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DIREITO EMPRESARIAL - III RECUPERAÇÃO JUDICIAL, EXTRAJUDICIAL E FALÊNCIA. 7º Semestre Professor Esp. Fernando Henrique C. Peres dos Santos E-mail: fernando@institutoinvest.edu.br CRIMES FALIMENTARES Os crimes em espécie elencados no Capítulo VII da Lei nº. 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, são disposições de natureza penal que descrevem condutas empresariais consideradas criminosas no sistema jurídico brasileiro. Elas podem ocorrer antes ou durante a recuperação judicial ou extrajudicial homologada judicialmente, bem como depois da sentença de decretação de falência de uma empresa. A antiga lei que versava sobre a falência e seus processos no âmbito jurídico brasileiro, o Decreto-Lei nº. 7.661, de 21 de junho de 1945, trazia em si a expressão “crimes falimentares” para se referir aos delitos ocorridos antes, durante e depois dos trâmites falimentares. Essa expressão, porém, não se reproduziu na nova lei, tendo em vista que agora são denominados simples- mente como “crimes em espécie”. Contudo, utilizaremos a expressão “crimes falimentares” para fins didáticos, conforme a doutrina atual e jurisprudência preconizam acerca dessa temática. 2 Fernando Henrique (FH) - Crimes falimentares são condutas ilícitas que podem ser praticadas por empresários, sócios, administradores ou terceiros com relação a uma empresa que está em processo de falência, recuperação judicial ou extrajudicial. Essas condutas visam prejudicar os credores da empresa, fraudar o processo de recuperação ou falência, ou obter vantagens indevidas em prejuízo dos demais envolvidos no processo. Os crimes falimentares estão previstos na Lei nº 11.101/2005, que é a legislação que trata da recuperação judicial, extrajudicial e da falência de empresas no Brasil. Essa lei estabelece diversas condutas que podem configurar crimes, tais como fraudes na venda de bens da empresa, ocultação de ativos, destruição de documentos, prestação de informações falsas, entre outras. A prática de crimes falimentares pode resultar em sanções criminais, como multas e até mesmo prisão, além de outras penalidades previstas na legislação, como a inabilitação para o exercício de atividades empresariais. A finalidade da punição dos crimes falimentares é garantir a proteção dos interesses dos credores e a lisura do processo de falência ou recuperação judicial. Existem diversos crimes falimentares previstos na legislação brasileira, conforme já mencionado anteriormente. Dentre os principais crimes falimentares, podemos destacar os seguintes: Art. 168 - Praticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar a recuperação extrajudicial, ato fraudulento de que resulte ou possa resultar prejuízo aos credores, com o fim de obter ou assegurar vantagem indevida para si ou para outrem. Exemplo prático: um administrador de uma empresa em recuperação judicial oculta bens da massa falida, prejudicando os credores e obtendo vantagem indevida para si, caracterizando assim o crime falimentar previsto no artigo 168 da Lei 11.101/2005. Art. 169 - Violar, explorar ou divulgar, sem justa causa, sigilo empresarial ou dados confidenciais sobre operações ou serviços, contribuindo para a condução do devedor a estado de inviabilidade econômica ou financeira. Exemplo prático: um ex-funcionário de uma empresa em recuperação judicial divulga informações confidenciais sobre os negócios da empresa a seus concorrentes, contribuindo para a condução da empresa a um estado de inviabilidade econômica ou financeira, caracterizando assim o crime falimentar previsto no artigo 169 da Lei 11.101/2005. Art. 170 - Divulgar ou propalar, por qualquer meio, informação falsa sobre devedor em recuperação judicial, com o fim de levá-lo à falência ou de obter vantagem. Exemplo prático: um fornecedor de uma empresa em recuperação judicial espalha boatos falsos sobre a solvência da empresa, com o objetivo de pressionar a empresa a pagar sua dívida antes de outros credores e obter vantagem, caracterizando assim o crime falimentar previsto no artigo 170 da Lei 11.101/2005. Art. 171 - Sonegar ou omitir informações ou prestar informações