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Marx e Hegel

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UFRJ 
 
 
A CRÍTICA DA FILOSOFIA DO DIREITO DE HEGEL COMO MATÉRIA PRIMA 
DA TEORIA POLÍTICA DE MARX EM 1843 
 
 
Wellington Trotta 
 
 
 
 
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa 
de Pós-graduação em Ciência Política, Instituto de 
Filosofia e Ciências Sociais, da Universidade Federal 
do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos 
necessários à obtenção do título de Mestre em 
Ciência Política. 
 
Orientador: Aluízio Alves Filho 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
Dezembro de 2004
 ii
A CRÍTICA DA FILOSOFIA DO DIREITO DE HEGEL COMO MATÉRIA PRIMA DA 
TEORIA POLÍTICA DE MARX EM 1843 
 
Wellington Trotta 
 
Orientador: Aluízio Alves Filho 
 
 
Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em 
Ciência Política, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, da Universidade Federal do 
Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título 
de Mestre em Ciência Política. 
 
Aprovada por: 
 
___________________________________ 
Presidente, Prof. Aluízio Alves Filho 
 
___________________________________ 
Prof. Antonio Celso Alves Pereira 
 
___________________________________ 
Prof. Charles Pessanha 
 
___________________________________ 
Prof. Ivair Coelho Lisboa R. N. Itagiba Filho 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
Dezembro de 2004
 iii
 
 
 
 
 
 
 
Trotta, Wellington. 
A Crítica da Filosofia do Direito de Hegel como matéria 
prima da teoria política de Marx em 1843./ Wellington Trotta. 
- Rio de Janeiro: UFRJ/ IFCS, 2004. 
vi, 140f.: 31 cm. 
Orientador: Aluízio Alves Filho 
Dissertação (mestrado) – UFRJ/ IFCS/ Programa de Pós-
Graduação em Ciência Política, 2004. 
Referências Bibliográficas: f. 129-133. 
1. Estado. 2. Política. 3. Idealismo. 4. Materialismo. 5. 
Hegelianismo e instituições. I. Alves Filho, Aluízio. II. 
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Filosofia 
e Ciências Sociais, Programa de Pós-graduação em Ciência 
Política. III. A Crítica da Filosofia do Direito de Hegel como 
matéria prima da teoria política de Marx em 1843. 
 
 
 
 iv
RESUMO 
 
A CRÍTICA DA FILOSOFIA DO DIREITO DE HEGEL COMO MATÉRIA PRIMA DA 
TEORIA POLÍTICA DE MARX EM 1843 
 
Wellington Trotta 
 
Orientador: Aluízio Alves Filho 
 
Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-
graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, 
como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Ciência 
Política. 
 
O objetivo da presente da presente dissertação é analisar dentro da Crítica 
da Filosofia do Direito de Hegel, o entendimento de política, Estado e suas 
instituições no pensamento de Karl Marx em 1843, quando redige suas anotações 
críticas sobre o livro Filosofia do Direito de Georg Wilhem Friedrich Hegel. Destaca-
se que o centro da discussão é saber a relevância do Estado enquanto elemento 
capaz de operar a inversão social sobre o político, contraposto ao pensamento 
político ociental que coloca a dimensão social subordinada à política, com isso 
destacando o Estado como elemento fundamental dentro da sociedade moderna. 
 
Palavras-chave: estado, política, idealismo, materialismo, hegelianismo e 
instituições. 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
Dezembro de 2004
 v
ABSTRACT 
 
A CRÍTICA DA FILOSOFIA DO DIREITO DE HEGEL COMO MATÉRIA PRIMA DA 
TEORIA POLÍTICA DE MARX EM 1843 
 
Wellington Trotta 
 
Orientador: Aluízio Alves Filho 
 
Abstract da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-
graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, 
como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Ciência 
Política. 
 
The goal of this research is an analysis of Karl Marx´s thought on politics, 
State and its institutions, produced during his studies about Georg Wilhem Friedrich 
Hegel and the legal philosophy in 1843. The objective of the present work is to 
search State while capable to operate the inversion of the social one on the 
politician, what politician opposes itself to the thought occidental person, who 
places the social dimension subordinate to the politics, with this detaching the State 
as basic element inside of the modern society. 
 
Key words: state, politics, materialism, idealism, hegelianismo and institutions. 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
Dezembro de 2004
 vi
AGRADECIMENTOS 
Primeiramente desejo agradecer a todo corpo docente do Programa de Pós-
Graduação de Ciência Política do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da 
Universidade Federal do Rio de Janeiro, pelos conhecimentos construídos e 
transmitidos através do diálogo, pelas mãos pacientes dos professores Valter 
Duarte, Izabel de Oliveira, Antônio Celso, Eli Diniz, Aluízio Alves Filho e Charles 
Pessanha. 
Agradeço especialmente ao meu orientador, Prof. Aluízio Alves Filho, que no 
processo de elaboração da presente dissertação, sempre esteve presente e, mais 
do que isso, nunca se negou a discutir os pontos nevrálgicos da pesquisa, em que, 
com sua atenção às indagações apresentadas, mostrou-se sempre tranqüilo face ao 
seu reconhecido cabedal teórico. Agradeço também ao meu segundo orientador, 
Prof. Charles Pessanha, pelos conselhos oportunos que foram incorporados ao 
trabalho, sem sombra de dúvida melhorando-o consideravelmente. 
Agradeço aos amigos de turma André Pellicione, Fabrício Neves e Luis 
Penteado pelo incentivo nos momentos difíceis em que a pesquisa se completava. 
Preciso destacar o carinho, a compreensão e as dificuldades pelas quais 
minhas mulher e filha passaram no processo de elaboração da presente 
dissertação. A elas e aos meus pais, dedico este trabalho. 
 vii
SUMÁRIO 
Introdução 1 
Capítulo 1. Sobre Marx e Hegel: breve histórico 5 
Hegel 
Marx 
Capítulo 2. O Pensamento político de Hegel 14 
Os principais elementos da filosofia hegeliana 
Filosofia do Direito: o político no sentido de Hegel 
Família, Sociedade Civil e Estado 
A Constituição, poderes políticos e o papel da burocracia 
A burocracia: função do Estado 
Hegel: propriedade e a propriedade privada 
O problema da representação política 
Capítulo 3. Marx e a crítica ao idealismo hegeliano 55 
Feuerbach, uma influência decisiva sobre Marx 
A inversão do método filosófico-especulativo pelo método filosófico-
histórico 
 
Capítulo 4. O pensamento político de Marx no limite da Crítica de 1843 69 
Família, sociedade civil e Estado 
Constituição 
Soberania e poder soberano 
Poder governativo e a burocracia 
O poder legislativo 
Marx e a propriedade privada 
Democracia como oposição à monarquia 
Conclusão 124 
Referências bibliográficas 129 
 
Introdução 
O propósito que anima a presente dissertação é analisar dentro da Crítica da 
Filosofia do Direito de Hegel,1 o entendimento de política, Estado e suas instituições 
no pensamento de Karl Heinrich Marx (1818-1883) em 1843, quando redige suas 
anotações críticas sobre o livro Filosofia do Direito de Georg Wilhem Friedrich Hegel 
(1770-1831). 
Destaca-se que o centro da discussão é saber a relevância do Estado 
enquanto elemento capaz de operar a inversão do social sobre o político, 
contraposto ao pensamento político ocidental que coloca a dimensão social 
subordinada à política, com isso destacando o Estado como elemento fundamental 
dentro da sociedade moderna. 
Considerando a relevância do tema dentro do pensamento marxista, não 
faço nenhuma revisão de leitura e muito menos discuto a possível dicotomia entre o 
jovem Marx e o Marx maduro, muito embora sobre o mesmo problema possa se 
encontrar, dentre muitos autores, um pensador da importância de Louis Althusser 
(1918-1990), que considera a produção juvenil de Marx idealista.2 
Ao passar em revista a Filosofia do Direito de Hegel, Marx examina não uma 
filosofia política ou um dado pensamento político, mas aquilo que pretendia ser a 
própria conclusão da filosofia,ou a conclusão política da filosofia. Marx acreditava 
que sua crítica a Hegel se estenderia ao Estado moderno e todas as suas 
conseqüências, dentre as quais os resquícios de uma medievalidade que ainda se 
 
1 Essa obra foi redigida por Marx em 1843 quando de sua estada em Kreuznach, 
publicada, porém, após sua morte originalmente em 1927, organizada pelo 
grande estudioso russo David Riazanov, fundador do Instituto Marx-Engels de 
Moscou. 
2 Os textos filosóficos de Marx de 1841 a 1845, incluindo A Sagrada Família, 
estão construídos sobre uma problemática idealista, não importa se idealista 
liberal ou idealista antropológica, que teve Marx que criticar radicalmente para 
poder estabelecer sua nova teoria da história e a nova filosofia que corresponde 
a ela. ALTHUSSER, L. Materialismo Histórico e Materialismo Dialético: 40. 
Althusser propõe em A Favor de Marx, uma classificação quanto à produção 
teórica de Marx da seguinte maneira: a - Obras da Juventude: 1840-1844; b – 
Obras da censura: 1845; c – Obras da maturação: 1845-1857; d – Obras da 
Maturidade: 1857-1883. Idem: 25. 
 2
sustentava na Europa, sobretudo numa Alemanha envolvida pelas disputas 
particulares, locais, regionais.3
Marx, como qualquer outro pensador político, em 1843, na Alemanha, não 
poderia ignorar a influência dos postulados hegelianos,4 ainda mais quando tais 
idéias são disputadas pelos partidários do movimento prussiano e dos que, com a 
Prússia ou sem a Prússia, têm no professor de Berlim a fundamentação de seus 
argumentos e movimentos político-partidários. Há em Hegel um projeto político 
muito claro, e nisso Marx observa sua filiação ao movimento prussiano, que desde 
o fim do século XVII5 se constitui numa efetiva e constante força que em torno de 
si pretende aglutinar todos os estados alemães num processo de unificação política 
- o que só encontraria resultado em 1871. Destarte o que se tem por fim é 
compreender se em Marx o Estado é ou não uma construção capaz de superar as 
contradições existentes na sociedade civil, ou seja, como essa construção supera as 
contradições e quais os mecanismos adequados à sua consecução, por outra, quais 
as implicações teóricas para o entendimento de Estado na impossibilidade de tal 
superação. 
Na Crítica de 1843, Marx elabora um exame pormenorizado dos parágrafos 
261 ao 313 da Filosofia do Direito de Hegel, onde procura na leitura dos mesmos, 
uma crítica da filosofia política do autor da Fenomenologia do Espírito. Marx ao se 
debruçar sobre os cinqüenta e dois parágrafos destinados ao estudo do Estado e 
suas relações dentro da sociedade civil tem por fim não só compreender o 
pensamento político de Hegel como também investigar a noção de política existente 
em sua contemporaneidade, considerando que a respeito do Estado moderno o 
pensamento hegeliano seja paradigmático. Não se pode olvidar de que Marx na sua 
 
