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LEGISLAÇÃO EMPRESARIAL APLICADA Tiago Ferreira Santos Estabelecimento e ponto empresarial Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identificar o que vem a ser estabelecimento e sua proteção. Explicar como funciona a proteção ao ponto empresarial. Reconhecer os mecanismos de alienação e tutela do estabelecimento e do ponto empresarial. Introdução A criação de um estabelecimento empresarial envolve um dispêndio de tempo e recursos financeiros para o empresário. Sendo assim, essa universalidade deve ser protegida pelo Direito. Do mesmo modo, o ponto criado pelo empresário e identificado pelos clientes merece proteção. Neste capítulo, serão abordados o estabelecimento e a sua alienação, bem como o ponto empresarial. Conceito e proteção do estabelecimento “Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exer- cício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária” (Art. 1.142, BRASIL, 2002, documento on-line). Essa é a defi nição legal de estabeleci- mento, motivo pelo qual bem se entende que estão a ele integrados os bens materiais e imateriais, desde que destinados à atividade empresarial. Assim, ainda que se diga que o “[...] estabelecimento é o instrumento para o empresário exercer sua atividade; é a base física da empresa [...], é o local onde os clientes do empresário se dirigem para realizar negócio” (TEIXEIRA, 2018, p. 81), pelo conceito legal de estabelecimento, não se fala apenas de bens materiais, afinal, “[...] há, ademais, bens imateriais, a exemplo das marcas e das patentes, escrituradas, também, no ativo perma- C03_Estabelecimento_ponto_empresarial.indd 1 20/04/2018 13:22:30 nente da empresa, destinando-se diretamente à consecução da atividade” (MAMEDE, 2018, p. 185). Questiona-se, ainda, se o estabelecimento empresarial consiste em uma universalidade de fato (art. 90, CC) ou de direito (art. 91, CC). Atualmente, tem prevalecido o seu caráter híbrido, ou seja, ora é uma universalidade de direito, ora é de fato. Um dos principais conceitos relacionados ao estabelecimento é o avia- mento, um de seus atributos, surgido da constatação de que “[...] o estabeleci- mento tem condições de produzir lucro para o empreendedor” (TEIXEIRA, 2018, p. 82). Entretanto, mais adequado é reconhecer que o aviamento também pode se referir ao seu oposto, ou seja, redução de lucros e geração de prejuízos. Assim, reconhece-se que “[...] a organização – as características dinâmicas dos bens especializados para a empresa – pode definir um sobrevalor (e, mesmo, um subvalor, em alguns casos)” (MAMEDE, 2018, p. 191). Outra importante informação há de ser trazida, que é a distinção entre patrimônio de estabelecimento empresarial, porquanto é extremamente su- til. Ao passo que esse conceito é o “[...] complexo de bens organizado, para o exercício da empresa” (MAMEDE, 2018, p. 186), consoante já visto, o patrimônio é simplesmente o complexo de bens, sejam eles quais forem, desde que do empresário. Assim, constata-se, de logo, que o “[...] empresário, pessoa natural, pode ter bens que não constem do patrimônio especificado da empresa” (MAMEDE, 2018, p. 186). Além disso, o empresário e a sociedade empresária “[...] podem ter bens que não constem deste complexo organizado para o exercício da empresa” (MAMEDE, 2018, p. 186). Em síntese, patrimônio é um conjunto mais amplo que inclui, por exem- plo, imóveis ou títulos do tesouro não destinados à atividade empresarial, ao passo que estabelecimento é mais restrito, porquanto engloba tão somente os organizados para exercício da empresa, consoante se depreende do CC. Integram o estabelecimento, na condição de seus elementos, esses bens cor- póreos (móveis ou imóveis) e também os bens incorpóreos (nome empresarial, título de estabelecimento, marcas e outros direitos de propriedade intelectual, clientela, freguesia, ponto empresarial, locação para fins não residenciais). Nome empresarial consiste naquele constante dos registros, podendo ser firma ou denominação, a depender da espécie societária. Ao contrário, título de estabelecimento consiste no chamado nome fantasia pelo qual a atividade empresarial é popularmente reconhecida, geralmente é uma parte do nome empresarial, mas por vezes é totalmente distinta. A marca, por sua vez, “[...] é o sinal colocado em um produto ou serviço para que este seja identificado e distinguido, impedindo que possa ser con- Estabelecimento e ponto empresarial2 C03_Estabelecimento_ponto_empresarial.indd 2 20/04/2018 13:22:30 fundido pelo público com outros bens (produtos ou serviços) semelhantes” (TEIXEIRA, 2018, p. 491). Por clientela, entende-se aquele público que mantém relação de fideli- dade com o estabelecido, em função de elementos de ordem subjetiva, como “[...] bom atendimento, a qualidade dos produtos ou a simpatia do empresário” (MAMEDE, 2018, p. 77), ao passo que “[...] a freguesia relaciona-se a aspectos objetivos” (MAMEDE, 2018, p. 77). Acerca da possibilidade de a mesma atividade empresarial ser exercida por diversos estabelecimentos com escrituração própria, há previsão expressa do art. 968, parágrafo único, do CC: “Em qualquer caso, a constituição do estabelecimento secundário deverá ser averbada no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede” (BRASIL, 2002, documento on-line). Assim, [...] a escrituração própria, especializada, permite a distinção de estabele- cimentos diversos, independentes ou não entre si, que sejam titularizados pela mesma pessoa, natural (empresário) ou jurídica (sociedade empresária), podendo, inclusive, ser objeto de relações jurídicas próprias [...] (MAMEDE, 2018, p. 188-189). Portanto, para se pretender consequência jurídica favorável ao titular da atividade empresarial, há de ser observado tal requisito de escrituração própria. A sua constituição é extremamente interessante por diversas questões de ordem prática que repercutem na saúde financeira da empresa em atividade. Não raro, a decisão de averbá-lo faz parte de um planejamento fiscal decorrente de consultoria, para fins de recolher uma quantia inferior de tributos. A importância de utilização desse recurso é destacada por Mamede (2018, p. 189): A distinção de estabelecimento, com contabilidade própria, é, em muitas