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4. Vygotsky atual
Na primeira parte deste texto, analisamos as consequências da teoria do desenvolvimento de Vygotsky para a educação. No que se segue, passaremos brevemente em revista suas ideias mais explícitas sobre educação. Consideramos, porém, que a análise que acabamos de fazer é de importância capital na matéria. 
Vygotsky foi, pessoalmente, muito engajado em atividades pedagógicas. Ele era educador e diz-se que ele era muito bem dotado para a profissão. Membro de diferentes órgãos dirigentes da educação nacional, ele foi levado a agir sobre problemas práticos com os quais se confrontava o sistema educacional soviético da época, incluído o da passagem do ensino “complexo” para o ensino por disciplinas escolares na escola primária. Ao longo de toda sua vida, ele se interessou pela educação de crianças deficientes. 
Daremos, aqui, algumas indicações sobre os problemas pedagógicos que dizem respeito às relações entre desenvolvimento e aprendizagem, sobre o conceito de “zona de desenvolvimento proximal” e sobre as especificidades da educação escolar formal. 
O problema da relação entre desenvolvimento e aprendizagem, para Vygotsky, era, em primeiro lugar, um problema teórico. Uma vez que, na sua teoria, a educação estava muito ligada ao desenvolvimento e que este ocorre no meio sociocultural real, suas análises recaem, diretamente, sobre a educação escolar. 
Já vimos que um dos modelos de desenvolvimento (modelo II – “desenvolvimento artificial”) torna-se possível justamente graças ao ensino escolar, com a aquisição dos sistemas de conceitos científicos como núcleo desse tipo de educação. 
Assim, para Vygotsky, a educação não se resume à aquisição de um conjunto de informações; ela é uma das fontes de desenvolvimento e ela própria se define como o desenvolvimento artificial da criança. O papel essencial da educação é, pois, de assegurar seu desenvolvimento, proporcionando-lhe os instrumentos, as técnicas interiores, as operações intelectuais. Em várias oportunidades, Vygotsky fala da aprendizagem de diferentes tipos de atividades. Se, por exemplo, seu enfoque for aplicado na classificação usada na botânica, poder-se-ia dizer que, para ele, o essencial não é o conhecimento das categorias taxionômicas, mas o domínio do procedimento de classificação (definição e aplicação dos critérios de classificação, classificação dos casos limite ou ambíguos, produção de novos elementos de uma classe e, antes de tudo, aprendizagem da execução das operações lógicas que ligam as diferentes classes entre elas, etc. 
Tudo isso significa que Vygotsky atribuía a maior importância aos conteúdos dos programas educacionais, destacando, sobretudo, os aspectos estruturais e instrumentais desses conteúdos, cujo significado evocamos o significado na análise das implicações da fórmula de McLuhan, “o meio é a mensagem”. Nessa linha de pensamento, devemos afirmar que Vygotsky não foi muito longe no desenvolvimento dessas ideias interessantes. Nesse enfoque, pode-se considerar o próprio estabelecimento escolar como uma “mensagem”, isto é, um fator fundamental de educação, pois essa instituição, mesmo que se faça abstração dos conteúdos que aí são ensinados, subtende uma certa estruturação do tempo, do espaço e repousa sobre um sistema de relações sociais (entre aluno e professor, entre os próprios alunos, entre a escola e o entorno, etc.). De fato, o impacto da escolarização é devido, em grande parte, a esses aspectos do “meio escolar”. 
Por outro lado, vimos que Vygotsky pouco desenvolveu sua crítica da educação escolar a não ser na linha de seu sistema de pensamento: a escola não ensina sempre sistemas de conhecimento, mas, frequentemente, sobrecarrega os alunos com fatos isolados e desprovidos de sentido; os conteúdos escolares nem comportam instrumentos nem técnicas intelectuais e, muitas vezes, não há, na escola, interações sociais capazes de construir saberes, etc. Enfim, Elkonin (Elkonin e Davidov, 1966) tem razão quando reclama que Vygotsky não deu a devida atenção aos métodos pedagógicos. 
A noção vygotskyana de “zona de desenvolvimento proximal” tem, de início, uma marca teórica. Na concepção sociocultural de desenvolvimento, a criança não deveria ser considerada isolada de seu contexto sociocultural, em uma espécie de modelo Robinson-Crusoé-criança. Seus vínculos com os outros fazem parte de sua própria natureza. Desse modo, nem o desenvolvimento da criança, nem o diagnóstico de suas aptidões, nem sua educação podem ser analisados se seus vínculos sociais forem ignorados. A noção de zona de desenvolvimento proximal ilustra, precisamente, esta concepção. Esta zona é definida como a diferença (expressa em unidades de tempo) entre os desempenhos da criança por si própria e os desempenhos da mesma criança trabalhando em colaboração e com a assistência de um adulto.

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