, de que esse potencial só se torna válido mediante a graça salvadora</p><p>de Deus e por meio da morte de Cristo, que venceu nossos pecados. À parte</p><p>da salvação, qualquer afirmação do potencial humano rapidamente se</p><p>transforma em uma versão de moralismo humanista.</p><p>Em outras palavras, devemos reconhecer ambas as realidades: nossa</p><p>total depravação e o maravilhoso potencial que temos como portadores da</p><p>imagem de Deus. São verdades que coexistem.</p><p>É, contudo, precisamente esse o problema com a mensagem do</p><p>cristianismo progressista. Seus defensores não têm problema em aceitar a</p><p>capacidade inata que o ser humano tem por ser criado à imagem de Deus; a</p><p>resistência deles surge quando o assunto é o pecado. Repito, os cristãos</p><p>progressistas separam aquilo que a Bíblia uniu.</p><p>A Rejeição do Ensino Bíblico acerca do Pecado</p><p>Agora, pode-se objetar que nem todos os cristãos progressistas negam o</p><p>estado de pecado da humanidade. Alguns desses cristãos progressistas</p><p>podem até mesmo defender que estão dispostos a testemunhar ambas as</p><p>verdades.</p><p>Voltando ao livro de Gulley — a base da lista de Rohr —, logo</p><p>descobrimos que o próprio Gulley não afirma ambas as verdades. Na</p><p>realidade, o autor se mostra bastante inflexível quando defende que o</p><p>ensino cristão histórico acerca do pecado é fundamentalmente errado.</p><p>Considere o seguinte:</p><p>Gulley defende que as igrejas que ensinam que o ser humano é pecador</p><p>são culpadas de “abuso espiritual” e “crueldade” para com os seus</p><p>membros.12</p><p>Gulley declara abertamente: “cresci em uma tradição que enfatizava o</p><p>pecado e a necessidade de salvação; não considerei essa visão útil para a</p><p>minha vida, então decidi abandoná-la”.13</p><p>Gulley nega o pecado original afirmando que Adão e Eva não eram</p><p>pessoas reais; ou seja, as narrativas que envolvem essas duas personagens</p><p>não passam de “mitos” religiosos. Além disso, o relato da Criação não pode</p><p>ser considerado confiável, pois é contraditório e inconsistente.14</p><p>Gulley defende que deveríamos parar “de considerarmos a nós mesmos</p><p>miseráveis pecadores, merecedores da condenação divina”. Ele chega a se</p><p>queixar de hinos como “Maravilhosa Graça”, pois descreve Deus salvando</p><p>pecadores.15</p><p>A Rejeição da Obra Salvífica de Cristo</p><p>Rejeitar o ensino bíblico acerca do pecado é a superfície; em suas</p><p>profundezas se encontra a rejeição de uma verdade cristã ainda mais</p><p>fundamental, a saber, de que o propósito da morte de Jesus Cristo era</p><p>salvar-nos de nossos pecados.</p><p>Aquele que rejeita a doutrina do pecado e diminui sua gravidade precisa</p><p>encontrar um motivo diferente para a morte de Cristo. Para os progressistas</p><p>(ao menos aqueles como Gulley), Jesus não poderia morrer na cruz para</p><p>pagar pelos pecados da humanidade, pois isso seria como engrandecer a</p><p>iniquidade. Não, Cristo precisa ter morrido por outra razão. Desta forma</p><p>chegamos a outro princípio importante do cristianismo progressista: a</p><p>rejeição da expiação substitutiva.</p><p>Gulley declara:</p><p>Ao longo dos séculos, a igreja sempre entendeu a salvação como ser resgatado do pecado e ir</p><p>para o céu depois que morrer. Agora, e se eu acreditar que a salvação é a jornada da vida em</p><p>direção à maturidade, à plenitude, ao amor? Se esse for o caso, Jesus não é aquele que salva a</p><p>humanidade pelo seu sacrifício de sangue, mas aquele que exemplifica essa maturidade, essa</p><p>plenitude, esse amor; aquele a quem os cristãos podem se voltar e dizer […] “podemos ser como</p><p>ele!”.16</p><p>Vê-se, portanto, que essa visão acerca da morte de Cristo esposada pelo</p><p>cristianismo progressista não só rejeita a doutrina do pecado original, mas</p><p>também nega a obra salvadora de Cristo na cruz. Mais uma vez, sob esses</p><p>ditames, o cristianismo é reduzido a mero moralismo.</p><p>O Cristianismo Progressista (ou ao menos essa versão) não é</p><p>Cristianismo</p><p>Rejeitada a doutrina do pecado original, em seguida a ideia de que</p><p>somos pecadores carentes de salvação e, por fim, negada a verdade de que</p><p>Jesus morreu na cruz pelos pecados da humanidade, o que resta do</p><p>cristianismo histórico e bíblico? Quase nada. Na verdade, Machen defendia</p><p>que aquilo que nos resta não é cristianismo, mas outra religião.</p><p>Por isso, digo com todas as letras que muito mais proveitoso é confiar na</p><p>mensagem simples e clara do apóstolo Paulo: “Fiel é a palavra e digna de</p><p>toda aceitação: que Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores,</p><p>dos quais eu sou o principal” (1Tm 1.15).</p><p>CAPÍTULO 3</p><p>O Ministério de Reconciliação deve ser</p><p>Valorizado acima de Julgamentos</p><p>Uma das principais marcas do cristianismo progressista é sua ênfase na</p><p>forma como as pessoas se relacionam com o seu próximo à custa da</p><p>maneira como o ser humano se relaciona com Deus. Essa preocupação se</p><p>faz evidente em seu terceiro mandamento: O ministério de reconciliação</p><p>deve ser valorizado acima de julgamentos.</p><p>Neste ponto, Gulley preocupa-se com relacionamentos humanos</p><p>quebrados ou feridos. Na visão desse autor, a igreja deveria fazer mais para</p><p>reparar ou restaurar esses relacionamentos, mas permanece preocupada</p><p>demais com o comportamento das pessoas. Os cristãos precisam parar de</p><p>julgar e começar a ajudar.</p><p>Agora, posso começar reconhecendo que o objetivo aqui é, em parte,</p><p>recomendável. Proporcionar reconciliação a relacionamentos conturbados é</p><p>um propósito bíblico fundamental. A Bíblia tem muito a dizer a respeito de</p><p>tópicos como perdoar uns aos outros (Lc 17.4), reconciliar-se uns com os</p><p>outros (Mt 5.24; At 7.26), reconciliação entre marido e mulher (1Co 7.11) e</p><p>a remoção de hostilidade entre grupos (Ef 2.16). De fato, Gulley está certo</p><p>em afirmar que a reconciliação entre pessoas é um aspecto importante do</p><p>cristianismo.</p><p>O problema, no entanto, é de que forma Gulley acredita que a</p><p>reconciliação é idealmente alcançada. E é nessa parte que Gulley toma</p><p>emprestado um princípio bíblico e lhe dá um toque decididamente</p><p>progressista/esquerdista. A reconciliação é idealmente alcançada, ele</p><p>defende, quando a igreja está menos preocupada com o costume</p><p>de</p><p>“julgar”. Se ao menos a igreja se livrasse da “cultura do julgamento”,</p><p>parasse de oferecer “condenação e culpa” e abandonasse “sua predileção</p><p>pelo pensamento de ‘oito ou oitenta’, ou de ‘esse ou aquele’”, então poderia</p><p>ajudar mais as pessoas a se reconciliarem umas com as outras.17</p><p>Agora, outra vez, depende de o que se quer dizer com expressões como</p><p>essas. Se a preocupação aqui é com o tom ou a postura geral da igreja,</p><p>então estamos de acordo. As igrejas precisam ter cuidado, mesmo enquanto</p><p>lidam com o pecado, mesmo quando se prestam à graciosidade, à paciência</p><p>e à caridade. Agora, se o autor quis dizer que a igreja não deve se meter no</p><p>comportamento das pessoas e julgá-lo pecaminoso ou errado, daí já é um</p><p>caminho bem diferente.</p><p>De fato, essa última abordagem tem diversos problemas significativos.