opor- tunidades, uma solução particularmente interessante para gozar de benefícios fiscais de regime especial, distinguindo, numa mesma atividade, aquelas que sejam tributadas em situação mais vantajosa. Ainda sobre esse tema, segue julgado elucidativo das consequências ju- rídicas possíveis: O princípio tributário da autonomia dos estabelecimentos, cujo conteúdo normativo preceitua que estes devem ser considerados, na forma da legislação 3Estabelecimento e ponto empresarial C03_Estabelecimento_ponto_empresarial.indd 3 20/04/2018 13:22:30 específica de cada tributo, unidades autônomas e independentes nas relações jurídico-tributárias travadas com a Administração Fiscal, é um instituto de direito material, ligado à questão do nascimento da obrigação tributária de cada imposto especificamente considerado e não tem relação com a respon- sabilidade patrimonial dos devedores prevista em um regramento de direito processual, ou com os limites da responsabilidade dos bens da empresa e dos sócios definidos no direito empresarial. (BRASIL, 2013, documento on-line). Em resumo, é possível a obtenção de CNPJ/MF para cada estabelecimento após a averbação do registro na Junta Comercial, sendo que esse cadastro repercute, especialmente, nas obrigações fiscais, mas, em hipótese nenhuma, há a criação de uma nova pessoa e, portanto, há possibilidade de exigir as dívidas processualmente, inclusive, por meio de penhora dos bens de quaisquer estabelecimentos. Interessante anotar, ainda, a distinção entre aviamento objetivo e subjetivo. Aquele [...] decorre de aspectos extrínsecos à atividade do empresário, como é o caso da localizaçãodo estabelecimento (local goodwill); o segundo, subjetivo, deriva de aspectos intrínsecos e conceituais quanto à atuação do empresário, como, por exemplo, a sua competência e boa fama à frente de seu negócio (personal goodwill) (TEIXEIRA, 2018, p. 82). Questão interessante no Direito empresarial contemporâneo é a hipótese do estabelecimento virtual de empresas que atuam, supostamente, apenas na Internet. Não é difícil imaginar, atualmente, negócios automatizados em que a contratação e o objeto usufruído são realizados on-line. Primeira observação que há de ser feita é que o estabelecimento consiste no complexo de bens organizados, sejam eles bens corpóreos ou incorpóreos, logo, esses negócios virtuais, sem dúvidas, têm bens que o integram. Assim, a conclusão do Enunciado nº 7 do Conselho da Justiça Federal (CJF) não poderia ser diferente, ou seja, o nome de domínio integra o estabelecimento. Enunciado nº 7 do Conselho da Justiça Federal (CJF) O nome de domínio integra o estabelecimento empresarial como bem incorpóreo para todos os fins de direito. Estabelecimento e ponto empresarial4 C03_Estabelecimento_ponto_empresarial.indd 4 20/04/2018 13:22:30 Essa hipótese atende muito bem às atividades empresariais que funcionam simultaneamente no meio virtual e físico. Entretanto, para aqueles negócios que pretendem atuar apenas em ambiente virtual, há maiores considerações. Por um lado, o “[...] estabelecimento empresarial virtual originário cor- responde ao que muitos doutrinadores denominam de sites inteligentes, que possibilitam o desenvolvimento da atividade empresarial sem qualquer apoio físico direto” (GOMES, 2018, p. 89), ao passo que “[...] o estabelecimento empresarial virtual derivado corresponde a sites menos elaborados, que contêm estruturas de menor complexidade, [...] e que é por muitos denominado de site passivo” (GOMES, 2018, p. 89). Assim, a situação que se pretende destacar aqui é tão somente a do es- tabelecimento empresarial virtual originário, porque “[...] assim exercida caracteriza o estabelecimento empresarial virtual em si, que logicamente deverá corresponder a um endereço físico unicamente para efeitos registrais perante a Junta Comercial”, CNPJ/MF e ação judiciais (GOMES, 2018, p. 90). Por fim, importa trazer algumas súmulas que interessam ao presente assunto, ainda que se refiram especialmente ao estabelecimento físico. A primeira a ser destacada é a Súmula Vinculante n. 38 do Supremo Tribunal Federal (STF), a qual consolidou que é competência municipal “[...] fixar o horário de funcionamento de estabelecimento comercial”, com fundamento no interesse local previsto no art. 30, inciso I, da Constituição, demonstrando hipótese confirmadora de que também os municípios têm “[...] atuação estatal interventiva para conformar a ordem social” (BRITO, 2016, p. 105). Além disso, há também a súmula vinculante n. 49, também do STF, que considera inconstitucional a vedação ao município de instituição de atividades comerciais concorrentes vizinhas, consoante redação que segue: “Ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que impede a instalação de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área” (BRASIL, 2015, documento on-line). Não poderia ser diferente. Do ponto de vista do Direito empresarial, é usual que os estabelecimentos se valorizem, justamente em razão da proximidade da concorrência, como bem observa Teixeira (2018, p. 18): “Por mais contraditório que possa parecer do ponto de vista concorrencial, às vezes o aviamento se dá em razão de o estabelecimento estar localizado próximo aos concorrentes. Nesse caso, a clientela é atraída para certa localidade em razão de lá haver várias opções de fornecedores”. Além disso, o princípio da livre concorrência está respaldada na proteção do consumidor, afinal, é inegável que a proximidade dos estabelecimentos concorrentes possibilita melhor pesquisa de preço e, assim, redução de gastos. Em outros termos, “[...] a Constituição alçou a livre concorrência aos píncaros 5Estabelecimento e ponto empresarial C03_Estabelecimento_ponto_empresarial.indd 5 20/04/2018 13:22:30 de um de seus princípios integrando-a ao da defesa do consumidor, com o objetivo de realizar o bem-estar social” (BRITO, 2016, p. 204). Tais questões acerca da localização geográfica conduzem à análise do ponto empresarial a ser realizada no tópico seguinte. Proteção do ponto empresarial “Ponto ou ponto empresarial é a localização física do estabelecimento [...]” (TEIXEIRA, 2018, p. 84), não se confundindo também com a propriedade do imóvel, porquanto tem natureza diversa. Assim, civilmente, “[...] a propriedade