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► ■ O princípio crosscheck norteia a avaliação audiológica infantil1, ou seja, o resultado de um teste deve ser aceito após ser confirmado por outro independente. Neste contexto, em nosso serviço determinamos um protocolo para avaliação de crianças na idade de 0 a 1 ano que compreende métodos comportamentais, eletroacústicos e eletrofisiológicos, que a princípio, permitem constatar a funcionalidade normal das estruturas do sistema auditivo, envolvendo cóclea, nervo auditivo e tronco encefálico. Por outro lado, a detecção de alteração em um dos procedimentos que compõe este protocolo determina a necessidade de procedimentos complementares a fim de definir o diagnóstico audiológico quanto à existência de perda auditiva, caracterizandoa quanto ao tipo e grau, informações necessárias para uma adequada indicação e adaptação do aparelho de amplificação sonora individual – AASI (Quadro 51.1). Frente à obtenção de potencial evocado auditivo de tronco encefálico (PEATE) clique alterado, com ausência de sincronia neural ou com limiar eletrofisiológico rebaixado ou ausente confirmando a perda auditiva, procedimentos complementares devem ser realizados para a definição do diagnóstico audiológico com precisão, entre os quais, emissões otoacústicas evocadas produto de distorção, PEATE por condução óssea, PEATE com frequência específica e/ou potencial evocado auditivo de estado estável (PEAEE). Importante ressaltar que, a caracterização da perda auditiva quanto ao tipo e grau com especificidade de frequência é de fundamental importância para uma adequada indicação e adaptação do aparelho de amplificação sonora individual e/ou implante coclear. Quadro 51.1 Protocolo de avaliação audiológica infantil (0 a 1 ano). Protocolo de avaliação audiológica Princípio cross-check Entrevista fonoaudiológica Otoscopia Medida da imitância acústica (timpanometria e re᠀�exo acústico) Emissões otoacústicas evocadas transientes (EOE-t) Avaliação do comportamento auditivo Audiometria com reforço visual Potencial evocado auditivo de tronco encefálico – clique Realizado para con�rmar a alteração em quaisquer dos procedimentos do protocolo proposto Protocolo de avaliação audiológica A entrevista fonoaudiológica, primeiro procedimento a ser realizado, permitirá que o profissional compreenda melhor a dinâmica familiar, assim como obtenha informações sobre gestação e parto, sobre o desenvolvimento geral da criança e seu comportamento auditivo, informações estas que irão auxiliar na análise dos resultados obtidos nos procedimentos aplicados, assim como na orientação à família ao final do processo de diagnóstico. Métodos comportamentais Na nossa prática clínica, realizase a avaliação do comportamento auditivo baseada nas técnicas propostas por Ewing e Ewing e McCormick, com inúmeras adaptações2,3. A realização do teste com os seis sons de Ling apresentados à viva voz permite verificar se a criança está detectando a fala com uma varredura de um espectro amplo de frequência de 250 a 4.000 Hz (Quadro 51.2). A avaliação do comportamento auditivo não requer equipamentos específicos para sua realização, mas exige um amplo domínio do examinador para observar o comportamento da criança esperado para cada faixa etária. Inicialmente, está sendo avaliada a habilidade de detecção, porém é importante ressaltar que a presença de resposta não descarta a perda auditiva leve ou unilateral, apesar de que nesta última, o comportamento da criança pode apresentar indícios em uma análise qualitativa da resposta, como por exemplo, virar sempre para um lado independente da orelha que o som está sendo apresentado. Quadro 51.2 Sons de Ling utilizados para observação comportamental. Fonema Frequência (Hz) /u/ 275 /m/ 250 /a/ 1.000 /ch/ 2.500 /i/ 3.000 /s/ 6.000 Outro aspecto que pode ser avaliado é o desenvolvimento da função auditiva e consequentemente a maturação do sistema nervoso auditivo central4. Para tanto, se avalia a habilidade auditiva de localização por meio da apresentação de um som instrumental em ambas as orelhas de maneira alternada, no caso, por exemplo, o guizo, utilizando como referência para análise do comportamento o proposto por Azevedo et al. para crianças de baixo e alto risco para deficiência auditiva5. Caso a criança apresente outro comportamento em vez de localização, como sorrir, atenção, entre outros, demonstra que a criança detectou o som, mas pode sugerir um atraso no desenvolvimento da função auditiva. Complementarmente, o reflexo cocleopalpebral é pesquisado frente a um som instrumental de forte intensidade como agogô ou tambor, em torno de 90 dBNPS6. Nossa experiência demonstra que o reflexo cocleopalpebral pode estar ausente mesmo quando não há alteração auditiva, assim o resultado desta pesquisa deve ser sempre analisado cuidadosamente dentro do contexto da avaliação audiológica, para não supervalorizar este achado. Por outro lado, sua ocorrência demonstra que a criança teve a sensação do som, e que é pouco provável a presença de deficiência auditiva sensorial de grau profundo bilateral. A audiometria de observação comportamental, em inglês behavioral observation audiometry (BOA) é pouco confiável para determinar limiares auditivos, principalmente em neonatos e crianças nos primeiros meses de vida7. Assim, a determinação do limiar auditivo só é possível a partir de 56 meses, utilizando a técnica de condicionamento operante. A visual reinforcement audiometry (VRA) deve ser sempre realizada em crianças a partir de seis meses de idade, na qual o comportamento condicionado é o reflexo de orientação, ou seja, virar a cabeça em direção ao som. Este comportamento auditivo é reforçado por meio de estímulos visuais, como a luz, desenhos animados apresentados na TV ou brinquedos mecânicos que se movimentam, para que não haja habituação da resposta e a mesma ocorra por mais vezes e em fracas intensidades8 nas frequências testadas de 0,5 a 4 kHz. O VRA pode ser realizado em crianças com atraso no desenvolvimento mental, desde que sua função mental equivalha à idade de 56 meses de idade9,10; e também em prematuros, desde que a idade corrigida corresponda a 810 meses ou mais11. Os valores médios dos níveis mínimos de resposta para o VRA realizado com fone de inserção são 16,4 dBNA; 13,3 dBNA; 7,1 dBNA e 6,4 dBNA para 0,5 kHz; 1 kHz; 2 kHz e 4 kHz, respectivamente12. Na idade inferior a um ano, os testes linguísticos que avaliam a percepção auditiva da fala são escassos e fornecem poucas informações. Durante o VRA é determinado o limiar de detecção da fala (LDF), que por vezes fornece informações mais precisas que a resposta observada para o estímulo warble tone ou ruído de faixa estreita. Crianças normais, entre seis e 13 meses de idade, apresentam níveis de detecção da voz em 30 a 35 dBNA5. Ainda nesta faixa etária, o reconhecimento de comandos verbais encontrase em uma fase inicial, como por exemplo a palavra “não”, ordens simples como “dá tchau”, “joga beijo” e “bate palma”5. ■ ■ ■ Medida da imitância acústica Devido à alta ocorrência de otite média serosa (OMS) nesta faixa etária13, a timpanometria é fundamental no protocolo, pois a alteração de orelha média, quando presente, dificulta a interpretação dos resultados dos demais procedimentos que compõem a avaliação e, consequentemente, a distinção entre a deficiência condutiva e sensorioneural. Na literatura tem sido descrito que a sonda de 226 Hz, comum na prática clínica, deve ser utilizada em crianças a partir de sete meses, sendo que em idade inferior recomendase o uso da sonda de 600 ou 1.000 Hz14. Com as sondas de frequências mais agudas na criança, caracteristicamente podem ser obtidos– palavras de incentivo, aplausos, sorrisos, gestos podem ajudar a criança a se manter motivada a continuar trabalhando Selecionar brinquedos ou atividades lúdicas que sejam do interesse da criança e que sejam adequados ao seu desenvolvimento neuropsicomotor. ► Medidas de avaliação da percepção da fala. A logoaudiometria pode ser uma ferramenta muito valiosa em uma bateria de testes audiológicos infantis, especialmente quando usada para monitorar ou avaliar a função auditiva da criança. Avaliar as habilidades de percepção da fala pode ser de grande ajuda na determinação do tipo de dificuldade auditiva que uma criança pode estar sofrendo. Algumas questões são importantes para a aplicação deste procedimento em