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CAPÍTULO 03 
O PROCESSO DE FAVELIZAÇÃO 
NO RIO DE JANEIRO 
 
O tema “Geografia do Rio de Janeiro e Conhecimentos 
Gerais” tem feito parte da grade de edital de diversos 
concursos do estado do Rio de Janeiro, inclusive do 
concurso da Polícia Militar do Estado. Esse enfoque 
retrata o caráter inovador da disciplina a partir da 
abordagem crítica. 
 
Este material traz uma visão múltipla sobre a Geografia, 
abordando especificidades físicas e humanas. Natureza e 
sociedade se embaralham e moldam o planeta em seus 
vários recantos. Os temas abordados adentram na 
explicação da natureza e do dia a dia dos habitantes dos 
continentes, de modo a fazer menção aos mais variados 
temas. Várias temáticas vêm acompanhadas de textos 
complementares para que um maior arcabouço teórico 
possa ser oferecido ao leitor. Acreditamos que, a partir 
dessa leitura, possamos ampliar o conhecimento de 
nossa realidade. 
----------------------------------------------------------------------- 
INTRODUÇÃO 
Mangueira teu cenário é uma beleza 
que a natureza criou 
O morro com seus barracões de zinco 
quando amanhece, que esplendor 
 
Todo mundo te conhece ao longe 
pelo som de teus tamborins 
e o rufar do teu tambor 
chegou ô, ô, ô. 
A mangueira chegou, ô, ô. 
Exaltação a Mangueira. Jamelão 
 
Para entender o processo de produção do espaço 
urbano na cidade do Rio de Janeiro e como ele 
contribuiu para a atual organização do espaço, 
caracterizada pela intensa fragmentação social, é 
necessário voltar ao processo de formação da 
cidade, principalmente no início de sua 
transformação em espaço adequado às exigências 
do modo de produção capitalista. Este período, 
correspondente à segunda metade do século XIX, 
interessa-nos aqui em razão do seu papel 
transformador da cidade, de sua antiga forma 
colonial-escravista para uma cidade adequada 
aos interesses do capital e do Estado 
Republicano. 
 
A história das favelas, na versão mais difundida, 
conta que elas surgiram no final do século XIX 
num morro localizado no centro da cidade do Rio 
de Janeiro chamado “Morro da Providência”. 
Soldados que retornavam do combate aos 
seguidores de Antônio Conselheiro chegaram de 
Canudos e se instalaram no referido morro para 
pressionar o Ministério da Guerra a lhes pagar os 
soldos devidos. 
 
Os ex-soldados acabaram se instalando lá mesmo. 
O morro, porém, se assemelhava com outro que 
se tornara muito conhecido durante o conflito de 
Canudos por ter sido o último reduto dos 
combatentes que insurgiram contra a República: 
o “Morro da Favella”. 
 
 
Quartel general e Morro da Providência, 1900 
 
A denominação acabou se generalizando para 
todas as aglomerações análogas que vieram a ser 
constituídas. Desde então, o Morro da 
Providência (que ficou conhecido como Morro da 
Favella) entrou para a história como a primeira 
favela do Rio de Janeiro. 
 
No entanto, na época, embora o Morro da Favella 
fosse bastante conhecido, o foco principal dos 
higienistas era o “cortiço”. Essas habitações 
coletivas, onde viviam os mais pobres, foram 
consideradas pelos médicos como um grande 
perigo para a cidade, em razão da aglomeração 
excessiva de pessoas em pequenos dormitórios, 
da falta de higiene e da consequente produção de 
“miasmas”, que eram os grandes responsáveis 
pelas epidemias que assolavam a cidade. 
 
Mesmo antes da chegada dos soldados de 
Canudos, Barata Ribeiro já havia decretado 
guerra aos cortiços, e muitos deles foram 
destruídos, incluindo o mais famoso da cidade, 
localizado na Rua Barão de São Félix (atrás da 
Central do Brasil), conhecido como: “Cabeça de 
Porco” (demolido em 1893). 
 
O “Cabeça de Porco”, todavia, não se limitava ao 
sobrado que constituía seu edifício principal, mas 
também se alastrava morro acima, onde o 
proprietário permitia a construção de pequenas 
casas. Com a demolição do cortiço, muitos dos 
moradores teriam, então, subido a colina e 
montado seus casebres improvisados. 
 