</p><p>É Profundamente Antibíblico Afirmar que nunca Podemos Julgar um</p><p>Comportamento como Certo ou Errado</p><p>As Escrituras estão repletas de exemplos em que o povo de Deus julga</p><p>determinados comportamentos como errados. Jesus fez isso. Paulo agiu</p><p>assim. E até mesmo nós somos chamados a agir assim: “Se teu irmão pecar</p><p>[contra ti], vai argui-lo entre ti e ele só. Se ele te ouvir, ganhaste a teu</p><p>irmão” (Mt 18.15).</p><p>A essa altura alguém pode protestar: “Mas quem sou eu para dizer a</p><p>alguém que ele/ela está errado/errada? Eu também sou pecador”. Sim, essa</p><p>é uma perspectiva essencial, mas a Bíblia nunca exige que alguém seja</p><p>completamente sem pecado antes de poder falar contra o pecado de outra</p><p>pessoa. Perfeição pessoal não é um pré-requisito para se possa defender o</p><p>que é certo, ou então ninguém jamais seria capaz de condenar o pecado —</p><p>incluindo (como veremos em instantes) aqueles que querem julgar quem</p><p>julga!</p><p>A base apropriada para chamar algo de pecado não é a perfeição pessoal,</p><p>mas simplesmente se Deus declara esse algo pecaminoso.</p><p>Dizer que Nunca Podemos Considerar um Comportamento Errado é,</p><p>no Fim das Contas, Contraproducente</p><p>A grande ironia daqueles que dizem que não devemos julgar é que eles</p><p>próprios julgam. Aqueles que dizem “não julgueis” estão declarando que</p><p>um comportamento é “errado” (nesse caso, o ato de julgar), enquanto</p><p>praticam eles mesmos esse comportamento errado! Logo, essa abordagem</p><p>prova-se profundamente inconsistente. Esse é o equivalente retórico de</p><p>serrar o galho no qual se está sentado.</p><p>Dessa forma, o cristianismo progressista é o resultado do contexto</p><p>cultural atual. Vivemos num mundo que insiste, mais do que nunca, que não</p><p>devemos julgar. Mas também vivemos numa geração que há muito o mundo</p><p>não via tão crítica e amargurada. Como nunca antes, as pessoas, hoje, se</p><p>sentem livres para expressar, geralmente com vigor e fervor, sua indignação</p><p>moral contra qualquer ofensa (como os ativistas das redes sociais podem</p><p>atestar), e ainda assim permanecem, aparentemente, ignorantes de como</p><p>esse comportamento falha em condizer com o lema de não julgar.</p><p>É Inevitavelmente Seletivo Dizer que Nunca Podemos Declarar que um</p><p>Comportamento está Errado</p><p>Uma curiosidade da insistência progressista de que não devemos ser</p><p>pessoas que “julgam” é que esse comportamento é seletivo. Em se tratando</p><p>da ética sexual, por exemplo, os cristãos progressistas nos dizem que não</p><p>devemos julgar práticas e comportamentos contrários. Eles defendem que a</p><p>forma pessoal de manifestação e expressão deve ser livre. Mas quando se</p><p>trata de racismo, ambientalismo, abusos e outras problemáticas</p><p>semelhantes, então, aparentemente, julgar o comportamento dos outros é</p><p>permissível. Na verdade, julgá-los é necessário!</p><p>Dizer que Nunca Podemos Considerar um Comportamento Errado</p><p>substitui o Processo de Reconciliação</p><p>O problema fundamental com a abordagem progressista acerca do ato de</p><p>julgar é que ela destrói aos poucos o próprio objetivo que está tentando</p><p>atingir, isto é, a reconciliação. Essa harmonia só pode existir quando erros</p><p>são reconhecidos e pecadores responsabilizados; quando há</p><p>arrependimento. Para tanto, deve haver julgamento sobre o comportamento</p><p>do próximo, o qual precisa ser realmente errado — e não apenas errado na</p><p>opinião de alguém. De outra forma, a reconciliação torna-se uma simples</p><p>ilusão.</p><p>Podemos e devemos afirmar que a reconciliação é um importante</p><p>princípio bíblico. E podemos afirmar que as igrejas não devem carregar um</p><p>tom ou uma postura de julgamento, mas sempre agir com graça, paciência e</p><p>um espírito de amor. Nada disso, porém, requer que abandonemos o claro</p><p>ensino de Deus de que algumas coisas devem ser consideradas certas e</p><p>outras, erradas.</p><p>Essa é a maneira apropriada de julgar, e não uma prática a ser evitada;</p><p>todo cristão é chamado e encorajado a isso. Nas palavras do profeta Isaías:</p><p>“Ai dos que ao mal chamam bem e ao bem, mal” (Is 5.20).</p><p>CAPÍTULO 4</p><p>O Comportamento Gracioso é mais</p><p>Importante do que Crer na Verdade</p><p>Como temos visto, o cristianismo progressista é amplamente definido</p><p>por sua ênfase na moralidade em detrimento da doutrina. Seus defensores</p><p>apregoam que o que realmente importa não é aquilo em que cremos, mas</p><p>como nos comportamos. Isso nos leva ao quarto mandamento: O</p><p>comportamento gracioso é mais importante do que crer na verdade.</p><p>Numa primeira leitura, há certo terreno comum. Certamente,</p><p>concordamos que a igreja deve ser caracterizada por uma postura terna e</p><p>amorosa (ainda que haja controvérsias quanto à implicação desse amor e</p><p>dessa ternura). No mínimo, pode-se dizer que a igreja (e os cristãos) deve</p><p>ser paciente, gentil, bondosa e amorosa para com todos — até mesmo com</p><p>aqueles que têm convicções teológicas diferentes.</p><p>Ainda assim, porém, há uma série de problemas que surgem da maneira</p><p>como esse mandamento é aplicado e da forma como Gulley dá mais</p><p>detalhes a seu respeito.</p><p>A Busca da Boa Teologia é o Problema?</p><p>Priorizar o comportamento externo acima da teologia chama a atenção</p><p>do mundo moderno, pois a população em geral já tem a ideia de que</p><p>pessoas que se preocupam com teologia são facciosas, radicais, dogmáticas</p><p>e até mesmo maliciosas. Pelo contrário, dizem-nos que o que importa é</p><p>simplesmente ser amável com as pessoas.</p><p>Gulley revela esse estereótipo ao comparar pessoas que se preocupam</p><p>com teologia com os fariseus. Segundo Gulley, o problema com os fariseus</p><p>é a sua “fixação pela ortodoxia” e sua “busca equivocada pela pureza</p><p>teológica”.18 Ou seja: sua preocupação com a ortodoxia provavelmente</p><p>revela o seu farisaísmo inato.</p><p>Deixando de lado a natureza ríspida (!) dessa comparação, posso</p><p>simplesmente citar sua tremenda imprecisão histórica. Jesus nunca disse</p><p>que o problema com os fariseus era a sua preocupação excessiva com a</p><p>ortodoxia. O problema com os fariseus era o legalismo (preferir leis</p><p>humanas e preterir as leis de Deus) e a hipocrisia (falar uma coisa e fazer</p><p>outra). Além do mais, legalismo e hipocrisia geralmente andam de mãos</p><p>dadas. O problema dos fariseus não era se preocupar demais com a boa</p><p>teologia; não, pelo contrário, era se preocupar de menos! A teologia dos</p><p>fariseus era uma bagunça. Sua doutrina glorificava o homem, invertia as</p><p>prioridades do próprio Deus e seguia seletivamente a lei do Senhor.</p><p>Toda essa dificuldade levanta um ponto importante. Ensinar boa teologia</p><p>não é o problema, mas a solução. Ensinar boa teologia é vital; é a essência</p><p>de cuidar bem de uma alma. Ao invés de enxergar a teologia como algo que</p><p>machuca ou oprime as pessoas, lembremo-nos de que a boa teologia, na</p><p>verdade, consola e liberta. Os fariseus feriam as pessoas precisamente ao</p><p>ensinar-lhes (e ao servir de exemplo) uma má teologia.</p><p>O Comportamento é mais Importante do que a Teologia?</p><p>Outro problema em relação ao quarto mandamento do cristianismo</p><p>progressista é a dicotomia que este cria entre o comportamento e a doutrina.