em si é do seu proprietário. Empresarialmente, com relação ao ponto, é do empresário” (TEIXEIRA, 2018, p. 84). Logo, “[...] quando se vê o anúncio de ‘passa-se o ponto’, na realidade não se está vendendo a propriedade do imóvel, mas, sim, a propriedade sobre o ponto” (TEIXEIRA, 2018, p. 85). Se por um lado se costuma destacar a relação entre clientela e freguesia e ponto empresarial, tal qual faz Tarcísio Teixeira (2018, p. 84) ao afirmar que o estabelecimento “[...] é valorizado pelo deslocamento efetuado dos clientes desde a saída de um local até a chegada nele para realizarem suas compras”, é mais adequado considerar que ele não é protegido [...] apenas pela consideração da clientela ou da freguesia, mas por diversos outros elementos, tais como logística, captação e manutenção de trabalhadores (bem como o custo de seu transporte, facilidade estruturais (distribuição de energia elétrica, comunicações, água e esgoto, vias de acesso) (MAMEDE, 2018, p. 285). Há basicamente duas formas de proteção ao ponto empresarial. Por uma, quando o imóvel for de propriedade do próprio empresário, a sua proteção será regulada pelas normas de Direito civil que tutelam a propriedade civil. Nesse sentido, segue lição de Gladston Mamede (2018, p. 285): No primeiro caso, protege-se o ponto com regras gerais do direito de pro- priedade (Direito das Coisas), garantindo-se ao proprietário o exercício dos direitos inerentes à propriedade, designadamente o direito de usar (ius utendi), gozar (ius fruendi) e dispor (ius disponendi) da coisa, bem como o direito de pedir ao Judiciário que o bem lhe seja devolvido (ius vindicandi, base da ação de reivindicação ou rei vindicatio). Estabelecimento e ponto empresarial6 C03_Estabelecimento_ponto_empresarial.indd 6 20/04/2018 13:22:30 Noutro giro, quando houver contrato de locação para fins não residenciais, chamado de contrato de locação comercial ou empresarial, principalmente, será a Lei nº. 8.245/91 (Lei de Locações) que protegerá o ponto empresarial. Há diversos mecanismos interessantes de proteção nessa lei. Já no mo- mento da contratação, por exemplo, há previsão de contravenção penal para quem exigir luvas ao locatário para renovação do contrato de locação. Sua impossibilidade é bem clara, como segue: Art. 43. Constitui contravenção penal, punível com prisão simples de cinco dias a seis meses ou multa de três a doze meses do valor do último aluguel atualizado, revertida em favor do locatário: I - exigir, por motivo de locação ou sublocação, quantia ou valor além do aluguel e encargos permitidos (BRASIL, 1991, documento on-line). Logo, “[...] são nulas de pleno direito as cláusulas do contrato de locação [...] que afastem o direito à renovação [...] ou que imponham obrigações pecuniárias para tanto”. (art. 45, BRASIL, 2002, documento on-line). Essas limitações restringem tão somente a relação jurídica locador-locatário. Assim, por óbvio, não há qualquer vedação ao locatário que venha a pedir luvas para eventual interessado em adquirir o ponto comercial. Nessa hipótese, há alienante-adquirente. Outras duas situações são expressa- mente proibidas na contratação, sob pena de incidir também na mesma contravenção penal, a saber: II - exigir, por motivo de locação ou sublocação, mais de uma modalidade de garantianum mesmo contrato de locação; III - cobrar antecipadamente o aluguel, salvo a hipótese do art. 42 (inexistência de garantia) e da locação para temporada. (BRASIL, 1991, documento on-line). É interessante prestar atenção a essas disposições por não ser nada estra- nho um empresário desejar alguma dessas medidas, entretanto, incumbe ao profissional do Direito recomendar a atuação adequada e, assim, evitar incidir em contravenção penal. A pessoa que constitui ponto comercial por meio de contrato de locação para fins não residenciais tem direito à ação renovatória. Nesse sentido, há de cumprir alguns requisitos cumulativos previstos no art. 51 do CC: I - o contrato a renovar tenha sido celebrado por escrito e com prazo determinado; 7Estabelecimento e ponto empresarial C03_Estabelecimento_ponto_empresarial.indd 7 20/04/2018 13:22:30 II - o prazo mínimo do contrato a renovar ou a soma dos prazos ininterruptos dos contratos escritos seja de cinco anos; III - o locatário esteja explorando seu comércio, no mesmo ramo, pelo prazo mínimo e ininterrupto de três anos (BRASIL, 2002, documento on-line). A jurisprudência tem sido rigorosa em exigir tais requisitos. Na verdade, não poderia ser muito diferente. Segue julgado: DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. LOCAÇÃO COMERCIAL. AÇÃO RENOVATÓRIA. PRAZO MÍNIMO DO CONTRATO A RENOVAR. CINCO ANOS (INCISO II, DO ARTIGO 51 DA LEI Nº 8.245/91). INOBSERVÂN- CIA. DIREITO À RENOVAÇÃO. PRAZO MÍNIMO DE SEIS MESES DE ANTECEDÊNCIA DO TÉRMINO CONTRATUAL. INOBSERVÂNCIA. DECADÊNCIA DO DIREITO À RENOVAÇÃO (§ 5º, DO ARTIGO 51 DA LEI DO INQUILINATO). 1. SE, NA LOCAÇÃO COMERCIAL, A SOMA DOS PRAZOS DE VIGÊN- CIA DOS CONTRATOS AJUSTADOS ENTRE AS PARTES NÃO CHEGA A CINCO ANOS RESTARÁ FRUSTRADA A RESPECTIVA PRETENSÃO RENOVATÓRIA. [...]. (DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS, 2011, documento on-line). Além desses requisitos, há de ser observado, ainda, que o “direito a re- novação decai aquele que não propuser a ação no interregno de um ano, no máximo, até seis meses, no mínimo, anteriores à data da finalização do prazo do contrato em vigor” (Art. 51, parágrafo quinto, da Lei de Locações). É inte- ressante exemplificar tal situação com a circunstância usualmente presenciada pelos profissionais, qual seja a ação renovatória de um contrato de locação para fins não residenciais, cujo prazo inicial é de cinco anos. Nessa hipótese, o “[...] período para ajuizar a ação renovatória é no penúl- timo semestre de vigência do contrato, ou seja, num contrato de 5 anos (que é composto por dez semestres), a ação deve ser ajuizada durante os meses do nono semestre [...]” (TEIXEIRA, 2018, p. 85). Preste atenção aos prazos. Ingressar antes da data implica ausência de interesse processual, afinal, a lei especifica que será, no interregno de um ano, no máximo: LOCAÇÃO. AÇÃO RENOVATÓRIA. CARÊNCIA DA AÇÃO. 1. Se no transcurso de ação renovatória de aluguel, completa-se o prazo pretendido pela parte demandante, é cabível o ajuizamento de segunda ação renovatória. Todavia, deverá ser observado o prazo legal para a propositura de tal demanda (art. 51, § 5º, Lei n. 8.245/1991). Carece de interesse processual a parte que ajuíza a segunda demanda antes de atingido o período de um ano até seis meses antes do período pretendido na primeira ação. 2. Majorados os Estabelecimento e ponto empresarial8 C03_Estabelecimento_ponto_empresarial.indd 8 20/04/2018 13:22:31 honorários sucumbenciais arbitrados em prol da corré que manejou recurso adesivo [...]