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Diferenças entre Resumo e Resenha - LINGUISTICA E LITERATURA

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Diferenças entre Resumo e Resenha
Juliene Barros UFRPE/UAG
1. Produção de linguagem e re-textualização
Dizer de novo não é nunca repetir. 
(Schneider)
Todo e qualquer falante de linguagem possui uma capacidade sócio-comunicativa expressa por meio de uma competência textual que envolve as habilidades de leitura e de produção escrita, em gêneros diversos. Essa mesma capacidade que permite ler, escrever textos e adequá-los às situações de interação, possibilita aos sujeitos transformarem os textos de acordo com as exigências de comunicação. No âmbito de uma teoria do texto, pode-se pensar essa competência como fruto de três capacidades básicas:
Capacidade formativa, que permite ao sujeito produzir e compreender um número potencialmente elevado e ilimitado de textos inéditos e que também lhe possibilita a avaliação da boa ou má formação de um texto dado;
Capacidade transformativa, que o torna capaz de reformular, de parafrasear e resumir um texto dado, bem como avaliar a adequação do produto dessas atividades em relação ao texto a partir do qual a atividade foi executada;
Capacidade qualificativa, que lhe confere a possibilidade de tipificar um texto dado, isto é, dizer se é uma descrição, narração, argumentação etc., e também produzir um texto de tipo particular.
Tratando especificamente da capacidade transformativa, podemos considerar mais um aspecto a ela relacionado, explicitando que a habilidade de transformar um texto em outro culmina numa atividade de re-textualização, ou seja, de pôr um texto, lido ou ouvido, em outro formato textual. Atividades de re-textualização são usuais, bastante automatizadas, por meio delas tornam-se possíveis sucessivas transformações de um mesmo texto, dadas por variações de registro, de gêneros, de estilo e outras. Exemplos dessas atividades podem ser dados com a escrita de uma ata de reunião, uma carta ditada para a secretária, o reconto de uma leitura de jornal ou revista, a anotação escrita feita por um aluno com base em uma aula, etc.. 
As formas de resumo e resenha constituem-se como atividades de re-textualização que põem em jogo a capacidade transformativa dos sujeitos e operam com uma atividade cognitiva primordial - a de sumarização. A atividade de sumarização, característica de toda e qualquer forma de resumo e de resenha, baseia-se fundamentalmente na compreensão; portanto resumir ou resenhar não é simplesmente traduzir um texto em outro, ou transcodificá-lo, mas compreender as idéias centrais de um texto e re-textualizá-lo, colocá-lo em outro formato adequado à situação comunicativa.
A capacidade transformativa mobilizada no caso de resumos e resenhas dá origem a dois tipos textuais básicos, a depender da postura do escrevente em relação a um texto-base: se executa uma re-textualização sem avaliação; ou, se, diferentemente, a faz seguida de uma avaliação. Nisso repousa a diferença básica entre resumo, que constitui textos indicativos e informativos, portanto, de tipologia expositiva, e resenha, que é um texto opinativo, estruturado em tipologia argumentativa. Trata-se, tanto em um caso quanto em outro, de um exercício de re-textualização, de uma re-escrita ou meta-escrita. Disso decorre a possibilidade de considerar resumos e resenhas como meta-textos, textos sobre outros textos, aos quais devem fidelidade, mas que ao mesmo tempo devem ser auto-suficientes do ponto de vista informativo. 
	
