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Texto Aula - 23 2011 Miriam PEDilma

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A Política Externa do governo de Rousseff: continuidade nas estratégias e ajustes 
nas prioridades e no estilo 
 
Publicado em: Umbrales de América del Sur n. 12. Buenos Aires, CEPES, abril-
julho/2011. 
 
Miriam Gomes Saraiva 
Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais/Universidade do Estado do 
Rio de Janeiro 
miriamsaraiva@uerj.br 
 
 
Em termos gerais, a política externa brasileira é identificada pela continuidade. 
Como pano de fundo para esta perspectiva, pode ser identificado, por um lado, um 
discurso político da diplomacia brasileira que defende a continuidade e, por outro, algumas 
crenças que orientam sua evolução há muitos anos: a autonomia, a ação universalista e a 
idéia de que o país virá a ocupar um lugar de mais destaque na política internacional. A 
forte concentração do processo de formulação da política externa com a presença do 
Itamaraty enquanto burocracia especializada contribuiu para um comportamento mais 
estável pautado em princípios de longo prazo. 
Mas esta perspectiva convive com descontinuidades. As opções podem orientar-
se para estratégias de caráter mais multipolar ou de buscar ganhos relativos no cenário 
internacional; para preferências por atuação mais autônoma ou por liderar iniciativas de 
países do Sul; para um comportamento do país como skateholder ou como revisionista 
soft.1 Nestes casos, as alternativas são definidas a partir do contexto internacional, da 
estratégia de desenvolvimento nacional, do perfil e de determinados cálculos dos 
formuladores de política externa que variaram de acordo com a visão política e a 
percepção destes formuladores do que seriam os interesses nacionais e a conjuntura 
internacional. Estes fatores têm influência sobre a escolha das estratégias externas por 
parte da diplomacia brasileira. 
 Nos marcos do Itamaraty, encontram-se basicamente duas correntes de 
pensamento com percepções diferentes sobre estratégias e parcerias externas. Os 
 
1
 Maria Regina Soares de Lima, expondo sobre “As bases conceituais da Política Externa Brasileira” no 
Seminario Iniciativa México Brasil, LACC/FIU, Miami, 13 de maio de 2010. 
institucionalistas pragmáticos, predominantes durante o governo de F.H.Cardoso, 
caracterizam-se por dar maior importância ao apoio do Brasil aos regimes internacionais 
em vigência. Esta postura defende uma identificação maior do país com o Ocidente 
como um cenário favorável ao desenvolvimento econômico brasileiro. A corrente 
autonomista, que se consolidou como principal formulador da política externa durante o 
governo de Lula, busca uma projeção mais autônoma e proativa do Brasil na política 
internacional. Eles defendem uma reforma da dinâmica das instituições multilaterais no 
sentido de criar espaços de atuação para o país assumindo assim um perfil revisionista 
da ordem internacional. A construção da liderança regional, de uma liderança entre 
países do Sul e a ascensão para a posição de potência global são seus objetivos 
principais. No campo econômico buscam uma estratégia de inserção internacional 
orientada para o intercâmbio tecnológico e para a projeção de empresas brasileiras. 
A ascensão de Lula reforçou setores mais tradicionais dos autonomistas 
formados nos marcos do pragmatismo responsável dos anos de 1970 e incorporou ao 
processo de formulação de política externa uma nova corrente de pensamento vinculada 
a quadros internacionalistas do PT. Durante o governo de Lula este grupo estabeleceu 
um diálogo importante com o Itamaraty através da figura do presidente, que teve um 
forte desempenho no campo da diplomacia. Para estes pensadores, a integração regional 
com base em uma identidade sulamericana seria vista como prioridade da política 
externa. 
Esta composição trouxe uma descontinuidade na visão de mundo e nas 
estratégicas adotadas pela diplomacia brasileira, levando o país a um movimento de 
fortalecimento de sua presença internacional no papel de global player. 
 