3 Além dos males modernos, oprime a nós alemães uma série de males 
herdados, originários de modos de produção arcaicos, caducos, com seu séqüito 
de relações políticas e sociais contrárias ao espírito do tempo. Somos 
atormentados pelos vivos e, também pelos mortos. MARX, K. O Capital: 5. 
4 QUAINI, M. Marxismo e Geografia; SCHILLING, K. História das Idéias Sociais. 
5 ANDERSON, P. Linhagens do Estado Absolutista. 
 3
Crítica de 1843, ao Estado moderno e ao próprio Hegel, está de alguma forma 
construindo sua noção de Estado e conseqüentemente de política. 
Visando uma melhor exposição do presente trabalho, dividi-o em quatro 
capítulos e uma conclusão, a saber: 
Capítulo 1: Sobre Marx e Hegel: breve histórico 
Capítulo 2: O Pensamento político de Hegel 
Capítulo 3: Marx e a crítica ao idealismo hegeliano 
Capítulo 4: O pensamento político de Marx no limite da Crítica de 1843 
No capítulo primeiro, Sobre Marx e Hegel: breve histórico, procuro muito 
sucintamente apresentar alguns dados biográficos essenciais cujo fim é localizar os 
dois pensadores dentro de seus respectivos momentos sem me alongar em fatos já 
exaustivamente conhecidos e explorados. É um histórico peculiar porque apresento 
Marx até o momento de sua crítica a Hegel. 
No segundo capítulo, O Pensamento Político de Hegel, trabalho sua Filosofia 
do Direito extraindo os tópicos mais importantes de sua filosofia política, fazendo 
relação com sua filosofia através de uma exposição sistemática daquilo que Hegel 
compreende por filosofia. Procurei restringir-me a essa obra na intenção de buscar 
o substantivo do sentido de política em Hegel, sem com isso discutir outros textos 
da mesma natureza de sua autoria, anteriores ou posteriores à sua obra política 
máxima. É preciso ainda esclarecer que o estudo direto do pensamento político de 
Hegel está circunscrito à discussão do Estado, portanto, a terceira seção da terceira 
parte A Moralidade Subjetiva, especificamente os parágrafos citados, embora faço 
incursões em outros parágrafos quando necessário. 
Partindo do princípio que apresento um capítulo de situação histórica dos 
dois personagens deste trabalho e, que em seguida pontuei os postulados políticos 
e filosóficos de Hegel, não poderia proceder de maneira diferente senão no terceiro 
capítulo apresentar o Marx até o momento da Crítica de 1843. O que fiz. Nesse 
 4
capítulo intitulado Marx e a crítica ao Idealismo Hegeliano, trabalhei no sentido de 
não só demonstrar como também discutir o pensamento de Marx no limite da 
proposta da dissertação, com isso corrigindo algumas dúvidas que me assaltavam e 
escurecia o que supostamente conhecia a respeito daquele Marx ainda caminhando 
na busca de um leme firme e seguro. 
Certamente tive que me conter quanto ao terceiro capítulo destinado a uma 
síntese do pensamento de Marx em 1843, para mais adiante trabalhar com suas 
críticas a Hegel de forma mais aprofundada. E por quê? Pela intenção de pensar 
discutindo, ou melhor, discutindo de forma reflexiva quando no quarto capítulo, O 
pensamento político de Marx no limite da Crítica de 1843, cito sua referida obra 
exaustivamente por meio de recortes. 
Nesse capítulo apresento o pensamento político de Marx na mesma ordem 
que construí o de Hegel no capítulo terceiro, isso com o fim de tornar legível e 
continuado a crítica feita pelo autor de O Capital. Esse capítulo é o mais longo de 
todos por uma razão muito simples: nele estão os elementos teóricos e críticos do 
pensamento de Marx em 1843, por isso os detalhei na medida do possível no 
interesse de tornar claro o intento da dissertação. É longo por ser necessário; é 
longo por nele estar contido as principais reflexões de Marx em 1843, constituindo 
a espinha dorsal da presente pesquisa. Desse capítulo extraio as conclusões 
julgadas pertinentes dentro da Crítica de 1843. 
Por fim, a conclusão ficou adequadamente reduzida a algumas páginas, onde 
estão resenhados os conteúdos principais da presente pesquisa. 
Capítulo 1 
Sobre Hegel e Marx: breve Histórico 
No princípio do século XIX ocorreram grandes transformações nos cenários 
artístico, filosófico e científico alemão. Foi nesse contexto, tipificado por uma 
espécie de renascimento que se destacou a obra de Georg Wilhem Friedrich Hegel, 
que por sua originalidade filosófica inaugurou uma nova época de pensar o social, 
ou melhor, a relação sociedade e Estado. Pode-se considerar que com Hegel tem 
início o período contemporâneo da história do pensamento filosófico ocidental e de 
toda a sua influência no pensamento político. Hegel é um marco definitivo. Pela sua 
ambição intelectual, por seus vastos conhecimentos, e por seus esforços 
permanentes em elaborar uma síntese filosófica, passa a posteridade como uma 
referência fundamental na Filosofia e também na Política. 
Hegel 
Filho de um modesto funcionário público do Departamento de Finanças do Ducado 
de Würtemberg, Hegel nasceu em Stuttgartno dia 27 de agosto de 1770, tendo 
recebido uma educação não diferente dos jovens de sua época, destacou-se nos 
estudos de latim e história clássica. Em sua juventude foi influenciado pela 
literatura de William Shakespeare quando de seu professor Löffler, recebeu um 
volume das obras do poeta inglês. Hegel, por influência de seu pai e pelos seus 
méritos enquanto bom aluno, recebeu uma bolsa ducal para cursar Teologia na 
Universidade Regional de Tübingen. Ao se formar em 1793, recebeu 
um certificado que declarava ser ele um homem bem-dotado e de 
bom caráter, bem preparado em teologia, mas sem nenhuma 
aptidão em filosofia.6 
No Seminário Hegel foi fortemente influenciado por Friedrich Wilhelm Joseph 
Schelling (1775-1854) e Johann Christian Friedrich Höelderlin (1770-1843). Este 
apresentara ao futuro autor da Filosofia do Direito os encantos da Grécia clássica, 
ao passo que Schelling abriu-lhe uma nova perspectiva filosófica na discussão do 
 
6 DURANT, W. A História da Filosofia: 278. 
 6
real em relação ao ideal. Afirma-se que Hegel, Shelling e Höelderlin em uma certa 
manhã, bem cedo na praça do mercado, plantaram uma Árvore da Liberdade em 
homenagem ao sucesso da revolução francesa de 1789. Isso retrata o impacto 
positivo de quanto a Revolução animava não só a camada culta alemã, como 
também sua própria juventude. 
Embora Schelling fosse mais novo que Hegel, alcançou mais cedo maior 
reputação que seu colega. Seus trabalhos filosóficos encontram publicações e, de 
alguma forma ecoam no mundo das letras filosóficas. Hegel, pela sua própria 
formação, construía a imagem daquele filósofo que pouco a pouco edifica o seu 
próprio sistema e com isso uma base que em breve se transformará no seu 
principal elemento de consistência filosófica. 
Os primeiros escritos de Hegel, os da juventude, passam pelo problema 
teológico, em que o pensador alemão formula inúmeras reflexões acerca do 
Cristianismo sempre tendo a cultura grega como norte ideal de organização política. 
Em tais escritos primeiros, Hegel chega a comparar Jesus com Sócrates, uma vez 
que humaniza aquele na tentativa de estabelecer um paralelo não só de 
personalidade como também envolver os aspectos culturais que cada um 
representou ante suas respectivas culturas. Hegel via no Cristianismo um avanço 
considerável em relação ao indivíduo face ao Judaísmo que, para ele, era uma 
religião positiva no sentido de que as normas eram emanadas diretamente de Deus 
numa prescrição de comportamento a partir de um código exterior aos homens. O 
Cristianismo se constituía em um avanço justamente por ser inverso ao Judaísmo, 
pois seu caráter subjetivo proporcionava ao homem um sentido de liberdade 
individual que ligava os homens dentro de uma comunidade humana. Para Hegel o 
Cristianismo desenvolve a subjetividade quando os próprios homens, pelo amor uns 
com os outros, criam um sentido de comunidade que faz lembrar a cidadania 
ateniense, isto é, o homem pela dimensão do cidadão. 
Nesse período destacam-se os seguintes escritos de Hegel: 
 7
a - Fragmentos sobre Religião Popular e Cristianismo (1793/94); 
b - Vida de Jesus (1795); 
c - A Positividade da Religião Cristã (1795/96); e 
d - O Espírito do Cristianismo e seu Destino (1798/99). 
Estes textos foram publicados depois da morte do autor em um único 
volume intitulado Escritos Teológicos Juvenis de Hegel. Os primeiros escritos de 
Hegel são marcados por uma preocupação teológica sem com isso ser uma apologia 
a teologia. Leandro Konder assinala que: 
Nos chamados escritos teológicos juvenis, os temas que têm a ver 
com a teologia são sempre abordados em ligação com as 
preocupações terrenas, com a história política dos homens. Para o 
jovem Hegel, o enriquecimento da consciência religiosa dependia 
do enriquecimento da consciência política. A religião precisava 
contribuir para que os seres humanos desenvolvessem sua 
capacidade de agir, de intervir no mundo, transformando-o de 
acordo com seus desígnios. Ao longo da história do cristianismo, 
os cristãos tinham rezado muito e atuado deficientemente: tinham 
ficado numa postura contemplativa, passiva (...).7
Pode-se dizer que Hegel toma sua cultura religiosa e tenta viabilizá-la a 
partir da perspectiva do que entende por cidadania ateniense, tentando 
compatibilizar os elementos do cristianismo com os da filosofia grega. Esta será 
uma preocupação permanente em sua obra. Mais tarde, na Filosofia do Direito, 
retomando o tema, seu enfoque é o cidadão como voz do indivíduo, em que o 
Estado como unidade política é o centro da vida ética coletiva. 
Hegel por volta de 1800 se transferiu para Jena a convite de Schelling, com 
o fim de lecionar na mesma Universidade que seu amigo para lá fora levado por 
Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832). Esse momento marcou decisivamente a 
vida de Hegel, pois, na medida que começou a lecionar na referida instituição, deu 
prosseguimento aos seus estudos filosóficos propriamente ditos. Hegel, após a 
publicação da Fenomenologia do Espírito, em 1807 - que trata dos movimentos 
necessários da consciência, do seu despertar até o que poderia se chamar de 
 