No início do século XX, quando Rodrigues Alves 
chegou à presidência da República e nomeou 
Pereira Passos como prefeito, com o objetivo 
claro de sanear a cidade, a situação dos cortiços 
se agravou ainda mais, especialmente após a 
posse de Oswaldo Cruz como chefe da Diretoria 
Geral de Saúde Pública, em 1903. 
 
Oswaldo Cruz começou a efetuar demolições em 
massa para extinguir os cortiços de uma vez por 
todas, e a administração de Pereira Passos ficou 
conhecida pelo “bota abaixo”. 
 
 
Tudo isso teria levado à desarticulação das 
formas de sobrevivência das camadas mais 
pobres da população, que terminariam 
construindo seus barracos nas encostas dos 
morros ou rumando para os subúrbios da cidade. 
 
Com o processo de urbanização e crescimento 
populacional da cidade, os morros foram se 
adensando e passaram a preocupar as 
autoridades públicas. Assim, em razão do 
crescimento populacional, da dificuldade de 
encontrar habitações baratas por outras razões, 
as favelas se espalharam rapidamente. A história 
das favelas conta também que elas só passariam a 
marcar a paisagem carioca a partir de 1933. 
 
A cidade do Rio de Janeiro foi forjada numa dura 
luta contra o pântano, a montanha e o mar. A 
cidade antiga era balizada pela presença de 
quatro morros: Castelo, Santo Antônio, São Bento 
e Conceição, e as primeiras vias da cidade foram 
construídas presas ao sopé dos morros para 
evitar o brejo. A expansão da cidade se fez sobre 
uma planície encharcada, por meio de sucessivos 
desmontes de morros, drenagem e aterro de 
brejos e lagoas. 
 
Os bondes puxados a burro ligavam a área central 
aos bairros: Botafogo, Laranjeiras, Jardim 
Botânico, Tijuca, Rio Comprido e São Cristóvão. 
As montanhas do Rio de Janeiro foram logo 
valorizadas como local de residência permanente, 
especialmente as encostas de Santa Teresa, Glória 
e Rio Comprido. Além disso, as montanhas eram 
consideradas locais de cura e lazer, por isso 
diversos sanatórios e casas de saúde particulares 
foram construídos em morros. 
 
A cidade crescia, sem dúvida, e o número de 
casebres nos morros também. Mas pelo menos 
até a década de 1940, poucos apresentavam 
condições de adensamento de moradores. 
 
O Plano Agache foi o primeiro documento oficial 
a citar a presença de favelas no Rio de Janeiro – 
quando esta presença já começava a incomodar. 
No censo de 1948, já se registrava uma população 
de 138.837 habitantes morando em 105 favelas, o 
que representava 7% da população da cidade. As 
favelas estavam distribuídas por toda a cidade, 
sendo os pontos de maior concentração a Zona 
Norte (29,5%) servida pelo trem, a área central 
(22,7%) e a Zona Sul (20,9%). 
 
 
 
 
 
Durante o período que vai de 1945 a 1965, 
surgiram novos conflitos com relação às áreas 
valorizadas da cidade e a presença de população 
pobre nessas áreas. As favelas, apesar de 
incômodas, serviram de instrumento político, 
como campo de atuação dos candidatos, que 
ofereciam barganhas para os favelados em troca 
de votos, que nessa época representavam quase 
10% da população carioca. A favela passou a ter, 
portanto, maior visibilidade no cenário político e 
cultural da época. Na década de 30, o samba, 
nascido na praça Onze e subindo a favela 
posteriormente, passou a figurar nos principais 
circuitos da música carioca, assim como as 
escolas de Samba, até hoje muito ligadas às 
favelas, passaram a fazer parte do programa 
oficial do carnaval da cidade. 
 
Os Parques Proletariados da Gávea, Leblon e Cajú 
foram construídos entre 1941 e 1943 e 
removeram cerca de 4.000 moradores, com a 
promessa de que a moradia no parque seria 
provisória, e que os moradores poderiam 
retornar para as áreas de onde foram removidos 
quando estas passassem por obras de 
urbanização. Os Parques Proletários acabaram 
funcionando como um mecanismo de fixação 
territorial de moradores de favelas, mas com a 
valorização dos bairros onde foram instalados, 
principalmente Leblon e Gávea, os moradores 
foram removidos novamente para áreas menos 
valorizadas. O ParqueProletário da Gávea foi 
removido em 1970 e sua população foi fixada na 
Cidade de Deus. 
 