crianças12: Seleção do vocabulário – deve ser adequado ao nível de competência linguística e ao nível de desenvolvimento cognitivo da criança. A maioria dos procedimentos utiliza figuras para avaliar a habilidade de reconhecer e discriminar a fala em crianças, o que traz, segundo Jerger18, alguns problemas, como a restrição do vocabulário no momento da seleção do material de teste e a limitação das possibilidades de resposta (conjunto fechado) (Quadro 52.3). Avaliação da competência de linguagem da criança – durante a entrevista com os pais/responsáveis pela criança, interagindo com ela, utilizar algumas situações de linguagem que permitam conhecer nível de competência linguística. Por exemplo, ordens simples, perguntas com respostas simples: sim ou não e/ou com respostas elaboradas: decidir entre uma coisa e outra, onde?, quando?, como?, por quê? Quadro 52.3 Resumo de tipo de medida, material de teste, formato de resposta e tipo de reforço a ser oferecido de acordo com a idade cognitiva da criança avaliada. Idade cognitiva Tipo de medida Estímulo-teste Resposta Tipo de reforço ≥ 10 anos LRF convencional Trissílabos Verbal Verbal 5 a 10 anos LRF convencional Trissílabos Verbal Verbal 30 meses a 6 anos LRF modi�cado Palavras adaptadas para a criança Apontar �gura ou objeto Social, visual, tátil Menor que 3 anos LAF Repetição de sílabas, chamar o nome, cantar Condicionada Lúdico, visual, social, tátil • • ► Limitada LAF Repetição de sílabas, chamar nome, cantar Não condicionada Nenhum LRF = limiar de reconhecimento de fala; LAF = limiar de atenção para a fala. Tipo de resposta que será solicitada – dependendo da criança que está sendo avaliada, o formato da resposta pode ser modificado. Existem situações em que a criança é muito inibida para falar, outras em que a criança apresenta problemas de articulação que podem comprometer a interpretação dos resultados. A criança pode ser solicitada a responder apontando figuras, repetindo a palavra apresentada ou executando uma tarefa/ordem Utilização de reforço – a utilização de reforço social, acompanhando o reforço positivo que foi escolhido ao longo da avaliação com frequência específica, ajuda a manter a criança motivada a realizar o exame. É preciso lembrar que os resultados podem ser muito mais um reflexo do interesse e da motivação da criança do que a real indicação de suas habilidades de discriminar a fala a partir da suas habilidades auditivas. ► Medida da função da orelha média. A avaliação da função da orelha média é um componente fundamental da bateria de testes audiológicos, especialmente na população pediátrica. Entretanto, alguns cuidados devem ser tomados ao se interpretarem os resultados obtidos, e questões relacionadas às diferenças anatômicas entre o sistema condutivo da criança e o adulto precisam ser consideradas. Quanto menor a criança, mais essa questão se torna importante, e estudos mostram que o volume da orelha média, o posicionamento da membrana timpânica e o desenvolvimento do meato acústico externo são bastante diferentes em crianças pequenas quando comparados com os valores de um adulto. Realizar a inspeção do meato acústico externo antes de iniciar os procedimentos de medida da função da orelha média é fundamental; crianças inserem corpos estranhos (pontas de lápis, pontas de caneta, grão de feijão, de pipoca ou de milho) na abertura do meato acústico externo (MAE) a todo momento. Muitas vezes, essa situação ocorre de uma hora para outra. A inserção da oliva pode ser a causa de uma lesão na pele do MAE se dentro dele já houver algum corpo estranho. Explicar para a criança, de forma lúdica, o que vai ser feito, como será feito, pode ajudála a se sentir menos ansiosa e a colaborar com o examinador. A inserção da oliva na entrada do MAE, quando apresentada de forma contextualizada, dentro de uma história, de uma brincadeira, com certeza facilita nossa tarefa. Após a obtenção das medidas timpanométricas e do reflexo acústico do músculo estapédio, é importante basearse nos valores de normalidade propostos para crianças: 0,3 a 1,05 cc para crianças nas medidas timpanométricas e de complacência estática; pico de complacência entre –100 e +50 daPa, ao analisar os resultados obtidos. Estudos sobre as medidas de absorvância de banda larga podem, no futuro, trazer novas possibilidades de melhorar a confiabilidade e a validade das medidas da orelha média. Em recentes publicações sobre pesquisas realizadas em neonatos, bebês entre 0 e 6 meses e em crianças pequenas, todos os autores mostram que o desenvolvimento morfológico da orelha média afeta os resultados do exame. Esses autores reforçam a necessidade de mais estudos nesta população1921. ► Interpretação de resultados. Após a coleta de informações o examinador deve redigir um relatório no qual deve interpretar, não repetir, os resultados dos testes audiológicos; estabelecer recomendações a partir dos resultados dos testes e providenciar um registro claro e preciso no prontuário do paciente. Este relatório varia de acordo com as circunstâncias e com os objetivos da avaliação, usando terminologia que deve ser familiar a quem solicitou o exame. Deverá ser descrito o comportamento da criança durante o teste e o grau de confiabilidade das respostas. Para finalizar, o examinador deve comentar sobre a relação entre os resultados dos testes aplicados, explicando o porquê da coerência ou da incoerência dos resultados, as recomendações fonoaudiológicas e educacionais que sugere para aquela criança em especial. Conclusão Uma parte importante de uma bateria básica de testes audiológicos para recémnascido ou crianças é a avaliação da função auditiva. Inúmeros testes e inventários têm sido desenvolvidos para este fim. A avaliação funcional da audição é, em geral, realizada a partir de questionários preenchidos por professores, familiares, pais ou responsáveis que acompanham a criança ao exame. Ao examinador cabe usar seu conhecimento técnico, sua criatividade e sua habilidade de identificar sutilezas no comportamento de uma criança durante a avaliação audiológica para, dessa forma, chegar a um diagnóstico sobre a real condição auditiva dessa criança. ► 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. 20. 21. Referências bibliográ�cas Myklebust H. Auditory disorders in children: a manual for differential diagnosis. New York: Grune & Stratton. 1954. Bellis TJ. Assessment and management of central auditory processing disorders in the educational setting: from science to practice. New York: Delmar; 2003. Conselho Federal de Fonoaudiologia. 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O volume do conduto auditivo externo encontrase aproximadamente em 0,3 cc na idade de quatro meses16; em 0,7 cc na faixa etária de três a quatro anos17, com um aumento para 1 a 5,5 cc na presença de tubo de ventilação posicionados na membrana timpânica14 ou pequena perfuração de membrana timpânica difícil de ser visualizada na otoscopia. A pesquisa do reflexo acústico do estapédio (RAE), outra medida a ser realizada, fornece informações complementares sobre a funcionalidade da orelha média, cóclea e tronco encefálico, além de auxiliar a predizer o limiar psicoacústico18. Nossa experiência demonstra que a presença do RAE em intensidades inferiores a 100 dBNA sugere limiar psicoacústico normal nas frequências testadas, assim como, do arco reflexo envolvendo nervo e tronco encefálico. Por outro lado, sua ausência deve ser analisada cuidadosamente porque mesmo uma deficiência condutiva leve, com uma diferença aéreoóssea de apenas 10 dB já pode ser suficiente para abolir o RAE19, assim como pode refletir o processo maturacional das estruturas do sistema auditivo. Emissões otoacústicas A pesquisa das emissões otoacústicas evocadas não se trata de um teste auditivo, mas de funcionalidade de células ciliadas externas. Na prática clínica, comumente são utilizadas as emissões otoacústicas evocadas transientes (EOET) e a produto de distorção (EOEPD), que diferem pelo estímulo utilizado para evocálas. O estímulo utilizado na pesquisa das EOET é o clique com faixa de frequência de 500 a 5.000 Hz, porém em neonatos, devido à anatomia do conduto auditivo externo, o estímulo tipicamente possui mais energia nas frequências altas20. Assim, a ausência de resposta nas frequências baixas em neonatos deve ser analisada cautelosamente. Por outro lado, na pesquisa das EOEPD são utilizados dois tons