falsas no processo de falência, de recuperação judicial ou de recuperação extrajudicial, com o fim de induzir a erro o juiz, o Ministério Público, os credores, a assembléia-geral de credores, o Comitê ou o administrador judicial. Exemplo prático: o administrador de uma empresa em recuperação judicial omite informações relevantes sobre as dívidas da empresa, induzindo o juiz e os credores a erro, caracterizando assim o crime falimentar previsto no artigo 171 da Lei 11.101/2005. Art. 172 - Praticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar plano de recuperação extrajudicial, ato de disposição ou oneração patrimonial ou gerador de obrigação, destinado a favorecer um ou mais credores em prejuízo dos demais. Exemplo prático: um devedor em processo de falência vende um imóvel de sua propriedade a um parente próximo por um valor muito abaixo do valor de mercado, prejudicando outros credores, caracterizando assim o crime falimentar previsto no artigo 172 da Lei 11.101/2005. Art. 173 - Apropriar-se, desviar ou ocultar bens pertencentes ao devedor sob recuperação judicial ou à massa falida, inclusive por meio da aquisição por interposta pessoa. Exemplo prático: um sócio de uma empresa em recuperação judicial transfere bens da empresa para seu próprio nome, ocultando-os da massa falida e prejudicando outros credores, caracterizando assim o crime falimentar previsto no artigo 173 da Lei 11.101/2005. Art. 174 - Adquirir, receber, usar, ilicitamente, bem que sabe pertencer à massa falida ou influir para que terceiro, de boa-fé, o adquira, receba ou use. Exemplo prático: uma pessoa adquire um bem de uma empresa em processo de falência por um valor muito abaixo do valor de mercado, sabendo que o bem pertence à massa falida, caracterizando assim o crime falimentar previsto no artigo 174 da Lei 11.101/2005. Art. 175 - Apresentar, em falência, recuperação judicial ou recuperação extrajudicial, relação de créditos, habilitação de créditos ou reclamação falsas, ou juntar a elas título falso ou simulado. Exemplo prático: um credor apresenta uma relação de créditos falsa em um processo de recuperação judicial, com o objetivo de receber um valor maior do que o devido, caracterizando assim o crime falimentar previsto no artigo 175 da Lei 11.101/2005. Art. 176 - Exercer atividade para a qual foi inabilitado ou incapacitado por decisão judicial, nos termos desta Lei. Exemplo prático: um empresário que teve sua empresa declarada falida e foi inabilitado pela justiça para exercer atividades empresariais, continua a atuar como empresário em outra empresa, caracterizando assim o crime falimentar previsto no artigo 176 da Lei 11.101/2005. Art. 177 - Adquirir bens de massa falida ou de devedor em recuperação judicial quando tenham atuado nos respectivos processos. Exemplo prático: um administrador judicial de uma empresa em recuperação judicial adquire bens da empresa a um preço abaixo do mercado, caracterizando assim o crime falimentar previsto no artigo 177 da Lei 11.101/2005. Art. 178 - Deixar de elaborar, escriturar ou autenticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar o plano de recuperação extrajudicial, os documentos de escrituração contábil obrigatórios. Exemplo prático: o administrador de uma empresa em processo de falência deixa de elaborar os documentos de escrituração contábil obrigatórios, prejudicando a avaliação da situação financeira da empresa, caracterizando assim o crime falimentar previsto no artigo 178 da Lei 11.101/2005. Os crimes falimentares estão dispostos fora do Código Penal, uma vez que são crimes especiais, isto é, crimes que, devido às circunstâncias, merecem tratamento jurídico específico. Conforme entende o jurista Fazzio Júnior (2016), a ação penal falimentarse desenvolve na sua sede mais adequada, qual seja, o juízo criminal, e não perante o juízo da falência e, por isso, o estudo pela ótica da lei analisada oferece um resumo informativo das instruções acerca do direito penal falimentar, e não crítico e profundo, como os realizados por meio da perspectiva criminalista. Nesse sentido, Pitombo (2010, p. 233–234) preconiza que: O devido processo legal impunha que as ações penais