. (RIO GRANDE DO SUL, 2012, documento on-line). Ou seja, antecipar-se ao prazo não ajudará, apenas servirá para imputar ao seu cliente honorários sucumbenciais. Noutro giro, se transcorrer período superior ao previsto em lei, estará decaído o direito, visto que faltará período inferior a 6 meses. Segue julgado destacando o rigor: LOCAÇÃO DE IMÓVEIS – AÇÃO RENOVATÓRIA DE LOCAÇÃO – DE- CADÊNCIA – Agravo de instrumento tirado contra decisão que deixou de reconhecer a decadência, determinando o prosseguimento da demanda, com nomeação de perito para avaliação do imóvel – Alegação de que a autora ajuizou a ação após o termo final fixado no art. 51, § 5º, da Lei 8.245/91, prazo este decadencial – A ação renovatória de locação deve ser proposta no prazo de um ano até seis meses do vencimento do contrato locatício a renovar – Demanda aforada um dia após o termo final do prazo – Ocorrência de decadência – Re- curso provido, para reconhecer a decadência e extinguir o feito, com fulcro no art. 269, IV, do CPC, condenando a autora ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios. (SÃO PAULO, 2015, documento on-line). Assim, após estudadas as principais normas que protegem o ponto em- presarial, bem como seus requisitos, importa verificar a exceção de retomada quando o proprietário poderá retomá-lo em algumas circunstâncias, a saber: I - por determinação do Poder Público, tiver que realizar no imóvel obras que importarem na sua radical transformação; II - para fazer modificações de tal natureza que aumente o valor do negócio ou da propriedade; III - o imóvel vier a ser utilizado por ele próprio, hipótese em que não poderá ser destinado ao uso do mesmo ramo do locatário, salvo se a locação também envolvia o fundo de comércio, com as instalações e pertences; IV - para transferência de fundo de comércio existente há mais de um ano, sendo detentor da maioria do capital o locador, seu cônjuge, ascendente ou descendente (BRASIL, 1991, documento on-line). Portanto, se não há direito absoluto no ordenamento jurídico brasileiro, inclusive, mesmo a vida tendo suas ponderações a serem realizadas diante de legítima defesa ou reserva do possível, não seria diferente com a proteção ao ponto empresarial adquirido após contrato de locação para fins não residenciais. 9Estabelecimento e ponto empresarial C03_Estabelecimento_ponto_empresarial.indd 9 20/04/2018 13:22:31 Mecanismos de alienação e tutela do estabelecimento e do ponto empresarial Sabe-se que pode “[...] o estabelecimento ser objeto unitário de direitos e de negócios jurídicos, translativos ou constitutivos, que sejam compatíveis com a sua natureza” (art. 1.143, BRASIL, 2002, documento on-line). Nesse sentido, não se nega a possibilidade de sua alienação, ao contrário. Há de se destacar, assim, o que a doutrina chama de contrato de trespasse, que é “[...] o negócio jurídico que tem, por objeto, a alienação, em princípio onerosa, e na modalidade venda e compra, do estabelecimento empresarial como um todo, transferindo-se ao adquirente a titularidade dos direitos de propriedade incidentes sobre todos os bens que o integram” (GOMES, 2018, p. 83). Os efeitos a terceiros das transferências (contrato de trespasse, usufruto, arrendamento), entretanto, só são possíveis após o cumprimento de certas for- malidades. Primeiramente, averbação à margem da inscrição do empresário no Registro Público de Empresas Mercantis e, em segundo lugar, publicação na imprensa oficial. Ou seja, admite-se existência, validade e, até mesmo, eficácia do negócio contra os partícipes, restringindo esta apenas a terceiros. Outra limitação à sua transferência decorre de possível insuficiência dos bens. Nessa hipótese, se “[...] ao alienante não restarem bens suficientes para solver o seu passivo, a eficácia da alienação do estabelecimento depende do pagamento de todos os credores, ou do consentimento destes, de modo expresso ou tácito, em trinta dias a partir de sua notificação” (art. 1.145, BRASIL, 2002, documento on-line). Após analisada a transferência do estabelecimento ou ponto empresarial, há de serem analisados os efeitos dela decorrentes. Em regra, o alienante do estabelecimento não pode fazer concorrência ao adquirente nos 5 anos subse- quentes à transferência. Entretanto, o art. 1.147 do CC prevê a possibilidade de autorização expressa nesse sentido. Nas hipóteses de arrendamento ou usufruto do estabelecimento, a proibição prevista persistirádurante o prazo do contrato. Enunciado nº 8 da I Jornada de Direito Comercial do Conselho da Justiça Federal (CJF) A sub-rogação do adquirente nos contratos de exploração atinentes ao estabeleci- mento adquirido, desde que não tenham caráter pessoal, é a regra geral, incluindo o contrato de locação. Estabelecimento e ponto empresarial10 C03_Estabelecimento_ponto_empresarial.indd 10 20/04/2018 13:22:31 Assim, se, por um lado, é sabido que, “[...] salvo disposição em contrário, a transferência importa a sub-rogação do adquirente nos contratos estipu- lados para exploração do estabelecimento, se não tiverem caráter pessoal”, podem, por outro, “[...] os terceiros rescindir o contrato em noventa dias a contar da publicação da transferência, se ocorrer justa causa, ressalvada, neste caso, a responsabilidade do alienante” (art. 1.148, BRASIL, 2002, documento on-line). Entretanto, tal circunstância não se aplica à hipótese de mera instalação de um novo estabelecimento em lugar antes ocupado por outro, ainda que no mesmo ramo de atividade. Tal explicação foi objeto da II Jornada de Direito Comercial da CJF. Enunciado nº 59 da II Jornada de Direito Comercial da CJF A mera instalação de um novo estabelecimento, em lugar antes ocupado por outro, ainda que no mesmo ramo