</p><p>Seus defensores nos dizem que o comportamento é simplesmente mais</p><p>importante do que a doutrina.</p><p>A dificuldade, no entanto, é que ambos, comportamento e doutrina, não</p><p>podem ser facilmente separados. Na verdade, qualquer declaração sobre</p><p>comportamento certo ou errado é uma declaração teológica! Não se pode</p><p>determinar um comportamento piedoso na falta de categorias</p><p>teológicas e</p><p>de conceitos firmes, pois o comportamento só é “certo” se concordar com a</p><p>lei e com o caráter de Deus.</p><p>Há uma rica ironia aqui. A declaração “O comportamento gracioso é</p><p>mais importante do que crer na verdade” é, em si, uma proposição que</p><p>requer o ato de crer daquele que a ouve! Aparentemente, nesse caso, a</p><p>“crença correta” importa.</p><p>Recebemos mais “Graça” Priorizando o Comportamento?</p><p>O impulso de Gulley em preferir o comportamento à doutrina é</p><p>conduzido por uma convicção simplista, isto é, que o comportamento leva à</p><p>graciosidade. No dizer desse mesmo autor: “Jesus sabia que o</p><p>comportamento ríspido normalmente tem raízes em uma busca extraviada</p><p>por pureza teológica”.19 Em outras palavras, boa teologia não tende a</p><p>produzir um comportamento gracioso. Ao contrário, defende Gulley,</p><p>produzimos um comportamento mais gracioso quando enfatizamos... o</p><p>próprio comportamento.</p><p>Aqui é onde Gulley fecha o círculo e retorna ao primeiro mandamento</p><p>progressista, a saber, que o cristianismo diz mais respeito à moralidade do</p><p>que à adoração a Jesus. Simplificando, o argumento básico de Gulley é que</p><p>o comportamento gracioso flui mais facilmente do moralismo. Obviamente,</p><p>a triste realidade é que, na verdade, eram os fariseus, e não Jesus, que se</p><p>comprometiam com o moralismo. E de forma alguma seu moralismo os</p><p>tornava mais graciosos.</p><p>Novamente, há uma ironia aqui. Embora critique a natureza ríspida dos</p><p>fariseus, Gulley, ainda assim, defende a metodologia moralista dos próprios</p><p>fariseus. É esse tipo de incongruência que surge sempre que a doutrina e a</p><p>teologia são rebaixadas. Tudo que resta é uma religião de ser “bonzinho”</p><p>com as pessoas.</p><p>Se realmente desejamos nos tornar pessoas mais graciosas, nossa</p><p>resposta não pode ser enfatizar o comportamento e “tentar mais e melhor”.</p><p>Pelo contrário, a resposta é fixar os olhos em Jesus Cristo, o Filho de Deus,</p><p>que entregou sua vida para pagar a dívida dos nossos pecados e nos</p><p>capacitar por meio do Espírito a viver uma nova vida. Só assim</p><p>conseguiremos negar a nós mesmos e amar o nosso próximo com entrega.</p><p>J. Gresham Machen resume esse ponto muito bem:</p><p>O que é estranho sobre o cristianismo é que ele adotou um método inteiramente diferente. Ele não</p><p>transformou as vidas dos homens apelando para a vontade humana, mas contando uma história;</p><p>não através da exortação, mas pela narração de um evento [...] as vidas de homens são</p><p>transformadas através de um fragmento de notícias.20</p><p>A abordagem cristã exige o pensamento teológico.</p><p>Por fim, fica claro que o comportamento correto não é mais importante</p><p>do que a teologia correta. Ambos, teologia e comportamento, são</p><p>importantes. Tenhamos em mente o lembrete do apóstolo Paulo: “Tem</p><p>cuidado de ti mesmo e da doutrina” (1Tm 4.16).</p><p>CAPÍTULO 5</p><p>Questionamentos Atraentes são mais Valiosos</p><p>do que Respostas Sólidas</p><p>Talvez nenhum outro mandamento capture mais o ethos do cristianismo</p><p>progressista do que o quinto: Questionamentos atraentes são mais valiosos</p><p>do que as respostas sólidas.</p><p>Trata-se de uma estratégia eficaz. Coloque-se como alguém humilde e</p><p>inquisitivo, numa simples jornada de descobertas. Então descreva o outro</p><p>lado como formado por despenseiros altivos, defensores de dogmas</p><p>excessivamente rígidos.</p><p>Você não passa de um inquiridor bem-intencionado; os outros é que são</p><p>maldosos, um bando de sabe-tudo, senhores do saber. Brilhante. Na</p><p>verdade, essa é a reclamação de Gulley contra a igreja. Ele defende que a</p><p>instituição da igreja tem se “comprometido com a propaganda” e</p><p>“obedecido às cegas”, afastando-se da “explicação vigorosa da verdade”.21</p><p>Certo, mas, sendo assim, como devemos lidar com esse quinto</p><p>“mandamento”? Permita-me apresentar alguns pensamentos.</p><p>Uma Caricatura do Cristianismo</p><p>Antes de tudo, percebamos, mais uma vez, que há um elemento de</p><p>verdade nesse ponto. Só nos Estados Unidos, as expressões de cristianismo</p><p>são muitas e variadas; muitos já se acostumaram com denominações que</p><p>dão respostas rasas e insatisfatórias a dúvidas honestas acerca da fé. Em</p><p>contextos assim, questionamentos a respeito da fé são desencorajados. E,</p><p>quando feitos, a liderança pressupõe que o inquiridor está disposto a aceitar</p><p>a resposta provida de bom grado; o envolvimento intelectual profundo</p><p>deixou de ser uma opção.</p><p>Se o referido mandamento progressista é projetado para corrigir essa</p><p>abordagem do cristianismo, então estamos de acordo. Tal correção é</p><p>necessária. Mas seria uma caricatura pintar todos os cristãos (ou o</p><p>cristianismo) como propagadores do anti-intelectualismo. Na verdade, ao</p><p>longo das eras, a maior parte dos cristãos já pressionou a Bíblia e lhe fez as</p><p>perguntas mais difíceis — intelectuais, históricas e pessoais. Ao fazê-lo,</p><p>esses cristãos descobriram que as Escrituras fornecem respostas sólidas e</p><p>convincentes. Por que tamanha solidez seria motivo de ridicularização?</p><p>Qual Posição é Intelectualmente Irresponsável?</p><p>Suspeito que parte do problema em jogo é o pensamento progressista de</p><p>que é intelectualmente irresponsável reivindicar a verdade, exigência esta</p><p>feita pelo cristianismo histórico. Essa reivindicação soa arrogante; até</p><p>mesmo presunçosa. Como alguém pode ter a certeza de verdades tão</p><p>profundas? Os cristãos progressistas defendem que a melhor forma de agir é</p><p>dizer: “Não sei”.</p><p>Embora essa abordagem liberal dê um ar de humildade, seus problemas</p><p>são graves. Em primeiro lugar, dizer “Não sei” só é a resposta certa se, de</p><p>fato, não houver nenhuma base epistemológica para chegar ao</p><p>conhecimento do respectivo questionamento. Agora, e se, ao contrário,</p><p>houver base para obter conhecimento acerca da dúvida em questão?</p><p>Existindo essa base, dizer “Não sei” constitui uma posição intelectualmente</p><p>irresponsável.</p><p>Em outras palavras, “Não sei” nem sempre é a resposta certa; às vezes, é</p><p>a resposta errada.</p><p>Imagine que, recentemente, você teve aulas sobre a Guerra Civil</p><p>Americana. Caso um amigo seu pergunte: “Abraham Lincoln assinou a</p><p>abolição da escravatura nos EUA?”, e sua resposta for “Sim”, dificilmente</p><p>você seria contestado como um sabe-tudo arrogante. Na verdade, se tivesse</p><p>respondido “Não sei”, devido a uma noção equivocada de humildade</p><p>intelectual, então você poderia ser repreendido por rejeitar uma evidente</p><p>verdade histórica.