 
Remoção do Parque proletário da Gávea. 
 
A implantação do regime civil-militar no Brasil 
representou grandes impactos na organização 
social e espacial da cidade, que esteve marcada 
pela implantação de grandes indústrias e grandes 
obras de infraestrutura, além da fusão do estado 
da Guanabara e do Rio de Janeiro. 
 
O período da ditadura militar foi de intensa 
repressão às favelas e à população pobre da 
cidade, sendo um período de muitas remoções de 
favelas, principalmente na Zona Sul. O período de 
1960 a 1980 foi de muitas incertezas para a 
população favelada, marcado principalmente por 
remoções e intensa opressão política. 
 
As associações e organizações dos moradores que 
começaram a se formar na década de 1940 e 
1950 foram completamente dissolvidas durante o 
período de repressão política. Além disso, as 
décadas de 1970 e 1980 foram particularmente 
difíceis para a cidade do Rio de Janeiro, dentro da 
lógica econômica do país, pois a cidade passou 
por um esvaziamento político e econômico em 
razão transferência da capital para Brasília. A 
política habitacional adotada pelo governo da 
ditadura foi um programa maciço de construções 
habitacionais, por meio do BNH e da Cohab, que 
muitas vezes não atingia aos pobres e causou um 
aumento da favelização apesar das remoções. 
 
Durante os anos de 1980, prevaleceram no Rio de 
Janeiro as políticas sociais clientelistas e uma 
negação à prática de remoções. A prática 
clientelista adotada pelo governo Brizola 
representou também uma nova forma de lidar 
com as favelas e os excluídos no Rio de Janeiro. 
Brizola desenvolveu, então, projetos que visavam 
a implantação de infraestrutura (rede de água, 
saneamento e coleta de lixo), pois as favelas do 
Rio até este período possuíam infraestrutura 
muito precária. Além disso, o programa mais 
importante do governo Brizola era denominado 
“Cada Família um lote”, e visava à regularização 
fundiária das moradias nas favelas. 
 
 
 
O programa representou o primeiro projeto 
social com vias a assumir a presença da favela na 
cidade, tornando-as parte da cidade legal, 
funcionando como uma legitimação da favela na 
cidade. O início da década de 1980 representou, 
portanto, a “adoção de políticas de 
reconhecimento das favelas e dos loteamentos 
irregulares e clandestinos como solução dos 
problemas de moradia das camadas populares. 
 
O governo Brizola representou, também, o 
momento da consolidação dos investimentos 
feitos pelos próprios moradores das favelas em 
suas casas, representando a passagem do 
barracão de madeira e zinco à casa de alvenaria. 
A regularização dos imóveis na favela acabou de 
vez com a ameaça das remoções, principalmente 
na Zona Sul da cidade, onde as favelas estão em 
áreas privilegiadas quanto à acessibilidade e 
próximas do principal mercado de trabalho. As 
favelas passaram, então, por um período de 
mudança, deixando evidenciado o poder de 
compra do pobre, visto que rapidamente as 
favelas foram tomadas por casas de alvenaria. 
 
O efeito da política do governador Leonel Brizola 
pode ser notado por meio da intensa 
verticalização observada nas favelas do Rio, 
principalmente na Zona Sul, pois a alvenaria 
permitiu a construção de casas de dois e três 
andares, que se multiplicaram rapidamente. Hoje, 
é possível observar inclusive prédios em algumas 
favelas da cidade. 
 
 
Prédio sendo construído na favela da Rocinha, na 
Zona Sul do Rio de Janeiro, em 2009. As construções 
de prédios e casas de três pavimentos são muito 
comuns na Rocinha, assim como em outras favelas da 
cidade. 
 
 
 
A Zona Sul teve grande participação no 
contingente de favelas em razão do grande 
crescimento que se inicia na década de 1940 e vai 
até os anos de 1970, quando a Zona Sul passa por 
intenso processo de valorização e verticalização. 
 
A década de 1990 e o início dos anos 2000 foram 
marcados pela manutenção da política dos 
governos anteriores de prover infraestrutura nas 
áreas de favela, além da manutenção da 
legalidade dos imóveis. Nesse contexto surgiu o 
Programa Favela-Bairro, em 1995, um programa 
muito amplo de urbanização das favelas e com 
alto investimento público e internacional, do 
Banco Interamericano de Desenvolvimento 
(BID). O Programa ocorreu de 1995 a 2000 e 
beneficiou 54 favelas e oito loteamentos 
irregulares, segundo dados do Instituto Pereira 
Passos. 
 