de atividade, não implica responsabilidade por sucessão prevista no art. 1.146 do CCB. Importa agora explicar as responsabilidades do adquirente e do alienante. Acerca do adquirente, há responsabilidade pelo pagamento dos dé- bitos anteriores à transferência, desde que regularmente contabilizados (art. 1.146, CC), assim como, por óbvio, dos posteriores. Ao alienante, entretanto, não é deferido se isentar de pronto de todas as obrigações. Ao contrário, ele responderá solidariamente, ainda, pelo prazo de um ano, a partir, quanto aos créditos vencidos, da publicação e, quanto aos outros, da data do vencimento (art. 1.146, CC). Por fim, o art. 1.149 dispõe que [...] a cessão dos créditos referentes ao estabelecimento transferido produzirá efeito em relação aos respectivos devedores, desde o momento da publicação da transferência”. Entretanto, reconhece que “o devedor ficará exonerado se de boa-fé pagar ao cedente (BRASIL, 2002, documento on-line). 11Estabelecimento e ponto empresarial C03_Estabelecimento_ponto_empresarial.indd 11 20/04/2018 13:22:31 BRASIL. Lei n° 8.245, de 18 de outubro de 1991. Dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos e os procedimentos a elas pertinentes. Brasília, DF, 1991. Disponível em: . Acesso em: 10 mar. 2018. BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF, 2002. Disponível em: . Acesso em: 10 mar. 2018. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (1ª Seção). REsp 1355812/RS. Relator: Ministro Mauro Campbell Marques. Julgado em: 22 maio 2013. DJe, Porto Alegre, 31 maio 2013. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula vinculante 49. Brasília, DF, 2015. Disponível em: . Acesso em: 16 abr. 2018. BRITO, E. Reflexos jurídicos da atuação do Estado no domínio econômico. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS. Tribunal de Justiça. Apelação cível : APL DF 0007200- 27.2007.807.0007. Relator: Des. João Batista Teixeira. Julgado em: 08 jun. 2011. GOMES, F. B. Manual de direito empresarial. 7. ed. rev., atual. e ampl. Salvador: JusPo- divm, 2018. MAMEDE, G. Direito empresarial brasileiro: empresa e atuação empresarial. 10. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2018. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça (16ª Câmara Cível). AC: 70051082725 RS. Relator: Paulo Sérgio Scarparo. Data de julgamento: 29 nov. 2012. Diário da Justiça, Porto Alegre, 03 dez. 2012. SÃO PAULO. Tribunal de Justiça (31ª Câmara de Direito Privado). AI: 21616856020158260000 SP 2161685-60.2015.8.26.0000. Relator: Carlos Nunes. Data de julgamento: 29 set. 2015. TEIXEIRA, T. Direito empresarial brasileiro: doutrina, jurisprudência e prática. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2018. Estabelecimento e ponto empresarial14 C03_Estabelecimento_ponto_empresarial.indd 14 20/04/2018 13:22:33 Leituras recomendadas BRASIL. Conselho de Justiça Federal. I Jornada de Direito Comercial: enunciados. Brasília, DF, 2012. Disponível em: . Acesso em: 14 abr. 2018. BRASIL. Conselho de Justiça Federal. II Jornada de Direito Comercial: enunciados. Brasília, DF, 2015. Disponível em: . Acesso em: 14 abr. 2018. IGLESIAS, M. B.; POIDOMANI, I. L. Análise do estabelecimento empresarial: natureza jurídica e contratos. Revista do CEPEJ, n. 17, p. 109-121, 2015. Disponível em: . Acesso em: 11 mar. 2018. PARENTONI, L. N. Direito de arrependimento na internet e estabelecimento virtual. Repertório de Jurisprudência IOB, v. 3, n. 16, p. 514-517, ago. 2006. Disponível em: . Acesso em: 11 mar. 2018. 15Estabelecimento e ponto empresarial C03_Estabelecimento_ponto_empresarial.indd 15 20/04/2018 13:22:33 DIREITO EMPRESARIAL Guérula Mello Viero Caracterização do empresário Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identificar os elementos essenciais de regulação da atividade empresarial e do empresário. Distinguir empreendedor de empresário. Reconhecer o mecanismo de registro do empresário perante o órgão oficial competente. Introdução Quando uma pessoa pretende empreender, a escolha da formatação jurídica é de fundamental importância, pois isso pode definir as responsabilidades e os riscos inerentes à atividade empresarial. Nesse sentido, optar pela melhor forma de exercer a empresa é uma medida de prudência e profissionalismo do empreendedor. Neste capítulo, você vai ler sobre o conceito de empresário e como se dá a atividade empresarial, ou seja, quais os requisitos necessários para se constituir a empresa, visto que há elementos imprescindíveis, tanto para ser classificado como empresário quanto para o exercício da atividade econômica. Você também vai estudar as características dos empreendedores e dos empresários e entender como eles diferem entre si. Ainda, irá entender como ocorre o registro das empresas, quais órgãos são competentes, como obter a inscrição no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), a escolha do nome empresarial, entre outros elementos. Empresário e atividade empresarial A defi nição de empresário pode ser encontrada no Código Civil, art. 966, o qual dispõe que: “Art. 966 Considera-se empresário quem exerce profi ssionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços” (BRASIL, 2002, documento on-line). Assim, dessa conceituação, já se exprimem os requisitos básicos inerentes ao desenvolvimento da atividade empresarial. Para ser caracterizado como tal, o empresário deve ter profissionalismo, exercer uma atividade econômica organizada e que esta tenha o intuito de produzir ou fazer circular bens e/ou serviços. Assim, vamos entender cada um desses elementos. Profissionalismo O profi ssionalismo é um quesito composto por três ordens para o desempenho de uma atividade. Em primeiro lugar, a habitualidade. Alguém que exerce uma atividade de forma esporádica, mesmo que haja exploração comercial, não é considerado empresário. Logo, é necessário que seja de forma habitual. O segundo item trata da pessoalidade. Um empresário deve ter empregados. O empresário, sendo um profissional, exercerá a atividade empresarial pessoalmente, enquanto os empregados irão produzir e circular os bens e serviços emnome do empregador. Em terceiro lugar, e o mais importante, é o monopólio das informações. O empresário detém todas as informações sobre o produto ou serviço que é objeto