</p><p>É claro que os progressistas defenderão que se trata de uma falsa</p><p>comparação, pois sabemos que Lincoln assinou a abolição da escravatura,</p><p>mas não sabemos, digamos, se Jesus realmente ressuscitou. Mas é</p><p>justamente esse ponto que está sendo discutido! Visto que a Bíblia é, na</p><p>verdade, a Palavra de Deus inspirada e revelada, quanto mais certeza</p><p>podemos ter quanto à ressurreição de Cristo do que a respeito de Abraham</p><p>Lincoln.</p><p>O argumento progressista só funcionaria se alguém já “soubesse” que a</p><p>Bíblia não é a Palavra de Deus e, portanto, pudesse colocar em dúvida</p><p>qualquer uma de suas reivindicações. Mas como os progressistas</p><p>conseguiriam obter esse conhecimento? Do ponto de vista progressista, não</p><p>é um absurdo afirmar conhecimento absoluto?</p><p>Em outras palavras, para ser intelectualmente defensável, a posição</p><p>progressista necessariamente precisaria saber que é impossível saber se a</p><p>ressurreição de Cristo realmente aconteceu ou não. Mas esse conhecimento</p><p>exigiria um alto nível de certeza intelectual — algo que os progressistas</p><p>declaram ser impossível.</p><p>Certezas Sorrateiras</p><p>Esse raciocínio todo conduz a um problema real com a posição</p><p>progressista: ela é inconsistente.</p><p>O cristianismo progressista lamenta o dogmatismo e a certeza do</p><p>cristianismo bíblico. Tudo seria muito melhor, defende Gulley, se todos</p><p>admitissem sua incerteza. O referido autor, porém, tem bastante certeza de</p><p>suas posições — a ponto de condenar outras posições bem depressa. Em</p><p>certo ponto, ele descreve uma perspectiva sobre a conversão como um</p><p>“ponto de vista infantil”, de alguém claramente “preso” a uma posição</p><p>teológica ruim.</p><p>Nesse caso, e também em muitos outros, Gulley simplesmente</p><p>contrabandeia sua certeza às escondidas, pela porta dos fundos. E ele está</p><p>longe de agir sozinho. Os progressistas são rápidos em condenar</p><p>todo tipo</p><p>de comportamento dentro do seu campo de visão, ao mesmo tempo em que</p><p>insistem que os cristãos que acreditam na Bíblia estão errados quando</p><p>defendem certezas históricas. Por exemplo, considere o debate sobre o</p><p>casamento de pessoas do mesmo sexo. Note que ouvimos pouquíssimos</p><p>progressistas comentando algo como “Não temos a resposta para esse</p><p>problema. Não podemos ter certeza a esse respeito”. Não, pelo contrário:</p><p>recebemos um absolutismo por parte deles. Recebemos certeza. Recebemos</p><p>dogmatismo.</p><p>Assim, tem-se a impressão de que o verdadeiro problema não é a</p><p>certeza. Os progressistas simplesmente trocaram um conjunto de crenças</p><p>assertivas por outro.</p><p>Todos temos certezas. Todos pressupomos alguns ensinos como</p><p>verdadeiros e absolutamente reais. A pergunta-chave envolve a base dessas</p><p>certezas. Os cristãos baseiam sua certeza na Palavra de Deus.</p><p>O mundo pode zombar das Escrituras, mas Cristo manteve-se alicerçado</p><p>na certeza que ele próprio declarou ao Pai: “A tua palavra é a verdade” (Jo</p><p>17.17).</p><p>CAPÍTULO 6</p><p>Encorajar a Busca Pessoal é mais Importante</p><p>do que a Unidade de Grupo</p><p>O cristianismo sufoca o pensamento livre? A igreja só está interessada</p><p>em proteger sua própria autoridade?</p><p>No sexto capítulo de seu livro, Gulley responde a ambas as perguntas</p><p>com afirmativas. Ele lamenta o fato de cristãos estarem tão preocupados</p><p>com proteger a igreja de visões dissidentes que chegam a sufocar o</p><p>pensamento livre e mesmo a expulsar aqueles que não se conformam ao seu</p><p>sistema doutrinário. Essa problematização nos leva ao sexto mandamento</p><p>do cristianismo progressista: Encorajar a busca pessoal é mais importante</p><p>do que a unidade de grupo.</p><p>Para provar seu ponto de vista, Gulley conta a história de conhecidos</p><p>que “tiveram sua comunhão cortada” ou foram “evitados” pela igreja por</p><p>certos comportamentos ou crenças. Eles simplesmente tentaram pensar por</p><p>conta própria, mas a igreja estava mais interessada na “uniformidade do</p><p>grupo”. Os progressistas então apregoam que Jesus jamais aceitaria essa</p><p>espécie de rompimento. Pelo contrário, argumenta Gulley, Cristo era a favor</p><p>da “jornada pelo saber espiritual” e “não tinha nenhum problema com o</p><p>pensamento independente e a ação individual”.22</p><p>Para deixar claro, esse capítulo do livro de Gulley faz boas observações</p><p>sobre a maneira como algumas congregações praticam a disciplina</p><p>eclesiástica. Ele está certo em ser cauteloso com a prática de “evitar” de</p><p>alguns grupos e, sem dúvida, não erra ao afirmar que algumas igrejas (como</p><p>já mencionei) não se interessam pela comunhão com pessoas que fazem</p><p>perguntas difíceis. Mas a mensagem geral do capítulo de Gulley é simplista</p><p>demais. Igrejas que seguem certas verdades com firmeza e convicção são</p><p>retratadas como mesquinhas e vingativas, e aqueles que questionam essas</p><p>verdades são retratados como guerreiros lutando contra o sistema por</p><p>liberdade de consciência. E Jesus, é claro, estaria do lado desse grupo</p><p>libertário.</p><p>Essa narrativa toda pode ser aceita pelo lado cristão progressista, mas</p><p>eu, particularmente, a considero repleta de problemas significativos.</p><p>O Cristianismo não é uma Simples Jornada</p><p>Os progressistas gostam de retratar a religião cristã (e todas as religiões,</p><p>nesse caso) como uma “jornada” espiritual. A religião é, fundamentalmente,</p><p>uma “exploração ” individual das nossas crenças espirituais.</p><p>O problema é que por trás dessa abordagem está um pressuposto gritante</p><p>(embora oculto) do liberalismo teológico: Deus não se revelou com clareza</p><p>e evidência. Deus nem mesmo revelou uma mensagem de salvação. Na</p><p>verdade, o pressuposto oculto e fundamental dessa narrativa progressista é</p><p>que a religião refere-se ao ser humano buscar e encontrar a Deus, e não ao</p><p>ato de Deus ter se revelado à humanidade.</p><p>É compreensível a irritação dos progressistas contra o cristianismo</p><p>bíblico. De acordo com seus defensores, a religião (por definição!) é sempre</p><p>um fluxo, um movimento. É o processo de buscar a Deus. Quão arrogante</p><p>seria declarar que ele foi encontrado! Em contraste, o cristianismo bíblico</p><p>defende que Deus claramente revelou a mensagem de salvação em Cristo</p><p>Jesus, e que todas as pessoas em todos os lugares são chamadas a crer nas</p><p>boas novas do Senhor.</p><p>A Igreja Recebe Inquiridores</p><p>Gulley promove a visão de que as igrejas, via de regra, não gostam de</p><p>membros inquiridores, pois questionamentos são considerados ameaças à</p><p>autoridade da igreja. Novamente, embora certamente haja congregações que</p><p>agem assim, não creio que essa seja a verdadeira posição da igreja</p><p>evangélica como um todo.</p><p>Pelo contrário, a maioria das igrejas tem esse desejo de que as pessoas</p><p>façam perguntas. Na verdade, as igrejas querem que as pessoas façam</p><p>perguntas acerca da fé cristã, aprendam sobre as doutrinas em que os</p><p>cristãos creem e por que acreditam nelas. Logo, parece que a queixa</p><p>progressista sobre as igrejas é por outro motivo. Não se trata de não aceitar</p><p>questionamentos (creio que a maioria das igrejas os aceite). A verdadeira</p><p>problematização progressista é de que a igreja pensa que há resposta para</p><p>muitos desses questionamentos!