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Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2023.2 Página | 1 PMSUS - Oficina 02 EPIDEMIOLOGIA DOS PROBLEMAS DE SAÚDE MENTAL Doenças abordadas: • Depressão; • Ansiedade; • Transtorno afetivo bipolar; • Esquizofrenia; e • Abuso de álcool e outras drogas 1) ENTENDER A EPIDEMIOLOGIA DAS PRINCIPAIS DOENÇAS PSIQUIÁTRICAS E SUAS COMPLICAÇÕES (INCIDÊNCIA, PREVALÊNCIA, MORTALIDADE E MORBIDADE); Antes da pandemia, em 2019, estimava-se que 970 milhões de pessoas no mundo viviam com uma perturbação mental, 82% das quais estavam em países de baixa e média renda. Entre 2000 e 2019, estima-se que mais 25% de pessoas viviam com perturbações mentais, mas como a população mundial cresceu aproximadamente à mesma taxa, a prevalência (pontual) de perturbações mentais manteve-se estável, em cerca de 13%. Além disso, de acordo com várias estimativas, 283 milhões de pessoas tiveram transtornos por uso de álcool em 2016, 36 milhões de pessoas tiveram transtornos por uso de drogas em 2019, 55 milhões de pessoas tiveram demência em 2019 e 50 milhões de pessoas tiveram epilepsia em 2015. Em muitos países, os sistemas de cuidados de saúde mental são responsáveis pelo cuidado de pessoas com essas condições. A prevalência de transtornos mentais varia com o sexo e a idade. Tanto em homens quanto em mulheres, os transtornos de ansiedade e os transtornos depressivos são os dois transtornos mentais mais comuns. Os transtornos de ansiedade tornam-se prevalentes em idades mais precoces do que os transtornos depressivos, que são raros antes dos dez anos de idade. Continuam a tornar-se mais comuns mais tarde na vida, com estimativas mais elevadas em pessoas entre os 50 e os 69 anos. Entre os adultos, as perturbações depressivas são as mais prevalentes de todas as perturbações mentais. Em 2019, 301 milhões de pessoas em todo o mundo viviam com perturbações de ansiedade; e 280 milhões viviam com transtornos depressivos (incluindo transtorno depressivo maior e distimia). Em 2020, estes números aumentaram significativamente como resultado da pandemia da COVID-19. A esquizofrenia, que ocorre em 24 milhões de pessoas e em aproximadamente 1 em cada 200 adultos (com 20 anos ou mais), é uma preocupação primária dos serviços de saúde mental em todos os países. Nos seus estados agudos, é a mais prejudicial de todas as condições de saúde. O transtorno bipolar, outra preocupação importante dos serviços de saúde mental em todo o mundo, ocorre em 40 milhões de pessoas e em aproximadamente 1 em cada 150 adultos em todo o mundo em 2019. Ambos os transtornos afetam principalmente as populações em idade ativa. Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2023.2 Página | 2 Prevalência em homens e mulheres Os transtornos depressivos e de ansiedade são cerca de 50% mais comuns entre as mulheres do que entre os homens ao longo da vida, enquanto os homens são mais propensos a ter um transtorno por uso de substâncias. Como os transtornos depressivos e de ansiedade são responsáveis pela maioria dos casos de transtorno mental, em geral, um pouco mais mulheres (13,5% ou 508 milhões) do que homens (12,5% ou 462 milhões) vivem com um transtorno mental. Os transtornos mentais são comuns entre mulheres grávidas e mulheres que acabaram de dar à luz, muitas vezes com impactos graves tanto para as mães como para os bebés. Em todo o mundo, mais de 10% das mulheres grávidas e mulheres que acabaram de dar à luz sofrem de depressão. Nos países de baixa e média renda, estima-se que este número seja substancialmente mais elevado. As mulheres que sofreram violência por parceiro íntimo ou violência sexual são particularmente vulneráveis ao desenvolvimento de um problema de saúde mental, com associações significativas encontradas entre vitimização e depressão, ansiedade, condições de stress, incluindo TEPT, e ideação suicida. As mulheres que vivem com um transtorno mental grave têm muito mais probabilidade de ter sofrido violência doméstica e sexual durante a vida do que outras mulheres. Prevalência em crianças e adolescentes Cerca de 8% das crianças pequenas (com idades entre os 5 e os 9 anos) e 14% dos adolescentes do mundo (com idades entre os 10 e os 19 anos) vivem com uma perturbação mental. Um estudo seminal de âmbito nacional nos Estados Unidos descobriu que metade dos transtornos mentais presentes na idade adulta se desenvolveram até os 14 anos de idade; três quartos apareceram aos 24 anos. Os transtornos idiopáticos do desenvolvimento, que causam deficiência no desenvolvimento, são o tipo mais comum de transtorno mental em crianças pequenas, afetando 1 em cada 50 crianças com menos de cinco anos. O segundo transtorno mental mais prevalente em crianças pequenas é o transtorno do espectro do autismo (outro transtorno do desenvolvimento), que afeta 1 em cada 200 crianças com menos de cinco anos. Ambos os distúrbios tornam-se gradualmente menos prevalentes com a idade, à medida que muitas pessoas com distúrbios de desenvolvimento morrem jovens. O transtorno de déficit de atenção/hiperatividade e os transtornos de conduta são particularmente comuns na adolescência, especialmente entre os meninos mais jovens (4,6% e 4,5%, respectivamente, nos meninos de 10 a 14 anos de idade). A ansiedade é o transtorno mental mais prevalente entre os adolescentes mais velhos (4,6%) e ainda mais entre as adolescentes (5,5%). A ansiedade e os transtornos depressivos nesta idade podem estar associados à vitimização por bullying. Os distúrbios alimentares ocorrem principalmente entre os jovens e, dentro deste grupo, são mais comuns entre as mulheres (por exemplo, 0,6% nas mulheres com idades compreendidas entre os 20 e os 24 anos, em comparação com 0,3% nos homens da mesma faixa etária). Prevalência em idosos Cerca de 13% dos adultos com 70 anos ou mais viviam com algum transtorno mental em 2019, principalmente transtornos depressivos e de ansiedade. As diferenças entre os sexos nas taxas de perturbações mentais aumentam nesta categoria etária, uma vez que se estima que 14,2% das mulheres e 11,7% dos homens com mais de 70 anos