de sua empresa. Ou seja, como leciona Coelho (2014), o empresário precisa conhecer bem os produtos e serviços que fornece, como as informações de uso, qualidade, insumos empregados, defeitos de fabricação que podem ocorrer, potenciais riscos à saúde, tanto dos funcionários quanto de seus compradores, entre outros. Atividade A empresa é uma atividade pela qual são produzidos e circulados os bens ou serviços. Destacamos que, muitas vezes, a palavra empresa é empregada erroneamente, inclusive no meio jurídico. Coelho (2014, p. 95) menciona algumas formas: “[...] a empresa faliu” e “[...] a empresa importou essas mercadorias”. Nesse sentido, a empresa não pode ser confundida com o sujeito de direito, que é o empresário, o qual fale ou seja responsável pela importação das mercadorias. A empresa deve ser entendida como um sinônimo de empreendimento. Ainda, as expressões como “[...] a empresa está pegando fogo” e “[...] a empresa foi reformada” também entram no rol de equívoco, uma vez que aqui Caracterização do empresário2 há relação entre empresa e local em que a atividade se desenvolve. O correto seria nominar como estabelecimento empresarial, visto que este pode pegar fogo, ser embelezado, mas não a atividade (COELHO, 2014, p. 96). Econômica A atividade é considerada econômica, uma vez que busca lucro para o empresário que a explora. O lucro é fundamental para manter o funcionamento da empresa, visto que, se as despesas superarem os rendimentos, fi ca insustentável. Assim, o lucro pode ser tanto o objetivo da produção ou circulação de bens ou serviços quanto pode servir de instrumento para alcançar outras fi nalidades. Organizada A empresa é considerada uma atividade organizada, uma vez que o empresário articula quatro fatores de produção: “[...] capital, tecnologia, insumos e mão de obra” (COELHO, 2014, p. 102). Para ser considerado empresário, é necessário que explore esses fatores. Vejamos um exemplo: pense em um comerciante que vende perfumes. Se ele mesmo leva os produtos até os seus consumidores, ele realiza a circulação de bens, com o intuito de lucro e possui habitualidade. Ele será considerado empresário mesmo não possuindo empregado, pois o fato de não ter subordinados com vínculo empregatício é irrelevante para a caracterização de empresário No que tange à tecnologia, esta não precisa ser necessariamente de ponta, apenas precisa estar inserida no contexto da organização econômica. Produção de bens ou serviços A produção de bens ou serviços consiste na fabricação dos produtos ou das mercadorias. Como disciplina Coelho (2014), toda atividade industrial é uma atividade empresarial. Como exemplos, citamos: 3Caracterização do empresário montadoras de automóveis; fábricas de eletrodomésticos; confecções de roupas. A produção de serviços nada mais é do que a prestação de serviços. Nesse contexto, podemos listar como exemplos de produtores de serviços: bancos; hospitais; escolas; seguradoras; estacionamentos. Circulação de bens ou serviços A circulação de bens refere-se à forma originária do comércio, a qual consiste em buscar diretamente no produtor o bem e levá-lo até o consumidor. É a atividade de intermediar. Estão inseridos nesse contexto os supermercados, as lojas de roupas, as concessionárias de veículos, entre outros. Já a circulação de serviços diz respeito ao ato de intermediar, mas, nesse caso, também os serviços, como o trabalho realizado pelas agências de turismo ao montarem um pacote de viagem com passagem aérea, hospedagem, entre outros. Bens e serviços Até o fi m de 1990, sem a presença da internet, a distinção entre serviços e bens não gerava tanta difi culdade. Os bens eram considerados corpóreos, enquanto os serviços não possuíam materialidade. “A prestação de serviços consistia sempre numa obrigação de fazer” (COELHO, 2014, p. 107). Com a intensa utilização do ambiente virtual para a realização de negócios, restaram dúvidas sobre como defi nir. Os bens virtuais, como um jornal virtual ou os programas de computador, seriam incluídos em qual categoria? Bem ou serviço? No entanto, no que diz respeito à caracterização de empresário, o comércio eletrônico, mesmo com todas as suas variações, é considerado sim uma atividade empresarial (COELHO, 2014). Caracterização do empresário4 Segundo o art. 972 do Código Civil, “[...] podem exercer a atividade de empresário os que estiverem em pleno gozo da capacidade civil e não forem legalmente impedidos”. Para entendermos no que consiste a capacidade civil, é necessário analisar o art. 5º do Código Civil: “[...] a menoridade cessa aos 18 anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil”. Logo, para exercer a atividade empresarial, a pessoa precisa ser maior de 18 anos ou ser emancipada, não importando se é homem ou mulher, natural ou estrangeiro (BRASIL, 2002, documento on-line). Empreendedor versus empresário Ao contrário do que muitos pensam, empreendedor e empresário estão longe de serem sinônimos. Ambos possuem papéis distintos e necessitam de competências diferentes. Assim, nem todo empresário é um empreendedor e nem todo empreendedor é um empresário. Tal confusão ocorre pelo desconhecimento das características que devem ser inerentes a cada um. Conforme Demetrio (2017), muitos empreendedores falham justamente pelo fato de não serem empresários. Os empreendedores normalmente possuem a ideia, chegam a abrir o negócio, mas, por não apresentarem as características necessárias para consolidar seu projeto, acabam frustrados. O empreendedor é aquele que consegue identificar as oportunidades e, a partir delas, gerar riqueza. É aquela pessoa que, com uma simples ideia, consegue vislumbrar um negócio e criar uma empresa. Já o empresário é o indivíduo que tem a capacidade e competência para fazer essa mesma empresa ou negócio se perpetuar no tempo. A partir do que foi concebido, ele faz crescer e prosperar (MOREIRA, 2014). Assim, entendemos que empresário é uma profissão. Como explica Marques (2017, documento on-line), o empresário nada mais é do que uma pessoa física ou jurídica que, por meio de capital e trabalho, “[...] produz e gerencia bens/ serviços ao mercado, fazendo com que a empresa cresça e tenha lucro”. No entanto, para colocar em prática esse papel, é necessário contar com mão