fossem julgadas por magistrado com neutralidade e interdependência, o qual não estivesse em contato com o processo falimentar ou de recuperação. No caso da lei atual esse aspecto se acentua, na medida que várias infrações penais se destinam à tutela do próprio processo falimentar, protegendo a administração da justiça. Seria um absurdo deixar que o acusado de prestar informações falsas no processo de falência, com o fim de induzir a erro o juiz (art. 171 da Lei 11.101/2005), viesse a ser julgado pelo mesmo juiz que se sentiu enganado. Por outro lado, Fazzio Júnior (2005, p. 306) pontua, de acordo com seu entendimento, críticas ao fato da legislação falimentar conter matéria penal. Acompanhe: Uma lei que orienta o regime de insolvência não deveria, seja por razões formais, seja porque ingredientes da procrastinação do processo falimentar, conter matéria penal. São poucos os crimes genuinamente falimentares, senão delitos comuns praticados antes e durante o processo de quebra. Assim, o estelionato falimentar não deixa de ser estelionato, integrando a LRE pelo fato de causar prejuízo aos credores da massa falida. Da mesma forma, a apropriação indébita (art. 173) e a receptação (art. 174), forçadamente adaptadas na LRE, produzindo diversos inconvenientes na sua interpretação, o que, logicamente, implicará múltiplas dificuldades no modo de tipificá-las. Nos crimes falimentares, em regra, o sujeito ativo é o devedor, enquanto o sujeito passivo é o credor. Tratam-se de crimes, em sua maioria, monossubjetivos, isto é, cometidos por apenas uma pessoa, mas reconhecem a participação de terceiros em coautoria, desde que tenham vínculo com a empresa em recuperação judicial ou extrajudicial ou com o processo da falência. Nos processos resultantes de crimes falimentares, é comum observar que o réu comete mais de uma atividade criminosa tipificada em lei, porém, ele não deve ser penalizado diversas vezes sobre os atos cometidos, tendo em vista o princípio da unidade, adotado pela doutrina e pela jurisprudência brasileira. 11 Nesse sentido, Coelho (2003) preconiza que a unidade é a característica fundamental do crime falimentar, isto é, mesmo que o sujeito ativo cometa mais de um comportamento delitual, aplica-se somente a pena do crime mais grave, impedindo-se, assim, a aplicação de dupla sanção privativa de liberdade, mesmo que vários tipos de pena tenham sido praticados para a execução da fraude. A conceituação de crimes falimentares, bem como a definição do bem jurídico tutelado, não é de entendimento pacificado entre os doutrinadores. Conforme Fazzio Júnior (2016) destaca, embora reine intensa discordância quanto à objetividade jurídica tutelada na estipulação das modalidades delituosas da Lei de Falências, os delitos falimentares ofendem diretamente o patrimônio em crise, bem como a administração da justiça, a propriedade, a fé pública e o crédito. Por isso, o autor qualifica esses crimes como plurissubjetivos, posto que, geralmente, um delito falimentar agride, simultaneamente, diversos bens juridicamente relevantes. Para Pereira (2010), no entanto, devem ser levados em consideração cinco aspectos quanto à classificação e entendimento acerca da objetividade jurídica. De acordo com o doutrinador, os crimes falimentares podem ser os seguintes: 1 - Crimes falimentares patrimoniais: esse tipo de crime falimentar envolve a prática de condutas que afetam o patrimônio do devedor e a garantia dos direitos dos credores. Um exemplo é a ocultação de bens da empresa falida para não serem utilizados para pagamento das dívidas. 2 - Crimes falimentares contra a administração pública: esse tipo de crime falimentar envolve a prática de condutas que afetam a ordem jurídica ou a administração da justiça durante o processo de falência ou recuperação judicial da empresa. Um exemplo é o suborno de um juiz para obter vantagens no processo de falência. 3 - Crimes falimentares contra a fé pública: esse tipo de crime falimentar envolve a prática de condutas que afetam a credibilidade ou a boa-fé das relações de comércio durante o processo de falência ou recuperação judicial da empresa. Um exemplo é a falsificação de documentos para se obter vantagens no processo de falência. 