tenham uma perturbação mental. As estimativas de prevalência da esquizofrenia são mais baixas em adultos com mais de 70 anos (0,2%) em comparação com adultos com menos de 70 anos de idade (0,3%), o que em parte pode ser explicado pela mortalidade prematura. Nomeadamente, estas estimativas sobre perturbações mentais não incluem a demência, que é um problema fundamental de saúde pública que é frequentemente abordado pelas políticas e planos de saúde mental ou de envelhecimento. Estima-se que 6,9% dos adultos com 65 anos ou mais vivam com demência. Diferenças geográficas As perturbações mentais são comuns em todos os países: ocorrem em todas as regiões da OMS, variando entre 10,9% de prevalência na Região Africana da OMS e 15,6% na Região das Américas da OMS. As perturbações mentais são um pouco mais comuns em países de rendimento elevado (15,1%), mas também são comuns em países de rendimento baixo (11,6%). As variações nas taxas de prevalência entre regiões e grupos de rendimento podem ser explicadas por pelo menos três fatores. Em primeiro lugar, os fatores demográficos diminuem as taxas de prevalência nos países de baixo rendimento: as populações aqui tendem a ter uma proporção mais elevada de crianças com menos de dez anos de idade, para as quais as perturbações mentais são muito menos comuns. Em segundo lugar, a guerra e os conflitos contribuem para as taxas relativamente mais elevadas de perturbações mentais na região do Mediterrâneo Oriental da OMS. Terceiro, os fatores socioculturais têm um papel. Por exemplo, diferentes entendimentos e conceptualizações culturais sobre saúde mental e condições de saúde mental podem influenciar a disponibilidadedas pessoas Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2023.2 Página | 3 para revelar sintomas de saúde mental em inquéritos. Os conceitos culturais locais de sofrimento – que podem estar associados à psicopatologia – normalmente não são bem abordados em estudos epidemiológicos. E embora o estigma e a discriminação sejam elevados em todos os países, podem ser ainda mais elevados em muitos países de baixa e média renda, o que poderia levar à subnotificação. A combinação de fatores como a idade, o sexo e a localização geográfica pode revelar diferenças importantes nas necessidades específicas de saúde mental das pessoas. Por exemplo, embora cerca de 4% de todas as faixas etárias em todo o mundo viviam com perturbações de ansiedade em 2019, a taxa aumenta para cerca de 10% entre as mulheres em idade ativa nas Américas. Suicídio O suicídio é responsável por mais de uma em cada 100 mortes em todo o mundo. E para cada morte por suicídio há mais de 20 tentativas de suicídio. O suicídio afeta pessoas de todos os países e contextos. E em todas as idades, os suicídios e as tentativas de suicídio têm um efeito cascata nas famílias, amigos, colegas, comunidades e sociedades (leia a experiência de Marie). Em 2019, cerca de 703 000 pessoas de todas as idades (ou 9 por 100 000 habitantes) perderam a vida por suicídio. As estimativas das taxas de suicídio variam significativamente entre países – desde menos de duas mortes por suicídio por 100 000 habitantes em alguns países até mais de 80 por 100 000 habitantes noutros. Cerca de três quartos (77%) de todos os suicídios ocorrem em países de baixa e média renda, onde vive a maior parte da população mundial. Mas os países de rendimento elevado agrupados apresentam as taxas de suicídio mais elevadas, de 10,9 por 100 000. Estes países são também mais propensos a ter dados de registo vital de alta qualidade. As taxas de suicídio também variam entre homens e mulheres. Globalmente, as mulheres são mais propensas a tentar o suicídio do que os homens. E, no entanto, o número de homens que morrem por suicídio é duas vezes superior ao das mulheres. Nos países de rendimento elevado, o rácio de mortes por suicídio entre homens e mulheres é ainda mais elevado, com três homens para cada mulher. Tanto em homens como em mulheres, o suicídio é uma das principais causas de morte entre os jovens. Em 2019, foi a terceira principal causa de morte em mulheres entre 15 e 29 anos; e a quarta principal causa de morte em homens nesta faixa etária. No geral, é a quarta principal causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos e é responsável por cerca de 8% de todas as mortes nesta faixa etária. Mais da metade (58%) dos suicídios acontecem antes dos 50 anos. E as taxas de suicídio em pessoas com mais de 70 anos são mais do dobro das taxas de pessoas em idade ativa. A nível mundial, a taxa de suicídio caiu 36% desde 2000, com diminuições que variam entre 17% na Região do Mediterrâneo Oriental da OMS, 47% na Região Europeia da OMS e 49% na Região do Pacífico Ocidental da OMS. No entanto, na Região das Américas da OMS, as taxas de suicídio aumentaram 17% nos últimos 20 anos. (Figura: Suicídios em 2019) Referência: • World mental health report: Transforming mental health for all. WHO, 2022. (https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe- mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude- mental-para-todos/). https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe-mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude-mental-para-todos/ https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe-mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude-mental-para-todos/ https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe-mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude-mental-para-todos/ Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2023.2 Página | 4 Depressão De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), comparando-se os anos de 2013 e 2019, houve no Brasil significativo aumento do número de indivíduos que reportaram diagnóstico de depressão por profissional de saúde mental. Em 2019, 10,2% das pessoas com 18 anos ou mais de idade referiram ter recebido tal diagnóstico, o equivalente a aproximadamente 16,3 milhões de pessoas. O percentual apresentou um aumento de 34% em relação a 2013, quando havia 7,6% de pessoas em situação equivalente. Desagregando os dados por sexo, verificou-se que independentemente do ano em análise mulheres referiram diagnóstico de depressão com aproximadamente 2,8 vezes mais frequência do que os homens. Outrossim, comparando-se os anos de 2013 e 2019, a proporção dos que reportaram diagnóstico de depressão aumentou ligeiramente mais entre as mulheres (35%) do que entre os homens (31%). Em 2019, os idosos entre 60 e 64 anos representavam a faixa etária proporcionalmente mais afetada: 13,2% tinham sido diagnosticados com depressão. Já o menor percentual, de 5,9%, foi observado entre jovens adultos de 18 a 29 anos de idade. Contudo, no período analisado, a maior variação na proporção de pessoas que relataram ter sido diagnosticadas com depressão foi verificada entre os adultos de 18 a 29 anos (51% de aumento), seguidos dos idosos de 75 anos ou mais (48% de aumento). Referência: • Boletim Fatos e Números: Saúde mental. Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Brasília, Vol.1, 2022. (https://www.gov.br/mdh/pt- br/navegue-por-temas/observatorio-nacional-da- familia/fatos-e- numeros/5.SADEMENTALLTIMAVERSO10.10.2 2.pdf) Suicídio Entre 2010 e 2019, ocorreram no Brasil 112.230 mortes por suicídio, com um aumento de 43% no número anual de mortes, de 9.454 em 2010, para 13.523 em 2019. Análise das taxas de mortalidade ajustadas no período demonstrou aumento do risco de morte por suicídio em todas as regiões do Brasil. Neste mesmo período, estima-se que a população brasileira tenha crescido de 190.732.694 para 210.147.125, resultando em crescimento de 10,17%. A taxa nacional em 2019 foi de 6,6 por 100 mil habitantes. Destacam-se as Regiões Sul e Centro-Oeste, com as maiores taxas de suicídio entre as regiões brasileiras. Homens apresentaram um risco 3,8 vezes maior de morte por suicídio que mulheres. Entre homens, a taxa de mortalidade por suicídio em 2019 foi de 10,7 por 100 mil, enquanto entre mulheres esse valor foi de 2,9. Ao analisar a evolução da mortalidade por suicídio segundo sexo, observou-se aumento das taxas para ambos os sexos, com manutenção da razão de taxas entre os sexos no período. Comparando os anos de 2010 e 2019, verificou-se um aumento de 29% nas taxas de suicídios de mulheres, e 26% das taxas entre homens. A análise da evolução dessas taxas segundo faixa etária demonstrou aumento da incidência de suicídios em todos os grupos etários. Destaca-se, nesse aspecto, um aumento pronunciado nas taxas de mortalidade de adolescentes, que sofreram um incremento de 81% no período, passando de 606 óbitos e de uma taxa de 3,5 mortes por 100 mil hab., para 1.022 óbitos, e uma taxa de 6,4 suicídios para cada 100 mil adolescentes. Não obstante a menor expressividade das taxas em relação aos demais grupos etários, destaca-se também o aumento sustentado das mortes por suicídio em menores de 14 anos. Entre 2010 e 2013 houve um aumento de 113% na taxa de mortalidade por suicídios nessa faixa etária, passando de 104 óbitos e uma taxa de 0,3 por 100 mil, para 191 óbitos, e uma taxa de 0,7 por 100 mil habitantes. Ao analisar a distribuição do risco de morte por suicídio segundo faixa etária entre as regiões https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/observatorio-nacional-da-familia/fatos-e-numeros/5.SADEMENTALLTIMAVERSO10.10.22.pdf https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/observatorio-nacional-da-familia/fatos-e-numeros/5.SADEMENTALLTIMAVERSO10.10.22.pdf https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/observatorio-nacional-da-familia/fatos-e-numeros/5.SADEMENTALLTIMAVERSO10.10.22.pdfhttps://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/observatorio-nacional-da-familia/fatos-e-numeros/5.SADEMENTALLTIMAVERSO10.10.22.pdf https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/observatorio-nacional-da-familia/fatos-e-numeros/5.SADEMENTALLTIMAVERSO10.10.22.pdf Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2023.2 Página | 5 brasileiras, em 2019, observou-se que as Regiões Sul, Norte e CentroOeste apresentaram as maiores taxas de mortalidade de adolescentes de 15 a 19 anos. Essas foram também as regiões que apresentaram o maior incremento percentual das taxas de suicídio entre 2010 e 2019, respectivamente 99%, 90% e 99%. Nesse cenário, destaca-se a Região Norte, onde o maior risco de morte por suicídio ocorreu entre jovens de 15 a 19 anos (9,7 por 100 mil). Analisando a mortalidade por suicídio entre os estados brasileiros, observou-se que todos os estados da Região Sul do País apresentaram taxas de suicídio superiores à média nacional. Destacam-se os estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, com as maiores taxas de suicídio do país, respectivamente 11,8 e 11,0 por 100 mil habitantes. Violências autoprovocadas Em relação às notificações de violências autoprovocadas, em 2019 foram registradas 124.709 lesões autoprovocadas no País, um aumento de 39,8% em relação a 2018. Mulheres foram a grande maioria das vítimas de lesões autoprovocadas, representando 71,3% do total de registros. A ocorrência das lesões autoprovocadas se concentrou na faixa etária de 20 a 39 anos, com 46,3% dos casos. A faixa etária de 15 a 19 anos aparece na segunda posição, com 23,3% dos casos. Em relação a escolaridade, aproximadamente um terço possuíam ensino médio completo ou incompleto, e menos de 7% possuíam ensino superior. Quanto à raça/cor, observaram-se maiores prevalências entre indivíduos de cor branca (47,3%). Em relação ao local da ocorrência, evidenciou-se que a maior parte dos casos ocorreu na própria residência das vítimas (82%), e a repetição do evento foi registrado em 41% dos casos. Os dados mostram, ainda, que aproximadamente 60% dos meios de agressão registrados nas notificações de lesões autoprovocadas corresponderam ao envenenamento, seguidos pelos objetos perfurocortantes (16,8%). Depressão É um problema médico grave e altamente prevalente na população em geral. De acordo com estudo epidemiológico a prevalência de depressão ao longo da vida no Brasil está em torno de 15,5%. Segundo a OMS, a prevalência de depressão na rede de atenção primária de saúde é 10,4%, isoladamente ou associada a um transtorno físico. De acordo com a OMS, a depressão situa-se em 4º lugar entre as principais causas de ônus, respondendo por 4,4% dos ônus acarretados por todas as doenças durante a vida. Ocupa 1º lugar quando considerado o tempo vivido com incapacitação ao longo da vida (11,9%). A época comum do aparecimento é o final da 3ª década da vida, mas pode começar em qualquer idade. Estudos mostram prevalência ao longo da vida em até 20% nas mulheres e 12% para os homens. Referência: • Boletim Epidemiológico Nº 33: Mortalidade por suicídio e notificações de lesões autoprovocadas no Brasil. Ministério da Saúde. Volume 52. Setembro, 2021. 