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1 
 
Questões quanto ao gênero e seu debate atual1 
Matheus Negri2 
 
Depois de toda polêmica causada pela prova do ENEM, seja pela questão referente à 
Simone de Beauvoir ou ao tema da redação, violência contra mulher. Achei por bem 
apresentar não o pensamento de S. Beauvoir (para estudo sobre S. Beauvoir sugiro o texto de 
Gabriel Negri: A prazerosa dor da paixão: A convidada, Simone de Beauvoir.), mas explicar 
as questões referentes ao gênero. Pois até o momento me parece um tema caro para o 
movimento evangélico brasileiro, politizado ou não. Para tanto apresentarei o pensamento de 
duas filosofas feministas e um filósofo que abordam o tema, não tenho pretensão de fazer 
nenhum juízo de valor e nem de propor alguma resposta, mas sim clarear as ideias para um 
possível debate. 
Primeiramente devemos entender que não existe uma definição de gênero, ou melhor, 
uma explicação do que é gênero, mas sim temos referenciais teóricos que norteiam a questão 
em debate. Por precisarmos de uma definição mais clara podemos seguir J. Scott (1995) e 
dizer que “gênero é uma organização social, construída sobre a percepção das diferenças 
sexuais imbricadas a relações desiguais de poder”, assim podemos dizer que gênero, para esta 
autora, é a relação de poder entre os sexos. Seguindo assim a proposta de M. Foucault em O 
sujeito e o poder (1995) o qual considera os movimentos sociais das minorias como uma 
forma de oposição ao sistema estabelecido numa condição opressor/oprimido. E sugere que a 
questão do masculino e feminino não se funda no biológico e sim são construções culturais e 
estruturais que visam naturalizar o sujeito. 
Desta forma temos um duelo entre o determinismo biológico, os aspectos sociais 
dependem das características biológicas, e o construcionismo social, os aspectos culturais são 
construções históricas. Para exemplificar a questão L. Nicholson (2000) propôs a metáfora do 
cabide: pode-se colocar várias peças de roupa sobre um cabide, que seriam os aspectos 
socialmente construídos, mas o cabide continuaria sendo um cabide, as determinações 
biológicas. Assim temos uma dicotomia entre sexo e gênero, como sugere A. Senkevics 
(2015). A questão é se os aspectos biológicos são invariáveis, pois como afirmou Nicholson 
(2000) “se o próprio corpo é sempre visto através de uma interpretação social, então o ‘sexo’ 
não pode ser independente do ‘gênero’; antes, sexo nesse sentido deve ser algo que possa ser 
 
1 Texto publicado em NAPEC – Apologética Cristã, 28.10.2015. 
2 Mestrando em Teologia, Faculdade Batista do Paraná. Especialista em Ética pela PUC-PR. Coordenador de 
estágio e professor na Faculdade Fidelis. Professor e capelão no Colégio Erasto e pastor da Igreja Evangélica 
Menonita de Curitiba. 
2 
 
subsumido pelo gênero”. Sendo invariável ou não a questão neste ponto torna-se sobre a 
discussão do que é ‘humano’, sua identidade, ou melhor, como sugere M. Serres, de 
pertencimento. Passemos então as pensadoras e pensador. 
 