</p><p>Portanto, a real objeção de Gulley se dá porque os cristãos acreditam</p><p>que existem respostas claras e cognoscíveis às questões mais importantes da</p><p>vida. O que ele realmente objeta é a crença cristã na verdade absoluta.</p><p>Esse é o ponto crítico. E é por isso que os progressistas nunca se</p><p>satisfazem com a simples mudança de tom ou de abordagem por parte dos</p><p>cristãos. Eles só se sentirão satisfeitos quando os cristãos abandonarem por</p><p>completo a afirmação de que o verdadeiro cristianismo possui verdades</p><p>fundamentais.23</p><p>Jesus Ensinou a Disciplina Eclesiástica</p><p>Como já deu para perceber, creio que Gulley não erra em afirmar que</p><p>algumas tentativas de sufocar o erro são problemáticas. Mas ele cita</p><p>erroneamente 1Coríntios 5.11 como evidência de que o apóstolo Paulo</p><p>defende a prática num sentido mais lato.</p><p>O que o apóstolo defende é a disciplina eclesiástica, aquele processo em</p><p>que os líderes de uma congregação corrigem, de forma amorosa, um</p><p>membro rebelde que se envolveu em desobediência grave (seja moral, seja</p><p>doutrinária). Como toda disciplina, ela deve ser executada de forma gentil e</p><p>para o bem de quem a recebe. E, apesar de Gulley supor que Jesus seria</p><p>contra tal prática, Cristo a corrobora claramente em Mateus 18.15-20. No</p><p>versículo 17, ele diz: “E, se ele [o irmão rebelde] não os atender, dize-o à</p><p>igreja; e, se recusar ouvir também a igreja, considera-o como gentio e</p><p>publicano”. Em 1Coríntios 5.11, portanto, Paulo concorda com Jesus: o que</p><p>alguns podem caracterizar como “sufocar” é, às vezes, um componente bom</p><p>e necessário de um processo de disciplina eclesiástica ordenado e redentivo.</p><p>Tenha em mente que a disciplina eclesiástica limita-se aos membros da</p><p>comunidade pactual. Essas passagens bíblicas não proíbem o cristão de</p><p>interagir com não cristãos ou com pessoas de visões discordantes. Como já</p><p>deixei claro anteriormente, a igreja recebe não cristãos que desejam se</p><p>achegar e aprender acerca de Jesus Cristo.</p><p>A disciplina eclesiástica volta-se aos cristãos professos que se perderam</p><p>no meio do caminho, a fim de que se arrependam de práticas pecaminosas e</p><p>sejam restaurados. A disciplina ministrada pela igreja serve para manter a</p><p>paz e a pureza do corpo.</p><p>Errando a Mensagem</p><p>Logo, acredito que o sexto mandamento do cristianismo progressista</p><p>sofre de uma série de premissas erradas ou de uma má compreensão das</p><p>bases. Seu ensino, mesmo sem provar, pressupõe que não há verdade</p><p>absoluta, que a igreja não aceita questionamentos (enquanto, de modo geral,</p><p>aceita, sim) e que sua instituição não compreende adequadamente a</p><p>natureza e o propósito da disciplina eclesiástica (a qual serve ao bem do</p><p>membro disciplinado).</p><p>E ainda mais grave que tudo isso, a posição progressista erra o cerne da</p><p>mensagem cristã. O cristianismo não se trata da “jornada” sem fim da</p><p>humanidade em direção a Deus; a religião cristã, pelo contrário, é a jornada</p><p>consumada que Deus fez para achegar-se a nós, a fim de salvar-nos dos</p><p>nossos pecados. Nas palavras</p><p>de João Batista: “Nisto consiste o amor: não</p><p>em que nós tenhamos amado a Deus, mas em que ele nos amou e enviou o</p><p>seu Filho como propiciação pelos nossos pecados” (1Jo 4.10).</p><p>CAPÍTULO 7</p><p>Suprir Necessidades Reais é mais Importante</p><p>do que Manter Instituições</p><p>Em seu livro Eles Gostam de Jesus, mas não da Igreja,24 Dan Kimball</p><p>indica uma mudança crucial nos dados demográficos de pessoas mais</p><p>jovens, a saber, que elas estão desiludidas com a igreja institucional. Esses</p><p>jovens professam seguir a Cristo, mas são céticos quanto às organizações</p><p>religiosas. Esse fenômeno é apreendido no sétimo mandamento do</p><p>cristianismo progressista: Suprir necessidades reais é mais importante do</p><p>que manter instituições.</p><p>No sétimo capítulo de seu livro, Gulley lamenta sobre como as “funções</p><p>institucionais (e disfuncionais) superam a missão e o propósito da igreja”.25</p><p>Ele defende que a maioria dos cristãos está cega para essa realidade:</p><p>“Parece ser um traço comum entre o ser humano e as instituições que</p><p>criamos: ignorar nossas falhas, mesmo quando estas impedem nossa</p><p>capacidade de agir e crescer”.26</p><p>Embora Gulley ofereça uma lista de observações úteis nesse capítulo, há</p><p>também um tom anti-institucional subjacente que acaba divorciando Jesus</p><p>Cristo de sua noiva, a Igreja.</p><p>A Igreja não é Perfeita</p><p>Sem dúvida, Gulley está certo de que a igreja não é uma instituição</p><p>perfeita. Ele oferece uma série de exemplos de denominações mesquinhas,</p><p>ensimesmadas, obcecadas com sua autopreservação e compulsivas por</p><p>tamanhos e quantidades. Em particular, ele nota como muitas congregações</p><p>são geridas como se fossem empresas, fato que cria uma cultura corporativa</p><p>que tende a operar como uma corporação listada entre as mais ricas do</p><p>mundo, e não como a noiva de Cristo. Congregações desse tipo estão mais</p><p>preocupadas com o “preço de suas ações” do que com a necessidade das</p><p>pessoas e da comunidade ao seu redor.</p><p>Há muito com o que concordar neste ponto, e tenho certeza de que cada</p><p>leitor poderia contribuir com o seu próprio relato das fraquezas presentes na</p><p>igreja moderna. Repleta de pecadores e parte integrante de um mundo</p><p>caído, toda igreja, evidentemente (e inevitavelmente), tem falhas.</p><p>A Igreja Permanece Noiva de Cristo</p><p>Ainda assim, a igreja permanece a gloriosa e maravilhosa noiva de</p><p>Cristo, amada com grande amor e purificada por seu sangue (Ef 5.25–27). A</p><p>igreja de Deus não será perfeita até a volta de Cristo, mas já é, com justiça,</p><p>considerada santa — separada para Deus.</p><p>Infelizmente, Gulley não partilha de uma visão elevada da igreja. Para</p><p>ele, a igreja como instituição é relativamente dispensável. Por quê? Porque,</p><p>em sua visão, a igreja tem pouco a ver com Jesus. O autor argumenta que</p><p>“Jesus parecia dar [à igreja] pouca importância […] sua gênese e</p><p>continuação não pareciam prioridade para ele”.27</p><p>É claro que estas são declarações chocantes quando comparadas ao que</p><p>Jesus realmente disse sobre a igreja. Cristo não enxergava a igreja como</p><p>uma edificação humana, mas como o corpo que ele próprio edificaria.</p><p>“Edificarei a minha igreja”, Cristo disse a Pedro e, preocupado com sua</p><p>continuação, acrescentou: “e as portas do inferno não prevalecerão contra</p><p>ela” (Mt 16.18).</p><p>Além disso, Jesus zelava pela estrutura da igreja, especialmente com a</p><p>forma de restaurar ovelhas perdidas, como aquela mencionada quando</p><p>citamos o processo de disciplina eclesiástica traçado em Mateus 18.15–20.</p><p>Perceba que Jesus não estava lidando com a igreja invisível — cristãos</p><p>genuínos espalhados pelo mundo —, mas com expressões tangíveis e locais</p><p>da instituição (igreja) que pode até mesmo aplicar disciplina a membros</p><p>rebeldes. Em outras palavras, Jesus afirmava o valor da igreja institucional.