7 KONDER, L. Hegel, a razão quase enlouquecida: 7. 
 8
tomada da essência da realidade -, aprofunda seu conhecimento filosófico e torna 
sua filosofia cada vez mais abstrata na busca de uma razão universal que não seja 
fruto de particularidades de simples opiniões, mas um esforço do espírito que se 
pensa a si mesmo no cenário histórico da consciência. 
Seguindo a publicação da Fenomenologia do Espírito, Hegel apresenta ao 
publico em 1813 a Ciência da Lógica, que tem por fim um estudo ontológico, um 
estudo do ser. Konder em seu livro Hegel, a Razão quase enlouquecida, apresenta 
uma boa síntese das preocupações contidas nesse volumoso livro de Hegel. 
A Ciência da Lógica [pondera Konder], trata de esclarecer as 
relações entre os conceitos fundamentais com os quais a razão 
precisa trabalhar; e mostra que, assim como o infinito está nos 
próprios seres finitos e depende da finitude, também o absoluto 
está nos seres relativos, o universal está nos seres singulares e a 
essência está nos fenômenos; ao contrário, nutre-se dele: funda 
nele sua existência concreta.8 
Em 1817 apareceu a primeira versão da obra Enciclopédia das Ciências 
Filosóficas. Nessa obra Hegel procurou coroar seu sistema de forma a dividi-lo em 
três momentos, isto é, em três volumes, assim como na sua dialética tríade. O 
primeiro momento foi dedicado ao estudo da lógica através de uma grande síntese; 
no segundo momento desenvolve a sua filosofia da natureza. No terceiro e último 
momento estuda a filosofia do espírito. Em Berlim, por volta de 1827, Hegel retoma 
a Enciclopédia e promove algumas modificações com o fim de atender as premissas 
do seu sistema, sem com isso alterar o sentido originário que lhe dera. 
No terceiro momento ou volume da Enciclopédia das Ciências Filosóficas, 
Hegel ensaia o que mais tarde aprofundará com a publicação de sua Filosofia do 
Direito em 1821, isto é, o estudo do Estado (eticidade), as relações entre universal 
e particular, como são possíveis as relações no plano político e em que medida o 
direito efetivaria a liberdade, e a normatividade como dimensão pública, 
resguardando os homens nas suas relações necessárias. Hegel morre em 13 de 
 
8 Idem: 48. 
 9
novembro de 1831, aos 61 anos, de cólera. Passou à posteridade como um dos 
poucos filósofos a alcançar em vida, grande notoriedade pública. 
Hegel deixa em toda Alemanha uma herança intelectual sem precedentes na 
história do pensamento ocidental. De suas lições, de seus escritos serão 
construídas diversas escolas filosóficas. Logo após sua morte seus discípulos e 
admiradores se dividiram em duas grandes correntes: os hegelianosde direita e os 
hegelianos de esquerda, assim chamados por David Friedrich Strauss (1808-1874). 
Os hegelianos de direita tinham na filosofia da religião de Hegel o alicerce de seus 
princípios filosóficos, ao passo que os hegelianos de esquerda extraiam de sua 
dialética, o conteúdo crítico de suas conclusões políticas. 
Segundo Giovanni Reale e Dario Antisseri em História da Filosofia, a divisão 
de direita e esquerda hegelianas pode ser observada do seguinte modo: 
No que se refere à política, a direita hegeliana sustentava, grosso 
modo, que o Estado prussiano, com suas instituições e suas 
realizações econômicas e sociais, devia ser visto como o ponto de 
arribação da dialética, como a realização máxima da racionalidade 
do espírito. Já a esquerda, ao contrário, invocava a teoria da 
dialética para sustentar que não era possível deter-se em 
configuração política e que a dialética histórica deveria negá-la 
para superá-la e realizar uma racionalidade mais elevada.9
Pode-se ponderar, de maneira sintética, que os hegelianos de direita 
sustentavam que o Estado prussiano como tal encontrara sua forma definitiva. Em 
oposição a esses, os hegelianos de esquerda, sustentados pela dialética hegeliana, 
negavam o Estado prussiano existente. Desse segundo grupo há um segmento de 
jovens estudantes e professores entusiasmados com a nova situação da Europa e 
mesmo a perspectiva de um novo Kaiser alemão comprometido com uma 
liberalização da Prússia. Esse pequeno grupo tornou-se conhecido pela 
denominação de os jovens hegelianos, que muito ativos procuravam por todos os 
meios exercer influência no meio político alemão. 
 
9 REALE & ANTISSERI. História da Filosofia, vol. III: 163. 
 10
Os jovens hegelianos formavam intelectualmente um agrupamento 
heterogêneo e não constituíam uma base teórica específica ou mesmo uma linha 
política definida. Seus membros tiravam de Hegel aquilo que interessava às suas 
teses e formulações políticas. Em função disso muito rapidamente os jovens 
hegelianos, enquanto movimento político de suma importância, sofreu um processo 
de descontinuidade. Destacam-se nesse grupo o próprio Strauss, Bruno Bauer 
(1809-1882), Max Stirner (1806-1856), Arnold Ruge (1802-1880), Ludwig 
Feuerbach (1804-1872) e Karl Marx, todos pensando politicamente, mas cada um a 
partir de pontos de vista diferentes uns dos outros. 
Assumindo desde cedo uma postura eminentemente política, buscando em 
suas reflexões a representação dos fatos a partir de sua materialidade, Marx, em 
seus escritos, toma muito rapidamente o sentido de história legado por Hegel e 
assume definitivamente o plano concreto como esteio de seu pensamento político-
filosófico. 
Marx 
Karl Marx nasceu em 15 de maio de 1818, em Tréveris. Recebeu de seu pai 
influência decisiva pelo gosto polêmico da política. Adotando a fé protestante 
liberalmente após preferir a carreira de advogado quando se viu impedido do culto 
judaico face às leis anti-semitas da Renânia, em 1816, Heinrich Marx, um iluminista 
de primeira hora, leitor de Immanuel Kant (1724-1804), Voltaire (1694-1778), 
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) e outros, insiste para que seu filho não só se 
inclinasse para o Direito bem como o orientou na busca de uma sólida formação 
intelectual que de alguma forma pudesse influir na formação de sua postura 
política. Karl Marx matriculou-se na Universidade de Berlim depois de uma 
temporada na Universidade de Bonn. Em Berlim, ao chegar em 1836, tomou 
contato coma a filosofia de Hegel, tornando-se membro do Doktorklub,10 e desde 
logo percebeu as vantagens do pensamento político deste em detrimento do 
 
10 Associação dos Jovens Hegelianos. 
 11
defendido por Kant. Marx se dispõe a estudar o pensamento de Hegel,11 e de 
imediato certificou-se que as relações políticas na Alemanha estão muito aquém do 
que acontece em centros como França e Inglaterra. 
Marx graduou-se em Jurisprudência, e logo depois obteve em 1841 o 
doutorado em Filosofia pela Universidade de Jena, com a tese Diferenças das 
Filosofias da Natureza em Demócrito e Epicuro, em que mesmo apresentando uma 
abordagem idealista, anuncia algumas diferenças quanto ao restante dos jovens 
hegelianos, que mais tarde serão radicalizadas pela Ideologia Alemã. 
Em razão da censura imposta a Bruno Bauer pelo governo prussiano, 
quando despedido do cargo de professor da Universidade de Bonn, por motivos 
político, Marx resolveu desistir de ingressar no mundo acadêmico, transferindo 
assim seus objetivos para a imprensa, onde poderia levar adiante seu projeto 
crítico da realidade alemã. Nesse sentido, em pouco tempo Marx assume a editoria 
do jornal Gazeta Renana de Política, Comércio e Indústria (1842-1843) que desferia 
ácidas análises não só contra o Estado prussiano como também à inteligência 
alemã. Marx em breve se constituía num objeto de permanente preocupação da 
censura prussiana, tanto que o mesmo jornal foi fechado e Marx mais uma vez teve 
que se silenciar, o que fez aproveitando os dias de recém-casado. É nesse período 
que passa a fazer um exame detalhado da obra política máxima de Hegel, os 
Princípios da Filosofia do Direito. 
Nos anos quarenta do século XIX, momento importante da história política 
européia, especialmente a alemã, vive-se dias de intensa mudança. A Europa 
assiste a uma ebulição de 1830 a 1848, onde muitos Estados como França, Bélgica, 
Suíça e outros passam por transformações políticas em razão de suas respectivas 
burguesias se movimentarem no exercício do poder quando buscam aquele modelo 
mais eficiente conforme seus interesses. Na Alemanha, particularmente na Prússia, 
essa mesma burguesia não se faz presente no sentido de resguardar seus 
 