puros definidos com uma razão de 1,2 e abrangem uma faixa de frequência mais ampla. A presença das EOET demonstra funcionalidade das células ciliadas externas, o que diminui a probabilidade de haver uma perda auditiva periférica, uma vez que as alterações cocleares são as de maior prevalência ao nascimento e as células ciliadas externas são mais vulneráveis a doenças e lesões do que as células ciliadas internas21. Contudo, não descarta a presença de alteração auditiva visto que na desordem do espectro da neuropatia auditiva ou nas alterações retrococleares periféricas ou centrais as emissões otoacústicas poderão estar presentes independentemente do limiar psicoacústico. Nas perdas auditivas sensoriais acometendo células ciliadas externas, pode ser feita uma correlação entre os limiares auditivos e o resultado da pesquisa das emissões otoacústicas. No caso das EOET, a presença poderá ocorrer quando os limiares estiverem menores ou iguais a 25 dBNA e as EOEPD quando os mesmos estiverem menores ou iguais a 50 dBNA porém, com amplitude reduzida. Por outro lado, a ausência das emissões otoacústicas pode demonstrar uma deficiência auditiva sensorial de qualquer grau, na presença de funcionalidade normal das orelhas externa e/ou média. Desta forma, o resultado das emissões otoacústicas deve ser analisado cuidadosamente e não deixa de ser imprescindível a realização da medida da imitância acústica no mesmo dia. Potenciais evocados auditivos de tronco encefálico Na utilização dos potenciais evocados auditivos deve ser sempre considerado o processo maturacional das estruturas do sistema auditivo que se reflete na amplitude e latência dos componentes. Inúmeros estudos foram desenvolvidos com o objetivo de caracterizar a latência e amplitude dos componentes do PEATE de acordo com a idade, tanto para criança a termo como prétermo, podendo servir de referências para o início de um serviço de avaliação infantil2224. Ao nascimento, a cóclea está respondendo praticamente com o seu processo maturacional completo, contudo, o nervo auditivo e tronco encefálico continuam seu desenvolvimento até a idade de 18 meses. O processo maturacional ocorre da porção periférica para a central, com uma diminuição linear da latência da onda V com a idade25. No primeiro mês de vida o processo maturacional do nervo auditivo está praticamente completo, o que permite supor que a onda I com latência aumentada pode estar demonstrando alteração da função auditiva periférica, envolvendo orelha média e/ou interna26. O PEATE tem sido utilizado para o diagnóstico de disfunção neurológica do tronco encefálico em crianças de alto risco27,28. Enquanto no neonato a termo é possível registrar o PEATE mesmo em fracas intensidades, no neonato pré termo a idade em semanas pósconcepção em que é possível registrar o PEATE varia entre 25 e 30 semanas, com estímulo em intensidade forte2931. Neste contexto, por quanto tempo o infantil deve ser acompanhado até concluir que a ausência de registro reflete o processo maturacional ou é decorrente de um distúrbio? Para responder esta pergunta, fazse necessário o acompanhamento do desenvolvimento da criança por um período de tempo para verificar mudanças no registro do PEATE, concomitante à orientação e aconselhamento familiar. Contudo, outra pergunta pode surgir, ou seja, por quanto tempo deve ser feito este acompanhamento pensando na importância do diagnóstico precoce? Neste período, o desenvolvimento da criança será acompanhado não apenas pelo PEATE, mas também por meio de métodos comportamentais de avaliação da audição, incluindo a análise do índice de respostas auditivas de acordo com a idade. Desta forma, caso seja constatado que o desenvolvimento da função auditiva está também alterado, deve se definir pelo início da intervenção, com a indicação do aparelho de amplificação sonora individual e terapia fonoaudiológica. Outra aplicação fundamental da pesquisa do PEATE na avaliação audiológica infantil é para auxiliar na predição dos limiares psicoacústicos, por meio da pesquisa do limiar eletrofisiológico, que em recémnascidos a termo e crianças difere de 10 a 20 dB do limiar psicoacústico, sendo que já na idade de cinco meses o limiar eletrofisiológico encontrase em 20 dBNA32. Por outro lado, nos recémnascidos prétermo o limiar encontrase em 40 dBNA entre 28 e 35 semanas de idade gestacional e 30 dBNA entre 35 e 38 semanas de idade gestacional29. A correlação entre o limiar eletrofisiológico e o limiar psicoacústico na faixa de frequência do estímulo utilizado, geralmente o clique (1 a 4 kHz), é maior com a frequência de 2 kHz, seguida de 4 e 1 kHz33,34. Para auxiliar na detecção da resposta, utilizase o componente SN10 (slow negative 10) que corresponde à despolarização na região do colículo inferior, sendo por vezes mais visível que a própria onda V no limiar eletrofisiológico. Assim, deve ser utilizado o filtro passaalto de 30 Hz e janela de 15 ms no registro do PEATE em crianças, uma vez que o componente SN10 apresenta caracteristicamente frequência de resposta em 100 Hz e latência de 10 ms. Recomendase também o uso do algoritmo Fsp disponível em alguns equipamentos, para determinar o verdadeiro potencial em fracas intensidades35. Assim, o que significa obter limiar eletrofisiológico para o clique em 20 dBNA ou menos nas criança? Ao ser considerado que a maioria das deficiências auditivas é coclear com início na base da cóclea onde se localizam as frequências agudas, e o estímulo clique estimula a região das frequências entre 1 e 4 kHz, com este limiar eletrofisiológico normal diminuise a possibilidade de haver alteração na função auditiva periférica. Não se exclui aqui a presença de deficiência auditiva sensorial com curva ascendente, e caberáao profissional, de acordo com o histórico da criança, definir a necessidade de exames complementares e/ou acompanhamento do desenvolvimento da criança. Por outro lado, o limiar eletrofisiológico rebaixado ou ausente demonstra a necessidade de continuidade na avaliação audiológica para definição do diagnóstico audiológico, pois existem algumas limitações importantes do PEATE clique quando utilizado para predizer o limiar psicoacústico. Na Figura 51.1A encontrase um registro com ausências de resposta neural na pesquisa do PEATE, que pode ocorrer em diferentes situações que se refletem diretamente nas decisões que o profissional deve assumir durante o processo de diagnóstico audiológico. Inicialmente, o PEATE só pode ser utilizado para predizer limiar psicoacústico, se não houver comprometimento neural periférico, caso contrário não haverá esta correlação com o limiar psicoacústico (Figura 51.1B). Devido à intensidade máxima disponível nos sistemas de registro de potenciais (94 a 100 dBNA), a audição residual não é caracterizada, informação necessária para um adequado ajuste do aparelho de amplificação sonora individual, com posterior análise do benefício e definição ou não do implante coclear (Figura 51.1C e D). O limiar eletrofisiológico não fornece informações detalhadas sobre o grau da deficiência auditiva em função da frequência comprometida, ou seja, a resposta com especificidade de frequência (Figura 51.1E). Assim, fica óbvia a importância de realizar o PEATE com o estímulo tone burst que permite obter resposta com especificidade de frequência (0,5 a 1 kHz), com razoável acurácia, para a programação adequada dos aparelhos de amplificação sonora individual. Assim como no clique, os limiares eletrofisiológicos obtidos com tone burst são maiores que os limiares psicoacústicos, com diferenças mais acentuadas nas frequências mais baixas (média de 33 dB para 0,25 kHz; 21 dB para 1 kHz e aproximadamente 10 dB para as frequências altas), o que pode limitar o uso do PEATE para estimar a sensibilidade para frequências abaixo de 1 ou 0,75 kHz36. Figura 51.1 Ausência de resposta bilateral na pesquisa do potencial evocado auditivo de tronco encefálico (A) e em quais situações este mesmo tipo de registro poderia ser observado: B. Deficiência auditiva neural em que a ausência independe do limiar acústico. C. e D. Deficiência auditiva coclear em que ausência depende do limiar psicoacústico e geralmente ocorre em deficiências auditivas acima de 80 dBNA nas frequências de 1 a 4 kHz, o que não permite caracterizar audição residual. E. Deficiência auditiva coclear com maior comprometimento das frequências altas, como nas deficiências