2. Resumo
Serenata sintética
lua morta
rua torta
tua porta.
 Cassiano Ricardo
A prática de resumo está presente nas mais diversas atividades do cotidiano, como no reconto de fatos diários ou na divulgação de filmes e livros em mídias diversas. No ambiente escolar, o resumo, que é também bastante diverso quanto às formas e às funções, adquire um duplo estatuto: é uma técnica de estudo, por parte do aluno, e também uma forma de verificação da capacidade de leitura e de escrita do aluno, por parte do professor, sendo, neste caso, um instrumento de avaliação. Resumir, neste contexto, é fazer a apresentação dos pontos relevantes de um texto (seja ele oral ou escrito).
	A variação das formas de apresentação do resumo depende dos propósitos de quem resume, dos objetivos do texto a ser resumido e do tipo de conteúdo que se quer resumir. Uma tentativa de catalogar as variações é propor uma taxonomia que os separa em resumos esquemáticos e resumos não-esquemáticos.
2.1. Resumos esquemáticos
A característica básica de um resumo esquemático é não possuir disposição discursiva; não se trata de um texto contínuo e sim de uma disposição esquemática, como o próprio nome indica. A este tipo pertencem o sumário e o esquema.
O sumário corresponde a uma enumeração de títulos e seções, respeitando sempre a ordem de apresentação no texto e apresentando a página em que se inicia cada seção. É um elemento pré-textual, ou seja, antecede o texto propriamente dito e tem natureza remissiva. Há variações quanto às formas de apresentação de um sumário, podendo haver sumários numéricos, alfanuméricos e ainda constituídos de sistemas hierárquicos. 
Exemplo de sumário com apresentação numérica:
	PROJETO DE PESQUISA
INTRODUÇÃO____________________04
OBJETIVO_______________________ 05
 OBJETIVO GERAL______________05
OBJETIVO ESPECÍFICO___ ______06
JUSTIFICATIVA_________________08
METODOLOGIA_________________09
MATERIAIS_____________________10
CRONOGRAMA_________________12
PLANILHA DE CUSTOS__________14
 8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS__16
Exemplo de sumário com apresentação alfanumérica:
	LINGUISTICA TEXTUAL
Introdução....................................................01
I – COESÃO TEXTUAL:
 A) Lexical..............................................07
 B) Gramatical.......................................09
 C) Referencia........................................13
 D) Sequência.........................................15
II – COERÊNCIA TEXTUAL..................20
 A) Contextualidade.............................25
 B) Intertextualidade...........................26
 ...
Exemplo de sumário com sistema numérico em níveis hierárquicos:
	Capítulo IV
TRABALHANDO NA INTERFACE
4. Entre o texto e o discurso: a autoria............................................................149
4.1. Onde estariam, então, os autores?..............................................158
4.1.1. A emergência da autoria nos textos infantis.............159
4.1.1.1. Organizando o texto...................................160
4.1.1.2. Entrando pelos gêneros.............................167
4.1.1.3. (Sobre) saindo pelo estilo...........................179
4.2. O que sistematizar sobre a autoria?...........................................200
Apêndice I: A eloqüência da marginalia ............................205
Apêndice II: Sobre autoria na oralidade............................221
O esquema apresenta as idéias hierarquizadas e encadeadas, mas não necessita de números de páginas, pois não tem por função estabelecer a localização de dados, e sim fornecer uma visão geral, hierárquica, que pode ser total ou parcial. Assim, pode contemplar toda uma obra, como também pode restringir-se a um capítulo, ou seção. O esquema sofre variações em relação à forma de apresentação e em relação ao produtor de texto. O produtor pode ser o próprio autor, com o objetivo de orientar o leitor; ou outro leitor, fazendo uma leitura analítica ou como um recurso de memorização. Os modos de apresentação variam conforme se opte pelo uso de chaves, diagramas, sistema numérico, alfabético alfanumérico, quadros, tabelas, gráficos.
Exemplo de esquemas feito por meio de chaves:
	
resumo
	
 esquemático
 
não- esquemático
	
sumário
esquema
	 numéricos
 alfanuméricos
 sistemas
 chaves
 diagramas
 quadros
	
	
	
 síntese
 sinopse
Exemplo de resumo esquemático em diagramas:
 �
Exemplo de resumo esquemático emtabela:
PARÂMETROS DE NORMALIDADE DA PRESSÃO ARTERIAL
	
ANO
	
PRESSÃO
	
AVALIAÇÃO
	1994
	- 16/9
	normal
	1998
	-14/9
	normal
	2002
	-12/8
	ótima
	
2003
	12/8 ( 14/9
	pré-hipertensos
	
	-12/8
	normal
 Revista Veja, 04 de maio de 2005, p.92.
2.2. Resumos não-esquemáticos
 	
