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DEVER FUNDAMENTAL DE VOTAR

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DEVER FUNDAMENTAL DE VOTAR 
 
Franco Aurélio Brito de Souza1 
 
RESUMO 
 
O presente estudo, cujo tema é o exercício do voto na perspectiva dos deveres 
fundamentais, tem por objetivo refletir sobre a ideia de que, não obstante a Lei Maior 
de 1988 fazer menção expressa a deveres ao longo do texto constitucional, a 
sociedade brasileira ainda não compreendeu sua razão de ser, especialmente no 
que concerne ao voto. Nesse diapasão, busca analisar a natureza de tal instituto sob 
a perspectiva dos deveres fundamentais. A partir de uma pesquisa 
predominantemente bibliográfica, com abordagem qualitativa, balizada pelo método 
dialético, foi possível alcançar que, tanto quanto um direito, o voto traduz um dever 
fundamental que precisa ser exercitado para além do pensamento egoísta. 
 
Palavras-chave: voto, direito, dever. 
 
 
1. PALAVRAS INICIAIS 
 
Sabe-se que os direitos fundamentais, além de tratarem da tutela e 
promoção da pessoa na sua individualidade, percebida como titular de direitos; 
denotam valores de toda coletividade, os quais o Estado e a sociedade devem 
reverenciar, resguardar e promover. Por isso, é imperioso ter em mente que direitos 
não podem ser concebidos sem consideração recíproca em relação a deveres. Nas 
palavras de Ingo Wolfgang Sarlet: 
Não é à toa que a máxima de que direitos não podem existir sem 
deveres segue atual e mais do que nunca exige ser levada a sério, 
ainda mais quando na atual CF houve menção expressa, juntamente 
com os direitos, a deveres fundamentais, como dá conta a redação 
do art. 5º, caput, ao se referir aos direitos e deveres individuais e 
coletivos, isto sem levar em conta outras referências diretas a 
deveres ao longo do texto constitucional2. 
 
 
1
 Mestre em Direito do Estado pela Universidade da Amazônia; Professor de Direito Eleitoral na 
Graduação e no Programa de Pós-Graduação lato sensu da Universidade da Amazônia; Professor de 
Direito Constitucional da Faculdade de Belém e da Faculdade Integrada Brasil Amazônia; Advogado. 
2
 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos 
fundamentais na perspectiva constitucional. 10. ed. rev. atual. e ampl. 2. tir. Porto Alegre: Livraria do 
Advogado, 2010, p. 226. 
Não obstante, o tema dos deveres fundamentais, conforme observado por 
Cassalta Nabais3, é reconhecidamente um dos mais “esquecidos” pela doutrina 
constitucional hodierna, não se valendo de um regime constitucional equivalente, ou 
sequer aproximado, àquele referente aos direitos fundamentais. 
No que toca ao ordenamento jurídico pátrio, o contexto não é diverso. O 
desenvolvimento doutrinário e jurisprudencial sobre este tema não é 
consubstanciado. Tal estágio evolutivo encontra razão de ser no desenho do próprio 
Estado de Direito e do que se poderia assinalar de um legado liberal, a partir da 
postura do indivíduo em face do Estado, como a de titular de prerrogativas de não 
intervenção na sua esfera pessoal, fomentando a primazia quase absoluta dos 
direitos subjetivos em detrimento dos deveres. 
Essa supervalorização dos direitos guarda relação estreita, pois, com a 
visão de um cidadão descomprometido com a coletividade que o circunda. 
Constatação que, por sua vez, no que concerne às características do Estado Social, 
necessitou de certa revisão, haja vista a necessária ponderação a respeito do 
exacerbado individualismo, mirando, assim, os elementos sociais e os deveres 
econômicos, sociais e culturais4. 
O imprescindível reconhecimento de deveres fundamentais é pressuposto 
da atuação pró-ativa dos cidadãos na vida pública e impõe, nas lições de José 
Carlos Vieira de Andrade5, “um empenho solidário de todos na transformação das 
estruturas sociais”, reclamando um grau mínimo de responsabilidade social no 
exercício da liberdade individual, além da existência de deveres jurídicos (e não 
apenas morais)6 de deferência aos valores constitucionais. 
 