2) ENTENDER O IMPACTO DO SOFRIMENTO MENTAL E O ABUSO DE ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS NA CARGA GLOBAL DAS DOENÇAS; A abordagem do Estudo de Carga de Doença Global (GBD) é um esforço sistemático e científico para quantificar a magnitude comparativa da perda de saúde decorrente de doenças, lesões e fatores de risco por idade, sexo e geografia para pontos específicos no tempo. O Estudo de Carga de Doença Global fornece dados detalhados sobre doenças, lesões e fatores de risco que são insumos essenciais para a formulação de políticas com base em envidências. Esse projeto colaborativo mostra que a saúde no mundo está passando por uma mudança rápida. Anos de vida perdidos (YLLs): Anos de vida perdidos em decorrência de morte prematura. Anos vividos com invalidez (YLDs): Anos de vida vividos com qualquer perda de saúde a curto ou a longo prazo. Anos de vida ajustados à invalidez (DALYs): A soma dos anos perdidos em decorrência de morte prematura (YLLs) e anos vividos com invalidez (YLDs). DALYs também são definidos como anos de vida saudável perdidos. Expectativa saudável de vida ou expectativa de vida ajustada à saúde (HALE): O número de anos que uma pessoa em uma determinada idade pode esperar viver em boa saúde, levando em consideração a mortalidade e a invalidez. Anos de Vida Ajustados pela Qualidade (QALY): Os QALY representam os anos de vida subsequentes a uma intervenção de saúde, ajustados para a qualidade de vida experimentada pelo paciente durante esses anos. Os QALY fornecem uma unidade comum para comparar o custo-utilidade de diferentes intervenções de saúde e para estabelecer prioridades para a alocação de recursos exíguos e têm sido amplamente utilizados na literatura internacional. Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2023.2 Página | 6 Carga global dos transtornos mentais Os estudos sobre o peso das doenças estimam o impacto, em toda a população, de viver com doenças e lesões e de morrer prematuramente. Envolvem cálculos utilizando o Ano de Vida Ajustado por Incapacidade (DALY), onde um DALY representa a perda de um ano de saúde plena. Os DALYs combinam numa única medida os anos de vida perdidos devido à mortalidade prematura (YLLs) e os anos de vida saudável perdidos devido à incapacidade (YLDs) para estimar a carga global de cada causa de doença e lesão. Em 2019, em todas as idades, os transtornos mentais, neurológicos e por uso de substâncias representaram juntos um em cada dez DALYs (10,1%) em todo o mundo. Os transtornos mentais representaram 5,1% da carga global. Os distúrbios neurológicos representaram outros 3,5%; enquanto as condições de uso de substâncias representaram 1,5%. Em todos os países, o fardo das perturbações mentais abrange todo o ciclo de vida: desde o início da vida, onde condições como perturbações do desenvolvimento e perturbações comportamentais na infância são os maiores contribuintes para o fardo; até a idade adulta e a velhice, onde predominam os transtornos depressivos e de ansiedade. No geral, o maior fardo é suportado durante o início da idade adulta. Em todos os transtornos mentais, a maior parte da carga se manifesta como YLDs, e não como YLLs. Isto deve-se à forma como as estimativas de carga são calculadas, que não atribui quaisquer mortes a condições como perturbações depressivas ou perturbação bipolar, e que inclui automutilação e suicídio numa categoria separada de lesões intencionais. Os transtornos mentais são a principal causa de anos vividos com incapacidade, representando um em cada seis (15,6%) YLDs em todo o mundo. Os transtornos por uso de substâncias são responsáveis por mais 3,1% dos YLDs; e as condições neurológicas respondem por 6,4%. Os transtornos mentais, neurológicos e por uso de substâncias combinados são responsáveis por um em cada quatro YLDs em todo o mundo. A contribuição das perturbações mentais para os YLD varia ao longo da vida, desde menos de 10% para crianças e adultos mais velhos até mais de 23% para jovens entre os 15 e os 29 anos. Desde 2000, tanto os transtornos depressivos quanto os de ansiedade têm estado consistentemente entre as dez principais causas de todos os YLDs em todo o mundo. Os transtornos depressivos por si só são a segunda principal causa de YLDs globais, representando 5,6% de todos os YLDs em 2019. Dois importantes fatores de risco para estes transtornos mentais comuns foram quantificados como parte do GBD 2019: abuso sexual infantil (exposição antes dos 15 anos a qualquer contacto sexual Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2023.2 Página | 7 indesejado);e vitimização por bullying (danos intencionais e repetidos causados por pares a crianças e adolescentes que frequentam a escola). Em 2019, os níveis globais padronizados por idade de exposição ao longo da vida ao abuso sexual infantil e à vitimização por bullying no ano anterior ascenderam a 9,4% e 7,3%, respetivamente. Juntos, esses fatores de risco modificáveis foram responsáveis por 7,1% de todos os DALYs de transtorno de ansiedade e 9,9% de todos os DALYs de transtorno depressivo maior em todo o mundo. Um contributo fundamental para as Estimativas de Saúde Global (GHE) da OMS são os chamados "pesos do estado de saúde", que são utilizados para ajustar o tempo passado num determinado estado de saúde pelo seu nível associado de diminuição da saúde ou deficiência (numa escala de 0 a 1, onde 0 denota saúde plena ou nenhuma deficiência). O estado mais prejudicial em