Governo Lula: a ascensão do Brasil na política internacional e a América do Sul 
 
A política externa do governo de Lula foi marcada por uma descontinuidade na 
visão de mundo, nas estratégicas adotadas e alternativas de parcerias em relação ao 
período anterior. Em termos econômicos, sua gestão foi introduzindo progressivamente 
no decorrer dos dois mandatos elementos próprios ao desenvolvimentismo, como as 
iniciativas para o reforço da infraestrutura e um projeto de fortalecimento da 
industrialização com perspectivas de avanços tecnológicos em algumas áreas. 
Externamente empreendeu uma política forte de busca de mercados para as exportações do 
país dando prioridade para parceiros emergentes e para exportação de bens completos, 
assim como para acordos de cooperação tecnológica de diferentes matizes. 
A ascensão da corrente autonomista diminuiu a convicção nos regimes 
internacionais, que foi substituída por um comportamento ativo com vistas a modificá-
los em favor dos países do Sul ou em benefício próprio. A ideia de trazer junto a si 
outros países do Sul, emergentes ou de menos recursos, serviu de base para a atuação 
internacional do país. A liderança regional na América do Sul tornou-se um objetivo e, 
ainda mais, uma vontade político da presidência. 
A construção desta liderança regional apoiou-se em uma articulação entre os 
autonomistas do Itamaraty e o grupo vinculado ao PT. A aproximação com os países 
vizinhos é percebida pelos autonomistas como o instrumento para melhor inserção 
internacional, que possibilita a realização do potencial brasileiro e a formação de um 
bloco capaz de exercer maior influência internacional. Também abriria caminhos para a 
projeção das indústrias brasileiras na medida em que estas pudessem ocupar espaços 
vazios decorrentes das limitações das indústrias dos países vizinhos. Para os pensadores 
do partido do presidente, seria importante que o Brasil assumisse o papel de paymaster 
do processo de integração na região e frente a países vizinhos com governos anti-
liberais. 
Grosso modo, o resultado foi uma assunção progressiva por parte da diplomacia 
brasileira do papel de paymaster, junto com uma busca pela construção de consensos 
políticos entre seus pares frente a temas que afetam a região. Com este objetivo, a 
diplomacia brasileira deu um novo peso à construção de uma liderança brasileira na 
região com padrões calcados no reforço do multilateralismo (com destaque para a 
Unasul). Atualizou os princípios da não intervenção na forma da “não-indiferença” e 
vinculou iniciativas de cooperação e integração regional com incentivos ao 
desenvolvimento brasileiro. A cooperação técnica com vizinhos de menos recursos, 
calcada em diferentes agências de governo, e os investimentos implementados através 
de financiamento de obras de infraestrutura com recursos do BNDES cresceram. E 
contribuíram para avanços, limitados, na construção de uma infraestrutura regional. 
 O Mercosul, por seu turno, deixou de ter um papel importante na estratégia 
brasileira global podendo ser visto dentro da perspectiva sulmaericana. Embora haja 
enfrentado problemas na dimensão comercial, a cooperação entre diferentes ministérios 
(educação, cultura, energia, ciência e tecnologia) cresceu no período. O processo de 
integração com os vizinhos ao sul seguiu sendo uma política de estado calcada na 
manutenção de laços de cooperação com a Argentina. 
 
Novas expectativas com o governo de Dilma Rousseff 
 
 Em seus três primeiros meses, o governo de Dilma Rousseff parece significar a 
manutenção das estratégias de política externa do governo anterior: a trajetória 
revisionista frente às instituições internacionais, a atuação como representante dos 
países do Sul e a liderança regional. Referências à continuidade vêm sendo recorrentes 
no discurso diplomático. Os autonomistas, em termos gerais, mantiveram sua 
predominância dentro do Itamaraty, embora dando lugar a gerações maisjovens com 
uma visão de mundo mais globalizada. A estratégia econômica de traços 
desenvolvimentista vem sendo aprofundada. E a ampliação do número de agências de 
governo que participam das ações de política externa –como nos casos da cooperação 
técnica e investimentos- garante maior estabilidade à política. O diálogo entre ações 
empresariais e o governo que existe atualmente no cenário externo também contribui 
para a continuidade.2 
Mas sua trajetória já começou a mostrar inflexões no que diz respeito ao 
processo de formulação de política externa e ajustes em sua implementação. Vigevani e 
Cepaluni defendem a existência de modificações na política externa a nível de 
“mudança de tonalidade e de ênfase (ajustes)”, que não chegam necessariamente a 
alterar a forma de inserção internacional do país.3 O argumento aqui defendido é que, 
embora haja continuidade na utilização da política externa como instrumento para 
conseguir insumos para o desenvolvimento, assim como na visão de mundo e na 
estratégia de inserção externa revisionista seguida durante o governo de Lula, há ajustes 
de ênfase e de estilo. 
 No que diz respeito à formulação da política externa, existe uma tendência do 
Itamaraty recuperar a centralidade, em detrimento do grupo aqui identificado como 
vinculado ao PT. A diplomacia presidencial se está reduzindo, assim como o papel da 
presidência como elemento equilibrador de diferentes visões de política externa que 
 