3
 NABAIS, José Casalta. O dever fundamental de pagar impostos. Coimbra: Livraria Almedina, 1998, 
p. 15. 
4
 Para melhor análise ver BONAVIDE, Paulo. Do estado liberal ao estado social. 8. ed. São Paulo: 
Malheiros, 2007; CANOTILHO, Joaquim José Gomes. Estado de direito. Lisboa: Gradiva, 1999; DÍAZ, 
Elías. Estado de derecho y sociedad democrática. Madri: Editorial Cuadernos para el Diálogo, 1973. 
5
 ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. 
Coimbra: Livraria Almedina, 1987, p. 155. 
6
 “Como apontam Gregorio Peces-Barba (1987, p. 329) e Gianluigi Palombella (2007, pp. 117-118), o 
conceito de dever tem, historicamente, influência da moral, de modo a se dizer, inclusive, que não há 
direitos morais, e sim deveres (LAWS, 2003, p. 267). A influência da moral religiosa, notadamente a 
cristã, sobre o conceito atualmente adotado de deveres é bastante clara. Para se ter uma breve ideia 
disso, deveres muito comuns na Antiguidade Greco-Romana eram os de culto aos mortos e de 
manter aceso o fogo sagrado da família, além disso, na tradição cristã encontram-se deveres insertos 
nos mandamentos do Antigo Testamento (ALCÂNTARA, 2006, p. 3). Há, também, influência da ética 
sobre o conceito de deveres, do que se pode citar a obra de Marco Túlio Cícero, De officiis, que trata 
sobre os deveres, e que se constitui como uma das influências mais nítidas para a recepção jurídica 
moderna do conceito de dever (PECES-BARBA MARTÍNEZ, 1987, p. 329). Ainda no campo ético-
moral é possível referir ao bastante citado dever de não fazer a outrem o que não se quer que faça a 
Vale ressaltar que no universo jurídico, bem como no moral, sanções 
corresponderam aos deveres. Isto é, a disposição jurídica de um dever e o seu não 
atendimento pelos indivíduos traz, normalmente, como consequência uma espécie 
de “castigo”. 
Portanto, fica claro que, mesmo no campo do direito constitucional 
não se prescinde de uma busca no campo da moral, especialmente 
da moral cristã, em se tratando da cultura ocidental, tanto do conceito 
quanto da tipologia dos deveres fundamentais. Isso, de um ponto de 
vista jurídico excessivamente puro provoca a sensação de que os 
deveres não são uma categoria jurídica. Fosse assim, não haveria 
institutos jurídicos, já que todos eles, salvo raríssimas exceções, 
derivam de uma situação social ou de um costume que lhes são pré-
existentes. Assim, a relação entre direito e moral, no campo dos 
deveres fundamentais, não é senão bastante forte7. 
 
Dessa forma, nota-se nítida através da história uma estreita relação entre 
o antijurídico e o pecado, a qual com o transcorrer do tempo sofreu abalos a partir 
do distanciamento entre Estado e religião; entre direito e moral. 
 
2. ENSAIO SOBRE CLASSIFICAÇÃO DOS DEVERES FUNDAMENTAIS 
 
Considerando o caminhar histórico e as singularidade do Estado de 
direito, de pronto, tem-se que o respeito ao ordenamento jurídico legitimamente 
estabelecido emerge no seio da sociedade como uma espécie de “dever dentre os 
deveres”. O que tem o condão de sugerir a percepção de deveres em sentido amplo 
e em sentido estrito. A primeira forma abraçando a necessidade de prestação estatal 
com o escopo de materialização, por meio de políticas públicas, de direitos 
fundamentais; e a segunda, alcançando propriamente os deveres fundamentais dos 
cidadãos na busca pela harmonização das relações intrassociais. 
Nesse aspecto, faz-se mister observar, conforme ensinamentos de José 
Cassalta Nabais8, que se por um lado os direito fundamentais denotam a perspectiva 
ativa dos indivíduos ante o Estado e a sociedade, por outro os deveres refletem o 
prisma passivo da mesma relação. Em outrosdizeres, os direitos exprimem o que o 
 