todas as condições de saúde – tanto no GHE 2019 como na Carga Global de Doenças 2019 – é a esquizofrenia aguda, à qual é atribuído um peso de estado de saúde de 0,78. Simplificando, isto significa que se espera que um indivíduo com esquizofrenia aguda tenha apenas um quinto da saúde e do funcionamento de uma pessoa totalmente saudável. O episódio depressivo grave é considerado o quinto estado de saúde mais prejudicial; e o estado residual da esquizofrenia é o décimo. A estimativa dos pesos do estado de saúde também pode ajudar a informar as discussões em torno da “equidade vertical”. Este conceito significa dar mais atenção a quem mais necessita. É diferente da equidade horizontal, que se centra na igualdade de acesso ou tratamento para necessidades iguais (como garantir a igualdade de acesso aos cuidados em zonas urbanas e rurais). Na verdade, vários países incluíram explicitamente a gravidade de uma doença ou condição como critério fundamental para a definição de prioridades. Assim, de uma perspectiva de equidade vertical, os cuidados para a esquizofrenia e outras condições graves de saúde mental, incluindo episódios graves de perturbação depressiva, devem ter prioridade devido à deficiência envolvida. Referência: • World mental health report: Transforming mental health for all. WHO, 2022. (https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe- mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude- mental-para-todos/). 3) ENTENDER A CORRELAÇÃO DA MORTALIDADE PRECOCE POR COMORBIDADES NAS PESSOAS COM SOFRIMENTO MENTAL; Mortalidade prematura Estimar a mortalidade por problemas de saúde mental é complexo. Tanto as condições de saúde mental como o suicídio raramente são registados como causa de morte nas certidões de óbito ou nas estatísticas de mortalidade dos países. No entanto, a má saúde mental é muitas vezes um importante factor subjacente ou causal. Em todo o mundo, sabe-se que as pessoas com problemas de saúde mental apresentam taxas de mortalidade desproporcionalmente mais elevadas em comparação com a população em geral. Pessoas com problemas graves de saúde mental – incluindo esquizofrenia e transtorno bipolar – morrem em média 10 a 20 anos mais cedo do que a população em geral. A maioria destas mortes deve-se a doenças evitáveis, especialmente doenças cardiovasculares, doenças respiratórias e infeções, que são mais comuns em pessoas com problemas de saúde mental. Nestes casos, ter um problema de saúde mental pode não ser a causa da morte, mas é provável que seja um fator contribuinte importante. Os efeitos secundários dos medicamentos para condições graves de saúde mental podem ter um papel na mortalidade prematura, contribuindo, por exemplo, para a obesidade, intolerância à glicose e dislipidemia. Além disso, as pessoas com problemas de saúde mental têm maior probabilidade de estar expostas aos factores de risco bem conhecidos para doenças não transmissíveis (DNT), incluindo o tabagismo, o consumo de álcool, uma alimentação pouco saudável e o sedentarismo. Isto é ainda agravado pela abordagem fragmentada que os sistemas de saúde adotam no cuidado das condições de saúde física e mental: quando uma pessoa é encaminhada para um serviço de saúde mental, a sua saúde física é muitas vezes negligenciada. Ao mesmo tempo, tanto em contextos de cuidados de saúde mental gerais como especializados, os sinais e sintomas de doença física são frequentemente atribuídos erroneamente a uma condição de saúde mental concomitante, no que é conhecido como “ofuscamento https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe-mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude-mental-para-todos/ https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe-mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude-mental-para-todos/ https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe-mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude-mental-para-todos/ Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2023.2 Página | 8 do diagnóstico”. Estes dois fatores levaram, por exemplo, a um subreconhecimento e subtratamento sistemático de doenças cardiovasculares entre pessoas que vivem com esquizofrenia e perturbação bipolar. A OMS e os seus consultores especializados desenvolveram um quadro de intervenção a vários níveis e diretrizes destinadas a colmatar estas deficiências. A carga de mortalidade cumulativa das condições de saúde mental pode ser derivada utilizando modelos de história natural que relacionam a prevalência com as taxas observadas de mortes excessivas. Estes modelos não fazem parte da estimativa da carga fatal, que atribui as mortes à causa primária (como as doenças cardiovasculares), mas os investigadores utilizaram estes modelos para mostrar que a carga de mortalidade das doenças mentais está grosseiramente subestimada. Uma análise dos dados de 2010 mostra que houve mais de quatro milhões de mortes em excesso atribuíveis a perturbações mentais, incluindo 2,2 milhões de perturbações depressivas major, 1,3 milhões de perturbações bipolares e 700.000 de esquizofrenia – em comparação com apenas 20.000 mortes por causas específicas, todas por causas específicas. esquizofrenia, calculada usando os cálculos padrão da carga de doença. Este enorme, mas oculto, fardo de mortalidade das condições de saúde mental foi rotulado como um escândalo e que contraria as convenções internacionais sobre o direito ao mais elevado padrão de saúde possível. Referência: • World mental health report: Transforming mental health for all. WHO, 2022. (https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe- mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude- mental-para-todos/). 