auditivas em rampa. (Reprodução autorizada por Alvarenga e Piza, 2010.) (Esta figura encontrase reproduzida em cores no Encarte.) Outro aspecto importante na avaliação audiológica infantil é a definição do componente condutivo nos casos de malformações de orelha externa e/ou média que impossibilite a pesquisa da função sensorial por meio das emissões otoacústicas e em crianças muito pequenas, nas quais o resultado da timpanometria seja questionável. A diferença básica entre o registro do PEATE por conduções aérea e óssea é basicamente o transdutor utilizado, no caso o vibrador em vez do fone de ouvido, e pela intensidade máxima possível, de 50 dBNA para o estímulo. Devido à presença de artefatos no registro pelo campo elétrico criado entre o vibrador e os eletrodos, recomendase a utilização de polaridade alternada do estímulo, e em alguns casos, o registro contralateral à orelha estimulada. A utilização do mascaramento pode ser dispensada quando há registro da onda I no canal de registro ipsilateral, pois caso fosse resposta da orelha contralateral, haveria o registro apenas das ondas III e V. ■ ■ • • • • • • • Potencial evocado auditivo de estado estável O PEATE com estímulo clique ou tone burst não caracteriza a audição residual da criança devido à intensidade máxima permitida no equipamento. Desta forma, em nossa prática clínica temos utilizado os potenciais evocados auditivos de estado estável (PEAEE) com frequência de modulação de 80 a 110 Hz, pois permite o uso de intensidades em torno de 30 dB acima do PEATE e de 20 a 30 acima da audiometria em campo livre. Obter a audiometria eletrofisiológica em deficiências auditivas de graus severo e profundo é imprescindível, principalmente na idade inferior a seis meses, período no qual o profissional possui apenas os limiares eletrofisiológicos para o ajuste adequado do aparelho de amplificação sonora, e posterior análise do benefício deste dispositivo e definição da indicação ou não do implante coclear. Inúmeros estudos foram desenvolvidos demonstrando a alta correlação entre o PEAEE e a audiometria tonal liminar37 42 caracterizando com precisão o grau da deficiência auditiva sensorial em crianças. Importante ressaltar que as respostas obtidas para a estimulação acústica nas intensidades mais fortes devem ser analisadas cuidadosamente, pois podem não representar uma resposta auditiva. Este fato demonstra a importância de o profissional realizar, durante todo o exame, a análise vetorial de resposta e do ruído, assim como dos valores de probabilidade obtidos, ou seja, caberá ao profissional aceitar ou não como verdadeiros os limiares dos PEAEE apresentados. Por outro lado, nas crianças em que os achados dos demais exames sugerem a presença de perda auditiva de grau leve ou moderado, o tone burst continua sendo a opção para pesquisar a audiometria eletrofisiológica, uma vez que a correlação entre os limiares psicoacústicos e os propostos pelo PEAEE é menor nestes graus de deficiência auditiva43. O PEAEE fornece informações sobre a configuração audiométrica, porém, semelhante ao PEATE, esta correlação diminui para a frequência de 500 Hz44. Nas crianças com diagnóstico de desordem do espectro da neuropatia auditiva, o PEAEE mostra uma inconsistência nas respostas obtidas em todas as frequências, mesmo quando utilizado forte intensidade45,46, não devendo, assim, ser utilizado para predizer o limiar psicoacústico. Aspectos emergentes na área da audiologia infantil Com o avanço científico e tecnológico, outros estímulos e/ou procedimentos de avaliação têm sido investigados com o intuito de promover maior precisão diagnóstica. Nesse sentido, a reflectância de potência estudada desde a década de 1990 representa uma possibilidade de favorecer a identificação de alterações condutivas. Recentemente denominada como “medidas de imitância acústica de banda larga”47, além de ser realizada com estímulos que avaliam uma ampla faixa de frequência, inclui uma grande variedade de medidas de transferência acústica passíveis de análise, envolvendo aquelas baseadas em energia e também outras que se baseiam na impedância do sistema48. As medidas que estão sendo estudadas estão descritas a seguir: Absorvância: consiste na razão entre a energia absorvida e a energia incidente no conduto auditivo externo (CAE). Um número real entre “zero” e “um”, em que o “zero” representa toda energia refletida e o “um” representa toda energia absorvida, podendo ser expressa em porcentagem (%) Reflectância: consiste na razão entre a energia refletida e a energia incidente no CAE. É uma medida inversamente proporcional à absorbância Magnitude da admitância: representa a facilidade com que uma onda sonora é transmitida, medida em potência, sendo o inverso da impedância Magnitude da impedância: impedância acústica representa a oposição da orelha à transmissão da onda sonora. Qualquer valor de impedância diferindo de 1 resultará em reflexões de pressão, seja positiva ou negativa. Elevada impedância resulta em reflexões positivas,enquanto reduzida impedância em reflexões negativas, medida em potência Fase da impedância: fornece informações sobre qual o tipo de impedância a orelha é dominada: resistência, massa ou rigidez, expresso em radianos/2π. A fase negativa (–π/2) é dominada pela rigidez, a fase positiva (+π/2) pela massa e a fase próximo a zero, dominada pela resistência Fase da reflectância: fornece informações sobre como a onda sonora se propaga no CAE, de acordo com a frequência, expressa em radianos/2π Delay da reflectância (slope): consiste no tempo entre a apresentação do estímulo pela sonda, transmissão até a membrana timpânica e captação da energia pelo microfone da sonda, expresso em milissegundos (ms). Como evidenciado anteriormente, a timpanometria com sonda de 226 Hz possui baixa sensibilidade para avaliação de crianças nos seis primeiros meses de vida, sendo indicada a utilização da sonda de 1.000 Hz nesta população. Contudo, na prática clínica observase que mesmo com esse tom de sonda muitas vezes obtêmse curvas timpanométricas irregulares, classificadas como do tipo “indeterminado”, que não auxiliam o audiologista na definição da presença ou ausência da alteração condutiva. Embora PEATE e PEAEE por condução óssea possibilitem a identificação de componentes sensoriais, em casos de perda auditiva mista de grau profundo tais procedimentos não são capazes de fornecer informações adicionais, uma vez que por limitação do transdutor, não podem ser realizados em intensidades elevadas. Importante ressaltar que estudos nesta área ainda são necessários para que seja possível o uso clínico destas medidas, favorecendo o diagnóstico audiológico infantil com maior precisão. Na rotina clínica o PEATE é realizado com o estímulo clique e tone burst. As características acústicas do tone burst geram uma redução na sincronia neural, principalmente para as frequências mais graves devido à dispersão da energia sonora ao longo da membrana basilar até chegar no feixe de fibras correspondente a esta frequência. Tal comportamento refletese na morfologia do registro e, consequentemente, na dificuldade em detectar as respostas. Assim, visando melhorar esta detecção, foi construído o estímulo chirp, inicialmente de banda larga e, posteriormente, com especificidade de frequência. O estímulo chirp compensa o tempo gasto pela onda de deslocamento progressivo na cóclea, atrasando a apresentação dos componentes das frequências agudas em relação às frequências graves; assim, as diferentes regiões ao longo da membrana basilar são estimuladas e despolarizadas simultaneamente, gerando respostas com melhor sincronia. Atualmente estudos têm sido desenvolvidos a fim de verificar as vantagens, desvantagens e aplicabilidade do estímulo chirp para que no futuro seja alcançado o uso clínico em potencial4955. Os resultados prévios são promissores, evidenciando maior amplitude da onda V e, consequentemente, melhor identificação da resposta eletrofisiológica. A seguir serão apresentados casos clínicos que exemplificam a importância dos procedimentos disponíveis para a avaliação audiológica infantil e o raciocínio clínico para a definição do diagnóstico da perda auditiva. Caso clínico 1 Criança com 4 meses. Na triagem auditiva neonatal com EOEt obteve-se resultado “falha”, bilateralmente. Realizou-se PEATE duas vezes com ausência de resposta neural na orelha esquerda e limiar eletro�siológico