11 MCLELLAN, D. Karl Marx, Vida e Pensamento: 40. 
 12
interesses. Seus representantes não são orgânicos e, com isso, não há 
representação política, isto é, a monarquia prussiana está longe ora do modelo 
francês, ora do modelo inglês. Droz comenta que: 
El advenimiento al trono del nuevo rey de Prusia, Federico 
Guillermo IV, en 1840, cuyas primeras decisiones – suavización de 
la censura, amnistía, publicidad de las Dietas provinciales y 
creación de una comisión unida que se reunía cada dos años en 
Berlín – provocaron el resurgimiento de la esperanza, parecía dar 
la razón a los que especulaban sobre la evolución de Prusia hacia 
el liberalismo. Pero estas esperanzas estaban basadas en puras 
ilusiones y Federico Guillermo iba a demostrarlo muy pronto: era 
un soberano romántico, ligado al concepto de Estado cristiano y 
germánico, sin contacto con las fuerzas sociales surgidas de la 
revolución económica, y cuya inhábil política iba a preparar el 
camino a la Revolución. 12 
Como Marx está diante dessa realidade que se apresenta aos seus olhos, a 
ele não resta outra alternativa senão buscar na crítica política a verdadeira crítica 
da sociedade, do Estado e da religião. Para isso se debruça sobre a filosofia política 
de Hegel no intuito de mastigar o Estado moderno, que no seu entendimento era 
Hegel o maior intérprete, mesmo quando o critica em sua Filosofia do Direito. É, 
portanto, o próprio Marx que, bem distante de 1843, no Prefácio da Contribuição à 
Crítica da Economia Política em 1858, assinala os imperiosos motivos que o 
levaram a retomar Hegel: os problemas reinantes na sociedade civil burguesa e 
toda relação de causa na dita condições materiais de existência. 
O primeiro trabalho que empreendi para resolver a dúvida que me 
assediava foi uma revisão crítica da filosofia do direito de Hegel, 
trabalho este cuja introdução apareceu nos Anais Franco-alemães 
editados em Paris em 1844. Minha investigação desembocou no 
seguinte resultado: relações jurídicas, tais como formas de Estado, 
não podem ser compreendias nem a partir de si mesma,nem a 
partir do assim chamado desenvolvimento geral do espírito 
humano, mas, pelo contrário, elas se enraízam nas relações 
materiais de vida, cuja totalidade foi resumida por Hegel sob o 
nome de sociedade civil (bürgerliche Gesellschaft), seguindo os 
ingleses e franceses do século XVIII.13
Chegando a este ponto, pode-se considerar nesta passagem a chave da 
compreensão da presente dissertação e seu significado em discutir o pensamento 
 
12 DROZ, J. Historia da Alemania: la formación de la unidad alemana 1789/1871. 
Vol. 1: 140. 
13 MARX, K. Contribuição à Crítica da Economia Política (Prefácio): 53. 
 13
político de Marx nos limites da Crítica de 1843. Isso porque o Estado aos olhos de 
Marx assume uma perspectiva diferente daquela apresentada pelos pensadores 
políticos jusnaturalistas.14
Marx chega a Hegel não para negá-lo simplesmente mas, na medida em que 
o estuda, demonstrar as incongruências do seu pensamento como as 
incongruências daquilo que se convencionou chamar Estado moderno. Por fim, Marx 
estava convencido, e o Prefácio da Contribuição à Crítica da Economia Política 
mostra, que o seu pensamento político se desloca para um plano material, e que o 
grande significado da origem desse giro15 é mais que um ajuste de contas com sua 
consciência, mas sim um giro decisivo dentro da história não só do pensamento 
político, científico e filosófico, como um giro dentro dos movimentos sociais que 
tem em Marx um referencial, um norte intelectual.16
 
14 Teóricos ligados ao jusnaturalismo, corrente que defendia a existência de um 
direito natural que seria anterior e superior ao direito positivo posto. Tal 
corrente deu origem as seguintes escolas: o contratualismo, o 
constitucionalismo e o liberalismo Ver BOBBIO, N. Dicionário de Política. 
15 Esta expressão foi retirada de José P. Netto, que a utiliza em seu trabalho, A 
Propósito da Crítica de 1843, numa coletânea de ensaios destinada ao 
centenário da morte de Marx, organizada por J. Chasin. Esta expressão, embora 
não revele, Netto com certeza tirou de Kant quando este atribui à Crítica da 
Razão Pura, um giro copernicano de natureza epistemológica: Até hoje admite-
se que o nosso conhecimento se devia regular pelos objectos; porém, todas as 
tentativas para descobrir a priori, mediante conceitos, algo que ampliasse o 
nosso conhecimento, malogravam-se com este pressuposto. Tentemos, pois, 
uma vez experimentar se não se resolverão melhor as tarefas da metafísica, 
admitindo que os objectos se deveriam regular pelo nosso conhecimento, o que 
assim já concorda melhor com o que desejamos, a saber, a possibilidade de um 
conhecimento a priori desses objectos, que estabeleça algo sobre eles antes de 
nos serem dados. Trata-se de uma semelhança com a primeira idéia de 
Copérnico; não podendo prosseguir na explicação dos movimentos celestes 
enquanto admitia que toda a multidão de estrelas se movia em torno do 
espectador, tentou se não daria melhor resultado fazer antes girar o espectador 
e deixar os astros imóveis. KANT, I. Crítica da Razão Pura: 19-20. 
16 A biografia de Marx já é conhecida por todos aqueles que se interessam em 
buscar no fundador do socialismo científico, suas argutas interpretações dos 
fenômenos históricos, que em síntese são fenômenos sociais. Preferi não me 
alongar em notas biográficas mais específicas com receio de prosseguir num 
caminho cuja saída seria difícil de encontrar. A vida de Marx por ser 
extremamente rica pode ser resumida em diversas perspectivas: moral, 
intelectual e política. Todas essas dimensões, se procurarmos o sentido humano, 
demasiadamente humano de sua história, encontraremos um sentido épico de 
vida em que a prática cotidiana da existência está definitivamente subordinada 
aos princípios teóricos construídos a partir da própria prática revolucionária. 
Marx, quando muitos dos seus intérpretes se imiscuem em bobinas de 
contradições, viveu um exemplo de coragem perseguido por poucos. Talvez seja 
este um dos tantos significados dignos de sua vida. 
Capítulo 2 
O pensamento político de Hegel 
O projeto prussiano de liderar os estados alemães data especificamente do século 
XVII com Frederico Guilherme (1640-1688) que, sistematicamente, foi perseguido 
pelos seus sucessores ora com maior ou menor intensidade conforme as 
circunstâncias históricas. Após a revolução francesa de 1789, a derrocada de 
Napoleão, e o enfraquecimento da Áustria, o Estado prussiano intensificou seu 
projeto político dentro da comunidade germânica. Para isso utilizou o artifício de 
não só estimular como também chamar para o seu território as melhores cabeças 
de toda comunidade de língua alemã. Com esse fito fundou a Universidade de 
Berlim em 1810, tendo a frente como seu primeiro reitor o diplomata e filólogo 
Wilhelm von Humboldt (1767-1835), mais tarde o filósofo Johann Gottlieb Fichte 
(1762-1814) e depois Hegel.17 Assim o Estado prussiano se consolidava como uma 
força legítima dentro da cultura alemã, capaz de materializar não só a idéia de uma 
unidade política como também o sonho de um império forte e efetivo, contrário ao 
Sacro Império Romano Germânico, apenas uma representação ideal na história 
germânica. 
Boa parte da inteligência alemã saudara com entusiasmo o advento da 
revolução francesa de 1789.18 Kant embora condenasse os excessos cometidos no 
período do Terror, não negava o valor histórico do movimento que trouxe para a 
humanidade um verdadeiro sentido de implementação da liberdade, a maioridade 
dos homens pela autonomia. Portanto, mesmo sendo saudada por um pequeno, 
mas expressivo grupo de intelectuais como Adolf von Knigge (1752-1796), Friedrich 
Gottlieb Klopstock (1724-1803), Goethe e outros assim como os estudantes.19 A 
revolução de 1789 não encontrou apoio nas massas populares, pois estas viam os 
 