4) ELUCIDAR O PAPEL DA ATENÇÃO PRIM ÁRIA NA PREVENÇÃO E RASTREAMENTO DAS DOENÇAS PSIQUIÁTRICAS E ABUSO DE ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS; A organização do Sistema Único de Saúde (SUS) em níveis hierarquizados, planejados e distribuídos a partir de regiões e populações definidas, considerando a singularidade de suas necessidades, está de acordo com as diretrizes colocadas pela Constituição Federal de 1998 de descentralização político-administrativa da gestão em saúde, atendimento integral, e participação das comunidades no desenvolvimento das ações. Esse modelo organizacional pressupõe uma concepção ampliada sobre a saúde: “saúde” como direito de todos os cidadãos e dever do Estado, “saúde” para além da ausência de doença. Definida pela Organização Panamericana de Saúde (OPAS) como elemento fundamental na construção de modelos de assistência mais equânimes e eficazes, a Atenção Primária à Saúde (APS) – representada pelas Unidades Básicas de Saúde (UBS), Núcleos de Apoio a Saúde da Família, Consultórios de Rua, Centros de Convivência e Cultura, entre outros – configura não só uma porta de entrada no sistema, mas um espaço privilegiado para o acolhimento da pessoa em sofrimento e para a construção de vínculo longitudinal, ambas diretrizes estabelecidas pela Política Nacional de Humanização (2003).A APS tem como atributos o acesso, a integralidade do cuidado, a oferta de cuidado ao longo do tempo (longitudinalidade) e a coordenação do cuidado, ou seja, funciona como porta de entrada no sistema de saúde em cada novo problema dos indivíduos e famílias ou nas crises de problemas crônicos. Isto é, para além de um processo de triagem e encaminhamento, cabe à atenção básica escutar ativamente as queixas trazidas pelo usuário e prestar um atendimento resolutivo, desenvolvendo um Projeto Terapêutico Singular, que leve em consideração não somente as manifestações da doença no corpo, por meio dos sintomas, mas também as representações e desejos do usuário sobre os processos que ele vive, sua rede de relações, dados epidemiológicos do território, etc. Buscando coordenar o itinerário deste usuário na Rede de Atenção à Saúde (RAS). As demandas em saúde mental são muito comuns na atenção primária. Uma investigação conduzida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) na década de 1990, confirmou uma alta prevalência dos chamados Transtornos Mentais Comuns – quadros diferentes dos comumente atendidos em ambulatórios especializados – no nível primário. Estudos a respeito desses tipos de transtornos indicam que aproximadamente 20% da população apresenta algum tipo de sofrimento psíquico que necessitaria de atenção profissional. Considerando a posição estratégica que a APS ocupa em um modelo de atenção à saúde que organiza seus serviços a partir do território em que eles se inserem, adaptando os serviços às necessidades da população, e não o contrário; o nível primário é fundamental no planejamento de ações em saúde mental eficazes e humanizadas, que estejam de acordo com os princípios do SUS e da Reforma Psiquiátrica, tendo sempre a desinstitucionalização e a autonomia do usuário como horizonte na construção de um modelo de assistência que compreenda os fenômenos de saúde e adoecimento como determinados por múltiplos fatores e por múltiplos agentes. https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe-mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude-mental-para-todos/ https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe-mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude-mental-para-todos/ https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe-mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude-mental-para-todos/ Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2023.2 Página | 9 O acolhimento, nesse sentido, não corresponde somente a uma etapa inicial do atendimento, mas deve estar presente ao longo de todo o processo de atenção à saúde. Isso implica que a Atenção Primária se responsabilize pelo acompanhamento contínuo dos usuários e suas demandas, mesmo que se verifique a necessidade de encaminhamento. Ou seja, a existência da atenção primária não substitui os serviços de atenção secundária ou terciária; pelo contrário, entende-se que deve haver uma boa articulação entre todas as instâncias da rede a fim de efetivar o cuidado integral. Contudo, o referenciamento do usuário para um serviço especializado, como o Centro de Atenção Psicossocial, não deve resultar na perda de vínculo com a APS, com o território e com a comunidade. Desse modo, dispositivos como o matriciamento das equipes de Saúde da Família por núcleos de referência, mostram-se fundamentais para a promoção de uma assistência qualificada, potencializando a responsabilização das equipes pelos casos, contribuindo para a desfragmentação entre as unidades da rede e para continuidade da adesão dos usuários ao tratamento, prezando pela autonomia destes e pelo cuidado em liberdade. Vale lembrar que a estratégia do apoio matricial vem sofrendo duros ataques por parte do governo Bolsonaro, como o corte da base de incentivo federal aos Núcleos Ampliados de Saúde da Família (NASF), ainda em 2019, e a nota técnica emitida em janeiro de 2020. Considerando os resultados de ampla investigação científica sobre a temática e experiências exitosas por parte de profissionais e usuários, entende-se a importância do papel desempenhado pela APS no cuidado em saúde mental, organizado de acordo com as propostas do Programa de Saúde da Família. Apesar de enfrentar muitos desafios, como o subfinanciamento crônico do SUS em âmbito federal e o atual cenário de flexibilização dos contratos de trabalho, ela possibilita a construção de um modelo de assistência em saúde mental que efetivamente concretize os direitos garantidos pela Constituição de 1988, em oposição à lógica manicomial presente na proposta feita pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), marcada pelo isolamento social e pela cronificação das pessoas em sofrimento psíquico. Referência: • Qual o papel da atenção primária no cuidado da saúde mental? INFORMASUS: comunicação social e científica para democratização da ciência, UFSCAR. 