em 70 dBNA na orelha direita. Mediante estes resultados, foi então encaminhada para diagnóstico audiológico. Indicadores de risco para a de�ciência auditiva: histórico de de�ciência auditiva na família, sendo uma tia de terceiro grau com de�ciência auditiva congênita. Desenvolvimento psicomotor normal. Otoscopia: sem alterações. A e B. Medida da imitância acústica: com sonda de 1 kHz. Re᠀�exo acústico ipsilateral e contralateral da OD presentes (100 a 110 dB) e ipsilateral e contralateral da OE ausentes. C e D. PEATE por condução aérea clique e tone burst: com fone de inserção 3A. E. PEATE por condução óssea: vibrador ósseo posicionado na mastoide, intensidade de 50 dBNA, realizado sem a utilização de mascaramento. F e G. Potencial evocado auditivo de estado estável: com fone de inserção 3A. Avaliação do comportamento auditivo: Orelha direita: não houve reações para os sons de Ling e observou-se atenção para palmas e nome. Orelha esquerda: não houve reações para os sons de Ling, palmas e nome. H, I, J e K. Emissões otoacústicas evocadas transientes e produto de distorção. L. Audiometria com reforço visual: com fone de inserção 3A. Realizada aos 8 meses de idade. Diagnóstico audiológico: perda auditiva sensorial assimétrica, de grau moderado na orelha direita e profundo na orelha esquerda. Conduta: adaptação de aparelhos de ampli�cação sonora individual aos quatro meses, com início da terapia fonoaudiológica especializada. Acompanhamento do desenvolvimento global e reavaliação audiológica a cada três meses. Comentários: na faixa etária em questão é fundamental a opção pela sonda de alta frequência para realização da medida de imitância acústica, uma vez que a mesma confere maior sensibilidade para a identi�cação de alterações condutivas nos seis primeiros meses de vida. Nota-se em ambas as orelhas curva timpanométrica com “pico positivo”, que de acordo com a classi�cação proposta por Baldwin (2006)56 sugere normalidade do sistema tímpano-ossicular, o que permite concluir lesão de células ciliadas externas demonstrada pela ausência de registro das emissões otoacústicas evocadas. Todavia, mesmo com este resultado, a realização do PEATE por condução óssea confere maior precisão diagnóstica, demonstrando a existência de uma perda auditiva sensorial. Frente à constatação da existência de perda auditiva no PEATE clique, é essencial a obtenção de limiares com especi�cidade de frequência por meio do PEATE com estímulo tone burst e de maneira complementar à pesquisa dos PEAEE a �m de caracterizar a audição residual nas perdas auditivas de graus severo e profundo, considerando a análise vetorial. Os métodos eletro�siológicos nesta faixa etária são fundamentais, pois possibilitam a seleção e adaptação de aparelhos de ampli�cação sonora individual, contudo a utilização do limiar eletro�siológico deve ser cuidadosa ao considerar a ampli�cação do conduto auditivo externo. Importante ressaltar a necessidade de reavaliação no processo de diagnóstico. Caso clínico 2 Criança com 7 meses. Realizou triagem auditiva neonatal com EOEt com resultado “falha” bilateralmente no teste e resultado “passa” na orelha direita no reteste. Com 9 meses foi encaminhada para realização do diagnóstico audiológico. Indicadores de risco para a de�ciência auditiva: icterícia com transfusão sanguínea. Desenvolvimento psicomotor normal. Otoscopia: sem alterações. A. Audiometria com reforço visual: com fone de inserção 3A. Avaliação do comportamento auditivo: localizou todos os sons de Ling, palmas e nome, bilateralmente. B e C. Medida da imitância acústica com sonda 226 Hz. Re᠀�exo acústico ipsilateral e contralateral ausentes, bilateralmente. D e E. PEATE por condução aérea clique e tone burst 500 Hz: com fone de inserção 3A. F, G, H e I. Emissões otoacústicas evocadas transientes e produto de distorção. J. Eletrococleogra�a para pesquisa de microfonismo coclear: com tone burst de 2 kHz, eletrodo de conduto. Diagnóstico interdisciplinar: desordem do espectro da neuropatia auditiva. Diagnóstico audiológico: perda auditiva sensorioneural de grau moderado bilateral. Conduta: adaptação de aparelhos de ampli�cação sonora individual, início de terapia fonoaudiológica especializada e acompanhamento audiológico e da aquisição e desenvolvimento de linguagem. Comentários: neste caso destaca-se a importância da pesquisa do microfonismo coclear (MC) para o diagnóstico diferencial, visto a ausência de registro dasemissões otoacústicas evocadas. Ao se observarem traçados com reprodutibilidade no início do registro do PEATE clique, a inversão da polaridade é fundamental para veri�car a existência de resposta neural. Com a inversão dos traçados seguindo a polaridade do estímulo, conclui-se que o registro re᠀�ete o MC ou artefato elétrico. A clampagem do tudo permite esta diferenciação, pois no caso de MC, as ondas no registro desaparecem. Por vezes, o registro do MC é questionável, sendo imprescindível, assim, a pesquisa do MC por meio da eletrococleogra�a. Neste caso, o registro do MC é nítido na orelha esquerda, porém, na orelha direita observa-se também presença de artefato elétrico associado, uma vez que a clampagem do tubo não cancelou completamente a resposta registrada. Destaca-se também que a ausência de resposta neural no PEATE clique associado ao registro de MC não permite concluir que se trata de um caso de DENA (desordem do espectro da neuropatia auditiva). Nestes casos é essencial a diferenciação com perdas auditivas sensoriais com con�guração de curva em rampa. Assim, o PEATE tone burst de 500 Hz é essencial para diagnóstico diferencial, uma vez que se tratando de perda sensorial em rampa tem-se o registro de resposta neural nesta frequência. Por �m, nota-se que a ausência de resposta neural no PEATE clique não tem relação com o grau da perda auditiva nos casos de DENA, sendo assim, essenciais os exames comportamentais para a indicação, seleção e adaptação de aparelhos de ampli�cação sonora individual. Assim, em nosso serviço, a criança com DENA inicia a terapia fonoaudiológica imediatamente após o diagnóstico, mas o AASI é indicado e adaptado após a obtenção dos níveis mínimos de audição por meio do VRA, por volta dos seis meses de idade. Caso clínico 3 Criança 11 meses. Realizou triagem auditiva neonatal com EOEt na maternidade e núcleo de saúde, com resultado “passa” em ambos. Com 8 meses fez PEATE com ausência de resposta, sendo encaminhada ao serviço para diagnóstico e intervenção. Ausência de indicadores de risco para de�ciência auditiva. Desenvolvimento psicomotor normal. Otoscopia: sem alterações. A. Audiometria com reforço visual: com fone de inserção 3A. B e C. Medida da imitância acústica com sonda 226 Hz. Re᠀�exo acústico ipsilateral e contralateral ausentes, bilateralmente. Avaliação do comportamento auditivo: não houve nenhuma reação para todos os sons de Ling, palmas e nome, bilateralmente. D e E. Emissões otoacústicas evocadas transientes. F. PEATE por condução aérea clique: com fone de inserção 3A. ► ► 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. G. Peate por condução aérea tone burst 500 Hz: com fone de inserção 3A. Diagnóstico interdisciplinar: desordem do espectro da neuropatia auditiva. Diagnóstico audiológico: perda auditiva sensorioneural de grau profundo bilateral. Conduta: adaptação de aparelhos de ampli�cação sonora individual com início de terapia fonoaudiológica especializada. No processo de acompanhamento observou-se pouco benefício com aparelho de ampli�cação sonora individual, não sendo observado desenvolvimento das habilidades auditivas e de linguagem, sendo assim, indicado o implante coclear pela equipe interdisciplinar. Comentários: ao confrontar os achados dos casos 2 e 3 nota-se que ao se obter o diagnóstico interdisciplinar de DENA, a presença ou ausência de EOEt não fornece informações sobre o grau da perda auditiva. Da mesma forma, os resultados eletro�siológicos não possibilitam predizer os limiares psicoacústicos. Sendo assim, nestes casos a atenção deve ser voltada aos procedimentos comportamentais para determinação dos níveis mínimos de resposta por frequência especí�ca para a indicação, seleção e adaptação dos aparelhos auditivos. É crucial ressaltar a importância do acompanhamento audiológico com objetivo de se obter melhor precisão diagnóstica à medida que a criança responde melhor aos métodos comportamentais, e também para veri�car o benefício com o AASI e a necessidade de modi�car a forma de intervenção. Conclusão Na avaliação audiológica infantil, o princípio crosscheck é mandatório, ou seja, o profissional deve definir um protocolo de avaliação, envolvendo procedimentos eletroacústicos, eletrofisiológicos e comportamentais para a definição do diagnóstico audiológico, que permita a definição de um diagnóstico preciso e conduta adequada. Importante ressaltar que a intervenção deve ser iniciada imediatamente após o diagnóstico da deficiência auditiva, e deverão fazer parte deste processo reavaliações audiológicas periódicas, para a definição com mais precisão do grau da perda auditiva constatada, à medida que a criança passa a ter condições de responder de forma mais precisa aos métodos comportamentais. 