si próprio, visto pelos contratualistas clássicos como uma lei natural e por Immanuel Kant como 
imperativo categórico”. (SIQUEIRA, Julio Pinheiro faro Homem de. Deveres fundamentais e a 
constituição brasileira.FIDES, Natal, v.1, n. 2, ago/dez, 2010, p. 215). 
7
 Ibidem, p. 216-7. 
8
 NABAIS, José Casalta. op. cit.,, p. 65. 
Estado tem que propiciar às pessoas, ao passo que os deveres referem-se àquilo 
que estas devem àquele. 
 Surge dessa reflexão a ideia de deveres autônomos e deveres correlatos 
aos direitos, distinguindo-se, pois, em razão de estarem ou não ligados direta e 
materialmente à concretização de direitos fundamentais9. 
A título de exemplificação, o dever de solidariedade enquadra-se como 
dever correlato, o qual tem total relação com direitos, tais como sociais, promoção 
da saúde e da educação. O dever de proteção do meio ambiente igualmente é 
exemplo de dever correlato, in casu, ao direito ao ambiente equilibrado, saudável e 
democrático. Incluídos na categoria de deveres autônomos verificam-se, v.g., o de 
alistamento eleitoral, o de prestar serviço militar e o de votar. 
Semelhante ao que ocorre com os direitos fundamentais, os deveres 
podem ter conteúdo de natureza defensiva ou prestacional, dependendo da 
imposição que realizam em relação ao seu destinatário, a saber: comportamento 
positivo ou negativo. Assim, há deveres fundamentais prestacionais ou positivos e 
deveres fundamentais defensivos ou negativos10. 
Há ainda a noção de deveres expressos e deveres implícitos, situando-se 
a diferença no fato de estarem ou não expressamente estabelecidos no texto 
constitucional11. 
De acordo com quem possui o dever, Gregorio Peces-Barba Martinez 
aponta deveres individuais, deveres coletivos e deveres estatais, os quais se 
diferenciam, respectivamente, por dizerem respeito àquilo que pode ser cobrado das 
 
9
 SARLET, Ingo Wolfgang. op. cit.,p. 228. 
10
 A complexidade de alguns deveres fundamentais não permite seu ajuste exclusivo em uma das 
categorias mencionadas, por causa da presença dos dois elementos. Isso acontece no caso dos 
deveres de defesa e promoção da saúde, de defesa do ambiente e de defesa do patrimônio (NABAIS, 
José Casalta. op. cit., p. 112) 
11
 Sobre o assunto Julio Pinheiro Faro Homem de Siqueira observa que: “Embora não haja a 
formulação, por exemplo, de que pagar tributos seja um dever, ou seja, não haja no texto 
constitucional enunciado que explicite como dever das pessoas em pagar determinados tributos, dos 
enunciados de direito tributário previstos na CF é claramente possível extrair a obrigação dos sujeitos 
de pagar tributos, assim como, por exemplo, no art. 14, §1º, da CF, é clara a obrigatoriedade de 
alistamento eleitoral para os brasileiros alfabetizados maiores de 18 e menores de 70 anos. De outro 
modo, não há no texto fundamental brasileiro qualquer referência em suas normas que permita a 
extração dos deveres de respeitar a situação jurídica de terceiros e de respeitar a ordem jurídica 
brasileira. Esses deveres são formulações tanto doutrinárias quanto jurisprudenciais pacíficas, mas 
que não têm qualquer pista de sua existência no texto magno. Dentro desse esquema, pode-se trazer 
quarta classificação: deveres legais ou constitucionais e deveres judiciais ou doutrinários, de acordo 
com sua previsão no ordenamento jurídico – que é o primeiro caso – ou com sua criação pela 
doutrina ou pela jurisprudência – que é o segundo caso”. (SIQUEIRA, Julio Pinheiro faro Homem de. 
op. cit., p. 219). 
pessoas; que pode ser exigido dos grupos de pessoas (família, sindicato, partido 
político); ou do Estado, quer no âmbito interno quer no externo12. 
 