15 dez 2020. (https://informasus.ufscar.br/qual-o-papel-da- atencao-primaria-no-cuidado-da-saude-mental/) 5) EXPLICAR A RELAÇÃO DA PANDEMIA DO COVID -19 COM O AGRAVO DAS DOENÇAS PSIQUIÁTRICAS (INCIDÊNCIA, PREVALÊNCIA, MORTALIDADE E MORBIDADE); No primeiro ano da pandemia de COVID-19, a prevalência global de ansiedade e depressão aumentou em 25%, de acordo com um resumo científico divulgado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2022. O resumo também destaca quem foi mais afetado e mostra o efeito da pandemia na disponibilidade de serviços de saúde mental e como isso mudou durante a emergência de saúde pública. Múltiplos fatores de estresse Uma das principais explicações para esse aumento é o estresse sem precedentes causado pelo isolamento social decorrente da pandemia. Ligados a isso estavam as restrições à capacidade das pessoas de trabalhar, busca de apoio dos entes queridos e envolvimento em suas comunidades. Solidão, medo de se infectar, sofrimento e morte de entes queridos, luto e preocupações financeiras também foram citados como estressores que levam à ansiedade e à depressão. Entre os profissionais de saúde, a exaustão tem sido um importante gatilho para o pensamento suicida. Jovens e mulheres são mais atingidos O resumo, que é baseado em uma revisão abrangente das evidências existentes sobre o impacto da COVID- 19 na saúde mental e nos serviços de saúde mental, e inclui estimativas do último estudo Global Burden of Disease, mostra que a pandemia afetou a saúde mental de jovens, que correm um risco desproporcional de comportamentos suicidas e automutilação. Também indica que as mulheres foram mais severamente impactadas do que os homens e que pessoas com condições de saúde física pré-existentes, como asma, câncer e doenças cardíacas, eram mais propensas a desenvolver sintomas de transtornos mentais. Os dados sugerem que pessoas com transtornos mentais pré-existentes não parecem ser desproporcionalmente vulneráveis à infecção por COVID-19. No entanto, quando essas pessoas são infectadas, elas são mais propensas a sofrer hospitalização, doença grave e morte em comparação com pessoas sem transtornos mentais. Pessoas com transtornos mentais mais graves, como psicoses, e jovens com transtornos mentais, estão particularmente em risco. Lacunas no cuidado Esse aumento na prevalência de problemas de saúde mental coincidiu com graves interrupções nos serviços, deixando enormes lacunas no atendimento daqueles que https://informasus.ufscar.br/qual-o-papel-da-atencao-primaria-no-cuidado-da-saude-mental/ https://informasus.ufscar.br/qual-o-papel-da-atencao-primaria-no-cuidado-da-saude-mental/ Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2023.2 Página | 10 mais precisam. Durante grande parte da pandemia, os serviços para condições mentais, neurológicas e de uso de substâncias foram os mais interrompidos entre todos os serviços essenciais de saúde relatados pelos Estados Membros da OMS. Muitos países também registraram grandes interrupçõesnos serviços de saúde mental que salvam vidas, inclusive na prevenção do suicídio. No final de 2021, a situação melhorou um pouco, mas ainda em 2022 muitas pessoas continuaram incapazes de obter os cuidados e o apoio de que precisam para condições de saúde mental pré-existentes e recém- desenvolvidas. Referência: • Pandemia de COVID-19 desencadeia aumento de 25% na prevalência de ansiedade e depressão em todo o mundo. OPAS, 2022. (https://www.paho.org/pt/noticias/2-3-2022- pandemia-covid-19-desencadeia-aumento-25-na- prevalencia-ansiedade-e-depressao-em) O GBD 2020 estimou um aumento substancial de perturbações depressivas e de ansiedade como resultado da pandemia de COVID-19, tendo em conta muitas das incertezas em torno das estimativas epidemiológicas de perturbações mentais em emergências graves. Antes da pandemia, estima-se que 193 milhões de pessoas (2 471 casos por 100 000 habitantes) sofriam de perturbação depressiva grave; e 298 milhões de pessoas (3 825 casos por 100 000 habitantes) tinham perturbações de ansiedade em 2020. Após o ajuste para a pandemia de COVID-19, as estimativas iniciais mostram um salto para 246 milhões (3 153 casos por 100 000 habitantes) de perturbação depressiva major e 374 milhões (4 802 por 100 000 habitantes) para perturbações de ansiedade. Isto representa um aumento de 28% e 26% para transtornos depressivos maiores e transtornos de ansiedade, respectivamente, em apenas um ano. Em ambos os casos, os países mais duramente atingidos pela pandemia registaram os maiores aumentos na prevalência da doença. Em todo o mundo, houve um aumento maior na prevalência de doenças entre as mulheres do que entre os homens, provavelmente porque as mulheres eram mais propensas a serem afectadas pelas consequências sociais e económicas da pandemia. E, a nível mundial, registou-se também uma maior mudança na prevalência entre os grupos etários mais jovens do que entre os mais velhos, reflectindo potencialmente o profundo impacto do encerramento de escolas e das restrições sociais na saúde mental dos jovens. Referência: • World mental health report: Transforming mental health for all. WHO, 2022. (https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe- mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude- mental-para-todos/). 6) IDENTIFICAR OS DESAFIOS ATUAIS PARA O CUIDADO DOS PORTADORES DE TRANSTORNO MENTAL NO BRASIL. Conheça o cenário público político sobre saúde mental no Brasil Em nosso país, o panorama que envolve a saúde mental já passou por várias fases e mudanças significativas. No entanto, em termos de assistência concreta, ainda precisa melhorar bastante, pois há profundas lacunas que comprometem seriamente a reabilitação do paciente. A ineficiência ou a ausência de programas governamentais para essa área é um dos maiores desafios a serem vencidos. Somado a isso, há também o preconceito em relação ao estigma que prevalece desde os séculos passados em relação ao perfil dos pacientes psiquiátricos. A maioria era taxada de louca, e por isso, era vista com indiferença. Ainda que essa postura seja meramente cultural, nesse sentido, pouca coisa mudou. Muitos pacientes hesitam em procurar assistência psiquiátrica para tratar doenças associadas a transtornos psicológicos porque têm medo ou vergonha de se assumirem como pacientes da psiquiatria. Falta informação adequada. Falta educação preventiva. Ou seja, falta conhecimento sobre a realidade