17 Fichte foi reitor no período de 1810 a 1811, enquanto Hegel ocupou o mesmo 
cargo entre 1829 a 1830. Dado recolhido do sitio http://www.hu-
berlin.de/hu/geschichte/rektoren. 
18 DROZ, J. Historia de las Doctrinas Políticas en Alemania. 
19 SCHEID, L. Dois Séculos de História Alemã (política, sociedade e cultura). 
 15
exércitos franceses como mais um avanço imperial sobre sua pátria. Mais tarde o 
mesmo Fichte, entusiasta de primeira hora da revolução, simpatizante dos 
jacobinos, se volta contra a presença francesa na Alemanha embalado pelo 
renascimento do nacionalismo alemão. 
Assim como Fichte, Hegel será chamado pelo Estado prussiano a lecionar em 
Berlim não somente pelo seu já reconhecido valor enquanto filósofo, mas, 
sobretudo, pelas implicações políticas de suas idéias que na verdade constituíam, 
ou pelo menos deveriam constituir, os fundamentos de um Estado racional como 
efetivação de uma idéia, de um projeto existente dentro da própria história alemã, 
enfim: o Estado prussiano. É nesse contexto que Hegel surge como força 
emergente e sua filosofia, coroada pelo seu pensamento político, expressa o 
espírito e a expectativa de sua época. 
Mesmo não sendo esta dissertação um estudo da filosofia hegeliana 
enquanto objeto em si, é importante chamar atenção para sua repercussão política 
dentro do cenário cultural alemão, uma vez que chegou a representar o 
pensamento de uma perspectiva de mudança do Estado prussiano. Assim 
compreendendo, julgo necessário apresentar alguns princípios fundamentais que 
norteiam o pensamento filosófico de Hegel, isso porque o seu pensamento político 
está subordinado ao plano de sua filosofia como alertam Lefebvre-Macherey. na sua 
obra Hegel e a Sociedade. 
Principais elementos da filosofia hegeliana 
A lógica hegeliana ao contrário de ser uma simples teoria do conhecimento é em 
verdade uma ontologia. Como tal procura o ser enquanto dimensão do 
pensamento, identidade absoluta, instância de superação entre objeto e sujeito,ser 
e pensar. A categoria lógica assume a perspectiva sistemática de explicitação de se 
conhecer o concreto pelo conceito, como identidade da identidade e da diferença. O 
conceito é o idêntico que se diferencia a si mesmo no processo lógico da dialética 
como superação. Nessa relação o sistema se identifica na premissa de que o ser é o 
 16
pensamento pensando a si mesmo como idéia absoluta.20 Todos os entes são idéias 
que existem em razão da representação do Espírito Absoluto, no qual se identificam 
pensar e ser, conceito e realidade. O absoluto é, por fim, o conceito, e o conceito, a 
própria identidade. 
Para Hegel a filosofia se definiria como o conhecimento necessário do 
conteúdo da representação do absoluto. Sendo assim, o absoluto se confundiria 
como objeto da própria filosofia, contrariando um postulado fundamental da 
filosofia kantiana expressa na Crítica da Razão Pura, que consiste na 
impossibilidade de se conhecer o objeto em si mesmo, o que reduz o conhecimento 
da coisa pelo fenômeno, pela manifestação exterior do objeto. Ao contrário, para 
Hegel a lógica teria o papel de compreender o objeto pelo conceito: as condições do 
conhecimento nem estão arbitrariamente no sujeito muito menos no objeto, mas 
sim numa estrutura lógica, na idéia, no conceito, por isso filosofia é um 
conhecimento conceituante.21 Ressalta-se, ainda, a diferença entre a lógica 
dialética e a lógica formal: esta se baseia na lógica de Aristóteles, que tem por 
fundamento o princípio da não-contradição, ao passo que na lógica dialética a 
contradição não é apenas aceita como também inerente ao próprio movimento do 
pensamento. Movimento a partir da contradição. 
A intenção de Hegel é justamente provar que a razão necessariamente se 
efetiva no mundo e não é apenas uma idéia abstrata. Por isso, sua concepção de 
conceito difere da tradição filosófica. O conceito que Hegel descreve e concebe está 
em movimento. Esse conceito é dialético. O motor deste conceito é a contradição. 
Por isso, o absoluto é percebido no pensamento pela lógica, e não como postulava 
Schelling, através da intuição. 
No entendimento de Carneiro Leão: 
 
20 LEÃO, C. Aprendendo a Pensar. 
21 HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das Ciências Filosóficas. Vol. I: 292. 
 17
Ser e pensar não se opõem como realidade. Não se pode 
determinar o dado da experiência sensível como real, 
contrapondo-o ao pensamento como se o pensamento não fosse 
real. Abandonar o pressuposto absurdo de que o sensível é o ser e 
o pensamento é o nada constitui a primeira condição para se 
pensar logicamente qualquer coisa (...) A essência da abstração 
não está em se prescindir da matéria sensível, mas na elevação do 
sensível à estrutura universal do conceito.22
Com base no exposto, pode-se dizer que o pensamento para Hegel teria a 
estrutura do universal, condição necessária para o conhecimento do objeto. O 
pensamento não se configura como algo nadificado, ou melhor, ser e pensamento 
não se opõem como sentidos opostos em que este se constitui em abstração 
daquele. Muito pelo contrário, é no pensamento que o objeto encontra a sua 
dimensão universal, sendo, portanto, concreto, enquanto o sensível apenas revela 
sua exteriorização como percepção da realidade pensada, porém particularizada. A 
filosofia hegeliana é antes de tudo um sistema fundado sobre o Espírito Absoluto,23 
que por sua vez é a síntese do espírito subjetivo e do espírito objetivo. Toda 
filosofia hegeliana é filosofia da identidade, uma vez que este fundamento se 
expressa na arte, na religião, na história e por fim no mundo ético: no direito, no 
conceito de Estado. 
Além do que, por residir a filosofia essencialmente no elemento da 
universalidade – que em si inclui o particular -, isso suscita nela, 
mais que em outras ciências, a aparência de que no fim e nos 
resultados últimos que se expressa a Coisa mesma, e inclusive sua 
essência consumada.24
Percebe-se mediante leitura da passagem citada que, para Hegel, o sentido 
da filosofia está na perspectiva do universal como também é a expressão do 
universal pelo fato de buscar a coisa mesma, em si, por isso a noção de unidade 
domina, de certa forma, o seu pensamento, isto é, o universal em si representa a 
própria totalidade, e, como tal, aquilo que é particular encontra-se como elemento 
dentro de um sistema, necessariamente. Hegel considera o seu sistema como 
alternativa à particularidade, ao particularismo filosófico e pretende que tal sistema 
 
22 LEÃO, C. Aprendendo a Pensar: 258. 
23 HARTMANN, N. A Filosofia do Idealismo Alemão. 
24 HEGEL, G. W. F. Fenomenologia do Espírito. Vol. I: 21. 
 18
inaugure uma forma de pensar que leve em conta a cultura e sua subordinação ao 
plano ideal como fio condutor histórico. 
A verdadeira figura, em que a verdade existe, só pode ser o seu 
sistema científico. Colaborar para que a filosofia se aproxime da 
forma da ciência – da meta em que deixe de chamar-se amor ao 
saber para ser saber efetivo – é isto o que me proponho.25
Pela leitura do texto supra, Hegel se apresenta como aquele que tem por 
responsabilidade a construção de um sistema capaz de dar conta da totalidade, 
visando colocar a filosofia como expressão da verdade. Para Hegel a filosofia não 
pode se contentar com o papel de mera expectadora, sua importância está 
determinada pela coisa mesma, o absoluto em si mesmo, pelo saber efetivo. Esse 
saber efetivo é o saber se processando, se realizando não só para conhecer o 
centro como para ser o próprio centro: a visão do conjunto a partir do conjunto, 
dentro do conjunto. Portanto, a filosofia é um modo peculiar de pensar, uma 
maneira pela qual o pensar se tornar conhecer e conhecer conceituante.26 
Uma opinião é uma representação subjectiva, um pensamento 
qualquer, uma fantasia que eu posso ter dum modo e outros de 
outro modo; uma opinião é coisa minha, nunca é uma idéia 
universal que existia em si para si. Mas na filosofia não contém 
nenhuma opinião, porque não existem opiniões filosóficas (...) A 
filosofia é a ciência objetiva da verdade, é a ciência da sua 
necessidade: é o conceito por conceitos, não é opinar nem deduzir 
uma opinião de outra.27
Em Hegel não há espaço para opiniões, tais considerações não pertencem ao 
mundo da filosofia. Hegel nesse particular inspira-se em Platão28 quando este 
estabelece a relação entre doxa e episteme, opinião e ciência. Desse modo o trecho 
acima assinala a concepção hegeliana de filosofia: a linguagem pela qual a verdade 
se apresenta como um lógico conceituante, procedimento que se refere a uma nova 
e específica forma de pensar, que não opera de uma dedução à outra 
necessariamente, mas por contradição de uma relação à outra. A linguagem 
 
25 Idem: 23. 
26 HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das Ciências Filosóficas. Vol. I: 40. 
27 HEGEL, G. W. F. Introdução à História da Filosofia: 51. 
28 Ler PLATÃO. Fedro e Mênon. 
 19
hegeliana não se estabelece por construir sinônimos para qualificar o que se pensa, 
procura de maneira peculiar desenhar conceitos por meio de expressões 
consideradas por ele científicas, precisas no sentido de relacionar adequadamente 
pensamento e objeto pensado, ou seja, pela reflexão do texto em si. Daí vem seu 
rigor extremo na exposição de um sistema que busca a natureza do conceito posto 
pelo conceito. E o conceito posto pelo conceito é um resultado filológico-filosófico 
que, longe de ser uma armadilha de opiniões, significa a própria verdade por meio 
de exposições conceituais. A filosofia não é um jogo de opiniões, mas pensamento 
conceituante. 
A maneira pela qual Hegel pensa é dialética, e consiste na relação 
inseparável dos contraditórios com o fim de apreender uma etapa superior que 
possa daí estabelecer uma síntese. Por isso a filosofia em Hegel é um plano lógico.A lógica tem, segundo a forma três lados: a) o lado abstrato ou do 
entendimento; b) o dialético ou negativamente-racional; c) o 
especulativo ou positivamente racional.29 
Esses três lados afirmados por Hegel, não são partes da Lógica e sim 
momentos do todo lógico-real, o que ele chama de todo conceito ou de todo 
verdadeiro geral. Dessa forma a dialética de Hegel envolve no primeiro momento 
um ou diversos conceitos (categorias) fixos – tese. Pensados esses mesmos 
conceitos surgem contradições no seio de suas relações, fase verdadeiramente 
dialética ou razão dialética, negativa, que necessariamente nega a anterioridade 
como movimento de superação – antítese. 
O resultado dessa dialética é uma nova categoria, superior, que 
engloba as categorias anteriores e resolve as contradições nelas 
envolvidas.30 
Esta fase é denominada de especulação, positiva (síntese), ou como sugere 
Hegel, unidades dos opostos, isto é, a negação da negação anterior que retoma a 
afirmação negada na totalização de 
 