Gayle Rubin 
 
Vamos começar com G. Rubin (1949-), antropóloga norte-americana que em 1975 
escreveu um texto chamado Tráfico de mulheres: notas para uma economia política do sexo, 
e a partir dele tornou-se conhecida por seu conceito ‘sistema sexo/gênero’, que segundo M. 
Moschkovich (2012) ainda é fundamental para o estudo de gênero, e que para J. Butler (2003) 
é fundamental não só para a teoria feminista como também para a metodologia sobre o 
lesbianismo e os gays. O conceito ‘sistema sexo/gênero’ é uma dicotomia que pressupões uma 
matéria prima, o sexo, e o seu produto, o gênero. Que no caso de Rubin é a fêmea e o que o 
sistema social a torna: a mulher domesticada. 
Segundo a própria G. Rubin (2002) em entrevista dada a J. Butler afirmou que seu 
texto surgiu nos primórdios da segunda onda do feminismo, fim da década de 1960 e começo 
da de 1970, com o objetivo de tentar pensar e entender a opressão das mulheres. Este 
momento foi marcado, no ambiente político, pela New Left, que muito influenciou o 
movimento feminista e o de luta pelos direitos e a crítica ao imperialismo militarizado dos 
EUA. Porém a autora entende que o marxismo é insuficiente para entender a diferença de 
gênero e a opressão sofrida pelas mulheres, "Fui uma das muitas que finalmente concluíram 
que só podíamos avançar dentro de um paradigma marxista, que ele era útil, mas ao mesmo 
tempo tinha limitações no que diz respeito a gênero e sexo". 
As inspirações para seu texto se deram pelo vácuo produzido pelas tentativas 
simplórias marxistas para responder as questões correlatas ao gênero, ao curso que fez com 
M. Sahlins sobre a economia tribal, Estruturas Elementares do Parentesco de L. Strauss e o 
conceito de feminilidade em Freud e Lacan. Assim para Rubin, "o sistema sexo/gênero é um 
conjunto de arranjos através dos quais uma sociedade transforma a sexualidade biológica em 
produtos da atividade humana, e na qual estas necessidades sexuais transformadas são 
satisfeitas". De forma que a autora não encerra a questão de gênero, mas proporciona 
ferramentas para o debate entre a que se refere ao natural, o sexo, e a construção sócio-
histórica, o gênero. 
 
3 
 
Judith Butler 
 
Escolhi J. Butler (1956-), pois a autora além de ser muito badalada e referencial, 
propõe uma reconceituação do gênero, questiona a materialidade e coloca o corpo, sexo e 
desejo no campo discursivo. Butler é considerada continuadora do pensamento de M. 
Foucault e sua biopolítica e de centrar a materialidade dos corpos no pensamento filosófico. 
Segundo Rodrigues (2015), "Autora de uma obra marcada pela retomada da filosofia política 
numa situação em que o pensamento parecia esvaziado para enfrentar as acusações de 
impotência diante dos grandes desafios do complexo cenário da vida contemporânea, 
relativismo e niilismo moral". O pensamento de Butler é considerado como o paradigma da 
crítica à heteronormatividade, pois insere a tríade sexo/gênero/desejo como um sistema 
discursivo operador da diferença sexual, isto é, a inversão do conceito de ‘sistema 
sexo/gênero’ de Rubin não havendo esta dicotomia, ambos são construções sociais. 
Desta forma em Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade (2010), a 
autora propõe encerrar a lógica construída socialmente em que o sexo se restringe a 
reprodução e pertence à matriz heterossexual, incluindo o desejo e inscrevendo o sexo no 
campo do social. Assim para a autora, “O gênero não deve ser meramente concebido como a 
inscrição cultural de significado num sexo previamente dado […] tem de designar também o 
aparato mesmo de produção mediante o qual os próprios sexos são estabelecidos”. Isto se 
daria por meio de repetição de ações no sistema cultural, que para Butler é a 
performatividade. 
Performatividade para a autora seria "não só como algo que uma pessoa faz, mas 
também como algo encenado no coletivo. Eu pretendo demonstrar que meu trabalho sobre 
performatividade de gênero está ligado à política de precariedade [...] temos que pensar o 
lugar de corpos atuantes e de corpos movendo-se livremente dentro de uma democracia" 
(2015). Percebe-se que o conceito de gênero a partir da perfomatividade é um ato intencional 
e gerador de significados. 
A autora trabalha a performatividade a partir dos travestis e transexuais, visto que 
nestes a perfumasse torna-se a subversão da ordem estabelecida. Deve se ficar claro que esta 
autora não está ausente de críticas seja por movimentos religiosos ou filosóficos. Butler 
(2015) considera a crítica da Igreja Católica e a kantiana, as ações universalizáveis, como 
argumentos histéricos, "agimos dentro de nossa situação histórica. Até nossa capacidade de 
agir está historicamente condicionada e estruturada (não determinada!). Sinto que ainda não 
4 
 
alcançamos um conceito do universal que realmente inclua todas as populações que, comdireito, desejam ser representadas dentro de seus termos". 
 