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A avaliação diagnóstica provê a primeira oportunidade para que se desenvolva o relacionamento entre a família e os primeiros cuidados audiológicos (diagnóstico, aconselhamento, intervenção e coordenação dos cuidados que estão ocorrendo). A interação com a família durante a avaliação diagnóstica é crítica porque o apoio, a orientação e a educação que ela recebe neste momento ajudarão a facilitar sua transição para os programas de intervenção para onde é encaminhada. Avaliação audiológica Diversos são os objetivos para se realizar a avaliação audiológica da população pediátrica, dentre eles podese citar: Determinar a integridade do mecanismo auditivo Identificar tipo, grau e configuração da perda auditiva de cada orelha Caracterizar problemas associados e condições que possam levar a handicap Avaliar a habilidade da criança em usar a informação auditiva de forma significativa (audição funcional) Identificar os fatores de risco individuais e a necessidade de vigilância para perdas auditivas progressivas ou de instalação tardia Avaliar se o paciente é candidato a equipamentos auxiliares, por exemplo: aparelhos auditivos, sistemas auxiliares (sistema FM, sensores táteis), implante coclear Encaminhar para avaliações adicionais e serviçosde intervenção quando necessários Prover aconselhamento de acordo com as realidades linguísticas e culturais para as famílias/responsáveis legais em relação aos achados e às recomendações audiológicas Comunicar os achados e recomendações, com consentimento familiar, para outros profissionais, tais como médico de família, médicos especialistas, fonoaudiólogos, especialistas de outras áreas e para as agências municipais e estaduais adequadas Considerar a necessidade de avaliações adicionais e/ou triagens (fala e linguagem, cognitiva, comportamental) baseada na história do caso, nas observações clínicas, nas preocupações dos pais e em razões especiais para encaminhamentos. A importância prática de se realizar o diagnóstico correto dos diferentes tipos de problemas que uma criança pode apresentar está no fato de que suas necessidades variam de forma significativa e, quando um diagnóstico diferencial não é feito, suas potencialidades podem ser perdidas1. Em 2003, Bellis2 comentou que a simples identificação da presença de um transtorno não é o suficiente, este problema deve ser qualificado de tal modo que um programa de intervenção e educação possa ocorrer. Somente com uma bateria de testes e com a cuidadosa observação e interação com a criança é possível chegar a um diagnóstico sobre suas REAIS condições auditivas. Todas as medidas da função auditiva (comportamentais e fisiológicas) devem ser completadas em um ambiente acústico que atenda aos padrões de ruído para exames audiométricos (Quadro 52.1) (Resolução CFFa no 364/09 de 30 de março de 2009)3. Os equipamentos devem estar de acordo com as especificações e recomendações do fabricante e calibrados de forma a atender aos padrões recomendados pelo Conselho Federal de Fonoaudiologia. A verificação diária da integridade dos equipamentos é extremamente importante ao se avaliarem crianças. Quando não existem padrões para os estímulos usados, tal como ocorre com os estímulos transientes usados nos testes de potencial evocado ou na audiometria em campo sonoro, a calibração deve ser baseada em outros padrões publicados ou em valores estabelecidos em estudos realizados em clínicas. A calibração do campo sonoro é particularmente crítica na avaliação comportamental de crianças que não podem ser avaliadas com fones de ouvido supraaurais ou de inserção46. Quadro 52.1 Níveis máximos de pressão sonora permissíveis para o ruído ambiente, Lmáx, em bandas de 1/3 de oitava para a audiometria por via aérea quando fones de ouvido supra-aurais típicos. Frequência central da banda de 1/3 de oitava (Hz) Níveis máximos de pressão sonora permitidos para o ruído ambiente Lmáx (referência: 20 uPa) dB Faixa de frequências do tom de teste 125 a 8.000 Hz 250 a 8.000 Hz 500 a 8.000 Hz 31,5 56 66 78 40 52 62 73 50 47 57 68 63 42 52 64 80 38 48 59 100 33 43 55 125 28 39 51 160 23 30 47 200 20 20 42 250 19 19 37 315 18 18 33 400 18 18 24 500 18 18 18 630 18 18 18 800 20 20 20 1.000 23 23 23 1.250 25 25 25 1.600 27 27 27 2.000 30 30 30 2.500 32 32 32 3.150 34 34 34 4.000 36 36 36 5.000 35 35 35 6.300 34 34 34 8.000 33 33 33 o ► Baseado em Resolução CFFa no 364/20.093, Art. 1o O ambiente acústico para a realização de avaliações audiológicas deve atender aos níveis estabelecidos pela Norma ISO 8.253-1 como referência para os níveis de ruído ambiental máximos permitidos na cabine/sala de teste. A avaliação dos níveis de pressão sonora do ruído ambiente deve ser realizada conforme a metodologia descrita na Recomendação CFFa no 11 e pressupõe a utilização de um sistema de medição composto por analisador de terços de oitavas associado a microfone e calibrador de nível sonoro. A empresa escolhida entre as inúmeras existentes deve comprovar que estes equipamentos são anualmente calibrados no Inmetro ou laboratório integrante da RBC – Rede Brasileira de Calibração. Os certificados de calibração devem ser do próprio Inmetro ou exibir a logomarca da acreditação pela RBC, visualizável no site do Inmetro (http://www.inmetro.gov.br/). Nota: utilizandose os valores apresentados, o menor nível do limiar auditivo a ser medido é de 0 dB, com uma incerteza máxima de +2 dB devido ao ruído ambiente. Se uma incerteza máxima de +5 dB devido ao ruído ambiente é permitida, os valores podem ser incrementados em 8 dB. O processo de avaliação de uma criança deve passar pelas seguintes etapas: ► Entrevista. O diagnóstico correto de um problema auditivo em uma criança começa com a obtenção cuidadosa da história desta, desde a fase gestacional até o momento da avaliação. Dentre as questões que devem ser discutidas com a família ou com os cuidadores podemse citar: qual a queixa que a família traz?, qual a dúvida que tem sobre a criança?, como tem sido o desenvolvimento motor da criança?, e o da sua fala e linguagem?, como a criança se comunica?, como se comunicam com ela?, a criança tem problemas de ouvido?, a família acha que a criança ouve bem?, existem antecedentes familiares de perda auditiva?, que doenças a criança já teve?, a criança está na escola?, tem problemas de aprendizagem? A história do caso é particularmente importante porque poderá ser um guia para a seleção das estratégias que serão utilizadas na avaliação audiológica. Por outro lado, o diagnóstico bem feito da perda auditiva depende da interpretação de bateria de testes dentro do contexto da história médica e de desenvolvimento da criança. As informações obtidas na história do caso podem levar a modificações nos procedimentos de avaliação. A história do caso deve ser registrada em formulários padrão. No Quadro 52.2 é apresentada uma sugestão de formulário para a história de caso em crianças. Cuidados na seleção do procedimento O uso de técnicas adequadas à idade cognitiva da criança é vital no processo de sua avaliação. O examinador deve maximizar a probabilidade de sucesso, obtendo informações valiosas e detalhadas. Tornase então extremamente importante que a abordagem audiológica selecionada esteja de acordo com o desenvolvimento da criança que está sob estudo naquele momento. A entrevista com os pais e com os professores e as informações obtidas, a partir das observações feitas antes da aplicação de qualquer teste formal, facilitam a tomada de decisão sobre qual o melhor procedimento a ser aplicado inicialmente. O examinador deve ter em mente que a avaliação de