4 - Crimes falimentares contra a economia popular: esse tipo de crime falimentar envolve a prática de condutas que afetam a economia popular, prejudicando a população em geral que depende da atividade econômica da empresa em falência ou recuperação judicial. Um exemplo é a venda de produtos ou serviços sem a devida autorização durante o processo de falência ou recuperação judicial da empresa. 5 - Crimes falimentares contra o comércio: esse tipo de crime falimentar envolve a prática de condutas que afetam o comércio ou o mercado durante o processo de falência ou recuperação judicial da empresa. Um exemplo é a celebração de contratos lesivos aos credores durante o processo de falência ou recuperação judicial da empresa. Pode-se inferir que as disposições penais da Lei de Falências almejam evitar possíveis fraudes antes, durante e depois dos processos de falência e de recuperação das sociedades, mas também viabilizam um procedimento correto, para que a probidade e a boa-fé sejam alcançadas. Nesse sentido, o jurista Denis Pestana (2007) dispõe que as figuras penais contidas na lei falimentar não constituem formas de incriminar apenas a condição de devedor e as relações empresariais, mas sim todo o complexo de atos indevidos referentes à atividade do empresário declarado falido, em vista da criação de um estado que o levou à insolvência, ou seja, em débito com suas obrigações. Por fim, salienta-se que a maioria dos crimes falimentares admite a forma de tentativa. EXEMPLO Imagine que um devedor em recuperação judicial, percebendo ser inevitável sua quebra financeira e econômica, começa a desviar os bens que pertencem à empresa, porém não obtém sucesso na conduta, pois o administrador judicial impede o transporte da mercadoria. Outro exemplo é quando um administrador judicial tenta prestar informações falsas durante o processo de falência para obter vantagens indevidas, mas é descoberto antes de consumar o delito. Em ambos os casos, mesmo que a conduta não tenha sido consumada, o agente pode ser responsabilizado criminalmente pela tentativa de crime falimentar. Aqui, a consumação do crime, mesmo em sua forma tentada, aconteceu de fato. SANÇÕES PENAIS APLICADAS AOS CRIMES FALIMENTARES A Lei nº. 11.101/2005 adotou uma posição rígida na tipificação e sanção dos crimes falimentares decorrentes do descumprimento de regras legais e boas práticas de atividades empresariais. A legislação analisada prevê, para os crimes falimentares nela estabelecidos, penas privativas de liberdade, penas restritivas de direito e penas de multa. O Código Penal, em seu art. 32, determina os tipos de sanções penais admitidos no sistema jurídico brasileiro. Veja o dispositivo a seguir: “Art. 32 – As penas são: I - privativas de liberdade; II - restritivas de direitos; III - de multa”. As penas privativas de liberdade, que se formalizam nos institutos da reclusão e da detenção, constringem o direito de ir e vir, recolhendo o condenado em estabelecimento prisional. Conforme elucida o caput do art. 33 do Código Penal, a reclusão é a pena aplicada em condenações mais graves, devendo ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto, enquanto que a pena de detenção é aplicada nas condenações mais leves, em regime aberto ou semiaberto, exceto em casa de transferência de condenado para regime fechado. As penas restritivasde direitos, de acordo com o art. 43 do Código Penal, traduzem-se em prestação pecuniária, perda de bens e valores, prestação de serviços comunitários, limitação de fim de semana, prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas, interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana. Para os crimes falimentares tutelados pela lei em estudo, as penas empregadas serão de reclusão e detenção, todos acrescidos de multa. Além disso, a todos esses crimes incumbe-se a pena de reclusão, exceto para o último crime previsto no dispositivo em estudo, qual seja, o de omissão dos documentos contábeis obrigatórios, tutelado pelo art. 178, o qual tem pena de detenção. A fraude a credores, estabelecida no art. 168, é o crime com a pena mais grave, que é a de reclusão, e