3. DEVERES FUNDAMENTAIS NA ORDEM JURÍDICA BRASILEIRA 
 
A Carta Constitucional pátria dispõe expressamente no Capítulo I de seu 
Título II sobre deveres fundamentais. Não obstante, pela existência de deveres 
também implícitos, nota-se certa dificuldade didática em delimitar uma listagem a 
respeito do tema. 
De qualquer forma, sem a pretensão de indicar um rol exaustivo, 
percebem-se no âmbito constitucional brasileiro os seguintes deveres: de respeito à 
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (art. 5º, caput, da CF); 
de fazer ou deixar de fazer algo em virtude da existência de lei (art.5º, II, da CF); de 
não torturar ou submeter outrem a tratamento desumano ou degradante (art. 5º, III, 
da CF); de indenização por dano material, moral ou à imagem (art. 5º, V e X, da CF); 
de respeito à liberdade de consciência e crença (art. 5º, VI, VIII, da CF); de respeitar 
a intimidade, a vida privada, a honra, a imagem e a casa do indivíduo, assim como 
sua correspondência, comunicações telegráficas, de dados e telefônicas (art. 5º, X, 
XI, XII, da CF); de respeitar a propriedade (art. 5º, XXII, da CF); dever de atender à 
função social da propriedade (art. 5º, XXIII, da CF); de prestar ajuda ao Estado e/ou 
à sociedade em caso de iminente perigo público (art. 5º, XXV, da CF); de respeitar 
as criações alheias, bem como seu valor (art. 5º, XXVII, XXVIII, XXIX, da CF); de 
alistamento eleitoral, de votar e de filiação partidária para se candidatar (art. 14, da 
CF); de alistamento militar (art. 143, da CF); de pagar tributos (art. 145 e seguintes, 
da CF); de contribuir para a seguridade social (arts. 194 e 195, da CF); de promover 
a educação (art. 205, da CF); de promover e proteger o patrimônio cultural (arts. 215 
e 216, da CF); dever de preservar o ambiente (art. 225, da CF); conjugais (art. 226, 
§5º, da CF); de dar suporte à criança e ao adolescente (art. 227, da CF); de amparar 
as pessoas idosas (art. 230, da CF). 
Nessa direção, Ingo Wolfgang Sarlet, ao comentar sobre o regime 
jurídico-constitucional dos deveres fundamentais, traz as seguintes lições: 
 
12
 MARTÍNEZ, Gregorio Paces-Barba. Los deberes fundamentales. Doxa, Alicante, n. 4, 1987, p. 336. 
 
[...] já ficou suficientemente demonstrado que a categoria dos 
deveres fundamentais não se limita a deveres em relação a direitos 
individuais (no sentido de direitos de liberdade) mas alcança também 
deveres de natureza política, bem como deveres sociais, 
econômicos, culturais e ambientais. Em termos gerais, no que diz 
com o seu conteúdo, o regime jurídico dos deveres fundamentais 
guarda sintonia com o regime jurídico dos direitos fundamentais, 
guardadas, é claro, as distinções entre as diferentes dimensões de 
direitos fundamentais, bem como a sua natureza defensiva ou 
prestacional. Nesse sentido, é possível afirmar que os deveres 
fundamentais podem – a depender do caráter da norma jurídico-
constitucional que os fundamenta – ter eficácia e aplicabilidade 
imediatas, mas que tais características, no plano dos deveres, 
devem, a depender da hipótese, ser compreendidas de modo distinto 
do que ocorre com os direitos fundamentais. Com efeito, 
especialmente quando se cuidar da imposição, diretamente deduzida 
de deveres fundamentais (sem mediação legislativa) de sanções de 
natureza penal, administrativa e mesmo econômica, há que ter a 
máxima cautela e render sempre a devida homenagem ao princípio 
da legalidade e seus diversos desdobramentos, entre outros13. 
 