crianças deve ser feita com a consciência de que ocorrem efeitos maturacionais sobre os protocolos utilizados e que por isso as avaliações de crianças com idade inferior a 7 anos devem ser feitas com cuidado, devido ao grande grau de variabilidade no seu desempenho. As crianças não são iguais, diferem entre si e cada criança que chega à sala de exames audiológicos precisa e deve ser observada na sua individualidade. Ao se fazer esta avaliação primária, é sempre possível iniciar o teste a partir de uma seleção das técnicas de avaliação que vão exigir da criança respostas neuromotoras e cognitivas que estão dentro de suas possibilidades. Outros aspectos que influenciam o desempenho da criança em uma avaliação audiológica estão relacionados ao seu estado físico no momento do exame, como sono, fome, febre e cansaço, que pode ser um fator negativo que faz com que ela não queira colaborar ou participar do processo de exame. É importante observar os seguintes aspectos antes de se decidir qual a técnica de exame será aplicada: ► Habilidades de fala e linguagem. Realizadas por meios padronizados e não padronizados para “rastrear” a função motororal e as habilidades de produção de fala: articulação, fluência, ressonância e características da voz; “rastrear” a compreensão e a produção da linguagem (incluindo processos fonológicos, sistemas de linguagem de sinais, fala com pistase aspectos cognitivos da comunicação); intenção comunicativa; uso de gestos indicativos e/ou simbólicos. Quadro 52.2 Formulário para história de caso em crianças. Nome da criança Nome dos pais Idade Data de nascimento Data do exame Por que motivo você marcou este exame de audição? Seu �lho já fez algum exame de audição? Sim Não Você tem alguma dúvida sobre a audição do seu �lho? Sim Não Seu �lho parece ouvir melhor em alguns dias do que em outros? Sim Não Tem alguém na família (irmãos, irmãs, tios, avós etc.) que apresenta dé�cit ou problema com linguagem, aprendizagem, audição, fala etc.? Sim Não Houve alguma complicação durante a gravidez ou parto? Sim Não Seu �lho apresentou alguma dessas condições ao nascimento ou nos dois primeiros meses de vida? Permaneceu no hospital depois que a mãe saiu? Prematuridade? Peso ao nascer inferior a 1.500 g? Baixo ganho de peso? Não responde a sons ou a pessoas? Parecia amarelo? Ficou em uma incubadora? Teve di�culdade para respirar? Teve infecções ao nascer? Teve febre alta? Apresenta deformidades físicas? Como é a saúde geral do seu �lho? Boa Regular Ruim Seu �lho toma alguma medicação? Sim Não Seu �lho já foi hospitalizado? Sim Não Seu �lho já teve infecções de ouvido ou qualquer outro problema de ouvido? Sim Não Seu �lho já fez alguma cirurgia de ouvido? Sim Não Que doenças seu �lho já teve? Febre alta Tontura Convulsões Pneumonia Sarampo Problemas cardíacos Traumatismo na cabeça ou no ouvido Febre reumática Encefalite Alergias Meningite Asma Tonsilite Outra: Seu �lho já fez terapia de fala/linguagem? Sim Não Você tem alguma preocupação sobre a fala e a linguagem do seu �lho? Sim Não Você tem dúvidas sobre o desenvolvimento físico ou mental do seu �lho? Sim Não Seu �lho vai à escola? Ele já repetiu alguma série? Você acha que seu �lho tem problemas de aprendizagem? Baseado em Guidelines for the Audiologic Assessment of children from birth to 5 years of age. http://www.asha.org/docs/html/GL2004-00002-F1.html7 ► Habilidades motoras e desenvolvimento social. Protocolos que apresentam os marcos do desenvolvimento infantil tais como o Manual para Vigilância do Desenvolvimento Infantil da Organização PanAmericana de Saúde (2005)8 e a Caderneta de Saúde da Criança do Ministério da Saúde do Brasil9, são indicados. ► • • • Avaliação clínica A avaliação audiológica de uma criança deve ser vista como um “processo” e não uma avaliação clínica isolada. Muitas vezes são necessárias diversas visitas à clínica para que se possa estabelecer a real condição auditiva da criança. Para que os objetivos da avaliação audiológica sejam alcançados, é recomendado usar uma bateria de testes que se baseie no princípio da prova e “contraprova”. O princípio da contraprova estabelece que diversos testes comportamentais e eletrofisiológicos devam ser usados para determinar a extensão da função auditiva da criança10. Ao aplicar uma série de testes em uma criança, é possível não somente estabelecer qual seu problema auditivo, como também excluir qual transtorno auditivo não é11. O uso de qualquer teste isolado para avaliar a sensibilidade auditiva da criança não é recomendado. Dessa forma, a ASHA (2004)7 recomenda que a avaliação audiológica pediátrica inclua procedimentos comportamentais, fisiológicos e medidas de desenvolvimento. O uso de diversos testes na prática clínica ocorre devido à complexa natureza do mecanismo auditivo e do fato de que um transtorno auditivo pode resultar em problemas em um ou mais níveis deste sistema. Na seleção da bateria de testes, o examinador deve usar procedimentos que são baseados em evidências, e por isso podem apresentar maior eficácia nos resultados; deve ainda valorizar mais os testes cujos resultados tenham maior validade e confiabilidade. Ao mesmo tempo, é importante lembrar que o tipo e o número de procedimentos administrados a qualquer criança devem ser regidos muito mais pela validade e confiabilidade do que pela imposição de qualquer tipo de protocolo. A corroboração dos resultados com a história do caso, relatos dos pais e com as observações do comportamento da criança são vitais para avaliar o uso funcional da audição. Alguns cuidados devem ser tomados ao se iniciar a avaliação da audição de uma criança: Apresentar o estímulo sonoro através do campo sonoro em vez de iniciar direto com os fones. Isto permite à criança conhecer o som e aprender a responder à sua apresentação e permite ao examinador um rápido levantamento da extensão da perda auditiva da criança Tornar os pais observadores silenciosos durante a avaliação em campo livre, para que não interfiram nem dirijam as respostas da criança e para que possam sentir as reais dificuldades de audição que seus filhos apresentam. A pre sença dos pais durante a avaliação audiológica deixa a criança mais segura e mais tranquila e, pode tornar a tarefa de orientação um pouco mais fácil Escolher o estímulo acústico que se mostre mais significativo para a criança; procurar colocar esse estímulo em contexto para o paciente. Temos observado que estímulos sonoros, tais como ruído de banda estreita (narrow band noise), tom modulado (warble tone), sons ambientais filtrados, são bastante eficientes na produção de respostas auditivas. Montar uma pequena história para inserir o estímulo tem sido um recurso de grande auxílio nos procedimentos de condicionamento usados na avaliação audiológica. Para o som modulado, costumamos pedir à criança para prestar atenção ao “canto do passarinho pedindo comida”, e para o ruído de banda estreita, pedimos que fale “quando começar a chover para podermos fechar as janelas da casa”. São pequenas estratégias que podem fazer a criança tornarse mais atenta e mais colaboradora durante o teste. A presença dos pais associada à significação do estímulo acústico pode ser fator determinante para um bom resultado quando o paciente a ser examinado é uma criança em idade préescolar. Conhecer e respeitar a criança, seus interesses, seus medos, suas ansiedades, suas dificuldades; saber o que se pode esperar de um paciente que tem 2, 3, 4 ou 5 anos de idade; como é o desenvolvimento normal de uma criança nestas faixas etárias, saber do que gostam, do que costumam brincar e ser muito paciente tornase fator decisivo para o sucesso ou falha de uma sessão de teste audiológico. Marion Downs, um dos maiores nomes na audiologia pediátrica, em uma de suas vindas ao Brasil, dizia que “para atender crianças é preciso ter experiência em avaliar adultos. Que todos os que atuam nessa área deveriam primeiro avaliar adultos e observar crianças com desenvolvimento normal para só depois atuar na avaliação audiológica infantil.” Ao avaliar a audição de uma criança devese, rotineiramente, aplicar os seguintes procedimentos: ► Pesquisa do nível de alerta da fala (NAF). Determinar em técnica ascendente, em campo sonoro e depois com fones qual a menor intensidade para a qual a criança apresenta reação de alerta: “acho que ouvi alguma coisa”. Procurase um comportamento de localização ou de atenção por parte