29 HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das Ciências Filosóficas: 159. 
30 INWOOD, M. Dicionário Hegel: 100. 
 20
supressão e conservação das duas posições anteriores.31
O pensamento filosófico de Hegel é um sistema complexo de unidades no 
qual a mesma estrutura se processa em áreas diferentes do conhecimento. Hegel 
como um grande filósofo sistemático aplica as mesmas categorias aos mais 
variados problemas. Sua dialética tríade domina sua forma de apresentar e superar 
o problema. Pensa sempre no sentido de que o pensamento deve percorrer 
caminhos cíclicos, ou seja, sempre se realizando em si mesmo na saturação de um 
conceito que impõe a busca de um outro necessariamente, mais completo não por 
decorrência, mas como superação das contradições. E essas contradições são 
superadas logicamente pelas sínteses que promovem na tensão dos opostos, na 
síntese que gera uma nova oposição.32 
Hegel traça um panorama filosófico que tem por fim ser o limite da própria 
filosofia, o fim de uma jornada que encontra em si o fechamento de um grande 
ciclo, o fim da história da filosofia, o sistema que pretende ser o último e o único 
capaz de dar conta de toda a realidade. 
Essa ciência é a unidade da arte e da religião, enquanto o modo de 
intuição da arte, exterior quanto à forma, o seu produzir subjetivo 
e o fracionar do conteúdo substancial em muitas figuras 
autônomas são reunidos na totalidade da religião; e o dispersar-se 
que se desdobra na representação da religião e a mediação dos 
[elementos] que se desdobram não só são recolhidos em um todo, 
mas também unidos na intuição espiritual simples, e elevados 
depois ao pensar consciente-de-si. Por isso esse saber é o 
conceito, conhecido pelo pensamento, da arte e da religião, em 
que o diverso no conteúdo é conhecido como necessário, e esse 
necessário como livre (...) Por conseguinte, a filosofia se 
determina de modo a ser um conhecimento da necessidade do 
conteúdo da representação absoluta.33
 
31 Nesta configuração, destacamos um primeiro ciclo no qual partimos de uma 
posição afirmativa ou identitária – o momento da tese – suscetível de gerar sua 
própria negação que, amadurecida, irá constituir uma segunda posição – o 
momento diferencial da antítese. A tensão entre tese e antítese vai provocar a 
emergência de uma terceira posição, ou seja, de um momento da síntese, que 
é, concomitantemente, negação e afirmação, supressão e conservação das duas 
posições anteriores. SAMPAIO, L. S. C. Lógica Ressuscitada: 36. 
32 Ibidem. 
33 HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das Ciências Filosóficas: 351. 
 21
Esta passagem é esclarecedora por tratar das formas absolutas, arte e 
religião, totalizando a unidade na representação do espírito absoluto que só pode 
ser definido pela filosofia, que em si é a unidade do saber. A filosofia é uma ciência 
pelo objeto e pelo procedimento específicos: o absoluto e a dialética no 
desdobramento do pensamento. Pode-se ponderar que, para Hegel, a filosofia 
representa a verdade no mundo dos homens, por isso que no seu sistema as 
opiniões constituem um obstáculo ao conhecimento do absoluto. A filosofia se 
determina de modo a ser um conhecimento da necessidade do conteúdo da 
representação absoluta, implicando que a filosofia seria aquele saber que explicaria 
o absoluto na condição de revelar sua dimensão de forma racional dentro das 
estruturas da lógica, que pesquisando o ser atrelado ao pensamento não como 
oposição, anunciaria sua identidade necessitante. 
Completando essa linha de raciocínio, existe uma passagem de Hegel, nos 
seus Cursos de Estética, que amplia consideravelmente o que ele concebe por 
filosofia. Para o professor de Berlim, filosofia é uma necessidade por ser 
representação da verdade. 
Pois somente a filosofia em seu conjunto é o conhecimento do 
universo como uma necessidade orgânica em si mesma, que se 
desenvolve a partir de seu próprio conceito e, em sua própria 
necessidade de se relacionar consigo mesma como um todo que 
retorna a si como um mundo da verdade.34
Por isso a filosofia não pode ser uma opinião como também não pode ser um 
primeiro resultado da sensação. Hegel pretende mostrar com isso que o seu 
sistema anuncia uma visão que só pelo conjunto é possível conhecer o elemento. É 
como se o elemento em si não pudesse ter sua existência determinada, só é 
reconhecido na representação do todo como realidade primeira. Essa realidade 
primeira é com certeza o princípio norteador das difíceis elaborações hegelianas, 
que por determinação do seu conceito não pode buscar o exterior para manifestar o 
que ocorre no centro do interior. Assim como os conceitos do belo e da arte são 
 
34 HEGEL, G. W. F. Cursos de Estética: 47. 
 22
pressupostos necessariamente do sistema da filosofia,35 a família, a sociedade civil 
e o Estado também o são, portanto, pensados pelo espírito como realidades em si. 
Se a filosofia é ciência do absoluto, linguagem do absoluto que se pensa e se 
mostra exteriormente aos homens pela consciência, a filosofia só pode ser 
realização do absoluto, por isso não se pode olvidar que a filosofia na sua tarefa 
esclarecedora tenha por missão precípua, apresentar o absoluto como 
determinação na história, encontrando no Estado sua relação de efetivação. Esse 
papel que a filosofia tem no idealismo alemão,36 a de identidade cultural, portanto 
nacional, não tem nenhum paralelo na história da filosofia moderna, a não ser que 
se recue ao mundo grego, onde, sem sombra de dúvida, a filosofia tem um papel 
relevante na medida em que se cria uma linguagem específica a partir de 
problemas políticos, e como atesta Jean-Pierre Vernant em sua obra, As Origens do 
Pensamento Grego, o vocabulário filosófico tem origem na temática política.37 
O idealismo alemão surge então como uma corrente filosófica sem sombra 
de dúvida impregnada do espírito alemão: a introspecção, o retorno aos valores 
culturais esquecidos como sentido de afirmação política, a disciplina viva no intuito 
de se conseguir o objetivo determinado, e a superioridade do seu sistema cultural 
como um valor sobre o resto da Europa. O idealismo alemão, como assinala 
Hartmann, busca sua expressão na criação de um sistema de filosofia em que os 
fundamentos são últimos e irrefutáveis, onde a totalização se efetiva numa reflexão 
profunda em razão da interiorização, caracterizando assim um sentimento de 
 
35 Ibidem. 
36 Os termos idealista e idealismo surgem pela primeira vez com o filósofo 
alemão Gottfried W. Leibniz (1646-1716), mas é com George Berkeley (1685-
1753), filósofo inglês, que adquire o sentido que nós conhecemos, uma corrente 
filosófica que reduz toda a existência ao plano do pensamento, isso quando 
consideramos o pensamento segundo René Descartes(1596-1650). Já o 
idealismo alemão, é uma corrente filosófica que surge no final do século XVIII 
sob forte influência da filosofia kantiana. Sua premissa básica consiste na não 
existência de coisas reais independentes da consciência, do espírito, do ego, do 
eu. Portanto o que pensamos representa expressamente ao plano do real. No 
idealismo alemão encontramos diversas formas de se representar o real pelo 
pensamento, e, dentre elas, se destaca Hegel com o seu idealismo lógico. 
37 VERNANT, J-P. As Origens do Pensamento Grego: 34-35. 
 23
otimismo juvenil.38 O idealismo alemão procura sintetizar o espírito germânico 
diante da história, e com isso objetiva promover, face à revolução francesa, uma 
perspectiva de auto-reconhecimento. 
A filosofia hegeliana representa a apoteose germânica, missão que o povo 
alemão tem em si para efetiva realização da maturidade da Europa que soube ser 
história e consciência de si. A Alemanha tem um projeto e esse projeto só pode ser 
de natureza universal, a materialização do espírito objetivo, a concretização do 
espírito como referência, como principio de identidade. Nesse sentido nenhuma 
outra corrente filosófica foi tão eloqüente quanto a hegeliana, nenhum outro 
filósofo alemão representou tão bem esse espírito alemão de se pretender 
universal, a mente filosófica dentro de um mundo comandado pelos mais ingênuos 
sentimentos. A síntese absoluta da filosofia construída por Hegel reproduz os 
interesses de uma síntese germânica que não só busca sua unidade como o 
comando da Europa cristã. Assim como os antigos germânicos se uniam em torno 
do chefe para a superação dos grandes confrontos bélicos, nos tempos idos,39 os 
alemães do século XIX, especialmente os nacionalistas como Hegel, elegiam o 
império prussiano como a liderança racional para comandar a unificação. A síntese 
de Hegel é a síntese do espírito na história, no mundo, por isso precisa dos 
instrumentos do mundo para sua realização enquanto determinação da vontade. 
Para se libertar desta perdição de si mesmo, e do seu universo, e 
do infinito sofrimento que lhe é conseqüente – sofrimento de que o 
povo israelita foi o suporte -, o espírito, fechado em si mesmo no 
extremo da sua negatividade absoluta, apreende, numa 
perturbação que é em si e para si, a positividade infinita da sua 
vida interior, o princípio da unidade da natureza divina e humana, 
e na consciência de si e na subjectividade aparece a reconciliação 
como verdade objectiva e liberdade. O princípio nórdico dos povos 
germânicos é que tem a missão de tal realizar.40
O princípio da liberdade como valor, segundo Hegel, é de natureza 
germânica, e como tal significa que o povo alemão deve realizar tal idéia, cumprir o 
 