Além disso, é imperioso reforçar que os deveres fundamentais compõem 
categoria constitucional autônoma, notadamente por não poderem ser confundidos 
com as restrições e limitações de direitos fundamentais, mesmo que possam servir 
de justificativa constitucionalpara eventuais limitações e restrições14. 
Sendo assim, tal categoria jurídica determina a cada indivíduo, à 
sociedade e ao Estado a necessidade de respeito à ordem jurídica legitimamente 
estruturada e contribui para a formação e a manutenção de um alicerce material 
vinculado a um sentimento comunitário de bem-estar, o qual viabiliza a fruição de 
um padrão coletivo de vida digno e civilizado condizente com os níveis satisfatórios 
socioeconômicos que vigoram na sociedade. 
 
4. CONJECTURAS SOBRE O VOTO NO CONTEXTO DOS DEVERES 
FUNDAMENTAIS 
 
Antes de se comentar a respeito do instituto do voto propriamente dito, 
faz-se mister abordar, ainda que sucintamente, a noção de sufrágio. 
 
13
 SARLET, Ingo Wolfgang. op. cit., p. 229-30. 
14
 Ibidem, p. 230. 
Para José Jairo Gomes, “o vocábulo sufrágio significa aprovação, opinião 
favorável, apoio, concordância, aclamação. Denota, pois, a manifestação de vontade 
de um conjunto de pessoas para a escolha de representantes políticos”15. 
Em outras palavras, o sufrágio é o poder que se confere a certo número 
de pessoas de atuar diretamente ou indiretamente na gerência da vida pública. 
Com a participação direta, o povo politicamente organizado decide, 
através do sufrágio, determinado assunto de governo; com a 
participação indireta, o povo elege representantes. 
Quando o povo se serve do sufrágio para decidir, como nos institutos 
da democracia semidireta, diz-se que houve votação; quando o povo 
porém emprega o sufrágio para designar representantes, como na 
democracia indireta, diz-se que houve eleição. No primeiro caso, o 
povo pode votar sem eleger; no segundo o povo vota para eleger16. 
 
Diante dessas premissas, o próximo passo é saber se o sufrágio é função 
ou direito. Assim, duas correntes principais debruçam-se sobre o tema, quais sejam: 
a que perfilha o entendimento da doutrina da soberania nacional, a qual apreende o 
sufrágio como função; e a que compartilha a teoria da soberania popular, a qual 
percebe esse instituto como direito. 
A primeira, teoria jurídica do sufrágio-função, ganhou eco a partir de 
Barnave, em 1791, por ocasião da Revolução Francesa17. Sustenta que o eleitor é 
instrumento ou órgão de que vale a nação com fins de criar o órgão maior (corpo 
representativo) a que delega o poder soberano, do qual todavia nunca perde a 
condição de titular. 
Com efeito, nessa diretriz, a partir do sufrágio não se tem a vontade 
autônoma do eleitor intervindo na eleição, mas sim a vontade soberana da nação. 
No que tange à teoria do sufrágio-direito, a história aponta Rousseau 
como o seu “mais celebrado corifeu”18. Considerando o povo soberano, cada 
indivíduo, como membro da coletividade política, assume a titularidade de parcela da 
soberania. O sufrágio, aqui, é visto como a expressão sui generis, autônoma, de 
cada pessoa integrante do corpo eleitoral. 
Sem embargo, na contemporaneidade, com base nos ensinamentos 
constitucionais de origem italiana19, procurou-se uma solução eclética para a 
 