2
 Ver o artigo de Mônica Hirst, Maria Regina Soares de Lima e Letícia Pinheiro publicaram recentemente 
um artigo que traz reflexões importantes sobre as novos padrões e atores da política externa brasileira. A 
Política Externa Brasileira em tempos de novos horizontes e desafios, OPSA, Análise de Conjuntura n.12, 
dez./2010. Disponível em http://www.opsa.com.br/analises.php. 
3
 Vigevani, Tullo & Cepaluni, Gabriel. A política externa de Lula da Silva: a estratégia da 
autonomia pela diversificação. Contexto Internacional vol 29 n.2., jul.dez./2007, p.293-335. 
aconteceu durante o governo anterior. Isto reduz o espaço para maior intercâmbio de 
posições e percepções. No interior da corrente autonomista, por seu turno, os grupos 
que ascenderam a cargos decisórios têm menos resistência a uma identificação com o 
Ocidente o e dão preferência a um comportamento mais pragmático frente a temas 
polêmicos que marcam a política internacional.4 Esta mudança já é identificada por 
artigos de imprensa, e há um debate público sobre as possíveis descontinuidades. 
 No campo das ações, em termos mais globais, os ajustes da política externa se 
fazem sentir na defesa dos direitos humanos que, durante o governo de Lula, foi 
preterida em nome de outras prioridades. O voto brasileiro a favor de investigações de 
denúncia de violações destes direitos no Irã e na Síria aponta para a nova preferência do 
governo de Dilma.5 As relações com os Estados Unidos, embora sem mudanças em seu 
conteúdo, ganharam um tom mais pragmático e a disposição de superar alguns 
obstáculos que afastam os dois países. 
 Em relação à América do Sul, embora não haja havido posições diferentes, já é 
possível identificar a perda de importância no espectro da nova política externa 
brasileira. Na medida em que lideranças políticas simpáticas a governos anti-liberais 
perdem capacidade de influir sobre o comportamento externo do país, as ações 
brasileiras na região vão assumindo um caráter mais pragmático e de mais baixo perfil. 
A prioridade da construção de uma liderança na região cede espaço para a construção de 
outro tipo de liderança mais ampliado, aonde a diplomacia brasileira concentra seus 
esforços na construção de uma liderança brasileira em um cenário maior – entre países 
sulamericanos e também africanos, de menos recursos. 
No entanto, o processo de articulação entre países sulamericanos, e os vínculos 
bilaterais brasileiros com países vizinhos através da cooperação técnica e financeira 
estão estabelecidos e ramificados por diferentes esferas governamentais dando um 
caráter de mais longo prazo para as políticas brasileiras para a região. Com menos vigor, 
os avanços no campo da integração regional conseguidos no período de Lula estão 
tendo continuidade. Durante estes primeiros meses não houve uma crise na região que 
pusesse a prova a atuação da diplomacia brasileira. 
 Em relação ao Mercosul, a posição adotada durante o governo de Lula vem 
sendo mantida: não é prioridade, mas sua defesa é uma política de estado. Os avanços 
devem se concentrar em áreas não-comerciais, e se buscará espaços para a expansão 
 
4
 Comportamentos percebidos como eficientes é um dos principais pilares do governo de Dilma Rousseff. 
5
 Embora lideranças políticas do PT evitam aceitar que haja mudanças de rumo. 
industrial e o desenvolvimento de infraestrutura. É fundamental manter estreitos laços 
de cooperação com a Argentina que evitem o renascimento de qualquer tipo de 
rivalidade que pode provocar danos nas estratégias brasileiras. 
 
A guisa de conclusão 
 
 Com três meses de mandato ainda é cedo para se fazer uma análise mais 
detalhada da política externa mas, ao que tudo indica, a continuidade de suas principais 
estratégias convive já com ajustes. Mas o mais relevante de ser ressaltado, por ora, é o 
fato da política externa brasileira ter entrado no governo de Dilma Rousseff como uma 
política que desperta interesse na sociedade civil, incorpora um maior numero de atores 
e temas, e é avaliada em sua essência pelos meios de comunicação. Apesar da tendência 
do Itamaraty de recuperar um papel mais central na formulação da política externa, a 
ideia histórica de uma política externa encapsulada e formulada dentro de uma 
burocracia fechada cedeu lugar a uma política própria dos regimes democráticos, mais 
aberta para o debate político. Neste caso, as mudanças de rumo –e sobretudo os ajustes- 
serão sempre mais passíveis de acontecer.

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