pode ir até seis anos, além de multa pecuniária. Essa pena pode ser majorada ainda mais de acordo com a natureza e condução dos delitos fraudulentos. Por outro lado, a pena mais branda é aplicada ao crime de omissão de documentos contábeis obrigatórios, que, conforme já falamos, tem pena de detenção, podendo chegar a dois anos, além de multa. O parágrafo quarto do art. 168 determina uma única hipótese de diminuição da pena para os crimes tutelados na legislação em tela. Trata-se do crime de fraude contra credores, quando praticado por microempresa ou pequena empresa em recuperação ou falência. Nesse caso, a pena de reclusão pode ser diminuída de um a dois terços ou ser substituída pela pena restritiva de direitos (como a prestação de serviços à comunidade ou entidade pública), desde que se constate que as condutas fraudulentas não eram habituais. Nesse sentido, Nostre (2007, p. 556) pontua o seguinte: Em primeiro lugar, somente se permite uma menor reprovação criminal nos casos das condutas típicas terem sido realizadas no âmbito de microempresa e de empresa de pequeno porte, definidas conforme legislação própria. Em segundo, o falido não pode ter praticado condutas fraudulentas habitualmente durante a vida da empresa, vale dizer, a prática de atos eivados de fraude não pode ter sido reiterada. Habitual é o que se repete com frequência, o que se realiza de forma contumaz, repetidamente. A sentença que decreta a falência, concede a recuperação judicial ou homologa a recuperação extrajudicial é condição objetiva de punibilidade das infrações penais falimentares, conforme aponta o art. 180 da legislação analisada. Isso significa que a sentença é a condição para a punição dos atos e fatos fraudulentos dispostos na Lei nº. 11.101/2005, isto é, ela é necessária para que a punição aconteça. 21 Os efeitos da condenação por crime falimentar estão descritos no art. 181. Atente ao teor do artigo: Art. 181. São efeitos da condenação por crime previsto nesta Lei: I – a inabilitação para o exercício de atividade empresarial; II – o impedimento para o exercício de cargo ou função em conselho de administração, diretoria ou gerência das sociedades sujeitas a esta Lei; III – a impossibilidade de gerir empresa por mandato ou por gestão de negócio. § 1º Os efeitos de que trata este artigo não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença, e perdurarão até 5 (cinco) anos após a extinção da punibilidade, podendo, contudo, cessar antes pela reabilitação penal. § 2º Transitada em julgado a sentença penal condenatória, será notificado o Registro Público de Empresas para que tome as medidas necessárias para impedir novo registro em nome dos inabilitados (BRASIL, 2005, documento on-line). Assim sendo, conforme a lei falimentar explica, a partir da sentença que condena o empresário por crime falimentar, geram-se efeitos legais secundários extrapenais, os quais não podem ser ignorados. O empresário, desde então, torna-se inabilitado para exercer a atividade empresarial, além de ficar impedido para o exercício de cargo ou função em conselho de administração, diretoria ou gerência das sociedades sujeitas à Lei de Falências, bem como adquire a impossibilidade de gerir empresa por mandato ou por gestão de negócio. Tais efeitos não são aplicados automaticamente ao condenado, uma vez que, para eles terem eficácia de fato, o Juiz deve declarar e fundamentar os impedimentos na sentença. Eles também não são, necessariamente, cumulativos. Os efeitos da condenação por crime falimentar duram cinco anos, podendo ser cessados antes por meio do instituto da reabilitação penal. As regras sobre a prescrição dos crimes falimentares, conforme determina o art. 182 da Lei de Falências, estão contidas nas disposições sobre o assunto no Código Penal. Assim sendo, a prescrição começa a ser contada a partir do dia da decretação da falência, da concessão da recuperação judicial ou da homologação do plano de recuperação extrajudicial. Deve-se salientar que a decretação da falência do devedor interrompe a prescrição quando a contagem iniciou com a concessão da recuperação judicial ou com a homologação da recuperação extrajudicial. Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal (STF) já havia editado a Súmula nº. 147, a qual estabelece que a prescrição de crime falimentar começa a correr da data em que deveria estar encerrada a falência ou do trânsito em julgado da sentença que a encerrar ou que julgar cumprida a concordata. 24 A reabilitação do empresário condenado pode ocorrer tanto na esfera civil quanto na penal. Trata-se de declaração judicial do cumprimento ou extinção da pena. Ela se dará no âmbito civil quando o Juiz da falência proferir sentença, declarando extintas as obrigações do falido, não existindo crimes falimentares. A reabilitação civil segue o que preconiza a lei falimentar, em seu art. 158, o qual determina que as obrigações do falido se extinguem nas seguintes situações: No pagamento de todos os créditos: Quando o falido quita integralmente todas as suas dívidas, suas obrigações são extintas. Nesse caso, todos os credores recebem seus créditos e o falido é considerado reabilitado. No pagamento de mais de 50% dos créditos quirografários: Quando o falido paga mais de 50% dos créditos quirografários, ou seja, aqueles que não possuem garantias reais, suas obrigações são extintas. Nesse caso, os credores quirografários recebem uma parte de seus créditos e o falido é considerado parcialmente reabilitado. Decorridos 5 anos do encerramento da falência: Se o falido não foi condenado por prática de crime previsto na Lei de Falências durante esse período, suas obrigações são extintas. Nesse caso, o falido não pagou todas as suas dívidas, mas não cometeu crimes falimentares e por isso é considerado reabilitado. Decorridos 10 anos do encerramento da falência: Se o falido foi condenado por prática de crime falimentar e passados 10 anos do encerramento da falência sem novas condenações, suas obrigações são extintas. Nesse caso, o falido cometeu crime falimentar, mas já cumpriu a pena e passado o prazo de 10 anos é considerado reabilitado. Um exemplo prático de reabilitação civil é quando um empresário solicita a falência de sua empresa e após o processo de falência, paga integralmente todas as suas dívidas. Nesse caso, suas obrigações são extintas e ele é considerado reabilitado. Outro exemplo é quando um empresário solicita a falência de sua empresa e após o processo de falência, paga mais de 50% dos créditos quirografários. Nesse caso, suas obrigações são extintas parcialmente e ele é considerado parcialmente reabilitado. Também é possível que um empresário solicite a falência de sua empresa, não cometa crimes falimentares e decorridos 5 anos do encerramento da falência, tenha suas obrigações extintas e seja considerado reabilitado. Por fim, um empresário que cometeu crime falimentar, cumpriu a pena correspondente e passados 10 anos do encerramento da falência, não teve novas condenações, pode ter suas obrigações extintas e ser considerado reabilitado. ESPÉCIE DE CRIMES FALIMENTARES De acordo com os estudos sobre as disposições penais da Lei nº. 11.101/2005, existem quatro espécies de crimesfalimentares, quais sejam: 1 - Crimes falimentares próprios: são aqueles que somente podem ser praticados pelo empresário ou sociedade empresária que se encontram em estado de falência ou de recuperação judicial. São exemplos de crimes falimentares próprios: a fraude na realização do ativo, a fraude contra credores e a concussão. 2 - Crimes falimentares impróprios: são aqueles que podem ser praticados por qualquer pessoa, independentemente de estar em estado de falência ou recuperação judicial. São exemplos de crimes falimentares impróprios: a denunciação caluniosa, a falsidade ideológica e a extorsão. 3 - Crimes falimentares pré-falimentares: são aqueles que ocorrem antes da decretação da falência ou da recuperação judicial, mas que têm impacto no processo de falência ou recuperação judicial. São exemplos de crimes falimentares pré-falimentares: a ocultação de bens, a alienação fraudulenta de bens e a simulação de dívidas. 