15
 GOMES, José Jairo. Direito eleitoral. 4. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 37. 
16
 BONAVIDES, Paulo. Ciência política. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 245. 
17
 Ibidem, p. 246. 
18
 Ibidem, p. 247. 
19
 Ver RUFFIA, Biscaretti di. Diritto constituzionale. 5. ed. Napol, 1958. 
natureza jurídica do sufrágio. Ao mesmo tempo em que sufrágio agrega a noção de 
direito, não prescinde do seu correto exercício (dever). 
Como ‘função eleitoral’, o sufrágio é direito público subjetivo, 
contendo certos poderes reconhecidos ao seu titular, entre os quais, 
consoante Ruffia, o de exigir a própria inscrição nos registros 
eleitorais, o de reclamar a inscrição de outros eleitores em tais 
registros, o de exigir o eventual cancelamento daqueles eleitores que 
hajam sido indevidamente inscritos, o de propor eventualmente 
candidatos, o de ser admitido às votações. 
Como ‘correto exercício da função eleitoral’, entende-se por aí a face 
do sufrágio que se apresenta em forma de dever, de obrigação do 
eleitor ou cidadão. Este não poderá ser molestado no livre e 
independente exercício daquele direito. Descumprido porém o 
caráter público da função, abstendo-se de votar ou valendo-se do 
voto para auferir vantagens pessoais indevidas, ficará então o eleitor 
sujeito às sanções da ordem jurídica [...] 
Enfim [...] direito de sufrágio ou direito de função entra na categoria 
dos direitos públicos subjetivos, da velha teoria de Jellinek. Como 
função o sufrágio é de natureza eminentemente pública e não 
propriamente estatal. O eleitor ou cidadão exerce referida função de 
modo coletivo e não individual, como direito corporativo e não como 
‘direito subjetivo individual’ em nome próprio, com vistas aos 
elevados fins e superiores interesses sociais e não em nome do 
Estado20. 
 
 
Nessa linha, partindo do pressuposto que o voto é a concretização do 
sufrágio21, nota-se que esse instituto também pode ser considerado direito público 
subjetivo, além de função no âmbito da soberania popular, o que legitima sua 
imposição como dever, na medida em que o cidadão deve manifestar a sua vontade 
na democracia. 
Nos termos da Constituição brasileira de 1988, a soberania popular será 
exercida pelo sufrágio universal22 e pelo voto direto e secreto, com valor igual para 
todos (art. 14, caput, da CF). 
 