38 HARTMANN, N. A Filosofia do Idealismo Alemão: 9-10. 
39 ANDERSON, P. Passagens da Antiguidade ao feudalismo: 117. 
40 HEGEL, G. W. F. Princípios da Filosofia do Direito: 320. 
 24
fim para o qual está determinado ou mesmo se determinou como uma imposição a 
partir da consciência de si, da autoconsciência enquanto determinação de sua 
individualidade e importância. Talvez esteja aqui a chave para compreender o 
entusiasmo que a filosofia hegeliana exerceu sobre boa parte da inteligência alemã, 
sobretudo naqueles jovens por realizar seu papel dentro da história, a luta política 
por uma Alemanha conforme os novos tempos. 
Na Introdução de sua Filosofia da História, Hegel monta um quadro onde 
divide a história universal em quatro grandes momentos, começando pelo oriente, 
pela Ásia, passando pela Grécia, Roma e terminando a caminhada do espírito no 
mundo germânico. 
A história universal vai do leste para oeste, pois a Europa é o fim 
da história universal, e a Ásia é o seu começo. (...) O oriente sabia 
– e até hoje sabe – apenas que um é livre; o mundo grego e o 
romano que alguns são livres; o mundo germânico sabe que todos 
são livres.41
Essa divisão tem por fim mostrar que o conceito de Estado foi uma longa 
maturação na qual o seu elemento formal é a monarquia, onde a liberdade 
encontra espaço de sua materialização. 
Em conseqüência, a primeira forma de governo que tivemos na 
história universal foi o despotismo; depois vieram a democracia e 
a aristocracia, e, em terceiro lugar, a monarquia.42 
Hegel evidencia a realização do Estado como reino da liberdade pela 
determinação político-administrativa enquanto monarquia, instância do universal 
pela concretização da idéia, o espírito tomando consciência de si na história. 
Então se apresenta o mundo germânico, o quarto momento da 
história universal; comparado aos momentos anteriores, 
corresponderia à velhice. A velhice natural é fraqueza, mas a 
velhice do espírito é a perfeita maturidade e força; nela, ele 
retoma a unidade consigo, em seu caráter totalmente 
desenvolvido como espírito.43
 
41 HEGEL, G. W. F. Filosofia da História: 93. 
42 Ibidem. 
43 Idem: 97. 
 25
Nessa perspectiva político-filosófica de Hegel, o mundo constituído pelo 
espírito germânico, tem a tarefa de implementação do reino da razão quando 
efetiva a realização da vontade que, não sendo particular, mas universal, desdobra-
se na realidade histórica, na concretização do mundo político. Esse mundo político é 
dominado pela vontade do conceito de direito que se expressa na figura do Estado 
como reino ético, reino da liberdade não de um ou de poucos, mas de todos. O 
espírito germânico seria então a liberdade como uma dimensão espiritual, portanto, 
realidade que se concluiu no momento em que o espírito se determinou 
comunitariamente. Hegel inverte as determinações do real porque a natureza do 
seu pensamento é lógico-idealista, isto é, o objeto é uma realização do conceito, 
portanto lógico-ideal, o pensamento dá as condições de todo conhecimento. Não é 
o sujeito e muito menos o objeto que se pronunciam na qualidade de se apreender 
o conhecimento. O conhecimento se realiza como categoria lógica, por isso é 
sempre um conceito, uma idéia.44 
La proposición que lo finito es ideal, constituye el idealismo. El 
idealismo de la filosofía no consiste en nada más que en esto: no 
reconocer lo finito como un verdadero existente. Cada filosofia es 
esencialmente un idealismo, o por lo menos lo tiene como su 
principio, y el problema entonces consiste sólo [en reconocer] en 
qué medida ese principio se halla efectivamente realizado. La 
filosofía es [idealismo] tanto como la religión; porque tampoco la 
religión reconoce la finitud como un ser verdadero, como un 
último, un absoluto, o bien como un no-puesto, eterno.45
O verdadeiro ser não é aquele que se apresenta aos sentidos, mas aquele 
que é compreendido no pensamento como determinação última, isto é, as coisas 
são representadas pelo conceito, em última instância é o pensamento como ato que 
determina a existência da realidade. Isso não quer dizer que os objetos não 
existam ou não tenham realidade, essa realidade primeiro se afigura no 
 
44 Para o idealista lógico o objecto gesso não existe nem em nós nem fora de 
nós; não existe pura e simplesmente, necessita de ser concebido. Mas isto tem 
lugar devido ao nosso pensamento. Formando o conceito de gesso, o nosso 
pensamento concebe o objeto gesso. Para o idealista lógico o gesso não é, 
portanto, nem uma coisa real nem um conteúdo da consciência; é um conceito. 
O ser do gesso não é, segundo ele, nem um ser real nem um ser consciente, 
mas um ser lógico-ideal. HESSEN, J. Teoria do Conhecimento: 105-106. 
45 HEGEL, G. W. F. Ciencia de la Lógica: 136. 
 26
pensamento como realidade que possibilita o conhecimento. O conhecimento não é 
um atributo do objeto e sim do sujeito enquanto aquele que pensa conceituando. É 
preciso assinalar que no idealismo tudo se trata especificamente como algo 
existente na idéia, nas construções da consciência, no sujeito, istoé, 
não há coisas reais, independentes da consciência.46 
Filosofia do Direito: o político no sistema de Hegel 
A Filosofia do Direito de Hegel, mais do que um tratado jurídico-político é 
teoricamente um tratado ético-político, está na mesma tradição da A República de 
Platão (428-348 a.C.), a Política de Aristóteles (384-322 a.C.), O Príncipe de 
Nicolau Maquiavel (1469-1679), o Leviatã de Thomas Hobbes (1588-1679), O 
Contrato Social de Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), enfim, constitui um 
clássico do pensamento político do ocidente. Seja como for, independente do ponto 
de vista de cada expectativa, a obra política de Hegel é um marco dentro do 
pensamento político moderno, uma vez que leva adiante uma crítica do Estado e do 
próprio liberalismo na possibilidade de fundamentar teoricamente os homens 
públicos nos negócios públicos. 
O tema central dessa obra, sem prejuízo para os demais enfoques, está 
relacionado à efetivação do plano da liberdade como dimensão do direito no sentido 
da eticidade,47 em que o Estado assume a instância universal de superação de 
todas as particularidades. Sendo assim, o Estado em Hegel tem em si a idéia de 
representar a totalidade político-social, de encerrar em si o mundo público e o 
mundo privado, a restauração da vida ética na representação grega. Hegel pensa a 
comunidade no sentido politicamente estatal, legal, normativo, ou seja, por meio 
da norma jurídica – instrumento jurídico-político – a liberdade atinge sua realização 
num elo comum a todos. O Estado em Hegel não é só um poder como também uma 
função. Uma função política no trato da coisa pública que é devidamente pública 
 
46 HESSEN, J. Teoria do Conhecimento: 102. 
47 HARTMANN, N. A Filosofia do Idealismo Alemão: 598. 
 27
para a satisfação do indivíduo dentro do Estado. O pensamento de Hegel é herdeiro 
da revolução francesa, e como tal tem na lei, portanto na legalidade, o fundamento 
da nação enquanto sociedade organizada, cujo fim é a liberdade. 
Na Filosofia do Direito, Hegel pensa uma ordem política onde as instituições, 
sobretudo as políticas, deveriam funcionar na devida medida em que os interesses 
universais sejam garantidos dentro dos particulares, delegando aos órgãos públicos 
a tarefa de, em si, resolver o social por meio do político. Hegel, que para muitos é 
considerado o grande aristotélico moderno, pensa o homem a partir de uma ordem 
necessária que o antecede,48 ou seja, sua possibilidade enquanto homem só é 
possível dentro do Estado, a polis moderna, cuja finalidade consiste numa eticidade 
pelo direito, pela normatividade. 
a) Família, Sociedade Civil e Estado 
A Filosofia do Direito de Hegel pode ser tomada como uma tentativa de firmar o 
princípio racional como real, na medida em que a sociedade civil é apenas uma 
etapa que o espírito objetivo cumpre até se realizar como Estado: a verdade que se 
volta a si mesmo. A Filosofia do Direito definitivamente traz o pensamento social de 
 
48 Na ordem natural a cidade tem precedência sobre a família e sobre cada um 
de nós individualmente, pois o todo deve necessariamente ter precedência sobre 
cada um de nós individualmente. ARISTÓTELES. Política: 15. Ao chamar Hegel 
de aristotélico moderno, estou tomando as relações que este pensador 
promoveu quando vai a Aristóteles no intento de buscar fundamentos para sua 
filosofia. Observa-se que muitas construções hegelianas têm inspiração 
aristotélica, a começar pela figura da flor e da semente que Hegel buscou na 
formulação de ato e potência de Aristóteles, assim como a tese de o todo 
preceder as partes (uma inspiração platônica). Uma outra formulação que marca 
profundamente o pensamento político de Hegel é aquela em que Aristóteles 
anuncia que o homem só conhece sua dimensão na polis, onde Hegel dirá que o 
homem só percebe sua dimensão no Estado. Estas observações são feitas a 
partir dos seguintes autores: OLIVEIRA, A. M. Ética e Sociabilidade: 198, no 
capítulo destinado a Hegel destaca: Hegel, o grande aristotélico dos tempos 
modernos, antecipa de certo modo, através de sua vinculação a Aristóteles, 
algumas das intuições fundamentais do pensamento contemporâneo. LEBRUN, 
G. Hegel leitor de Aristóteles: 57: “Qualquer coisa que se queira pensar a 
respeito da análise que faz Hegel de Aristóteles nas Preleções sobre a História da 
Filosofia, um mérito, ao menos, se lhe deve reconhecer: Hegel voltou a fonte; 
retornou ao texto do Estagirita – e isso com dificuldade, sem haver tradução 
latina; pôs-se à sua escuta direta com desprezo do aristotelismo escolar. 
MARCUSE, H. Razão e Revolução: 51: A filosofia de Hegel é em amplo sentido a 
reinterpretação da ontologia de Aristóteles, liberada esta das distorções do 
dogma metafísico. RAMOS, C. A Crítica Marxista do Estado Hegeliano: 1, 
assinala: A crítica ao modelo aristotélico-hegeliano, exposta por Marx, retrata 
uma outra posição teórica em relação ao Estado. 
 28
Hegel, sua preocupação com a tentativa de ir ao encontro da história e dela 
resgatar a dimensão do homem. 
No entendimento de Hegel, tanto a família quanto a sociedade civil são dois 
momentos que antecedem o Estado, mas que na verdade são dois momentos da 
idéia de Estado. Etapas pelas quais o Estado superou como autodesenvolvimento 
de si na objetivação do plano da liberdade. Família e sociedade civil são reinos 
particulares diante do Estado, todavia consideradas em si, constituem o 
desenvolvimento da idéia de liberdade, a passagem do contingente para o racional, 
isto é, o necessário. Família e sociedade civil são, no entender de Hegel, 
necessidades onde o espírito no processo toma consciência de si. 
No primeiro momento a família, substancialidade imediata do espírito, 
determina-se pela sensibilidade (amor), ou seja, é onde o espírito adquire sua 
relação com o mundo externo, se apresentando em uma unidade.49 A família de 
certa maneira surge como uma relação racional, espírito ético imediato,50 sentido 
de superação da natureza, ou melhor, qualidade de promover o conteúdo para além 
do sujeito e da pessoa, a substancialização de membro, de um dentro de outros: na 
relação com todos.51
Na superação da família, Hegel apresenta a sociedade civil como relação de 
superação do reino das particularidades, ou das unidades particulares, que agora se 
unem na disposição de encontrarem uma associação mais ampla de resguardar 
ainda assim, os mesmos interesses particulares. A sociedade civil é a negação 
lógica da família que ao seu turno será negada pelo Estado como reino ético, logo a 
sociedade civil é o momento em que os membros da família libertam-se da 
condição de membros de uma unidade para encontrarem em si no 
 