4 - Crimes falimentares pós-falimentares: são aqueles que ocorrem depois da decretação da falência ou da recuperação judicial, mas que têm impacto no processo de falência ou recuperação judicial. São exemplos de crimes falimentares pós-falimentares: a fraude na administração da massa falida, a desobediência às ordens do juiz e a apropriação indébita de valores da massa falida. Os crimes falimentares podem ser classificados, no que diz respeito ao agente praticante da conduta tipificada, em próprios ou impróprios. Fazzio Júnior (2016) considera crimes próprios aqueles realizados pelo próprio empresário individual devedor, equiparando-se a ele, na medida de sua culpabilidade, seus sócios, administradores, conselheiros e administrador judicial. Usualmente, segundo o autor, são crimes cometidos pelo falido até que se promova a arrecadação do ativo. Por outro lado, os crimes impróprios são aqueles executados por pessoas terceiras relacionadas à falência. A Lei de Falências, em seu art. 177, arrola tais pessoas, que podem ser o Juiz, o representante do Ministério Público (MP), o administrador judicial, o gestor judicial, o perito, o avaliador, o escrivão, o oficial de justiça ou o leiloeiro, por si próprios ou mediante interposição de terceiros. Nesse sentido, Freitas (2005) ensina que esses crimes são aqueles que a lei não exige uma condição especial do agente, são sujeitos que entraram em alguma especulação de lucro enquanto estavam atuando nos respectivos processos. No que diz respeito ao tempo da prática do crime, os delitos falimentares podem ser pré-falimentares ou pós-falimentares. Os crimes pré-falimentares são aqueles cometidos anteriormente à falência da empresa ou então durante a fase de recuperação, seja ela judicial, seja extrajudicial homologada judicialmente. A sentença, nesse caso, funcionará como condição de punibilidade penal. Freitas (2005) afirma que o falido é o sujeito ativo principal dos crimes pré-falimentares, sendo estes, em sua maioria, crimes monossubjetivos, como no caso da fraude a credores (art. 168). Contudo, uma terceira pessoa, podendo esta ser o contador, o credor, o técnico contábil etc., poderá atuar em conluio no crime, desde que possuam algum tipo de vínculo com a empresa em recuperação ou em falência. Os crimes pós-falimentares, por sua vez, são aqueles praticados depois da decretação da falência ou da concessão da recuperação judicial ou homologada judicialmente. Aqui, a sentença funciona como elemento constitutivo do crime realizado. De acordo com Freitas (2005), nos crimes pós falimentares, em regra, figuram pessoas que atuaram direta ou indiretamente no processo judicial, como o Juiz, o administrador judicial, o leiloeiro etc. Do mesmo modo, esses crimes, em sua maior parte, são monossubjetivos, e terceiros podem concorrer em autoria, por exemplo, se o administrador judicial adquirir bens da massa falida por meio de uma interposta pessoa — os dois irão responder, em concurso, pelo crime de violação de impedimento (art. 177). A doutrina, também classifica os crimes falimentares em relação ao seu resultado ou efeito, podendo ser de dano ou de perigo. Crimes de dano são aqueles que geram perda, prejuízo, diminuição de um bem, exigindo-se uma efetiva lesão ao mesmo. Já os crimes de perigo são aqueles que podem gerar dano, perda ou diminuição do bem, bastando aqui a possibilidade do dano para a sua consumação. Para os crimes falimentares de perigo, como o de fraude contra credores (art.168), não é necessário demonstrar o efetivo prejuízo que a fraude acarretou aos credores. Capez (2001) citado por Freitas (2005) subdivide os crimes de perigo em concreto e abstrato. O crime de perigo concreto se dá quando a realização do delito exige a existência de uma situação de efetivo perigo, demonstrado caso a caso, como, por exemplo, no caso da fraude contra credores (art. 168) e na aquisição, recebimento ou uso ilegal de bens (art. 174). Já o crime de perigo abstrato é aquele no qual a situação de perigo é presumida, como no caso da contabilidade paralela (art. 168, §2º), violação de sigilo empresarial (art.169) e divulgação de informações falsas (art. 170). Fazzio Júnior (2016), por sua vez, chama esse crime de “crime de perigo presumido” e explica que ele ocorre quando a lei reconhece em abstrato determinada ação ou omissão. 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