20
 BONAVIDES, Paulo. op. cit., p. 248. 
21
 GOMES, José Jairo, op. cit., p. 40. 
22
 “A característica do sufrágio quanto ao critério de seu alcance é disposta pela universalidade, 
quando há o reconhecimento da legitimidade do direito de votar para todos os nacionais, 
indistintamente; e configurada também pela restrição, quando se pulveriza o direito de votar, 
contemplando-o a grupos determinados, para tanto, tornando-se lícita a exigência de condições para 
o voto” (SILVA, Amaury. Reforma eleitoral. Leme: J. H. Mizuno, 2010, p. 47). 
 Para um maior esclarecimento sobre o tema, Paulo Bonavides assim comenta: “a rigor todo 
sufrágio é restrito. Não há sufrágio completamente universal. Relativa pois é a distinção que se 
estabelece entre o sufrágio universal e o sufrágio restrito. Ambos comportam restrições: o sufrágio 
restrito em grau maior; o sufrágio universal em grau menor [...] Define-se o sufrágio universal como 
aquele em que a faculdade de participação não fica adstrita às condições de riqueza, instrução, 
nascimento, raça e sexo” (BONAVIDES, Paulo. op. cit., p. 250). 
Muito embora não esteja explícito no texto constitucional, o voto ainda é 
dotado de outra qualificação, a saber: livre. Isto porque sem o caráter de liberdade 
não há explicação razoável para o destaque feito à feição secreta do voto. 
O voto direto impõe seja conferido pelo eleitor “a determinado candidato 
ou a determinado partido, sem que haja mediação por instância intermediária ou por 
um colégio eleitoral. Tem-se aqui o princípio da imediaticidade do voto”23. 
Igualmente, o voto é secreto e, de maneira indissociável, livre. Ora, 
ninguém poderá saber em qual candidato votou o eleitor, se isto não for da sua 
vontade; bem como a ninguém é facultado o direito de interferir na liberdade de 
escolha deste eleitor. 
No que concerne à igualdade do voto, tem-se qualquer tratamento 
discriminatório não merece guarida no ordenamento jurídico pátrio, quer quanto aos 
eleitores, quer quanto à própria eficácia de sua participação no processo eleitoral. 
Conforme bem ressalta Gilmar Ferreira Mendes: 
A igualdade de votos abrange não só a igualdade de valor numérico 
(Zahlwertgleichheit),mas também a igualdade de valor quanto ao 
resultado (Erfolgswertgleichheit). 
A igualdade de valor quanto ao resultado é observada se cada voto é 
contemplado na distribuição dos mandatos. 
A igualdade de valor quanto ao resultado associa-se, 
inevitavelmente, ao sistema eleitoral adotado, se majoritário ou 
proporcional, à admissão ou não de cláusula de desempenho ou de 
barreira, para as agremiações partidárias, e à solução que se adote 
para as sobras ou restos, no caso da eleição proporcional24. 
 
Para os fins almejados neste articulado, imperioso é ainda o debate sobre 
a obrigatoriedade ou não do voto, haja vista a relação estreita com a percepção 
deste instrumento como dever social. 
O voto obrigatório é aquele em que a participação eleitoral não é 
consentida ao arbítrio do eleitor, mas resolvida por lei, que assim prevê sanções na 
hipótese de não observação. O voto facultativo traduz-se como o oposto ao voto 
obrigatório, possibilitando ao eleitor decidir pelo seu exercício ou não. 
A regra da obrigatoriedade do voto é adotada pelo Brasil desde 1934, a 
qual gera fervoroso debate, especialmente pelo fato de dizer com a própria natureza 
da participação política num ambiente democrático. As razões a favor ou contra o 
 
23
 MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso 
de direito constitucional. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 783. 
24
 Ibidem, p. 784. 
voto obrigatório, conforme apontamentos de Cícero Araújo25, podem ser 
classificadas em dois tipos: “Razões de princípio, que levam em conta o significado 
e o estatuto mesmo do ato de votar; e razões prudenciais, que consideram os efeitos 
benéficos ou danosos da obrigatoriedade (ou não) da participação”. 
Nesse sentido, argumenta-se que, se o voto é um direito, por definição ele 
não poderia ser obrigatório. Ora, ou se possui um direito, caso em que se pode 
exercê-lo ou não; ou se é compelido por lei a fazer algo, e então isso é de fato uma 
obrigação. 
Com o respeito necessário a quem sustente tais premissas, há melhores 
caminhos para iluminar o debate: é possível harmonizar num só instituto a ideia de 
direito, dever, obrigação, função. 
Ao invés de pensar o voto como um direito individual, interessante seria 
considerá-lo um ato púbico de confiança, que depositaria nos eleitores significativas 
responsabilidades26. 
 Com isso, atribuir a determinado indivíduo um título de eleitor, não 
equivale a dar um título de propriedade a alguém. É antes de tudo, reforçar-lhe a 
obrigação de fazer jus à confiança nele depositada enquanto agente de 
transformação social, reconhecidamente capaz de colaborar decisivamente para o 
bem-estar da comunidade que o cerca. 
Esse direito de acesso é complementado necessariamente por um dever 
de exercício que, por conseguinte, transmuta-se em obrigação legal, para evitar que 
parcela dos cidadãos “empurre” para os demais a carga desse serviço público. 
Por outro lado, ainda que não seja legalmente obrigatório, o voto continua 
sendo um dever cívico. O cidadão tem o direito legalmente garantido, porém seu 
exercício deve ser balizado pelo comprometimento social (dever). Nas lições de 
Ronald Dworkin “[...] a deliberação cívica com outras pessoas é um ‘dever político’ 
que caminha lado a lado com o dever do cidadão soberano de votar”27 
 