Atualmente, a relação da favela e do bairro 
continua delicada, pois as favelas se multiplicam 
por todos os bairros da cidade, sem distinção. 
Segundo dados do Instituto Pereira Passos e do 
IBGE, existem cerca de 750 favelas espalhadas 
por toda a cidade, e a população favelada passa 
de um milhão de pessoas, representando cerca de 
18% da população e ocupando cerca de 42 Km2 
da área total da cidade, estando a favela 
completamente ligada à paisagem do Rio de 
Janeiro. 
 
Na Zona Sul existem 27 favelas registradas, que 
contam com cerca de 100 mil moradores, 
ocupando uma área de cerca de 4% da área total 
dos bairros. Como lidar com esta situação e 
melhorar as condições de vida das pessoas torna-
se um desafio cada vez maior. 
 
RAP DA FELICIDADE 
 
Eu só quero é ser feliz 
Andar tranquilamente na favela onde eu nasci 
E poder me orgulhar 
E ter a consciência que o pobre tem seu lugar 
(...) 
 
Minha cara autoridade, eu já não sei o que 
fazer 
Com tanta violência eu tenho medo de viver 
Pois moro na favela e sou muito 
desrespeitado 
A tristeza e a alegria aqui caminham lado a 
lado 
Enquanto os ricos moram numa casa grande e 
bela 
O pobre é humilhado, esculachado na favela 
(...) 
 
Nunca vi cartão postal que se destaque uma 
favela 
Só vejo paisagem muito linda e muito bela 
Quem vai pro exterior da favela sente 
saudade 
O gringo vem aqui e não conhece a realidade 
Vai pra Zona Sul pra conhecer água de coco 
E pobre na favela, vive passando sufoco 
Funk Carioca – Rap da felicidade MC Cidinho e Doca, 
1995 
 
QUESTÕES CORRELATAS 
01. O espaço urbano da cidade do Rio de 
Janeiro foi reformulado no começo do século 
XX com vistas à modernização. No decorrer 
dessa reforma urbanista eclodiu uma revolta 
popular 
 
A) apelidada de Bota Abaixo, que procurava 
deter as construções e obras urbanas ordenadas 
pelo prefeito Pereira Passos, mediante a 
alegação de que a população mais pobre havia 
sido transferida para os morros da cidade, sob a 
promessa, não cumprida, de que teriam 
moradias. 
B) motivada pela reação de setores populares à 
imposição da vacinação executada de forma 
violenta por agentes de saúde com o auxílio da 
polícia, em um contexto de inconformismo 
causado pela demolição de casebres e cortiços 
para o embelezamento da cidade. 
C) iniciada por marinheiros que, indignados com 
a permanência de castigos físicos na Marinha, 
em um momento em que se celebravam os 
ares modernos do Rio de Janeiro, amotinaram-se 
e bombardearam parte da região portuária da 
capital, com o apoio de outros segmentos da 
população. 
D) desencadeada a pós a execução de dezoito 
jovens tenentes lotados no Forte de Copacabana, 
que haviam se insurgido contra o poder das 
oligarquias e o autoritarismo dos governantes, 
cujas mortes causaram grande comoção 
popular e a realização de barricadas na cidade. 
E) popularizada como Noite das Garrafadas, 
uma vez que populares se armaram com 
pedaços de paus, garrafas e outras armas 
improvisadas para resistirem à ação de 
sanitaristas e milícias que interditaram os 
bairros pobres da cidade e atearam fogo, a fim 
de combater as epidemias de febre amarela e 
varíola. 
 
02. A origem das favelas está relacionada à 
pobreza e à desigualdade social, contudo, no 
caso específico do Rio de Janeiro, as favelas 
surgiram em função da 
 