</p><p>O Propósito da Igreja</p><p>Boa parte do problema referente ao relato de Gulley acerca da igreja é</p><p>que ele a enxerga como tendo um propósito unicamente horizontal — isto</p><p>é, o modo como o ser humano se relaciona com o seu próximo. A igreja</p><p>deveria ajudar pessoas em necessidade: “alimentando o faminto, fazendo</p><p>amizade com os solitários, amando o inimigo, curando o doente”.28</p><p>Embora esses elementos estejam no escopo da igreja, o que falta no</p><p>relato de Gulley é o propósito vertical da igreja (a forma como o ser</p><p>humano se relaciona com Deus). Nenhuma menção é feita do chamado à</p><p>igreja a adorar e glorificar a Cristo. Nenhuma menção é feita sobre a igreja</p><p>ser o ambiente no qual Deus fala ao seu povo por meio de sua Palavra.</p><p>Nenhuma menção é feita sobre o que Deus faz por meio dos sacramentos.</p><p>Isso explica muito da frustração de Gulley com a igreja. Ele acredita que</p><p>a função principal da igreja é resolver problemas sociais. E ele parece</p><p>chateado, pois considera que a igreja não tem feito o suficiente.</p><p>Essa abordagem se encaixa muito bem com a crença da esquerda cristã.</p><p>Se o sistema religioso de alguém é puro moralismo, as únicas categorias</p><p>cabíveis, evidentemente, serão as horizontais. A “igreja”, então, torna-se</p><p>apenas mais uma instituição de caridade ou uma versão da AMC local.</p><p>Em contraste, a visão bíblica da igreja não escolhe entre dimensões</p><p>verticais ou horizontais. Ela afirma ambas. É claro, a igreja deve ser luz e</p><p>bênção no mundo, mas também foi projetada para redundar em glória e</p><p>louvor a Deus, a fim de proclamar sua verdade.</p><p>Problema Errado, Solução Errada</p><p>Gulley salienta corretamente que a igreja não é uma instituição perfeita.</p><p>De fato, pode ser frustrante ver congregações atoladas em burocracias e</p><p>procedimentos, falhando em seu chamado inato. Mas a suposta solução de</p><p>Gulley não é, nem de longe, uma solução. Ao invés de simplesmente</p><p>descartar a instituição eclesiástica como uma criação humana, como o autor</p><p>quer que façamos, precisamos levar a igreja de volta ao seu devido lugar:</p><p>uma instituição ordenada e criada pelo próprio Cristo e para a sua própria</p><p>glória.</p><p>Não ousemos transformar a igreja em mais uma simples ferramenta para</p><p>tratar de problemas sociais. Novamente, embora haja espaço para a igreja</p><p>servir em prol da comunidade, não podemos nos esquecer de que o</p><p>propósito primário da igreja é adorar a Cristo e proclamar sua Palavra.</p><p>Lembremo-nos, também, de que um dia a igreja será perfeita: “Então,</p><p>veio um dos sete anjos que têm as sete taças cheias dos últimos sete flagelos</p><p>e falou comigo, dizendo: Vem, mostrar-te-ei a noiva, a esposa do Cordeiro;</p><p>e me transportou, em espírito, até a uma grande e elevada montanha e me</p><p>mostrou a santa cidade, Jerusalém, que descia do céu, da parte de Deus, a</p><p>qual tem a glória de Deus. O seu fulgor era semelhante a uma pedra</p><p>preciosíssima, como pedra de jaspe cristalina” (Ap 21.9–11).</p><p>CAPÍTULO 8</p><p>A Paz é mais Importante do que o Poder</p><p>Para aqueles frustrados com a religião institucional, pode parecer que os</p><p>líderes eclesiásticos estão preocupados sobretudo com o poder, para tê-lo e</p><p>mantê-lo. De fato, pode até parecer que igrejas atraem pessoas famintas por</p><p>poder, ávidas por comandar os outros. O oitavo mandamento do</p><p>cristianismo progressista foi desenvolvido para ir contra esse problema: A</p><p>paz é mais importante do que o poder.</p><p>Comecemos reconhecendo que boa parte desse oitavo mandamento</p><p>progressista está correto. Deus não chama os líderes da igreja à</p><p>autopreservação severa, mas ao serviço humilde e sacrificial. Assim como</p><p>Pedro admoesta os presbíteros: “pastoreai o rebanho de Deus que há entre</p><p>vós, não [...] como dominadores dos que vos foram confiados, antes,</p><p>tornando-vos modelos do rebanho” (1Pe 5.2–3).</p><p>Gulley apresenta sua perspectiva fornecendo vários exemplos de má</p><p>liderança eclesiástica — pastores/bispos famintos por controle e dispostos a</p><p>pisar nas pessoas para consegui-lo. Tenho certeza de que muitos cristãos</p><p>poderiam contar histórias semelhantes por experiência própria. Entretanto,</p><p>como em capítulos anteriores, Gulley tem o diagnóstico correto, mas a cura</p><p>errada (ou terrivelmente incompleta). Como veremos a seguir, a fim de</p><p>livrar a igreja da autoridade indevida, Gulley oferece uma abordagem</p><p>excessivamente igualitária e que pode acabar furtando da igreja sua real</p><p>autoridade.</p><p>Autoridade vs Autoritarismo</p><p>Gulley faz uma distinção plausível entre autoridade e autoritarismo.</p><p>Embora a autoridade seja legítima, o autoritarismo é destrutivo. O</p><p>autoritarismo é uma forma de liderança excessiva, de cima para baixo,</p><p>comparável ao abuso, e que tem o poder de destruir os membros e a</p><p>congregação como um todo. O próprio Jesus reconhecia os perigos da</p><p>liderança despótica: “Então, Jesus, chamando-os, disse: Sabeis que os</p><p>governadores dos povos os dominam e que os maiorais exercem autoridade</p><p>sobre eles. Não é assim entre vós; pelo contrário, quem quiser tornar-se</p><p>grande entre vós, será esse o que vos sirva” (Mt 20.25–26). Gulley também</p><p>está certo em sugerir que a liderança autoritária precisa ser tratada quanto</p><p>antes: “Quanto antes o autoritarismo for desafiado, mais saudável será a</p><p>igreja”.29</p><p>Mas logo surge a dificuldade: como é possível saber se determinada</p><p>liderança é autoritária? Gulley apresenta uma ponderação útil: “A liderança</p><p>em questão edifica ou destrói?”.30 Esse ponto ecoa as palavras de Paulo:</p><p>“Porque, se eu me gloriar um pouco mais a respeito da nossa autoridade, a</p><p>qual o Senhor nos conferiu para edificação e não para destruição vossa, não</p><p>me envergonharei” (2Co 10.8).</p><p>Como veremos, entretanto, tudo depende de compreender a diferença</p><p>entre edificar e destruir.</p><p>Que Forma Toma para si a Autoridade Legítima?</p><p>Embora Gulley deva ser elogiado por falar contra a liderança autoritária,</p><p>permanece a necessidade de uma boa liderança com sua devida autoridade.</p><p>Qual é o alcance da autoridade legítima da igreja?</p><p>É aqui onde a bagunça começa. Por exemplo, podemos nos perguntar se</p><p>a igreja (ou seus líderes) tem a autoridade de condenar falsas doutrinas.</p><p>Pastores e presbíteros podem usar sua autoridade para defender a verdade e</p><p>condenar o erro?</p><p>Aparentemente, Gulley acredita que não. Ele conta a história de uma</p><p>pastora que foi examinada por um comitê, devido a preocupações em</p><p>relação à sua teologia progressista. Mas na cabeça de Gulley, o próprio</p><p>questionamento foi um abuso de poder: “[O comitê] deixou de ter</p><p>autoridade genuína para exercer autoritarismo; deixou de edificar para</p><p>destruir”. Segundo Gulley, o comitê só queria saber de “comando e</p><p>controle”.31</p><p>Em que mundo defender a sã doutrina tornou-se um abuso de</p><p>autoridade? A igreja não tem controle sobre suas doutrinas e ensinos? Paulo</p><p>não diz a Tito que é dever do presbítero “que tenha poder tanto para exortar</p><p>pelo reto ensino como para convencer os que o contradizem” (Tt 1.9)? E</p><p>não é verdade que todas as autoridades, até mesmo as legítimas, ainda</p><p>precisam de certo nível de “comando e controle”? Pois, se não tiverem esse</p><p>elemento de governo, não é fato que deixariam de ser autoridades?