da criança12. Para a pesquisa dessa medida, podemse usar sons de fala tais como sílabas isoladas: [pa],[pa]; [au],[au]; sons do Ling [a,a,a], [i,i,i], [u,u,u], [s,s,s], [ch,ch,ch]; canções infantis: parabéns a você, atirei o pau no gato; chamar a criança pelo seu nome; entre outros. O uso dessa medida permite ao examinador: uma estimativa do nível de sensibilidade auditiva da criança, o que lhe permite estabelecer qual a intensidade adequada para se iniciar a audiometria lúdica; determinar se há diferença de sensibilidade entre as orelhas, quando executado com fones de ouvido; determinar se a criança utiliza o estímulo de fala/vozhumana, como fonte de contato; avaliar a maturação da função auditiva da criança. ► Audiometria de observação do comportamento. Baseada no teste de distração elaborado por Ewing e Ewing (1944), a audiometria de observação do comportamento busca identificar respostas comportamentais a estímulos sonoros apresentados de forma controlada em crianças até 6 meses de idade. As respostas podem ser provocadas por estímulos acústicos apresentados em campo sonoro: materiais de fala, tom puro modulado, ruído de banda estreita, instrumentos acústicos (agogô, sino etc.), brinquedos sonoros, sons ambientais (batida de porta, batida de palma etc.). As respostas a serem observadas podem ser bastante diversas, entre elas: piscar de olhos, franzir testa ou até mesmo a presença de movimentos involuntários, mudanças no padrão respiratório e/ou no padrão de sucção. Madell e Flexer (2004)13 mostraram que o padrão mais provável de resposta ao estímulo acústico em recémnascido, nesta faixa etária, é a mudança no seu padrão de sucção. Respostas de susto, de movimentos dos membros superiores e/ou inferiores e o piscar de olhos em geral ocorrem em intensidades superiores ao limiar auditivo do recémnascido e podem estar comprometidas com quadros neurológicos associados. Segundo as autoras, a resposta de sucção é mantida por mais tempo e permite chegar próximo do limiar auditivo da criança. ► Audiometria com reforço visual (VRA). Indicada para crianças com idade cognitiva entre 6 meses e 3 anos, mas que também pode ser usada naquelas com outros problemas associados (déficit mental, déficit de atenção, dificuldade de colaborar, entre outros). Baseada no desenvolvimento psicoacústico de recémnascidos, que mostra que um bebê com idade cognitiva de 6 meses e com desenvolvimento adequado da função auditiva é capaz de localizar uma fonte sonora quando esta é apresentada no plano lateral à sua cabeça. O método foi desenvolvido a partir da apresentação de um reforço visual a cada resposta de localização ou de busca da fonte sonora que a criança faz ao ouvir um estímulo sonoro. Esta “virada” de cabeça é uma resposta que pode ser condicionada de forma que ocorra todas as vezes que o estímulo sonoro é apresentado e ouvido pela criança. Proposto por Liden e Kankkunen14, baseado na técnica do condicionamento do reflexo de orientação de Suzuki e Ogiba15, a técnica propõe a apresentação de um estímulo sonoro, seguido da apresentação de um estímulo visual, em geral um brinquedo iluminado. A criança é posicionada sentada, no colo de um dos pais ou em uma cadeira adequada (cadeirão de bebê) entre dois altofalantes inicialmente e, posteriormente, quando possível, com fones de ouvido. Quando um estímulo sonoro tal como um som de frequência específica, ruído mascarante, fala ou música é apresentado, a mudança no olhar ou na cabeça do recémnascido em direção à fonte sonora é recompensada com a ativação da iluminação de um brinquedo próximo ao altofalante. É importante enfatizar que qualquer teste feito em campo sonoro não avalia cada orelha separadamente e, em geral, seus resultados mostram os limiares da orelha com menor comprometimento auditivo. A única maneira de se estabelecerem os limiares auditivos de cada orelha é por meio de fones, sejam eles supraaurais ou de inserção. ► Audiometria lúdica. Descrita pela primeira vez por Lowell em 1956, pode ser definida como a observação das respostas comportamentais da criança a estímulos acústicos em situação controlada. Na audiometria lúdica, a criança aprende a responder ao estímulo auditivo por meio de um brinquedo simples – encaixe, pinos, torre etc. Esta técnica é recomendada para crianças com idade cognitiva de 3 anos ou mais, mas também pode ser utilizada para avaliar aquelas com problemas neurológicos, com déficit de atenção ou crianças pouco cooperativas. Ao ensinar uma criança a fazer a audiometria lúdica é fundamental que a criança escute o estímulo que será usado para treinála a responder. Se a criança não ouve o sinal sonoro, ela será condicionada no silêncio e não fará a associação entre ouvir o som e realizar a atividade lúdica. Após obter a história do caso, interagir com a criança durante a entrevista, fazer a pesquisa do nível de alerta de fala e observar as respostas da criança a brinquedos sonoros, o examinador pode ter uma ideia sobre o nível de intensidade que o estímulo sonoro deverá ser apresentado. Se a criança responde para sons de fala em níveis de conversação normal, o teste poderá ser iniciado em torno de 40 a 50 dBNA. Se na entrevista a mãe/responsável comenta que a criança só reage para sons de avião ou trovão, o examinador deverá iniciar o teste em frequência baixa e grande intensidade. Se na interação com a criança o examinador observa que a criança só usa vocalizações, mas mantém a prosódia e a qualidade da voz, a questão poderá não ser perda auditiva periférica, mas um problema auditivo de outra natureza. Em alguns casos, só o treinamento associando a presença do som e a atividade lúdica pode não ser suficiente. Nestes casos, podese usar a técnica desenvolvida por Dix e Hallpike em 194716 – o teste peep show. Neste procedimento, baseado na técnica do condicionamento operante, é necessária uma caixa de madeira com uma janela com uma figura de • • • • • • interesse da criança. A cena (reforço) é iluminada pela criança quando ela aperta um botão assim que ouve o som (estímulo). Para se conseguir o condicionamento, o examinador repete diversas vezes o procedimento. No peep show, além do estímulo e do reforço, um estímulo neutro (luz) é apresentado na etapa de treinamento do procedimento. Este sinal luminoso é sincronizado à apresentação do sinal auditivo para facilitar o condicionamento e, posteriormente, a luz (estímulo neutro) é retirada. Muitas vezes, a criança que está sendo examinada tem grande dificuldade para entender a associação “ouvir o som e brincar”, a técnica do peep show que utiliza a associação “ouvir o som + ver a luz e brincar” pode ser uma alternativa bastante produtiva. A introdução do estímulo neutro (luz) pode ser produtiva e facilitar o treinamento de crianças difíceis de testar. Pode se usar como reforço qualquer atividade lúdica, como, por exemplo, mudar a tela de um computador, encaixar um bloco, falar ao microfone ou acender uma caixa com diferentes brinquedos dentro dela. O que é mais importante neste contexto é apresentar brinquedos que façam com que a criança permaneça interessada e estimulada a continuar “brincando”. Com o desenvolvimento tecnológico, outras opções de brinquedo para essa técnica foram desenvolvidas, mas todas elas se baseiam no princípio do “ouvirverbrincar”. A técnica do peep show ainda é usada, porém muito mais como uma audiometria lúdica em que a criança aprende a responder ao som por meio de um brinquedo. Com crianças nesta faixa etária, a rapidez na execução do teste é fundamental; elas não conseguem permanecer muito tempo em uma mesma atividade. Para dar conta dessa necessidade é importante que o examinador cuide de alguns aspectos: A tarefa de ouvir o som e brincar deve ser contextualizada, uma brincadeira, uma atividade lúdica podem ser criadas com a criança Alternar a pesquisa do limiar de uma orelha para outra a cada frequência avaliada, ou seja, ao obter o limiar de uma frequência, por exemplo, 1.000 Hz, na orelha direita, alternar o sinal para a orelha esquerda e obter o novo limiar. Esse procedimento torna mais rápida a obtenção do limiar auditivo; lembrar que “…testar a audição de uma criança pequena ou de um recémnascido, com procedimentos comportamentais, requer eficiência no uso do tempo, porque a última resposta da criança pode ser sua última colaboração”17 Apresentar reforços sociais além do reforço positivo que é representado pelo brinquedo