25
 ARAUJO, Cícero. Voto obrigatório. In: AVRITZER, Leonardo; ANASTASIA, Fátima (Org.). Reforma 
política no brasil. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006, p. 86. 
26
 “O exercício de qualquer função política, seja como um eleitor ou como um representante, é um 
poder sobre os outros. Aqueles que dizem que o sufrágio não é um ato de confiança, mas um direito, 
dificilmente aceitarão as conclusões a que sua doutrina conduz. Se é um direito, se pertence ao 
eleitor em seu próprio benefício, com que base poderíamos culpá-lo por vendê-lo, ou por usá-lo para 
recomendar a si próprio a quem seja de seu interesse agradar?” (MILL, John Stuart apud ARAUJO, 
Cicero. op. cit., p. 87). 
27
 DWORKIN, Ronald. A virtude soberana: a teoria e a prática da igualdade. 2. ed. São Paulo: Martins 
Fontes, 2011, p. 523. 
Destarte, deve-se enaltecer que a compreensão do voto como dever 
fundamental, indissociavelmente, impõe o esclarecimento da prática cidadã, por 
meio do sistema educacional formal, dos partidos políticos, dos veículos de 
comunicação, com o escopo de descortinar qual poder de fato o povo tem em suas 
mãos quando do exercício de escolhas públicas. 
 
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
Nesse momento, surge a possibilidade de sintetizar os singelos 
resultados das ideias trabalhadas ao longo do texto. Não obstante a linha de 
raciocínio aqui desenvolvida já estar descortinada, faz-se relevante pontuar os 
frutos, mesmo que incipientes, que surgiram por ocasião dos enfrentamentos 
realizados. 
Considerando que o Brasil tem sua “democracia eleitoral maturada”28 - ou 
seja, que a realidade brasileira, duas décadas pós-redemocratização, reflete de 
maneira serena uma conjuntura onde os atores políticos, partidos ou interesses 
organizados, forças ou instituições de peso encontram no processo democrático a 
única alternativa para alcançar o poder e, principalmente, onde nenhum grupo ou 
instituição se julga no direito de vetar a atuação de governantes democraticamente 
eleitos - emerge o desafio ímpar de se marchar estavelmente rumo à consolidação 
de um ambiente democrático que garanta cidadania civil e social a toda a sociedade, 
para além do voto; contudo, necessariamente, por meio da conscientização coletiva 
sobre o seu papel no Estado Democrático de Direito. 
Assim, compreendendo os deveres fundamentais como integrantes de 
uma categoria constitucional autônoma, faz-se imprescindível por parte da 
sociedade brasileira uma (re)leitura do instituto do voto enquanto dever – ato público 
de confiança – fomentador de elevado grau de responsabilidade social para quem o 
exerce. 
Além disso, igualmente indispensável é a propagação e assimilação de 
informações no sentido do real poder do voto num ambiente democrático 
(transformação do status quo), a fim de despertar conjuntamente nos indivíduos um 
 
28
 SOUZA, Franco Aurélio Brito de. O acesso à justiça e o paradigma institucional da defensoria 
pública no estado brasileiro. 2009. 150p. Dissertação (Mestrado em Direito). Universidade da 
Amazônia, Belém. 
sentimento comunitário de unidade em prol da melhoria da qualidade de vida sob o 
prisma coletivo, deixando para segundo plano as ponderações egoístas. 
 
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