</p><p>Essa confusão e tamanha inconsistência levantam perguntas sobre o</p><p>ponto de vista de Gulley em relação à igreja. Parece que qualquer exercício</p><p>de autoridade é visto como inapropriado, tirânico, ou mesmo uma mistura</p><p>de inadequação com tirania. Ora, essa postura despótica não cabe no</p><p>cristianismo progressista. Como vimos em capítulos anteriores, o pacote</p><p>esquerdista, em seu cerne, carrega consigo um tom distintamente contrário</p><p>às autoridades. Ninguém pode nos dizer o que fazer ou no que crer (embora,</p><p>ironicamente, o livro todo de Gulley trate do que fazer e no que acreditar)!</p><p>O que Significa Buscar a Paz?</p><p>Se os membros de uma igreja devem buscar a paz, e não o poder, como</p><p>Gulley sugere, então o que essa busca significa exatamente? Incrivelmente,</p><p>o autor aproveita a oportunidade para defender o pacifismo e para</p><p>repreender a igreja nos EUA por apoiar as Forças Armadas. Logo, a “paz”,</p><p>de acordo com Gulley, é mais uma vez vista em termos unicamente</p><p>horizontais. Trata-se da paz entre as nações; trata-se de cessar o conflito</p><p>militar.</p><p>Deixando de lado a questão do pacifismo (não há espaço para tratá-la</p><p>aqui), é certo que podemos, em uma só voz, afirmar que a reconciliação</p><p>entre as pessoas é um princípio bíblico fundamental. Como já expliquei, a</p><p>Bíblia lida com o perdão ao próximo (Lc 17.4), com a reconciliação mútua</p><p>(Mt 5.24, At 7.26), com a harmonia entre marido e esposa (1Co 7.11) e com</p><p>a remoção de hostilidade entre grupos (Ef 2.16).</p><p>Gulley, porém, ignora completamente a forma como essa paz horizontal</p><p>é alcançada. Basta se esforçar? A igreja torna-se uma emulação da ONU?</p><p>Protestamos contra as diversas guerras e conflitos armados mundo afora?</p><p>As Escrituras, por sua vez, respondem à pergunta de como a paz é</p><p>alcançada: “Porque ele [Jesus] é a nossa paz, o qual de ambos fez um; e,</p><p>tendo derribado a parede da separação que estava no meio, a inimizade” (Ef</p><p>2.14). O poder para amar o próximo e para manter o vínculo da paz começa</p><p>com a compreensão do amor de Deus por nós em Cristo. Esse é o</p><p>fundamento da verdadeira paz: “Nós amamos porque ele nos amou</p><p>primeiro” (1Jo 4.19).</p><p>Em outras palavras, a paz horizontal (entre a humanidade) começa,</p><p>antes de tudo, com o reconhecimento de que carecemos da paz vertical</p><p>(entre Deus e a humanidade). E apenas Jesus pode fornecer paz com Deus.</p><p>Inacreditável dizer, Gulley não parece ter interesse pelo método</p><p>proposto por Jesus para receber paz. Para o autor, a paz não passa de um</p><p>conceito político e social. Novamente, o cristianismo progressista, com seu</p><p>desinteresse pela doutrina — e, por consequência, seu desinteresse por</p><p>Jesus — é reduzido a mero moralismo.</p><p>Problema Certo, Solução Errada</p><p>Gulley está certo quando indica problemas com déspotas eclesiásticos</p><p>que buscam dominar o rebanho ao invés de pastoreá-lo gentilmente. Líderes</p><p>autoritários podem causar graves estragos tanto aos membros como à igreja</p><p>em geral. Mas, embora Gulley esteja certo no diagnóstico, persistem as</p><p>dificuldades quanto à cura. No esforço de livrar a igreja de líderes que ele</p><p>julga autoritários, Gulley acaba por livrar a igreja de toda a sua autoridade.</p><p>Ironicamente, essa libertação proposta pelo autor torna a igreja ainda mais</p><p>vulnerável a indivíduos abusivos e suscetível a falsos ensinos.</p><p>A cura para a liderança ruim não é o cessar absoluto de toda liderança.</p><p>Pelo contrário, a má liderança deve ser substituída pela liderança piedosa,</p><p>misericordiosa, gentil, cristocêntrica.</p><p>Além disso, Gulley continua a pensar apenas no sentido horizontal. Sem</p><p>Jesus e sem as boas novas do Evangelho, o referido autor não explica como</p><p>alcançar a pacificação, tarefa difícil, quase impossível. Aparentemente, aos</p><p>olhos de Gulley, as igrejas locais precisam simplesmente tentar mais vezes</p><p>e com mais ímpeto, até conseguirem.</p><p>Esse tipo de pacificação torna-se um jugo envolto em nosso pescoço —</p><p>um arado que acabamos precisando puxar com a nossa própria força. Por</p><p>isso, digo sem medo de errar: a melhor escolha é recorrer a Jesus, aquele</p><p>que é o grande portador da paz; e Cristo a dará gratuitamente: “Deixo-vos a</p><p>paz, a minha paz vos dou” (Jo 14.27).</p><p>CAPÍTULO 9</p><p>Deveríamos nos Preocupar mais com Amor e</p><p>menos com Sexo</p><p>Como já observamos, o cristianismo progressista é decididamente</p><p>moralista: sua crença não importa, mas sim seu comportamento. Quão</p><p>curioso, porém, é que essa abordagem não aparece em assuntos</p><p>relacionados ao sexo. Quando o assunto se refere a questões sexuais, de</p><p>repente os progressistas tornam-se a favor da liberdade e da escolha moral.</p><p>Essa abordagem é evidente no nono mandamento da esquerda cristã:</p><p>Deveríamos nos preocupar mais com amor e menos com sexo.</p><p>De uma perspectiva retórica, trata-se de uma linguagem bem eficaz.</p><p>Afinal, sua mensagem fala aquilo que as pessoas já querem ouvir — você</p><p>tem toda a liberdade sexual que quiser e, ao mesmo tempo, é uma pessoa</p><p>boa, um ser humano a favor do “amor”. Todos saem ganhando. O indivíduo</p><p>pode manter qualquer prática sexual questionável e continuar se</p><p>congratulando por sua superioridade moral.</p><p>O livro de Gulley expande esse clichê a um argumento completo em prol</p><p>da liberdade sexual. O autor ergue sua defesa adotando uma abordagem</p><p>muito comum, portanto façamos uma breve análise de sua estratégia.</p><p>Passo 1: Apresente as Virtudes Morais Daqueles que se Encontram em</p><p>Pecados Sexuais</p><p>O primeiro passo é mostrar que as pessoas envolvidas</p><p>na disputa acerca</p><p>do comportamento sexual são genuinamente boas, maravilhosas, seres</p><p>humanos virtuosos e ecléticos. Esse movimento tem o objetivo de fazer as</p><p>pessoas duvidarem se o pecado sexual é tão vil quanto a Bíblia diz ser.</p><p>Afinal, se é tão ruim assim, como pessoas tão maravilhosas conseguem</p><p>manter essas práticas? Em outras palavras, visto que pessoas maravilhosas</p><p>se envolvem em comportamentos que considero errados, então, talvez, seja</p><p>eu quem precise repensar se a prática em questão é realmente pecaminosa.</p><p>Gulley faz esse movimento com astúcia brilhante. Seu primeiro exemplo</p><p>é o de um casal com seus oitenta anos que convive e mantém relações</p><p>sexuais com pessoas fora do casamento. O autor nos diz que ambos são</p><p>pessoas “boas”, que “recebem calorosamente” outras pessoas em seu</p><p>“modesto lar”, e que há fotos dos “netos espalhadas pelo corredor”.32</p><p>Aqui vemos como a estratégia de Gulley é amplamente edificada sobre a</p><p>premissa de que determinada prática só será errada se as pessoas que a</p><p>abraçam forem desagradáveis. Na verdade, o autor chega a essa conclusão</p><p>sem meias palavras, a respeito do mesmo casal de idosos: “O lar que ambos</p><p>criaram tornou-se um ambiente de profundo amor e respeito mútuo; nada</p><p>daquilo parecia pecado para mim”.33</p><p>Mas não é dessa maneira que os cristãos pensam acerca da moralidade.