Os resumos não-esquemáticos são a sinopse e a síntese. Consistem na apresentação sintética dos pontos importantes de um texto e caracterizam-se por sua elaboração em forma discursiva. Tal como acontece com os resumos não-esquemáticos, estes podem ser também parciais ou totais, conforme recubram um texto inteiro ou apenas partes dele. Como são escritos em texto contínuo, oferecem mais dificuldades que os resumos não-esquemáticos, pois, em sua elaboração, são exigidos, além de conhecimentos teóricos relacionados ao assunto resumido, conhecimentos de escrita relativos à elaboração do texto. 
	Sinopse é a apresentação reescrita de um texto. É usada como elemento pré-textual em artigos, teses, ensaios e outros, quando escrito em apenas um idioma; quando escrito em mais de um idioma, aparece também como elemento pós-textual. Pode ser feita pelo próprio autor ou por editores. A sinopse é considerada um resumo indicativo, um convite à leitura; por meio dela, o leitor decide se vai ou não ler o texto maior. Sua extensão não deve conter mais de 3 a 5% do texto-base. Embora seja uma forma importante de resumo, a sinopse não constitui material de estudo, pois é um texto apenas indicativo. Por isso mesmo, é usada em editoriais de jornal, em divulgações de filmes, livros e outros.
Exemplo de sinopse em programa de disciplina acadêmica:
	EMENTA
Enfoque da natureza sócio-histórica das realidades significantes em seus aspectos ideológicos e discursivos como subsídio para a abordagem da discursivização específica de práticas sociais marcadas ideologicamente como as que emergem no domínio pedagógico e escolar.
 Ideologia, Discurso e Prática Pedagógica. UFRPE/UAG.
Síntese é a apresentação concisa e seletiva de um texto, pondo-se sempre em evidência os elementos de maior importância. É feita, comumente, por outra pessoa e não pelo próprio autor, contendo uma condensação do conteúdo que deve expor finalidades, metodologia, objetivos, resultados, conclusões. A síntese é, de todas as formas de resumos apresentadas, a mais indicada como material de estudo, por parte do aluno, e como meio de avaliação, por parte do professor. É um texto informativo, constituído por meio de paráfrases, revisões, explicações e não um simples convite à leitura. Nela são imprescindivelmente necessários conhecimentos de escrita, como a coesão e o encadeamento das idéias no texto. Por seu caráter mais informativo, a síntese pode ter extensão entre 10 a 50% do texto-base.
Exemplo de síntese de um artigo de opinião:
	SÍNTESE
O governo sustenta a idéia de que tem realizado uma política externa eficiente, autônoma, identificada como “de esquerda”, firmando, deste modo, uma independência em relação à grande Potência Econômica Mundial – os Estados Unidos. Já o autor do texto defende que, apesar de todo o empenho do governo brasileiro de divulgar uma suposta autonomia e de tentar buscar outras relações, o que há de concreto, em sua política externa, são as relações com os Estados Unidos. Esses pontos de vista são constituídos no texto por meio do par opositivo Fantasia x Realidade: as afirmações da parte do governo são tratadas como fantasiosas; e, em oposição a elas, o autor considera o que acontece na realidade.
 		A jóia da coroa. Roberto Pompeu de Toledo Revista Veja, 04 de maio de 2005, p. 204.
Feita a apresentação das diferentes formas de resumo, é possível reiterar que a operação cognitiva que está na base de todas elas é a de sumarização, e acrescentar que a qualidade máxima de um resumo deve ser a fidelidade ao texto-base, independentemente da forma adotada e da extensão. Por mais que seja previsível, é importante advertir ainda que nenhuma forma de resumo pode ser maior que o texto-base.
Em todo e qualquer resumo, o produtor do texto opera com regras de redução, por meio das quais a atividade de sumarização se efetiva. Mas esta não a única regra: tão importante quanto ela é a regra de construção, que vai jogar decisivamente na re-elaboração do novo texto, ou seja, na re-textualização. Uma re-textualização voltada para a produção de resumos tem que ter como característica fundamental a objetividade, pois o resumo não deve conter comentários, avaliações, apreciações de quaisquer natureza - para isto servem as resenhas.
3. Resenha
Cidadezinha qualquer
Casas entre bananeiras
mulheres entre laranjeiras
pomar amor cantar.
Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.
Devagar... as janelas olham.
Eta vida besta, meu Deus.
Carlos Drummond de Andrade.
A resenha é um texto de comentário e não simplesmente um resumo. Nela deve constar, além do resumo em si, a avaliação da obra resumida. 
	Tal como os resumos não-esquemáticos, as resenhas têm disposição discursiva e, em sua apresentação, devem ser levados em conta aspectos diversos.
A identificação da obra a ser resenhada e a contextualização da obra e do autor, incluindo dados de formação e de atuação profissional, pois isso geralmente dá credibilidade ao texto e funciona como um convite à leitura. Essa contextualização da obra pode ser feita de forma indireta e dispersa no texto, não necessitando contar em tópico específico. 
Exemplos de introduções de resenha:
	O jornalista Eduardo Bueno, em A viagem do Descobrimento – a verdadeira história da expedição de Cabral (objetiva, 144 págs., R$ 16,00), adotou como perspectiva narrativa o cotidiano de cerca de 1.5000 embarcados na frota cabralina.
	A precariedade das nossas escolas cria fenômenos curiosos. A viagem do Descobrimento (Editora Objetiva, 137 págs., R$ 16,00) do jornalista Eduardo Bueno, entrou para a listados mais vendidos.
 