A) transferência da capital de Salvador para o Rio 
de Janeiro, consequência do desenvolvimento da 
economia cafeeira, o que provocou uma grande 
inflação e o empobrecimento da populaçãoem 
geral. 
B) transmigração da Corte portuguesa para o 
Brasil, que expulsou a elite brasileira de suas 
propriedades urbanas, forçando a abrigar a 
nobreza portuguesa, e que desalojou centenas de 
cariocas de todos os níveis sociais para acomodar 
as necessidades físicas do novo governo. 
C) Era Mauá, cujo desenvolvimento industrial 
atraiu a mão de obra de operários oriundos do 
campo, que, devido às péssimas condições 
salariais, se concentraram nas áreas mais 
miseráveis da cidade. 
D) reforma urbana no centro do Rio de Janeiro, 
durante a Primeira República, que, inspirada no 
modelo urbanístico europeu, derrubou casarões 
coloniais, moradia da população de baixa renda, 
que passou a buscar abrigo nos morros cariocas. 
E) política repressiva do regime ditatorial militar, 
nos anos 60 do século passado, que atuou 
incisivamente contra a população carente e dos 
bairros proletários, buscando conter as 
manifestações e os focos de resistência ao 
governo. 
 
UM LUGAR COMUM, O EUFEMISMO E A 
FAVELA 
 
Uma valorização do eufemismo parece 
importante na dinâmica das relações sociais. 
Seu emprego permitiria, em parte, contornar 
o valor negativo que certas expressões 
espelham. O eufemismo, no entanto, não 
afronta o estigma. Seu uso indica uma relação 
de cortesia, necessária, no curso das trocas 
sociais que se passam com aqueles que não 
podem se desfazer de suas marcas. 
Observamos que este uso é generalizado 
entre diferentes grupos sociais – a mesma 
preocupação pode levar a substituir o 
termo comunidade por outro equivalente, 
como morro ou bairro. Sabemos todos que nas 
trocas sociais o mais importante é o sentido 
que se elabora no interior das suas dinâmicas. 
O esforço continuado para não ferir as 
pessoas que acompanham as trocas sociais 
correntes motiva o uso do 
termo comunidade em muitos momentos, 
inclusive por aqueles diretamente 
concernidos – as pessoas que moram em 
favelas –, quando se referem a seus locais de 
moradia. Empregado pela mídia, pelo 
governo, pelas associações locais, pelas ONGs, 
o termo comunidade muitas vezes explicita a 
dificuldade dessa operação de levar em conta 
o que pensam os que se veem nomeados de 
uma forma negativa. 
 
Se este uso eufemístico é recorrente, vale 
observar que, em muitas circunstâncias, do 
ponto de vista dos moradores, o que é mais 
reivindicado é a não identificação, ou seja, 
preferencialmente, a anulação de qualquer 
referência à identidade territorial em trocas 
sociais diversas. 
 
O termo “comunidade” em seus usos 
eufemísticos não é capaz de impedir a 
associação da pessoa com os traços negativos 
provenientes dessa identificação; somente 
indica a suspensão destes pelo uso 
momentâneo de aspas que podem ser 
retiradas quando for preciso. 
 
BIRMAN, Patrícia. Favela é comunidade? In SILVA, L.A. 
(Org.) Vida sob cerco. Violência e rotina nas favelas do 
Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008, 
pp.106-7. Adaptação. 
 
Do Texto VIII, destaca-se o seguinte trecho: 
 
“Observamos que este uso (do eufemismo) é 
generalizado entre diferentes grupos sociais – 
a mesma preocupação pode levar a substituir 
o termo comunidade por outro equivalente, 
como morro ou bairro”. (linhas 6-8) 
 
A substituição apontada no trecho acima pode 
ser encontrada em letras de algumas canções, 
como no 
exemplo a seguir. 
 
Endereço dos Bailes 
 
“(...) 
Ê ê ê ê! Se liga que eu quero ver 
O endereço dos bailes eu vou falar pra você 
É que de sexta a domingo na Rocinha o morro 
enche de gatinha 
Que vem pro baile curtir 
Ouvindo charme, rap, melody ou montagem, 
É funk em cima, é funk embaixo, 
Que eu não sei pra onde ir 
 
(...) 
Tem outro baile que a galera toda treme 
É lá no baile do Leme lá no Morro do Chapéu 
Tem na Tijuca um baile que é sem bagunça 
A galera fica maluca lá no Morro do Borel 
(...)” 
 
MC Júnior e MC Leonardo 
 
Essa associação entre favela e morro pode ser 
explicada pela combinação dos seguintes 
aspectos: 
 
A) autossegregação / interferência do 
planejamento estatal. 
B) segregação social / especificidade do sítio 
urbano. 
C) periferização / espaço urbano como 
mercadoria. 
D) metropolização / busca pela legalização da 
posse. 
E) verticalização / política demográfica natalista.

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