Pierre Bourdieu 
 
Finalizarei com P. Bourdieu (1930-2002) devo destacar já de inicio que este autor não 
trabalhou propriamente a questão de gênero, mas contribui para a discussão do conceito e, 
segundo M. Setton (2010) a denuncia das distorções na produção da cultura e na sua difusão 
educacional. E de certa forma contrasta com J. Butler. Em seu livro Dominação Masculina 
(1995) sugere, com base em suas pesquisas etnográficas na cultura berbere da Argélia, que o 
feminino é construído contra e em relação ao masculino, isto é, sempre de maneira inferior. 
De forma que esta é uma construção de nosso inconsciente, uma sociedade antropocêntrica e 
perceptível em pleno século XXI. 
Dois conceitos chaves para a compreensão do pensamento de Bourdie são o habitus e 
a violência simbólica. M. Betti (2011) explica habitus como: "noção mediadora que analisa a 
maneira como as estruturas sociais são incorporadas pelos indivíduos na forma de disposições 
duráveis acerca de modos de agir, pensar e sentir, na forma de esquemas de percepção e 
apreciação. Explica como as estruturas sociais se tornam estruturas mentais/cognitivas, como 
a ordem social se reproduz objetiva e subjetivamente. É importante destacar que isso não 
significa que o habitus seja algo estático ou eterno; muito ao contrário, ele é socialmente 
forjado, está sempre em construção e é resultado de um exaustivo processo de inculcação e de 
incorporação, pois exige uma transformação duradoura dos corpos e das mentes dos 
indivíduos". E quanto à violência simbólica A. Senkevics (2012) explica que, "Por esse 
conceito, Bourdieu compreende o poder que impõe significações, impondo-as como legítimas, 
de forma a dissimular as relações de força que sustentam a própria força. [...] O que o 
sociólogo quis dizer com isso é justamente a manutenção de um poder que se mascara nas 
relações, que se infiltra no nosso pensamento e na nossa concepção de mundo". Contribuindo 
assim para o debate sobre o gênero, visto que como tentamos definir acima é a relação de 
poder entre o masculino e o feminino. 
Assim a dominação do masculino sobre o feminino, segundo o autor, é de uma 
violência simbólica e incorporada pela forma de habitus, isto é, com a afirmação da diferença 
biológica entre os sexos garante que a dominação se torne a-histórica e propagada por homens 
e mulheres nas próprias categorias do entendimento do mundo, sendo garantida pelos meios 
5 
 
de comunicação. De forma que para Bourdie (1995) “O corpo biológico socialmente 
modelado é um corpo politizado, ou se preferimos, uma política incorporada. Os princípios 
fundamentais da visão androcêntrica do mundo são naturalizados sob a forma de posições e 
disposições elementares do corpo que são percebidas como expressões naturais de tendências 
naturais”. 
 
Como vimos nestes três pensadores o conceito de gênero não é algo fechado e 
certamente passível de discussão e críticas. Seja a partir do ‘sistema sexo/gênero’ e as 
questões referentes à determinação biológica e o construtivismo social. Ou o tripé sexo, 
gênero e desejo e sua performatividade. E a dominação masculina como uma construção 
intricada no inconsciente social e garantida pelo habitus e violência simbólica. De forma que 
para uma possível construção teológica sobre a questão do gênero ou uma réplica as posições 
apresentadas se fazem necessário uma definição sólida do que é o ser humano, seu estatuto, 
sua construção e definição a luz das Sagradas Escrituras que possibilite um entendimento 
teológico e universalizável, relevante à crise contemporânea e ao alto índice de violência 
contra a mulher no Brasil, longe de anacronismos.

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