49 HEGEL, G. W. F. Princípios da Filosofia do Direito: 160. 
50 HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das Ciências Filosóficas. Vol. I: 297. 
51 WEBER, T. Hegel: Liberdade, Estado e História: 102. 
 29
aparecimento de pessoas independentes e reconhecidas como tais 
pela sua maioridade.52 
A sociedade civil assume em si mesma um instante necessariamente fadado 
à sua superação, isso porque superando o reino das particularidades da família, não 
consegue ir além de uma superação tímida, que por sua vez acirra essas mesmas 
particularidades agora em bases não naturais, mas artificiais, nas classes e outras 
corporações. Eis que o Estado, a universalidade concreta, é absolutamente o fim 
das particularidades tomadas como centro, cedendo aos interesses gerais. 
b) A Constituição, poderes políticos e o papel da burocracia 
Após o advento da revolução norte-americana de 1776, da declaração da 
constituição dos Estados Unidos da América do Norte em1783, e a eclosão da 
revolução francesa de 1789, com suas sucessivas fases na qual se destaca a 
constituição de 1793, o pensamento jurídico-político ocidental amadureceu a idéiade organização política tendo por base uma constituição formal que estabelecesse 
os princípios reguladores de uma determinada formação social. A constituição como 
algo necessário à sociedade organizada é um fenômeno que data da Grécia antiga, 
especificamente da Atenas do período clássico, pois para os gregos o sentido de 
constituição está relacionado à organização do governo, ou melhor, a sua forma de 
governo em vista a administração da cidade. Na modernidade a constituição 
assume também um caráter formal como determinação jurídica de limitação do 
poder real; as constituições surgem no objetivo de se estabelecer leis em que todos 
se obriguem ao cumprimento do firmado mediante uma legislação exterior, isto é, 
de leis dos reis para leis do reino. A constituição deixa de representar forma de 
governo para se firmar como um conjunto de princípios a constituir um Estado 
dentro dos seus limites de ação, assume por fim o sentido de um grande contrato 
social. Todavia essa explicação não é suficiente para dar conta do imenso problema 
que a produção de mercadorias atingiu depois da revolução industrial e da 
consolidação da burguesia como nova classe que ora reorganiza os Estados 
 
52 Idem: 112. 
 30
nacionais. A legislação desponta, através das constituições orgânicas e dos códigos, 
como novo instrumento de resguardar novos interesses, de firmar o novo conceito 
de propriedade privada, proteger a circulação de mercadorias, etc. 
Com a revolução francesa o corolário de que a nação tem na lei o seu 
fundamento53 ganha proporção não só de necessidade jurídica como político-
econômica, visto que desse debate se está construindo aquilo que hoje se costuma 
chamar Estado de Direito, onde a norma tem em si a dimensão de autoridade 
suficiente em sobrepor-se aos governantes em favor de uma ordem pública voltada 
aos interesses coletivos. 
As novas relações de produção, a expansão da indústria e do comércio, as 
garantias essenciais ao implemento de novos negócios, aceleram o sentido da lei 
como algo imprescindível dentro do mundo moderno. Dentro desta modernidade, 
ao lado da construção do capitalismo e do Estado, é que surge, relacionado a tudo 
isso, a Constituição como elemento fundamental de personalização política do 
Estado. Com o conceito de constituição na qualidade de lei máxima de um Estado, 
em que o próprio Estado deve submeter-se, surge a tese de que a lei é uma 
determinação de ordem jurídico-político-administativa, ora comandada pelo espírito 
burguês, pela necessidade burguesa. A Constituição não é, portanto, um puro 
princípio da razão jurídica, mas o resultado de interesses, necessidades, 
perspectivas políticas e econômicas.54
No entendimento de Hegel a constituição marca um momento de pura 
racionalidade jurídico-política, o momento em que a liberdade está posta pela 
garantia da determinação da idéia até chegar ao concreto de si, isto é, pelos 
instrumentos efetivos da normatividade. 
(...) por Constituição deve-se entender a determinação dos 
direitos, isto é, das liberdades em geral, e a organização de sua 
 
53 Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, 1789, artigos específicos 1º, 
3º e 6º. 
54 Ler TROTTA, W. A Constituição como determinação de legitimidade. 
 31
efetivação; e que a liberdade política só pode, em todo caso, 
formar uma parte dela.55
Para Hegel a constituição determinaria a racionalidade do Estado, o 
momento em que são superadas as particularidades da sociedade civil, se 
organizando num organismo vivo e necessariamente lógico-racional, em que o 
Estado, na perspectiva de totalidade, é o universal, o centro de uma vida ética 
tendo o público e o privado como dimensões continuadas pela liberdade de todos. 
A constituição política é, em primeiro lugar, a organização do 
Estado e o processo da sua vida orgânica em relação consigo 
mesmo. Neste processo distingue o Estado os seus elementos no 
interior de si mesmo e desenvolve-os em existência fixa.56
No pensamento de Hegel a constituição é a materialização racional do 
Estado. O momento em que o próprio Estado em si torna-se efetivamente universal 
concreto dentro de uma dada organização social. A constituição assume o sentido 
de determinação do Estado moderno, ou seja: a plena configuração de sua legítima 
existência no limite das relações entre os homens. 
A Constituição é racional quando o Estado determina e em si 
mesmo distribui a sua actividade em conformidade com o conceito, 
isto é, de tal modo que cada um dos poderes seja em si mesmo a 
totalidade.57 
Tinha Hegel entendido que a constituição seria um elemento essencial do 
Estado moderno, o que o diferenciaria dos outros momentos desse conceito ao 
longo da história, por isso que no seu sistema a constituição marcaria o Estado 
como organismo, como um funcionamento biológico necessariamente, tendo as 
partes naturais subordinadas ao todo. 
Hegel não admite a clássica separação entre os poderes interpretada por 
Montesquieu (1689-1755), pois entende que tal concepção não só dificultaria a 
unidade do Estado como o colocava em risco pela sua fragmentação.58 Esse 
organismo hegeliano é uma determinação de sua lógica mais que outra coisa 
 
55 HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das Ciências Filosóficas. Vol. I: 311. 
56 HEGEL, G. W. F. Princípios da Filosofia do Direito: 250. 
57 Idem: 251. 
58 Idem: 253. 
 32
qualquer. É a lógica sendo representada pela concretização da idéia. É interessante 
notar que em Hegel a concepção de poder de Estado difere substancialmente dos 
seus contemporâneos, que pensam de alguma forma na construção de um Estado 
racional e efetivamente comprometido com a nova realidade do indivíduo burguês, 
com a individualidade burguesa, o plano de uma liberdade atomizante dentro de 
uma ordem política. Hegel na percepção dessa nova realidade, parte do conceito de 
unidade do Estado, e para tanto não confere à clássica separação dos poderes a 
importância que tem dentro do pensamento liberal contra o pensamento 
absolutista. Para Hegel o Estado não poderia se constituir em diversos outros 
poderes que não fosse o próprio Estado, um poder em si mesmo, visto que 
qualquer unidade em si e para si além do Estado, levaria a unidade de Estado 
soberano a se diluir e não efetivar o seu próprio conceito que é a concretização da 
liberdade. Para Hegel os poderes não constituíam nenhuma determinação fora 
daquilo que o próprio espírito do Estado atingiu na história. A divisão dos poderes é 
a cisão do Estado enquanto elemento histórico a permitir que todos os indivíduos 
sejam livres. O Estado moderno é a maturidade histórica sob a qual os homens se 
organizam e superam as particularidades no fim de nele buscar o universal. Logo, 
Estado só existe na medida de sua unidade, de sua universalidade. Pensá-lo 
dividido em poderes é pensá-lo dominado pelas esferas das particularidades, diluído 
privadamente. 
Para Hegel a concepção de separação dos poderes tem em si algo que, 
devidamente entendida, é importante no sentido da determinação da liberdade 
pública, mas que para isso é preciso acima de tudo compreender que tal separação 
não pode passar de um princípio de distribuição de funções, que em si não 
comprometa a unidade do Estado em sua soberania. 
Entre as concepções correntes, dever-se-á mencionar a da 
necessária separação dos poderes. Poderia ser ela uma concepção 
muito importante, pelo que representa de garantia da liberdade 
pública, se fosse tomada no seu verdadeiro sentido (...) É nela que 
se encontra o elemento da determinação racional. O princípio da 
 33
separação contém, com efeito, como elemento essencial, a 
diferenciação, a razão na realidade.59
Na relação que Hegel estabelece entre realidade e pensamento, isto é, a 
realidade como produto daquilo pensado, a separação dos poderes

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