de obra, dinheiro, equipe qualificada, materiais e equipamento. Há dois tipos de empresários (MARQUES, 2017): 5Caracterização do empresário individual, que é quando a pessoa física estrutura a empresa de maneira individual; coletivo, quando uma pessoa jurídica se une a pessoas com o mesmo objetivo para explorar uma atividade econômica. Para tanto, o empresário precisa apresentar algumas características, como: ter vontade de solucionar os problemas das outras pessoas; manter um controle financeiro e saber empregar os recursos; compreender as mudanças do mercado e adaptar-se a elas; ter conhecimento administrativo e de gestão de pessoal; possuir espírito de liderança para cooperar com o desenvolvimento do projeto e com os resultados. Os empresários podem ser tanto individuais quanto coletivos. Entre os individuais, temos: empresário individual, que exerce em nome próprio uma atividade empresarial (por exemplo, médicos); microempreendedor individual (MEI), que consiste no empresário individual com receita bruta anual de até R$ 81 mil; empresa individual de responsabilidade limitada (Eireli), que é a atuação individual, sem sócios. Já no molde coletivo, temos: sociedade empresarial limitada; anônima; em nome coletivo; em comandita simples e em comandita por ações. Já o empreendedor não está relacionado diretamente com o quesito profissão,mas sim com o comportamento. Os profissionais que possuem essa característica são mais valorizados pelas empresas, devido à alta concorrência existente no mercado. O empreendedor está mais ligado “[...] à identificação de oportunidades, proatividade, criatividade e vontade de agregar valor por meio da entrega de produtos/serviços inovadores” (MARQUES, 2017, documento on-line). Esse perfil empreendedor está atrelado à motivação. “Não basta ter uma ideia Caracterização do empresário6 excepcional, é necessário [...] assumir responsabilidades, trabalhar, estudar, assumir riscos, ter iniciativa e construir um networking para auxiliar o alcance do sucesso” (MARQUES, 2017, documento on-line). Para tanto, há três perfis de empreendedores: o individual — aquele que atua com uma empresa própria; o digital — a pessoa que se utiliza da internet para disponibilizar um produto/serviço, que seria o perfil do e-commerce; o social — aquele que se preocupa com os problemas da sociedade e trabalha em prol de soluções e mudanças; este perfil está mais associado a organizações não governamentais e instituições integrantes do terceiro setor. Assim, o empreendedor precisa contar com algumas características para ter destaque no mercado, quais sejam: ser organizado e possuir habilidade de planejamento; ter conhecimento e apreço pela área em que irá atuar; estar sempre em busca de novidades e soluções para o projeto que está desenvolvendo; ter facilidade de comunicação; ser um visionário. Registro do empresário Entre as obrigações do empresário para exercer uma atividade econômica organizada, com o intuito de produzir ou circular bens/serviços, o registro perante os órgãos competentes é fundamental para dar início ao seu negócio, pois, para uma empresa entrar em funcionamento, ela precisa estar legalmente registrada (COELHO, 2014): na prefeitura; na administração regional da cidade; no Estado; na Receita Federal; na Previdência Social. O objetivo do registro é “[...] tornar público os atos jurídicos, o estado e a capacidade das pessoas, estabelecendo a autenticidade, a segurança e a validade 7Caracterização do empresário das obrigações e de certas relações de direito passíveis de tutela legal e sujeita à transferência, modificação ou extinção” (SILVA, 2002, p. 1). No entanto, o registro não é essencial para se caracterizar um empresário, visto que tal caracterização ocorre por meio do exercício da atividade empresarial, independentemente de registro, como dispõe o art. 966 do Código Civil. Contudo, é necessário que haja inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis na cidade onde desenvolve a atividade, como preconiza o art. 967 do Código Civil (BRASIL, 2002). Órgãos de registro das empresas O Sistema Nacional de Registro de Empresas Mercantis (Sinrem) é formado por dois órgãos: o Departamento de Registro Empresarial e Integração (Drei); as Juntas Comerciais. O Drei, órgão federal, é o responsável por normatizar e fi scalizar os atos de registro. Entre suas funções, quatro merecem destaque (BRASIL, 1994, documento on-line): define com exclusividade as normas do registro; fiscaliza as Juntas Comerciais; soluciona as dúvidas sobre a interpretação das leis e normas administrativas no que se refere ao registro público; organiza o cadastro nacional das empresas mercantis, que funcionam no País, em conjunto com as Juntas Comerciais. Já as Juntas Comerciais são órgãos estaduais, que realizam o registro das empresas mercantis e as atividades afins. Como disciplina o art. 32, II, da Lei nº. 8.934, de 18 de novembro de 1994, uma das principais atividades das Juntas Comerciais é arquivar: Documentos relativos à constituição, alteração, dissolução e extinção de firmas mercantis individuais, sociedades mercantis e cooperativas; dos atos relativos a consórcio e grupo de sociedade de que trata a Lei nº. 6.404, de 15 de dezembro de 1976; dos atos concernentes a empresas mercantis estrangeiras autorizadas a funcionar no Brasil; das declarações de microempresa; e) de atos ou documentos que, por determinação legal, sejam atribuídos ao Caracterização do empresário8 Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins ou daqueles que possam interessar ao empresário e às empresas mercantis (BRASIL, 1994, documento on-line). A inscrição empresarial será feita mediante requerimento, a qual conterá sua qualificação (nome, nacionalidade, domicílio, estado civil e, se casado, o regime de bens, o capital, o objeto e a sede da empresa — conforme art. 968 do Código Civil) (BRASIL, 2002). Ainda, se, por ventura, o empresário individual constituir sociedade, ele poderá solicitar ao Registro Público de Empresas Mercantis a transformação de seu registro de empresário, atentando para as normas existentes no § 3º do referido artigo. O empresário também pode constituir filial em Estado diverso ao que atua. Para isso, há necessidade de registro e averbação do