Síntese descritiva da obra ou texto. Nesta, devem constar todos os dados importantes, em seqüência e na ordem em que aparecem no texto. Por exemplo, se o livro contém quatro capítulos, cada um deve ser resumido independentemente e todos devem ser articulados na construção da resenha.
Exemplos de sínteses descritivas:
	O autor descreve os tipos embarcados na esquadra, conta quem eram os pilotos da frota e os capitães de cada nau, revela a complexa hierarquia a bordo (...), mostra como era a comida servida nas naus e quanto ganhavam os marinheiros, além das doenças comuns das viagens (...)
	O livro é uma espécie de supletivo sobre o Brasil.
 
Avaliação ou apreciação da obra resumida. Concluída a parte descritiva, passa-se à parte argumentativa, que constitui a resenha propriamente dita.
Exemplo de avaliação em uma resenha:
	(...) De análise nem se fala. Não há o anticolonialismo dos marxistas. Não há a atenção ao cotidiano da micro-História. Não há a indignação moral de um Caio Prado. Não há a fixação sexual de um Gilberto Freire, tanto que até Caramuru é apresentado como monógamo. Ou seja, é uma história asséptica, de múltipla escolha, sem riscos, em que o passado não tem influencia sobre o presente. (...)
É preciso deixar claro que estas orientações servem aos aprendizes de resenha, como os aspectos que devem ser considerados, mas o resenhista proficiente trata essas questões todas de modo mais indireto e menos pontual. Isso deve até ocorrer porque toda a escrita de uma resenha deve ser o mais independente possível da escrita do autor, embora, na parte descritiva, que é o resumo, deva manter-se fiel às idéias do texto base. 
	Enumerados os passos de uma resenha, a sua macroestrutura, conforme se diz teoricamente, é preciso considerar aspectos de sua microestrutura, ou seja, pontos relacionados à articulação do texto. Neste domínio, destacam-se os seguintes aspectos:
A coesão textual, em função da qual se deve atentar para a articulação entre as partes do texto e o uso adequadodos itens gramaticais com função coesiva, seja de retomada ou e progressão, como pronomes, conjunções, além da pontuação. Neste domínio, deve-se dar atenção à recuperação das relações lógicas estabelecidas no texto e às conjunções necessárias para retomá-las no texto da resenha; assim como é importante a apreensão dos atos de fala e dos propósitos do autor do texto–base, o que pode ser reproduzido na resenha pelo uso eficiente dos chamados verbos de elocução, ou dicendi.
A coerência textual, princípio que trata da unidade de sentidos de um texto e de sua adequada relação com o contexto e com o intertexto. Nesse sentido, são imprescindíveis não apenas a recuperação do propósito central do texto-base e de suas idéias acessórias, como também a situação do texto no contexto teórico e prático da obra, ou seja, no horizonte conceitual no qual ela se inscreve e no horizonte prático ao qual ela se destina. Sobre o intertexto, é importante que o resenhista tenha domínio de outras obras do campo em que se inscreve a resenha, para relacionar, comentar, comparar, enfim, estabelecer as relações intertextuais que constituem todo e qualquer texto e que se expressam de modo especial em textos de comentário, pois servem de base argumentativa (a exemplo da argumentação fundamentada em argumento de autoridade).
Aí estão algumas considerações básicas sobre resumos e resenhas e sobre os modos de confecção desses dois textos específicos. Esperamos estar contribuindo com os alunos que, iniciando seu contato com a escrita científica, precisam desenvolver técnicas de estudo. De igual modo, desejamos contribuir com outros leitores, que, contemporâneos desta época em que se vive o chamado império das comunicações e da fragmentação do conhecimento, necessita de técnicas de seleção e de otimização das muitas leituras a que estão expostos.
resumo
esquemático
não-esquemático
sumário 
esquema
síntese
sinopse

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