que envolve a verdadeira função da psiquiatria e a relevância desse campo para atenuar as comorbidades geradas por doenças de outros sistemas. De certo modo, o Governo é conivente com essa situação. Existem inúmeros programas para todas as outras áreas de prevenção, mas de saúde mental, não se vê quase nada. O que você vê de um programa de informação e prevenção sobre saúde mental? A situação é tão alarmante que o próprio Ministério da Saúde (MS) reconhece a necessidade de reforçar as medidas preventivas devido ao aumento de casos de suicídios no país nos últimos anos. Sobre depressão, ansiedade ou outras doenças psicossomáticas, não existe absolutamente nada no Brasil. Se pensarmos que 20% da população tem, teve ou terá em algum momento um quadro depressivo, ansioso, um estado de agitação intensa pela ansiedade ou síndrome do pânico, há uma população imensa que está sem nenhuma assistência. https://www.paho.org/pt/noticias/2-3-2022-pandemia-covid-19-desencadeia-aumento-25-na-prevalencia-ansiedade-e-depressao-em https://www.paho.org/pt/noticias/2-3-2022-pandemia-covid-19-desencadeia-aumento-25-na-prevalencia-ansiedade-e-depressao-em https://www.paho.org/pt/noticias/2-3-2022-pandemia-covid-19-desencadeia-aumento-25-na-prevalencia-ansiedade-e-depressao-em https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe-mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude-mental-para-todos/ https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe-mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude-mental-para-todos/ https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe-mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude-mental-para-todos/ Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2023.2 Página | 11 Também houve falhas na gestão governamental quando foi sancionada a lei 102016/2001, pois a reforma proposta era do modelo assistencial em saúde mental. Porém, a desinformação e o equívoco do MS ao entender que a lei aprovada era para fechar hospital e para proibir internação tornou-se um grande problema. Na realidade, essa lei garantia ao paciente a internação psiquiátrica, descreve quais tipos de internação deveria ter e como seria o funcionamento do hospital psiquiátrico. Mas o que aconteceu nesses últimos anos foi, praticamente, um massacre dos hospitais. Na assistência pública, eles quase desapareceram: nós saímos de 120 mil leitos em 1980 para 10 ou 12 mil leitos em todo o Brasil atualmente. Consequentemente, o maior problema foi a mudança no modelo sem uma adequação necessária, pois fecharam os leitos e acharam que a doença mental ia simplesmente desaparecer. Logo, o desinteresse da esfera pública e a falta de investimentos no setor exacerba essa questão e coloca os serviços do SUS em um estágio cada vez mais degradante no que se refere à assistência à saúde mental. A própria OMS destaca que os investimentos em saúde mental são insuficientes para atender a demanda e possibilitar a reestruturação da saúde e do bem-estar da coletividade. Estudos indicam que é necessário aumentar os recursos para haver mudanças mais concretas e alcançar as metas. Como são os cuidados em saúde mental no Brasil? Como dito anteriormente, no Brasil há dois modelos de assistência: o privado, que atende bem a expectativa dos pacientes e o público, que necessita de mais investimentos e de melhorias substanciais. Até mesmo na iniciativa privada ainda existe uma falta muito grande de leitos e de médicos psiquiatras conveniados. Muitas dessas disparidades decorrem de questões meramente administrativas, já que as falhas na gestão contribuem para acentuar esses gargalos. Um dos problemas é que a consulta psiquiátrica demora um pouco mais ou o paciente necessita de retorno. Como nem sempre o convênio aceita pagar esses extras, o especialista acaba rompendo com a instituição. Por conseguinte, isso culmina com a descontinuidade do tratamento e, às vezes, o paciente precisa recomeçar o tratamento em outro lugar e com outro profissional. Não raro, os pacientes acabam desistindo do tratamento incorrendo no risco de agravamento da doença. O que podemos esperar da saúde mental no Brasil? Primeiramente, é preciso buscar formas para combater o preconceito e o estigma que envolve o tratamento psiquiátrico. Embora nas mídias sociais já se converse bastante sobre doenças mentais, o preconceito em relação ao estereótipo desses pacientes ainda é imenso. Esse éum dos motivos que faz com que as pessoas demorem tanto para procurar o psiquiatra. Há demora na procura pelo tratamento ambulatorial e também receio de receber o diagnóstico da necessidade de uma internação, quando necessária. No serviço público, além da desinformação que alimenta o preconceito, a inexistência ou a ineficácia do serviços contribui para piorar a situação. Essas falhas sustentam a evolução das doenças mentais mais simples para os quadros de alta complexidade. Referência: • Hospital Santa Mônica. Um panorama sobre a saúde mental no Brasil. Agosto, 2019. (https://hospitalsantamonica.com.br/um-panorama- sobre-a-saude-mental-no- brasil/#:~:text=A%20inefici%C3%AAncia%20ou% 20a%20aus%C3%AAncia,ao%20perfil%20dos%20 pacientes%20psiqui%C3%A1tricos.) https://hospitalsantamonica.com.br/um-panorama-sobre-a-saude-mental-no-brasil/#:~:text=A%20inefici%C3%AAncia%20ou%20a%20aus%C3%AAncia,ao%20perfil%20dos%20pacientes%20psiqui%C3%A1tricos https://hospitalsantamonica.com.br/um-panorama-sobre-a-saude-mental-no-brasil/#:~:text=A%20inefici%C3%AAncia%20ou%20a%20aus%C3%AAncia,ao%20perfil%20dos%20pacientes%20psiqui%C3%A1tricos https://hospitalsantamonica.com.br/um-panorama-sobre-a-saude-mental-no-brasil/#:~:text=A%20inefici%C3%AAncia%20ou%20a%20aus%C3%AAncia,ao%20perfil%20dos%20pacientes%20psiqui%C3%A1tricos https://hospitalsantamonica.com.br/um-panorama-sobre-a-saude-mental-no-brasil/#:~:text=A%20inefici%C3%AAncia%20ou%20a%20aus%C3%AAncia,ao%20perfil%20dos%20pacientes%20psiqui%C3%A1tricos https://hospitalsantamonica.com.br/um-panorama-sobre-a-saude-mental-no-brasil/#:~:text=A%20inefici%C3%AAncia%20ou%20a%20aus%C3%AAncia,ao%20perfil%20dos%20pacientes%20psiqui%C3%A1tricos