estabelecimento secundário no registro público local, como preconiza o art. 969 do Código Civil: Art. 969 O empresário que instituir sucursal, filial ou agência, em lugar sujeito à jurisdição de outro Registro Público de Empresas Mercantis, neste deverá também inscrevê-la, com a prova da inscrição originária. Parágrafo único. Em qualquer caso, a constituição do estabelecimento secundário deverá ser averbada no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede (BRASIL, 2002, documento on-line). A Lei nº. 8.934/1994 traz, em seu rol de disposições, a estruturação para o Registro Público de Empresas Mercantis e atividades afins. Como dispõe seu art. 1º, o registro é exercido em todo o território nacional, por órgãos estaduais e federais, com a finalidade de: Art. 1º [...] I — dar garantia, publicidade, autenticidade, segurança e eficácia aos atos jurídicos das empresas mercantis, submetidos a registro na forma desta lei; II — cadastrar as empresas nacionais e estrangeiras em funcionamento no País e manter atualizadas as informações pertinentes; III — proceder à matrícula dos agentes auxiliares do comércio, bem como ao seu cancelamento (BRASIL, 1994, documento on-line). A referida lei dispõe que o Número de Identificação do Registro de Empresas (Nire) da empresa será atribuído a todo ato constitutivo de empresa, bem como deve ser compatibilizado com os demais números constantes nos cadastros federais. O Nire possui o número adotado no ato de registro da empresa, o qual é feito pela Junta Comercial ou pelo cartório. 9Caracterização do empresário Em posse do Nire, a empresa deve regular sua atividade com o registro do CNPJ na Receita Federal, passando ao status de contribuinte — a não ser que tenha aderido ao sistema do Simples Nacional. Com o CNPJ, a empresa está apta a adquirir seu alvará de funcionamento, que é fundamental para seu funcionamento. Ainda, em até 30 dias, a empresa precisa realizar seu cadastro na Previdência Social, bem como no seu aparato fiscal na Secretaria da Fazenda do Estado em que está localizado seu estabelecimento. Atos de registro das empresas Os atos de registro de empresa são compostos por três etapas: Matrícula — “A matrícula é o nome do ato de inscrição dos tradutores públicos, intérpretes comerciais, leiloeiros, trapicheiros e administradores de armazéns-gerais” (COELHO, 2014, p. 219). Arquivamento — o arquivamento é o nome de registro levado à Junta Comercial para que a empresa possa ser constituída, alterada, dissolvida ou extinta. Autenticação — consiste no registro dos instrumentos de escrituração do empresário, ou seja, o registro dos livros empresariais e das fichas escriturais. Nome empresarial O nome empresarial nada mais é do que a fi rma ou a denominação adotada para a atividade empresarial. Como dispõem os arts. 1.155 e 1.163 do Código Civil, deve ser equiparada à denominação das sociedades simples, associações e fundações e, ainda, distinguindo-sede outra empresa inscrita no mesmo registro. São nomes empresariais (BRASIL, 2002, documento on-line): Empresário individual — a firma será constituída por seu nome, seja completo ou abreviado, inserindo a designação de sua pessoa ou ramo de atividade, se quiser (art. 1.156 do Código Civil). Eireli — nesse caso, é obrigatória a inclusão da expressão Eireli após a firma ou denominação social (art. 980-A, § 1º, do Código Civil). Sociedade limitada — a firma deve ser composta pelo nome de um ou mais sócios, a denominação precisa descrever o objeto da sociedade, Caracterização do empresário10 sendo acompanhada, ao final, da palavra limitada ou de sua abreviação (art. 1.158, §§ 1º a 3º, do Código Civil). Sociedade anônima — a firma pode conter ou não o nome do fundador ou acionista, a denominação do objeto social, junto com a expressão sociedade anônima ou companhia, também aceitas em suas formas abreviadas (art. 1.160 do Código Civil). Sociedade cooperativa — a firma deve ser acompanhada pelo vocábulo cooperativa (art. 1.159 do Código Civil). Sociedade em comandita por ações — “a sociedade em comandita por ações pode, em lugar de firma, adotar denominação designativa do objeto social, aditada da expressão ‘comandita por ações’” (art. 1.161 do Código Civil). Sociedade em conta de participação — uma vez que não possui personalidade jurídica, “a sociedade em conta de participação não pode ter firma ou denominação” (art. 1.162 do Código Civil). Microempresas, empresas de pequeno porte e MEI — o nome empresarial deverá vir acompanhado das expressões microempresa ou ME; empresa de pequeno porte ou EPP; e microempreendedor individual ou MEI. BRASIL. Lei Federal nº. 8.934, 18 de novembro de 1994. Dispõe sobre o Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 21 nov. 1994. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/CCivil_03/ leis/L8934.htm. Acesso em: 24 jun. 2019. BRASIL. Lei no. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 11 jan. 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ Leis/2002/l10406.htm. Acesso em: 24 jun. 2019. COELHO, F. U. Manual de Direito Comercial: direito de empresa. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. DEMETRIO, D. W. Qual a diferença entre empreendedor e empresário? Sebrae-SC, Florianópolis, 13 jun. 2017. Disponível em: https://blog.sebrae-sc.com.br/empreendedor- e-empresario/. Acesso em: 24 jun. 2019. MARQUES, J. R. Qual a diferença entre empreendedor e empresário? Portal IBC, [s. l.], 16 mar. 2017. Disponível em: https://www.ibccoaching.com.br/portal/qual-diferenca- entre-empreendedor-e-empresario/. Acesso em: 24 jun. 2019. 11Caracterização do empresário MOREIRA, W. Diferenças entre empreendedor e empresário. Administradores, João Pessoa, 4 nov. 2014. Disponível em: https://administradores.com.br/artigos/diferencas- entre-empreendedor-e-empresario. Acesso em: 24 jun. 2019. SILVA, A. L. M. Registro público da atividade empresarial. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2002. Leitura recomendada SEBRAE. Quais são os tipos de empresas? Sebrae São Paulo, São Paulo, 7 jun. 2018. Disponível em: http://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/ufs/sp/conteudo_uf/ quais-sao-os-tipos-de-empresas,af3db28a582a0610VgnVCM1000004c00210aRCRD. Acesso em: 24 jun. 2019. Caracterização do empresário12 1 2