</p><p>Os cristãos não condenam um ensino ou uma prática somente quando se</p><p>mostra desagradável. Nós, crentes em Jesus Cristo, não julgamos um</p><p>comportamento baseando-nos em como as circunstâncias podem nos fazer</p><p>“sentir”. Defendemos que algo é ruim quando este algo entra em conflito</p><p>com o caráter de Deus, que é refletido em seus mandamentos morais.</p><p>Logo, os cristãos defendem ser bem possível — na verdade, muito</p><p>comum — que pessoas boas, com muitas outras virtudes, se envolvam em</p><p>comportamentos extremamente errados. Quem comete pecados horríveis</p><p>não são só os assassinos em série. Até mesmo a doce senhorinha ao seu lado</p><p>pode cometer pecados, mesmo pecados graves.</p><p>É claro, Gulley (e os pós-modernos, de modo geral) não vivem de</p><p>acordo com a premissa defendida de modo consistente. Se ser “uma boa</p><p>pessoa” torna um comportamento aceitável, então o que acontece quando</p><p>uma pessoa considerada muito bondosa se envolve com uma prática</p><p>repreensível? Por exemplo, molestar crianças. Gulley e seus companheiros</p><p>certamente não defenderiam a aceitação dessa prática.</p><p>Passo 2: Insista que Deus tem Coisas mais Importantes com que se</p><p>Preocupar</p><p>O próximo passo nessa estratégia é minimizar a santidade de Deus. O</p><p>Senhor não tem tempo para se preocupar com o pecado sexual. Essa prática</p><p>não o incomoda; ele tem problemas mais urgentes a resolver. A esse</p><p>respeito, Gulley é claro enquanto fala acerca do casal de idosos: “Sabem,</p><p>amigos, acredito que Deus tenha coisas maiores com que se preocupar.</p><p>Apenas sejamos gratos que aquele casal de idosos tem um ao outro”.34</p><p>Certamente, as pessoas são livres para retratar Deus dessa forma. Na</p><p>verdade, os progressistas geralmente pintam Deus como um sujeito</p><p>descontraído — um tipo de avô fofinho que não quer se intrometer na sua</p><p>vida, que só quer que você seja feliz. Esse, porém, não é o Deus da Bíblia.</p><p>O Deus da Bíblia é infinitamente santo e, na verdade, lida em diversas</p><p>partes de sua Palavra com a prática e o pecado sexual. E Deus não condena</p><p>o pecado sexual por ser um radical ou retrógrado, mas porque o pecado</p><p>sexual atinge o coração da nossa humanidade, agredindo violentamente o</p><p>casamento, cujo propósito é refletir a união de Cristo com a sua Igreja (Ef</p><p>5.32).</p><p>Passo 3: Mostre que o Comportamento Sexual Divergente conduz a</p><p>Bons Resultados</p><p>Esse terceiro passo estratégico é similarmente brilhante. Pois, nesse</p><p>ponto, Gulley mostra como o pecado sexual traz alguns resultados</p><p>positivos, ou ao menos como a prática sexual ajuda a resolver outros</p><p>problemas.</p><p>Por trás desse argumento há uma premissa sorrateira, ou seja, de que</p><p>algo é bom — na verdade, que este algo deve ser bom — caso conduza a</p><p>um bom resultado. Isto é, um bom resultado serve como prova positiva do</p><p>valor moral pertencente ao comportamento que o produziu. Em relação ao</p><p>casal idoso, Gulley nota que eles estavam financeiramente atados; logo, a</p><p>vida a dois (como casal) os ajudava com as despesas. Além disso, ambos</p><p>eram “solitários” e precisavam de companheirismo.35</p><p>Essa estratégia funciona bem, é claro, pois qualquer um que insista que</p><p>o casal não deveria viver dessa forma parece insensível à situação</p><p>financeira dos dois e indiferente para com a solidão deles. Mais uma vez,</p><p>essa não é a perspectiva bíblica. Posso ser compassivo e compreensivo com</p><p>a situação deles, enquanto os ajudo a seguir o mandamento de Deus acerca</p><p>da prática sexual lícita. Não são decisões autoexcludentes.</p><p>Além disso, é dever do cristão desafiar a ideia corrosiva de que</p><p>dificuldades e sofrimentos justificam comportamentos pecaminosos. A</p><p>incapacidade de pagar o meu aluguel não me dá o direito de roubar um</p><p>banco, e tenho certeza de que o cidadão pós-moderno concordaria com essa</p><p>ideia. Porém, em essência, essa é a lógica que os progressistas usam para</p><p>tentar encobrir o pecado sexual.</p><p>Passo 4: Retrate Aqueles que se Levantam contra Certas Práticas</p><p>Sexuais como Pessoas Insensíveis e Cruéis</p><p>Toda boa história tem seu revés, uma nêmesis contra a qual torcer. Nessa</p><p>história do casal idoso, Gulley descreve o pastor da igreja que primeiro lhe</p><p>informou sobre a situação do casal. Ao invés daquela descrição terna,</p><p>positiva dada ao casal idoso, esse pastor recebe o tratamento contrário.</p><p>Ele, então, é caracterizado como “crítico”, “indevidamente</p><p>transtornado”, alguém que “categoricamente condena” os outros, ávido por</p><p>perpetrar seu “código sexual meticuloso”.36 Gulley até mesmo dá a</p><p>entender que o referido pastor é mesquinho, indisposto a ajudar</p><p>financeiramente o casal de idosos. De acordo com esse retrato</p><p>excessivamente simplista, o casal envolvido em pecado sexual deixa de ser</p><p>o problema. O problema é esse sujeito que traz à tona o problema!</p><p>Essa é a moralidade invertida da pós-modernidade (embora aplicada de</p><p>forma inconsistente). Quando convém à agenda progressista mais genérica</p><p>(por exemplo, assalto a banco, não pode; pecado sexual, sim, pode), a</p><p>balança se inverte e passa a pesar dois pesos, duas medidas.</p><p>O que falta, porém, ao argumento de Gulley é a ideia de que o pecado</p><p>prejudica as pessoas e de que esse pastor talvez estivesse genuinamente</p><p>preocupado com o prejuízo que o pecado sexual causa. Em outras palavras,</p><p>é possível — uma ideia chocante para muitos em nosso mundo pós-</p><p>moderno — ser verdade que confrontar o pecado é sinônimo de amor?</p><p>Passo 5: Insista que Jesus Está do seu Lado</p><p>O passo final na justificação do pecado sexual é ostentar o suposto apoio</p><p>de Jesus. Para tanto, Gulley dá vazão a clichês básicos, como o de Jesus ser</p><p>mais gracioso com pecadores do que com legalistas. O autor chega mesmo</p><p>a apelar (não que seja uma surpresa vê-lo fazendo isso) à história de Jesus</p><p>sendo ungido por uma mulher pecadora.37</p><p>Gulley, no entanto, não menciona que a mulher levou consigo os seus</p><p>pecados e ajoelhou-se aos pés de Jesus, não em rebeldia, mas arrependida!</p><p>Na verdade, Jesus relata àquela mulher que os pecados dela eram muitos,</p><p>mas que todos estavam perdoados (Lc 7.47). Sim, Jesus perdoa a pecadores.</p><p>Mas precisamos reconhecer e admitir que somos pecadores.</p><p>Em suma, o nono mandamento de Gulley é uma obra de arte da</p><p>esquerda cristã. Ele segue o manual clássico da justificação do pecado</p><p>sexual e, à primeira vista, pode soar convincente. Mas, no final das contas,</p><p>sua posição simplesmente não se sustenta. Não somos chamados a</p><p>transformar o amor e a prática sexual em conceitos antagônicos. Pelo</p><p>contrário, somos chamados a valorizar e estimar ambos. Como Paulo nos</p><p>lembra: “Ninguém despreze a tua mocidade; pelo contrário, torna-te padrão</p><p>dos fiéis, na palavra, no procedimento, no amor, na fé, na pureza” (1Tm</p><p>4.12).</p><p>CAPÍTULO 10</p><p>A Vida neste Mundo é mais Importante do</p><p>que a Vida no Mundo Vindouro</p><p>Chegamos, por fim, ao décimo e último “mandamento” do cristianismo</p>